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iaUm olhar psicanalítico sobre o bullying

Resumo
O bullying pode ser considerado um dos retratos do mal-estar contemporâneo na educação?
Esta é a pergunta norteadora de nossa pesquisa de mestrado, cujos primeiros resultados serão
apresentados nesse texto. Em suma, podemos afirmar que o material analisado evidencia a juridização
do campo educacional e uma forte relação entre a recusa da autoridade pelos adultos e ascensão de
situações descritas como bullying.

Nos últimos anos, o bullying tornou-se um dos assuntos predominantes quando se fala em
escola e frequentemente tomamos conhecimento de algum acontecimento, supostamente desse tipo,
ora via relatos da própria comunidade escolar (professores, alunos, pais, etc), ora via notícias
veiculadas pela mídia impressa, televisiva e digital.
Então seria possível considerar o bullying como um dos retratos do mal-estar contemporâneo
na educação? Sem dúvida esta é uma questão que divide opiniões. Para alguns se trata de uma prática
presente desde os primórdios da instituição escolar. De fato, basta uma conversa simples com nossos
avós para, aos lhes interrogarmos sobre suas lembranças da época em que eram alunos, identificarmos
situações que muito provavelmente hoje seriam classificadas como bullying.
Podemos concordar com o argumento sobre a não novidade do fenômeno, mas não é possível
negar a evidência o mesmo adquiriu na atualidade. É necessário, pois investigarmos por que isto
acontece. É preciso saber ainda por que situações tão diversas hoje são identificas sob um mesmo
nome: O Bullying. Para tanto precisamos considerar, escutar os discursos sobre esse tema. Escutar,
aqui, aos moldes da Psicanálise: considerar o manifesto para alcançar o latente, transformar queixa
em enigma.
Quando sugerimos a possibilidade do bullying ser pensado como um dos retratos do mal-estar
na educação, é porque aqui utilizamos o mal-estar no sentido freudiano do termo, portanto estrutural,
e estamos em busca de compreender os discursos sobre bullying como evidências de contingências
que acirram esse mal-estar.
Trazer à tona quilo que o uso do termo bullying pretende recalcar: este é o objetivo de nossa
pesquisa de mestrado, cujos s primeiros resultados serão apresentados no presente texto. Para tanto
tomamos como corpus os discursos sobre essa tema presentes em livros, artigos de jornais e revistas
destinados ao público em geral. Consideramos ainda algumas experiências vividas por nós, ao longo
dos últimos cinco anos, enquanto psicóloga escolar numa Secretaria de Educação de um município
vizinho à cidade de São Paulo. Salientamos que além do legado teórico deixado por Freud e Lacan,
baseamos nossas análises nas contribuições da filósofa Hanna Arendt ao campo educacional.
Antes de mais nada, o nosso primeiro passo foi tentar entender do que se está falando quando
se usa a palavra bullying. A partir do material pesquisado, pudemos constatar que, sob a égide desse
conceito, estão alocadas situações muito diversas. Encontramos, por exemplo, no material
pesquisado, descrito como bullying desde o espancamento de um jovem pelos colegas de sala, danos
ao patrimônio físico da escola, ofensas entre alunos e professores, fofocas em redes sociais até
mordidas entre crianças no maternal.
Apesar da diversidade dos casos, quando ouvimos a palavra bullying a impressão que temos
é de que, sem muito esforço, somos capazes de compreender completamente do que se está falando.
Assim, como nos diz Carvalho (2009)

[a palavra bullying] aparece como uma palavra mágica, capaz de esclarecer toda
sorte de condutas que causariam humilhação, dor e mal [...] E ao assim fazer parece
ter o dom de nos dispensar de pensar na complexidade e particularidade de cada caso,
de refletir sobre o desafio prático que sua singularidade nos propõe. Está tudo
explicado: é bullying!

Recorrendo à psicanálise podemos dizer que uso do termo bullying, no material visitado, tem
por consequência manter recalcado tudo aquilo que é da ordem do sujeito, portando do desejo. O que
se quer é apenas administrar o problema, sem a necessidade de compreendê-lo. Não por acaso são
cada vez mais frequentes medidas como expulsão e registro de Boletim de Ocorrência contra alunos
1
, contratação de seguro contra bullying2 e outorga de projetos de Lei, em âmbito Federal, Estadual e
Municipal, que criminalizam sua prática.
Estamos diante da juridização da educação, fenômeno que assola todas as esferas do social.
Sobre esse processo, Voltolini (2004, p.94)

Trata-se de legislar, estabelecer limites e especificações sobre um dado assunto que


envolve um laço entre os indivíduos. E esse legislar deve prescrever princípios
gerais, normativos, e não flexíveis, às idiossincrasias [...] Dito de outro modo, o
tratamento jurídico da questão agrega, sem se preocupar com a heterogeneidade do
que agrega. Seu princípio é por definição homogeneizante.
Acreditamos ser essencial para a compreensão do problema em questão considerar a variedade
e a complexidade de cada caso definido como bullying. Portanto, seria mais coerente falarmos em

1
Exemplificaremos um caso desses mais adiante no texto
2
“As escolas parecem ter uma nova preocupação em relação ao bullying: além de educar seus alunos para evitar esse
tipo de violência física ou psicológica, as instituições de ensino agora querem se proteger de possíveis prejuízos
financeiros causados por ações na Justiça movidas por famílias de vítimas. Vinte colégios já contrataram um seguro
contra bullying, criado há quatro meses pela Ace Seguradora.” In Colégios Contratam seguro contra ‘bullying’.
bullyins e não O Bullying, como nos quer fazer crer a maioria dos discursos sobre esse tema.
Apesar de toda variedade de situações simplificadas sob o nome bullying, constatamos que
algo comparece como denominador comum em todo o material por nós analisados. Vejamos dois
exemplos para a partir deles discorrermos sobre esse denominador comum.
O primeiro deles diz respeito a um relato presente no livro “Mentes perigosas nas Escolas –
Bullying”, parte de nosso corpus de pesquisa. De maneira resumida, nesse livro a autora, Ana Beatirz
Barbosa Silva, defende a tese de que o bullying é um problema de “ saúde pública ” ( Ibid,
p.14 ) e aquele que o pratica sofre de distúrbio de personalidade – por isso o nome mentes perigosas-
ocasionado por uma “afetividade deficitária” ( Ibid, p.44).
Vamos ao relato:
Antônio tinha dez anos quando chegou ao meu consultório. Apresentava
quadro clínico compatível com depressão [...] vinha sofrendo constantes agressões
verbais e físicas por parte de alguns garotos da escola. Por medo de desapontar os
pais e de sofrer agressões ainda mais violentas, ele permaneceu calado durante todo
o primeiro semestre [...] Como nenhum dos agressores foi reprimido pelas
autoridades escolares, as ações de bullying se intensificaram, chegando a pontapés e
socos [...] A direção do colégio só tomou conhecimento do fato quando os pais de
Antônio foram à escola relatar o ocorrido. Em nenhum momento cogitou-se
advertência, expulsão ou denúncia dos agressores a órgãos responsáveis pela
proteção de crianças e adolescentes.3 [...] Diante de tal negligência, os pais de
Antônio resolveram trocá-lo de escola [...] (Ibid, p.117)

O segundo exemplo, o tomamos de nossa experiência enquanto psicóloga escolar. No primeiro


semestre deste ano, recebemos em nosso departamento um relatório solicitando nossa atuação no
seguinte caso: uma professora, que ministrava aulas para alunos de 5º ano do ensino fundamental,
havia sido mordida em diversas partes do corpo por um de seus alunos e desejava, não só expulsá-lo
da escola, mas também registrar um Boletim de Ocorrência contra esse aluno, alegando que havia
sido vítima de bullying.4
Onde estão os adultos nesses relatos? Em relação ao primeiro relato, onde estavam e o que
fizeram os professores do menino em questão, quando este sofria as agressões em sala de aula? Onde
estavam e o que fizeram os outros funcionários da escola quando o menino era agredido no pátio?
Como é possível que a direção da escola só tenha tomado conhecimento do fato quando há a queixa

3
Note-se aqui um exemplo do que chamamos anteriormente no texto de juridização do campo educacional.
4
Antes que pudéssemos fazer qualquer intervenção, fomos surpreendidos pela notícia de que a diretora de escola,
apoiada por uma Supervisora de Ensino, conseguiram registrar um Boletem de Ocorrência na delegacia do município
contra o aluno em questão.
dos pais? E os pais, onde estavam, o que os impediu de notar o sofrimento do filho antes que este
adoecesse? Se alguém deveria ser denunciado aos órgãos responsáveis pela proteção de crianças e
adolescentes – como sugere Silva ( Ibid ) 5 - esse alguém deveria mesmo ser a outra, ou as outras
crianças que agrediam Antônio? E qual a responsabilidade dos adultos nesta situação?
No segundo relato a situação parece ainda pior: como é possível que uma criança de 10 anos
tenha conseguido, no mesmo dia, morder uma mulher em várias partes de seu corpo sem que esta
tenha consentido com isso? A impressão que temos é que a professora em questão, ao menos
simbolicamente, abandona a cena e só retorna a mesma para tomar as medidas contra o aluno. Ainda
sobre essa situação, de que maneira podemos dizer que se posicionam a diretora, a supervisora de
ensino e o delegado de polícia quando registram um BO contra um menor de idade?
A omissão dos adultos: este parece ser o denominador comum presente em todos os casos
descritos como bullying. Os relatos são feitos como se nas cenas os adultos tivessem simplesmente
desaparecido, são omitidos voluntária ou involuntariamente das situações descritas, retornando a
aparecer apenas para tomar medidas administrativas – suspender/expulsar o aluno agressor, mudar o
filho de escola, registrar Boletim de Ocorrência - mas de maneira alguma implicando-se nele.
Arendt, no belíssimo livro “Entre o passado e o futuro” de 1954 , afirma que a chamada crise
na educação decorre de uma crise de autoridade na modernidade: tomado pelo que a filósofa
classificou com pathos do novo, o Ocidente teria recusado a tradição e consequentemente, o que é
estrutural do processo educativo, qual seja, a natalidade.
A natalidade, o fato de que crianças nascem para o mundo – mundo esse que as precede e que
permanecerá depois delas – engendra a necessidade de adultos que se disponham a apresentar a elas
esse mundo, responsabilizando-se assim, diz Arendt (2005, p. 235) “ [...] pela vida e desenvolvimento
da criança e pela continuidade do mundo”. De acordo com a filosofa, autoridade do educador provém
desse comprometer-se com o mundo, com o legado desse mundo, portanto com a tradição.
Na educação, nas escolas, o pathos pelo novo ganhou força com as chamadas teorias
desenvolvimentistas que deslocaram o foco da Educação para o aprendizado d'A criança e
conduziram, assim, o educador à mera posição de facilitador desse processo de aprendizagem.
Em psicanálise, melhor dizendo, em Lacan, esse adulto, descrito por Arendt como
representante de um legado, assume a forma de o grande Outro. Mas para alguns psicanalistas, esse
encontro da criança com o Outro – encontro esse necessário para humanizá-la, para colocá-la no laço
social – engendra uma violência própria da educação. Como diz Kupfer (2007, p. 140 ) “ [..] violenta
porque desde o princípio , submete o corpo da criança a uma ordem que nada têm de natural [..]
trata-se da imposição do simbólico, da linguagem, sobre o corpo.”

5
Ressaltamos que não concordamos com a sugestão de Silva (2010).
Ao recusar a tradição, o educador/o professor não comparece mais à cena educativa como
Grande Outro, como sustentador de uma ordem, portanto, como autoridade. Na posição de mero
facilitador, o educador, frente a seus alunos, não representa nada além de sua particularidade, de sua
pessoalidade. Assim, adulto e criança, Professor e alunos encontram-se nivelados simbolicamente no
que diz respeito ao mundo. Esvai-se a assimetria trans-geracional, essencial à educação.
Sem a autoridade de um adulto, a criança fica submetida a tirania de seu grupo. Recorrendo
novamente à Arendt (Ibid, p.230)

A autoridade de um grupo, mesmo que este seja um grupo de crianças, é


sempre consideravelmente mais forte e tirânica do que a mais severa autoridade de
um indivíduo isolado. Se a olharmos do ponto de vista da criança individual, as
chances desta de se rebelar ou faze qualquer coisa por conta própria são praticamente
nulas; ela não se encontra mais em uma luta bem desigual com uma pessoa que, é
verdade, tem absoluta superioridade sobre ela, mas no combate a quem pode, no
entanto, contar com a solidariedade das demais crianças, isto é, de sua própria classe;
em vez disso, encontra-se na posição, por definição irremediável, de uma minoria de
um em confronto com a absoluta maioria dos outros.

Portanto, quando o adulto comparece à cena educativa não como autoridade, mas apenas em
sua pessoalidade, a violência própria da educação torna-se impossível, dando lugar, assim, como
argumenta Kupfer no trabalho citado anteriormente, à violência na educação.
Afinal sem a Lei, a ordem sucumbi dando lugar à horda, condição nunca definitivamente
superada, como nos adverte Freud ao discorrer sobre o narcisismo das pequenas diferenças. O gozo
desenfreado de um tirano, a violência e o medo subjacente à condição de horda: não seria esta a cena
a que somos remetidos quando estamos diante de algo como o bullying?

BIBlIOGRAFIA:

Arendt, H. (2005). Entre o passado e o futuro. São Paulo, SP: Perspectiva.

Associação Psicanalítica de Porto Alegre (2011). Autoridade e Violência. Porto Alegre, RS:
APPOA

Carvalho, J. S. F. (2011). Um bullying fora do lugar: quando o conceito exclui a complexidade de


cada caso. Educação, São Paulo, SP, nº 171, jul de 2011, p.66.

Chemama, R. (2000). Elementos lacanianos para uma psicanálise no cotidiano. Porto


Alegre, RS: CMC.
Colégios contratam seguro contra o ‘bullying’. In http://oglobo.globo.com/educacao/colegios-
contratam-seguro-contra-bullying-3787310. Consultado em outubro de 2012.

Kupfer, C. (2007). Educação para o futuro. Psicanálise e Educação. São Paulo, SP:
Escuta.

Silva, A. B. B. (2010). Mentes perigosas nas escolas. Bullying. Rio de Janeiro, RJ: Objetiva.

Voltolini, R. (2004). Psicanálise e Inclusão Escolar: direito ou sintoma? Estilos da Clínica, 2004,
Vol. IX, no 16, 92-101.

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