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+ Marcelo Gleiser

Independência e inovação
MARCELO GLEISER,
é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover
(EUA), e autor do livro "A Harmonia do Mundo"

Matemática pura à parte, toda pesquisa é aplicada

Já que calhou desta coluna cair no dia da Independência, me


parece adequado juntar o conceito de independência com o de
liberdade intelectual. Não a liberdade de imprensa; felizmente, hoje
não há ameaça ao direito que as pessoas têm de receberem
informação sem a censura tendenciosa do Estado. Falo da
liberdade intelectual que vem do aprendizado dos fatos e modos do
mundo, com a capacidade que temos de compreender a natureza e
de aplicar esse conhecimento à melhoria da qualidade de vida das
pessoas. Essa liberdade é o arcabouço do pensamento científico.

A ciência só é possível quando indivíduos têm a liberdade de


pensar sobre o assunto que lhes interessa e de trocar idéias
criticamente entre si. Mesmo que exista a importante pesquisa
direcionada, voltada exclusivamente para um fim preestabelecido,
como o desenvolvimento de um produto ou de uma tecnologia de
interesse comercial ou militar, historicamente as grandes inovações
científicas aconteceram quando os cientistas tinham liberdade para
criar, independentemente dos compromissos de curto prazo
impostos pela economia ou por interesses do Estado.

Falo, portanto, da chamada pesquisa básica, a ser distinguida da


chamada pesquisa "aplicada". Ponho aspas porque a palavra
aplicada pode ter muitas conotações. De certa forma, com exceção
da matemática pura, toda a pesquisa é aplicada, já que busca
novos conhecimentos sobre o mundo natural.

Mesmo os assuntos mais esdrúxulos -que vão de buracos negros,


por exemplo, à matéria escura que gravita em torno das galáxias-
podem um dia vir a ter um papel tecnológico. É impossível prever. O
que podemos dizer é que a história nos ensina que as descobertas
de hoje são as tecnologias de amanhã. A distinção entre pesquisa
aplicada e básica é, a meu ver, bastante sutil.

Como exemplo, cito o caso das ciências dos materiais. Milhares de


cientistas buscam atualmente materiais que sejam supercondutores
a altas temperaturas, isto é, materiais que não oferecem qualquer
resistência à passagem de correntes elétricas. Um fio comum
esquenta quando passa uma corrente, o que acarreta num maior
uso de energia.

É óbvio que a descoberta desses materiais teria uma série de


aplicações industriais. Mas existe também o interesse em descobrir
quais são as propriedades físicas de metais e cerâmicas que
podem levar à supercondutividade à temperatura ambiente. Muitos
cientistas se contentam em entender isso, sem correr a um
advogado de patentes apenas feita uma descoberta. Deveria haver
uma aliança entre as universidades e a indústria, permitindo
cientistas a dedicarem-se à pesquisa sem o pavio curto das
necessidades do mercado.

Isso é praxe nas economias de ponta e começa timidamente no


Brasil. É difícil para um investidor pensar nas vantagens de uma
operação a longo prazo. Mas, no caso da pesquisa científica, a
paciência vale ouro. Se um laboratório recebe financiamento sem
atraso e em nível suficiente, é quase certo que os frutos venham. E
que sejam inesperados. Com liberdade, a pesquisa traça caminhos
que nem sempre são previsíveis. O elemento surpresa, tão difícil de
quantificar e de vender a um órgão de financiamento, tem um papel
muito importante na ciência.

Fala-se muito em descobertas acidentais, como os raios X e a


radioatividade. Prefiro dizer que a sorte ajuda aos bem preparados.
A melhor garantia de qualquer investimento em pesquisa é dar aos
cientistas de boa reputação as condições necessárias para que
possam criar com liberdade.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth
College, em Hanover (EUA), e autor do livro "A Harmonia do
Mundo"

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0709200803.htm

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