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AMARANTE, P. D. C. Saúde mental, desinstitucionalização e novas estratégias de cuidado. In: GIOVANELLA, L., ESCOREL,
S., LOBATO, L. V. C., NORONHA, J. C., and CARVALHO, A. I., eds. Políticas e sistemas de saúde no Brasil [online]. 2nd ed.
rev. and enl. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2012, pp. 635-655. ISBN: 978-85-7541-349-4.
https://doi.org/10.7476/9788575413494.0023.
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Reconocimento 4.0.
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Este capítulo analisa as políticas de saúde mental no Brasil desde seu início até o mo-
mento presente, marcado pela desinstitucionalização no âmbito da loucura e do sofrimento
mental. Para tanto, desenvolve um resgate histórico das principais políticas e modelos as-
sistenciais, que vai da criação do primeiro hospício até os fundamentos dos projetos atuais
orientados pelos princípios da reforma psiquiátrica como processo social complexo. Fina-
liza com um detalhamento das diferentes propostas das redes de serviços e dispositivos de
atenção psicossocial e saúde mental e com uma análise de suas perspectivas e possibilidades.
A história da assistência às pessoas com problemas mentais no Brasil começa com a
fundação do primeiro hospital psiquiátrico brasileiro, o hospício criado pelo imperador
Pedro II na data de sua sagração e que leva o seu nome.
to, uma instituição efetivamente médica e sim de caridade, ora porque não fora construído
nos parâmetros adequados às necessidades da terapêutica moderna da alienação mental.
O conceito de alienação mental foi utilizado por Philippe Pinel, médico francês considerado o pai
da psiquiatria, em seu clássico Tratado Médico-Filosófico sobre a Alienação Mental ou Mania, a primeira
grande obra fundadora da especialidade.
O conceito de alienação se refere à ideia de um distúrbio das paixões que ocasiona um distúrbio
moral. Pinel foi também responsável pela consolidação da primeira proposta terapêutica para a
loucura: o tratamento moral (Pinel, 2007).
Em nosso meio, há uma obra clássica de um dos maiores escritores da língua portuguesa:
O Alienista, de Machado de Assis. O conto, publicado em forma de folhetim, elabora uma perspi-
caz e profunda crítica ao modelo da ciência psiquiátrica que, ainda hoje, se embaralha com seus
conceitos e dilemas mais fundamentais.
Para refletir
Leia O Alienista, de Machado de Assis, e a partir deste conto reflita sobre alguns conceitos e
questões. O que é normalidade? O que é loucura? Qual a relação entre normalidade e cultura?
O certo é que o Hospício de Pedro II abriu caminho para o surgimento de muitas ou-
tras instituições similares no país. A partir de então, e por quase 150 anos, pode-se resumir
a política nacional do setor como de mera implantação de hospitais psiquiátricos. Vejamos.
Em 1890, logo após a Proclamação da República, o Hospício de Pedro II foi desane-
Colônias de alienados
Instituições psiquiátricas
xado da Santa Casa e sua direção passou às mãos dos médicos. Além da criação da Assis-
que se baseavam no prin- tência Médico-Legal aos Alienados, primeiro órgão nacional de normatização e gestão da
cípio de que o trabalho assistência, foram instituídas as duas primeiras colônias de alienados, as colônias de São
seria uma forma eficaz
de tratamento moral da Bento e de Conde de Mesquita, ambas na ilha do Galeão, no Rio de Janeiro. Daí em diante,
alienação mental, uma foram dezenas de colônias agrícolas que passaram a existir em quase todos os estados da
vez que disciplinaria os federação, onde eram internadas milhares e milhares de pessoas com problemas mentais.
indivíduos que, por con-
ta da natureza de suas Para se ter uma ideia, a Colônia de Juquery (SP) alcançou a cifra das 15 mil vagas, ao passo
enfermidades, tinham as que a Colônia de Jacarepaguá (RJ) chegou a 8 mil.
mentes desregradas.
A noção de colônia já é suficiente para exprimir a proposta de uma modalidade única
de cultura: de colonização de um determinado tipo de pessoas, ligadas por uma origem
étnica, profissional, religiosa ou de uma natureza especial, como seria o caso dos alienados.
De qualquer forma, tal princípio expressa uma prática de segregação de sujeitos identificados
como loucos. No início do século XX, falava-se até mesmo em cidades destinadas somente
para os alienados: as cidades manicômios!
O aparecimento das colônias foi o que faltava para que o modelo asilar dominasse
definitivamente a assistência psiquiátrica no país até as décadas de 1940 e 1950. Daque-
políticos da ditadura.
Para refletir
Você conhece algum hospital psiquiátrico? Existe algum em sua cidade ou nas proximidades?
Conhece alguém que esteve internado em uma dessas instituições? A partir de sua experiência,
analise as características de um hospital psiquiátrico e compare-as com as de um hospital geral.
Para refletir
No livro Asylums, Erving Goffman elabora uma análise microssociológica de algumas instituições
fechadas, que ele denominou de totais, fundadas no isolamento e na gestão completa e absoluta
da vida dos internos. No Brasil, o livro foi publicado com o título Manicômios, Prisões e Conventos
(Goffman, 1974).
Você já havia identificado algumas semelhanças entre tais instituições? Caracterize algumas dessas
semelhanças.
Franco Basaglia aproveitou a vinda ao Brasil para realizar visitas a sindicatos e as-
Franco Basaglia (1922-
sociações, proferir palestras em universidades e institutos e manter um contato bastante
1980), psiquiatra ve-
próximo com os ativistas do MTSM, tornando-se, a partir de então, referência fundamental neziano que liderou os
na trajetória da experiência brasileira. processos de desinstitu-
cionalização em Gorizia
Logo no ano seguinte, ocorreram outros eventos muito importantes para o processo e Trieste, no norte da
de reforma psiquiátrica: o I Congresso Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental, o Itália, criou o Movimento
Psiquiatria Democrática
I Simpósio de Políticas de Saúde da Câmara dos Deputados e o III Congresso Mineiro de e inspirou a elaboração
Psiquiatria. O Congresso do MTSM aconteceu em janeiro de 1979, no Instituto Sedes Sapien- da lei da reforma psi-
quiátrica italiana, a lei
tiæ em São Paulo. Neste, depreende-se que a luta pela transformação do sistema de atenção
n. 180, que ficou conhe-
à saúde está vinculada à luta dos demais setores sociais em busca da democracia plena e de cida como a Lei Basaglia.
uma organização mais justa da sociedade, por meio do fortalecimento dos sindicatos e das Suas vindas ao Brasil, em
1978 e 1979, foram de ex-
demais associações representativas articuladas com os movimentos sociais. trema importância para
Já no Simpósio de Saúde da Câmara, o MTSM traçou um importante diagnóstico crí- os primeiros momentos
do processo brasileiro.
tico sobre o modelo assistencial psiquiátrico e algumas das reflexões e propostas que viriam Aqui, Basaglia proferiu
a marcar a atuação do movimento em toda a sua história. Neste mesmo simpósio, o Cebes praticamente suas últi-
apresentou a proposta do Sistema Único de Saúde (SUS), que seria base de inspiração da mas conferências, que
foram publicadas em vá-
Constituição de 88 e, consequentemente, da Lei Orgânica da Saúde (lei n. 8.080, de 19/9/90). rios países com o título de
Franco Basaglia retornou ao Brasil para o III Congresso Mineiro de Psiquiatria e “Conferências Brasileiras
de Franco Basaglia”.
visitou o Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, desencadeando uma crise de
denúncias sobre a assistência psiquiátrica no Brasil. A visita de Basaglia a Barbacena trouxe
muitos resultados marcantes, mas dois deles merecem destaque: o curta-metragem Em Nome
da Razão, obra de estreia do premiado cineasta Helvécio Ratton, e o também premiado livro
Nos Porões da Loucura, de Hiram Firmino.
Reforma psiquiátrica como processo social complexo: ruptura radical por uma
sociedade sem manicômios
Para refletir
Você já participou de alguma conferência de saúde? Tem ou teve informações sobre a existência
de alguma delas? Procure se informar em seu município.
e que introduziu, no Brasil, o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, além de instituir
o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, comemorado desde então na data de 18 de maio.
Falávamos de 1987. Aquele ano foi palco ainda de um terceiro fato que o tornou his-
tórico no processo da reforma psiquiátrica brasileira: a criação na cidade de São Paulo do
primeiro serviço de atenção psicossocial do país, o Centro de Atenção Psicossocial Professor
Luiz da Rocha Cerqueira, da Secretaria Estadual de Saúde, que passou a ser conhecido
simplesmente como Caps.
Trata-se do primeiro serviço que procurava constituir-se fora da lógica manicomial.
Ensaiava ações de inserção comunitária e iniciava propostas de atenção intensiva a pacientes
com quadros mais graves que, até então, eram atendidos predominantemente em hospitais
e, muito raramente, em ambulatórios, pois, como vimos, a rede hospitalar absorvia a quase
totalidade (97%) dos recursos financeiros destinados à assistência psiquiátrica. O Caps pas-
sou a realizar um dos mais importantes trabalhos assistenciais, tornando-se uma referência
nas políticas de saúde mental e um campo de formação estratégica de profissionais para o
processo da reforma psiquiátrica brasileira.
Mas os efeitos positivos dos tempos da democratização não acabaram por aí. Em
1988, foi promulgada a nova Constituição Federal com um capítulo dedicado à saúde,
Você conhece parágrafos
da Constituição Federal que passou a ser considerada “Direito de todos e dever do Estado”. Foi certamente uma
que se referem à saúde? vitória do movimento nacional de Reforma Sanitária – aí incluído o movimento da reforma
Consulte o capítulo 11.
psiquiátrica – que propôs uma emenda popular com os termos do SUS, cujas diretrizes
haviam sido consolidadas nos debates da 8a CNS.
Com a diretriz da descentralização estabelecida no SUS, o poder municipal passou a
ser o responsável pelo conjunto de instituições e políticas de saúde no âmbito do município.
Foi assim que, em 3 de maio de 1989, ocorreu um dos mais importantes acontecimentos
do processo de reforma psiquiátrica no Brasil: a intervenção realizada pela Prefeitura de
Santos (SP) em um hospital psiquiátrico privado conveniado ao SUS, a Clínica Anchieta,
onde ocorriam violências contra pacientes internados, assim como vários óbitos.
A partir dessa intervenção, duas opções do poder público municipal de Santos deram
Sobre as bases concei-
início a uma verdadeira revolução na questão do tratamento da loucura no país. A primeira
tuais e históricas da ex- opção foi a decisão de não reformar o hospital. Ou seja, de não seguir pelo caminho das
periência italiana, ver reformas administrativas, como ocorria anteriormente, nas quais, após situações desta na-
especialmente Desinsti-
tucionalização, de Franco tureza, procurava-se readequar a instituição aos parâmetros considerados terapêuticos ou
Rotelli, Diana Mauri e aceitáveis. Ao contrário, partiu-se do princípio de que o hospital psiquiátrico, por sua natu-
Ota de Leonardis (1990),
Escritos Selecionados em
reza e função social, era uma instituição de violência e segregação. Tais eventos de agressão
Saúde Mental e Reforma à dignidade humana, longe de serem crises eventuais, eram bastante comuns e mesmo
Psiquiátrica, coletânea de inerentes ao modelo institucional. Em segundo lugar, tendo como base a experiência de
textos de Franco Basaglia
(2005), e Jardins de Abel: Trieste (Itália), iniciada por Franco Basaglia e continuada por Franco Rotelli, decidiu-se por
desconstrução do manicômio atuar no sentido da desconstrução do manicômio, entendido não apenas como o hospital
de Trieste, de Denise Dias
Barros (1994).
psiquiátrico em si, mas como todas as referências conceituais e ideológicas produzidas no
âmbito do saber psiquiátrico em torno do conceito de doença mental.
Desconstrução do manicômio
A noção de desconstrução não diz respeito a uma ideia negativa, de destruição, mas sim de des-
montagem da lógica teórico-conceitual e institucional de determinados saberes e práticas, e implica
a reconstrução de formas de lidar com o problema. Quando nos referimos à desconstrução do
manicômio, falamos da desmontagem de toda a lógica institucional, política, jurídica, ideológica,
social e cultural que se constituiu em torno de um determinado conceito que, no caso da psiquiatria
e do manicômio – sua mais importante e expressiva instituição –, é o conceito de doença mental
como sinônimo de perda de razão.
um vigoroso e criativo projeto cultural, o Projeto TAM TAM, com rádio e TV comunitária; Usuário
uma residência para ex-internos do hospital que, por alguma razão, não tivessem condições Este termo passou a ser
próprias de moradia; e uma cooperativa de trabalho, para geração de renda para os usuários. adotado pelo SUS para
designar os beneficiários
A experiência santista se tornou a mais importante do processo de reforma psiquiá- desse sistema, mas assu-
trica no Brasil, tendo uma enorme repercussão, e não apenas no circuito da saúde: toda miu um valor muito parti-
cular no âmbito da saúde
a grande imprensa divulgou e debateu a experiência, dando, à questão psiquiátrica, uma mental, por possibilitar o
dimensão pública até então nunca vista. Sobre essa experiência, Florianita Braga e Cláudio abandono da expressão
Maierovitch (2000) organizaram o livro Contra a Maré à Beira-Mar: a experiência do SUS em ‘paciente’, considerada
negativa e pejorativa,
Santos, que retrata não apenas a política de saúde mental, mas toda a proposta de saúde do para os sujeitos em sofri-
município de Santos (SP), uma das pioneiras e mais avançadas do SUS. mento mental.
a reproduzir novas possibilidades no trato com a questão do sofrimento mental. E há, ainda,
o modo como o Estado vem incorporando essas inovações em forma de normas técnicas que
constituem políticas de transformação do modelo de saúde mental.
O Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH) foi uma das
medidas que introduziram uma reversão significativa no modelo assistencial. Instituído pela
portaria n. 251/GM, de 31 de janeiro de 2002, o PNASH foi um dispositivo fundamental
na redução dos leitos psiquiátricos ao estabelecer diretrizes e normas para a assistência hos-
pitalar em psiquiatria, reclassificar os hospitais psiquiátricos e definir e estruturar a porta
de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS. Atualmente, no país todo, o
número de leitos psiquiátricos é inferior a 50 mil. Nesse processo de redução dos leitos,
merece destaque a atuação dos ministérios públicos estaduais que, a partir de ocorrências
de óbitos e violências em hospitais psiquiátricos, têm impetrado medidas substanciais para
a reversão do modelo.
Embora seja evidente, muitos autores ligados aos setores conservadores da psiquia-
tria (dentre os quais muito particularmente os da psiquiatria privada com seus 55 mil
leitos de então) alarmavam a sociedade com a ideia de que os leitos estavam sendo fe-
chados e a população, agora desassistida, estava sendo abandonada nas ruas. Ao contrá-
rio, desde a experiência pioneira de Santos, onde foi construída a primeira moradia para
egressos do hospital (denominada República Manequinho), debatia-se a necessidade de
dispositivos residenciais para os internos desmanicomializados. Seja porque não têm
famílias ou porque as famílias não têm condições de aceitá-los (ou não os querem mais
em casa), seja até mesmo porque alguns usuários não querem conviver com seus familia-
res, os dispositivos residenciais, ou formas e estratégias de residencialidade, vêm sendo
propostos no âmbito do processo da reforma psiquiátrica desde o final dos anos 70.
No Relatório Final da II Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em dezembro
de 1992, foi ressaltada a importância dos “lares abrigados”, expressão adotada na época.
Assim, foram promulgadas a portaria n. 106/2000, que introduziu os “Serviços residen-
ciais terapêuticos” para egressos de longas internações, e a portaria n. 1.220/2000, que
regulamentou a anterior no sistema de financiamento do SUS.
O Ministério da Saúde considera que foi necessário denominar esses dispositivos de
“serviços” e de “terapêuticos”, para que pudessem ser financiados pelo SUS. Em todo caso,
é importante observar que todo o cuidado é pouco na implantação e condução das residên-
cias, na medida em que efetivamente não devem ser serviços e muito menos terapêuticos.
A soma desses dois elementos, serviços e terapêuticos, aponta para o risco de instituições
totais, que assumem o caráter de instituições disciplinares que se propunham reeducado-
ras dos indivíduos nelas internados. É o caso dos reformatórios, das casas de correção, dos
educandários normais e dos manicômios (berço do tratamento moral).
Observados os riscos e as possíveis dificuldades daí advindas, as residências de egressos
de hospitais psiquiátricos vêm representando um ponto de grande avanço no processo de
reforma psiquiátrica, um recurso ímpar no processo de desinstitucionalização. Em 2011,
registram-se 596 residências, onde moram em torno de três mil pessoas. Apesar do impacto
dessa política na desmanicomialização, fica claro que não deve ser o único recurso adotado.
Muitas famílias aceitaram seus parentes com muita generosidade e alegria. Não é verdade
que as famílias sempre os rejeitam. São filhos e filhas, pais e mães, maridos e esposas...
O mito da recusa ao retorno à casa foi construído pela psiquiatria, com invejável colabora-
ção dos empresários, donos de hospitais, que lucram com as hospitalizações prolongadas
ou permanentes. Além disso, foi instituído o programa De Volta para Casa, de incentivo
à desmanicomialização e integração social dos egressos dos hospitais psiquiátricos. O pro-
grama instituiu o auxílio-reabilitação psicossocial para pacientes acometidos de transtornos
mentais egressos de internações, possibilitando um benefício em dinheiro para usuários
e suas famílias. O programa foi instituído pela lei n. 10.708, de 31 de julho de 2003, e em
julho de 2011 contava com 3.832 participantes (Brasil, 2011).
Em relação aos serviços de atenção psicossocial, logo após o surgimento do Caps Luiz
Cerqueira e dos Núcleos de Atenção e Promoção à Saúde (Naps) de Santos, muitos outros
serviços passaram a ser criados, com destaque para os Centros de Referência em Saúde
Mental (Cersam), implantados no estado de Minas Gerais.
Com as perspectivas abertas por esses serviços pioneiros, em 19 de novembro de 1991
o Ministério da Saúde promulgou a portaria n. 189 e, em 29 de janeiro de 1992, a portaria
n. 224, que estabeleceram e regulamentaram os novos procedimentos em assistência psi-
quiátrica e atenção psicossocial. Ou seja, além das consultas ambulatoriais e das internações
psiquiátricas, passaram a ser possíveis os atendimentos em serviços de atenção psicossocial
(denominados igualmente de Naps/Caps), em hospitais-dia, em oficinas terapêuticas, entre
outros. Apesar do valor inegável dessas portarias, a concepção impressa nesses documentos
termina por limitar a criatividade e a complexidade dos serviços de atenção psicossocial.
Uma consequência dessa orientação se reflete na redução conceitual e na mobilidade
e flexibilidade dos serviços, ao desconsiderar as diversidades das modalidades e naturezas
das experiências nas quais as portarias se basearam. O Caps, que serviu de inspiração para a
normatização, surgiu em um período anterior ao SUS, não vislumbrando, à época, exercer
uma intervenção de base fundamentalmente territorial, nem se propondo a se tornar um
serviço substitutivo ao modelo psiquiátrico tradicional. Já os Naps eram serviços que funcio-
navam em rede, interligados às demais políticas e estratégias públicas e sociais, e tinham uma
proposta de intervenção intersetorial mais articulada às iniciativas da comunidade – enfim,
se propunham como estratégia substitutiva.
Em 2002, foi promulgada a portaria n. 336, que estabeleceu uma nova regulamentação
dos serviços de atenção psicossocial. Foi abandonada a sigla Naps e todos os serviços dessa
natureza passaram a ser denominados Caps, sendo classificados a partir de então em três
categorias de modalidades distintas, como é possível constatar no Quadro 1.
Em julho de 2011, o número total de Caps no país chegou a 1.650, dos quais 780 da
modalidade Caps I; 420, Caps II; 55, Caps III; 262, Caps-ad; e 132, Caps-i. No sentido
de monitorar o processo de reversão do modelo assistencial, é importante assinalar que o
número de leitos em hospitais psiquiátricos continuou a diminuir: passou de 51.393, em
2002, para 32.681, em julho de 2011 (Boletim Informativo da Raps, 2012).
O objetivo é que os Caps funcionem articulados em rede, não apenas entre si, isto é,
em rede inter-Caps, mas, e fundamentalmente, em rede com outros serviços sanitários (de
saúde mental e saúde em geral) e em rede com outros serviços e dispositivos não sanitários.
Ou seja, que possam atuar articulados intersetorialmente com projetos oriundos da área da
educação, da cultura, do transporte, entre tantos outros produzidos no âmbito dos vários
setores das políticas públicas. E não apenas das políticas públicas, mas também das iniciativas
que vêm da sociedade com seus vários recursos e possibilidades.
Tipos e Dias de
População do Horário de
modalidades funcionamento na Clientela
município funcionamento
de Caps semana
Entre 20.000 e
Caps I 8h às 18h Segunda a sexta Adultos
70.000 hab.
8h às 18h
Entre 70.000 e
Caps II Pode ter um terceiro Segunda a sexta Adultos
200.000 hab.
período até 21h
8h às 18h
Acima de Crianças e
Caps II-i Pode ter um terceiro Segunda a sexta
200.000 hab. adolescentes
período até 21h
8h às 18h Pessoas com uso
Acima de
Caps II-ad Pode ter um terceiro Segunda a sexta abusivo de álcool
100.000 hab.
período até 21h e outras drogas
Diariamente,
Acima de
Caps III 24 horas inclusive nos feriados Adultos
200.000 hab.
e fins de semana
Para refletir
Você tem informação sobre a existência de algum Caps em sua cidade? Ou melhor, já conheceu
algum? Procure identificar uma dessas experiências e vá visitá-la. Se você também conhece algum
hospital psiquiátrico, aproveite para comparar as duas modalidades de assistência.
Praças
Vizinhos
Esportes
Família
Associações
e/ou
cooperativas
Escola
Associações
de bairro Trabalho
Além das várias atividades realizadas no interior de um Caps (oficinas de arte e trabalho,
atendimentos individuais e/ou em grupo aos usuários e aos seus familiares, dentre outras),
o maior potencial de sua capacidade substitutiva está na sua ação no território, seja na pos-
sibilidade de ativar atores e recursos comunitários em função dos objetivos e estratégias de
inclusão e integração social (atividades culturais, esportivas, de lazer, de trabalho), seja na
transformação da cultura da comunidade em relação à loucura e aos sujeitos em sofrimento
mental. Um bom exemplo de trabalho com famílias em um Caps pode ser encontrado em
Família e Doença Mental: repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares, de Jonas
Melman (2001).
da psiquiatria tradicional. Lancetti entende ainda que a saúde mental na saúde da família
possibilita um processo que pode ser denominado de complexidade invertida. Explicando:
na saúde, de uma maneira geral, a assistência é oferecida em graus crescentes de complexi-
dade, isto é, vai dos cuidados mais básicos (atenção básica) ou primários (atenção primária)
até os níveis mais sofisticados (assistência médico-cirúrgica hospitalar hiperespecializada).
Ao contrário, o nível hospitalar na psiquiatria é o que dispõe do tratamento mais elemen-
tar, o mais padronizado e menos individualizado: eletrochoques como medidas punitivas,
celas-fortes, proibições, coquetéis de medicamentos que atuam no sistema nervoso central,
intolerâncias, violências etc. É no âmbito do território que as ações são mais complexas,
mais voltadas para os sujeitos e suas famílias, pois devem contribuir para que as mesmas
modifiquem sua maneira de relacionar-se com o usuário, tomar decisões a esse respeito,
orientar os vizinhos, participar das decisões da comunidade, mudar a cultura em relação
aos problemas mentais.
Embora ainda não existam muitas publicações sobre a relação saúde mental e saúde da
família, a coletânea SaúdeLoucura 7 (2002), organizada por Lancetti, e o livro Saúde Mental
na Saúde da Família: subsídios para o trabalho assistencial, de Alice Bottaro de Oliveira, Marcos
Antônio Vieira e Socorro Andrade (2006) são referências que auxiliam suficientemente a
compreensão dos principais aspectos envolvidos.
de sigilo nas informações prestadas; ter direito à presença médica, em qualquer tempo,
para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; ter livre acesso aos
meios de comunicação disponíveis; receber o maior número de informações a respeito de
sua doença e de seu tratamento; ser tratados em ambiente terapêutico pelos meios menos
invasivos possíveis; ser tratados, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde
mental, entre outros.
Outro ponto importante da lei é a obrigatoriedade de o responsável técnico do es-
tabelecimento comunicar, ao Ministério Público Estadual (MPE), a internação psiquiátrica
involuntária. Essa inovação passou a produzir efeitos muito interessantes ao envolver o MPE
nas atividades e responsabilidades de proteção das pessoas em sofrimento mental.
O Presidente da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta
Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação
sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de
gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou
responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste
artigo.
Considerações finais
A reforma psiquiátrica brasileira vem sendo constituída com base na noção de pro-
cesso social complexo, que permite, entre outros aspectos, superar a ideia de uma simples
reorganização do modelo assistencial, fato que ocorreu em outras experiências europeias e
na norte-americana de reforma psiquiátrica. Assumir a noção de processo social complexo
significa dizer que não existe o processo ou um só processo de reforma psiquiátrica, mas
processos, na medida em que são ocorrências locais e históricas, com atores sociais e con-
junturas específicas, singulares e diferenciadas. Além disso, a ideia de processo leva a pensar
em movimento, com permanente renovação de atores, conceitos e princípios.
Assim, um processo social complexo implica várias dimensões simultâneas e interde-
pendentes. A primeira dessas dimensões é epistemológica, que remete a repensar, descons-
truir e reconstruir vários conceitos fundamentais do modelo científico, isto é, do paradigma
da psiquiatria. O principal conceito se refere ao objeto da ciência psiquiátrica: a alienação
mental (que posteriormente passou a ser denominada de ‘doença mental’ e, atualmente, de
‘transtorno mental’, mas, em última instância, todos com o mesmo significado: a perda da
razão!). Outro conceito em processo de desconstrução é o de cura, como ideia de correção,
ou de normatização proveniente do princípio da ‘normalidade’, como ideal teleológico,
sinônimo ora de perfeição, ora de felicidade.
A dimensão técnico-assistencial, ou seja, a dimensão que trata da organização e dos
princípios do cuidado, é absolutamente redefinida quando surge como consequência ou
associada à transformação na dimensão anterior. Exemplificando, no paradigma psiquiá-
trico, na medida em que ‘alienação mental’ é sinônimo de erro ou periculosidade, entre
outros significados negativos, o modelo assistencial é baseado, como vimos, na tutela, na
vigilância, na disciplina, no controle e na regeneração dos indivíduos. Foi dessa forma que
As características do cui- nasceu e floresceu o modelo asilar, manicomial, hospitalar da psiquiatria. Se na dimensão
dado ao doente crônico epistemológica esses significados forem desmontados conceitualmente, como reflexo na
são discutidas no capítu-
lo 32. Compare. dimensão técnico-assistencial, a organização de serviços se tornará voltada para o cuidado,
para o acolhimento, para a construção de espaços de escuta, de sociabilidade, de produção
de subjetividade, de vida, e não de controle e vigilância, ou de punição e segregação. Esse é
o princípio geral dos serviços de atenção psicossocial e das novas estratégias e dispositivos.
A terceira dimensão é a jurídico-política. Uma faceta dessa dimensão está calcada nos
aspectos legais que tratam do tema da loucura. Tanto o código civil quanto o penal são abso-
lutamente arcaicos na matéria da reforma psiquiátrica. Referem-se ainda a “loucos de todo
gênero”, à “irresponsabilidade civil” e a tantos outros aspectos discriminatórios, estigmati-
zantes e preconceituosos contra as pessoas em sofrimento mental. Mas a outra faceta – a da
política – pode conter grandes avanços, pois trata da questão das práticas de cidadania. Ou
seja, da possibilidade de construir espaços reais de produção de possibilidades de vida, tais
como cooperativas de trabalho ou projetos de geração de renda para pessoas com desvan-
tagem social (e não apenas com diagnósticos de transtorno mental), de construir programas
de participação e ingresso social, entre outras estratégias que viabilizem efetivamente a
participação cidadã de pessoas nas várias possibilidades da vida coletiva.
Por fim, há a dimensão sociocultural; ou seria esta uma dimensão que resultaria de
todas as demais? Pois, certamente, uma característica do processo brasileiro de reforma psi-
quiátrica é o forte investimento no campo sociocultural, com uma pluralidade de iniciativas
que contribuem para que a sociedade possa refletir sobre a questão da loucura e transformar
sua relação com ela e com as pessoas com ela identificadas.
Na atualidade, concordam autores e organismos internacionais, o processo brasileiro
de reforma psiquiátrica é um dos mais importantes e originais em todo o mundo. Em parte,
isso ocorre em consequência do próprio SUS. O funcionamento regular do SUS possibilita
que os militantes do processo de reforma psiquiátrica participem dos Conselhos Municipais
e Estaduais e do Conselho Nacional de Saúde e interfiram efetivamente nas políticas públicas
de saúde mental e atenção psicossocial.
Outro mecanismo de participação também muito importante são as Conferências de
Saúde Mental. Mas a ausência de uma periodicidade regular – como vimos, foram realiza-
das apenas quatro (1987, 1992, 2001 e 2010) desde a 8a CNS – enfraquece essa estratégia
democrática de controle e participação social. Por exemplo, após a 12a CNS, realizada em
dezembro de 2003, esperava-se que fosse convocada a IV Conferência Nacional de Saúde
Mental. Ao contrário, além de não ter sido convocada, foram realizados pelo SUS alguns
congressos nacionais de serviços com algumas características preocupantes. Uma delas, o fato
de serem congressos de técnicos, sem a participação paritária, prevista constitucionalmen-
te, de usuários e familiares como representantes da sociedade civil. Outra, o fato de serem
congressos especializados, isto é, dedicados exclusivamente a um tipo de serviço, fazendo
com que o aperfeiçoamento estivesse na dependência exclusiva de medidas científicas ou
administrativas oriundas do campo técnico. Finalmente, pelo fato de serem encontros de
serviços isolados, no momento em que toda a política de saúde estava voltada para a cons-
trução de redes, de intersetorialidade, de integralidade. A IV Conferência foi realizada
apenas em 2010, no final do governo, quando já se tornava pouco provável a viabilização
das propostas aprovadas.
Uma das forças mais expressivas do processo brasileiro de reforma psiquiátrica está
no fato de ser baseado em um forte e permanente movimento social, no qual se destacam o
Movimento Nacional de Luta Antimanicomial, que já realizou vários encontros nacionais,
com centenas de participantes, e as associações de usuários e familiares (existem dezenas
de associações dessa natureza) que já realizaram vários encontros municipais, estaduais e
nacionais, todos com ampla participação. Mais recentemente, surgiram novos atores sociais
que enriquecem ainda mais as políticas de saúde mental, como a Rede Nacional Internúcleos
da Luta Antimanicomial (Renila) e a Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme).
Esta última reúne não apenas profissionais das várias áreas inter/transdisciplinares que
caracterizam o campo da saúde mental, mas também os diversos militantes sociais e políticos
(usuários, familiares, militantes dos direitos humanos e outros). Além disso, ficaram muito
mais delimitados os atores sociais contrários ao processo de reforma psiquiátrica, como a
Associação Brasileira de Familiares de Doentes Mentais (AFDM), a Associação Brasileira
de Hospitais (ABH) e alguns segmentos da categoria médico-psiquiátrica e acadêmica.
O principal objetivo da reforma psiquiátrica é a possibilidade de transformação das
relações que a sociedade, os sujeitos e as instituições estabeleceram com a loucura, com o
louco e com a doença mental, conduzindo tais relações no sentido da superação do estigma,
da segregação e da desqualificação dos sujeitos ou, ainda, no sentido de estabelecer com a
loucura uma relação de coexistência, de troca, de solidariedade, de positividade e de cui-
dados. É o que se deseja para a nossa realidade.
Leituras recomendadas
AMARANTE, P. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. 3. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Editora
Fiocruz, 2011.
AMARANTE, P. (Coord.). Loucos pela Vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. 2. ed. rev. ampl.
Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2010.
BARROS, D. D. Jardins de Abel: desconstrução do manicômio de Trieste. São Paulo: Lemos, Edusp, 1994.
BASAGLIA, F. Franco Basaglia: escritos selecionados em saúde mental e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro:
Garamond, 2005. (Org. de Paulo Amarante).
BRAGA, F. & MAIEROVITCH, C. (Orgs.) Contra a Maré, à Beira-Mar: a experiência do SUS em Santos.
São Paulo: Hucitec, 2000.
LANCETTI, A. (Org.) Saúde Mental e Saúde da Família. São Paulo: Hucitec, 2002. (Coleção Saúde
Loucura 7)
MELMAN, J. Família e Doença Mental: repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares. São
Paulo: Escrituras, 2001.
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subsídios para o trabalho assistencial. Cuiabá: NESM, Olho d’Água, 2006.
ROTELLI, F.; MAURI, D. & DE LEONARDIS, O. Desinstitucionalização. São Paulo: Hucitec, 1990.
VIEIRA, M. C. T.; VICENTIN, M. C. G. & FERNANDES, M. I. A. (Orgs.) Tecendo a Rede: trajetórias da
saúde mental em São Paulo 1989-1996. Taubaté: Cabral Editora Universitária, 1999.
Sites de interesse
Associação Brasileira de Saúde Mental: www.abrasme.org.br
Inverso ONG em Saúde Mental: www.inverso.org.br
Política Nacional de Saúde Mental: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=925
Psiquiatria Democrática Italiana: www.psichiatriademocratica.com
Rede Exclusion Trieste: www.exclusion.net
Referências
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BOLETIM INFORMATIVO DA RAPS (REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL), n. 1, ano 1, jul./ago. 2012.
BRAGA, F. & MAIEROVITCH, C. (Orgs.) Contra a Maré à Beira-Mar: a experiência do SUS em Santos.
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a Política Nacional de Saúde Mental. Disponível em: <www.saude.gov.br/bvs/saudemental>. Acesso
em: 12 set. 2011.
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MACHADO, R. et al. Danação da Norma: medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil. Rio de
Janeiro: Graal, 1978.
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Paulo: Escrituras, 2001.
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subsídios para o trabalho assistencial. Cuiabá: NESM, Olho d’Água, 2006.
PINEL, P. Tratado Médico-Filosófico sobre a Alienação Mental ou a Mania. Porto Alegre: Editora da
UFRGS, 2007.
ROTELLI, F.; MAURI, D. & DE LEONARDIS, O. Desinstitucionalização. São Paulo: Hucitec, 1990.
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saúde mental em São Paulo 1989-1996. Taubaté: Cabral Editora Universitária, 1999.