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Idamis Lescovar

NOSSOS FILHOS - NOSSOS MUNDOS

MONOGRAFIA DE CONCLUSÃO

CURSO DE ANÁLISE BIOENERGÉTICA

ligare
Americana, dezembro de 2001
ÍNDICE

Introdução 01

Objetivos 03

Público alvo 03

Formação do grupo 03

Programação 03

Desenvolvimento dos encontros 04

Desenvolvimento do programa 04

Fundamentação teórica 07

Conclusão 15

Referências Bibliográficas 16

Anexo 1 – Questionário inicial 19

Anexo 2 – Terceiro encontro: Reconhecimento do Eu 21

Anexo 3 – Oitavo encontro: Agressividade 23

Anexo 4 – Nono encontro: Rivalidade entre irmãos e ciúmes 25

Anexo 5 – Décimo primeiro encontro: Contos de fadas 26


PROJETO
“NOSSOS FILHOS - NOSSOS MUNDOS”

Introdução

Após vários anos de trabalho em algumas instituições 1 , e em consultório


particular, pude observar a dificuldade dos adultos em compreender o universo infantil.
Tanto os pais, em casa, como os educadores 2 , em suas atividades de trabalho,
deparam-se com dificuldades em relação às crianças, seja por falta de informação ou
por dificuldade pessoal em abordar algum conteúdo específico com elas. Um exemplo
bastante usual é o tema da sexualidade. Apesar de toda informação, distorcida ou não,
veiculada pela mídia atualmente, esse assunto continua sendo muitas vezes intocado
pelos educadores. Outros temas, como limites e agressividade, também são foco de
grande interesse.
A partir de dificuldades trazidas a mim por estes, elaborei o programa
“NOSSOS FILHOS NOSSOS MUNDOS”, que visa ampliar o repertório teórico e
vivencial dos educadores. Elaborei um projeto para ser desenvolvido em grupo, com
grande ênfase no aspecto vivencial, para que a teoria possa ser entendida a partir da
prática.
Escolhi trabalhar em grupo, pela riqueza de troca de informações, pela
amplitude de ações e pela possibilidade de custo mais baixo que o trabalho individual.
O modelo adotado baseia-se na psicoterapia breve, onde trabalho um foco -
educação infantil - em um tempo pré-determinado - 13 encontros semanais -
totalizando 3 meses de trabalho.
Parto sempre de um ponto de vista clínico, isto é, daquela que irá intervir a partir
de um desenvolvimento perturbado da criança, atuando junto a ela e à família, na
tentativa da compreensão e, se possível, da resolução do problema.
Observo que a maioria dos educadores, ao invés de querer entender as crianças
em seu universo infantil, procura a ajuda psicológica para que “seja dado um jeito”
para adaptá-las, pois apresentam um comportamento inadequado ao convívio em
sociedade.

1
Clínica Psicológica Ana Maria Poppovic, Intermédica São Camilo (Ambulatório de Ginecologia),
Centro de Saúde Municipal de Piracicaba e Escola de Educação Infantil Primeiros Tempos.
2
Entendo como educadores todos aqueles que têm por objetivo educar, portanto pais,
professores, pedagogos, diretores de escolas, psicólogos, médicos, nutricionistas, dentistas,
enfermeiros, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, babás etc.
Buscam a adaptação, interessando-se muito pouco pelos motivos pelos quais as
crianças se comportam, naquele momento, daquele jeito, e menos ainda se
questionam sobre a qualidade da relação que estabelecem com elas.
Na entrevista inicial, alguns se queixam da agressividade excessiva,
desorganização, hiperatividade, birras constantes, denunciando uma criança “ativa
demais”. Outros reclamam da falta de interesse dos filhos pela vida, pouco
relacionamento com outras crianças e insegurança, medos excessivos, indicando uma
criança “ativa de menos”.
Fico me questionando como essas crianças montam esses processos de defesa.
Com o quê elas se deparam, ao longo de seus relacionamentos, para padronizar, se é
que haviam padronizado precocemente seu comportamento.
Questiono também, essa padronização, nesse momento do atendimento, pois
esse adulto poderá estar sendo tendencioso ao olhar para aquela criança.
Solicito então, que os pais me dêem exemplos de como lidam com os problemas
descritos acima, e cito algumas frases para exemplificar a tentativa em dar limites,
baseado na crença de se educar as crianças.
“Lá em casa se eles não me obedecem, eles obedecem ao Piaget. Piaget é o
nome do meu chinelo”. Engenheiro, professor universitário, 3 filhos, comentando sobre
a educação rígida que dá a eles.
“Cala a boca, se não eu quebro os seus dentes com meu tapa”. Mãe, engenheira,
contando como lidou com a ousadia do filho de 7 anos ao questionar as regras da casa.
“Criança não tem que achar nada, tem que obedecer”. Comentário feito por um
estudante universitário, pai de dois filhos, um menino de 6 e uma menina de 4 anos,
em um grupo de orientação para pais.
“Comporte-se, se não eu mando o bicho papão comer você de noite”. Engenheiro,
dirigindo-se a sua filha de 2 anos e meio, quando ela tentava subir em uma cadeira.
“Você é feio, não gosto mais de você”. Mãe, pedagoga e aeromoça, tentando
educar seu filho de 4 anos que não se deve arrotar em público.
“Enquanto você não fizer isso sem erro, eu não deixo você sair do seu quarto”.
Pai, engenheiro, contando como tentou fazer que a filha de 3 anos e 10 meses
arrumasse seu quarto.
“Seja bonzinho porque o papai do céu está vendo tudo de mal que você está
fazendo agora”. Avó, segundo grau incompleto, contando como tentou dissolver uma
briga entre os netos de 5 e 6 anos.
“Você é um burro mesmo, não faz nada direito”! Avó, dirigindo-se ao seu neto de
4 anos quando ele derrubou um copo de água sobre a mesa, em atendimento
psicológico, mostrando-me que ela se importava com o que ele fazia.
“Cale a boca, se não Jesus castiga”. Mãe, pedagoga, na tentativa de fazer seu
filho de 4 anos parar de falar em uma missa.
“Não dê colo ao seu filho porque ele pode acostumar”. Pediatra, aconselhando
uma mãe com seu primeiro filho de um mês, em relação aos choros noturnos.
“Se você não parar quieto, enquanto eu falo com a doutora, eu falo para ela lhe
dar uma injeção”. Mãe, primeiro grau incompleto, tentando controlar seu filho de 6
anos e meio na primeira entrevista psicológica.
“Não mexa aí, hem que eu te levo para o dentista”. Mãe, primeiro grau
incompleto, tentando dar limite ao filho de 3 anos.
“Sei que minha filha não tem limite. Ela é igualzinha a mim. Então, vê se você dá
limite a ela porque eu não vou dar e o pai já desistiu dela”. Mãe, segundo grau
incompleto, solicitando-me na entrevista inicial, que eu fizesse algo em terapia com
sua filha de 17 anos.
Todas as frases acima indicam a tentativa de colocação de limite às crianças, o
problema é como colocar esse limite, quando e com qual intensidade.
Procuro com esse trabalho propor uma forma de trabalho com os educadores,
que os possibilite ir ao encontro de sua criança interna e a partir desse referencial, de
sua própria história, promoverem um encontro mais autêntico com as crianças com as
quais convivem.

Objetivos
• Proporcionar aos educadores uma oportunidade de convívio com outras pessoas
que passam por conflitos semelhantes.
• Vivenciar situações que possibilitem aos educadores um maior encontro com eles
mesmos, promovendo a reflexão e a ampliação da consciência.
• Proporcionar-lhes, de forma simplificada, uma maior compreensão da dinâmica
infantil, através das fases de desenvolvimento emocional das crianças, à luz da
psicanálise.
• Intensificar a intimidade entre educadores e crianças, conscientizando-os de suas
próprias reações em relação às atitudes das crianças.

Público alvo

O programa está aberto a pais, professores, diretores de escolas, médicos,


psicólogos, fisioterapeutas, dentistas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, juízes,
advogados, arquitetos, enfim a quem de uma forma direta ou indireta se relacione com
crianças e adolescentes em sua vida pessoal ou profissional.

Formação do grupo

Cada grupo deve ser formado no mínimo com 4, e no máximo com 8


integrantes.

Programação

O programa se desenvolve ao longo de 13 encontros semanais, de 3 horas de


trabalho por semana, mais uma entrevista inicial, individual, de uma hora. Totalizando
40 horas de curso.

• 1o encontro: Apresentação do programa, agendamento das entrevistas e


pagamento.
• 2o encontro: Formação do grupo e re-conhecimento da família
• 3o encontro: Re-conhecimento do “EU”
• 4o encontro: Lugar materno, lugar paterno. Lugar do filho?
• 5o encontro: Sexualidade Infantil
• 6o encontro: Formação de consciência e limites
• 7o encontro: Medos
• 8o encontro: Birras e agressividade.
• 9o encontro: Rivalidade entre irmãos, ciúme
• 10o encontro: Tema livre
• 11o encontro: Contos de fadas
• 12o encontro: Brincadeiras
• 13º encontro: Como deixar o meu filho crescer/ A conquista da independência.

Desenvolvimento dos encontros

Cada encontro é subdividido em 3 partes: seguindo o modelo da curva orgástica de


Reich.
1- Aquecimento do grupo: alongamento e exercícios de bioenergética para
promover uma maior circulação de energia (momento de tensão-carga).
2- Encontro com o tema: vivência com utilização de técnicas do psicodrama,
terapia expressiva, gestalterapia, jogos cooperativos e exercícios de
bioenergética, com o objetivo de ampliar a consciência dos membros do grupo em
relação ao tema abordado (topo da curva- auge da exitação).
3- Discussão e teoria.
Papel dos participantes: refletir sobre a vivência do dia, trocar experiências com
outros participantes e estabelecer relações entre a vivência e sua vida(momento de
descarga e relaxamento).
Papel da coordenadora: Focar o tema abordado, levantar questões, ajudar os
membros do grupo a relacionarem fatos trazidos por eles e introduzir subsídios
teóricos para a discussão.

Desenvolvimento do programa

O programa segue uma ordem encadeada para desenvolvimento do grupo.


Cada encontro é pré-requisito para o próximo, portanto ele não poderá ser
freqüentado somente nos dias de maior interesse. Didaticamente ele está dividido em
três partes. Seguindo novamente o modelo de curva orgástica.
• Os 4 primeiros encontros: integração do grupo.
• Os 6 seguintes: discussão dos problemas.
• Os 3 últimos encontros: integração entre os temas e dissolução dos problemas.
No 10 encontro, Apresentação do Programa, eu me apresento, apresento o
programa, a minha forma de trabalho, as especificidades para o desenvolvimento do
programa (enquadramento), recolho o questionário individual (anexo 1) e agendo as
entrevistas individuais.
Antes do segundo encontro as entrevistas são realizadas.
No 2º, 3º e 4º encontros trabalho com a formação do grupo e construção da
confiança entre os participantes, ao mesmo tempo em que abordo temas presentes na
vida das pessoas antes da chegada do filho, aluno ou cliente.
No 2º encontro, Re-conhecimento da família, proponho que cada um faça a
árvore genealógica do filho (4 gerações). Caso não o tenha, peço que faça a sua
própria árvore.
O objetivo dessa vivência é que os membros do grupo possam olhar para sua
história dentro de um sistema familiar. Formulo algumas perguntas para reflexão:
Como essas famílias criavam seus filhos? Quem era amistoso, paciente, amoroso,
atencioso? Quem era irritadiço, intolerante, severo, bravo? Com quem você se
identificava mais? De quem você tinha horror?
No 3º encontro, Re-conhecimento do Eu, trago para foco como se deu o
desenvolvimento daquele educador a partir dessa família de origem. Utilizo para isso a
vivência do “desenvolvimento do bebê” (Anexo 2), para reconhecer o seu corpo e
posteriormente irem em busca de contato com outras pessoas, a partir do ponto de
vista de um bebê.
Através do olhar desse educador para sua história, procuro despertar uma
afinidade entre eles e as crianças com as quais convivem.
No 4º encontro, Lugar paterno, lugar materno. Lugar do filho?
Nesse encontro procuro trazer em pauta as funções parentais. Através da
vivência e das perguntas abaixo, procuro estimular o interesse pelo tema.
Os papéis paterno e materno estão sendo transformados ultimamente? Como
estão sendo articulados? A entrada da mulher no mercado de trabalho promoveu o
desenvolvimento da família ou legitimou o abandono das crianças? Como o homem
atual se vê e se coloca diante de uma mulher forte e decidida? Como são distribuídas
as atividades do dia a dia dentro de sua família? Quais as mensagens implícitas desta
distribuição? Qual o local físico reservado para as crianças dentro de casa? O quarto
delas? A casa toda? As crianças dormem no quarto dos pais? Os pais dormem no
quarto das crianças?
A vivência utilizada é a “condução do cego”. Em duplas o primeiro integrante
conduz e o outro é conduzido pela sala com uma venda nos olhos. Eu coloco
obstáculos ao longo do percurso. O paralelo traçado entre “cegos” e crianças é
imediato. Dependendo do padrão de comportamento de quem conduz, o conduzido é
estimulado a enfrentar ou desviar dos obstáculos. O que procuro explorar é como se
dá o controle, a possibilidade de exploração e a confiança.
No 5º encontro, Sexualidade Infantil, trabalho um dos grandes eixos da teoria
psicanalítica freudiana, que são as fases do desenvolvimento sexual infantil, formação
da identidade e dissolução do Complexo de Édipo, através de uma dramatização das
fases oral, anal, fálica, latência e adolescência, além de trocar informações sobre as
tão freqüentes perguntas sobre sexualidade.
No 6º encontro, trabalho com um tema que é muito atual: limites. O conflito
subjacente é: “em que medida devo dar limite, será que estou sendo rígido ou
permissivo demais, quais as conseqüências do meu comportamento como educador a
longo prazo”? “Se eu não der limite será que a escola não se incumbe de ensinar meu
filho, ou quem sabe a vida”?
No 7º, 8º e 9º encontros, abordo os temas que constantemente me chegam
como dúvidas e inquietações.
No 7º encontro, Medo, utilizo dois textos para leitura em sub grupos e
discussão, retirados do livro Os Anos Mágicos (Fraiberg, 1980; pags. 30 e 37,
respectivamente). O primeiro é “O tigre risonho”, que trata da elaboração do medo de
uma criança da sua agressividade e o segundo “O bebê cientista” aborda a elaboração
do medo de uma cirurgia e conseqüentemente da morte, através do desmontar e
montar relógios. Dois exemplos de superação do medo através de recursos próprios e
singulares de cada criança.
No 8º encontro, é abordado o tema da Agressividade. Trabalhar com esse tema
é surpreendente, pois os educadores chegam com a expectativa de extinguir o
comportamento agressivo das crianças. Ao contrário da expectativa manifesta,
estimulo que cada integrante sinta sua agressividade latente. Em duplas, com as
palmas das mãos frente à frente, um diz sim e o outro diz não e sente como é
mobilizado internamente. Terminado o primeiro bloco inverte-se as palavras e repete
o exercício. Eles sentem calor, força, raiva, controle, ironia, impotência, frustração e
vergonha. Uma vez detectados esses sentimentos, peço-lhes para que escrevam ou
desenhem o que teriam vontade de fazer se fossem crianças com raiva. Não trabalho
intensamente para que não entrem em processo, então, depois das anotações e
registros dou encaminhamento para a discussão. O anexo 3 contém alguns tópicos
para discussão.
A idéia subjacente é que para se trabalhar a agressividade das crianças é
necessário entender a causa, reconhecer o sentimento, dando nome a esse sentimento
e permitir a expressão através de formas adequadas. Há muitas formas para dar vazão
adequadamente, como, por exemplo, beliscar a argila, socar almofada, fazer guerra de
almofadas, rasgar papel, bater em boneco, encenar ser o lobo mau ou a bruxa etc.
A tarefa mais complexa nesse tema é entender e aceitar as causas da
agressividade, pois na maioria das vezes a agressividade é uma resposta ao
comportamento dos educadores. Nesse processo encontramos muitos mecanismos de
defesa como negação, projeção e formação reativa por parte desses.
No 9º encontro, Rivalidade entre irmãos e ciúmes, a vivência utilizada é o
“cabo de guerra”, dizendo “é meu” puxando uma toalha torcida.
Peço que se lembrem como eram as rivalidades na disputa por namorados e
com os irmãos ou primos e a solução que destinavam no passado e olhando para a
situação hoje, como seria a sua reação. O anexo 4 contribui com algum subsídio
teórico.
No 10º encontro, “tema livre” são possíveis diversas possibilidades. Podemos
discutir um novo assunto ainda não abordado ou podemos fazer uma retomada de
tudo já visto anteriormente, de uma forma mais integrada. Com esse encontro
encerramos os temas das problematizações propriamente ditas e fazemos a ligação
destas à dissolução dos problemas.
Os 3 últimos encontros têm por objetivo mostrar alguns caminhos de trabalho
prazerosos com as crianças e que ao mesmo tempo possibilitem um desenvolvimento
natural destas. Estes visam trabalhar a integração de todos os temas do programa e
dar uma conclusão à teoria, uma possibilidade de trabalho com as crianças e um
encerramento para o grupo.
No 11º encontro, Contos de Fadas, os integrantes do grupo dramatizam o conto
“João e Maria”. (Descrito no anexo 5). Escolhi esse conto pela variedade e
singularidade de cada personagem. Utilizei a abordagem Junguiana para interpretação
em função da ampliação simbólica. Acredito que os contos de fadas promovem a
integração da personalidade, podendo relacionar todos os aspectos dela. Chama-me
atenção como estes perderam espaço, dentro do universo familiar, para a TV , vídeo
game, jogos de computador e mais recentemente para a internet.
No 12º encontro, Brincadeiras, fazemos um levantamento dos jogos e
brincadeiras de infância e brincamos. Viso com isso aumentar o repertório de
possibilidades de brincadeiras de quintal e de salão, utilizando o corpo como
instrumento de prazer para promover uma integração entre educadores e crianças no
convívio diário.
Alguns dos jogos relembrados foram:
• Jogos de quintal: ordem, alerta, morto-vivo, queimada, salada-saladinha (corda),
dança das cadeiras (tirando cadeiras e permanecendo o mesmo número de
participantes), amarelinha, mãe da rua, mamãe polenta, barra manteiga, corre
cotia, toca do coelho, cabra cega, balança caixão, pião etc.
• Jogos de salão: passa anel, mês, gato-mia, macaquinho mandou, stop (com papel
e lápis), telefone sem fio, 5 marias e estátua entre outras.
No 13º encontro, Como deixar o meu filho crescer/ A conquista da
independência, é o fechamento onde as pessoas trazem suas próprias reflexões sobre
suas questões pessoais. É proposto que façam um desenho com o tema: O que ficou
para você do programa?

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Na família medieval a educação se dava através da aprendizagem. As famílias não
conservavam suas crianças nas próprias casas, enviavam-nas para outras famílias,
com ou sem contratos, para que começassem suas vidas, aprendessem um ofício, que
freqüentassem uma escola, ou que aprendessem as letras latinas. O trabalho
doméstico e a aprendizagem confundiam-se.
A criança também era vista como um entretenimento para os adultos, como diz
Montaigne: “ainda se compreende o gosto pelo pitoresco e pela graça deste pequeno
ser, ou o sentimento da infância engraçadinha, com que nós, adultos, nos divertimos
para o nosso passatempo, assim como nos divertimos com os macacos”, citado por
Ariès, 1986; p.58.
Esse distanciamento em relação às crianças se dava em parte pela alta mortalidade
infantil, não se apegava a quem poderia se perder com facilidade.
A partir da obra Emille, de Rousseau, a criança começou a ser vista pelos
intelectuais da época, não mais como uma miniatura dos adultos, mas com um lugar
diferenciado. Ainda nesse momento as crianças eram amamentadas pelas amas de
leite, mas esta passou a se deslocar e ir até as famílias para morar com elas, até o
momento em que os processos de higiene e assepsia permitiram utilizar sem riscos o
leite animal. Isto é até o fim do século XIX.
Um século depois, em 1905, Freud, escreve Três ensaios sobre a teoria da
sexualidade, onde discorre sobre a sexualidade infantil, num momento em que mal se
falava sobre a sexualidade adulta. A partir da psicanálise freudiana, novas abordagens
teóricas foram sendo investigadas e desenvolvidas.
É importante salientar o processo de desenvolvimento psico-social no qual a
criança passa a ser inserida, isto é, a infância passa a ter importância para a formação
do futuro adulto.
Freud dizia que a criança não é um ser sexual neutro, mas é menino ou menina.
Esta é mais uma contribuição psicanalítica, no sentido de uma diferenciação sexual.
Nesse momento, a criança pode ser vista sendo diferente do adulto e apresentando
uma diferença entre os sexos.
A seguir, exploro essas fases do desenvolvimento.

FASE ORAL (0 a 1 ano)

A região de prazer é constituída pela boca e lábios.

Fase Primitiva:
Primeiro a criança chupa para se alimentar e depois para obter satisfação e
prazer (chupa o dedo, chupeta, fralda etc.).
Fase tardia:
Com o nascimento dos dentes e o desmame. A criança também passa a
morder.
A criança sente a mãe como seu prolongamento, pois é egocêntrica (nos 3
primeiros meses). O envolvimento afetivo criado entre mãe e filho, nesse momento, é
muito intenso. Por um lado pela desproteção e total dependência da criança à mãe, e
por outro, pelo preenchimento de um desejo de ser mãe. A essa mútua dependência
dá-se o nome de processo simbiótico.
Mamar é a primeira forma de prazer que a criança alcança com seu próprio
esforço.
Mais do que matar a fome e a sede, mamar, para o bebê é a inauguração da
capacidade de se relacionar com o mundo. É o primeiro vínculo de carinho com a mãe.
Os sentimentos de amor e ódio, que são inatos ao ser humano, também já
estão presentes. O amor da criança se manifesta como resposta à gratificação de seus
desejos (sentimentos de conforto físico e emocional –ex.: saciedade de fome, sensação
de conforto com a troca de fralda, sentimento de aconchego ao ser pego no colo e
embalado para dormir, supressão da dor etc.).
O ódio se manifesta em forma de agressão, como reação à frustração.
Quando a criança não é atendida no que deseja ou no momento em que deseja. Ex.:
alguns choros, mordida, jogar objetos.
É um período de grande desenvolvimento físico, a criança passa de uma
total dependência do adulto para conquistas de independência e de locomoção
(engatinhar, andar).
Há uma ausência de limites somada a uma intensa manifestação dos
impulsos de busca pelo objeto externo.
As relações de confiança da fase oral atualizam a imagem da mãe.
FASE ANAL (1 A 3 ANOS)
A região de prazer é prioritariamente o ânus. A obtenção do prazer é dirigida e controlada pela
criança.
O prazer nasce quando as fezes deslizam pelo orifício anal.

É nessa fase que ocorre o controle esfincteriano (controle neurológico e


muscular para expelir ou segurar o xixi e o cocô). A criança passa a produzir,
controlar e doar algo para o mundo (cocô). Ex.: dar cocô de presente para a mãe.
Há um grande desenvolvimento motor, o que leva a uma maior autonomia da criança. Ela
aproveita sua autonomia adquirida para fazer cocô quando e onde quer, e começa a controlar o ambiente.
As relações de autonomia são rudimentos das relações de conquista, por isso atualizam a figura do
pai.

Nasce então, a interação conflitiva entre criança e educadores, pois estes se


defrontam com uma criança com desejos próprios e já com mecanismos para
consegui-los (aquisição da marcha). (A criança, nesse momento, ainda é regida pelo
Princípio do Prazer (o Ego alia-se ao Id), e não tem suficientemente introjetado o
Princípio da Realidade para não se “meter em apuros” concretos do dia a dia, como
subir em cima de mesa com tampo de vidro, colocar a mão no forno ligado, beber
desinfetantes, enfiar o dedo no formigueiro etc.).
Acentua-se o processo de diferenciação EU x OUTRO e o interesse pela
descoberta do sexo masculino e feminino, “menino tem pipi”, “menina tem xoxota”, “
menino faz xixi em pé”, “ menina faz xixi sentada”.
A aquisição da fala confere à criança, também, uma maior autonomia e
independência.
Os limites passam a ser introjetados a partir da colocação clara dos NÃOS à
criança, por parte dos educadores.

FASE FÁLICA (3 a 6 anos)

O objeto de curiosidade é o pênis, tanto para os meninos como para as


meninas. O grande marco desse período é a relação triangular: pai, mãe e filho.
A criança deseja o progenitor do sexo oposto e tem no progenitor do mesmo
sexo um “rival”, já que este é parceiro do primeiro; mas, ao mesmo tempo, nutre
sentimentos bons em relação a este progenitor (o do mesmo sexo), o que gera
conflito para ela.
O que leva a criança a renunciar ao desejo pelo progenitor do sexo oposto é a
soma de alguns fatores:
• proibição do incesto (presente em todas as culturas);
• os sentimentos bons em relação ao progenitor do mesmo sexo;
• no menino, o medo da castração.
A esses sentimentos confusos e contraditórios dá-se o nome de Complexo de
Édipo. Esse processo leva a uma identificação com o progenitor do mesmo sexo e
aquisição de valores masculinos para o menino e femininos para a menina.
É uma fase em que as meninas “tramam o que podem” para ficarem sozinhas
com os pais ( do sexo masculino). Passam batom, colocam enfeites, sapatos de salto,
usam bolsinhas e chamam os pais de: “marido”, “meu príncipe”, “meu namorado” e
dizem que vão se casar com eles.
Os meninos se identificam com brincadeiras com espadas e lanças (dentre
outras), e pedem às mães para se casarem com eles.
É normal vermos as crianças, nessa faixa etária, brincando de médico. A
curiosidade pelo seu corpo e o corpo dos outros é marcante.
Ocorre também a aquisição da consciência, quando a criança introjeta as
leis da cultura onde vive (formação do Superego). Torna-se um ser social, que tem
que ceder frente a determinadas situações exigidas pela realidade (função do Ego), e
ao mesmo tempo considerar suas necessidades internas (vindas do Id).
O Ego (regido pelo Princípio da Realidade) estabelece uma formação de
compromisso entre o Id (regido pelo Princípio do Prazer) e o Superego.
Podemos dizer que a formação do Superego atualiza a figura do pai.

FASE DE LATÊNCIA (6 anos até a puberdade)


A energia é desviada da finalidade sexual; é canalizada e dirigida para a
aquisição da cultura e para o estabelecimento das relações amigáveis nos meios
familiar e escolar (sublimação).
A sede pelo saber coincide com a fase escolar e o domínio da escrita e da
leitura. A criança se sente valorizada por saber ler e escrever sozinha gosta de fazer
contas matemáticas e se empenha em contar histórias intermináveis. Ela se interessa
em acumular novos conhecimentos e adquirir instrumentos que lhe permitam
relacionar-se de igual para igual com os adultos. O pensamento vai se tornando mais
lógico e as brincadeiras mais elaboradas.
Cada sexo refugia-se entre seus pares em busca de uma identidade, para
assumir seu lugar na sociedade. Os meninos formam o “Clube do Bolinha” e as
meninas, o da “Luluzinha”.
No início da fase de latência, a rivalidade entre esses dois grupos, ainda não
tem uma conotação sexual.
Mas na medida que vai chegando a puberdade, as meninas começam
menosprezar os meninos de sua idade e se apaixonar pelos mais velhos, lançando-
lhes olhares lânguidos e construindo devaneios românticos.
Já os meninos estão mais interessados em disputar qualquer coisa, como
por exemplo: quem consegue arrotar mais alto, cuspir e fazer xixi mais longe, chutar
mais forte. Fazem coisas que “só homens de verdade têm coragem de fazer”. Tentam,
assim, provar a superioridade sobre outros meninos e sobre as meninas, consideradas
fracas, medrosas e sem graça (formação reativa).
Nessa fase começam os transtornos obsessivos compulsivos. Como por
exemplo: lavar muitas vezes as mãos, simbolizando a lavagem dos pensamentos
impuros relacionados a agressividade e a sexualidade.
O que se relacionam a conteúdos sexuais, ganham uma conotação de
repugnância, nojo e vergonha. Ex.: “Que nojo desse beijo molhado”!
Exacerbam-se as exigências estéticas e morais. Ex.: “Mãe, você está ridícula
com essa roupa”, “Você não está vendo que seu vestido está transparente”?.
Segundo Freud, nesse momento de vida, um mecanismo de defesa muito
utilizado para a aquisição do conhecimento é a sublimação. “A pulsão sexual põe à
disposição do trabalho cultural quantidades de força extraordinariamente grandes, e
isto graças à particularidade, especialmente acentuada nela, de poder deslocar seu
alvo sem perder, quanto ao essencial, a sua intensidade. Chama-se a esta capacidade
de trocar o alvo sexual originário por outro alvo, que já não é sexual, mas que
psiquicamente se apresenta com ele, capacidade de sublimação” ( Laplanche, 1985;
pag. 638).

FASE GENITAL (puberdade em diante)


Evidencia-se, o aumento da pulsão sexual. Todas as zonas erógenas se
subordinam à primazia da zona genital e evidencia-se o processo de encontro do
objeto.
A pulsão sexual deixa de ser auto-erótica e coloca-se a serviço da reprodução
(para a maioria dos neuróticos).
Os impulsos ligados a fase oral, anal, fálica e ao Complexo de Édipo tendem a
reaparecer intensificados, em uma relação de cooperação e não mais sucessivamente.
A fome converte-se em voracidade, fumo e roer o lápis, por exemplo.
Os hábitos de limpeza cedem lugar ao prazer da imundície e da desordem (ex.:
quarto de adolescente, o jeans que ele não quer que lave).
Os desejos edipianos são atualizados na forma de devaneios e fantasias,
levemente distorcidos (Ex.: A moça se apaixona pelo rapaz que é o oposto de seu pai).
O interesse pelo estudo, conquistado na fase anterior, dá lugar ao interesse
sexual.
Alguns comportamentos apontam as grandes contradições que compõem a
psique adolescente. São egoístas e narcisistas, e ao mesmo tempo em nenhuma outra
fase de suas vidas serão capazes de tanta abnegação e dedicação. Hora se misturam
por completo com a turma, hora mergulham na solidão. Oscilam entre a sensibilidade
e a explosão irrefletida. Seus estados de espírito variam entre o pessimismo e o
otimismo exacerbado. Elegem um líder ao qual se submetem sem questionamento e se
rebelam contra a autoridade. São materialistas e cheios de idealismo. Dedicam–se com
entusiasmo ao trabalho e subitamente são tomados pelo desleixo e preguiça.
A desvantagem do adolescente em comparação à criança é que este tem que
dar conta das pulsões (que até então eram parciais), simultaneamente e mais
intensificadas.
A vantagem, em relação à criança, é que este pode contar com um Ego mais
estruturado, se sua história no período do Complexo de Édipo e de latência foi rica
em aprendizados intelectuais e culturais, e satisfatória na condução das sublimações.
O Ego infantil, aliava-se facilmente ao Id para gratificação instintiva imediata e
revoltava-se contra o mundo externo, frente a uma frustração (através de
comportamentos birrentos, choros e infantilizações).
O Ego do adolescente não se gratifica mais só com esse manejo,
permanentemente. Ele agora está comprometido com o Princípio da Realidade e
com o Superego, além do Princípio do Prazer.
A Puberdade é uma das fases no desenvolvimento da vida humana. “ É a
primeira recapitulação do período sexual infantil; num período ulterior da vida, uma
segunda fase tem lugar, no climatério” ( Anna Freud, 1954; 119).
Ouso dizer que entre a puberdade e o climatério, encontramos outra fase de
desenvolvimento pessoal, que recapitularia o nosso próprio período sexual infantil que
é a experiência da maternidade ou paternidade. Essa fase é uma grande oportunidade
na vida do ser humano de olhar para sua história pregressa, refletir e se transformar,
motivados pela necessidade e exigência da coerência e do encontro com o novo, vinda
dos filhos.
As fases da sexualidade ajudam-nos a entender o processo do desenvolvimento
humano, que há um encadeamento no desenvolvimento natural das pessoas, na
cultura em que estamos inseridos, mas deixa aberta a discussão sobre qual o impacto
que a educação exerce nesse desenvolvimento.
Os aspectos psico-sócio-culturais dos educadores, também exercem influência na
condução da estruturação egóica das crianças.
Reich em seu livro O Caráter Impulsivo (1925/1975), no tópico “Influências da
educação”, citado por Albertini (1994), expõe e avalia quatro possíveis maneiras de
educação infantil a partir da relação entre frustração e satisfação pulsional.
“Na primeira delas, a mais adequada, segundo Reich, ocorrem frustração e
satisfação pulsional parciais. O que a caracteriza é a presença da ação educacional
frustrante sem uma conseqüente inibição pulsional completa. O mesmo já não
acontece com a segunda forma. Nesta, a frustração excessiva, aplicada massivamente,
cria condições para a organização de caráteres inibidos. Na terceira, ao contrário da
anterior, uma atitude permissiva exagerada gera o aparecimento de caráteres com
pouca capacidade de auto-contenção. Na quarta e última forma, uma ampla atitude
permissiva é seguida pela aplicação de frustração intensa e traumática. Tendo por
base os casos atendidos na Clínica Psicanalítica de Viena, Reich acha que esta última
forma de educação desempenharia importante papel no surgimento de caráteres
impulsivos” (Albertini, 1994; p 61).
Partindo desse referencial reichiano, a maioria dos educadores acima estaria
provocando uma frustração excessiva, exagerando suas colocações, criando assim,
condições para que caráteres inibidos sejam desenvolvidos.
Somente a última citação exemplificaria uma atitude exageradamente permissiva,
gerando o aparecimento de caráter com pouca capacidade de contenção. Ao longo dos
atendimentos com a cliente, pude constatar que isso se confirmava.
Explorando um pouco mais o modelo educacional baseado na frustração
excessiva, Reich em seu artigo “Os pais como educadores: a compulsão a educar e
suas causas” escreve: “As inibições criadas exclusivamente com base na severidade
produzirão inevitavelmente conflitos na organização do psiquismo e impedirão uma
unificação da personalidade, porquanto continuam a ser corpos estranhos.” (Reich,
1926/1975; p. 59)
Ainda nesse artigo, Reich indica que a compulsão em educar se manifesta além
das frustrações desnecessárias, na forma como os educadores dão fim às necessárias
restrições instintivas.
Ele aponta que há restrições aos instintos, que precisam realmente ser feitas em
prol do auto-domínio das crianças, pois se esta atender exclusivamente ao princípio do
prazer, mais tarde não terá ferramentas para lidar com a realidade.
Mas esclarece que, se as manifestações instintivas forem sufocadas
precocemente ou tardiamente, os educadores também não atingem seu objetivo de
educar.
Quanto às manifestações instintivas a serem sufocadas precocemente ele diz: “Os
pais vêem em qualquer impulso instintivo um fenômeno patológico ou um sintoma de
perversidade congênita e o que conseguem com suas medidas disciplinares é
desenvolver na criança um caráter inibido de tipo patológico: as suas características
distintivas são uma paralisação da vida afetiva no plano sexual e no plano social, uma
capacidade inferior para a luta pela existência e dificuldade no processo sublimatório.
Como é preciso que o instinto se desenvolva primeiro para que seja possível sublimá-
lo, ou seja, orientá-lo para fins culturais, o resultado é que essas frustrações
prematuras são ademais, nocivas do ponto de vista social”.
Como conseqüência de uma vigilância negligente ou de um mimo excessivo, os
instintos da criança atingem o seu pleno desenvolvimento. Ao faltarem, na idade tenra,
as frustrações necessárias, as exigências da criança crescem até assumirem uma força
nociva. Então, precisamente quando não há nada a fazer é que se recorre aos
processos “corretivos” dos educadores de crianças “mimadas” ou “malcriadas”. A
crescente “má-criação” da criança provoca medidas disciplinares cada vez mais
severas e brutais: Tais medidas já não podem ter nenhum proveito, mas em troca
produzem na criança um grave conflito, cujos elementos fundamentais são os instintos
já incontroláveis, o ódio contra os pais brutais e o amor por esses mesmos pais. Essas
situações encontram a sua expressão mais clara nos caracteres psicopáticos
impulsivos” (Reich, 1926/1975; p 59).
Idealmente a melhor maneira para se educar, seria permitir aos instintos alcançar
primeiro um certo grau de desenvolvimento, para depois as frustrações serem
introduzidas aos poucos, sempre partindo de uma pré-condição de boas relações com
a criança.
“O importante não é tanto arraigar na criança as exigências culturais, mas a
maneira de fazê-lo; que as frustrações sejam de molde a poderem harmonizar um
compromisso viável com o ato de prazer. Daí se deduz que uma educação sem amor
jamais poderá conseguir senão uma adaptação artificial, falsa à realidade” (Reich,
1926/1975; p. 59).
“Se a criança se deve adaptar voluntariamente à realidade, deve aprender
primeiro a amar essa realidade. Deve poder identificar-se ao ambiente com alegria: é
esse o princípio da economia sexual. Ao invés, o princípio moral autoritário tentou
adaptar a criança a um ambiente hostil por intermédio de um sentimento moral e com
a ajuda de uma pressão moral” (Reich, 1930; p. 47).
Albertini escreve: “o bom funcionamento psíquico depende d uma boa economia
energética, um equilíbrio satisfatório para o indivíduo entre as quantidades de energia
disponível e de satisfação alcançada. Para Reich, assim como para Freud, só algum
grau de prazer consegue manter o indivíduo a realidade. Uma vida não realizadora dos
desejos em alto grau propicia condições para o estabelecimento das mais variadas
formas de (psico) patologia” (Albertini, 1997; p. 61).
Ao iniciar o tratamento com as crianças, constatava que as mais comprometidas,
apresentavam-se com um comportamento basicamente sem alternância. Começavam
sessões sem conseguir estabelecer contato, fosse pelo exagero de atividade ou pelo
medo de dirigir o olhar a mim e se expressar.
Se essas crianças mantinham essa padronização, sem alternância entre
passividade e atividade, entre contenção e relaxamento, significaria que já estavam se
encouraçando?
Reich, em Os Jardins da Infância na Rússia Soviética escreve:
“É fácil constatar como em todos os meios patriarcais as crianças de quatro,
cinco, ou seis anos se tornam rígidas, frias e começam a se encouraçar contra o
mundo exterior”.
No decorrer desse processo, perdem o seu encanto natural e tornam-se com
freqüência acanhadas, tacanhas, insolentes, “difíceis”; por sua vez, isso vai provocar o
agravamento dos métodos patriarcais de educação. É, também, sobre esse fundo
estrutural que se desenvolvem as tendências religiosas, a ligação infantil aos pais e a
dependência para com eles; o que a criança perdeu em motricidade natural, substitui
por ideais imaginários; torna-se introvertida e neurótica, “sonhadora”. À medida que o
Ego se debilita na sua função da realidade, ao mesmo tempo em que se mantém a
afetividade e a sua ação, maior é o reforço das exigências ideais que tem que se impor
a si próprio para conservar a capacidade de ação. Aqui, devemos distinguir
cuidadosamente duas espécies de ideais: aqueles que têm origem na mobilidade
vegetativa natural da criança, e os que derivam da necessidade de autodomínio e da
repressão dos instintos. Dos primeiros, depende o trabalho voluntário, livremente
produtivo; dos segundos, o trabalho como dever. Assim na sociedade patriarcal, a
autonomia na adaptação social e o trabalho agradável são substituídos estruturalmente
pelo princípio da obediência à autoridade e do trabalho como dever, com a
conseqüente revolta” (Reich, 1930; p 41).
É importante notar que o conceito de couraça, inicialmente na obra de Reich, foi
vinculado a um estado de rigidez, porém é possível amplia-lo também para um estado
de relaxamento crônico, isto é, com pouca capacidade de contenção.
Segundo Albertini, “cronicidade tanto na rigidez como no relaxamento, é
indicativa de um estado encouraçado. Nesse sentido, a saúde deve ser entendida como
uma capacidade de alternância entre conter e relaxar” (Albertini, 1994; p 32).
Meu trabalho com as crianças consistia em flexibilizar a couraça, trazendo a elas
novas formas de estabelecer vínculos tanto em relação ao mundo externo, como em
relação ao mundo interno e poder transitar com maior facilidade entre eles. Em outras
palavras tentava trazer para as sessões o modelo de curva orgástica.
Inicialmente tentava entrar em contato com a criança, estabelecer uma situação
empática, a partir daí, através de algumas atividades dirigidas, ampliar o repertório
dessa criança , deixando-a contatar novas formas prazerosas e possíveis de explorar o
mundo, para num terceiro momento estabelecer algumas pontes com seu cotidiano se
fosse preciso.
Por exemplo: Uma criança muito contida, que nunca pôde se sujar, estaria em
estado de tensão-carga, passaria a poder mexer prazerosamente em massa de
modelar, trigo com água e por último com argila, até conseguir relaxar (descarga-
relaxamento), para evacuar melhor, aceitando seu processo natural.
Mas não era possível trabalhar só com as crianças.
Era necessário desenvolver um trabalho com os educadores, pois surpreendia-me
ao constatar que, alguns deles, com os quais trabalhei, não conseguiam compreender
a criança em seu universo infantil e tomavam atitudes que mais contribuíam para
desagregação do que para a integração do ego formação. Teoricamente os educadores
deveriam contribuir dando condições para que o desenvolvimento infantil se realizasse,
mas revelavam uma falta de clareza para avaliar um contexto específico, e
aparentemente uma absurda falta de informação para encaminhar a resolução dos
problemas cotidianos.
Algumas frases complementam os exemplos quanto ao distanciamento adulto das
necessidades infantis.
“Eu sempre falei a eles que Papai Noel não existe, porque não tem que acreditar
em o que não existe”. Psicóloga, mãe de um garoto de 10 anos e uma menina de 6,
explicando como possivelmente os filhos não tiveram medo de fantasmas e
contribuindo para o empobrecimento do imaginário deles.
“Vem cá senta no colo do pai, fedida” ! Físico, chamando “carinhosamente” sua
filha de 2 anos. Assim ele se referia à filha, conferindo a ela uma identidade
depreciativa.
“Você gosta mais desse vovô ou do outro vovô? Avô, primeiro grau incompleto,
perguntando à sua neta de 3 anos, assim que ela voltou da temporada de férias na
casa do outro avô, tentando estabelecer um grau de comparação entre os afetos da
menina.
“Você não vai dar um beijinho na vovó, eu que lhe dei aquele brinquedo!” Avó,
segundo grau completo, chantageando a neta de 4 anos a lhe dar um beijo, o qual ela
não queria dar.
“Minha filha tem intestino preso porque não para de brincar para evacuar. Isso
sempre foi assim, desde que eu comecei colocá-la para fazer cocô no peniquinho
quando completou um ano de idade”. Mãe, segundo grau completo, contando-me
sobre sua filha de seis anos e meio.
Eu observava que alguns educadores realmente acreditavam que suas atitudes
eram as corretas, e as exerciam para o bem da criança. Outros, o faziam porque era o
caminho mais curto para a criança deixar de incomodar.
Quanto aos motivos para a compulsão de educar, Reich indica algumas causas:
1) Porque os educadores recordam seus próprios desejos infantis reprimidos.
“Parece que isso é devido ao fato de que os pais diante de qualquer manifestação
instintiva da criança “recordam” os seus próprios desejos infantis reprimidos e as
instâncias instintivas da criança representam um perigo para a subsistência das
próprias repressões. Ora esse perigo é impedido à custa de proibições educativas
que exibem claramente os traços característicos da compulsão para educar”
(Reich, 1926/1975; p 62).
2) Porque zangam-se com quem os colocou na situação de sentir a sua própria
ignorância.
“A mãe havia considerado a menina neurótica, ou seja, “má” e tinha se irritado
com ela; e isso pela mesma razão do neurólogo da velha escola: por não estar à
altura de uma situação na qual tem que atuar. Em tais casos existe a tendência a
zangar-se com quem os pôs nessa incômoda situação de sentir sua própria
ignorância ou instâncias afetivas inconfessadas” (Reich, 1926/1975; p 62).
3) Pela ambição em educar insatisfeita.
“Não é possível evitar a impressão de que o educador se julga obrigado a fazer
alguma coisa, a educar, ainda que nada haja a educar, e que sente como ofensa
pessoal, como um testemunho negativo de sua arte educativa, que sua vítima
não se comporte de modo adulto” (Reich, 1926/1975; p 64).
4) Sua própria educação neurótica.
“Todos os conflitos conhecidos, tais como ambição frustrada, insatisfação sexual,
discussões matrimoniais, numa palavra, tudo o que pertence ao inventário de
uma neurose se repercute na educação da criança” (Reich, 1926/1975; p 64).

Assim em nome do bem da criança, praticam atos educativos que se prestam a


satisfazer seus próprios afetos.
Aponta ainda, que os motivos que podem levar uma pessoa a converter-se em
educador seria o desejo em corrigir a própria infância, reparando em outras crianças
os males que a ela tenham sido causado e o desejo de ter filhos, frustrado
precocemente.
Para Reich, a saída apontada para a educação, nesse artigo, seria submeter os
educadores à psicanálise individual, para que possam reconhecer o verdadeiro
significado de sua atuação, podendo então, corrigir os erros e evitar possíveis fixações.
Um programa como este pode cumprir uma importante função no desenvolvimento de
capacidades e recursos nos educadores, num contexto economicamente viável, num
espaço de tempo limitado. O rendimento dos participantes é otimizado pelas interações
grupais e pelo caráter educativo dos encontros. As vivências, além de tornar o trabalho
mais leve, facilitam a assimilação do conteúdo, que pode atuar no consciente e no
inconsciente.

Conclusão

Pretendo com este projeto estimular nos participantes um comportamento mais


singular e autêntico em relação a cada criança com a qual eles convivam.
Evidentemente não pretendo com o programa esgotar as possibilidades de reflexão
sobre os temas abordados, mas a partir deles tenciono provocar um nova percepção e
uma reflexão sobre cada sentimento vivido, focando um tema por encontro.
O modelo adotado, assim como os temas abordados, têm atendido às minhas
expectativas, como idealizadora do projeto e coordenadora dos grupos, pois o retorno
dos participantes tem me motivado a continuar na luta pela preservação da saúde
mental das crianças e dos adultos.
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ANEXO 1

Questionário inicial

Esse questionário deverá ser preenchido antes da formação do grupo, e ser


entregue no dia da entrevista inicial, que poderá ser agendada comigo.
Ele tem um caráter confidencial, cabendo somente a mim, Idamis Lescovar, o
acesso aos dados nele contidos, e também zelar pela confidencialidade e
armazenamento das informações.
Eu me comprometo em não revelar a identidade das pessoas citadas em
eventuais publicações em livros ou revistas, podendo no entanto utilizar os dados para
fins de divulgação científica.
É necessária, além do preenchimento do questionário, a assinatura do termo de
sigilo e do contrato de funcionamento do curso, por parte de todos os integrantes do
grupo.
Atenciosamente,
Idamis Lescovar.

1. Dados pessoais

Nome:
Idade:
Endereço:
Bairro:
CEP:
Cidade:
e-mail:
Telefone residencial:
Profissão:
Atividade de trabalho:
Telefone de trabalho:
Carga horária de trabalho semanal:
Número de filhos e idade deles:

2. Faça uma pequena apresentação de quem é você.


3. Você tem algum problema de saúde crônico? (hipertensão, desvio de coluna,
enxaqueca, gastrite, diabetes, asma etc) Há quanto tempo?
4. Você usa óculos, ou precisa usar?
5. Você costuma fazer algum tipo de exercício diário ou semanal? Qual a frequência?
6. Você já fez alguma cirurgia? Onde? Há quanto tempo?
7. Faça uma pequena apresentação da sua família.
8. Quais são os pontos de dificuldade de relacionamento entre você e seus filhos ou
alunos?
9. Você já procurou ajuda? Que tipo de ajuda?
10. Você ou sua família passaram ultimamente por alguma situação de crise? Ex.:
assalto, cirurgia, perda da estabilidade econômica (dificuldades financeiras, perda
de emprego), perda de alguém querido, separação.
11. Quais são as suas expectativas em relação ao curso?
12. O que mais lhe atraiu no programa?
13. O que não lhe atraiu no programa?
14. Você gostaria de escrever algo que ainda não tenha escrito para que eu soubesse?

Observação: Não é necessário responder na ordem sugerida.


ANEXO 2
Terceiro encontro: Re - conhecimento do Eu

Vivência do desenvolvimento do bebê.

Agora imaginem que vocês começam a olhar como uma criança.


• Comece a olhar como um bebê de um mês de idade.

O que esse bebê pode fazer?


• Mexer as mãos, olhar para elas.
• Levá-las até a boca. Sentir as mãos.
• Agora, feche os olhos, toque seu rosto, sinta a distância entre os órgãos. Do nariz
para a boca, do nariz para os olhos. Contorne-os.
• Toque sua pele.
• Abra os olhos, mexa-os, seu campo de visão é limitado ainda.
• Comece a mexer o seu pescoço e a abrir seu campo de visão.
• Lentamente, você vai descobrindo que tem pernas e você vai movimentá-las como
um bebê. Estique-as. Pega o pé e tenta colocá-lo na boca. Espreguice com
consciência do seu corpo todo.
• Seus pés, agora, já apóiam o chão e você consegue levantar seu bumbum do
chão,
• Agora você já consegue rolar.
• Role de um lado para outro, ainda sem virar de bruços,
• Role e sinta o chão dando apoio para o seu corpo.
• Seu campo de visão se ampliou muito mais.
• Você consegue ficar de barriga para baixo e levantar o pescoço.

O que você pode ver?


• Descobre que pode apoiar-se nos braços e enxergar mais longe.
• Olhe para as pessoas como nunca as tivesse visto antes.
• Sentar.
• Suas pernas, começam a querer entrar em cena. Você tenta jogar seu peso sobre
elas deslocando seu peso para trás. De gatinhas. Agora para frente.
• Você tem 4 apoios e quer movimento.
• Você está de gatinhas e se arrisca buscando um objeto à sua frente. Descobriu a
autonomia. Livremente, você vai engatinhando em direção ao seu desejo. Um
lugar da sala, uma pessoa, buscar algum objeto. Você também pode explorar as
coisas com sua boca. Encontre alguém para pegar no pé, puxar o cabelo, puxar
para que possa ir na mesma direção que você.
• Você já sabe fugir?
• Aos poucos levante-se e tome contato, com uma nova perspectiva de mundo.
Agora, vão tentando se levantar. Ficar em pé. Apoiar-se em 2 pontos.
• Ande pela sala, preste atenção no seu corpo.
• Suas mãos estão livres para pegar o que quiser.
• Suas pernas estão soltas para levá-lo onde você desejar.
• Continuem andando, tomando consciência do seu corpo.
• Vamos ficando em uma roda.
• Olhos fechados,
• Respirem e se apropriem dessa experiência.
• Existe alguma parte do seu corpo que está mais presente?
• Mais tensa ou lhe incomodando?
• Coloque a mão na parte do seu corpo que mais lhe incomoda.
• Se tiver mais que uma, escolha as duas que mais lhe incomodam.
• Quais são os seus sentimentos?
• Escolha de um a três sentimentos que melhor lhe represente, agora.
• Inspire pelo nariz e solte pela boca.
• Ainda sem abrir os olhos, se prepare para abri-los, com as mãos no mesmo lugar.
• Podem abrir os olhos.
• Existe outra pessoa que tem a mão colocada na mesma região do corpo que você?
• Agrupem-se por região do corpo que estava sendo tocada. Vocês formaram um
grupo que se identifica por alguma coisa.
• Escrevam esses sentimentos, nessa folha de papel, já em grupos.
• Escrevam também a região do corpo tocada
• Quais os sentimentos que apareceram?
• Esses sentimentos apareceram mais de uma vez?
Compartilhem com os pequenos grupos.
• Vamos abrir com o grupo maior.
Esses papéis vocês guardam com a árvore genealógica.
• Vamos pensar agora nas crianças.
ANEXO 3:
Oitavo encontro: Agressividade

Antes do nascimento, a agressividade tem sua origem através de


movimentos mais bruscos das pernas, os pontapés, quando para se desenvolver,
encontra uma resistência do útero.
Agressividade é uma reação à frustração, que passa a ser percebida após
o nascimento, na fase oral, quando a criança passa a perceber a mãe como um
objeto separado de si, um ser autônomo. Ela experimenta essa descoberta com
frustração e responde com agressão. Ex.: mordida no seio se ele não jorra leite
quando ela quer. (1º para satisfazer a fome, depois para satisfazer um desejo de
obtenção de prazer oral. Erotização da boca).
Diante dos limites que a realidade (via mãe) impõe a um desejo infantil, é
natural que a criança se rebele e reaja contra a mãe para provar que é um ser
separado dela, diferente dela, é confirmar sua própria identidade através do
confronto.
Primeiro encontramos um movimento infantil, um impulso que desencadeia um
movimento, esses movimentos levam a descoberta do mundo externo a criança, aos
primeiros passos de uma exploração. Segundo Winnicott (1965) a agressão está ligada
ao estabelecimento de uma distinção clara entre o que é e o que não é EU. Essa é a
primeira fase do não, a segunda acontece na adolescência.
É uma das muitas fontes de Energia de um indivíduo.
Agressão também é uma forma de estabelecer contato. Em seu cotidiano
,se a criança não consegue estabelecer contato pelas coisas boas que faz. Os adultos
não a ouvem e não a vêem, mas se ao agredir eles a vêem. Dirigem a palavra a ela.
Gritam, brigam e reagem diante desse comportamento, então ela passa a estabelecer
esse tipo de resposta.
Agressividade também pode ser uma resposta ao meio ambiente
agressivo. Pais que se batem ou que batem nos filhos estão mostrando um padrão de
comportamento que os filhos passam a adotar por imitação, como forma de
identificação. Além de mostrar o ódio que estão sentindo por se sentirem humilhados.
O amor não é um sentimento simples, uno. Seu avesso é o ódio. Quanto maior
o amor e mais completa a entrega, maior é a sensação de dependência e maior fica o
medo de abandono. Essa combinação de emoções opostas faz com que o alvo de
sentimentos tão fortes e tão contraditórios (objeto de amor) também seja objeto de
ódio.
A criança demasiadamente gentil, a que recalcou a agressividade, utiliza
constantemente grandes doses de Energia para conter essa raiva, deixando de utilizá-
la para a criação e exploração do mundo. Pode tornar-se uma criança depressiva.
Naturalmente a criança canaliza sua agressividade sonhando, através
dos contos de fadas e das brincadeiras e jogos.

Como transformar a agressividade exagerada das crianças?


Em primeiro lugar entendendo o que a criança está espelhando para nós nesse
momento. O que ela está querendo dizer?
1. Nós não estamos dando-lhe atenção?
Então precisamos dar atenção merecida às crianças na hora que elas estão solicitando,
e combinando sempre alguns padrões de comportamento.
2. Nós estamos dando o exemplo de agressão?
Não se pode exigir nada delas se nós não nos esforçamos para dar o exemplo.
1. Ela está agredindo frente a frustrações da vida?
Precisamos conversar com ela nos momentos que ela se depara com a
frustração, que tem coisas que não podemos fazer porque há conseqüências
que temos que arcar mais tarde. Mostrar dentro de um limite superior e inferior
o que podemos fazer. Mostrar alternativas possíveis, para fazer parte do roll de
possibilidades futuras de escolha.
2. Ela está tentando comprovar sua própria identidade?
O confronto é uma forma de delimitar o que é EU do NÃO EU.
Mostrar suas próprias qualidades à criança, para que ela possa se sentir
reconhecida pelo seu próprio EU. Possa dar conteúdo a seu EU.
ANEXO 4
Nono encontro: Rivalidade entre irmãos e ciúmes

A situação típica de vivência do ciúme é a rivalidade no amor.

a) Reação de ódio e agressividade frente a uma perda ou ameaça de


perda. Uma característica essencial é o sentimento de humilhação que o
acompanha, devido à afronta que acarreta à autoconfiança e sensação de
segurança de cada um. A perda da confiança não é vivenciada conscientemente.
Pode se tornar agressivo e furioso, e quanto mais furioso, menos humilhado se
sente (formação reativa).
b) Sente-se humilhado e inferiorizado e inconscientemente indígno,
deprimido e culpado. I.é, se não é amado, não é digno de amor, que é odiável,
cheio de ódio. Conclui que foi negligenciado e abandonado por não ter sido bom
para o ser amado. A depressão e a sensação de desvalia, com todos os receios
de solidão que a acompanham são insuportáveis.
A projeção é ativada. A maldade e a destrutividade passam a ser vistas no rival; ele é

condenado, e contra ele pode ser dirigido o ódio sem implicar em sentimento de culpa.

Ciúme do marido: falta de amor ao marido que a faz projetar que o marido não lhe
tem amor suficiente.

Homens que sentem ciúme do filho quando nasce.


Com a mulher voltada para o bebê, alguns homens se sentem rejeitados pelas esposas
com o nascimento dos filhos.
Mulher e homem como amantes começam a se estranhar. Esta é uma fase de
transformação e adaptação a novos códigos e novos papéis. Cada um está buscando
dentro de si as referências para serem pais e mães.
“Ele está mais distante do umbigo da vida do que a mulher” Lídia Aratangy.
É preciso dar tempo e ter tolerância.

Um novo irmão, um encontro muito especial:


O que fazer:
Conversar com o filho mais velho que:
• o novo irmão significa um acréscimo à família e não uma substituição do filho
mais velho pelo mais novo, que seria uma subtração.
• Com a chegada do bebê não vai dividir o amor em dois, nem diminuir o amor pelo
primeiro.
Avisar e conversar com o(s) mais velho(s), que a mãe se ausentará no nascimento do
bebê, para ir à maternidade.
O que não fazer:
A criança não deve ser obrigada a beijar o irmão como prova que o ama. Nesse
primeiro momento ele mais odeia um intruso do que amam um irmão.
Não criar uma expectativa no irmão, que o bebê chegue sorrindo, brincando e
dividindo tudo com eles. O bebê chorará, fará cocô, será amamentado, tomará tempo
dos pais, mas mesmo assim, será legal para poder brincar, conversar etc, quando
crescer um pouquinho.

O ciúme pode ser manifestado na forma de:


• Agressão ao bebê – jogar coisas sobre o bebê, falar que ele é feio.
• Indiferença – que é uma forma de agressão ao objeto externo de forma velada,
sutil, que provoca menos coibições.?
• Agressão a ele próprio – ficando doente, caindo e se machucando.
• Agressão à mãe e a objetos e animais.

A criança agride por sentir que seu lugar está ameaçado, e não deve “engolir” a
sua raiva sem que seja conversado sobre ela e devidamente canalizada.

Ciúme dos pais pela independência e jovialidade dos filhos:


Alguns pais narcisistas em demasia, sentem Ciúme que os filhos tenham outros
relacionamentos além do relacionamento que os filhos têm por eles(pais).
É comum dizerem aos filhos que tal lugar que vão é perigoso, que, portanto,
não deveria ir. Ou denegrir a companhia do filho para que ele não se interesse por ela,
pois não é boa o suficiente. O que é bom é a mamãe ou o papai.
Pais que sentem inveja da vitalidade dos filhos adolescentes.

Manifestações do ciúme pela vida a fora.


Delação : testar limites, ganhar mais atenção e diminuir o outro para poder se
sobressair ( manifestação da agressividade). Assim eu destruo o outro.
Quando o que está em jogo é o afeto dos pais, a criança pode fazer de tudo para
chamar a atenção.
Ganhar um cãozinho pode provocar ciúme em uma criança que passa a delatar as
travessuras do bichinho.
“Ela fez xixi no tapete, você não vai bater nela”? Fazendo esta pergunta a criança está:
Testando limite vigente na casa, a regra –ela pode fazer xixi no chão e eu não?
Projetando a sua agressividade, mostrando que por ser mau a cachorrinha deve ser

punida e rebaixada do seu patamar de merecedora de afeto, assim o seu lugar(o da

criança) ficará assegurado.


Ganha mais atenção quando detém a atenção da mãe.
Nesse caso a criança precisa sentir que não precisa delatar os outros e diminuí-
lo para conquistar espaço no coração das pessoas. Ela precisa sentir, através de atos,
que tem seu espaço.

Ciúme pelo ente “amado” ou medo de perder o amor próprio.


Se ele me trai ou me abandona, não sou digno de amor nem perante a
sociedade e nem perante mim mesmo.
ANEXO 5
Décimo primeiro encontro: Contos de fadas

JOÃOZINHO E MARIA

Em um país não muito distante, numa época de grande carestia, viviam um


lenhador, seus dois filhos e a madrasta deles. A mulher era mandona que só ela e vivia
brigando com todo mundo. Casar de novo tinha sido a pior coisa que o homem fizera
na vida.

O lenhador ia levando a vida sem reclamar. Afinal, a mulher cuidava bem da casa e
gastava pouco dinheiro. Até que chegou uma época em que o preço das coisas subiu
demais. O homem não podia comprar quase nada com o que ganhava cortando lenha.
E, em pouco tempo, a comida da casa foi acabando.

- O que tem na despensa não dá para encher quatro barrigas – reclamou uma noite
a mulher. Duas vão ter que cair fora daqui. E o mais depressa possível.

- De que barrigas você está falando? – perguntou ele, mostrando que não tinha a
menor vontade de discutir.

- As dessas crianças, que não servem pra nada –respondeu ela. – Amanha mesmo,
vamos abandonar as duas no meio da floresta.

O marido achou ruim e disse que nunca ia fazer tamanha maldade. Mas a mulher
insistiu tanto que ele acabou concordando, de coração partido.

João e Maria, os filhos do lenhador, estavam escondidos na escada e ouviram toda


a conversa.

- O que a gente vai fazer? - cochichou a menina.

- Pode ficar sossegada – respondeu João. – Eu tenho uma idéia que não vai falhar.

Pé ante pé, os dois irmãos foram para o quarto e se deitaram.

Maria estava muito cansada e logo dormiu. Mas João ficou de olho aberto,
esperando que o pai e a madrasta terminassem de discutir os detalhes do plano.
Então, quando a casa ficou em silêncio, o garoto se levantou sem fazer barulho, foi ao
quintal e catou várias pedrinhas brancas.

De manhã, quando saíram para a floresta, ele foi largando as pedrinhas pelo
caminho.

Nem por um segundo, a madrasta percebeu que o menino estava marcando o


caminho. Quando chegaram a um lugar bem distante, ela parou e disse para as
crianças:

- Agora, fiquem sentados nessa pedra, bem quietinhos. Eu e seu pai vamos cortar
lenha mais para lá. Se a gente demorar muito, vocês podem comer isso aqui.
Ela entregou um pedaço de pão para cada um e se afastou. O lenhador ainda
demorou um pouco, querendo abraçar os filhos pela última vez. Mas a mulher não
deixou e foram embora, arrastando o marido pelo braço.

- Será que eles largaram mesmo a gente aqui, no meio da floresta? – perguntou
Maria para o irmão.

- Não sei, respondeu o menino. – Vamos esperar. Pode ser que a gente não tenha
ouvido muito bem a conversa.

As crianças passaram o dia esperando. Comeram todo o pão, sentiram fome de


novo, e nada de pai e a madrasta aparecerem.

- Acho que eu entendi a conversa, sim... – suspirou João. – Eles largaram a gente
mesmo.

Maria começou a chorar, apavorada.

- E agora? O que vai acontecer?

- Calma boba! – disse o garoto. – Eu marquei o caminho com pedrinhas.

Aí, o menino pegou a irmã pela mão e voltou com ela para a casa.

O lenhador recebeu os filhos de braços abertos. A madrasta ao contrário,


esbravejou como uma fera e mandou as crianças para a cama sem jantar.

- Mulher, os meninos estão morrendo de fome... – disse o pai.

- Pois não tem o que comer em casa – respondeu ela, engolindo a última colherada
de sopa que tinha sobrado.

- Ai, eu não sei onde estava com a cabeça quando me casei com você... – suspirou
o lenhador, muito triste.

E teve de ouvir outra vez a mulher dizer que precisavam largar as crianças na
floresta, porque não podiam mais sustentar quatro bocas.

- Amanhã eu me livro desses capetas de uma vez por todas – garantiu ela.

Desconfiado das malvadezas da madrasta, João esperou todo mundo dormir para ir
de novo pegar pedregulhos. Mas a porta estava trancada a sete chaves e ele não
conseguiu sair.

- O jeito vai ser marcar o caminho com pão – murmurou o menino. – Se ela me der
um pra comer...

No dia seguinte, a madrasta tirou as crianças da cama antes da hora.

- Acordem, seus preguiçosos! – berrou a malvada. – Vamos trabalhar.

Os meninos levantaram, esfregaram os olhos e saíram. Na porta da casa, a mulher


deu um pedaço de pão para cada um, dizendo:

- Guardem bem isso aqui. Hoje vocês não vão ganhar mais nada para comer.

Em seguida, todos foram pra a floresta. E o menino foi jogando migalhas de pão
pelo caminho, com cuidado para ninguém perceber.

Bem longe de casa, a madrasta e o pai se afastaram como da outra vez. As


crianças cansadas de tanto andar, sentaram na grama e caíram no maior sono.
Quando os dois acordaram, a noite já estava chegando. As corujas piavam nas
árvores e os lobos uivavam, famintos. Era de dar arrepio! Maria se agarrou ao irmão,
choramingando:

- João, eu estou com medo...

- Não precisa ficar com medo – respondeu o garoto. – A gente vai voltar para a
casa. Eu marquei o caminho com pedaços de pão.

Enquanto falava, ele começou a procurar as migalhas que tinha jogado no chão.
Mas não encontrou nem sombra deles.

- Maninha, estamos perdidos! Acho que os passarinhos comeram tudo. Mas não
fique nervosa. Mesmo assim acho que dá para a gente encontrar o caminho – disse o
garoto.

Com essa esperança, andou numa direção. Então, viu que estava errado e rumou
para o outro lado. Assim, deu voltas e voltas, cada vez se perdendo mais na escuridão.

- A gente se perdeu, não é? – perguntou a menina, fazendo força para não chorar.

João não teve saída. Precisou confessar que não podiam mais voltar para casa.

- Quem sabe a gente não acha um lugar seguro para ficar? - disse ele,
esperançoso.

- É... Pode ser... Vamos procurar – respondeu Maria.

E os dois andaram a noite inteira pela floresta escura, sem encontrar um cantinho
para servir de abrigo.

Então, quando o dia clareou, avistaram ao longe uma casa, numa clareira. E, mais
que depressa, correram até lá.

- É uma casa de doce! – gritaram os dois. As crianças estavam loucas de alegria.


Cada pedacinho da casa era de açúcar, chocolate, bala de goma... Elas queriam comer
tudo aquilo, que não sabiam por onde começar. E correram, apontando para todo lado.

- As colunas são de pirulito! – Exclamou João.

- E a escada, de biscoito! Acho que vou comer um degrauzinho agora mesmo –


disse Maria.

Famintos como estavam, os irmãos não viam a hora de arrancar e provar todas
aquelas gostosuras em forma de pedaços da casinha. Mas antes que pudessem comer
algum doce, uma velhinha de xale e bengala os atendeu à porta.

- Vocês estão com fome? – perguntou a velhinha.

- E como! – responderam as crianças, ao mesmo tempo.

- Pois, então, venham comer.

A mulher fez os dois entrarem e serviu para eles leite, torta, mingau, rosquinha e
frutas. Depois que os meninos comeram até não poder mais, ela disse: - Vocês
parecem cansados. Não querem dormir um pouco? E levou os dois para um quarto
todo azul, onde havia duas camas. Os irmãos deitaram correndo e logo caíram num
sono de pedra.
Se as crianças tivessem a menor idéia de onde estavam, não teriam dormido tão
sossegadas.

A velha na verdade, era uma bruxa malvada que gostava de comer criança. Ela
tinha feito a casa de doce só para atrair meninos perdidos. Todos iam bater na sua
porta, eram muito bem tratados e depois viravam carne assada.

Enquanto eles dormiam, a bruxa foi ver se já estavam no ponto de ir para o forno.
Aí, pegou o braço do menino, examinou bem, e depois olhou para a menina. Então
abanou a cabeça, dizendo: - Como são magros! Vai levar tempo para engordar esses
palitos. E eles não eram tão magros assim. A velha é que era gulosa.

No outro dia, a bruxa acordou bem cedo e deixou de fingir que era boazinha. Para
começar, entrou no quarto das crianças e gritou, batendo a bengala no chão: - Para
fora da cama, andem! Vocês já dormiram demais.

Depois, levou João até o porão. E trancou o menino numa gaiola, para ele engordar
mais depressa. Por fim, mandou Maria trabalhar na cozinha.

- Trate de fazer bastante comida para o seu irmão – disse a velha. – Detesto comer
criança magricela.

- Hein!? A se-senhora vai comer o me-meu irmão? – gaguejou a menina.

- Claro! – respondeu a velha. – E depois será a sua vez. Por que acha que recolhi
vocês na minha casa?

Maria ficou assustadíssima. E, no primeiro momento de folga, correu até o porão e


avisou João:

- A velha é uma bruxa e vai comer a gente. Mas ela disse que não gosta de criança
magricela. Por isso, veja se come pouco, que é para não engordar nunca.

O menino já havia percebido que coisa boa a velha não estava planejando. E, nessa
hora, entendeu o que era.

- Pode deixar – disse ele, sem perder a calma. – Eu vou dar um jeito de enganar a
bruxa sem passar fome.

Nesse momento, a malvada desceu até o porão, para ver se o menino já tinha
engordado.

- Mostre o dedo para a vovó – disse mansinha. O garoto, então estendeu um


ossinho fino que tinha guardado. E ela apalpou, porque não enxergava quase nada.

- Paciência! – suspirou. – Ainda não está no ponto.

Durante a semana inteira, a bruxa empanturrou o menino de quitutes. Mas quando


ia apalpar o dedo dele, topava sempre com aquele osso e dizia:

- Que coisa! O moleque come feito um gigante e não engorda nunca. Deve estar
com lombriga.

- A velha esperou mais uns dias e, então resolveu:

- Pois então vou comer a menina. E foi acender o forno. Depois, chamou Maria,
disse que queria cozinhar o pão e ordenou:

- Vá ver se o forno já está quente.


A garota, que também era esperta, logo percebeu as más intenções da velha e
procurou ganhar tempo.

- Eu não sei mexer em fogo – disse Maria.

- Menina boba! É só subir a escada, abrir a portinhola, enfiar a cabeça e...

E não acabou de falar, porque Maria deu um empurrão nela com toda a força,
trancando a bruxa dentro do forno.

Depois, a menina correu para o porão e soltou João.

- Eu joguei a bruxa dentro do forno quente – contou.

- Puxa! Como você é corajosa! – exclamou o irmão.

- Vamos embora – pediu ela.

- Pra que tanta pressa? – perguntou o garoto. – Agora, a bruxa já virou carvão.

- E pra que ficar mais tempo nesta casa horrível? – quis saber Maria, louca para cair
fora dali.

- Para pegar o tesouro – explicou João. – Toda bruxa de verdade tem um tesouro
em casa, você não sabia? E quase sempre escondido no sótão. Vamos até lá.

Os dois subiram uma escada e chegaram ao sótão, onde haviam três baús cheios
de ouro e prata.

- Puxa! Esse tesouro vale mais do que imaginei! – gritou o menino. – Vamos
levar tudo isso pra casa.

Sem perda de tempo, João e Maria encheram os bolsos de moedas, jóias raras e
pedras preciosas. Com toda aquela riqueza, os dois saíram da casa de doce, onde
viveram assustados o tempo todo. E começaram a andar pela floresta, sem saber para
que lado ir. Até que encontraram um cisne num rio.

- Sabe onde fica a nossa casa? – perguntou o menino.

O cisne pensou um pouco e respondeu:

- É depois daquele lago. Vocês podem subir nas minhas costas. Eu levo vocês até lá.

Os meninos subiram e o cisne foi embora. Assim, atravessaram bem rápido até a
outra margem do lago.

Os irmãos agradeceram e saíram correndo. Dali a pouco, chegaram em casa e se


jogaram nos braços do pai, chorando de alegria.

Depois ficaram sabendo que a madrasta tinha morrido. E, daquele dia em diante,
os três nunca mais se separaram.
A interpretação do conto foi elaborada segundo a Análise Junguiana.

Análise do conto:
O que significa um conto de fada para a alma de uma criança?
Que sentido poderia ter além do entretenimento e da diversão?
Por que as crianças se interessam tanto pelos contos de fadas?
Os contos de fadas, assim como os mitos sagas e lendas, fazem uma ponte
tanto com o mundo externo como com o mundo interno.
Na sua vida o homem tem a tarefa de experimentar seu meio ambiente, de
subsistir nele de dominá-lo e formá-lo. O conto contribui para que a criança aprenda a
lidar com as dificuldades do dia a dia: as duplas informações, restrições e limites,
tomadas de decisão e escolhas.
Mas também, e não menos importante, é a conscientização e integração do
mundo interno. O conto de fada se presta como um meio de formação do mundo
interno. O mundo inconsciente.
Segundo Dieckmann (1986), geralmente o conto de fada é o primeiro e mais

fundamental produto de forma espiritual da cultura com o qual o homem entra em

contato e assimila. Ele tem sua origem não no mundo da fantasia de uma só pessoa,

mas pertence às formações coletivas espirituais.

Ele foi utilizado por outras culturas em tempos longínquos para educação e formação
espiritual, assim como remédio, na medicina hindu, para pessoas mentalmente
desorientadas.
Diekmann (1986) diz ainda, que as figuras e feições, como também a ação do
conto, são vividas não mais como acontecimento real do mundo exterior, mas como
personificação de formações e evoluções interiores da mente. Eles são símbolos e
surgem como representantes no lugar daquilo que, como dinâmica espiritual, se passa
no homem, e para o qual não pode ser encontrada imagem melhor nem mais exata.
Joãozinho e Maria é um conto que fala sobre a sobrevivência e abandono.
Os elementos da estória e seu significado direto.
• Só um pedaço de pão: miséria da família.
• Juntar as pedrinhas: como pista para a voltar para casa.
• Migalhas de pão para marcar o caminho: como alternativa das pedrinhas, já
que a madrasta havia trancado a porta para que as crianças não mais pudessem
pegá-las.
• Pássaro branco: condutor para a situação de satisfação da fome. Ele os leva para
a casa de pão de mel.
• Casinha de pão de mel: sonho de alimento numa situação de fome. Aplacar a
fome com doçura.
ƒ Ossinho: utensílio para enganar a bruxa e prolongar a vida.
ƒ Forno: para assar, preparar alimentos para aplacar a fome e sobreviver.
ƒ Tesouros: servem para tirá-los de uma situação de miséria.
ƒ Água intransponível: seria o último obstáculo para poder desfrutar da presença
do pai.
ƒ Pato: um meio para transpor a água.

Características dos personagens:


• Pai: trabalhador, omisso, amoroso, mandado pela mulher.
• Madrasta: mandona, narcisista, seca em amor, não generosa.
• Joãozinho: astuto quanto a marcar o trajeto com pedrinhas, bom para ser
engordado, tolo, lento
• Maria: boa para o trabalho – limpar a casa e cozinhar, esperta, engenhosa.
• Bruxa: figura má e demoníaca, falsa, seduz as crianças com uma finalidade
egoísta, para conseguir o que quer: que entrem em sua casa, para em seguida
prendê-los e explorar o trabalho de Maria, e engordar o menino para o abate.

Os elementos da história e seu significado oculto.


O conto indica uma divisão entre dois mundos, um mundo real do dia a dia onde vive
um lenhador e sua família, o mundo da consciência.
E um bosque escuro e misterioso, o mundo mágico no qual existem bruxas, casas de
chocolate, pássaros solícitos e tesouros, o mundo inconsciente,

Forno: símbolo da metamorfose, pois nele uma força da natureza deve ser
transmutada em algo comestível para o homem. O lado negativo-demoníaco do
instinto maternal estaria maturo para uma transformação.
Há uma conexão entre o mundo consciente e o mundo inconsciente uma vez
que no momento em que a bruxa é queimada, no inconsciente; a madrasta desaparece
na estória. Quando a situação consciente se empobrece e novas experiências não são
adquiridas, a vida fica estagnada e passa fome. Então é necessário que surjam
impulsos, tais como o da madrasta, que empurrem as crianças para o reino do
inconsciente, e uma vez que as crianças precisem dar conta de si mesmas, elas se
transformam e trazem para a consciência uma experiência nova, dando luz à natureza
consciente.

Pássaro branco: pássaros freqüentemente são relacionado à fantasias, pensamentos,


idéias intuitivas ou conteúdos espirituais.
Branco: cor da credibilidade, da salvação, da paz e da alegria. O conto é da opinião de
que é boa a idéia de encontrar a bruxa da casa de pão de mel e entender-se com ela.

Pedrinhas: quando nos apegamos ao imóvel, ao morto, à pedra, então sempre


voltamos, mas nada se modifica. As necessidades anteriores e a fome de sempre ficam
na mesma. Há muitos adultos que sempre espalham pedrinhas quando pensam e
fazem algo e nunca saem do costumeiro.
Algo acontece somente quando são jogadas migalhas de pão, a substância de
transformação. Este símbolo desaparece na forma da consciência para depois voltar na
forma de forno, no inconsciente.
Pato: um bicho que é capaz de viver nos dois ambientes, o ar e a água, é um símbolo
adequado para ser o mediador entre os dois mundos, o consciente e o inconsciente.
Madrasta e bruxa: Ambas são a personificação da mãe, no consciente e no
inconsciente respectivamente.
Existem mães assim?
A resposta é não, pois no mundo real, diferentemente dos contos, as pessoas
transitam por uma multiplicidade de emoções diversas, contraditórias ou paralelas.
Raramente uma pessoa teria somente qualidades negativas.
A resposta é sim, já que existem mães e educadores que fazem o que podem
para manter a criança perto de si, que são capazes em função de seu próprio
narcisismo furtar da criança seu desenvolvimento normal, impedir sua independência e
autonomia. O amor materno devorador empobrece as formas de desenvolvimento da
criança com o mundo e consigo mesma.
Somente depois da criança se confrontar com sua agressividade e dominá-la,
ela é capaz de encontrar os tesouros contidos dentro de sua própria casa e deixar de
ser dominada pela miséria humana.
Tesouro: todos os impulsos de vida que co-existem com a agressividade (bruxa)
dentro do self (casinha de chocolate).

Quanto ao desfecho do conto de fada:


No caminho de volta das crianças à sua casa, toda a paisagem tinha se
mudado de maneira evidente: a passagem do mundo normal, do lenhador, para o
mundo mágico passava sem fronteiras. No segundo momento, quando as crianças
passam do mundo mágico para o real, há um largo rio que separando os dois
mundos. Isto se traduz no progresso psicológico, obtido pelas crianças em relação
ao começo da estória. A ausência de separação entre a consciência e a inconsciência
encontramos em um ego imaturo e instável. Tal pessoa pode ser conduzida pelos
impulsos ou necessidades instintivas que surgem do inconsciente. Um Ego sadio e
mais maduro é capaz de optar e decidir, na maioria das vezes, quais os impulsos ou
necessidades que podem ou não ser satisfeitos. Somente quando o lado mau, mágico,
e negativo do inconsciente – a bruxa - é vencido, é que se forma essa fronteira nítida
entre consciente e inconsciente, entre mundo real e mundo mágico.

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