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Transação penal: pena sem processo?

Considerada por grande parte da doutrina como um marco no direito penal-processual


brasileiro, a Lei n.º 9.099/95, que criou os Juizados Especiais Criminais, realmente
introduziu um novo paradigma na ordem jurídico-penal nacional: o da justiça criminal
consensual. Fruto da feliz previsão constitucional do artigo 98, inciso I, da Constituição
de 1988, os Juizados Especiais Criminais forma criados com competência para a
conciliação, o julgamento e a execução de infrações penais de menor potencial ofensivo,
mediante os procedimentos oral e sumaríssimo.

O legislador pátrio instituiu a transação penal, tida como verdadeiro mitigador do


princípio da obrigatoriedade da ação penal, visando permitir a realização de política
criminal mais eficaz.

O objetivo maior da transação penal é a reparação dos danos sofridos pela vítima e a
aplicação de pena não privativa de liberdade.

CONCEITO E DISPOSITIVO LEGAL

A Transação penal está consagrada no art. 76 da Lei 9099/95, o qual dispõe: ³havendo
representação ou tratando-se de crime de ação penal publica incondicionada, não sendo
caso de arquivamento, o Ministério Publico poderá propor a aplicação imediata de pena
restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta´. Antes do oferecimento
da denúncia, portanto, na fase administrativa ou pré-processual, o Ministério Público
poderá propor um acordo, transacionando o direito de punir do Estado com o direito à
liberdade do "autor do fato", desde que presentes os pressupostos objetivos e subjetivos
previstos na lei para a oferta.

Sergio Turra Sobrane define a transação penal como ³o ato jurídico através do qual o
Ministério Publico e o autor do fato, atendidos os requisitos legais, e na presença do
magistrado, acordam em concessões recíprocas para prevenir ou extinguir o conflito
instaurado pela prática do fato típico, mediante o cumprimento de uma pena
consensualmente ajustada´ (SOBRANE, Sérgio Turra. Transação Penal. São Paulo:
Saraiva, 2001.)

ÂMBITO DE APLICAÇÃO: INFRAÇÕES DE MENOS POTENCIAL OFENSIVO

Nos termos do art. 61, da Lei 9.099/95, ³consideram-se infrações de menor potencial
ofensivo, para os efeitos dessa Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei
comine pena máxima não superior a um ano, excetuados os casos em que a lei preveja
procedimento especial´.

Com o advento da lei 10.259, de 12 de julho de 2001, houve sensível modificação na


conceituação legal das infrações penais de menor potencial ofensivo. Nos termos do art.
2, da lei 10.259/2001 ³Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os
efeitos desta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou
multa´.
NATUREZA JURÍDICA DO INSTITUTO

A transação penal possui natureza dupla. Ao mesmo tempo em que é um instituto de


Direito Processual Penal, uma vez que por meio dela se compõe a lide subjacente, é
também um instituto de direito material, visto que os ajuste entre as partes, homologado
pelo juiz, implica a extinção da punibilidade do fato típico e antijurídico, não se
admitindo mais sua discussão. (SOBRANE, Sérgio Turra. Transação Penal. São Paulo:
Saraiva, 2001.)

Discute-se na doutrina e jurisprudência, se a transação penal constitui uma faculdade do


Ministério Publico ou um direito subjetivo do autor do fato, quando presentes os
requisitos específicos para sua aplicação.

O instituto da transação penal trata-se de direito subjetivo do infrator só este pode dele
dispor, aceitando ou não a proposta transacional, desde que presentes os requisitos
exigidos pela lei.

A POLÊMICA DA CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSAÇÃO PENAL: PENA


SEM PROCESSO?

O direito ao devido processo legal vem consagrado pela Constituição Federal no art. 5º.,
LIV e LV, ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o
devido processo legal e ao garantir a qualquer acusado em processo judicial o
contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Quando o legislador, no art. 76 da Lei 9.099/95, fala em aplicação imediata da pena, ele
não quis dizer pena mas sim ³medida penal´ pois só é possível aplicar uma pena no
Brasil depois de instaurado o devido processo legal. Na transação penal o autor do fato
aceita a proposta do Ministério Público para não ser processado, portanto não houve
processo. Então o que ele aceitou não foi uma pena, mas uma ³medida´ a ser cumprida
para que se evite um processo. Nesse novo modelo, não existe acusação, ou seja, o autor
do fato não reconhece sua culpa ao aceitar a proposta feita pelo Ministério Público,
apenas conforma-se com uma medida penal para que não venha a ser acusado e
processado criminalmente.

Portanto, os protagonistas dessa transação penal, com base no acerto de vontades,


buscam a evitar o processo. De um lado, o Ministério Público abre mão da persecução
penal e de outro lado, o autor do fato evita o processo preferindo se sujeitar a uma
medida penal que, em sendo cumprida, permitirá a extinção da punibilidade.

A pena aplicada na transação penal não tem caráter de punição, mas sim de uma medida
penal aceita voluntariamente pelo autor do fato para evitar o processo, sem admissão de
culpa ou de responsabilidade civil. Se no sentido de punição se tratasse, só poderia ser
aplicada depois do devido processo legal. Tanto é assim que a própria lei n. 9099/95
estabelece que a aceitação, pelo autor da infração da proposta do Ministério Publico de
imediata aplicação de uma medida restritiva de direitos ou multa não importará em
reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no
prazo de 5 (cinco) anos.(art. 76, par. 4º).

Na lição de Julio Fabbrini Mirabete: ³ Não se viola o princípio do devido processo legal
porque a própria constituição prevê o instituto, não obrigando a um processo formal,
mas a um procedimento oral e sumaríssimo (art. 98, I, CF/88) para o Juizado Especial
Criminal e, nos termos da lei, estão presentes as garantias constitucionais de assistência
do advogado, de ampla defesa, consistente na obrigatoriedade do consenso e na
possibilidade de não aceitação da transação. Trata-se da possibilidade de uma técnica de
defesa concedida ao apontado como autor do fato. (MIRABETE, Júlio Fabbrini.
Juizados especiais criminais: comentários, jurisprudência e legislação. 3ª ed. São Paulo:
Atlas, 1998.)

NATUREZA JURÍDICA DA DECISÃO QUE HOMOLOGA A TRANSAÇÃO

Conforme o modelo garantista, no Estado Democrático Brasileiro não é possível uma


sentença penal condenatória sem o devido processo legal, tornando certa a autoria e a
materialidade do fato imputado. Já a sentença penal homologatória é fruto de consenso,
de acordo entre Ministério Público e autuado, antes da propositura da ação penal, sem
julgamento do fato que originou o termo circunstanciado.

Sem o devido processo legal, a sentença que aplica pena restritiva de direitos ou multa,
com base no art.76, não tem caráter nem condenatório nem absolutório, mas
simplesmente homologatório da transação penal, declarando uma situação jurídica de
conformidade penal bilateral. Não gerando reincidência, registro criminal ou
responsabilidade civil (art.76-§§ 4º e 6º).

Sempre que as partes transigem, pondo fim à relação processual, a decisão judicial que
legitima jurisdicionalmente essa convergência de vontades, tem caráter homologatório,
jamais condenatório. (BITTENCOURT, Cezar Roberto. Juizados especiais criminais e
alternativas à pena de prisão. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,1996.)

DESCUMPRIMENTO DA TRANSAÇÃO

A conversão imediata da medida restritiva de direitos aplicada em pena privativa de


liberdade viola flagramente direitos constitucionais fundamentais como o contraditório,
a ampla defesa e o devido processo legal.

Assim, se o suspeito descumpre injustificadamente a medida não pode de imediato ser


preso, pela conversão da pena acordada em privativa de liberdade. A condenação, ou o
reconhecimento de culpa não foi objeto do acordo. A extinção da punibilidade somente
ocorre com o cumprimento da pena aceita livremente pelo autor do fato, implicando o
seu descumprimento a rescisão do acordo penal, razão pela qual só resta ao Ministério
Público iniciar a persecução penal, na forma do art. 77da Lei 9.099/95, oferecendo a
denuncia, ou requisitando as diligências que entender necessárias.

A doutrina tem-se inclinado no sentido de execução da pena, o que não encontra


respaldo na lei, nem ao menos, na lógica jurídica. Logo, como se pode pensar em
executar, na forma da lei de execuções penais - como querem crer alguns doutrinadores-
, se ainda não existe condenação, e, mais, não se pode nem ao menos falar em culpa, já
que a própria Constituição Federal assim assegura no art. 5º, LVII, sendo intuitivo que a
execução de uma pena no juízo criminal pressupõe a formação de um juízo anterior de
culpabilidade.

CONCLUSÃO

É proibida, no Direito brasileiro, a aplicação de qualquer pena sem a prévia realização


de um processo. Esse é o significado da regra nulla poena sine judicio, tradicional em
nosso sistema e em todos os que adotam o princípio maior do devido processo legal.
Portanto, a pena só é aplicada depois de o réu ter respondido a um processo- crime
democrático, em que a sua culpa tenha restado caracterizada.

3.CONSEQUÊNCIAS DO DESCUMPRIMENTO DA TRANSAÇÃO PENAL

A partir de então, diante da impossibilidade de conversão da pena alternativa aplicada


em sede de transação penal em pena privativa de liberdade quando do descumprimento
da transação penal, surgiu a celeuma acerca da providência cabível, sendo que as duas
correntes doutrinárias principais apontam as seguintes soluções: uma delas defende que
o Ministério Público deve oferecer a denúncia criminal para que seja instaurado um
devido processo legal, com as garantias fundamentais que lhe são inerentes, retornando
ao status quo ante; a outra, defende que o Ministério Público teria que executar a
transação penal, já que a sua homologação faria coisa julgada formal e, há quem
defenda, também material e, portanto, impediria o oferecimento da denúncia criminal.

Segundo o entendimento doutrinário de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães


Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flavio Gomes, a sentença que
homologa a transação penal não possui caráter condenatório e nem absolutório, e sim
meramente homologatório. Para estes doutrinadores, a sentença homologatória faz coisa
julgada material e formal e, portanto, dela origina um título executivo judicial, o que
impede, na hipótese de descumprimento do acordo, o oferecimento de denúncia
criminal. [06] Este também é o entendimento de Julio Fabbrini Mirabete e Fernando da
Costa Tourinho Filho. [07]

Por outro lado, para o doutrinador Damásio E. de Jesus a natureza jurídica da sentença
homologatória da transação penal é declaratória e, assim, "a transação penal encerra o
procedimento penal para o autor do fato". [08] Esta tese é também defendida por
Guilherme de Souza Nucci:

"A transação homologada pelo juiz fez cessar, por acordo, o trâmite do procedimento,
ainda na fase preliminar. A decisão é terminativa e meramente declaratória. Transitando
em julgado, não há como ser revista, para qualquer outra alternativa, como, por
exemplo, permitir o oferecimento da denúncia ou queixa e prosseguimento do
processo." [09]

O doutrinador Luis Paulo Sirvinskas, por sua vez, comunga em parte com o
entendimento destes últimos doutrinadores, já que, embora entenda que a sentença
homologatória da transação penal possui natureza declaratória, defende que se esta for
descumprida haverá que ser desconstituída, possibilitando ao Ministério Público o
oferecimento da denúncia criminal. [10] Seguindo este último entendimento, o extinto
Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo defendia que aludida sentença fazia apenas
coisa julgada formal, com a característica rebus sic stantibus, sendo que o
descumprimento do avençado imporia ao Ministério Público o dever de promover a
ação penal. [11]

Por fim, no tocante aos adeptos do caráter condenatório da sentença que homologa a
transação penal, há que se registrar que esta é a posição do Superior Tribunal de Justiça,
o qual já firmou o entendimento de que se homologada a transação penal não será
admitido o oferecimento da denúncia criminal, tendo em vista que a sentença que a
homologa faz coisa julgada formal e material. [12]

Considerando que inexorável será a inefetividade do Juizado Especial Criminal se não


for possível o ajuizamento da ação penal quando descumprida a transação penal, ante a
adoção seja do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ou daqueles que
entendem que a sentença homologatória da transação penal faz coisa julgada, seja
somente formal ou formal e material, e impede o prosseguimento do processo, buscou-
se uma solução intermediária.

Preliminarmente ao exame desta solução intermediária, cabe uma digressão acerca da


aduzida inefetividade do Juizado Especial Criminal quando se decide pela execução das
penas aplicadas em sede de transação penal, já que não se vislumbra a probabilidade de
que esta seja satisfatória, o que, por sua vez, gera a impunidade e o descrédito da
sociedade na justiça. De fato, há várias questões polêmicas no tocante à forma de
execução da pena aplicada em sede de transação penal, sendo imprescindível analisá-la,
em duas etapas, dependendo da modalidade de pena aplicada, restritiva de direitos ou
multa.

A pena de multa não pode ser convertida em privativa de liberdade, consoante já


analisado, entretanto, tal vedação não lhe retira o caráter penal, determinando somente
que sua execução, como dívida de valor, deverá ser realizada pela Fazenda Pública. Pois
bem, a execução da pena de multa aplicada em sede de transação penal, se for adotado o
posicionamento de que a homologação desta última tem caráter condenatório, na esteira
do preconizado pelo Superior Tribunal de Justiça, será promovida pela Fazenda Pública,
na forma do artigo 51 do Código Penal.

Imperioso que se registre que os valores da pena de multa são destinados, em regra, ao
Fundo Penitenciário da União (FUNPEN) [13] e, portanto, a legitimidade ativa para o
ajuizamento da execução é da Procuradoria da Fazenda Nacional. Alvitra-se, contudo,
que a lei n.º 10.522, de 19.07.2002, no seu artigo 20, determina que serão arquivadas as
execuções fiscais de débitos inscritos na dívida ativa da União pela Procuradoria Geral
da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, quando seus valores consolidados sejam
iguais ou inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais), o que praticamente perpetua a
inadimplência da pena de multa. [14]

De outra banda, concluindo-se pelo caráter declaratório (ou meramente homologatório)


da sentença que homologa a transação penal poder-se-á defender que a execução da
pena de multa nela aplicada deverá ser feita de acordo com o procedimento disposto no
Código de Processo Civil. Como decorrência, por óbvio que este entendimento afasta da
multa aplicada na transação penal o caráter de pena e a torna uma mera condição do
acordo homologado pelo juízo, cujo descumprimento importará na aludida execução
processual civil. Ainda, esta execução, provavelmente, será promovida pelo Ministério
Público no âmbito do próprio Juizado Especial Criminal ou em procedimento
executório no cível, sendo que a primeira opção é a mais defendida.

Destarte, com relação à execução da pena de multa, sem que se olvide da


impossibilidade de sua conversão em pena privativa de liberdade já que fere garantias
fundamentais do cidadão, também a sua execução no âmbito do Juizado Especial
Criminal restará infrutífera e fomentará a impunidade, não somente pela inadimplência
do transacionado, como também pela insegurança jurídica causada pela incerteza do
procedimento executório adequado.

No tocante à execução da pena restritiva de direitos aplicada em sede de transação


penal, se for acatada a tese da inviabilidade de oferecimento da denúncia criminal
quando descumprida e sendo inadmissível a sua conversão em pena privativa de
liberdade, inexorável a conclusão de que restará sempre infrutífera. Veja-se que, na
execução penal da pena restritiva de direitos, ao contrário do que ocorre com a pena de
multa, operar-se-á a sua conversão em pena privativa de liberdade.

Assim, se a conclusão for pela impossibilidade de oferecimento da denúncia, não haverá


outra solução jurídica apta a forçar o cumprimento do acordo, determinando-se o
arquivamento do termo circunstanciado no qual a pena de prestação de serviços e/ou de
prestação pecuniária, aplicadas em sede de transação penal, foram descumpridas.

No intento de combater esta inefetividade do Juizado Especial Criminal foi que se


buscou solução jurídica diversa das supramencionadas, a qual consistiu no
condicionamento da homologação da transação penal ao cumprimento da pena de multa
ou da pena restritiva de direitos nela aplicada. Assim, somente depois do cumprimento
da pena aplicada na transação penal, é que esta será homologada pelo Juízo, o que
possibilita o oferecimento de denúncia criminal quando do seu descumprimento, pois
que não terão lugar, até então, quaisquer discussões acerca da coisa julgada formal e
material que decorreria do acordo, mormente pela absoluta ausência de um título
executivo.

A sugestão de homologação da transação penal condicionada ao cumprimento da pena


aplicada significou, na prática, a contenção da inefetividade então verificada do Juizado
Especial Criminal e da impunidade dos autores de delitos de menor potencial ofensivo,
razão pela qual a ela se filiaram muitos operadores do direito, ressaltando que o
Superior Tribunal de Justiça aderiu a esta tese. [15]

Neste mesmo diapasão, foi o entendimento do FONAJE ± Fórum Nacional dos Juizados
Especiais, dentre cujos enunciados, atualizados até o XXV Fórum realizado entre os
dias 27 e 29 de maio de 2009, em São Luiz - Maranhão, o de n.º 79 dispôs que:

"Enunciado 79 (Substitui o Enunciado 14) - É incabível o oferecimento de denúncia


após sentença homologatória de transação penal em que não haja cláusula resolutiva
expressa, podendo constar da proposta que a sua homologação fica condicionada ao
prévio cumprimento do avençado. O descumprimento, no caso de não homologação,
poderá ensejar o prosseguimento do feito (Aprovado no XIX Encontro ± Aracaju/SE)"
Outrossim, destacam-se as recomendações do FONAJE, dentre as quais, o apoio à
alteração legislativa para que a transação penal não seja mais homologada por sentença,
suspendendo-se o prazo prescricional durante o período de cumprimento (Aprovado no
XVIII Encontro ± Goiânia/GO); e a aplicação dos enunciados 14 e 57 do FONAJE para
contornar a questão da falta de efetividade da transação penal (Aprovado no XVIII
Encontro ± Goiânia/GO). [16]

No entanto, há vozes doutrinárias contrárias ao condicionamento da homologação da


transação penal ao seu cumprimento, as quais afirmam que subordinar a homologação
de um acordo já realizado ao seu cumprimento é ilegal e arbitrário. Para Fernando da
Costa Tourinho Filho, esta espécie de cláusula resolutiva não é permitida pela lei n.º
9.099/95 e, assim, é ilegal. Assevera este doutrinador que a lei dos Juizados Especiais
Criminais teria previsto que a solução para o inadimplemento da transação penal seria a
execução da pena de multa, na forma do artigo 51 do Código Penal e que se tratando de
inadimplemento de uma pena restritiva de direitos, de fato, não existiria solução por
"imprevidência do legislador". [17]

A Lei nº 9.099/95, como se sabe, criou diversas medidas despenalizadoras, entre as


quais podemos citar como mais importantes a composição civil, a transação penal e a
suspensão condicional do processo (também chamada de sursis processual).

A adoção de tais medidas teve diversos objetivos, podendo ser relacionados como mais
relevantes os seguintes:

- Evita-se o assoberbamento desnecessário do Judiciário com processos de menor


importância (cujo destino, quase sempre, é a prescrição), restando mais tempo para
cuidar dos casos considerados mais importantes;

- O autor do fato não mais se submete às chamadas "cerimônias degradantes" referidas


por Jorge de Figueiredo Dias e Manuel da Costa Andrade, como citação em sua casa,
interrogatório, oitiva de testemunhas, constituição de advogado para acompanhar um
longo processo, entre outras;

- A forma simplificada do procedimento, com a adoção do princípio da oralidade, torna


o feito mais célere, atendendo a uma justa reivindicação da coletividade insatisfeita com
a morosidade dos julgamentos.

- Evitam-se diversas prisões cautelares desnecessárias, o que é extremamente salutar,


diante da atual situação do sistema carcerário brasileiro;

- A aplicação imediata de medidas não privativas de liberdade afasta a sensação de


impunidade.

A boa intenção do legislador, todavia, não evitou que diversas controvérsias surgissem
no momento da aplicação da Lei nº 9.099/95, uma vez que diversos dispositivos
carecem de maior detalhamento, exigindo que a doutrina e a jurisprudência apresentem
soluções nem sempre satisfatórias para diversas hipóteses.

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2. Cerne do problema

Um dos casos não solucionados pela Lei nº 9.099/95 é exatamente o descumprimento da


transação penal proposta pelo Ministério Público.

A proposta de transação penal deve ser formulada quando se tratar de crime de ação
penal pública, ou, nas hipóteses de ação penal pública condicionada em que houve
exercício do direito de representação.

Textos relacionados

‡ A utilização da transação penal e da suspensão do processo nos crimes


ambientais

‡ Os crimes cometidos à luz da Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha) envolvendo


militares cônjuges e os seus reflexos na jurisdição e na administração militares

‡ A recente reforma no Código de Processo Penal e seus reflexos na atividade dos


operadores do direito criminal

‡ A prisão processual, a fiança, a liberdade provisória e as demais medidas


cautelares. Comentários à Lei nº 12.403/11

‡ A delação premiada e os institutos despenalizadores em paralelo aos juizados


especiais criminais

Somente ao Ministério Público, na qualidade de único titular da ação penal pública,


cabe o direito de formular proposta de aplicação imediata de pena não privativa, nos
termos do art. 76 da Lei nº 9.099/95.

Obviamente, a pena não privativa de liberdade pode ser restritiva de direitos ou multa.
Em relação a esta última, não há maiores controvérsias, pelo menos no que concerne à
possibilidade de sua conversão em prisão.

Desde o advento da Lei nº 9.268/96, a pena de multa passou a ser considerada como
dívida de valor, sendo vedada, em qualquer hipótese, sua conversão em pena privativa
de liberdade.

A vexata quaestio está em saber como deve atuar o Ministério Público diante do
descumprimento, pelo autor do fato, da avença celebrada quando da transação penal.

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3. Elenco das penas restritivas de direitos

Antes de manifestar um posicionamento único em relação a todas as penas restritivas de


direitos, é imprescindível que se compreenda a natureza de cada uma delas, uma vez
que, em determinadas hipóteses, a solução é mais simples.
Nos termos do art. 43 do Código Penal, são penas restritivas de direitos: prestação
pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a entidades
públicas, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana e prestação de
outra natureza.

A multa, que também é uma pena não privativa de liberdade, ficará de fora do elenco,
uma vez que ela é considerada dívida de valor, sendo vedada sua conversão em prisão.
Deve a multa, portanto, ser executada nos termos da legislação processual civil em
vigor.

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4. Medidas restritivas de direitos cujo descumprimento pode ser sanado sem maiores
transtornos

Nos termos do art. 45, § 1º, a prestação pecuniária "consiste no pagamento em dinheiro
à vítima, a seus dependentes, ou a entidade pública ou privada com destinação social, de
importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360
(trezentos e sessenta). O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação
em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários".

A transação penal, como se sabe, sempre deve ser homologada pelo juiz. Ora, em se
tratando de compromisso de pagamento de determinado valor em dinheiro, é evidente
que o inadimplemento pode ensejar o processo de execução por quantia certa, nos
termos da legislação processual civil. Afinal, estaremos diante de um título executivo
judicial, conforme previsão expressa do art.584, III, do Código de Processo Civil.

Assim, pelo menos em relação à pena de prestação pecuniária, não existem maiores
problemas no que concerne ao seu descumprimento, uma vez que a execução por
quantia certa é o meio mais adequado para solucionar o inadimplemento.

No tocante às interdições temporárias de direitos, também não há polêmica


significativa. Com efeito, prevê o art. 359 do Código Penal, em seu caput: "Exercer
função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi suspenso ou privado por
decisão judicial".

É necessário aqui distinguir duas hipóteses, quais sejam:

a) O descumprimento se deu em razão de suspensão ou interdição de direitos fixada em


sentença condenatória, após a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva
de direitos. Nesse caso, a única alternativa possível é a conversão da pena restritiva de
direitos em privativa de liberdade, pelo tempo fixado na sentença;

b) Se, por outro lado, a aplicação da pena se deu após a realização de transação penal,
deve ser aplicado o disposto no art. 359 do CPB.

Quanto à perda de bens e valores, também não há transtorno significativo. O bem sobre
o qual recairá a perda deverá ser perfeitamente individualizado. Em se tratando de bem
imóvel, deve o juiz ter o cuidado de expedir, imediatamente, mandado de averbação ao
competente Cartório de Registro Civil de Imóveis. Em se tratando de bens móveis,
deverá ser providenciada a tradição imediata.

Finalmente, a prestação de outra natureza ± que sempre depende, mesmo em caso de


sentença condenatória, de anuência do autor do fato ± pode, a depender da natureza da
restrição imposta, padecer do mesmo problema da prestação de serviços à comunidade e
da limitação de fim de semana. Caso a prestação de outra natureza tenha por objeto
obrigação de dar, a solução á a mesma apresentada em relação à prestação pecuniária.

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5. Prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana

As penas de prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana


constituem o verdadeiro dilema de juízes e membros do Ministério Público, uma vez
que aparentemente não existe solução para o problema. Ou melhor, a Lei nº 9.099/95
não tratou expressamente do tema.

Suponha-se que alguém, ao celebrar a transação penal, se comprometa a prestar serviços


à comunidade em um hospital público, por exemplo, pelo período de seis meses, com
carga de 08 (oito) horas semanais. O que fazer se ele jamais aparecer no local?

O mesmo se aplica à limitação de fim de semana. Qual a solução para a hipótese de o


autor do fato jamais aparecer em casa do albergado ou estabelecimento adequado?

5.1 ± Soluções apontadas

Ao longo dos quase 07 (sete) anos de vigência da Lei nº 9.099/95, surgiram algumas
sugestões para a solução do problema. As mais aceitas serão examinadas a seguir.

5.1.1 ± Conversão imediata

A primeira solução apontada é no sentido da conversão imediata da pena restritiva de


direitos em privativa de liberdade. Tal posicionamento, segundo seus defensores, estaria
respaldado pela Lei de Execução Penal, em seu art. 181, §§ 1º e 2º. Não é o melhor
caminho, todavia. Senão, vejamos.

A LEP somente se aplica às hipóteses de sentença transitada em julgado, em que houve


a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. Em outras
palavras, a LEP trata da execução de sentença condenatória transitada em julgado.

A conversão imediata da medida restritiva de direitos aplicada em pena privativa de


liberdade viola flagrantemente direitos constitucionais fundamentais, como o
contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal.

Poder-se-ia argumentar que o autor do fato, ao aceitar a proposta de transação penal, já


se valeu do seu direito à ampla defesa. Tal argumento não estaria equivocado, mas não
enfrenta a integralidade da questão.
Com efeito, ao renunciar às garantias constitucionais que lhe são postas à disposição, o
autor do fato, na verdade, está manifestando sua vontade no sentido de que prefere ser
submetido a determinada medida, ao invés de ter que passar por todos os dissabores de
um processo penal.

Ocorre que a Lei nº 9.099/95 não prevê, em qualquer dispositivo, a possibilidade de


conversão. Caso existisse tal previsão, não haveria a menor dúvida de que, ao aceitar a
proposta de transação penal, o autor do fato teria que arcar com as conseqüências de sua
decisão.

A conversão imediata, todavia, representaria uma verdadeira imposição de pena


privativa de liberdade sem observância do contraditório, da ampla defesa e, sobretudo,
do devido processo legal.

Finalmente, existe um argumento que aniquila qualquer possibilidade de conversão


imediata. Qual seria o quantum da pena convertida? Quando a pena restritiva de direitos
que substituiu a privativa de liberdade na sentença condenatória é convertida em prisão,
existe um parâmetro, que é a pena aplicada. Qual seria o parâmetro, caso a conversão
decorresse do descumprimento da transação penal? Seis meses, um ano? A única
conclusão possível, portanto, é no sentido de que é absolutamente impossível converter
imediatamente a medida restritiva de direitos aplicada na transação penal em prisão.

5.1.2 ± Retomada do processo

Outra alternativa defendida é a possibilidade de retorno do processo, exatamente do


ponto onde havia parado. O autor do fato não seria preso imediatamente e teria
oportunidade de exercer seu direito à mais ampla defesa, num processo em que lhe fosse
assegurado o contraditório.

Tal solução é altamente sedutora. O Estado não receberia críticas pela impunidade do
sujeito ativo e este, por sua vez, teria a garantia de observância das garantias
constitucionais postas à sua disposição pelo legislador de 88. É a posição que Luiz
Flávio Gomes entende como a mais adequada, embora admita que a lei não permite tal
solução.

Infelizmente não é o melhor caminho. A transação penal é homologada através de uma


decisão judicial ± uma sentença. Esta, como se sabe, é o ato do juiz que põe termo ao
processo em primeiro grau de jurisdição. Através dela, o juiz esgota sua atividade
jurisdicional.

A Lei nº 9.099/95 não prevê a possibilidade de retomada do processo. Esta esbarraria


em um óbice praticamente intransponível. O recomeço do processo ± trata-se, na
verdade, de começo, uma vez que ainda não existia processo ± implicaria o
oferecimento de denúncia pelo Ministério Público. A tendência natural seria o
recebimento da peça acusatória, que, como se sabe, é uma medida que impõe um
constrangimento ao réu. Tanto assim é, que pode ser impetrado habeas corpus para
trancar a ação penal, em determinadas hipóteses.

De acordo com um princípio comezinho de hermenêutica, as regras que restringem, de


alguma forma, determinado direito, devem ser interpretadas restritivamente.
Na hipótese de que ora se cuida, o retorno do processo significaria mais que uma
interpretação extensiva, mas verdadeira criação de uma norma que restringiria o jus
libertatis, o que é absolutamente inadmissível.

Assim, em nosso sentir, também não pode ser adotada a retomada do processo como
sendo a melhor solução para o descumprimento da transação penal.

5.1.3 ± Execução por obrigação de fazer

A última alternativa que restaria ± e esta é a que nós adotamos ± seria a execução
específica do quanto pactuado na transação penal.

Não se pode perder de vista o fato de que o autor do fato, ao se comprometer, por
exemplo, a prestar serviços à comunidade, assume uma obrigação de fazer, de acordo
com a teoria geral das obrigações.

A melhor solução, portanto, seria a execução da obrigação de fazer, nos termos dos arts.
632 a 641 do Código de Processo Civil.

Poder-se-ia argumentar que o direito das obrigações não é aplicável à pena restritiva de
direitos, uma vez que esta última tem natureza penal, devendo, portanto, seguir as regras
da LEP para sua execução. Ademais, haveria quem afirmasse que a regra do Direito
Civil, segundo a qual não se pode compelir materialmente alguém a fazer algo, sob pena
de odiosa restrição à liberdade, não pode ser aplicada ao Direito Penal. Tal raciocínio,
todavia, seria distorcido.

Com efeito, não existe qualquer razão lógica para que se admita a execução civil para a
multa e a prestação pecuniária e não se adote o mesmo raciocínio para as penas
restritivas de direitos.

Não é demais lembrar que, embora estejamos nos referindo a pena restritiva de direitos,
na verdade, o que temos, quando da celebração da transação penal, é uma medida
restritiva de direitos, o que, de imediato, afasta a possibilidade de aplicação da LEP.

De acordo com o disposto no CPC, deve-se tentar, ao máximo, a execução específica da


obrigação de fazer. Caso não seja possível, parte-se para a indenização.

Não se pode perder de vista o fato de que o legislador, ao elaborar a Lei n. 9.099/95,
teve em mente abolir a pena de prisão para as infrações de menor potencial ofensivo.
Ora, se a idéia é exatamente evitar a odiosa pena de prisão, qual o problema em se
admitir que a obrigação de fazer, uma vez constatada sua impossibilidade de realização
material, se converta em obrigação de indenizar?

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6. Conclusão

A falibilidade, como se sabe, é intrínseca à condição humana. Com o legislador da Lei


nº 9.099/95 não poderia ser diferente e não haveria possibilidade de se prever, em um
único momento e em apenas um texto legislativo, todos os desdobramentos das medidas
despenalizadoras criadas.

Diante da omissão legislativa, portanto, entendemos que a única solução viável para o
descumprimento da transação penal, no que se refere à prestação de serviços à
comunidade e à limitação de fim de semana, é a execução civil da medida, considerada
como obrigação de fazer.

Mesmo reconhecendo que a solução pode transmitir a idéia de uma certa impunidade
diante do descumprimento de uma decisão judicial ± ainda que esta seja meramente
homologatória ± a medida é a única adequada ao espírito da lei e, principalmente, ao jus
libertatis do indivíduo. Até que haja uma reforma da Lei nº 9.099/95, não vislumbramos
outra alternativa.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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