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Felicidade Clandestina e renovação do desejo

“A felicidade sempre iria ser clandestina para mim.”

A frase acima, extraída do conto Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector, surge da elaboração
de uma experiência plena de sentido que faz a personagem, epifania, acerto de contas com uma
consciência que tardiamente alcança o mundo e, ao encontrá-lo, fazer emergir a experiência do
absurdo.

No conto, a autora narra as desventuras de uma menina que gozava previamente da leitura de As
Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato, um livro, em suas palavras, “para se ficar vivendo
com ele”. Como estava “muito acima de suas posses”, seu desejo seria realizado
“clandestinamente”, isto é mediante a iniciativa da mãe da colega sádica, filha de dono de livraria, a
qual, à revelia da filha e após inúmeros contratempos, decide emprestar o livro à personagem, “pelo
tempo que quisesse”.

A personagem, após a conquista de seu objeto de desejo, chega a casa e não começa a ler. Como ela
mesma diz: “Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li
algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer
pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes.
Criava as mais falsas dificuldades pra aquela coisa clandestina que era a felicidade”.

A experiência da personagem associa a satisfação daquele desejo em particular à própria felicidade,


a seu ver clandestina.
Um dos aspectos que mais chamam atenção é a percepção do caráter não legítimo da felicidade,
isto é, sua banalidade, sua desrazão. Clandestina, pois o livro efetivamente não lhe pertencia.
Clandestina, porquanto residia no encontro e não na leitura do livro, o que seria razoavelmente de
esperar. Clandestina por motivos os mais variados, como é próprio à felicidade o ser espontâneo,
livre, desautorizado pelo panorama da vida.

A despeito da riqueza do conto como uma totalidade, há, a meu ver, núcleos de significado que
extrapolam os limites do enredo, dado o seu alcance existencial. Nesse sentido, interessa-me aqui a
renovação da alegria do encontro, da satisfação do desejo, o que se manifestava em seu
esquecimento voluntário da posse do livro, apenas para ter o susto de o ter.

Schopenhauer, em O mundo como vontade e representação, escreve que: “Entre o querer e o


alcançar transcorre, portanto, toda a vida humana. O desejo é, por sua natureza, dor: o alcance gera
logo a saciedade: a posse dispersa a atração; de nova forma se representa o desejo, a dor; de outro
modo continua a monotonia, o vazio, o tédio, contra os quais temos a batalha igualmente
atormentada como a feita contra a necessidade”.

A personagem de Clarice, consciente ou não da dinâmica do desejo – que, nada medida em que
alcança seu objeto, condena-se a retornar ao ponto de origem, a saber, ao tédio, à incompletude e à
falta -, eleva-se a uma condição de liberdade, de superação do destino, ainda que efêmera. Cria
estratégias para vencer o ciclo de prazer e desprazer e, mesmo que não possa de todo se
desvencilhar dele, renova-o antes mesmo que ele pereça. Não houve espaço para o desprazer, dada a
distância encurtada entre a partida (desprazer) e a chegada (prazer).

A renovação do desejo parece suceder à tomada de consciência da transitoriedade e vileza de um


movimento cíclico, tragicamente repetitivo. Por um único momento, dentro de um plano de não-
liberdade, de não-escolha, no reino das necessidades, a personagem torna-se – clandestinamente -
senhora de seu destino.
“Decidi que começarei a escrever e a publicar. Se tudo o que depois de escrito for lido, reprovado e
rasgado, não me será útil o ter escrito, e serei um peso a mim mesmo.”

Quanta injustiça acreditar em um único deus. Sim, digo deus, com letra minúscula mesmo. E não o
faço por desrespeito, e sim por vingança. Tínhamos noutros idos vários deuses. Eles, em seus
conflitos e caprichos, preparavam-nos para o mundo que é, o único que subjetivamente é.

jan.sobieski@gmail.com adicionar

“A felicidade sempre iria ser clandestina para mim.”

A frase acima, extraída do conto Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector,


surge da elaboração de uma experiência plena de sentido que faz a
personagem: epifania, acerto de contas com uma consciência que tardiamente
alcança o mundo e, ao encontrá-lo, fazer emergir a experiência do absurdo.

No conto, a autora narra as desventuras de uma menina que gozava


previamente da leitura de As Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato,
um livro, em suas palavras, “para se ficar vivendo com ele”. Como estava
“muito acima de suas posses”, seu desejo seria realizado “clandestinamente”,
isto é, mediante a iniciativa da mãe da colega sádica,
filha de dono de livraria, a qual, à revelia da filha e após inúmeros
contratempos, decide emprestar o livro à personagem, “pelo tempo que
quisesse”.

A personagem, após a conquista de seu objeto de desejo, chega a casa e não


começa a ler. Como ela mesma diz: “Fingia que não o tinha, só para depois ter
o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o
de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com
manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por
alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa
clandestina que era a felicidade”.

A experiência da personagem associa a satisfação daquele desejo em


particular à própria felicidade, a seu ver clandestina. Um dos aspectos que
mais chamam atenção é a percepção do caráter não legítimo da felicidade, isto
é, sua banalidade e desrazão. Clandestina, pois o livro efetivamente não lhe
pertencia. Clandestina, porquanto residia no encontro e não na leitura do
livro, o que seria razoavelmente de esperar. Clandestina por motivos os mais
variados, como é próprio à felicidade o ser espontâneo, livre, desautorizado
pelo panorama da vida.
A despeito da riqueza do conto como uma totalidade, há, a meu ver, núcleos
de significado que extrapolam os limites do enredo, dado o seu alcance
existencial. Nesse sentido, interessa-me aqui a renovação da alegria do
encontro, da satisfação do desejo, o que se manifestava em seu esquecimento
voluntário da posse do livro, apenas para ter o susto de o ter e no adiamento
da satisfação e saciedade plenas.

Schopenhauer, em O mundo como vontade e representação, escreve que:


“Entre o querer e o alcançar transcorre, portanto, toda a vida humana. O
desejo é, por sua natureza, dor: o alcance gera logo a saciedade: a posse
dispersa a atração; de nova forma se representa o desejo, a dor; de outro
modo continua a monotonia, o vazio, o tédio, contra os quais temos a batalha
igualmente atormentada como a feita contra a necessidade”.

A personagem de Clarice, consciente ou não da dinâmica do desejo – que, na


medida em que alcança seu objeto, condena-se a retornar ao ponto de origem,
a saber, ao tédio, à incompletude e à falta -, eleva-se a uma
condição de liberdade, de superação do destino, ainda que efêmera. Cria
estratégias para vencer o ciclo de prazer e desprazer e, mesmo que não possa
de todo se desvencilhar dele, renova-o antes mesmo que ele pereça. Não
houve espaço para o desprazer, dada a distância encurtada entre a partida
(desprazer) e a chegada (prazer).

A renovação do desejo parece suceder à tomada de consciência da


transitoriedade e vileza de um movimento cíclico, tragicamente repetitivo.
Por um único instante, dentro de um plano de não-liberdade, de não-escolha,
no reino das necessidades, a personagem torna-se – clandestinamente -
senhora de seu destino.

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