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Che cos’é la poesia?! Jacques Derrida Publicado em Poesia, |, 11 de novembro 1988 Para responder a tal questao - em duas palavras, nao é? - pede-se saber renunciar ao saber. E de bem o saber, sem jamais o esquecer: desmobiliza a cultura, mas 0 que sacrificas em estrada, atravessando a estrada, nao o esqueces jamais em tua douta ignorancia. ‘Quem ousa me pedir isso? Mesmo se nao pareca nada, pois desparecer é sua lei, a resposta se vé ditada. Sou um ditado, pronuncia a poesia, aprende- me de cor, recopie, vele e me guarde, othe-me, ditada, sob os olhos: trilha- sonora, wake, singradura de luz, fotografia da festa em luto. Ela se vé ditada, a resposta, de ser poética. E por isso tem que se enderecar a alguém, singularmente a ti, mas como a um ser perdido no anonimato, entre cidade e natureza, um segredo partilhado, as vezes publico e privado, absolutamente um e outro, absurdo de dentro e de fora, nem um nem outro, 0 animal atirado no caminho, absoluto, solitdrio, enrolado em uma bola perto de si. Pode fazer-se esmagar, justamente, por isso mesmo, 0 ourico, istrice. E se tu respondes diversamente segundo os casos, tomando 0 espaco e 0 tempo que te sao dados com esta demanda (j4 que tu falas italiano), por ela mesma, segundo esta economia, mas também na iminéncia de qualquer travessia fora de si, riscada frente a lingua de outro em vista de uma traducao impossivel ou refutada, necessaria, mas desejada como uma morte, ‘0 que tudo isso, isso mesmo que tu acabas de delirar, a ver, desde, com a poesia? Com 0 poético, melhor, pois tu ouves falar de uma experiéncia, outra palavra de viagem, aqui o percurso aleatorio de um trajeto, a estrofe que volta, mas jamais reconduz ao discurso, nem a si mesma, jamais ao menos se reduz & poesia - escrita, falada, mesmo cantada. Aqui entao, imediatamente, em duas palavras, para nao esquecer: 1. A economia da meméria: um poema deve ser breve, por voca¢ao eliptica, qualquer que seja a extensao objetiva ou aparente. Douto inconsciente da Verdichtung e da retirada. 2. © cora¢ao. Nao 0 coraco no meio das frases que circulam sem risco sobre os distribuidores e se deixam traduzir em todas as linguas. Nao simplesmente 0 coragdo dos arquivos cardiograficos, o objeto dos saberes ou das técnicas, dos filésofos e dos discursos bio-ético-juridicos. Talvez nao o coragao das Escrituras ou de Pascal, nem mesmo, 0 que ndo é muito certo, este que o prefere Heidegger. Nao, uma histéria de «coracdo» poeticamente envolta no idioma «aprender de cor», este da minha lingua ou de outra, 0 inglés (to learn by heart), ou ainda de uma outra, 0 arabe (hafiza a’n zahri kalb) — um sé trajeto de miiltiplas vias. Dois em um: 0 segundo axioma se enrola no primeiro. O poético, digamo- lo, seria este que tu desejas aprender, mas do outro, gra¢as ao outro e sob ditado, de cor: imparare a memoria. Nao é isso ja, 0 poema, quando uma prova 6 dada, a chegada de um acontecimento, no instante em que a travessia da estrada nomeada traducao permanece tao improvavel como um acidente, intensamente sonhado portanto, requerida ali onde isso que ela promete sempre deixa a desejar? Um reconhecimento vai até isso mesmo e previne aqui o conhecimento: tua bendico antes do saber. Fébula que tu poderias tomar a contar como o dom do poema, é uma histéria emblematica : alguém te escreve, a ti, de ti, sobre ti. Ndo, uma marca a ti enderecada, deixada, confiada, se acompanhada de uma injun¢ao, na verdade se institui nesta ordem mesma que por sua vez te constitui, assinando tua origem ou te dando lugar: destréi-me, ou melhor, ainda restitui meu suporte invisivel de fora, no mundo (ja este o traco de todas as dissociacées, a histéria das transcendéncias), faz de modo que em todo caso a procedéncia. da marca permanece doravante nao encontravel ou desconhecido. Promete-o: que ela se desfigure, transfigure ou indetermine em seu porto, e tu ouvirds sob esta palavra a margem dessa partida tio bem que © referente frente ao qual uma translagao se porta. Coma, beba, engula minha letra-carta*, porte-a, transporte-a em ti, como a lei de uma escritura tomada teu corpo: a escritura em si. A astucia da injuncdo pode antes se deixar inspirar pela simples possibilidade da morte, pelo perigo que faz correr um veiculo a todo ser finito. Tu ouves vir a catastrofe. Desde entao impresso em si o traco, vindo do coraco, 0 desejo do mortal desperta em ti o movimento (contraditério, tu me segues bem, dupla obrigacio, coacao aporética) de guardar do olvido essa coisa que de um s6 golpe se expoe a morte e se protege - em uma palavra, o endereca, a retirada do ouri¢o, como sobre a estrada um animal envolto em bola. Querer-se-ia 0 tomar em suas maos, o aprender e o contemplar, o guardar para si, perto de si. Tu amas - guardar isso em sua forma singular, dir-se-ia na insubstituivel literalidade do vocdbulo se se falasse da poesia e nao somente do poético em geral. Mas nosso poema nao mantém no lugar nos nomes, nem mesmo nas palavras. Ele é antes lancado sobre as estradas e 0s campos, coisas mais além das linguas, mesmo se 0 vem de lembrar entao se reune, envolto em bola perto de si, mais ameacado que nunca em sua retirada: ele cré entao se defender, ele se perde. Literalmente: tu quererias reter de coracdo uma forma absolutamente nica, um acontecimento cuja intangivel singularidade néo separa mais a idealidade, 0 sentido ideal, como se diz, do corpo da letra-carta*. O desejo dessa inseparacao absoluta, 0 nao-absoluto, tu o respiras a origem do postico. Donde a resisténcia infinita a transferir da letra que o animal, em seu nome, reclama portanto. £ 0 desespero do ourico. Que quer 0 desespero, o stress mesmo? stricto sensu pér-se em guarda. Donde a profecia: traduza-me, desperte, guarde-me ainda um pouco, salva-te, abandonemos a estrada. Assim surge em ti o sonho de aprender de cor. De te deixar atravessar 0 coracao pelo ditado. De um sé traco, e isso é o impossivel e a experiéncia Poematica. Tu ainda nao conhecias 0 coracéo, assim o aprendes. Desta experiéncia e desta expresso. Eu chamo poema isso mesmo que aprende o cora¢ao, isso que inventa 0 coracao, enfim isso que a palavra de cor parece querer dizer e que em minha lingua eu mal diferencio da palavra coracao. Coragao, no poema «aprender de cor» (para aprender de cor), ndo nomeia mais somente a pura interioridade, a espontaneidade independente, a liberdade de se afetar ativamente reproduzindo o rastro amado. A memoria do “de cor” se confia como uma prece, isso é mais certo, a uma certa exterioridade do autémato, as leis da mnemotécnica, a esta liturgia que imita em superficie a mecdnica, de automével que surpreende tua paixéo e vem sobre ti como de fora: auswendig, «de cor» em alemao Entao: 0 coracao bate, nascimento do ritmo, além das oposicdes, do dentro e do fora, da representacao consciente e do arquivo abandonado. Um coragao ld, entre as veredas ou as auto-estradas, fora de tua presenca, humilde, rente ao chao, bem baixo. Reitera murmurando: nao repitas jamais... Numa s6 cifra, © poema (0 aprender de cor) sela conjuntamente 0 sentido e a letra, como um ritmo espacando o tempo. Para responder em duas palavras, elipse, por exemplo, ou elei¢do, coragéo ou ourico, precisarias desamparar a meméria, desarmar a cultura, saber esquecer o saber, incendiar a biblioteca das poéticas. A unicidade do poema se da sob esta condicao. Precisas celebrar, tu deves comemorar a amnésia, a selvageria, ver a bobagem do «de cor»: o ourico. Cega-se. Tornado esfera, ericado de espinhos, vulnerdvel e perigoso, calculista e inadaptado (pois ele se pde em bola, assentando o perigo sobre a auto-estrada, ele se expde ao acidente). Nao ha poema sem acidente, nao ha poema que nao se abra como uma ferida, mas que nao seja também feridor. Tu chamaras poema uma encantacao silenciosa, a ferida afona que de ti eu desejo aprender de cor. Ha entao lugar, para 0 essencial, sem que tenhamos que o fazer: ele se deixa fazer, sem atividade, sem trabalho, no mais sébrio pathos, estranho a toda producao, sobretudo a criagdo. O poema efetua-se, bendiccio, vindo do outro. Ritmo, mas dissimetria. Nunca hd apenas o poema, antes de toda poesia. Quando, em lugar de «poesia», dissemos «poético», deveriamos precisar : «poematica». Sobretudo nao deixa reconduzir 0 ourico no circo ou no haras da poiesis: nada a fazer (poiein), nem «poesia pura», nem retorica pura, nem reine Sprache, nem «pér-em-obra-da-verdade». Somente uma contaminacao, tal, e tal cruzamento, este acidente. Esta volta, e a reviravolta desta catastrofe. © dom do poema nao cita nada, néo ha nenhum titulo, nao histriona mais, ele vigia sem que tu o esperes, acossando, cortando com a poesia discursiva, e, sobretudo literdria. Em cinzas, mesmo, desta genealogia. Nao a fénix, nao a aguia, o ourico, bem baixo, muito baixo, rente a0 cho. Nem o sublime, nem o incorpéreo, angélico talvez, e por um tempo. Tu chamards doravante poema uma certa paixio da marca singular, a assinatura que repete sua dispersdo, cada vez mais além do logos, inumano, doméstico apenas, nem reapropriavel na familia do tema: um animal convertido, tornado esfera, voltado para o outro e para si, uma coisa em suma, e modesta, discreta, rente ao chao, a humildade que tu sobrenomeias te trazendo assim no nome mais além do nome, um ourico catacrético, todas as farpas para fora, quando este cego sem idade ouve, mas nao vé chegar a morte. poema pode se tornar em esfera, mas é ainda para revirar seus signos agudos para o fora. Ele pode certamente refletir a lingua ou dizer a poesia, mas ele nao se reporta nunca a ele mesmo, ele ndo se move nunca de si mesmo como estes trocos portadores da morte. Seu acontecimento interrompe sempre ou desvenda o saber absoluto, o ser perto de si na autotelia. Este «deménio do coracdo» nunca deixa de se reagrupar, ele antes se perturba (delirio ou mania), ele se expée a sorte, antes ele se deixaria picotar por aquilo que ver sobre si. Sem sujeito: ha talvez do poema e que se deixa, mas ndo o escrevo jamais. Um poema, eu nao 0 assigno jamais. O outro assigna. O eu é somente na chegada desse desejo: aprender de cor. Retraido para se resumir a seu proprio suporte exterior, sem substancia, sem sujeito, absoluto da escritura

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