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E.B. Viveiros
RESUMO: A acústica arquitetônica, e mais especificamente a acústica de salas, é uma área de conhecimento
relativamente nova, cujos fundamentos foram estabelecidos na segunda década do século XX com as pesquisas
do americano Wallace C. Sabine sobre reverberação. A câmara reverberante do Riverbank Labs, pronta em 1918,
permitiu que Sabine formulasse a famosa expressão do tempo de reverberação. A partir daí, o entendimento
sobre o campo acústico em ambientes fechados desenvolveu-se rapidamente. No Brasil, somente no final
daquele século é que a área de conhecimento começou a tomar forma, quase que exclusivamente através das
pesquisas desenvolvidas nos cursos de engenharia mecânica. Agora, no início do século XXI, estudos têm sido
conduzidos em diversos centros, freqüentemente em escolas de arquitetura. Mais recentemente, a acústica de
edificações, e em especial o isolamento acústico, tem despertado interesse da população dos centros urbanos,
talvez induzida pelo anseio de melhora das edificações brasileiras, tão desprovidas de qualidade acústica.
Infelizmente, porém, com o florescimento do tema em eventos científicos, e mesmo na mídia não especializada,
observa-se a repetição exaustiva de erros conceituais, o que prejudica a disseminação do conhecimento
acumulado. Este artigo trata de erros conceituais e “mitos” que foram levantados, ao longo dos anos, em
publicações de grande alcance e, até, em veículos especializados, tais como anais de congressos brasileiros.
Apresentam-se exemplos representativos às análises em questão, e não particulares a determinado autor que, em
cada caso, procurou-se preservar a identificação. São discutidas as possíveis razões que elevam elementos com
desempenho de absorção ou isolamento acústico insignificantes, tais como a caixa de ovo, à condição de
"materiais acústicos" consagrados.
1. INTRODUÇÃO
Temas relacionados à acústica têm recebido, recentemente, a dedicação por parte de muitos
pesquisadores do país. Até a mídia não-especializada tem dado atenção à questão, mas,
infelizmente, o que parece estar se disseminando é a desinformação. Se a publicação de um
equívoco é indesejável, a ausência de posição crítica por parte da comunidade científica é
inaceitável, pois os erros se consagram com o endosso da veiculação. Dessa forma, é
imperativo o questionamento a respeito do que sai publicado, colaborando-se para que
crenças populares sejam desfeitas.
Em revistas científicas internacionais a crítica é usual, sendo comum encontrarem-se
artigos que questionem, ou mesmo contestem, publicações anteriores, como pode ser visto,
por exemplo, em artigos no Journal of the Acoustical Society of America [1,2] uma das mais
conceituadas publicações em acústica no mundo. Há discussões severas [3], sempre no campo
científico, o que, inexoravelmente, conduz ao enriquecimento do tema em questão. As
reflexões e discussões por parte dos pares são saudáveis e trazem como benefício o controle
de qualidade das publicações. Tais embates de idéias, às vezes, prolongam-se por vários
números, como por exemplo, o que pode ser visto no Journal of the Audio Engineering
Society. Entre réplicas e tréplicas publicaram-se cinco artigos sobre determinado assunto [4].
Este artigo procura contribuir para a melhora na qualidade da produção em acústica,
fazendo uma reflexão a cerca das incorreções freqüentemente publicadas no país. A primeira
parte enfoca os materiais que são considerados mitos, com exemplos extraídos da mídia. A
seguir, apresentam-se erros conceituais encontrados em artigos científicos ou veículos de
massa. Sugerem-se possíveis razões que possam ter contribuído para essa deficiência de
conhecimento em acústica.
2. MITOS EM ACÚSTICA
Figura 1 – Texto de entrevista com músico onde a caixa de ovos é referida como ótima para
‘abafar’ o som.
Figura 2 – Anúncio do site Mercado Livre onde caixas de ovos são oferecidas para
‘isolamento acústico’.
Uma possível explicação para a associação da caixa de ovos com qualidade acústica talvez
esteja em sua geometria. Como diversos materiais de absorção comercialmente vendidos têm
superfície não plana, que lembra a embalagem, talvez creditem bom desempenho de absorção
à forma em si, e não ao material. O perfil sinuoso, porém, tem como fim o aumento da área do
material, ele sim responsável pela absorção. A matéria prima da caixa de ovos não é
permeável ao fluxo de ar, o que é impeditivo para um bom desempenho de absorção resistiva.
É entendimento do autor, no entanto, que a camada de ar aprisionada entre as caixas e a
parede pode ser responsável por trazer algum amortecimento sonoro, o que explica a
satisfação com o recurso por parte de alguns ‘músicos de garagem’.
2.2 Isopor
(a) (b)
Figura 3 – Detalhes de artigos: (a) que noticia incêndio de grandes proporções e se
referencia ao isopor como elemento de isolamento e (b) onde o isopor é retratado como
elemento de ‘isolamento acústico’.
Figura 4 - Fragmento de reportagem sobre seqüestro, publicada na revista ‘Isto É’, onde é
dito que as paredes do cativeiro tinham revestimento de material de isolamento acústico.
Uma das possíveis razões do isopor ser interpretado como material de isolamento acústico
reside no fato dele ser bom isolante térmico. Como há materiais que são utilizados como
recheio de componentes duplos, tanto para isolamento térmico quanto acústico, como a lã de
vidro, por exemplo, a generalização termina por incluir todos os materiais e o isopor ganha
adjetivo indevido. O item 3.4 discute a classificação de material ‘termo-acústico’ mais
detalhadamente.
3. ERROS CONCEITUAIS
Figura 6 – Extrato de dissertação de mestrado onde fibras secas têm caráter de proporcionar
isolamento acústico.
(a) (b)
Figura 9 – Extrato de (a) artigo apresentado em congresso onde a vegetação é compreendida como barreira
acústica e (b) página na internet de condomínio residencial, onde a vegetação é proposta como barreira
acústica ao longo da via.
Há casos em que uma proposta acertada tem que concorrer com a falta de conhecimento. A
Figura 10 traz trecho de artigo [16] onde é narrada disputa judicial entre residentes de
determinada região e o DERSA, órgão do governo estadual paulista responsável pelas
rodovias. Vê-se que a barreira acústica, determinada em juízo, é satiricamente chamada de
‘muralha da China’. Pior ainda, a empresa resiste a cumprir sua obrigação de dar proteção às
residências contra o ruído do tráfego automotivo, respaldada em estudo de impacto ambiental
que prevê apenas a colocação de árvores. Portanto, técnicos produziram um estudo específico
sobre o problema e a solução indicada foi a vegetação. Foram plantadas árvore e, conforme o
texto, não resolveram o problema, como esperado.
Figura 10 – Extrato de artigo a cerca de disputa sobre proteção contra poluição sonora.
Por fim, cabe destacar que a utilização de uma fileira de árvores pode até mesmo ser
indesejável. Estudos demonstram que os ouvintes tendem a superestimar a audibilidade do
ruído quando a visão da fonte sonora é bloqueada [17], mesmo que por vegetação.
(a) (b)
Figura 11 – (a) texto publicado na revista Veja onde o concreto apresentado, mais leve que o
convencional, serve como ‘isolante térmico e acústico’ e (b) descrição do PVC como
‘isolante termo-acústico’ em site de banco de dados de materiais.
Em outro exemplo, o isopor, mais uma vez, é tratado como isolante acústico e térmico. Em
pedido de patente registrada no INPI [20] tem-se a descrição “... placa térmica em EPS
(isopor)... no formato da telha ... a patente de modelo de utilidade XX 0000 refere-se a
“disposição construtiva introduzida em isolamento termo-acústico”, segundo o qual referidas
placas modulares em poliestireno expandido (EPS) são recortadas no sistema.”
definição é uma contradição em si, pois para existir um campo reverberante o espaço tem de
ser, necessariamente, fechado, com superfícies de entorno rígidas. Se um lado é aberto, cujo
modelo matemático corresponde à superfície com absorção sonora igual a um, desmontam-se
as condições de campo reverberante, pois características tais como intensidade sonora igual à
zero em qualquer ponto da sala ou distribuição uniforme de energia sonora desfiguram-se.
Ainda na acústica de salas, algumas entrevistas sobre projetos que envolvem fenômenos
acústicos trazem alguns deslizes teóricos. Em matéria intitulada “Lazer em todos os sentidos”,
na Revista Projeto [21], seção “Cuidados com a acústica”, consta:
“... Fulana de tal, arquiteta especializada em projetos de home theaters, elogia o
desempenho das paredes em alvenaria de tijolos, sem revestimento. “Elas refletem as
freqüências sonoras em várias direções, o que ajuda a distribuir e absorver o som pela sala”.
Figura 14 – Parte de artigo científico que computa à geometria a dissipação da onda sonora.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo apresentou alguns exemplos de ‘mitos’ em acústica, materiais que têm
comportamento consagrado e amplamente reconhecido, apesar de não haver respaldo para tal.
De forma mais detalhada, apresentaram-se erros conceituais, divididos em áreas de
conhecimento da acústica, que são veiculados em dissertações de mestrado, anais de
congressos brasileiros, bem como em jornais e revistas de circulação nacional. Algumas
possibilidades sobre as razões de interpretações errôneas foram discutidas. Vários exemplos
retirados de evento nacional foram apresentados, o que, talvez, seja indicativo da necessidade
de menos condescendência por parte dos revisores no aceite de artigos. Dessa forma, com
maior rigor científico na produção nos meios acadêmicos, a própria comunidade não
alimentará a desinformação existente na mídia não especializada.
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