PODRIGO LACERDA
Uma batalha navalPODRIGO LACERDA
Rodrigo Lacerda nasceu em 1969, no Rio de Janeiro, onde cresceu e vi-
veu até os 22 anos. Em 1991, jd casado, deixou o trabalho na Editora
Nova Fronteira e mudou-se para Sao Paulo, movido pelo objetivo de con-
cluir 0 curso de Histéria na Universidade de Sao Paulo (USP). Foi dessa
jungdo de literatura e pesquisa histérica que surgiu sua primeira obra O
Mistério do Ledo Rampante. Trabalhou na Edusp até final de 1995,
quando, apés o nascimento da filha, Clara, voltou para o Rio de Janeiro.
Seu livro de estréia foi bem recebido pela critica e Ihe rendeu dois prémios:
Certas Palavras, promovido pela Caixa Econémica Federal, e o importan-
te Prémio Jabuti de melhor romance. Com o feliz comego da carreira de
escritor, o segundo livro ndo demorou a ocupar as prateleiras. A Dinami-
ca das Larvas passa a limpo sua vasta experiéncia no mundo editorial e
consolida a posigdo do autor como parte da nova geragao de talentos li-
terdrios. Em 1999, lancou Tripé e atualmente é editor da Cosac & Naify,
onde é um dos organizadores da linha de literatura brasileira contempo-
ranea. “Exagerando um pouco, posso dizer que deixei de me preocupar
com as palavras e agora me preocupo com a emocao”, avisa o escritor aos
interessados em sua literatura.Estamos no século 17, tempo de reis, rainhas, nobres e piratas.
Sou um destes. Meu navio é 0 Cao Turbulento. Eu, 0 Cao. Minha fa-
ma de sanguinario, a maior. Abarbarado pelos cachagées da
fortuna, desconto no resto da humanidade todo meu édio e rancor.
Certo dia, num dos raros intervalos entre um e outro massacre,
Félix, meu imediato, apareceu-me anunciando a existéncia de um
pequeno navio a poucas horas de contato. Perguntei-Ihe se a viti-
ma era promissora.
~ Esta longe de ser presa de maior vulto, Capitao. Porém, seu
comportamento é peculiar. Embora seja impossivel que Ihe tenha-
mos passado despercebidos, nao ha qualquer sinal de que esteja
acelerando ou fugindo, como seria esperado, tendo em vista seu
renome e sua conhecida bandeira com a cara de cao.
— Talvez porque nao contenha nenhuma riqueza substantiva... —
argumentei.
— Nem a vida de seus homens?
Olhei-o intrigado. Achei por bem verificar. Da proa de meu navio,
constatei que a embarcacao era de fato misteriosa. A principio, pa-
recia uma canhoneira, um reles navio de vigilia, de pequena
envergadura e um s6 mastro. Nem isto deveria ser, contudo, pois
no apresentava qualquer canhao, nem no convés superior, nem
nas aberturas da borda-livre. Além do mais, nenhuma bandeira 0
identificava e, por seu porte acanhado, nenhum corsdrio compa-
nheiro de trabalho o teria por condugao ou vaso de guerra. No
entanto, nao fugia de nés.
Por curiosidade, decidi largar a meio pano, dando caga a embar-
cacao, sem pretender, no entanto, real emparelhamento.
geudo Louse rea Laceioa
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