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SEGUNDO COMENTÁRIO

[1] Assim, no tempo do imperador Constantino e do papa Silvestre 1 , a fé cristã


sobrelevou. Foi a idolatria muitíssimo perseguida, de tal modo que todas as
estátuas e pinturas foram desfeitas e laceradas em sua muita nobreza, antiga e
perfeita dignidade, e assim se consumiram com as estátuas, e pinturas, e
volumes, e comentários, e lineamentos, e regras que ensinavam uma arte
numerosa, egrégia e gentil. E depois, para remover todo antigo costume de
idolatria, 2 determinaram que todos os templos fossem brancos. 3 Nesse tempo

1 Os tempos do imperador Constantino e do papa Silvestre são personificações do


declínio das artes na Itália. Apesar de ser posterior, acamos tais personificações em Vidas
de Vasari. Cf. Giorgio Vasari, , Le vite de’ più eccellenti architetti, pittori et scultori italiani
da Cimabue insino a’ tempi nostri. Nell’ edizione per i tipi di Lorenzo Torrentino, Firenze
1550, Volume Primo. A cura di Luciano Bellosi e Aldo Rossi. Presentazione di Giovanni
Previtali. Torino, Giulio Einaudi Editore, 1991, p. 96: “(...) I quali, degenerati in grandissima
parte da l’valore antico romano, per essere andati gran tempo innanzi tutti i migliori in
Bisanzio con Costantino Imperatore, non avevano più costumi, né modi buoni nel vivere.
Anzi, avendo perduto in n tempo medesimo i veri uomini et ogni sorte di virtù, e mutato
leggi, abito, nomi e lingue, tutte queste cose insieme, e ciascuna per sé, avevano ogni
bello animo et alto ingegno fatto bruttissimo e bassissimo diventare (...)”. Cf. op.cit., p.100:
“(...) Ma perché più agevolmente si intenda quello che io chiami vecchio et antico, antiche
furono le cose inanzi Costantino, di Corinto, d’Atene e di Roma, e d’altre famosissime
città, fatte fino a sotto Nerone, a i Vespasiani, Traiano, Adriano et Antonino; percioché l’
altre si chiamano vecchie, che da San Silvestro in qua furono poste in opera da un certo
residuo de’Greci, i quali più tosto tignere che dipignere sapevano. (...)”.
2 Sobre a ruína da arte antiga e a perseguição da idolatria, v. Giorgio Vasari, op.cit., p.95-
96: “(...) Ma perché la fortuna, quando ella ha condotto altri al sommo della ruota, o per
ischerzo o per pentimento il più delle volte lo torna in fondo, avvene, dopo queste cose,
che sollevatesi in diversi luoghi del mondo quasi tutte le nazioni barbare contra i Romani,
ne seguì fra non molto tempo non solamente lo abbassamento di così grande imperio, ma
la rovina del tutto parimente gli eccellentissimi artefici, scultori, pittori et architetti,
lasciando l’arti e loro medesimi sotterrate e sommerse fra le miserabili stragi e rovine di
quella famosissima città. (...) Ma quello che, sopra tutte le cose dette, fu di perdita e danno
infinitamente alle predette professioni, fu il fervente zelo della nuova religione cristiana, la
quale, dopo lungo e sanguinoso combattimento, avendo finalmente, con la copia
de’miracoli e con la sincerità delle operazioni, abbattuta e annullata la vecchia fede de’
Gentili, mentre che ardentissimamente attendeva con ogni diligenza a levar via et a
stirpare in tutto ogni minima occasione donde poteva nascere errore, non guastò
solamente o gettò per terra tutte le statue maravigliose, e le scolture, pitture, musaici et
ornamenti de’fallaci Dii de’Gentili, ma le memorie ancora e gl’onori d’infinite antichità erano
state poste in publico le statue e l’altre memorie. (...)”.

3 Esta “determinação” para que os templos fossem “brancos”, pode possivelmente ser
entendida no comentário ghibertiano como uma alusão à ação contra a idolatria. Como

1
infligiram grandíssima pena a quem fizesse alguma estátua ou alguma pintura e,
assim, acabou a arte estatuária, e a pintura e toda doutrina que nessa fosse feita.
Extinta a arte, os templos permaneceram brancos por cerca de seiscentos anos.
Começaram os Gregos debilissimamente a arte da pintura e com muita rudeza
nela produziram; assim como os antigos foram peritos, nesta idade [foram]
grosseiros e rudes. 4 Passaram-se trezentas e oitenta e duas olimpíadas 5 desde a
edificação de Roma.

antítese a este discurso propomos o discurso de Glaber em que a expressão ‘o manto


branco de igrejas’ significa a renovação do mundo cristão. As igrejas são, então,
ornamentadas e embelezadas. Cf. Rodolfo il Glabro. Storie Dell’Anno Mille. Trad. Dorino
Tuniz. Introd. Giancarlo Andenna. Bergamo, Europía, 1998. Libro Terzo, IV. 13: “Mentre ci
si avvicinava al terzo anno dopo il Mille, in quasi tutto il mondo, ma soprattutto in Italia e in
Gallia, furono rinnovati gli edifici delle chiese. Benché la maggior parte di esse, essendo
costruzioni solide, non avesse bisogno di restauri, tuttavia le genti cristiane sembravano
gareggiare traloro per edificare chiese che fossero le une più belle delle altre. Era come se
il mondo stesso, scuotendosi, volesse spogliarsi della vecchiezza per rivestirsi di un
bianco manto di chiese. I fedeli, infatti, non solo abbelirono quasi tutte le cattedrali e le
chiese dei monasteri dedicate a diversi santi, ma persino le cappelle minori (...)”.
4 Embora indiretamente, há no trecho acima uma possível referência às tópicas
superação e renascimento das artes circulando, entre outros lugares, na História Natural
de Plínio. A sugestão procede, além disso, pela aparente conjunção, feita no texto
italiano, para a contagem do tempo, entre a enumeracão das olimpíadas antigas
destinadas à competição entre artistas e as datas que celebram a edificação de Roma.
Cf. Pline L’Ancien. Histoire Naturelle. Trad. H. Le Bonniec. Commenté par H. Gallet de
Santerre et par H. Le Bonniec. Paris, Les Belles Lettres, 1953. Livre XXXIV, XIX, 52:
“Cessauit deinde ars ac rursus olympiade CLVI reuixit, cum fuere longe quidem infra
praedictos, probati tamen, Antaeus, Callistratus, Polycles Athenaeus, Callixenus,
Pythocles, Pythias, Timocles.”
5 Aqui utilizam-se duas cronologias ou calendários: o das olimpíadas, em Plínio, que se
inicia em 776 a.C., e o da fundação de Roma, que se afirma em 753 a.C. A enumeração
das olimpíadas serve principalmente à demarcação de cinco importantes eventos,
segundo Schlosser e, depois, Krautheimer: 1. olímpíada 382, ou da “maneira grega” ou
“bizantina” identificada como de declínio para as artes; 2. olimpíada 408, em que opera
Buonamico, também chamado Buffalmacco; 3. olimpíada 410, que coincide com a
atividade de Andrea Pisano; 4. olimpíada 438, que indica a morte do escultor de Colônia,
Gusmin; 5. olimpíada 440, que data a visita de Ghiberti a Roma, onde este “viu” uma
estátua de hermafrodita sendo desenterrada. Segundo Krautheimer, o uso do ciclo de
cinco anos e não de quatro como seria de se esperar para cada olimpíada referida em Os
Comentários se dá provavelmente em virtude de Ghiberti ter seguido o calendário de
Diodoro, traduzido por Poggio Bracciolini e, particularmente, de Políbio, que propõe 775 e
não 776 a.C. como ano inicial para as olimpíadas gregas. Cf. Richard Krautheimer (in
collaboration with Trude Krautheimer-Hess. Lorenzo Ghiberti. Princeton University Press,
Princeton, 1982, p.357: “(…) We return again to our attempt to transpose Ghiberti’s
calendar of olympiads into years of the Christian era, starting with 775 B.C. and figuring in
olympiads of five years each. On this basis the following interpretation of the events

2
[2] Começou a arte da pintura a ressaltar na Etrúria. Numa aldeia vizinha da
cidade de Florença, que se chamava Vespignano, nasceu um menino, de
admirável engenho, que se tirava do natural uma ovelha. Passando por ali, pela
estrada que leva a Bologna, o pintor Cimabue 6 viu o menino sentado na terra que
desenhava sobre uma lage uma ovelha. 7 Admirou-se [Cimabue] muitíssimo com o
menino, tendo, com tão pouca idade, o saber fazer tão bem. Perguntou ao
menino, vendo ter ele, da natureza, a arte 8 , qual era seu nome. Este respondeu e

referred to by Ghiberti suggests itself. Ol. 382 = March 1135 – March 1140 (…) Ol. 408 =
1265 –1270 (…) Ol. 420 = 1325 –1330 (…) Ol. 438 = 1415-1420 (…) Ol. 440 = 1425 -1430
(…)”.
6 Há muito pouca documentação sobre este pintor, cujo nome aparece frequentemente
como Cenni (contração de Bencivenni) di Pepo, apelidado Cimabue. Teria estado em
Roma por volta de 1272 e em Pisa, entre 1301 e 1302 (A. Nicholson, Cimabue. A Critical
Study, Princeton, 1932), onde aparece como membro da Compagnia dei Piovuti. A única
obra atribuída como determinantemente sua é a figura de São João Evangelista no
mosaico absidial do Duomo de Pisa, obra pela qual recebeu pagamento em 1301.
7 As micronarrativas sobre os pintores e escultores que têm início neste parágrafo
parecem pertencer ao gênero prosopográfico, vida. A descrição dos feitos ou ações
daqueles está prescrita nos gêneros de narração propostos seja pela Retórica a Herênio,
seja pelo De Oratore, de Cícero, ou nas Instituições Oratórias, de Quintiliano, conhecido
desde o século XIV. Assim, o primeiro gênero de narração trata da causa que é exposta
“_ Cominciò l’arte della pittura a sormontare in Etruria (...)”. Para a constituição da
narrativa, o argumento do discurso pode se servir de feitos fictícios que poderiam ter
ocorrido (por exemplo, o menino Giotto desenhando uma ovelha sobre uma lage)
mesclados com pessoas que realmente existiram. A narração especifica além disso a
figuração dos modos de falar bem como a sua dramatização: ” _ Per nome io son
chiamato Giotto: il mio padre à nome Bondoni e sta in questa casa che è apresso. (...).” In
Lorenzo Ghiberti: I Commentarii. Ed. di Ottavio Morisani. Napoli, Riccardo Ricciardi, 1947.
Commentario Secondo, [2], p. 2. Sobre a mesma passagem confrontar também Giorgio
Vasari, op. cit., p. 117-118: “(...) Era l’anno MCCLXXVI nella villa di Vespignano uno
lavoratore di terre, il cui nome fu Bondone, il quale era tanto di buona fama nella vita e sí
valente nell’arte della agricoltura, che nessuno che intorno a quelle ville abitasse era
stimato più di lui. Costui, nello aconciare tutte le cose, era talmente ingegnoso e d’assai,
che dove i ferri del suo mestiero adoperava, più tosto che rusticalmente adoperati e’
paressino, ma da una mano che gentil fussi d’un valente orefice o intagliatore, mostravano
essere esercitati. A costui fece la natura dono d’un figliuolo, il quale egli per suo nome alle
fonti fece nominare Giotto. (...)”
8 Refere-se aqui tópica antiga na qual a natureza é fonte da invenção. Esta tópica opera,
entre outros lugares, no Anônimo da Retórica a Herênio. Cf. Rhetorica Ad Herennium.
Harvard University Press, Cambridge-Massachusetts, 1989, III, XXII, 35 e 36, p. 218: “(...)
Docet igitur nos ipsa natura quid oporteat fieri. Nam si quas res in vita videmus parvas,
usitatas, cotidianas, meminisse non solemus, propterea quod nulla nova nec admirabili re
commovetur animus; (...) Docet ergo se natura vulgari et usitata re non exsuscitari,

3
disse: _ Por nome sou chamado Giotto, o meu pai tem por nome Bondone e está
na casa logo ali, disse. Cimabue foi com Giotto ao pai, e tinha belíssima presença.
Pediu ao pai o menino: o pai era paupérrimo. Concedeu-lhe o menino e Cimabue
levou consigo Giotto que foi discípulo de Cimabue: tinha a maneira grega 9 que

novitate et insigni quodam negotio commoveri. Imitetur ars igitur naturam, et quod ea
desiderat id inveniat, quod ostendit sequatur. Nihil est enim quod aut natura extremum
invenerit aut doctrina primum ; sed rerum principia ad ingenio profecta sunt, exitus
disciplina conparantur.” Sobre a mesma tópica ver ainda o livro de Francisco de Holanda,
que traz passagem onde o engenho se associa ao infante. Cf. Da Pintura Antiga
Introdução e notas de Angel González Garcia. Imprensa Nacional-Casa da Moeda,
Lisboa, 1983, VII, p. 54-55: “(...) Parecerá por ventura que qualquer homem poderá ser
pintor, aprendendo; mas muito será enganado quem isto cuidar; porque, se alguma
sciencia ou arte n’este mundo para sua perfeição lhe foi necessario trazer a origem e
natural de seu nascimento, sem duvida nenhuma esta deve ser a arte da pintura. E não
somente para ser perfeito e consumado em tal sciencia e tão profunda lho convem com
uma nova graça nascer de Deos e de natural indole e rarissima; mas inda stimo que lhe é
necessario aver em seu pae e mãe algum lume de engenho n’esta ou em outra qualquer
nobre arte, ou alguma outra eicelencia de vertude; por que para dino de ser pintor mester
ha nascer pintor, pois o pintar não se aprende, mas sómente se póde crer que com o
mesmo homem nasce, isto sem se saber como, pois no inocente menino, que ha de ser
famoso n’esta profissão, tenho eu para mi que stá já enfundido e posta toda a
profundidade do saber que depois se ha n’elle de descubrir quando for o tempo de
exercital-o e descubril-o.”
9 A expressão “maneira grega” designa em finais do século XV o “estilo” e o “gosto”
daquilo que mais recentemente foi definido pelo termo “bizantino” ou
“constantinapolitano”, em conformidade com as modernas histórias da arte (v. Luigi Grassi
& Mario Pepe. Dizionario Dei Termini Artistici. TEA. Milano, 1994, p. 496). Panofsky, por
exemplo, propõe, a partir de Vasari, um léxico para os termos “maneira grega”, “maneria
velha”, “antigo” e “moderno”. Cf. E. Panofsky. Renascimento e Renascimentos na Arte
Ocidental. Editorial Presença, Lisboa, 1960, p. 60-61: “(...) Plenamente consciente duma
tal confusão e declarando explicitamente a sua intenção de ajudar os seus leitores a
melhor compreenderem a diferença entre vecchio e antico, Vasari forjou uma terminologia
algo incômoda mas não isenta de coerência. Assim, segundo ele, a expressão maniera
vecchia ( “estilo fora de moda”) deveria ser aplicada somente ao estilo dos greci vecchi e
non antichi (“os Gregos que pertenceram ao passado, mas não à antiguidade”),
equivalendo ao que nós chamamos estilo bizantino ou bizantinizante. A expressão
maniera antica (“estilo antigo”) deveria limitar-se à la buona maniera greca antica (“o bom
estilo grego antigo”), equivalendo ao nós chamamos clássico (...) E para distinguir a arte
da sua época quer do estilo “antiquado” da Idade Média, quer do “estilo clássico” da
Antiguidade, Vasari propõe que se lhe aplique o termo até então reservado para a arte da
Idade Média, ou seja, o termo moderno. Segundo a terminologia de Vasari, pois, tal
palavra já não denota um estilo oposto à “buona maniera greca antica”mas, ao contrário,
a “buona maniera greca antica” revivida, em contraste com a própria “buona maniera
greca antica”. Frequentemente acompanhado por epítetos como “bom” ou “glorioso”
(buona maniera moderna, il moderno si glorioso), o termo “moderno” torna-se, em geral,
sinônimo do estilo do “Renascimento” enquanto oposto ao estilo da Idade Média; (...)”. Em
Vidas, Giorgio Vasari faz uso de um artificio retórico, investindo a figura do mosaicista

4
era, na Etrúria, de grandíssima fama. Giotto tornou-se grande na arte da pintura.
10

[3] [Giotto] trouxe a arte nova, 11 abandonou a rudeza dos Gregos, sobrelevou-se
excelentissimamente na Etrúria. E fez egregíssimas obras, especialmente na

grego Apolônio como exemplum da divulgação da arte constantinapolitana sobre a arte na


época de Cimabue e Andrea Taffi. Cf. Giorgio Vasari, op. cit., (Vita di Cimabue) p.101:
“(...) Avvenne che in que’ giorni erano venuti di Grecia certi pittori in Fiorenza, chiamati da
chi governava quella città non per altro che per introdurvi l’ arte della pittura, la quale in
Toscana era stata smarrita molto tempo (...) Fu aconcio con non sua piccola satistazione
alla arte della pittura con que’ maestri e, di continuo esercitandosi, in poco tempo la natura
lo auitò talmente, che passò di gran lunga di diesgno e di colorito e’ maestri che
gl’insegnavano (...) et ancora che egli imitassi i greci, lavorò assai opere nella patria sua
onorando quella con le fatiche che vi fece, et acquestò a se stesso nome et utile certo
grandissimo. Ebbe costui per compagno et amico Gaddo Gaddi, il quale attese alla pittura
con Andrea Taffi domestico suo, e levò da la pittura gran parte della maniera greca nelle
figure dipinte da lui (...)”. Cf. Giorgio Vasari, op.cit., (Vita di Andrea Taffi), p. 109: “(...) Or
essendo il musaico, per la perpetuità delle memorie, più che l’altre pitture stimato da gli
uomini, si partí da Fiorenza Andrea, et a Vinegia se n’andò, dove alcuni pittori greci
lavoravano in San Marco opere di musaico; e con essi pigliando dimestichezza, con
prieghi, con danari e con promesse, di maniera operò, che a Fiorenza condusse un
maestro Apollonio pittor greco, il quale gli insegnò cuocere i vetri del musaico e fare lo
stucco di quello, et in compagnia con Andrea lavorò, nella tribuna di San Giovanni, la parti
di sopra, dove sono le Potestà, i Troni e le Dominazioni (...)”.Ainda sobre a “maneira
antiga” e a “maneira velha” há uma breve distinção em Holanda, op.cit., XI, p. 79: “Ha ahi
grande deferença entre o antigo, o que é muitos annos antes que nosso Senhor Jesu-
Cristo encarnasse, na monarchia de Gretia e tambem na dos romãos e entre o antigo a
que eu chamo velho, que são as cousas que se fazião no tempo velho dos reyes de
Castella, e de Portugal, jazendo a boa pintura inda na cova. Porque aquelle primeiro
antiguo é o eicellente e elegante, e este velho é o pessimo e sem arte. E o que hoje e
pinta, onde se sabe pintar, que é somente em Italia, podemos lhe chamar tambem antigo,
sendo feito hoje em este dia (...)”.
10 Há uma versão mais detalhada da história na qual Cimabue encontra e ensina Giotto
em Vidas, de Vasari. Cf. Giorgio Vasari, op.cit., p. 118: “(...) E così avenne che un giorno
Cimabue, pittore celebratissimo, transferendosi peralcune sue occorrenze da Fiorenza,
dove egli era in fran pregio, trovò nella villa di Vespignano Giotto, il quale, in mentre che le
sue pecore pascevano, aveva tolto una lastra piana e pulita e, con un sasso un poco
apuntato, ritraeva una pecora di naturale, senza essergli insegnato modo nessuno altro
che dallo estinto della natura. Per il che fermatosi, e grandissimamente maravigliatosi, lo
domandò se volesse star seco. Rispose il fanciullo che, se il padre suo ne fosse contento,
ch’egli contentissimo ne sarebbe. Laonde domandatolo a Bondone con grandissima
instanzia, egli di singular grazia glielo concesse. Et insieme a Fiorenza inviatisi, non solo
in poco tempo pareggiò il fanciullo la maniera di Cimabue, ma ancora divenne tanto
imitatore della natura, che ne’ tempi suoi sbandí affatto quella greca goffa maniera, e
risuscitò la moderna e buona arte della pittura, et indrodusse il ritrar di naturale le persone
vive, che molte centinaia d’anni non s’era usato. (...)”.

5
cidade de Florença e em muitos outros lugares, e teve muitosdiscípulos, todos
eles doutos, êmulos dos antigos Gregos. Viu Giotto na arte aquilo que os outros
não lhe acrescentaram. Trouxe a arte natural e com ela a gentileza, não saindo
das medidas. 12 Foi peritíssimo em toda a arte, inventor e achador 13 de muita
doutrina, que ficara sepultada por cerca de seiscentos anos. 14

11 Cf. Giovanni Bocaccio, Il Decamerone. Decima Edizione Integra, con prefazione e


glossario di Angelo Ottolini. Milano, Editore Ulrico Hoepli, 1992, giornata sesta, novella
quinta, p. 388: “(...) E l’altro, il cui nome fu Giotto, ebbe uno ingegno di tanta eccellenzia,
che niuna cosa dà la natura, madre di tutte le cose e operatrice col continuo girar de’cieli,
che egli con stile e con la penna o col pennelo non dipignesse sì simile a quella, che non
simile, anzi più tosto dessa paresse; in tanto che molte volte nelle cose da lui fatte si
truova che il visivo senso degli uomini vi prese errore, quello credendo esser vero che era
dipinto. E per ciò, avendo egli quella arte ritornata in luce che molti secoli, sotto gli error
d’alcuni che più a dilettar gli occhi degl’ignoranti che a compiacere allo ‘ntelletto de’savj
dipignendo, era stata sepulta, meritamente una delle luci della fiorentina gloria dir si puote;
(...)”.
12 O termo “gentileza” é genérico, qualificando positivamente tanto o ânimo do artista, a
amabilidade, a delicadeza, quanto a aparência das obras. Por exemplo, no Libro dell’ arte
de Cennino Cennini (de fins do século XIV) encontramos a sentença: “_ Non senza
cagione d’animo gentile alcuni si muovono di venire a questa arte, piacendoli per amore
naturale. Lo intelletto al disegno si dilletta solo, che da loro medesimi la natura a ciò gli
trae, senza nulla guida di maestro, per gentilezza di animo: e per questo diletarsi,
seguitano a voler trovare maestro e con questo si dispongono con amore d’ubbidienza,
stando in servitù per venire a perfeizione di ciò” (cap. II). Em Plínio, evidenciam-se
algumas ocorrências (por exemplo, nas histórias sobre Lisipo, Parrásio e Apeles) em que
a gentileza é refrida em relação a obras mais esbeltas, ou feitas com proporcionalidade,
symmetria, ou providas de charis, graciosidade, e, portanto mais agradáveis à vista.
Sobre Lisipo, cf. Pline L’Ancien, op.cit., XXXIV, XIX, 65, p. 129-130: “(...) Statuariae arti
plurimum traditur contulisse capillum exprimendo, capita minora faciendo quam antiqui,
corpora graciliora siccioraque, per quae proceritas signorum maior uideretur. Non habet
Latinum nomem symmetria, quam diligentissime custodit, noua intactaque ratione
quadratas ueterum staturas permutando, uulgoque dicebat ab illis factos quales essent
homines, a se quales uiderentur esse. Propriae huius uiderentur esse argutiae operum
custoditae in minimus quoque rebus (...)”. Sobre Parrásio, cf. Pline L’Ancien, op. cit.,
XXXV, XXXVI, 67, p. 66: “(...) Parrhasius Ephesi natus et ipse multa contulit. Primus
symmetrian picturae dedit, primus argutis uoltus, elegantiam capili, uenustatem oris,
confessione artificum in linnis extremis palmam adeptus. Haec est picturae summa
suptilitas. Corpora enim pingere et media rerum est quidem magni operis, sed in quo multi
gloriam tulerint; extrema corporum facere et desinentis picturae modum includere rarum in
successu artis inuenitur.” Sobre Apeles, cf. Pline L’Ancien, op. cit., XXXV, XXXVI, 79, p.
70-71: “(...) Praecipua eius in arte uenustas fuit, cum eadem aetate maximi pictores
essent; quorum opera cum admiraretur, omnibus conlaudatis deesse illam suam uenerem
dicebat, quam Graeci uocant τάξιζ; cetera omnia contigisse, sed hac sola sibi neminem
parem.”

6
Quando a natureza quer conceder alguma coisa, concede-a sem nenhuma
avareza. Este[Giotto] foi copioso em todas as coisas, laborou com afresco sobre

13 O termo “invenção”, do latim inventio, é sinônimo de achado. Portanto, a expressão _


fu inventore e trovatore di tanta dottrina (Morisani, p. 33) pode ser entendida como
pleonástica, pois reforçativa do louvor feito à arte e ao engenho de Giotto.
14 A comparação dos pintores antigos, excelentes, com os pintores modernos, que
emulando-os, ultrapassam-nos, após uma idade em que a arte esteve em declínio, é
retomada aqui em correspondência com a história dos iIustres florentinos publicada por
Filippo Villani por volta de 1400. Embora não possamos afirmar uma relação de Ghiberti
com Villani, observamos a correspondência dos discursos principalmente na tópica do
louvor às artes e aos artistas no gênero história. Cf. Phillippi Villani. De Origine Civitatis
Florentie Et De Eiusdem Famosis Civibus. Ed. Par Giuliano Tanturli. Padova, Editrice
Antenore, 1997, XXVI, p.411-412: “(1) Vetustissimi qui res gestas conspicue descripssere
pictores optimos, ymaginum atque statuarum scultores cum aliis famosis viris suis
voluminibus miscuerunt. (2)Poete quoque vetustissimi Promethey ingenium diligentiamque
mirati, ex limo terre eum fecisse hominem fabulando finxerunt. (3) Extimaverunt, ut
coniector, viri prudentissimi nature ymitatores, qui conarentur ex lapidibus et ere hominum
effigies fabricare, non sine nobilissimi ingenii singularisque memorie bono ac delicate
manus docilitate tanta potuisse. (4) Igitur inter illustres viros eorum annalibus Zeusim,
Policretum, Phydiam, Prasitelem, Mironem, Appellem, Conon et alios huiuscemodi artis
insingnes indiderunt. (5) Micchi quoque fas sit hoc loco, irridentium pace dixerim, egregios
pictores florentinos inserere, qui artem exanguem et pene extinctam suscitaverunt. (6)
Inter quos primus Iohannes, cui congnomento Cimabue nomem fuit, antiquatam picturam
et a nature similitudine pictorum inscitia pueriliter discrepantem cepit ad nature
similitudinem quasi lascivam et vagantem longius arte et ingenio revocare. (7) Constat
siquidem ante hunc grecam latinamque picturam per multa secula sub crasse peritie
ministerio iacuisse, ut plane ostendunt figure et ymagines que in tabulis atque parietibus
cernuntur sanctorum ecclesias adornare. (8) Post hunc, strata iam in nivibus via, Gioctus,
non solum illustris fame decore antiquis pictorius conparandus, sed forte arte et ingenio
preferendus, in pristinam dignitatem nomenque maximum picturam restituit. (9) Huius enim
figurate radio ymagines ita liniametis nature conveniunt, ut vivere et anelitum spirare
contuentibus videantur, exemplares etiam actus gestsque conficere adeo proprie, ut loqui,
flere, letari et alia agere non sine delectatione contuentis et laudantis ingenium manumque
artificis prospectentur, extimantibus multis, nec stulte quidem, pictores non inferiores
ingenii his quos liberales artes fecere magistros, cum illi artium precepta scriptis
demandata studio et doctrina percipiant, hii solum ab alto ingenio tenacique memoria que
in arte sentiant mutuentur. (10) Fuit Giotthus, seposita arte picture, vir mangni consilii et
qui multarum rerum usum habuerit, ystoriarum insuper notitiam plenam; ita poesis extitit
emulator, ut pingere que illi fingere subtiliter considerantibus perpendatur. (11) Fuit etiam,
ut viro decuit prudentissimo, fame potius quam lucri cupidus, unde ampliandi nominis
cupidine per omnes fere Ytalie civitates famosas locis spectabilibus aliquid pinsit
Romeque presertim in foribus ecclesie Sancti Petri trans Tiberi, ubi ex musibo periclitantes
navi apostolos artificiosissime figuravit, ut confluenti orbi terraru as urbem indulgentiarum
temporibus e se arteque sua spetaculum faceret. (12) Pinxit insuper speculorum suffragio
semetipsum sibique contemporaneum Dantem in tabula altaris capelle Palatii Potestatis.
(13) Ab hoc viro laudabili, velud a fonte abundantissimo et sincero picture, rivuli nitidissimi
defluxerunt, qui novatam emulatricem nature picturam pretiosam placidamque conficerent.
(...).”

7
parede, laborou com óleo em tábua. 15 Elaborou o mosaico da nave de São Pedro
em Roma 16 ; pintou com a própria mão 17 a capela e a tábua de São Pedro, em
Roma 18 . Pintou muito egregiamente a sala do rei Humberto com homens
famosos, em Nápoles; pintou no Castelo do Ovo. 19 Pintou na igreja, isto é, tudo
nela é de sua mão, na Arena de Pádua. É de sua mão uma Glória Mundana. 20 E
no Palácio da Parte 21 há uma história da fé cristã e muitas outras coisas havia no
referido palácio. Pintou na igreja de Assis, na Ordem dos Frades Menores, quase

15 A execução de pintura sobre tábua, que a distingue das feitas em parede e linho, é
referida frequentemente em Plínio. Cf. Pline L’Ancien, op.cit., XXXV, XXXVI, 77, p. 69-70:
“(...) Huius auctoritate effectum est Sicyone primum, deinde in tota Graecia, ut pueri
ingenui omnia ante graphicen, hoc est picturam in buxo, docerentur recipereturque ars ea
in primum gradum liberalium.” Cf. Pline L’Ancien, op.cit., XXXV, XXXVI, 92, p. 76: “(...)
Pinxit et Alexandrum Magnum fulmen tenentem in templo Ephesie Dianae uiginti talentis
auri. Digiti eminere uidentur et fulmen extra tabulam esse – legentes meminerint omnia ea
quattuor coloribus facta - ; manipretium eius tabulae in nummo aureo mensura accepit,
non numero.”
16 O mosaico para a Navicella, encomendado pelo cardeal Stefaneschi, e executado por
volta de 1298, foi uma das obras mais célebres de Giotto. Cf. Giorgio Vasari, op.cit., p.
122: “(...) Fu di sua mano la nave del musaico, fatta sopra le tre porte del portico, nel
cortile di San Pietro, la quale fu maravigliosa, et in quel tempo di tal disegno, d’ordine e di
perfezzione, che le lode universalmente datele da gli artefici e da altri intendenti ingegni
meritamente se le convengono.”
17 Na frase “_ e di sua mano dipinse la cappella e la tavola di san Pietro in Roma”
(Morisani, p. 33), a expressão “pintar com a própria mão” louva a execução da obra toda,
à diferença das obras em que muitos colaboram.
18 Em Vidas, de Vasari há menção da pintura da tribuna de São Pedro e não de tábua.
Cf. Giorgio Vasari, op.cit., p. 122: “(...) Fecelo dunque il predetto papa venire a Roma,
onorandolo grandemente e con premi riconoscendolo, dove fece la tribuna di San Pietro et
uno angelo di sette braccia, dipinto sopra l’organo, e molte altre pitture (...)”.
19 Há uma passagem mais extensa sobre esta história em Vidas de Vasari. Cf. Giorgio
Vasari, op.cit., p.123: “Ma per tornare a Napoli, fece Giotto nel Castello dell’Uovo molte
opere, e particolarmente la capella che molto piacque a quel re, dal quale fu tanto amato,
che si pigliava a piacere di vederlo lavorare e d’udire i suoi ragionamenti; (...).” Trata-se
aparentemente tanto em Ghiberti quanto em Vasari da Capela de Santa Bárbara pintada
no Castelo Novo e não no do Ovo.
20 Cf. Giorgio Vasari, op. cit., p.127: “Apresso, andato di nuovo a Padoa, oltre a molte
altre cose e capelle ch’egli vi dipinse, fece nel luogo dell’Arena una Gloria mondana, che
gl’arrecò molto onore e utile. (...).”
21 Provavelmente, jamais tenha existido um afresco de Giotto no Palácio de Parte Guelfa,
em Florença, lugar que pode ter sido confundido com o Palácio da Razão, em Pádua. Cf.
Giorgio Vasari, op.cit., p.120: “(...): e nel palazzo della Parte Guelfa di Firenze, é di sua
mano una storia della fede cristiana in fresco dipinta perfettamente;(...).”

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toda a parte de baixo. Pintou a Santa Maria dos Anjos, em Assis. Na Santa Maria
de Minerva, em Roma, pintou um crucifixo em uma tábua. 22

[4] Obras que por ele foram pintadas em Florença: pintou na abadia de Florença
23 , sobre a entrada da porta, em um arco, uma meia Nossa Senhora, com duas
figuras ao lado, muito egregiamente. Pintou a capela maior e a tábua. Na Ordem
dos Frades Menores, quatro capelas e quatro tábuas. Pintou muito
excelentemente em Pádua, nos Frades Menores. São doutíssimas nos Frades
Humilhados 24 , em Florença, onde havia uma capela, um grande crucifixo e quatro
tábuas feitas muito excelentemente: numa, havia a dormição de Nossa Senhora
com anjos e com doze apóstulos e Nosso Senhor em volta, feita muito
perfeitamente. Há ali uma tábua grandíssima com uma Nossa Senhora sentada
sobre um trono com muitos anjos à volta; vi 25 , sobre a porta que dá para o
claustro, uma meia Nossa Senhora com o menino no braço. E em São Jorge, uma
tábua e um crucifixo. Nos Frades Pregadores há um crucifixo e uma tábua
perfeitíssima de sua mão; ainda há ali muitas outras coisas. Pintou para
muitíssimos senhores. Pintou no Palácio de Podestá de Florença; em seu interior
fez a comuna sendo roubada 26 , e a capela de Santa Maria Madalena. Giotto
mereceu grandíssimo louvor. Foi digníssimo em toda a arte, também na arte
estatuária. As primeiras histórias que estão no edifício, que ele edificou, do
campanário de Santa Reparata foram por sua mão esculpidas e desenhadas; no

22 Nesta passagem, se apresenta o “topográfico”, que confirma a autoria, que é, por sua
vez, no discurso histórico de Ghiberti, constitutivo do louvor epidítico.
23 A obra de Giotto na abadia de Florença é comentada, além de Ghiberti, pelos
anônimos de Antonio Billi e de Magliabecchi.
24 Em Vasari, esta passagem está mais clara. Cf. Giorgio Vasari, op.cit., p. 125: “Dipinse
Giotto ai frati Umiliati d’Ognissanti di Firenze una capella e quattro tavole, e fra l’altre in
una la Nostra Donna con molti angeli intorno e col Figliuolo in braccio, et un Crucifisso
grande in legno; da ‘l quale Puccio Capanna, pigliando il disegno, molti per tutta Italia ne
lavorò, avendo presa molto la pratica e la maniera di Giotto (...).”
25 O uso da primeira pessoa no texto de Ghiberti se refere a um procedimento discursivo
em gênero epidítico. Nada impede, contudo, que se trate também de uma referência
topográfica.

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