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A Tradição TRAVESTIDA a traiçã traiçãoção tra

A Tradição travestida A TRAIC


A Tradição travestida a traiçã trai
so ção
çã o TRAV
o
A Tradição travestida A cTRAICAO
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A Tradição TRAVESTIDAl to a traiçã
traição
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wi
A Tradição travestida
p or a traiçã
traição ção
A Tradição TRAVESTIDA A TRA
A Tradição TRAVESTIDA A TRAI
A Tradição travestida A TRAICAO traves
ou
restos relançados duma nostalgia
ou
diz-curso
ou
ex-ciclo
ou
vinha

um copo de vinho

caminho livre linha

viva

este livro sina


da ponta do diamante eterno o tempo paleolítico alaúde fel
risca na face do cristal o lago ao vil ouvido do esquecido fere
das galerias submergidas algo as lascas farfalhantes na intempérie
mina sob as campinas galga o vento que troa torna à tona o escarcéu
as comas do crepúsculo gelado ‘lembra-te? lambe-me os flancos nus flama-os
um putrefar primeiro flore lento com tua língua ardente me navegue
dentro do tenso retinir silêncio destroça-te nas vagas não renegue-me’
densas nuvens navegam no ar calmo faz sol no lago pútrefo de thânatos
calma de morte se houver alma ela ressoa teatro de hipercúbicos milímetros
no ausente longe da faísca muda e alva sobre lentes fortíssimas retinas
átimo de ruínas noite larga a alba retêm a trama do cauim no vítreo
a aurora espera enquanto a esfera sobrevoa cosmo asséptico coma cristalina
a gema congelada raia um tênue raio instante excêntrico sempre durante
instante cintilante no orvalho e moras dentro no sem dentro ou antes
o que contém a caverna escura
luz? contém o breu da noite morta
sem estrelas luas ou luzes suas
som silêncio denso em todo canto
que a boca venta ouvida escuta
lenta e absorta grita muda
e o grito lento encoberto manto
da caverna envolve e absorve-lhe
converte-se em bolha de vazio
atrito entre pedra e água em branco
recoberto em negro de negrume
escuta! este negror sem sombra
e que a vida da caverna exala
branca esvanecida em grito em sombra
que o silêncio escuta atento e suga
brando e lento o som da gruta galga
disperso vesgo em visco muda
se fora foi como o que esvai-se em pranto
o que fica deste oco
ocado vazio cheio d’água
transparente raso e ralo
esvai pelos vãos deixando vãos
vazios tudo em vão
vão águas incolores inodoras e frias
águas que aguaceiam vazias
transparece num disco de luz
e desvanece de novo nas sombras
no ocaso das luzes do rio
que reaparece à frente, debaixo das rochas
acaso de águas e rochas e raios de sol
o rosto negro magro de bonfim
entrecortado por profundas rugas
reflete o semblante sombrio da aurora
mas de quando em vez que se abre
em generoso e largo e profundo riso
bril no manto breu da madrugada
madrigal de pontos prata enluarada
resplendendo meia luz de olhos meios
entreabert’em meio à fé a meia vela
em meio ao vale tens razão
em meio à rua geométrica há aromas
sem sentidos nesta bruma negra da noite
um raio de luz de sol fim de tarde
um jorro de palidez no lodo verde do corredor
trás da sala brotam plantas por entre fendas
de cimento enegrecido pelo tempo da casa
um halo de sol penetra o corredor contido
luz vermelha reluz em tijolos vermelhos e exala
o muro a rubrez que só ousa sair fim de tarde
uma pequena flor delica deitada em minuciosos talos verdes
paralelos à parede até a janela vislumbram os olhos
um brilho verde claro e de branco em brancas pétalas
e um pedaço de raio invade a sala obliquamente
e resplenda em alvo tingindo o amarelo de sol fim de tarde
uma alegria esmaecida um frescor de um dia vivido
cor palha e dispersa e difusa ilumina
olhos castanhos espelhos da tarde findoura
a música cai do negro disco impermanente
ao negror do ser impermeável
e penetra o negro véu permanente
em luto pela vida não nascida dentro do ente
e traz alguma cor ao frio cinza recorrente
que se volta num estalo à alma doente
crente estar oculta do ruído externo em eterno céu
seu, a música cai e o silêncio noturno da noite, véu
muito mais que qualquer luto
contra o céu eterneceu e sopra o vulto
incolor que permanece
na impermanência que se esquece
sombrio o fronte
sóbrio caminhar
sobre pedras esquadrinhadas
sobe a rua enevoada
sob sereno emadrugado
divagando em canto só
A idade desta cidade
É um mistério tão pro fundo
Quanto a sua identidade
Fundada num lago imundo

Morada da escuridade
Outro e si deste ser mundo
Este ser de mil verdades
Sem margens face sem fundo

Sonha o fixo e o acabado


Onde a vida é a nostalgia
De volver em sempre lago

Onde tudo é fluido e vago


Sem tristeza ou alegria
E onde a morte é o adorado
pedras e árvores

poste e calçada
casas sonham singelas
na manhã ensolarada

de Piracanjuba
bom dia !
muros e tijolos desgarrados
velho no portal acomodado
e velhas, velhinhas
noites densas
onde donzelas dançam
tensas
as duras mãos
se oferecem
lentas
olhos se aquecem
chamas
o sol
da manhã
faz sombras
de folhas verdes
pela janela
aberta
luzes
nos paralelepíped’azuis
sob olhos negros
de crianças pardas
leves
purpurilando
bolas e becos
e serenos
amenos
os pequenos
para lá e para cá
não param
a vida
não é menos
gatos
e telhas
e patos
nos lagos
na noite
reflexos
do luar
insetos
e uivar
de cães na cidade
cio
tremula no fio
da noite
a conduzir
florires
e pássaros a zunir
reluzir de sol
na manhã
luzir
Nós. Nas cordas que sustém
Nos valsamos sem voltas
Nus: tronco e curvas tortas
As mãos se soltam, soltas
Para o meu bem
Bem, volvamos às valsas: loucas
Líricas, danças mortas
Vem. Almas e valsas, quem ?
Ninguém veio... bailar e as vozes
Roucas
Ruídos. Cordas mudas, amém.
Teu dorso louro, desço e teço
As sensações se cruzam
Emergem, jorram resgatadas
Me retorço em imagens que se desfazem lentas
Tantas e dispersas
Brutas
Que abruptamente petrificam bruscas
Todas e diversas, unas
Numa unidade imóvel
Tudo, eterno e infinitamente vasto
Instante
Não dura mais que isto, instável
E imaterial
Nada
Me contorço em chamas
Brumas
Submergem, choram amargos
Poros, soam mares
Sais, salgados ares violentam ventas
Fluidos doces viscos quentes, envolventes
Ventre da manhã
Miragem
Cores e sabores falsos. Gostos, tatos e contatos: mera quimera
Ardências frias, planas
Um jardim etéreo sem espírito
Frio
Teus fios aéreos, sérios
Teus gestos atonais nos ares: danças
Corte de ar em vários
Goles de ares, áreas de cheio e vazio
Cheiros
Preenchidos vácuos de essências e substâncias, várias
Arenas: digladiam-se sentidos
Guerras e guerreiros brutos
estes cacos de traços que se
inscrevem soltos
descrevem-se nas tuas bocas
atrevem-se em teus olhares
escrevem-se a si mesmos
e saltam para a incerteza do
esquecido
traço que desenlaça em águas
e sais e se deságuam secas
estes traços se desescrevem
tortos
e desintegrados laços
ofício
ofício
vício obstinado
não cria descria ou destrói
não constrói ou desconstrói
sedimenta desliza evapora
cai e vai embora
inexpressivo corrói
as mãos do mineiro
ouro? sal
cal
embora como pluma
que plana o ar devagar
embora como perfume
que se esvanece no ar
embora com ar de cantar
da maneira que passam as horas
você foi embora
embora ficaste
a fronteira de jaiara-orquídea e jaiara-serpente
a fronteira das águas da confluência dos rios
a fronteira dos átomos da superfície e do ar
a fronteira do estado de origem com o outro
diluamos todas as margens fluidas
para atingirmos o âmago da margem
rumo à sorte
marginal
a morte
no instante da morte
é um corte
e no instante do corte
o gosto
do gozo
no instante do gozo

a gosma
num ácido instante
e numenal semblante
como a rosa
aberta instantânea
na tênue eterna
névoa fragrante

no ar
a dama consorte
a lavar
e amar nossa sorte
a planar
aspirar expirar
um acorde
da sonata espiral
o papel do poeta é algo mudando para algo mundano que algo
do mundo
(que) algo agouro
um mal agouro do mundo
e o papel do poeta
não se encharca das tintas
não é mais amarelo que amarela com o tempo e torna
poroso e áspero
que colorem as tintas
que vão se descolorindo num sem tom descolor
que são todas as cores: branca
esbranquiçadas
retornam por todos os poros e afloram
tal qual primavera refloram
por todos os cantos colorem de todas as cores reflorem
não são mais
tintas papéis e poetas
não mais
cores e poros e algo
não sei mais
lunar

subi
subi aa escada
escada
decantada
decantada de de ladrilhos
ladrilhos ppéétreos
treos
comunguei
comunguei ao ao ppéé da
da igreja
igreja velha
velha
um
um olhar
olhar para
para trtrááss
aa cidade
cidade nebulosa
nebulosa viva viva
sem
sem alma
alma viva
viva que
que sese mova
mova
aa esta
esta hora
hora desta
desta noite
noite
se
se movia
movia aa ouvia
ouvia seu seu respirar
respirar vivaz
vivaz
eu a revia idosa revivia
eu a revia idosa revivia idade idade
me
me movia
movia
em
em direçã
dire çãoo ao
ao templo
templo queria
queria ver
ver emem tempo
tempo
oo que
que escondia densas ásperas pesadas paredes
escondia densas ásperas pesadas paredes
dessas lisas tr êmulas vacilosas m
dessas lisas trêmulas vacilosas mãos deslizamãos deslizam
as
as dobras
dobras dodo tecido
tecido duro
duro frio
frio nnããoo vaticina
vaticina oo vento
vento
arrepio sem pensar se move rumo
arrepio sem pensar se move rumo à quina à quina
oo mar
mar revolto
revolto se se revela
revela vento
vento revolvia
revolvia olhar
olhar ee via
via
olhar o mar quebrar em
olhar o mar quebrar em branco branco
sil
silêêncio
ncio aoao mar
mar
aa voz
voz
àà voz
voz volver
volver oo olhar
olhar daquela
daquela
alva
alva voz
voz tenaz
tenaz olhar
olhar fugaz
fugaz contemplar
contemplar
todos
todos os
os anos
anos passados
passados naquele
naquele ato
ato inato
inato
um
um estender
estender aa mmããoo
um
um entender
entender dede fato
fato aa falta
falta
vestida
vestida pelo
pelo manto
manto escuro
escuro vvééuu cobrindo
cobrindo lisos
lisos talos
talos
que
que se
se deslizam
deslizam aaééreos
reos pela
pela alva
alva tece
tece
oo mar
mar medita
medita algo
algo
mar
mar
Amo-te demente
caridoso morrerei
remorsoso e mórbido
culpar-te-ei.
Culpar-te-ás e partirás também
ao imaterial abraço de teu rei
e escravo?
Escravo e rei não hei
de entristecer em meu sofrer
pois me darei
a ti
e a ti possuirei
como tantos, como tantos, por dever
morrerei, morreramos
pelo carma dum caudal impiedoso
e ressuscitaremos
eu pedra
e tu a flor do outro monte que um pássaro
num arco sobre as árvores
trouxe o olor
vago
dissipado pelo vento da manhã
um frescor
ainda um frescor à rocha desventurada
era uma casa muito engraçada
não tinha teto não tinha nada ( v.m.)

aquele que não posso ser está vivendo


não sei o que ele quer na funda noite escura
daquele quarto ao fundo que sequer eu entro
a casa agora estranha e a amada não escuta
a voz daquele eu mudo que agora já não ama

desenvolta ela passeia e se deita em sua cama


e o quarto não clareia e mesmo assim enche de luz
este outro a possui enquanto a casa se revela
antiqüíssima morada de deuses que conduz
aquele eu cego a viver à luz de velas

ver sem velas ou sol imponderáveis nuances dela


casa sem piso oitão ou teto vizinha do infinito
um rociar de eternidade impregna os cômodos disformes
foi tudo ti culpada amada a voltear por cômodos famintos
de não sei quê de além amor a entristecer-te enquanto dormes

com este outro e sem meu toque nos perdoe


luz inconsciente a lumiar o mar profundo
em que mergulha aquele que se diz eu
na busca indefinida de um mapa o mar inunda
cômodos e casa e tudo bóia e se perdeu

do eu amar e amada cômodos e casa e aquele outro


ainda chora o que não sinto e às vezes tem
(tenho certeza) amada em leito seu e amor um pouco
que (náufrago) não sei e luz é assim, às vezes vem...
vela que o vento leva que o vento come
vela suspensa no ar e no escuro mar
vela que voa ao longo do horizonte
vela que incendeia por sobre o monte
vela do desatino do aventureiro
vela que voga a lua na noite cheia
vela inflada de uma lufada
vela inflamável no fim do olhar
vela que vela a luz do plenilúnio
vela da tua vala
vela velha comadre de um sino
vela entre deus e meus olhos
vela que me leva
vela que me lava do escuro breu
vela vento que passou
vela luz que enluou
vela vala de minh’alma
valo do meu corpo
morto
caravela da vida
tênue vela ao vento
ao sopro do vento
que a voa
que apaga
teus olhos são tão sol
que molhas meu sol
quando me olhas farol
que me banha de tanta luz tamanha
tanta cruz estranha

soa no meu sol uma luz tamanha


outra luz de tuas entranhas
outra luz estranha
a tua luz nua
que luze em tua rua
curva e turva e pura
via para as tuas duas luas
que me vias
vias tão estreitas que diante
de tua luz tamanha, estranha nas entranhas
leite puro
são vias leito
leite pleno
impuro
leito plano
lácteas
leite amplo deleito estrelas
estreito
divino leitede estrelas
leito leito profano
entre o teu leite e o teu leito
estrada de sóis
me deito no desamparo
extracto demeluz
no teu jeito de deixar sol
de me deixar sou
as tuas duas luas na minha rua nua
só no descampado
desta luz tua: lua
leite puro leito impuro
leite pleno leito plano
leite amplo leito estreito
divino leite leito profano

entre o teu leite e o teu leito


me deito no desamparo
no teu jeito de me deixar sol
de me deixar sou
só no descampado
desta luz tua: lua
ontem nasceu narciso
fogo de ritos
narciso de amor foge

preso no próprio riso


rio de narciso
de mim não sei se preciso
frio rio de lava
nos lábios de narciso

narciso se vê na fonte
na fronte de todos os mitos
narciso se transforma
estava tão mudo em hades
lodo de muro antigo
pelas frestas
pelas festas de dionísio
um quintal me invade!
tardes de narciso
riso de narciso
siso de narciso
ris?

rio calmo como a morte


rio forte

narciso se vê na fronte
na fonte de todos os mitos
narciso se transforma
era narciso
que falava
fala de narciso
de que falo
era narciso
entre as águas
sai o eco de narciso
pelas ondas
zeros se es
palham — zeus!
da lágrima
de narciso
por um tris
te narciso

narciso se vê na fonte
na fonte de todos os mitos
narciso se transforma
josarrá
quem dera ter do mundo
o silêncio que necessitas agora
em que sentes sede de contemplar
e o teu semblante
destemido a pairar
mal recobres o que descobre ao bulir
em tais sonhos que tens teu olhar
teu olhar, teu pobre olhar
josarrá, mas
há um cheiro negro no ar
que colore os teus sonhos meninos
e redescobre a cada olhar
nos teus cantos, lugares, teu lar
que enraíza o alicerce da casa
e se espalha aos vãos de teu chão
teu piso, e sobes enfim por teus móveis
alcançando por fim teu telhado
tuas vigas de cheiro ocreado
tuas telhas de aranha que vêm que vão
não em vão tua vida emaranha
tantos casos de casa encantada
pelo vão das paredes caminham
caminham tanto e não chegam a lugar
que luares tu queres panhar
josarrá? não te notas, não queres notar
não deves, não podes voar
por teares tecidos de ar
não deves negar tuas cores
teu manto, teus tantos encantos
de uma cor que de cores te enche
solta o pranto que queres chorar e diz
josarrá, diz que o cheiro permeia o ar
que vem de tão longe e tanto tempo a jorrar
e deságua num rompante de dor
desnorteia o poente do sol que brotas
agora em teu sonhar
tua solidão, josarrá
teu amar.
de um lado o lodo da noite
do outro
outro lodo e as gramas putrefatas
vicejando
esta faixa dura e noturna
dividindo o deserto
é uma serpente sem casa
deglutindo metais
e peidando gases
vomitando vísceras
ao pasto de lama
indiferente

tu: reflexo de serpente no olho perdido


no horizonte perdido
vieste para fugir
mas encontraste buscar
e voltas encontrarás
vieste para encontrar

o que por onde passou


nunca deixou atrás
deixou este fino olor quase partido
este calor bafo
e o amargor seco na boca

este vago eco de amor quase um toque de dor


branco do seu palor grito cego de uma flor
alheia do seu compor
pobre de uma só cor
que insetos sabem de cor
foges mas deves voltar
sem nunca
sair deste norte
como nunca saíste do não
norte e não um são
sempre no mesmo lugar
sempre no agora mesmo
que o vento soprar
mesmo
que o norte voar
no entanto a um passo está o norte
no entanto um abismo de morte
desenha entre nós este corte
que o nada só o nada em acorde
transpõe esta linha este forte

apague dos olhos o norte


cale o norte da boca e ouça!
o vento do norte zunir
a sua melodia louca
trazendo o norte pra dentro
soprando na vela rouca
norte
ensaio de morte
de onde voltamos
cada vez mais
deus ateus
cada vez mais
pelo que há de vão
infindo no seio dele
pela música que soa
nadeante no seu silêncio
pelo que ele não é
sendo nas profundezas
pelo desmarcamento
das margens esparramadas
pela marca da fluidez
no seio dos demarcados
apenas eu
sem mim
nesta cidade que me rodeia
sem outros sem si
mudos à minha volta
nesta avenida absorta em si
no seu barulho surdo
ao lençol de silêncio dos olhos
que me olham
de dentro
do meu nada
mais p'ro
fundo do negror de minha ausência
pálidas nuvens passam ignoradas
e sob plácidos lagos serenos
dorme a morte que seremos
e dentro dela
com ela comungando e a corroendo
um átimo de norte dói correndo
e salta
leve brisa raio vento
fogo do pensamento
e fura a vida da avenida
ave em fúria
gula sem nome que nos consome
comida
de nossas feridas

que nos ilumina e a cada pedra destroçada do asfalto


a cada ato ao acaso
ao cheiro de gasolina a cada passo apressado
mal sabe os homens o norte deste instante
da face de joén nos seus semblantes
do urro de prazer dos dois amantes
da flor sem haste que brotou na face
do tempo
sem depois
nem antes
agora
deste norte desnorteante
todo o vento
num momento
todo o tento
num instante

o vento
e seu ventre
aberto
entre dois semblantes
sempre dois movimentos
vendo o abismo deserto
arco precário
istmo arbitrário
centelha dissipada
de vísceras
vácuo
o nada desse buraco
esse sovaco no cerrado
olhar
fixo
de vossas vozes
ávidas de barro
e engasgadas
de catarro
esse pigarro cósmico
semi desnatado
e carcomido
de fragmentos
iaras
e suas árias
aéreas
o norte
e sua sorte
incerta
meus velhos versos de segunda
vento e pássaros relva e rio
dissolvo-me neles na esperança
na esperança como nas lembranças
em que vingo a má ventura
onde perdem-se as razões, a harmonia e a sextina
e o ritmo com as pulsações
dentro e fora
fora-se toda a fluidez
e qualquer pertencimento a entidades obscuras
que passaram a fluir
transe e embriaguez
doçura e tortura
perderam-se, perdi-os e todos se lançaram
e lancei junto com eles
a qualquer alvo
de água, de madeira ou de metal
estou à salvo, não estou
talvez... talvez...
poemas de

*
poeta do gran circo imperial das togas

* PSEUDÔNIMO DE MOREIRA CARDOSO VELHO


não chores amada mia
que choras de amarga a vida
pois saibas que a vida vinha
devindo das idas mias
até que a vida um dia
envia por não sei vias
ao pranto que tão doía
à vida que então se via
sem vida e que só temia
que amargo não cessaria
amada que amar-me-ia não digas amada meiga
que o pranto quer não quer queira
pois saibas amada mia despenca da ribanceira
que a dor do ir existe não chores amada amiga
pois saibas que a dor insiste pois olhas e então me diga
que a vida porém persiste se alguma qualquer ferida
e saibas que amar permite se achou maior um dia
que saibas que embora triste que um dia de alegria
mui triste que o amor existe na vida de amada mia
há chama alegre da vida
maior que a dor da vida
que o sol do meio dia

sabes que a dor existe eu sei


e sabes que o pranto insiste e tens
saberes que a sina é triste e bem
sabes que a dor persiste e vem
vindo demais e tensa e hei
de querer e embora não sei
da dor que existe intensa a lei
que amar de amar e de amar demais
que amar te tenho e te tenho paz
Ora!
Tudo que quero é dizer que amo.
Só um velho como eu pode dizer tal coisa, hoje. Amo-te de um amor menino.
Mas que redundância!
Amo-te Queres coisa mais infantil
De incondicional amor intransitivo Que amar infante?
Como o dos poetas, como tem que ser.
Amo-te simplesmente.
Como o amor dos tolos, de um se dar desmedido. Mas isto também já foi dito por muitos
Como os profetas, cegos de amar e ver. (Por todos os que amam),
Mas não importa para quem ama.
De um amor lascivo como o de animais,
Puro instinto e violência, sangue e gozo. Se algo importasse para quem ama,
Não haveria amor,
O amor do Cristo que me purificais, Como poesia não haveria
Límpido e eterno, cristalino, água e fogo. Se o poeta pensasse antes.
Se o amante pensasse antes
Do amor que flui de dentro para fora, Não haveria amante,
De fora para dentro como o teu olhar em mim. Não haverias tu, amada e exaltada
Por esta alma desarmada, desarrumada.
Do amor que fica, mesmo indo embora, Nem alma, se me permita Deus, havia
Tão dentro e forte ante a distância sem fim Se amor não houvesse.

Da morte ou de um simples ir Pois que amo-te enfim


Para outro cômodo que não sei seguir. Em meio à tempestade
E em princípio é princípio meu amar
Amo-te de um amor impossível, A ti e amando-te transbordar
De impossível exprimir. O amor.
Mas tão impossível E amar a todos e a tudo,
Que nem encontro palavras A mim e amar o amor.
Para vos dizer.
Quem saiba assim o diga Amo-te como quem ama.
Neste sereno não dizer...
noite grande da cidade

casas depois de tantas casas


luzes que ofuscam estrelas
postes e mais postes
teia de fios metálicos
estalando lâmpadas no ar
ruas depois de ruas
teias de ruas sem fim

deste quarto pequenino


o menino magricela
solta a sua imaginação
até o mais longe desvão
mas não há desvão!
cada vão cada vale
vale um pedaço de casa
desta teia de casas até onde?
desta teia que o fio se esconde esta noite tem tanta invenção
destas veias noturnas escorrem luminosa ela tem tanto escuréu
carros roncando pra onde de noite grande
sonha a noite que se move
cada carro pros confins pelos morros ondula a malha de luzes
asfálticos de sua pele há luzes a mais depois dos morros?
morro de vontade dissolver-me
nesta idade nesta cidade nesta sede
de enredar-me nesta rede vede!
noite grande do sertão

vede esta noite longa


larga noite profunda
vede esta noite de redes
vede esta noite de malhas
vede este céu repicado
vede o repisque de estrelas

vede este cheiro de noite


e o cheiro do galho picado
salpicado de orvalho
esta noite picadas escuras
esta cíclica noite de luas
três luas e não lua
vede esta noite sem ruas
deste carro ou desta
o cheiro verde vai entranhando as narinas tapera solta no sertão
a poeira não passa o vento não vem solta o menino a sua ilusão
nem vai nesta noite imóvel que nos cerca de ver o invisível que não sabe
teias de terras teias de verdes teias o indizível que não se vê
de tantos galhos que se cruzam no cruzeiro saindo de si sobre a serrania
teias de quanto mistério quantas grotas sem seu olhar
brotam neste agora
neste instante de noite fulgurante
de formigas fervilhantes e estrelas
sem fim a nos olhar
estalando (em) nossos olhares
de lembrar e de brilhar
noite minha pequenininha

noite contida eu sei


de cada canto seu
cada recanto de breu
ou brilho
noite pequena eu sei

só não sei o porquê de todo dia toda noite


eu não sei mais noite mais íntima sei
onde acabas com as casas
onde as asas se divisam
onde as abas desta noite
só não sei porque estas beiras
me cheiram sem eira nem beira
não sei porque que te beijam
meus beiços com tanto ardor tu és em cada poste cada luz
cada lua e cada estrela
lua cheia de quintal cada telha cada casa
encheste o meu portal e casa-te com cada para-
para o sem fim de mim lelepípedo negro de amor
tão pequeninim que te carrega de dia
noite do meu morrim e se consome de noite no seu fulgor
abraçando-nos brincando-nos de nós
nos nós do futuro
noite o futuro é escuro
quero-te passada luz-minada
o nariz frio do cachorro alegre
e um portão monstruoso
o muro alto
velho
verde de lodo
e descascado

cascas de árvores
e passeios de praças
bicicletas e bolas
bobas meninas
e meninos sonsos
e tristes
alegres e tristes

postes de luzes cinzas


e janelas mortas
e abertas
tortas
ruelas voltas
e voltas
mortas
e tristes

vilas e rodas vivas


e noites
vivas e mortas
manhãs
e tardes quentes
e longas
faz frio na rua nua
frio de batê-quexo
faz cheiro de chuva molhada
vai ter pardal nos fios
vai ter pinguinho nas folhas
que hoje eu sei é orvalho

amanhã de manhã tem frio


tem cheiro de terra fresca
flor de jabuticaba
depois do aguaceiro
tapera é uma espera
no meio do nada
no veio do dia plantada
no seio da noite rebrotada

tapera abando nada


beira de ninguém sem eira
na esteira do musgo
e do lodo na esteira

tapera na capoeira
grota de vaca fugida
greta de visco ungido
fundida no cisco
fugido pro zóio
doído de luz
que tampa a tapera

tapera uma sombra


salpicada de sol
picada de noite
no veio do dia
jurubeba é uma biloca verde
margosa
feito fel
que levada ao céu
da boca leva a boca
ao céu

feito o amor
depois da dor
feita a vida
desfeita de uma ferida

jurubeba é um ensina
dor
jurubeba é um amar
gor

é uma esfera repleta de flor


antes e depois de flor
na embriagada língua
eufórica
sofrida
queimada de antiflor

jurubeba é um desvéu
que desvela
o amargo-doce

é um favo de fel no céu


da boca ávida
de mel

é mel tão apurado que amarga


sou
o que lembro e o que lembro
é mandinga pr’eu ter sido
o que sonhei um dia ido
e dolorido não sei se setembro

não sei se me relembro ou a lembrança


que há de vir ao ar se insinuar
é o enchimento amanhã do esvaziar
que ficou perdido na manhã esperança

acordes pobres de pardais infância


fios de postes das catadupas ignoradas
pela alegria brincando sem nada
pensar sobre as pedras da rua sem ânsia

sobre a perda a distância medita esferográfica


sobre a mesa dos tempos idos só doridos
e sarados neste retraçar florido
de alma velha sem viço pra ginástica

ó pardais e jabuticabas bobos e bolos


cidade natal pós-modernamente em cacos
nesta cabaça podre que a guarda saco
de gatos lentos e sem unhas do desconsolo
Meu coração é uma cidade antiga,
De casas brancas e compridos muros
Com pomares amplíssimos, escuros... (G.X.)

arrasto um punhado de pó
pelas ruas
arauto das casas desertas
e puídas
pelo silêncio e pela treva
carcomida
de luz entrante de uma fresta
(festa de meninos)
gatos conhecem-na biblicamente
entre móveis silentes calmamente
roçam pêlos nas suas entranhas
casa estranha trêmulo vácuo
arrepio de frio sob a tarde de morrinhos
quintal pomar escuro mar de podridão doce
muro de frinchas funcho e hortelã
lã estas redes de madeira teto
tateante alto de barro
piso em falso
um braço de halo
sobra do sol
que arrasto
joaquim papudo
vagueias ruas alheias
paradas vivas
Estes poemas pertencem originalmente ao Ciclo de
Jaiara e foram refeitos entre 2002 e 2005 para se
ler em tela cheia no computador. São versos do
Moreira Cardoso, que desejou o profundo até a morte
(de velho). Aqui, foram travestidos em bytes além
(aquém?) do literário. À margem do literário. Se há
algo que preste nestes (em quaisquer) poemas são as
margens que eles evocam.
Wilton Cardoso
Goiânia 26.11.2005

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