Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
A EDUCAÇÃO NA
IDADE MÉDIA
ARISTÓTELES MEDIEVAL. Um dos fatores que explicam a emergência das universidades, nos primeiros anos do século XIII, foi a onda de
traduções das obras de Aristóteles, com comentários de pensadores árabes como Avicena e Averróis. Acima, ilustração de livro de Avicena
espontâneo inquietou a Igreja, desejosa do monopólio pelo crescimento urbano ou pela aceleração das trocas
escolar e colocou em funcionamento o sistema de licentia de conhecimento. Isso se deve ao fato de a Igreja e os
docendi (autorização de ensino) para abrir escolas, mesmo poderes leigos e classes dirigentes terem sentido cada
particulares; autorização esta outorgada em cada diocese vez mais a necessidade de apelar a letrados competentes,
pela autoridade episcopal. Esse sistema se impôs, prin- dominando as disciplinas eruditas e todas as técnicas da
cipalmente, porque a maioria dos mestres era composta escrita, para gerir seus negócios, tanto privados quanto
por clérigos. públicos. A renovação escolar fez-se acompanhar de uma
Bastante independentes e muito mais laicas foram as espetacular promoção social de pessoas saídas das escolas,
primeiras escolas de direito e de medicina surgidas nos os denominados magistri.
países mediterrâneos. Ainda aqui, tratava-se de escolas Além disso, o prestígio desses magistri devia-se ao fato
particulares, funcionando de maneira autônoma, sob a de seu saber ser bastante superior ao das épocas anteriores.
única responsabilidade do mestre firmando contratos com Por certo, o panorama geral das disciplinas que definiam
seus ouvintes. No decorrer do século XII, mestres formados o campo da cultura erudita não fora modificado, como
nas escolas italianas de direito e medicina começaram a também não o fora o monopólio do latim como veículo
espalhar-se e a ensinar na Provença, no Languedoc, na Ca- dessa cultura. Manteve-se então a seguinte idéia: todo
talunha e até mesmo ao norte da França e na Inglaterra. saber acessível repousava num determinado número de
textos, de autoridades veneráveis, e todo progresso no campo
A RENOVAÇÃO DOS SABERES do saber podia derivar apenas de uma interpretação mais
A renovação escolar não é explicada pelo desenvol- aprofundada desses mesmos textos.
vimento geral do Ocidente, pelo auge da economia, Contudo, o século XII enriqueceu a cultura de forma
considerável. Foram resgatados antigos manuscritos, e na
CRÉDITO: MUSEU CONDÉ, CHANTILLY
nomo da atividade intelectual, sendo a própria raison d’être fascinava vários espíritos, brindava maior liberdade, porém
de sua associação. despertava a desconfiança das autoridades eclesiásticas.
Aos poucos, as universidades saíram do restrito quadro Para Steven Ferruolo, todos esses fatores interferiram,
diocesano, e com forte proteção pontificial afirmaram sua mas na sua opinião é preciso acrescentar-lhes uma tomada
capacidade de recrutamento em toda a cristandade, sem de consciência mais aguda das necessidades profissionais
outro limite além de seu renome específico. do ensino. Poder-se-ia dizer que, para fazer frente a
Como explicar a emergência, nos primeiros anos do determinado número de disfunções surgidas nas escolas
século XIII, dessa forma institucional nova? Alguns estudio- existentes, a solução universitária foi construída. Algumas
sos, como Jacques Le Goff, enfatizaram a conjuntura geral escolas periclitavam, enquanto outras mal dominavam
favorável, o progresso constante em centros urbanos como seu próprio crescimento. As autoridades eclesiásticas tra-
Paris, as novas necessidades dessas cidades, dos príncipes e dicionais estavam ultrapassadas. A massa dos estudantes
Igreja oferecendo empregos cada vez mais numerosos aos tornava-se uma ameaça para a ordem pública. Os mestres
graduados provenientes das escolas. Outros pesquisadores, eram cada vez mais numerosos e entravam abertamente
como Grundmann, preferiram insistir nos fatores intelec- em concorrência. Cada um ensinava a seu modo, percor-
tuais, principalmente no que se refere a Paris. Seja como rendo com superficialidade as “autoridades”, misturando
for, fica claro que essa evolução aconteceu graças a uma
nova onda de traduções das obras de Aristóteles, acompa- O AUTOR
nhadas de seus comentadores árabes de maior prestígio: REUVEN FAINGOLD é Ph.D. em história pela Universidade
Avicena e Averróis. Com tais textos, não se tratava mais Hebraica de Jerusalém, membro fundador da Sociedade Ge-
simplesmente de lógica, como no século XII; tratava-se nealógica Judaica do Brasil e pesquisador da história judaica
medieval e moderna; especialista em Segundo Império, é
doravante do conjunto da filosofia e da ciência greco- autor do livro D. Pedro II na Terra Santa: Diário de Viagem – 1876
árabes, surgidos nas escolas do Ocidente. Essa renovação (Sêfer, 1999).
PROLIFERAÇÃO E EVOLUÇÃO
Os séculos XIV e XV marcam uma nova fase na história
das universidades medievais. Ela se caracteriza por dois
traços principais: (a) surgimento de novas fundações; (b) marginais que não tiveram relação alguma com centros
maior intervenção dos Estados culturais e políticos da Europa como as universidades
Surgimento de novas fundações. Inicialmente, o próprio de Saint Andrews (1411) e Glasgow (1451), na Escócia;
sucesso acadêmico contribuiu para a expansão das uni- universidade de Copenhague (1475) e Uppsala (1477), na
versidades. As novas unidades universitárias resultaram Suécia, e Cracóvia (1397), na Polônia.
de um ato de fundação decidido por reis e príncipes e A essas fundações é preciso adicionar faculdades ainda
confirmado pelo papado. inexistentes, principalmente as de teologia, assim como
As primeiras universidades fundadas aparecem por volta a multiplicação de colégios, sobretudo em vilas como
de 1220-1230. Ousa-se qualificar como universidade o Paris, Oxford e Cambridge. Geralmente esses colégios
studium de Nápoles (instituído em 1224 pelo imperador foram fundados por ricos benfeitores, homens da Igreja,
Frederico II), tamanha era a limitação de sua autonomia. príncipes ou grandes oficiais reais.
Do mesmo modo, as escolas estabelecidas em Toulouse de-
pois da cruzada contra os albigenses (1229) só se tornaram Maior intervenção dos Estados. O poder político sempre
verdadeiras universidades após a outorga dos privilégios se interessou pelas universidades. Embora permanecen-
pontificiais de 1233 e 1245. Mas a terra eleita das univer- do instituições eclesiásticas, as universidades passaram
sidades fundadas foi, no século XIII, a península Ibérica. cada vez mais para o controle das cidades e dos Estados.
Lá, hispanos e lusitanos tomaram a iniciativa de instituir Havia uma necessidade de formar letrados para cargos
universidades em Salamanca (1218), Valência (1245), de administração nas grandes cidades. Surgia aos poucos
Valladolid (1250), Sevilha (1254), Lisboa, Coimbra (1290) o Estado moderno.
e Lérida (1300). Por 1300, não ha- Sob formas diversas, o controle
via mais de 12 ou 13 universidades O controle político político do Estado tornou-se opres-
ativas em toda Europa, e até 1378 sivo para algumas universidades,
o ritmo das fundações continuou do Estado tornou-se pois havia restrição ao exercício das
moderado. liberdades e privilégios, intervenção
Lembremos, as escolas de
opressivo para na nomeação dos professores e no
direito existentes desde o século certas universidades recrutamento de estudantes. Em
XIII viraram universidades, tais os troca, é verdade, os universitários
casos de: Orléans (1306), Angers obtiveram algumas gratificações fi-
(1337), Avignon (1303), Perusia (1308) e Pavia (1361). nanceiras, assim como promessas de brilhantes carreiras.
Sem fracassar totalmente, outras fundações vegetaram, são A antiga universidade de Paris resistia à perda de
elas: Cahors (1332), Florença (1349), Perpignan (1350) sua autonomia. Enquanto isso, as novas universidades,
e Siena (1357). quase sempre ligadas a um principado territorial, não
O fenômeno mais original desse período foi o apareci- ostentavam nem um brilho universal nem uma impossível
mento das primeiras universidades no mundo germânico independência. Elas se submeteram de boa vontade, em
e na Europa central. Em 1348, o imperador Carlos IV troca de favores, a um papel determinado: ministrar um
decretou a fundação da universidade de Praga. Seus pri- ensino ortodoxo, formar as futuras elites locais e contribuir
meiros tempos foram difíceis. Muito mais difíceis foram para o êxito da ordem social e política estabelecida. Cada
os das universidades de Cracóvia (1364), Viena (1365) e universidade pretendia consolidar suas metas e atender aos
Pécs (1367), três sociedades sem condições mínimas de interesses daqueles que a apoiavam naquela época.
desenvolver instituições universitárias.
Essa situação irá a mudar após o Grande Cisma (1378- POPULAÇÃO ESTUDANTIL
1417). Essa crise acelerou a emergência dos Estados e das Somente nos últimos anos a documentação histórica
Igrejas nacionais. Enquanto havia menos de 30 universi- nos permitiu conhecer melhor o perfil da população
dades ativas em 1378, após 1500 este número dobrará. estudantil na Europa. Apareceram pergaminhos com re-
Três países aproveitaram-se desta situação: a França, onde querimentos individuais endereçados pelas universidades
oito fundações provincianas – entre elas Aix-en-Provence, ao papado, registro de matrículas, e dados que permitem
Poitiers, Caen e Bourges – se juntaram a centros antigos; fazer análises quantitativas.
a Espanha, com cinco fundações novas; e a Alemanha A formação de letrados devia ser grande: por volta de
atingindo uma dúzia de universidades entre 1378 e 1500, 1400, Paris tinha provavelmente em torno de 4 mil alunos,
entre elas Erfurt, Colônia, Heidelberg, Leipzig, Freiburg, Bolonha conseguiu de 2 mil a 3 mil alunos, em Toulouse,
Basiléia e Tübingen. Acrescentamos, por fim, países Avignon, Oxford e Praga, chegamos por aproximação a 1,5
mil a 2 mil alunos. Havia também aquelas como Cahors, lação dos homens e a validade universal dos diplomas.
na França, onde o número não passava de uma centena Contudo, tal mobilidade não deve ser superestimada. Ela
ou de algumas dezenas. beneficiava as grandes universidades como Paris e Bolonha,
Na França, os mestres parisienses lamentavam a con- mas, mesmo ali, os estudantes de origem distante eram
corrência de Caen e de Bourges. Na Inglaterra, Cambridge sempre minorias. Em Bolonha, os ultramontanos jamais
com 1,3 mil estudantes aproximou- representavam mais de um quarto
se de sua irmã mais velha Oxford do total. No final da Idade Média,
com uns 1,7 mil alunos. Mas foram As populações a multiplicação das universidades
as universidades da Alemanha que universitárias nacionais ou regionais reduziu
mostraram um forte dinamismo: ainda mais essa mobilidade.
Louvain (1425) e outros centros na Idade Média De fato, no decorrer da Idade
acadêmicos da região alpina chega- eram móveis Média, a principal corrente mi-
ram a ter entre 1385 e 1500 quase gratória foi para Itália e rumo a
250 mil estudantes. Paris. Logo depois haveria uma
Apesar das intempéries, uma demanda social sus- preferência pelos países da Europa Central. Na contramão,
tentada permitiu em todos os lugares a manutenção de os britânicos dirigiam-se para Oxford e Cambridge, e os
contingentes estudantis e, mesmo nas últimas décadas espanhóis e portugueses para as universidades de seus
do século XV, a retomada do crescimento. respectivos países.
Fica ainda mais difícil reconstituir a origem social dos
MOBILIDADE GEOGRÁFICA E ORIGEM SOCIAL estudantes. Os nobres nunca foram numerosos e dificilmente
O estudo sistemático das listas nominativas de professores atingiram mais de 5% ou 10%. Os estudos universitários não
e alunos nos permitiu elucidar dois assuntos significativos, a conduziam ainda nem ao tipo de cultura nem ao tipo de car-
saber: (a) a mobilidade social, (b) a origem socioeconômica reira a que esse grupo social se dedicava preferencialmente.
As populações universitárias na Idade Média eram Os custos e a duração dos estudos eram suficientes
bastante móveis, não havia fronteira impedindo a circu- motivos para afastar a grande massa da população. Os
estudantes pobres eram sempre minoritários. Na melhor No final da Idade Média, a prática dos estudos tornar-
das hipóteses nas faculdades da Alemanha chegavam a se-á uso corrente, principalmente em famílias de oficiais
formar 20% do efetivo total. É provável, portanto, que reais, de juristas ou de médicos.
a maior parte dos alunos e graduados viesse das “classes Longo e complexo foi o trajeto das universidades
médias” (notários, comerciantes e artesãos abastados). na Idade Média. A maioria evoluiu de “escolas” para
Para as pessoas de recursos, os diplomas significavam um universidades com ajuda do braço secular e também
meio de ascensão social e também uma forma de obten- com a supervisão do eclesiástico. Afinal, nenhum
ção de rendimentos, ou no mínimo serviam para galgar centro acadêmico poderia fugir dos padrões religiosos
posições mais seguras e prestigiosas, tanto no alto clero do da época, norteados pela cristandade. Foi ela quem
século XV, onde encontramos porcentagens importantes conquistou dia a dia posições de destaque no desen-
de graduados, como na prática privada (médicos) ou no volvimento das cidades.
serviço da corte, nos cargos superiores de administração As sete disciplinas que faziam parte das artes liberais
e da justiça. O objetivo maior desses graduados era entrar foram fundamentais na formação da mentalidade do ho-
na nobreza ou fazer carreiras de professores. mem medieval e, concomitantemente tiveram um papel
significativo nas transformações pelas quais passou a
CRÉDITO: BRIDGEMAN ART LIBRARY, LONDRES/KEYSTONE
Europa rumo à modernidade.
O movimento universitário, se é que podemos
falar em “movimento”, teve uma missão especial na
renovação do saber e na aquisição do conhecimento.
PALÁCIO APOSTÓLICO, VATICANO