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Carlos Fausto
(PPGAS – Museu Nacional, UFRJ) 1
Abril 2006
1
Texto para a mesa-redonda sobre “Políticas Públicas para Produção Cultural Indígena”,
Mostra Vídeo nas Aldeias, Um Olhar Indígena. Centro Cultural Brasil-Espanha, Brasília, 19 de
abril de 2006.
Enquanto prosseguia a ocupação da Amazônia e as culturas indígenas
continuavam a sofrer os efeitos do avanço da sociedade nacional, nós
constituíamos nossa nacionalidade por meio da figura fantasmática dos Tupi
litorâneos. A antropofagia modernista, embora se anuncie como oposição
ferrenha ao nativismo romântico, refaz esse mesmo percurso, acrescentando
uma nova camada de interpretação às camadas anteriores.
Hoje, estamos diante da possibilidade de que essas leituras e re-leituras
se abram definitivamente ao olhar indígena e a uma nova produção cultural
indígena. Não se trata apenas de reconhecer e conferir valor às manifestações
culturais “tradicionais” dos povos indígenas, mas de oferecer instrumentos para
que eles possam “indigenizar” a nossa produção cultural. E para indigenizá-la,
efetivamente, os realizadores indígenas terão que adotar uma atitude
antropofágica. Assim como fizeram nossos modernistas ao buscar navegar
entre o nacionalismo regressivista e o mimetismo europeizante para construir
uma literatura nacional internacional, ao visar um nacional por adição, caberá
aos realizadores indígenas navegar entre o tradicionalismo e a indústria cultural
para produzir culturas indígenas por adição.
Mas para isso nós devemos admitir correr o risco de sermos
canibalizados. Para ser radical, um projeto de diálogo intercultural deve correr
este risco. Não podemos continuar pedindo aos índios que sejam apenas um
espelho para nossas ilusões românticas de um passado edênico; é preciso dar
a eles os instrumentos para quebrar esse espelho e para produzir uma cultura
outra, uma contra-cultura, realizando uma espécie de antropologia reversa que
não é senão um ato de antropofagia.
Para terminar essa minha brevíssima fala, permitam-me lembrar o
slogan máximo oswaldiano: “Só me interessa o que não é meu. Lei do homem.
Lei do Antropófago” (Manifesto Antropofágico).