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A AIDS E O BIBLIOTECÁRIO

Oswaldo Francisco de Almeida Júnior

"... o que ocorre é nada, nada por todos os lados, uma infinitude de nada inimaginável
em toda a sua inextensão." João Ubaldo Ribeiro. Viva o povo brasileiro.

Páginas e páginas de jornais infestadas, ou melhor, repletas de notícias sobre a AIDS.


As revistas dedicam matérias e matérias sobre o assunto, numa infinita repetição. Os
fantásticos programas televisivos encontraram um grande tema para veicular
reportagens pseudo-científicas. As rádios não cessam de veicular campanhas cujo
caráter informativo existe apenas no desejo dos redatores. Os amantes do cinema
acabam suportando uma seqüência cacete e inoportuna de informações sobre prevenção
e transmissão da AIDS. Enfim, os meios de comunicação de massa, bem ou mal,
passam a idéia de que estão cumprindo o papel social que lhes é destinado.

A expectativa é de que, em breve, algum iluminado cientista possa encontrar a cura, o


remédio que aplacará a ira incandescida da doença. Discursos verborrageiam que é
preciso eliminar a causa, ou seja, a promiscuidade, a imoralidade, pois a doença atinge
(ou atingia) quase que exclusivamente homossexuais e viciados. Bem feito,
principalmente para os primeiros, pois querem alterar o que a natureza determinou. Qual
bichas, desculpe, bichos, desconsideram preceitos e normas, muito mais que
verdadeiros, naturais, e que são observados e seguidos pelos homens há milhões de
anos. Bem feito também para os viciados, pois procuram a razão da existência em
lugares outros que não o seio da família, e da tranqüilidade da vida doméstica.

Enquanto os moralistas pregam a derrocada da libertação sexual, o fim do


homossexualismo e coisas que tais, outros investem seus esforços na tentativa de que
todos vistam a camisa (ou será camisinha?) da prevenção, através de intermináveis
discussões sobre formas de contágio, precauções, remédios, etc. A discriminação do
Aidético passou a ocupar posições prioritárias nessas discussões e debates.

E O BIBLIOTECÁRIO NISSO TUDO?

Vários parágrafos já se passaram e, até agora, nada foi dito sobre o bibliotecário. Muitos
dos leitores deste texto, provavelmente, esperavam que, por causa do título,
abordaríamos questões relacionadas ao homossexualismo na profissão ou, quem sabe,
histórias sobre bibliotecários aidéticos. Outros, talvez, tenham imaginado que
noticiaríamos que em uma universidade qualquer dos Estados Unidos, os cientistas,
embasados em amplas pesquisas, haviam descoberto uma nova forma de contágio, que
poria em risco aqueles que trabalham com livros ou fichas catalográficas. Infelizmente,
para eles, não é esse o caminho que queremos dar às nossas reflexões.

Nossa preocupação está voltada para os trabalhos que os bibliotecários vêm


desenvolvendo para informar a população sobre a AIDS. O interesse de que estamos
contaminados, parece-nos óbvio e claro, na medida em que desconhecemos qualquer
tentativa, por parte das bibliotecas, de ação concreta nesse sentido.
Afinal, o que o bibliotecário tem feito para diminuir, para amenizar o desconhecimento
da população sobre a AIDS? Nada, ou quase nada. Alguém conhece ou tem notícias de
trabalhos desenvolvidos por alguma biblioteca sobre o assunto? Vale lembrar que
atuações isoladas de bibliotecários existem, mas não podem ser caracterizadas,
obviamente, como trabalhos desencadeados a partir da biblioteca: o hábito faz o monge,
mas não só o bibliotecário faz a biblioteca.

Todos nós reconhecemos e aceitamos, depois de tantas notícias e discussões, que a


AIDS é uma doença incurável - até o momento - e que o único remédio eficaz contra ela
seria tornar a população totalmente informada sobre as formas de contagio, criando a
consciência da necessidade da prevenção. Assim, com a população ciente do perigo que
a AIDS representa, seria possível diminuir o número de contágios. Os meios de
comunicação de massa, bem ou mal, como já dissemos, assumiram e desencadearam
amplas campanhas contra a AIDS, informando ou procurando deixar a população
informada sobre a maior quantidade possível de aspectos da doença. Vários grupos
organizados surgiram, principalmente entre aqueles que eram considerados, de início,
como "de risco", visando, também, esclarecer a população sobre a AIDS. O trabalho
desses grupos abrange: a confecção e distribuição de cartazes; palestras programadas ou
determinadas pela necessidade do momento; campanhas em rádio e televisão; conversas
com o governo, na tentativa de sensibilizá-lo para os problemas ligados à AIDS e aos
Aidéticos; etc. Convém aqui ressaltar que a maioria desses grupos não conta com
nenhuma estrutura, baseando seus trabalhos na vontade e no despojamento dos que
neles militam.

Concordamos, então, que o combate a essa incurável doença está, todo ele, baseado na
informação. Parece-nos - e gostaríamos que você nos corrigisse caso estejamos errados -
que o principal trabalho do nosso querido profissional bibliotecário é, exatamente, a
informação. Correto? Ora, por que é, então, que o bibliotecário (o tal profissional da
informação, vale enfatizar) nada faz para informar a população sobre a AIDS,
contribuindo para diminuir o número de contagiados?

Alguns "profissionais" bibliotecários - para gáudio daqueles inveterados corporativistas


que nada fazem mas se rejubilam quando o ufanismo biblioteconômico é reiterado -
poderão contra-argumentar, apresentando a mera distribuição de folhetos e panfletos
sobre a AIDS (normalmente "deixados" sobre um balcão qualquer) como o único
trabalho de real competência das bibliotecas, como o máximo a ser realizado dentro da
esfera de incumbências do bibliotecário.

AIDS ET ALII

Enquanto os meios de comunicação de massa priorizam a AIDS, a maioria dos


brasileiros morre de diarréia, de desidratação, por falta de saneamento básico, por quase
total inexistência de atendimento médico. Enquanto uma enxurrada de informações
sobre a AIDS é veiculada, a taxa de mortalidade infantil, na Grande São Paulo, atinge
níveis assustadores de 100 por 1000.

Tudo isso ocorre ao lado, atrás, em frente das bibliotecas, mas, estas, afirmam nada
poder fazer já que a morte, a doença, a dor e o sofrimento da população não podem ser
recuperados bibliograficamente, não podem ser tratados tecnicamente, não fazem parte
do âmbito de interesse dos registros do conhecimento.
Estudos de usuário são realizados nas universidades, nas empresas, nas estatais, nos
centros das grandes capitais, nunca, porém, nas periferias, porque... ora, porque lá estão
as favelas, os cortiços, os sujos e mal-vestidos, os descalços e doentes, os analfabetos e
os incuravelmente ignorantes! Como aplicar questionários se essa gente não consegue
entender o grande significado da procura da verdadeira demanda informacional? Como
atender os interesses dessa gente se ela não faz, e nem deve fazer parte da cultura
letrada, do círculo daqueles que elevam e engrandecem a civilização brasileira?

Em "Viva o povo brasileiro", pela boca do personagem Amleto Henrique, João Ubaldo
Ribeiro escreve: "Mas, vejamos bem, que será aquilo que chamamos de povo?
Seguramente não é essa massa rude, de iletrados, enfermiços, encarquilhados,
impaludados, mestiços e negros. A isso não se pode chamar um povo, não era isso o que
mostraríamos a um estrangeiro como exemplo do nosso povo." Alguma coincidência
com o que falávamos anteriormente? Ora, mera semelhança.

Iniciamos falando sobre a AIDS e acabamos discutindo sobre o mal que infecta a
biblioteconomia brasileira: a passividade, desconhecimento e desrespeito pelos
interesses e necessidades da maioria da população. Trabalhamos apenas para uma seleta
e elitizada classe social, que se utiliza da biblioteca e do bibliotecário, com seu
consentimento e apoio, para manter seus privilégios e sua condição de dominante. O
fato é que a população -- toda ela e não apenas aquele reduzidíssimo número de
alfabetizados que freqüenta as bibliotecas -- precisa estar informada sobre todos os
aspectos que envolvem a AIDS e outras tantas doenças, principalmente as "sociais". O
fato é que os bibliotecários -- todos eles e não apenas aquele reduzidíssimo número que
está preocupado com a população -- precisam estar informados sobre todos os aspectos
que envolvem a principal doença da Biblioteconomia: absoluta ausência de função
social.

Precisamos de uma biblioteconomia subversiva, guerrilheira, que alimente a população


de informações, que inverta as prioridades hoje existentes, que permita ao povo
reconhecer-se como cidadão. ...

(Fonte: Publicado originalmente em: Boletim IN:FORMA, São Paulo, v.2, n.3, p.3,
jul./set. 1989 e reproduzinho em: ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de.
Sociedade e Biblioteconomia. São Paulo: Editora Polis/APB, 1997)

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