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Organização, Recursos Humanos e Planejamento

GESTÃO DE COMPETÊNCIAS E
GESTÃO DE DESEMPENHO:
tecnologias distintas ou
instrumentos de um mesmo
construto?

Hugo Pena Brandão


Mestre em Administração pela Universidade de Brasília (UnB).
E-mail: hugopb@tba.com.br

Tomás de Aquino Guimarães


Mestre em Administração pela FGV/EAESP, Doutor em Sociologia pela USP, Professor Adjunto e
Coordenador do Curso de Mestrado em Administração da Universidade de Brasília (UnB).
E-mail: tomas@unb.br

RESUMO ABSTRACT
Este artigo discute até que ponto a gestão de competências e a gestão This article discusses in what sense competence-based management
de desempenho constituem tecnologias gerenciais distintas ou partes and performance-based management are independent managerial
interdependentes de um mesmo construto. Os autores apresentam uma technologies or parts of the same construct. The authors present a
revisão da literatura sobre os conceitos que permeiam esses modelos literature review upon the concepts of these management methodologies,
de gestão, suas características e aplicações no campo organizacional e their characteristics and applications in the organizational field, and
analisam as principais semelhanças e diferenças entre eles, sendo pos- analyze the main similarities and differences between them. It is possible
sível concluir que, mais que tecnologias independentes, a gestão de to conclude that, more than independent technologies, competence-
competências e a gestão de desempenho parecem complementar-se based and performance-based management methodologies appear to
em um contexto mais amplo de gestão organizacional. Ao final, é pro- be complementary and part of a wider organization management model.
posta uma nova abordagem conceitual que procura considerar a rela- A new conceptual approach, leading to emphasize the interdependence
ção de interdependência entre esses modelos de gestão. relationship between these management methodologies, is proposed.

PALAVRAS-CHAVE
Competência, gestão de competências, gestão de desempenho, gestão estratégica de recursos humanos, tecnologias de gestão.

KEY WORDS
Competence, competence-based management, performance-based management, strategic human resource management, managerial technologies.

8 RAE - Revista de Administração de Empresas • Jan./Mar. 2001 RAESão


• v.Paulo,
41 • v.n.41
1 •• Jan./Mar.
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Gestão de competências e gestão de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo construto?

INTRODUÇÃO nar o reconhecimento social sobre a capacidade de al-


guém de pronunciar-se em relação a determinado as-
A sociedade contemporânea está passando por um sunto e, mais tarde, passou a ser utilizado, de forma
período de grandes transformações sociais, econômi- mais genérica, para qualificar o indivíduo capaz de
cas, políticas e culturais, que resultam num processo realizar determinado trabalho (Isambert-Jamati, 1997).
de reestruturação produtiva. Nas organizações, o im- A preocupação das organizações em contar com in-
pacto dessa reestruturação materializa-se por intermé- divíduos capacitados para o desempenho eficiente de
dio de processos de racionalização organizacional e determinada função não é recente. Taylor (1970) já
técnicas que incorporam ao ambiente empresarial no- alertava, no início do século passado, para a necessi-
vas tecnologias e novos modelos de gestão. Configu- dade de as empresas contarem com “homens eficien-
ra-se como desafio às organizações desenvolver e uti- tes”, ressaltando que a procura pelos competentes
lizar instrumentos de gestão que lhes garantam um certo excedia a oferta. Na época, com base no princípio
nível de competitividade atual e futuro. taylorista de seleção e treinamento do trabalhador, as
As propostas para a obtenção de vantagem competi- empresas procuravam aperfeiçoar em seus empregados
tiva, apesar das diferenças de ordem semântica, pare- as habilidades necessárias para o exercício de ativida-
cem caminhar em uma mesma direção: gestão estratégi- des específicas, restringindo-se às questões técnicas
ca de recursos humanos (Taylor, Beechler e Napier, relacionadas ao trabalho e às especificações de cargo.
1996); gestão de competências (Prahalad e Hamel, 1990; Posteriormente, em decorrência de pressões sociais e
Heene e Sanchez, 1997); acumulação do saber (Arrègle, do aumento da complexidade das relações de trabalho,
1995; Wright, Van e Bouty, 1995) e gestão do capital as organizações passaram a considerar, no processo de
intelectual (Stewart, 1998). Percebe-se, nessas proposi- desenvolvimento profissional de seus empregados, não
ções, a ênfase nas pessoas como recurso determinante somente questões técnicas mas também aspectos soci-
do sucesso organizacional, uma vez que a busca pela ais e comportamentais relacionados ao trabalho.
competitividade impõe às empresas a necessidade de Ao definir competência, Zarifian (1996), por exem-
contar com profissionais altamente capacitados, aptos a plo, faz alusão à metacognição e a atitudes relaciona-
fazer frente às ameaças e oportunidades do mercado. das ao trabalho, baseando-se na premissa de que, em
Nesse contexto, é possível visualizar a gestão de um ambiente dinâmico e competitivo, não é possível
competências e a gestão de desempenho como ins- considerar o trabalho como um conjunto de tarefas ou
trumentos que fazem parte de um mesmo movimento, atividades predefinidas e estáticas. Para esse autor,
voltado a oferecer alternativas eficientes de gestão às competência significa “assumir responsabilidades fren-
organizações. Mas até que ponto esses instrumentos te a situações de trabalho complexas [aliado] (...) ao
representam tecnologias de gestão díspares? Não seri- exercício sistemático de uma reflexividade no traba-
am terminologias diferentes utilizadas para represen- lho” (Zarifian, 1996, p. 5), permitindo ao profissional
tar um mesmo construto? São tecnologias apresenta- lidar com eventos inéditos, surpreendentes e de natu-
das como distintas apenas em decorrência de mais um reza singular.
modismo da teoria organizacional? Sparrow e Bognanno (1994), ao tratar do mesmo
Busca-se, neste artigo, discutir a evolução, as ca- tema, fazem referência a um repertório de atitudes que
racterísticas e as aplicações práticas da gestão de com- possibilitam ao profissional adaptar-se rapidamente
petências e da gestão de desempenho, bem como iden- a um ambiente cada vez menos estável e ter uma ori-
tificar as principais semelhanças e diferenças entre es- entação para a inovação e a aprendizagem permanen-
sas tecnologias, procurando respostas para as questões tes. Segundo esses autores, competências represen-
acima. Pretende-se, dessa forma, contribuir para o de- tam atitudes identificadas como relevantes para a ob-
bate teórico e prático em torno do tema e apresentar tenção de alto desempenho em um trabalho específi-
sugestões de releitura de conceitos. co ao longo de uma carreira profissional ou no con-
texto de uma estratégia corporativa.
GESTÃO DE COMPETÊNCIAS: PRINCIPAIS Existem, ainda, autores que definem competência
CARACTERÍSTICAS E APLICAÇÕES não apenas como um conjunto de qualificações que o
indivíduo detém. Para eles, é necessário também colo-
No fim da Idade Média, a expressão competência car em prática o que se sabe, ou seja, mobilizar e apli-
era associada essencialmente à linguagem jurídica. car tais qualificações em um contexto específico. Dutra,
Dizia respeito à faculdade, atribuída a alguém ou a al- Hipólito e Silva (1998), por exemplo, conceituam com-
guma instituição, de apreciar e julgar certas questões. petência como a capacidade de uma pessoa de gerar
Por extensão, o conceito de competência veio a desig- resultados dentro dos objetivos organizacionais. Para

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Ropé e Tanguy (1997), um dos aspectos essenciais da ser atribuída tanto a um indivíduo quanto a um grupo
competência é que esta não pode ser compreendida de de trabalho. Durand (2000) chama a atenção para esse
forma separada da ação. aspecto ao afirmar que crenças e valores compartilha-
Durand (1998), por sua vez, seguindo as chaves do dos pela equipe de trabalho influenciam sobremaneira
aprendizado individual de Pestalozzi 1, construiu um a conduta e o desempenho de seus componentes.
conceito de competência baseado em três dimensões – Prahalad e Hamel (1990) tratam do conceito no ní-
conhecimentos, habilidades e atitudes –, englobando vel organizacional, referindo-se à competência como um
não só questões técnicas mas também a cognição e as conjunto de conhecimentos, habilidades, tecnologias,
atitudes relacionadas ao trabalho, como mostra a Fi- sistemas físicos e gerenciais inerentes a uma organiza-
gura 1. Nesse caso, competência diz respeito ao con- ção. Assim, competências essenciais organizacionais são
junto de conhecimentos, habilidades e atitudes neces- aquelas que conferem vantagem competitiva, geram va-
sários à consecução de determinado propósito. lor distintivo percebido pelos clientes e são difíceis de
Tais dimensões são interdependentes na medida em serem imitadas pela concorrência. O design de motores
que, para a exposição de uma habilidade, se presume leves da Honda e a capacidade de miniaturização da Sony
que o indivíduo conheça princípios e técnicas específi- são exemplos de competência citados pelos autores. É
cos. Da mesma forma, a adoção de um comportamento possível, portanto, classificar as competências como hu-
no trabalho exige da pessoa, não raras vezes, a detenção manas – aquelas relacionadas ao indivíduo ou à equipe
não apenas de conhecimentos mas também de habilida- de trabalho – ou organizacionais – aquelas que dizem
des e atitudes apropriadas. Abordagens como essa pare- respeito à organização como um todo.
cem possuir aceitação mais ampla tanto no ambiente A gestão de competências pode ser visualizada
empresarial como no meio acadêmico, visto que procu- como uma tecnologia derivada da Resource-Based
ram integrar diversos aspectos relacionados ao trabalho. Management Theory. Essa teoria argumenta que certos
Além do nível individual, o conceito de competên- atributos organizacionais (recursos) são condicionantes
cia aplica-se também à equipe de trabalho e à organi- do sucesso da empresa com relação à concorrência. O
zação como um todo. Zarifian (1996) sustenta que não pressuposto é o de que o domínio de recursos raros, va-
se deve desconsiderar a dimensão da equipe no pro- liosos e difíceis de serem imitados confere à organiza-
cesso produtivo e sugere que uma competência pode ção certa vantagem competitiva (Taylor, Beechler e

Figura 1 – As três dimensões da competência

{
• Informação
Conhecimentos • Saber o quê
• Saber o porquê

COMPETÊNCIA

Habilidades Atitudes
{
{

• Técnica • Querer fazer


• Capacidade • Identidade
• Saber como • Determinação

Fonte: Durand (2000) (adaptado).

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Gestão de competências e gestão de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo construto?

Napier, 1996; Barney citado por Raub, 1998). Essa cor- gestão de carreira e formalização de alianças estraté-
rente sugere, ainda, que a gestão estratégica de recursos gicas, entre outras, para a captação e o desenvolvimento
humanos contribui para gerar vantagem competitiva sus- das competências necessárias para atingir seus objeti-
tentável por promover o desenvolvimento de habilida- vos. Esse processo pode proporcionar a “consistência
des, produzir um complexo de relações sociais e gerar interna da estratégia” (Tilles, 1997, p. 6), ou seja, um
conhecimento, ou seja, desenvolver competências. impacto positivo cumulativo dessas ações sobre o de-
Diversas empresas têm recorrido à utilização de mo- sempenho organizacional.
delos de gestão de competências, objetivando plane- Seria temerário afirmar que o processo de gestão
jar, selecionar e desenvolver as competências necessá- de competências é do tipo top-down, em que as com-
rias ao respectivo negócio. Um modelo sugerido por petências essenciais da organização determinam as
Ienaga (1998) tem como passo inicial a identificação competências humanas, ou o contrário, que esse pro-
do gap (lacuna) de competências da organização, como cesso seria do tipo bottom-up, em que estas determi-
mostra a Figura 2. Esse processo consiste em estabele- nam aquelas. A gestão de competências deve ser vista
cer os objetivos e as metas a serem alcançados segun- como um processo circular, envolvendo os diversos
do a intenção estratégica da organização e, depois, iden- níveis da organização, desde o corporativo até o indi-
tificar a lacuna entre as competências necessárias à con- vidual, passando pelo divisional e o grupal. O impor-
secução desses objetivos e as competências internas tante é que a gestão de competências esteja em perfei-
disponíveis na empresa. Os passos seguintes compre- ta sintonia com a estratégia organizacional (missão,
endem o planejamento, a seleção, o desenvolvimento visão de futuro e objetivos). A visão determina o esta-
e a avaliação de competências, buscando minimizar a do futuro desejado pela organização, sua intenção es-
referida lacuna, o que pressupõe a utilização de diver- tratégica, e orienta a formulação das políticas e dire-
sos subsistemas de recursos humanos, entre os quais, trizes e todos os esforços em torno da captação e do
recrutamento e seleção, treinamento e gestão de de- desenvolvimento de competências.
sempenho. A idéia é que a organização e seus profissi-
onais “eliminem as lacunas entre o que podem fazer e GESTÃO DE DESEMPENHO: PRINCIPAIS
o que os clientes esperam que eles façam” (Stewart, CARACTERÍSTICAS E APLICAÇÕES
1998, p. 84).
Nesse sentido, a gestão de competências faz parte Embora mecanismos de avaliação de desempenho
de um sistema maior de gestão organizacional. Ela toma tenham sido utilizados para o controle dos trabalhado-
como referência a estratégia da organização e direciona res desde a Antigüidade, foi com o surgimento do ca-
suas ações de recrutamento e seleção, treinamento, pitalismo e das grandes indústrias que a avaliação do

Figura 2 – Identificação do gap de competências

Visão dinâmica

Competências
necessárias

Gap0 Gap1

Competências
atuais

Tempo
T0 T1

Fonte: Ienaga (1998) (adaptado).

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Organização, Recursos Humanos e Planejamento

desempenho humano ganhou maior significado. A uti- desvios para assegurar que a execução corresponda ao
lização ampliada de processos e escalas para avaliar que foi planejado (Lucena, 1977; Aluri e Reichel,
o desempenho de empregados tomou corpo com o 1994). O termo gestão dá ao mecanismo de avaliação a
advento do taylorismo, no início do século passado. conotação de um processo que envolve atividades de
As pesquisas de Taylor para a racionalização do traba- planejamento, de acompanhamento e de avaliação pro-
lho deram origem às primeiras escalas de “avaliação de priamente dita (Guimarães, 1998).
mérito”, aplicadas, na época, para disciplinar o traba- As organizações modernas necessitam de mecanis-
lhador e interferir no seu modo de realizar o trabalho. mos de avaliação de desempenho em seus diversos ní-
Ao longo do século XX, a avaliação de desempe- veis, desde o corporativo até o individual, pois, como
nho passou das metodologias de controle dos tempos e sugerem Oliveira-Castro, Lima e Veiga (1996), o de-
movimentos para processos que consideram o empre- sempenho no trabalho é resultante não apenas das com-
gado e seu trabalho como parte de um contexto organi- petências inerentes ao indivíduo mas também das rela-
zacional e social mais amplo (Guimarães, Nader e Ra- ções interpessoais, do ambiente de trabalho e das ca-
magem, 1998). A partir da necessidade das organiza- racterísticas da organização. Um sistema de gestão de
ções de contar com instrumentos para estimular o tra- desempenho, conforme descrito por Guimarães, Nader
balhador a adotar ou reforçar determinadas atitudes, e Ramagem (1998), mostra que, no nível corporativo,
as técnicas de avaliação de desempenho foram sendo o planejamento, o acompanhamento e a avaliação res-
aperfeiçoadas, valendo-se, principalmente, de contri- tringem-se à missão, à visão e aos objetivos macro,
buições das Ciências Sociais. tendo a sustentabilidade da organização como resulta-
No que diz respeito à responsabilidade pela avalia- do esperado. No nível divisional ou funcional, o inte-
ção, por exemplo, essas técnicas evoluíram de um mo- resse recai sobre os objetivos e as metas de cada uni-
delo de avaliação de mão única, por meio do qual o dade produtiva da empresa, visando à eficácia organi-
chefe realizava unilateralmente um diagnóstico dos pon- zacional. No nível grupal, a avaliação concentra-se
tos fortes e fracos do subordinado, para outros modelos, sobre os projetos e processos de trabalho, isto é, sobre
como a avaliação bilateral, em que chefe e subordina- as equipes. Finalmente, no nível individual, o objeto a
do discutem em conjunto o desempenho deste último, e, ser avaliado é o resultado do trabalho do indivíduo, do
mais recentemente, a avaliação 360°, que propõe a uti- seu comportamento no ambiente de trabalho ou de
lização de múltiplas fontes, ou seja, a avaliação do em- ambos. Nestes dois últimos níveis, busca-se a qualida-
pregado por clientes, pares, chefe e subordinados, con- de dos produtos e serviços gerados pela organização.
forme proposto por Edwards e Ewen (1996). Como visto, a gestão de desempenho faz parte de
Assim, diversos têm sido os mecanismos utilizados um processo maior de gestão organizacional, uma vez
pelas organizações para a avaliação do desempenho que permite rever estratégias, objetivos, processos de
humano no trabalho, cada qual procurando desenvol- trabalho e políticas de recursos humanos, entre outros,
ver metodologias adequadas às suas necessidades e fi- objetivando a correção de desvios e dando sentido de
nalidades. Enquanto, na perspectiva funcionalista, a continuidade e sustentabilidade à organização.
avaliação é vista como um processo que visa ao desen-
volvimento de recursos humanos e à melhoria da GESTÃO DE COMPETÊNCIAS VERSUS
performance no trabalho (Goodale, 1992; Lucena, GESTÃO DE DESEMPENHO
1977), na perspectiva crítica, a avaliação é entendida
como um mecanismo utilizado pela organização para Com base na revisão realizada, é possível indagar
exercer o controle psicossocial sobre os trabalhadores até que ponto a gestão de desempenho é algo diferente
(Pagès et al., 1993). da gestão de competências. Ambas as tecnologias pro-
A gestão de desempenho surgiu nos últimos anos põem a necessidade de associar a performance ou as
como um conceito alternativo às técnicas tradicional- competências da organização com as de seus membros.
mente utilizadas para a avaliação de desempenho. Ava- No caso da gestão de desempenho, por exemplo, al-
liar significa, em síntese, comparar os resultados al- guns autores (Guimarães, 1998; Oliveira-Castro, Lima
cançados com os esperados (planejados), de forma que e Veiga, 1996) sustentam que as organizações deveri-
apenas o trabalho previamente planejado deve ser ob- am dispor de instrumentos de avaliação de desempe-
jeto de avaliação. Isso pressupõe não só a comparação nho em seus diversos níveis, do corporativo ao indivi-
entre o que se espera do indivíduo em termos de reali- dual. Da mesma forma, na gestão de competências, as
zação (resultado esperado) e a sua atuação efetiva (tra- proposições de Prahalad e Hamel (1990) e Durand
balho realizado) mas também a existência de algum (1998) seguem o mesmo caminho, sugerindo a exis-
mecanismo de acompanhamento que permita corrigir tência de competências organizacionais e humanas.

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Gestão de competências e gestão de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo construto?

Essas tecnologias de gestão parecem estar baseadas identificar seu gap (lacuna) de competências, tanto
em um mesmo pressuposto: a competência ou o desem- no nível individual como no organizacional. Infere-
penho do indivíduo exercem influência na competência se, portanto, que a identificação de necessidades de
ou desempenho da organização e são influenciados por desenvolvimento de competências acontece por meio
ela. Enquanto a corrente da gestão de competências ar- da gestão de desempenho.
gumenta que a competência humana, aliada a outros re- Um outro aspecto que merece ser considerado é
cursos, dá origem e sustentação à competência organi- a possibilidade de a gestão de desempenho e a de
zacional, os autores que defendem a gestão de desem- competências contribuírem para o que Pagès et al.
penho alegam que a performance no trabalho é resul- (1993) denominaram processos de objetivação e
tante não apenas das competências inerentes ao indiví- individualização do trabalho e, dessa forma, acabarem
duo mas também de atributos organizacionais. constituindo-se em mecanismos de controle social de
A necessidade de associar o desempenho ou as com- trabalhadores e de manutenção das estruturas de poder
petências humanas com o desempenho ou as compe- das organizações. Nesse caso, a objetivação refere-se
tências da organização como um todo faz com que tan- ao processo de traduzir, em termos quantitativos, o
to a gestão de desempenho como a de competências desempenho e as competências do indivíduo, buscan-
estejam inseridas em um contexto de gestão estratégi- do estimar o valor de sua contribuição para atingir os
ca de recursos humanos, entendida como a função de objetivos organizacionais. A individualização, por sua
atrair, desenvolver e manter o pessoal necessário para atin- vez, nada mais é que o reforço ao individualismo como
gir os objetivos organizacionais, por meio da utilização estratégia para evitar a mobilização de trabalhadores
de sistemas de recursos humanos consistentes entre si e em torno de reivindicações coletivas.
coerentes com a estratégia da organização (Taylor, Sob esse ponto de vista, tais tecnologias teriam
Beechler e Napier, 1996). Em outras palavras, as duas uso eminentemente patronal e, mais que instrumen-
tecnologias de gestão propõem integrar os subsistemas tos de gestão estratégica de recursos humanos, re-
de recursos humanos – gestão de carreira, remuneração, presentariam apenas um exercício convencional de
recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, pragmatismo, buscando intensificar o controle social
entre outros – e a estratégia organizacional. sobre o trabalhador. Segundo Legge (1995), certas
Além disso, ambas as tecnologias podem empregar práticas de recursos humanos conferem um aspecto
indicadores relacionados tanto ao resultado do traba- de modernidade aos estilos administrativos, mas, na
lho como ao comportamento ou processo utilizado para realidade, não negam os princípios fundamentais do
alcançá-lo. Quando a gestão de desempenho ocorre no taylorismo e do fordismo nem alteram as estruturas
nível individual, por exemplo, é possível avaliar o tra- de poder nas empresas.
balhador tomando como parâmetro não só os resulta- Hirata (1997) e Spink (1997), por sua vez, afirmam
dos decorrentes do trabalho executado mas também a que os conceitos de competência, desempenho e em-
manifestação, por parte do indivíduo, de conhecimen- pregabilidade2 remetem, sem mediações, a um sujeito,
tos, habilidades e atitudes que se pressupõe serem re- à individualização do trabalho e a efeitos excludentes
levantes para a consecução dos objetivos organizacio- e marginalizadores. Para eles, a possibilidade de con-
nais. Da mesma forma, na gestão de competências, uma centrar a atenção mais sobre a pessoa que sobre o pos-
competência se traduz tanto pelo resultado alcançado to de trabalho e de associar as qualidades requeridas
como pelo conjunto de conhecimentos, habilidades e de um indivíduo fortaleceria a divisão da sociedade em
atitudes necessários para atingi-lo. Observam-se, en- um núcleo “altamente capacitado” (ou competente) e
tão, até mesmo semelhanças conceituais entre compe- uma periferia “desqualificada” e, portanto, excluída do
tência e desempenho. O resultado alcançado (desem- processo produtivo.
penho) representa, em última instância, a própria com- Para se configurarem como práticas gerenciais ino-
petência do indivíduo. vadoras, é possível inferir que a gestão de competências
Outra semelhança é que tanto a gestão de desem- e a de desempenho devam ter como objetivo maior não
penho quanto a de competências presumem um pro- somente a melhoria das performances profissional e or-
cesso que considera a interdependência entre os atos ganizacional, mas, principalmente, o desenvolvimento
de planejar, acompanhar e avaliar. Sob esse aspecto, das pessoas em um sentido mais amplo. Somente assim a
nota-se que os processos inerentes às duas tecnolo- competência e o desempenho representariam, ao mesmo
gias muitas vezes se sobrepõem, parecendo ser com- tempo, um valor econômico para a organização e um va-
plementares. Na gestão de competências, por exem- lor social para o indivíduo. Segundo Zarifian (1999), o
plo, faz-se necessário contar com algum mecanismo desafio é fazer com que a empresa seja não apenas “qua-
de avaliação de desempenho que permita à empresa lificada”, do ponto de vista da competitividade, mas tam-

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Organização, Recursos Humanos e Planejamento

bém “qualificante”, no sentido de oferecer diversas opor- muitas vezes, sendo utilizados de maneiras distintas
tunidades de crescimento a seus membros. Dessa for- tanto no ambiente empresarial como no meio acadê-
ma, seria possível assegurar certa autonomia às pesso- mico. A complexidade do tema tornou a fragmenta-
as, como contraponto ao controle social de que falam ção teórica inevitável, o que parece natural, pois con-
Legge (1995) e Pagès et al. (1993). cepções variadas e até mesmo contraditórias sobre um
A perspectiva sociológica da abordagem da compe- mesmo assunto talvez sejam a representação mais acu-
tência é também explorada por Tanguy (1997), para rada do mundo pós-moderno.
quem os discursos sobre competência proliferam tanto Embora a gestão de competências e a gestão de de-
nas empresas como na esfera educacional. Para ela, “essa sempenho estejam inseridas nesse contexto de fragmen-
noção é invocada tanto pelas políticas de emprego ori- tação teórica, é possível perceber a relação de interde-
entadas pela busca da flexibilidade como pelas políticas pendência existente entre elas. Parece necessária a apli-
de mudança da organização do trabalho ou de gestão de cação concomitante dos pressupostos e processos sub-
pessoal” (Tanguy, 1997, p. 167). Ainda segundo essa jacentes a ambos os instrumentos para integrar e
autora, ao mesmo tempo em que o domínio de uma pro- direcionar esforços, sobretudo os relacionados à ges-
fissão, uma vez adquirido, não pode ser questionado, as tão de recursos humanos. Mais que tecnologias inde-
competências são apresentadas como propriedades ins- pendentes ou distintas, a gestão de competências e a
táveis que devem ser sempre submetidas à objetivação de desempenho parecem complementar-se em um con-
e avaliação dentro e fora do ambiente de trabalho. texto mais amplo de gestão organizacional.
Como instrumentos de um mesmo construto, me-
CONCLUSÕES lhor seria cunhar o termo gestão de desempenho ba-
seada nas competências, uma vez que este considera
O interesse recente sobre a gestão estratégica de o caráter de complementaridade e interdependência en-
recursos humanos deu origem a uma série de teorias tre competência e desempenho. Parece preciso integrar,
e práticas de recursos humanos, fazendo com que con- em um único modelo de gestão, as atividades de pla-
ceitos como o de competência, desempenho e empre- nejamento, acompanhamento e avaliação de desempe-
gabilidade passassem a fazer parte da retórica de mui- nho, a partir de um diagnóstico das competências es-
tas organizações, adquirindo diversas conotações e, senciais à organização, desde o nível corporativo até o

Figura 3 – Processo de gestão de desempenho baseada nas competências

Formulação da
Formulação dos
estratégia organizacional
Identificação e planos

desenvolvimento operacionais
Definição da visão de futuro, de competências de trabalho e
negócio e modelo de gestão internas de gestão
da organização Diagnóstico
das
competências
Diagnóstico das competências
humanas Definição de
essenciais à organização Seleção e
indicadores de
desenvolvimento
desempenho e de
de competências
Definição de objetivos e remuneração de
externas
indicadores de desempenho equipes e
organizacionais indivíduos

Acompanhamento e avaliação

Fonte: Guimarães et al. (2000) (adaptado).

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Gestão de competências e gestão de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo construto?

individual, conforme sugerido por Guimarães et al. vez mais intensos de trabalho com o objetivo de alcançar
(2000), justificando-se, portanto, a reconceituação ou níveis crescentes de produtividade.
releitura de conceitos aqui proposta (ver Figura 3). Para finalizar, é possível inferir que o desafio das
Quando utilizados com a finalidade de objetivação e organizações está relacionado à utilização de tais ins-
individualização do trabalho, esses instrumentos apenas trumentos associados a práticas de aprendizagem cole-
aprofundam o controle psicossocial da organização sobre tiva, desenvolvimento de equipes e gestão do conheci-
seus empregados, o que pode até ser legítimo do ponto de mento, dentre outras, que ofereçam múltiplas oportuni-
vista patronal, mas retira a “roupagem moderna” da ges- dades de crescimento profissional e estimulem as pes-
tão estratégica de recursos humanos. Nesse caso, estaría- soas não apenas a desenvolver coletivamente compe-
mos diante de uma espécie de neofordismo, como o defi- tências mas também a compartilhá-las. Do contrário,
ne Legge (1995), ou de novas formas de controle da mão- esses instrumentos de gestão poderiam até apresentar-
de-obra, sob a perspectiva de uma flexibilidade nas rela- se com uma roupagem moderna, mas, de fato, não re-
ções de trabalho que submete o empregado a ritmos cada presentariam inovações nas práticas de gestão. m

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NOTAS

Os autores agradecem as críticas e sugestões recebidas 1. Henri Pestalozzi (1746-1827), pedagogo suíço, idealizou 2. Empregabilidade diz respeito à probabilidade que pode ter
dos professores Waldyr Viegas e Guillermo Asper, da Uni- a educação como o desenvolvimento natural, espontâneo e um indivíduo à procura de um emprego de encontrá-lo, isto
versidade de Brasília, e do professor Mozar José de Brito, harmônico das capacidades humanas que se revelam na é, refere-se à probabilidade de reinserção no mercado formal
da Universidade Federal de Lavras. tríplice atividade da cabeça, das mãos e do coração (head, de trabalho. Quanto mais qualificado ou competente for o
hand e heart), isto é, na vida intelectual, técnica e moral do indivíduo, maior sua empregabilidade. Ver CASALI, A. et al.
indivíduo. Ver LARROYO, Francisco. História geral da pe- (Orgs.). Empregabilidade e educação: novos caminhos no
dagogia. São Paulo : Mestre Jou, 1974. mundo do trabalho. São Paulo : Editora da PUC, 1997.

RAE • v. 41 • n. 1 • Jan./Mar. 2001 15

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