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ARISTÓTELES E UMA VISÃO DE SEUS TRATADOS ÉTICOS

Ernesto Theodoro Krumenauer Filho*


ernesto_teodoro@hotmail.com

1. Contexto histórico aristotélico

Aristóteles nasceu em Estagira em 384-83 a.C. Entrou logo em


seguida na Academia de Platão. Permaneceu na Escola até os 20
anos, tempo que corresponde mais ou menos à data da morte de
Platão (348-47). Segundo o doxógrafo Diógenes Laércio, Platão teria
dito: “Aristóteles calcou-me como os potros calcam a mãe quando os
dá a luz” (apud ABBAGNANO, 1981, p. 191-192).
Fala-se que Aristóteles teria vivido parte de sua infância em
Pela, cidade sede da corte dos reis da Macedônia, e que tenha
herdado de seu pai todo o interesse pelas ciências naturais.
Logo em 343 lhe chega uma proposta do rei Filipe da
Macedônia para que ele se encarregue da educação de seu filho,
Alexandre. Aristóteles aceita o convite e passa a conviver entre os
mestres e os discípulos, construindo com ambos uma sólida amizade.
Quando ocorre a morte de Alexandre, vítima “de seus
excessos”, e a notícia chega a Atenas, Aristóteles, que fora sempre
fiel e grato a favores, viu-se alvo da mais triste ingratidão por parte
da cidade que muito lhe devia por interferência sua junto à corte da
Macedônia.
Em seguida ele é acusado de delito religioso: tributar honras
divinas a um mortal, crime gravíssimo naquela época. Embora se
tivesse alheado da política de Alexandre, alcançaram-lhe as
manifestações do ódio longamente sufocado contra o poderio
macedônio. Aristóteles, então, é condenado à morte por sedição.

*
UNISINOS
Sedição seria uma espécie de revolta do público, ou seja, uma
sublevação contra a autoridade legal.

2. Obras

Comenta-se que Aristóteles teria escrito aproximadamente


quatrocentas obras. Mas só restariam quarenta e sete, sendo
algumas consideradas legítimas e outras apócrifas. Entre as obras
esotéricas chegadas até nós são geralmente consideradas autênticas
as seguintes: Primeiros Analíticos, Segundos Analíticos, Tópicos,
Refutações, Sofisticas, Física, Do Céu, da Geração e da
Decomposição, Metereológicos, Da Alma; os opúsculos seguintes
entre as chamadas Pequenas Obras sobre Ciência Naturais: Do
sentido e das Coisas Sensíveis, Da Memória e da Reminiscência, Do
Sono, Dos Sonhos, Da Adivinhação pelo Sono, Da Longevidade e da
Brevidade da Vida, Da Juventude e da Velhice, Da Vida e da Morte e
Da Respiração Histórias dos Animais, Da Marcha dos Animais, Da
Geração dos Animais, Metafísica, Ética a Nicômacos, Política, Retórica
e Poética, Da Interpretação, Do Movimento dos Animais, Ética a
Êudemos. São consideradas apócrifas: Do Mundo, Do Espírito, Das
Cores, Das Coisas Ouvidas, Fisionômicos, Das Plantas, Das Coisas
Maravilhosas que se Ouvem, Problemas Mecânicos, Problemas, Das
Virtudes e dos Vícios, e Da Economia e Retórica a Alexandre (Ética a
Nicômacos, 1999 p.8- 09).

2.1 O lado ético para Aristóteles

A renomeada ética de Aristóteles chegou até nós por intermédio


de três redações: Ética a Nicômacos, em dez livros; a Ética a
Eudemos, em oito livros; e a Grande Ética, em dois livros. Comenta-
se que a palavra ética significaria “ciência do costume”. Ela também
se tratava de um conhecimento prático, que tinha como objeto
peculiar a ética. Aristóteles distingue alguns pontos, um seria a
dialética filiada ao conceito aristotélico de dianoia, um termo grego
retirado do próprio livro da poética de Aristóteles para traduzir o
tema ou o sentindo global de uma obra literária. Essa suposta dianoia
está então presente em toda a sua obra, mas nunca se revelaria por
parte do conjunto, porque seria a própria totalidade significativa da
obra. A ética de Aristóteles vai ser diretamente ligada a alguns
conceitos fundamentais da Metafísica.

3. Análise dos primeiros livros da Ética a Nicômacos de


Aristóteles

Toda arte e toda indagação , assim como toda ação e


todo propósito visam a algum bem; por isto foi dito
acertadamente que o bem é aquilo a que todas as
coisas visam. Mas nota-se uma certa diversidade entre
as finalidades; algumas são atividades, outras são
produtos distintos das atividades de que se resultam;
onde há finalidades distintas das ações os produtos são
por natureza melhores que as atividades. Mas como há
muitas atividades, artes e ciências, suas finalidades
também são muitas; a finalidade da medicina é a
saúde, a da construção a nau e da estratégia é a
vitória, a da economia é a riqueza. Onde, porém tais
artes se subordinam a uma única aptidão – por
exemplo, da mesma forma que a produção de rédeas e
outras artes relativas a acessórios para a montaria se
subordinam à estratégia, de maneira idêntica umas
artes se subordinam sucessivamente às outras – as
finalidades das artes principais devem ter precedências
sobre todas as finalidades subordinadas; com efeito, é
por causa daqueles que estas são perseguidas . Não
haverá diferença alguma no caso de as próprias
atividades serem as finalidades das ações ou serem
algo distinto delas, como ocorre com as artes e ciências
mencionadas (ARISTÓTELES, Ética a Nicômacos 1999,
livro I, 1094a).
Aqui se percebe claramente que essas primeiras premissas vão
nos servir de proêmio, de introdução ou até mesmo de um principio
ético e de uma própria ligação com a Política escrita por Aristóteles.
Logo em seguida vem o discurso da teoria da virtude, onde
começa uma exposição metódica sobre esse assunto. Seria, por sua
vez, um discurso doutrinário elaborado sobre a base concreta da
historia.
Um exemplo dessa primeira parte da ética ter uma semelhança
com a política é que toda ação tem como finalidade um bem; toda
comunidade se criou tendo em vista qualquer bem; para alcançar o
bem supremo do Estado, que seria, portanto, a agremiação mais
primorosa e maior.

3.1 A Ciência política e a influência dos jovens

Cada homem julga corretamente os assuntos que


conhece, e é um bom juiz de tais assuntos. Assim, o
homem instruído a respeito de um assunto é um bom
juiz em relação ao mesmo, e o homem que recebeu
uma instrução global é um bom juiz em geral.
Conseqüentemente, um homem ainda jovem não é a
pessoa própria para ouvir aulas de ciência política, pois
ele é inexperiente quanto aos fatos da vida e as
discussões referentes à ciência política partem destes
fatos e giram em torno deles; além disso, como os
jovens tendem a deixar-se levar pro suas paixões, seus
estudos serão vãos e sem proveito, já que o fim
almejado não é conhecimento, mas ação. Não fará
qualquer diferença o fato de a pessoa ser jovem na
idade ou no caráter; a deficiência não é uma questão
de tempo, mas depende da vida que a pessoa leva, e
da circunstancia de ela deixar-se levar pelas paixões,
perseguindo cada objetivo que se lhe apresenta. Para
tais pessoas o conhecimento não é proveitoso, tal como
acontece com as pessoas incontinentes, mas para
quem deseja e age segundo a razão o conhecimento de
tais assuntos é altamente útil (ARISTÓTELES, ÉTICA A
NICÔMACOS, 1999, livro I, 1095a).

Aqui, temos a certeza de que os jovens não seriam os mais


aptos a exercer um cargo político, uma vez que eles se deixariam
levar pelas paixões, pelo entusiasmo propriamente dito.
4. O saber teorético e o saber prático

Para Aristóteles, o objeto do conhecimento pode ser classificado


em dois grandes grupos: o saber teorético e o saber prático. O
primeiro trata daquilo que é necessário, incontingente. Dele fazem
parte a física, a matemática, a lógica e a filosofia primeira (que trata
da metafísica e da teologia) (ARISTÓTELES, 1998, 980a – 993a).
O segundo grupo trata das coisas que são contingentes, ou
seja, daquelas que assim são mas que assim poderiam não ser. Este
grupo se divide no conhecimento da práxis2 e da póiesis3. O escopo
da práxis coincide com a deliberação:
No sentido mais geral a pessoa capaz de bem deliberar
é dotada de discernimento... o discernimento não pode
ser conhecimento científico nem arte, pois a ciência se
refere ao invariável e a arte ao fazer (póiesis), não à
ação (práxis). O discernimento é uma qualidade
racional que leva à verdade no tocante às ações
relacionadas com as coisas boas ou más para os seres
humanos (ibidem, 1140a).

É a razão prática, portanto, que deve ser usada nas


deliberações. Até então a filosofia moral só conhecia dois esquemas
antagônicos e concorrentes, a saber, o relativismo sofista e o
essencialismo platônico.

4.1. O homem como medida

Buscando sempre o convencimento das platéias, a máxima que


mais se enquadra a essa prática é aquela proferida por Protágoras de
Abdera, depois definida como “axioma do homo mensura2” : “O
homem é a medida de todas as coisas, daquelas que são por aquilo
que são e daquelas que não são por aquilo que não são” (apud
REALE; ANTISERI, 2002, p. 76). Seu corolário é que: “Assim como
parece para mim cada coisa, assim é para mim e assim como te
parece, tal é para ti: porque tu és homem e homem sou também”
(apud ABBAGNANO, 1955, p. 43) Como apontam Reale e Antiseri:
A virtude que Protágoras ensinava era exatamente essa
‘habilidade’ de saber fazer prevalecer qualquer ponto de
vista sobre a opinião oposta... Para Protágoras,
portanto, tudo é relativo: não existe um “verdadeiro”
absoluto e também não existem valores morais
absolutos (“bens” absolutos). Existe, entretanto, algo
que é mais útil, mais conveniente e, portanto, mais
oportuno. O sábio é aquele que conhece esse relativo
mais útil, mais conveniente e mais oportuno, sabendo
convencer também os outros a reconhecê-lo e pô-lo em
prática (REALE; ANTISERI, 2002, p. 77).

4.2 A busca pela essência do Bem

Expondo o danoso relativismo proveniente do vazio de valores


absolutos, o vigilante raciocínio de Sócrates introduz a máxima de
Delfos4 como um novo passo em direção à virtude. Ela consistia em
procurar em si mesmo, enquanto cidadão da pólis5 e também
enquanto indivíduo racional e livre, um conhecimento verdadeiro e
capaz de basear um ideal de ação.
A busca de si mesmo é ao mesmo tempo busca do
verdadeiro saber e da melhor maneira de viver: em
outras palavras, é ao mesmo tempo busca do saber e
da virtude. Saber e virtude se identificam, segundo
Sócrates (ABBAGNANO, 1955 p. 51).

Platão sistematiza a doutrina de seu mestre na doutrina do bem


supremo, onde o apresenta como a idéia mais perfeita que o mundo
supralunar contém e na qual devemos basear nossas ações6. Imbuído
do conhecimento de si mesmo (desamarrar-se das correntes) é que o
homem alcança esse bem; pela iluminação.7 O ato de conhecê-lo,
para Platão, é condição sine qua non para o agir virtuoso:
Pois, segundo entende, no limite do cognoscível é que
se avista, a custo, a idéia do Bem; e, uma vez avistada,
compreende-se que ela é para todos a causa de quanto
há de justo e belo; que, no mundo visível, foi ela que
criou a luz, da qual é senhora; e que, no mundo
inteligível, é ela a senhora da verdade e da inteligência,
e que é preciso vê-la para se ser sensato na vida
particular e pública (PLATÃO, 2000, livro VII, 517a-e)
4.3 A questão da razão prática e o encontro do fundamento
ético mais sólido

Segundo Platão, para uma virtude suprema é necessário


conhecer algo que sequer sabemos se existe: o bem como essência
única. “Obviamente ele não pode ser algo universal, presente em
todos os casos e único, pois então ele não poderia ter sido predicado
de todas as categorias, mas somente de uma” (ARISTÓTELES, 1985,
1096a). Ou seja, cada atividade humana tende a um bem, a um fim
específico; sendo os fins de uns subordinados ao fim de outros.
Se há um fim mais essencialmente humano que os da
economia, retórica, estratégia, etc, este é o da política (ibidem,
1094b). O homem como zoon politicon8 não tem por normalidade a
virtude suprema nem a deficiência moral, mas sim o meio termo
(mesotes)9, que será chamada por ele apenas de virtude.
Definindo a vida em sociedade como a realização da finalidade
humana, é com vistas à felicidade que dela provém a máxima de que
o homem deve ordenar suas ações, procurando sempre trazer
felicidade à sociedade e a si próprio. É, portanto, por prioridade
teleológica que o bem das outras atividades humanas deve sempre
tender ao que é tido como bem na vida em sociedade. Mesmo assim,
não se pode dizer que Aristóteles busque uma receita universal de
boa convivência, mas sim que o homem procure refletir sobre suas
ações no momento mesmo em que as executa. “Uma ética do
particular voltada para o universal”, nas palavras de Manfredo A.
Oliveira. (1993, p. 58-59)
É no âmbito das atividades humanas (e nos seus “melhores
possíveis”) que devemos procurar a resposta à pergunta “que devo
fazer?”; uma solução que encerra tanto o relativismo sofista quanto o
essencialismo platônico, ambos justificados no meio termo da razão
prática.
4.4. Telos

Só um “objetivo maior” ou um “fim maior” (um telos) pode ser


fundador de uma ética, e este fim é presente na teoria aristotélica: a
felicidade (eudaimonia) como predicado de uma vida perfeita e
íntegra, admirável por toda a polis.

4.5 O hábito como formador da razão prática – o círculo


virtuoso

“As coisas que temos de aprender antes de fazer, aprendemo-


las fazendo-as” (ARISTÓTELES, 1985, 1103b), logo, só podemos
predicar felicidade a um ato depois de sua concretização. “Tornamo-
nos justos praticando atos justos” (loc. cit.). Uma boa formação de
hábitos desde a infância é fundamental para a formação do caráter e
da razão prática.
Para Aristóteles, um ser que ainda é irracional tem desejo e
prazer insaciáveis e generalizados. A tendência a querer saciá-los é
tão violenta que pode aniquilar a própria capacidade de raciocinar.
Por isso sua satisfação deve ser pouca e moderada, não devendo
nunca se opor à razão (ibidem, 1119b). Nesse sistema, portanto, a
virtude alimenta e constrói a razão prática que, por sua vez, constrói
a virtude – e assim temos um círculo virtuoso
O bom funcionamento da razão prática – “A escolha é um
desejo deliberado [...] para que a escolha seja boa, tanto a razão
deve ser verdadeira quanto o desejo deve ser correto, e este deve
buscar exatamente o que aquela determina.” Mas também a
inteligência prática deve perceber a verdade conforme ao desejo
correto. (ibidem, 1139b).
Jacques Maritain contundentemente observa que: “Não existe
sistema moral mais real e autenticamente humanista. E não existe
nenhum sistema moral que mais decepcione o homem” (1955, p.
69). Com o auxílio da razão prática aristotélica, é tão simples quanto
difícil ser virtuoso. Saber como agir é simples, a razão prática nos diz
como. Difícil é querer agir conforme a reta razão.
A virtude anda ao lado daquele que sabe como agir e que quer
agir de acordo com o que sabe – e é exatamente deste desejo que
carece o homem desde a modernidade, pois a ele não é dado um
script ou sinal que lhe oriente para a virtude concreta. O mar de
individualidades em que vivemos padroniza em ondas disformes o
virtuoso curso dos rios que a ele inocentemente correm.

4.6 O guia para o reto agir é o meio termo

Assim como toda exposição ou elaboração de teoria a respeito


de casos particulares, as matérias relativas à conduta nada têm de
fixo. Aristóteles, de família tradicionalmente ligada à medicina e
biólogo por vocação, vê a excelência moral como “constituída por
natureza de modo a ser destruída pela deficiência e pelo excesso [...]
e preservada pelo meio termo” (ARISTÓTELES, 1985, 1104a). Ou
seja, ausência de leis fixas no estudo da conduta é, para ele,
semelhante à das relações do homem com o seu corpo, em que
excessos e faltas na alimentação e nos exercícios pode levar ao
colapso.
A busca do meio termo, ou seja, “agir de acordo com a reta
razão” (ibidem, 1104a) deve ser o princípio geral da ação. Não basta
mais conhecer um suposto “Bem melhor que qualquer outro”, há que
analisar o melhor bem conhecido (conforme dito anteriormente, o
bem que a vida em sociedade aponta), aplicá-lo ao princípio do meio-
termo, à moderação, para aí então agir. “O conhecimento não traz
ética, como ouvir o médico e não agir conforme sua prescrição não
traz saúde.” (ibidem, 1105a)
4.6.1. A deficiência moral é voluntária

Aristóteles classifica como irracional (ibidem, 1114a) a


suposição de que os injustos não desejam sê-lo. São injustos
atualmente porque de início, quando puderam evitar este estado de
coisas, escolheram voluntariamente as formas da deficiência moral
(vício) ao invés do justo meio. Agora que são injustas não conseguem
mais deixar de sê-lo. “Ninguém censura as pessoas feias por
natureza, censuramos aquelas que o são por falta de exercícios e
cuidados” (loc. cit.).

5. As virtudes

O livro IV da Ética a Nicômacos trata de algumas virtudes


encontradas por Aristóteles nos homens virtuosos:

5.1 Liberalidade

É o meio termo no tocante a dar e obter riquezas que sejam


mensuráveis por dinheiro. Os liberais são aqueles que usam melhor
seus recursos que as outras. É, portanto, proporcional às posses e
pode ser resumida na máxima “A liberalidade consiste em dar às
pessoas certas e não obter de fontes erradas” (ibidem, 1119b-
1121a).

5.2. Magnificência

Semelhantemente à liberalidade, se relaciona com a riqueza


porém apenas no tocante aos gastos. A adequação do desembolso é
relativa a quem o faz, as circunstâncias e seu objetivo. É o meio
termo entre a mesquinhez e a vulgaridade ou mau-gosto. Pode ser
resumida na máxima “O resultado deve estar à altura do dispêndio e
o dispêndio à altura do resultado, ou deve até excedê-lo.” Também é
relativa às posses da pessoa que gasta (ibidem, 1122a-1123b).

5.3 Magnanimidade

“Considera-se magnânima aquela pessoa que aspira as grandes


coisas e está à altura delas [...] que seja incapaz de viver em função
de outras pessoas, a não ser de amigos. Que não seja propensa a
elogiar, tampouco falar mal” (ibidem, 1124a-1125a). Quem aspira
menos que merece é pusilânime, quem aspira mais que merece é
pretensioso.

5.4. Amabilidade

É o meio termo entre a cólera e aquilo que poderíamos chamar


de “amabilidade puritana”. Para Aristóteles, encolerizar-se por
motivos justos com as pessoas certas é também uma demonstração
de observância do meio termo (ibidem, 1125b).

5.5 Sinceridade
“Os sinceros merecem mais honras que os jactanciosos e os
falsos modestos” (ibidem, 1125b).

5.6 Presença de espírito

É o meio termo entre a fanfarronice de gracejar a todo o


momento e grosseria ou o silêncio enfadonho. “São dotados de
presença de espírito aqueles que traduzem repentes pertinentes, que
são considerados movimentos do caráter” (ibidem, 1128a).
5.7 A Justiça

A justiça e seu inverso, a injustiça, pode se dar em dois tipos


de relação: uma diz respeito à convivência das pessoas e outra diz
respeito às distribuições (de dinheiro, funções, etc). A primeira,
segundo Aristóteles, é a prática efetiva da excelência moral, ou seja,
em sua plenitude, se constitui pelo agir guiado pela justiça. Ser
injusto é não desejar o bem e o mal na mesma medida (ibidem,
1129a-b).
Outro aspecto importante da justiça é o da proporcionalidade,
não só de quantidades, mas também de qualidades.
Com efeito, a proporcionalidade é uma igualdade de
razões, envolvendo no mínimo quatro elementos: a
razão entre um par de elementos é igual á razão
existente entre o outro par. Nesta acepção o justo é o
meio termo entre dois extremos desproporcionais, o
justo é o proporcional (ibidem, 1131b).

A ação justa é o meio termo entre agir injustamente e ser


tratado injustamente. A injustiça, por outro lado, se relaciona com os
extremos da falta e do excesso.
A justiça corretiva – é feita quando se busca o meio termo
entre a perda e o ganho. Consiste em se ter o mesmo quinhão antes
e depois da ação.
A reciprocidade – A vida em comunidade se baseia em
permutas de produtos e serviços (ibidem, 1133b) entre homens
naturalmente desiguais. Essa relação de reciprocidade não é
necessariamente justa. A relação entre homens justos busca sempre
a proporcionalidade.
O meio mais fácil para obter proporcionalidade é mensurar e
igualizar os produtos das atividades humanas sob uma mesma
medida. Este, e tão somente este, é papel que cabe ao dinheiro.
Liberdade de consciência – Aristóteles se aproxima novamente
de Sócrates ao colocar a voluntariedade presente em um ato como
critério para a censura do agente. “Todo ato praticado na ignorância,
ou que, embora não sendo praticado na ignorância não depende do
agente” e, portanto, “sem deliberação” não é passível de julgamento.
(ibidem, 1135a), onde a palavra “voluntariamente” é usada para
designar “o conhecimento da pessoa em relação a qual se age, o
instrumento e a maneira pelo qual se está agindo” (ibidem, 1136b).

6. Crítica à acusação de elitismo

É patente que virtudes como a magnificência, a liberalidade e


até mesmo a magnanimidade são compatíveis apenas com certa
camada social – aquela que era contemplada pelo pensamento de
Aristóteles: cidadãos gregos livres e suficientemente providos para
manter seu sustento sem trabalho (póiesis). Essa classe social se
constitui hoje em clara minoria, o que transforma, aparentemente, a
ética de virtudes aristotélica em um sistema elitista.
Uma “popularização” da ética das virtudes, no entanto, depende
muito mais da difusão de conhecimento, culto e honra a essa cultura,
além de dedicação pedagógica por parte da sociedade; do que de
uma distribuição de renda que, embora desejável, não é
indispensável para, no mínimo, evitar a falha moral (o pólo negativo
da dialética do meio termo).

7. Ética para a polis global

Dentre as propostas atuais, podemos apontar três linhas como


herdeiras de Aristóteles: o universalismo, o comunitarismo e o
subjetivismo.

7.1 Universalismo
O universalismo pode ser definido como uma busca por valores
universais (transculturais) que possam fundamentar uma guia de
comportamento. Dois autores que trabalham nessa linha, Hans Küng
e John Rawls, podem ser citados.

7.1.1 Hans Küng

Küng, como Tomás de Aquino, esmera-se na busca por


fundamentos morais nas Escrituras Sagradas bem como nas práticas
presentes no convívio das sociedades cristãs. O legado de Aristóteles,
portanto, chega até ele por intermédio de Tomás, isto é, aplicado a
uma cristandade que se encontrava em situação semelhante à que
vivemos atualmente.
Do aquinate, herda a razão prática como exploradora e
organizadora de preceitos éticos que condigam com uma lei natural
(que no caso de Küng deve ser produto de consenso intercultural),
bem como a busca por uma ética que valorize virtudes e não apenas
por normas de ação. Do estagirita, herda a busca pelo bom senso
(meio termo), trazendo para o diálogo inter-religioso e intercultural o
saudável relativismo imprescindível ao entendimento mundial.

7.1.2 John Rawls

O americano John Rawls prega uma teoria de justiça eqüitativa


de maximização dos mínimos, isto é, fortalecimento dos mais
desfavorecidos. Sua teoria pretende revisar o contrato social dos
empiristas, colocando na “posição original” um homem que seja, por
natureza, político. Há, aí, influência de Aristóteles em dois pontos: 1)
a busca pelo meio termo (estratégia de maximização dos mínimos) e
2) a própria ontologia que Aristóteles faz do homem: na perfeita vida
em sociedade estaria finalidade do ser humano.
A teoria de justiça de Rawls constitui sólido apoio a uma ética
global porém descuida de um ponto: sua interculturalidade tem como
pressuposto a democracia como sistema social, o que, para muitos
povos, é apenas um conceito distante, a mais das vezes até
desconhecido. Em busca de uma saída que não fira as liberdades de
cada povo encontramos os filósofos comunitaristas.

8. Comunitarismo

Os comunitaristas colocam a liberdade cultural dos povos acima


de qualquer sistema social, vale dizer, encaram a democracia como
produto da cultura ocidental e, portanto, adequada como medida de
liberdade apenas para a cultura da qual foi gerada
Dentre outros comunitaristas, destacam-se o irlandês Alasdair
MacIntyre e o norte-americano Michael Walzer.
Alasdair MacIntyre em seu livro “Depois da virtude” empreende
rigorosa análise do desenvolvimento da filosofia moral, desde seus
momentos mais rudimentares até os dias atuais. Ele conclui que à
dicotomia presente entre o ceticismo de Hume e a deontologia de
Kant, a teleologia aristotélica do zoon politicon (cuja realização é a
boa vida em sociedade) pode ser resposta conciliadora.
Para o irlandês, só a busca pela virtude no seio da sociedade
pode trazer obrigatoriedade ética, pois
A virtude é uma qualidade humana adquirida, cuja
posse e exercício costuma nos capacitar a alcançar
aqueles bens internos às práticas e cuja ausência nos
impede, para todos efeitos, de alcançar tais bens
(MACINTYRE, 2001, p. 321).
O agente ético, aí, se adapta ao meio em que vive, aos scripts
de sua sociedade e não a regras de valores supostamente universais.
Ao contrário, elas é que são produzidas pela práxis humana.
Em que consiste a unidade de uma vida individual? A
resposta é que sua unidade é a unidade de uma
narrativa expressa numa única vida. Perguntar o que é
bom para mim? É perguntar como devo viver melhor
essa unidade e levá-la a cabo. Perguntar o que é bem
para o homem? É perguntar o que todas as respostas à
pergunta anterior devem ter em comum (ibidem, p.
367).
Sua filosofia moral é, portanto, um redirecionamento quase que
completo a teoria de Aristóteles e, levada à prática, traz à tona
algumas questões: em que polis estamos inseridos? Quem são nossos
vizinhos? Quais virtudes são valorizadas na nossa sociedade?
No capítulo final, MacIntyre exemplifica, com as comunidades
cristãs que se opunham ao império romano nos primeiros séculos de
nossa era, a possibilidade de surgimento de novos agrupamentos
sociais.
De fato, novos ditames morais, distintos daqueles que a massa
costuma usar, parecem cada vez mais necessários para um
desenvolvimento salutar e não uniformizado das culturas humanas
Segundo Walzer, a justiça distributiva têm sido adotada pela
sociedade de diversas formas em diversos arranjos, uma vez que
nunca se viu um meio universal de troca que facilitasse a distribuição
de bens. Mesmo o dinheiro não atinge todas as esferas de ação do
homem (como por exemplo amor, saúde, etc.)
Segundo ele, as esferas são: 1) dinheiro e mercadorias, 2)
profissão, carreira e trabalho, 3) educação, 4) trabalho duro e
perigoso, 5) lazer, 6) afeto e amor (família e casamento), 7) esfera
do sagrado, 8) reconhecimento e 9) poder político. “Cada bem social
ou conjunto de bens sociais constitui... uma esfera distributiva dentro
da qual apenas alguns critérios e arranjos são apropriados.” (WALZER
apud MACEDO, 1997, p.342). Qualquer inobservância na autonomia
intrínseca a cada uma das esferas de ação constitui, portanto, tirania,
com por exemplo, amor pago, amor por interesse, propina, assédio
sexual no trabalho para promoção, etc.
Walzer desenvolve a teoria de que existem dois níveis de
moralidade autônomos e que, um deles, pode ser universalizável.
Trata-se da teoria “Thick and Thin”, segundo a qual os povos
constituem, como uma espécie de solo, um código denso (thick) que
dita punições ou prêmios às ações. Esse solo, no entanto, esconde
raízes morais menos densas (thin) as quais podem ser fundamento
para uma ética global.
O roubo, por exemplo, é imoral tanto na cultura árabe quanto
na cultura cristã, porém a punição ocidental constitui-se na perda
temporária do direito natural à liberdade, enquanto o código
muçulmano manda mutilar o corpo do criminoso buscando eliminar o
órgão transgressor e disciplinar o agente que perpretou a ação
recriminada por aquela sociedade.

9. Subjetivacionismo

O subjetivacionismo vê, a partir das leituras que G. Deleuze e


M. Foucault fazem da sociedade pós-moderna, a inexistência da
liberdade individual na referida sociedade. Chamada por eles de
“sociedade de controle”, é ela que cria as potencialidades de
subjetivação do indivíduo contemporâneo, tolhendo aquilo que
pretendia como base da instituição do Estado moderno: liberdade.
Neste contexto, fazer-se livre constitui um esforço individual, como
era para os gregos da polis: o homem livre era aquele que melhor
comandava a si mesmo, pois a cidade não era formada por sujeitos
livres e sem regras, mas autônomos. A virtude é protagonista nessa
visão, sendo que Foucault, por exemplo, coloca a espiritualidade
platônica e o preceito estóico “ocupa-te de ti mesmo” como centro da
busca pelo fundamento do agir virtuoso:
O que interessava aos gregos era a constituição de uma
ética que fosse uma estética da existência... Pois bem,
me pergunto se nosso problema de hoje não é de certo
modo similar, dado que a maioria de nós não crê que a
ética esteja fundamentada na religião nem desejamos
que um sistema legal intervenha em nossa vida privada
de caráter moral e pessoal (FOUCAULT, 1996, p.11).
A busca estética da existência como formadora da autonomia
parece casar-se perfeitamente com a proposta comunitarista, sendo-
lhe complemento referente à realização pessoal e subjetiva do
indivíduo dentro de sua comunidade.
NOTAS
1
Lógica: estudo do logos (discurso, razão) e de suas leis.
2
Práxis: prática, deliberação, tomada de decisão.
3
Póiesis: arte, tecnologia, técnica, realização da decisão tomada na práxis.
4
Delfos: oráculo grego em cuja entrada se encontrava a máxima “conhece-te a ti
mesmo”.
5
polis: o conjunto dos cidadãos gregos que mantém relações entre si. É a cidade
grega e todos seus componentes.
6
Conforme a Alegoria da Caverna, presente no livro VII de “A República” (p. 514a-
c a 517a-e).
7
Note-se que o conhecimento é, aí, revelado e não produto da pura intelecção.
8
Zoon politicon: Animal essencialmente político.
9
Mesotes: Alguns tratam o termo como “justo meio”. Será adotada esta
nomenclatura nos momentos mais apropriados, tendo em vista que o termo
mesotes abrange muitos significados de uso variado.

Bibliografia

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