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SEMINÁRIO PRESBITERIANO DO NORTE

Pós-graduação em Teologia Exegética

Marcos Roberto da Silva

Considerações sobre o texto de Gálatas 3.19-25

Trabalho exigido pelo professor Rev. João Alves dos


Santos como parte das avaliações do curso de pós-
graduação em Teologia Exegética.

RECIFE
2009
ÍNDICE

INTRODUÇÃO.............................................................................................................04

I - UM POUCO DE CONTEXTO................................................................................05

II – O TEXTO PROPRIAMENTE DITO...................................................................09

CONCLUSÕES..............................................................................................................18

BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................19
INTRODUÇÃO

O uso que o apóstolo Paulo faz da palavra “lei” (no,moj), em seus escritos,
tem sido alvo de algumas controvérsias. Para alguns, Paulo é adversário da lei, um
homem movido tão somente pela graça de Deus sem preocupações com o que já passou.
Para outros, o apóstolo jamais desprezou a lei, pelo contrário, chamou tal lei de “santa,
justa e boa”, por isso, os cristãos não estão desobrigados de cumprir “toda lei”. Será que
existe um ponto de equilíbrio?

No texto que escolhemos para análise, há uma explicação clara sobre o


propósito da lei. Por ele é possível definir a aproximação ou o distanciamento que Paulo
tinha em relação a “lei”.

É significativo observarmos que há vários sentidos para o vocábulo no uso


feito pelo apóstolo. O termo pode designar a totalidade ou parte dos escritos do Antigo
Testamento, por exemplo, Paulo empregava no,moj para o Pentateuco (Gl 4.21) e para
o restante das Escrituras (1Co 14.21). No ensino de Paulo, no,moj também é utilizada
para referir-se à administração mosaica dispensada no Sinai (Rm 5.13,20; Gl
3.17,19,21).

Com frequência o termo no,moj é usado para designar a vontade de Deus,


implicando obrigação dos homens para com o Criador. Neste sentido a santidade da lei,
como expressão da santidade e justiça de Deus, é destacada e contrastada com o pecado
(Rm 7. 2,5,7,8,9,12,16,22).

Acontece, às vezes, que no,moj é usado em sentido depreciativo, indicando


a situação daquele que está preocupado em praticar as “obras da lei” a fim de alcançar a
justificação. Neste sentido, eles estão sendo escravizados pela lei (sob a lei),
depositando nela a confiança que deveria ser depositada em Cristo (Rm 6.14-15, Gl
5.18). No,moj também aparece como significando um princípio operante, é este o
sentido de “lei da fé” em detrimento de “lei das obras” em Romanos 3.37, onde o
contraste é, na verdade, entre o princípio da fé e o princípio das obras.

Por Paulo, no,moj é personificada. A lei fala e diz (Rm 3.19; 7.7); ela
trabalha “suscita a ira” (Rm 4.15); ela exerce domínio (Rm 7.1).

Que sentido tem, pois, o termo lei no trecho de Gálatas 3.19-25? Qual é o
papel da lei já que com a vinda de Cristo ela parece tão inútil e inoperante? Vamos
discorrer um pouco sobre o assunto. Considerando o contexto e a harmonia do texto
escolhido com o todo das Escrituras.

Primeiramente consideraremos o contexto e depois, o texto propriamente.


I – UM POUCO DE CONTEXTO

O texto escolhido, de Gálatas 3.19-25, ensina sobre o verdadeiro papel da lei.


Isso faz muito sentido quando descobrimos que naquele tempo os gálatas estavam sendo
iludidos por indivíduos que ensinavam ser necessário o completo cumprimento da lei
para a salvação. Sabendo que os judaizantes1 assim faziam, Paulo escreve para os
Gálatas exortando-os quanto à falta de discernimento espiritual e perseverança.

Os gálatas eram os primeiros frutos do trabalho missionário de Paulo e, levando


isso em consideração, ele tratou o problema daquelas igrejas de modo rápido e eficiente.

Atos 13 e 14 nos informam que Paulo e Barnabé evangelizaram a região sul da


província da Galácia pregando nas sinagogas a judeus e a gentios que temiam a Deus. A
oposição atacou, tentando solapar a autoridade apostólica de Paulo e minando seus
ensinos, justamente quando Paulo e Barnabé saíram de cena. Parece que esses
opositores não eram muitos, é o que podemos entender da declaração de Paulo: “Um
pouco de fermento leveda toda a massa” (Gal. 5.9), porém em todos os lugares ele
insistiam em dizer: “...Se não vos circuncidardes segundo o costume de Moisés, não
podeis ser salvos.” (Atos 15.1).

O concílio de Jerusalém (49 d.C.) reuniu-se para resolver a herética concepção


judaizante a respeito da salvação que foi disseminada em Antioquia. Parece ser este, o
contato com alguns líderes em Jerusalém, a que Paulo se refere em Gálatas 2.2-10.

O concílio resolveu a questão declarando a igualdade, no tocante à salvação,


entre judeus e gentios e determinando que os judeus não deveriam impor nada aos
gentios e que os gentios não deveriam escandalizar os judeus.

A decisão foi levada a Antioquia, Síria e Cilícia (Atos 15.23) e também as


cidades da Galácia do Sul (Atos 16.1-4) e “Assim as igrejas eram fortalecidas na fé e,
dia a dia, aumentavam em número” (Atos 16.5). Mesmo depois de toda essa
movimentação contra a heresia judaizante, eles não desistiram e atravessaram a Galácia
insistindo com os gentios para que fossem circuncidados.
1
Judaizantes. Em sua grande maioria eram judeus que, pelo menos teoricamente, haviam crido
no Evangelho, mas insistiam que além da fé, os crentes deveriam ser circuncidados e observar a lei de
Moisés, para que fossem salvos. A leitura de Atos 15:1, 5; 11:1-3 ; Gálatas 2:4,12; 4:10; 6:12, 13 nos fará
conhecê-los melhor. Eles ensinavam que a mensagem de Paulo não era suficiente em si mesma. Não
negavam a necessidade da morte do Senhor Jesus e a fé nesta morte, mas tentavam adicionar as obras da
lei à obra consumada de Cristo, como meio de justificação diante de Deus.
Muitos gálatas ouviram atentamente esses usurpadores e estavam a ponto de
trocarem o que haviam aprendido com Paulo por coisas sem nenhum valor espiritual e,
para que isso não acontecesse, o apóstolo relembra-os a real posição que ocupavam por
intermédio de Cristo. Isto constitui um breve contexto histórico da passagem.

Com relação ao contexto literário podemos observar o seguinte: antes de chegar


no versículo 19 do capítulo 3, Paulo: 1) apresenta seu apostolado como sendo da parte
de Deus (1.1); 2) mostra admiração por conta da inconstância dos gálatas (1.6); 3) faz
um resumo autobiográfico (1.13-2.14); 4) esclarece que a justificação é pela fé e não por
obras da lei (2.16); 5) chama a atenção dos gálatas para que eles não regridam (3.3) e, 6)
explica que a promessa que Deus fez a Abraão, de abençoar nele todas as famílias da
Terra, é anterior a lei, e por isso Abrão foi justificado porque creu na promessa e não
por obras da lei (3.6). Justificados, pois seriam todos os que depositassem sua confiança
em Jesus e não nas obras da lei. Depois desses esclarecimentos, então, ele vai discorrer
sobre a utilidade da lei. O versículo 19 do capítulo 3 começa com a seguinte pergunta:
“Qual, pois, a razão de ser da lei?”, a resposta a essa pergunta é oferecida na seqüência
no texto que vai até o verso 25.

Depois de explicar a razão de ser da lei o apóstolo fala sobre nossa liberdade em
Cristo, ensinando que os verdadeiros libertos não precisavam agir como escravos,
submetidos ao aio, mas como filhos e herdeiros de Deus (4.6-7). O versículo 1 do
capítulo 5 destaca isso muito bem “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou.
Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão”.

Os gálatas, agora que estavam esclarecidos com relação a essa situação,


deveriam demonstrar os frutos do Espírito (5.16-26) e estimularem-se mutuamente às
boas obras e ao amor fraternal (cap. 6).

O texto de 3.19-25 está bem no centro da carta e esclarece quanto a utilidade da


lei para a qual os gálatas estavam se direcionando de modo equivocado.

Dentro da harmonia com as Escrituras, o texto escolhido instrui-nos sobre a


utilidade da lei e fala também sobre uma promessa concedida aos que crêem em Cristo.
Estes temas, lei e promessa, são abordados em toda Bíblia e uma pequena amostra
disso será aqui exposta.

A promessa com relação à salvação do homem, por meio da vinda de um


Mediador, fora feita ainda no jardim do Éden, depois do pecado de Adão. Deus disse
que o descendente da mulher esmagaria a cabeça da serpente (Gn. 3.15).

Tal promessa permeou todo Antigo Testamento. Abraão, por exemplo, recebeu a
promessa de um descendente e Deus disse a ele: “...em ti serão benditas todas as
famílias da Terra”. (Gn.12.3). Em Gl. 3.16 lemos que o descendente de Abraão é
Cristo, explicando como é que a promessa se cumpriu: “Ora, as promessas foram feitas
a Abraão e ao seu descendente. Não diz: E aos descendentes, como se falando de
muitos, porém como de um só: E ao teu descendente, que é Cristo”.

Como é que todas as famílias da terra seriam benditas em Abraão? Por meio de
seu descendente que é, além de Isaque, Jesus, o “filho de Abraão”(Mt 1.1).
Descobrimos, no Novo Testamento, que todos os que passam a crer em Cristo,
tornam-se filhos de Abraão. Em Gálatas 3.7 nos é dito: “Sabei, pois, que os da fé é que
são filhos de Abraão”. Gerard Van Groningen explica que:

Todos os que acreditassem como Abraão, judeus ou gentios, seriam contados como
sementes de Abraão (Gl. 3.28-29). E a promessa da terra foi estendida à garantia de que
os filhos crentes de Yahweh seriam herdeiros do mundo (Rm. 4.13). Desse modo, em
Gênesis 12 e 15 as realidades básicas e os contornos amplos do pacto de Yahweh com
todos os crentes são apresentados.2

Portanto, a promessa feita a Abraão teve seu cumprimento cabal em Cristo, e por
meio de Cristo, cumprem-se as palavras “...serão benditas todas as famílias da terra”.

O povo de Israel era constantemente lembrado para confiar nas promessas feitas
por Deus, pois ele sempre as cumpriu, Js. 21.45, por exemplo, fala que até aquele
momento nenhuma promessa de Deus havia falhado.

O grande rei Davi também recebeu a promessa de um substituto para o seu


trono. As promessas a Davi, concernentes a perpetuidade de seu reino e o
estabelecimento do seu descendente, são encontradas em 2Samuel 7.1-17 e no texto,
paralelo a esse, de 1Crônicas 17.1-15, nestes textos, notamos a aliança de Deus com
Davi. O rei queria construir uma casa para abrigar a arca de Deus, portanto ele queria
uma casa para Deus (v.2 de 1Samuel 7). Todavia, Deus, por meio de Natã, diz a Davi:
“Dar-te-ei porém, descanso de todos os seus inimigos; também o SENHOR te fará
saber que ele, o SENHOR te fará casa. Quando teus dias se cumprirem e descansares
com os teus pais, então farei levantar depois de ti o teu descendente, que procederá de
ti, e estabelecerei o teu reino. (1Samuel 7.11-12). E ainda: “estabelecerei para sempre
o trono do seu reino” (1Samuel 7.13).

O descendente de Davi é quem deveria construir a casa (cf. 1Sm 7.13) e o seu
trono seria estabelecido para sempre.

Como se trata de um trono eterno, logo compreendemos que as promessas só


poderiam fazer referência ao Messias, o Cristo que é o Rei eterno (1Tm 1.17).

Davi também entendeu, quando orou revelando ter compreendido a vontade de


Deus, que esta promessa, de um trono para sempre, não se referia necessariamente a
Salomão, mas permaneceria “para tempos distantes” (v. 19, 1Samuel 7).

A casa, o reino de Davi, que duraria para sempre, chegou a condição de “choça”
conforme podemos observar em Isaías 1.8 – “ A filha de Sião é deixada como choça na
vinha, como palhoça no pepinal, como cidade sitiada”.

Notamos, contudo, que o tabernáculo de Davi seria reerguido, conforme


prescrito em Amós 9.11: “Naquele dia, levantarei o tabernáculo caído de Davi,
repararei as suas brechas; e, levantando-o das ruínas, restaurá-lo-ei como fora nos
dias da antiguidade”.

2
Gerard Van Groningen – Criação e Consumação vol. 1 – Ed. Cultura Cristã, São Paulo, 2002,
p. 251.
As palavras de Amós foram repetidas por Tiago, em Atos 15.16-18, para
explicar que o tabernáculo de Davi, reunindo homens de toda nação, é a igreja de
Cristo, que efetuou o levantamento do tabernáculo de Davi. A salvação poderosa da
casa de Davi foi reconhecida em Lucas 1.69, por Zacarias: “...e para nós fez surgir uma
salvação poderosa na casa de Davi, seu servo”.

Os filhos de Israel esperavam, pois na promessa de um Salvador e até que esse


Salvador não viesse, eles estavam sendo conduzidos pela lei que Deus deu a Moisés.

A lei deveria ser lida e amada pelo povo de Deus, Dt. 17.19 diz “E o terá
consigo e nele lerá todos os dias da sua vida, para que aprenda a temer o SENHOR,
seu Deus, a fim de guardar todas as palavras desta lei e estes estatutos, para os
cumprir”. O Salmista reconhece que é bem aventurado o homem que anda no caminho
do Senhor e medita dia e noite na sua lei (Salmo 1), e no livro dos Salmos temos ainda a
declaração de que a “lei do Senhor é perfeita” (19.7).

Sendo assim entendemos que a lei corrigiu e conduziu o povo para que fixasse
os olhos na promessa de um Redentor.

O Novo Testamento fala da lei e da promessa explicando como é que essas


coisas se relacionam.

Jesus, o Mediador na nova aliança (Hb. 12.24), diz, em Mateus 5.17-18 “Não
penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir.
Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais
passará da Lei, até que tudo se cumpra.” De fato Paulo destaca em Romanos 10.4 que
“o fim da lei é Cristo”, ou seja, Cristo verdadeiramente cumpriu corretamente as
exigências da Lei, podendo salvar da maldição da lei aqueles que nele creem. Isto quer
dizer que Cristo não exterminou a lei, invalidando-a, mas que ele era aquele alvo para o
qual a lei conduzia. Em Efésios 2.13-16 o apóstolo explica: “Mas, agora, em Cristo
Jesus, vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo. Porque
ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação
que estava no meio, a inimizade, aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma
de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a
paz, e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus, por intermédio da cruz,
destruindo por ela a inimizade.”

Portanto, as promessas com relação a salvação foram anteriores a lei dada por
Moisés e elas se cumpriram. A lei conduziu o povo até o cumprimento das promessas e
por isso ela foi também considerada como “sombra das coisas que haviam de vir” (Cl
2.17). Não queremos dizer com isso que não há nenhum aspecto da lei que deva ser
seguido até os dias de hoje, mas sim que os rituais, as cerimônias e os holocaustos,
tiveram seu lugar e sua simbologia, porém com a vinda de Cristo, isso tudo deixou de
ser necessário, todavia o caráter moral da lei perdura por todos os tempos.

Em Gálatas, Paulo mostra que os filhos de Abraão são aqueles que depositaram
fé em Cristo e por isso são também herdeiros da promessa (3.28-29).
II – O TEXTO PROPRIAMENTE DITO

Com o contexto em mente, fica mais fácil entender o que Paulo está explicando
no trecho que escolhemos. Vamos olhar para as expressões que constituem a chave do
entendimento

Ti, ou=n o` no,moj - “Qual, pois a razão de ser da lei?” - Neste ponto o
apóstolo está respondendo uma possível pergunta dos judaizantes. Era como se eles
dissessem “se, ao que tudo indica, a lei não tem mais valor, por que, pois a lei?” “Já que
ela não afetava absolutamente a promessa feita a Abrão, qual era sua utilidade?”. Na
resposta elaborada Paulo explica o objetivo da lei.

Por lei, aqui, devemos entender que o apóstolo está falando da lei mosaica. A
significação desse termo é definida de modo bem claro em 3.17, onde a lei é
identificada com o código mosaico de princípios espirituais, morais e cerimoniais,
dados quatrocentos e trinta anos depois do tempo de Abraão. Em 3.10 é feita uma
alusão ao “livro da lei”, que claramente se refere ao Pentateuco (Torá).

O problema dos judaizantes era que eles exigiam dos crentes gentios um
cumprimento exagerado e desnecessário da lei no que diz respeito ao seu caráter
cerimonial, principalmente no tocante a circuncisão. Paulo combateu o equivocado
ensino dos judaizantes, explicando com exatidão o propósito da lei; seu ensino sobre o
referido propósito é encontrado nos versículos seguintes.

Em nenhum momento Paulo subestimou a lei ou reduziu seu valor. Ele sempre
aplicou corretamente os propósitos da lei para a vida do crente, deixando claro que a
“lei” e a “graça” ou “lei” e “evangelho” não se excluem, porque Deus é o autor de
ambos, mas cada um cumpre o seu papel. Os judaizantes queriam dar a lei uma função
que ela nunca teve que, de acordo com a Bíblia, Deus nunca pretendeu dar, a saber, a
função de redimir, salvar o homem do pecado. Ainda que os crentes se esforçassem por
serem salvos mediante “obras da lei”, isso seria impossível.

Sabemos que a lei tem muitas utilidades, mas Paulo destaca aqui as utilidades
que serviram para o seu presente propósito.

É interessante notar que, depois de expor o correto uso da lei, com argumentos
esmagadores, o apóstolo faz a declaração final em 6.13 que se caracteriza como um
golpe de misericórdia nos seus adversários; ele diz: “Pois nem mesmo aqueles que se
deixam circuncidar guardam a lei; antes, querem que vos circuncideis, para se
gloriarem na vossa carne”. Portanto os cristãos deveriam tomar cuidado com todo falso
ensino sobre a lei, entendendo a proeminência da obra de Cristo.
Como resposta para a pergunta: “por que a lei?” três afirmações são feitas, que
passaremos a considerar.

tw/n paraba,sewn ca,rin prosete,qh - “Foi adicionada por causa


das transgressões” – Esta é a primeira afirmação. “Foi adicionada” é a tradução de um
verbo no tempo aoristo indicativo passivo (prosete,qh) que indica uma ação
completada no passado. Paulo está afirmando que a lei foi um acréscimo à promessa de
Deus, dado pelo próprio Deus.

O conceito de “lei” como sendo um acréscimo ou interpolação à promessa


constituiria uma idéia revolucionária para os judeus piedosos e quase o mesmo para os
“cristãos judeus” que estavam ainda se dedicando à lei.

A respeito do fato de ter sido a lei acrescentada à promessa, aprendemos com


Longenecker:

O fato de que ‘aumentado’, ‘prostiqhmi’ (adicionar para algo presente) aparece no


texto e não o verbo simples ‘tiqhmi’ (lugar, para cima), indica uma nuança de
menosprezo e sugere que a lei não era da essência da atividade remissória de Deus com
o gênero humano... ‘como Burton habilmente explica: ‘prostiqhmi’ marca a lei
como adicional, e conseqüentemente a subordinada à promessa (Gálatas, 188)’.3

E, já que a lei é um acréscimo à promessa, ela não pode, de modo nenhum,


invalidar a promessa; isto está de acordo com o ensino de 3.17, onde encontramos: “E
digo isto: uma aliança já anteriormente confirmada por Deus, a lei, que veio
quatrocentos e trinta anos depois, não a pode ab-rogar, de forma que venha a desfazer
a promessa”.

Mas, diz Paulo que a lei foi acrescentada “tw/n paraba,sewn ca,rin” - por
causa das transgressões - Paulo cita “paraba,sewn” (transgressão) e não “pecados”.
Por “transgressões” ele está enfatizando faltas intencionais, um desvio do padrão pré-
estabelecido, do caminho certo. Via de regra a expressão “por causa das transgressões”
tem sido entendida de duas maneiras. O problema é gramatical e envolve “ca,rin” que
pode ser entendido de duas maneiras aqui : 1) em um sentido cognitivo (trazer
sobre...um conhecimento de) ou 2) em um sentido causativo (causar, aumentar,
numericamente falando, a transgressão).

É razoável entender, à luz do contexto, que a lei, aqui citada, tem um sentido
cognitivo, ou seja, foi dada para que o homem pudesse ter um conhecimento adequado
do seu estado pecaminoso. A lei definiu um caminho certo e tornou o homem
consciente dele. Isto está de acordo com o que Paulo destaca em Romanos 7.7 quando
diz: “Que diremos, pois? É a lei pecado? De modo nenhum! Mas eu não teria
conhecido o pecado, senão por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça,
se a lei não dissera: Não cobiçarás”.

Considerando sobre o assunto, Hendriksen escreveu:

É o conhecimento do pecado que nos vem por intermédio da lei (Rm 3.20; 7.7,13). A

3
R. Longenecker – Word Biblical Commentary, vol. 41, Galatians – Word Books Publisher,
Dallas, Texas, 1999, p. 138.
lei funciona como uma lente de aumento. Esta, na realidade, não aumenta a quantidade
de manchas que sujam um vestido, mas faz com que elas apareçam com mais clareza e
revelem muito mais do que uma pessoa é capaz de ver a olho nu.4

Isto está de acordo também com o ensino do apóstolo em Romanos 5.20


–“sobreveio a lei para que avultasse a ofensa...”

É impossível definir exatamente o que Paulo quis dizer com “ca,rin”, contudo
o contexto apresentado nos ajudou a optar pela alternativa mais provável.

a;crij ou- e;lqh| to. spe,rma w-| evph,ggeltai - “Até que viesse
o descendente a quem se fez a promessa” – Esta é a segunda afirmação sobre o
propósito da lei. O tempo perfeito de “evpagge,llomai” expressa uma ação passada
com resultados para o presente, sugerindo que a promessa tem e ainda terá efeito.

A expressão “até que” significa “enquanto” e expressa um tempo de vigor para a


lei, pois esta serviu até a vinda do descendente. O ensino de Paulo é que a lei de Moisés
foi planejada por Deus para conduzir os filhos de Deus até a vinda de Cristo. Esta visão
de Paulo é, obviamente, contrária a dos judaizantes que estavam enfatizando a lei como
sendo de utilidade interminável em todos os sentidos, por isso diziam: “Se não vos
circuncidardes segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos” (Atos 15:1).

Na frase em destaque, Paulo fala que a lei serviu até a vinda do descendente a
quem se fez a promessa, mas quem é o descendente? O versículo 16 do capítulo 3 é bem
claro neste particular; ele explica, com exatidão, quem é o descendente de Abraão, por
meio do qual a promessa pode fazer efeito “a todas as famílias da terra”. O apóstolo
escreve: “Ora, as promessas foram feitas a Abraão e ao seu descendente. Não diz: E
aos descendentes, como se falando de muitos, porém como de um só: E ao teu
descendente, que é Cristo”.

A promessa foi feita a Abraão e a Cristo, em quem se cumpriu. Esta promessa


refere-se a garantia de vida eterna. A lei não podia e não pode perdoar pecados e por
isso não pode dar vida, para que a promessa tivesse cumprimento. O poder de redimir e
salvar foram prometidos e dados ao descendente, que é Cristo. Isto nos lembra as
palavras do apóstolo João: “Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e
a verdade vieram por meio de Jesus Cristo” (João 1.17). Nenhum problema com a lei,
pois ela cumpriu o seu propósito sem poder interferir ou cumprir o propósito que estava
reservado para a semente prometida. Vindo Cristo a promessa está concretizada e
perdura até os dias de hoje, não exigindo mais cerimonialismos como o fazia a lei
abolida por Cristo “na sua carne” (Ef 2.15).

diatagei.j diV avgge,lwn evn ceiri. mesi,tou - “Foi


promulgada por meio de anjos pela mão de um mediador” – Esta é a terceira afirmação
sobre a lei. Não é assunto de discussão o fato de que Deus é o autor da lei. O próprio
apóstolo reconhece isso em textos como Rom 7.22,25 e 8.7, onde ele fala da “lei de
Deus”.

O mediador aqui é destacado como “não sendo de um”, isso quer dizer que ele

4
William Hendriksen – Comentário do Novo Testamento – Gálatas, Ed. Cultura Cristã, São
Paulo, 1999, p. 205.
estava entre as partes, no caso da lei, entre Deus, o autor supremo da lei, e os homens
que receberam a lei para praticá-la e dirigirem-se por ela até a vinda de Cristo. Neste
caso, particularmente, quem cumpriu o papel de mediador foi Moisés, conforme
podemos deduzir das palavras escritas em Dt. 5.4 e 5 – “Face a face falou o SENHOR
conosco, no monte, do meio do fogo. Nesse tempo, eu estava em pé entre o SENHOR e
vós, para vos notificar a palavra do SENHOR, porque temestes o fogo e não subistes ao
monte”. Moisés foi o instrumento, colocado pelo próprio Deus, entre o povo e o Senhor
para entregar as ordenanças do alto.

Deus é destacado como “sendo um”. O mesmo Deus que falou a Abrão e a
Moisés, cumpriu toda promessa em Cristo. Deus é um, seu propósito para a humanidade
é um e ele executa com todo cuidado e coerência.

~O ou=n no,moj kata. tw/n evpaggeliw/n Îtou/ qeou/Ð -


“É, porventura, a lei contrária às promessas de Deus?” – Se a primeira pergunta é uma
possível indagação dos judaizantes contra Paulo, agora, a situação inverteu-se. Depois
de discutir a inferioridade da lei comparada a promessa abraâmica, Paulo está
perguntando se a conclusão lógica de tudo aquilo, que fora discutido até ali, é a
existência de contradição entre uma e outra. Para a pergunta de Paulo só havia uma
resposta que ele mesmo pronunciou: De modo nenhum!

A pergunta reveste-se de uma intenção peculiar. É como se Paulo acusasse seus


adversários de tentar achar contradição em Deus, autor da lei e da promessa. Diante de
tão claras explicações, nem os judaizantes e nem os influenciados por eles, poderiam
concluir que promessa e lei eram contrárias uma a outra.

mh. ge,noitoÅ eiv ga.r evdo,qh no,moj o` duna,menoj zw|


opoih/sai( o;ntwj evk no,mou a'n h=n h` dikaiosu,nh\ - “De modo
nenhum! Porque se fosse promulgada uma lei que pudesse dar vida, a justiça na
verdade, seria procedente de lei” - “De modo nenhum!”(mh. ge,noito), à luz de
todas as explicações esta é a resposta enfática de Paulo, que, honestamente, deveria ser
também a dos judaizantes. Esta expressão poderia ser traduzida da seguinte forma:
“absolutamente não” é o modo utilizado pelo apóstolo Paulo para rejeitar enfaticamente
uma idéia. Ele utiliza esta expressão em outros textos como Gl. 2.17, Rm. 6.2, 15 e 7.7.

Paulo admite que poderia existir um conflito se a lei tivesse o propósito de dar
vida, contudo, não é esse o caso. No que diz respeito a salvação “lei e graça” se
excluem. Com isso queremos dizer que salvação não se pode adquirir com meras
práticas daquilo que a lei exige. Isto está de acordo com o ensino de Paulo em Rm 4.14
“...pois, se os da lei é que são os herdeiros, anula-se a fé e cancela-se a promessa...” e
Rm 11.6 – “...e, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é
graça...”.

Sobre o fato de que a lei não pode dar vida Donald Guthrie expressou-se da
seguinte maneira:

Para transmitir vida, a lei teria de perdoar o condenado, isto é, justificá-lo ou dar-lhe
uma condição de justo. Mas isto está além do alcance da lei. Tanto a lei quanto a
promessa, portanto, tinham suas respectivas esferas, que não se sobrepunham, nem
entravam em choque entre si. Deus podia perdoar aqueles que sua própria lei
condenava, mas este era um ato de graça, assim como a promessa também constituía um
ato de graça.5

Ainda que façamos uma distinção, totalmente possível, dos tipos de lei que
existem no Antigo Testamento, entre lei civil, moral e cerimonial 6, descobriremos, que a
lei não pode dar vida, pois como diz Tiago: quem erra em um ponto da lei se torna
culpado de todos. (Tg.2:10).

avlla. sune,kleisen h` grafh. ta. pa,nta u`po. a`marti,an -


“Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado” - Paulo fala, com muita certeza,
que a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado. Mas, qual é o trecho (do A.T.) que ele
está citando? Não podemos definir com precisão, pois nenhuma parte da “Escritura” que
Paulo citou traz estas palavras do modo como aparecem aqui.

Longenecker assevera que: “o artigo [h`] junto a palavra Escritura sugere que
Paulo estava com uma passagem particular em mente, provavelmente o antecedente
mais imediato de 3.10, isto é, Deuteronômio 27.26”.7

O texto de Deuteronômio 27.26 fala de “maldição” para os que não confirmam


as palavras da lei. Como não há um texto do A.T. que diga exatamente o que Paulo
anunciou, parece-nos mais correto entender que ele estava falando do ensino geral do
A.T. sobre a situação pecaminosa do homem.

O verbo “sune,kleisen” é especialmente importante para se entender a


condição da raça humana que estava sob o pecado. Ele significa “cercado de todos os
lados”, “sem possibilidades de fuga”. Assim sendo o homem debaixo da lei, sem fé na
promessa, vivia num estado de total desespero e sem esperanças, pois a lei não oferecia
alternativas de salvação, senão condenação. Archibald Thomas Robertson ilustra este
quadro da seguinte forma: “é como se fechasse sobre nós a tampa de um baú que não
pudéssemos abrir, ou como se fôssemos presos em uma masmorra”8

Essa situação agonizante poderia ser desfeita “mediante a fé”, expressão que
agora vamos estudar.

evpaggeli,a evk pi,stewj VIhsou/ Cristou/ doqh/| toi/j


pisteu,ousin - “mediante a fé em Jesus Cristo, fosse a promessa concedida aos que
crêem” - Não sendo possível encontrar esperanças de salvação na lei, era necessário
esperar em Cristo, e depositar fé em sua obra salvadora. Depois de descobrir a
necessidade de ser libertado, o pecador deve depositar a fé em Cristo que pode fazer o
que a lei não podia. Só Jesus pôde “buscar e salvar o que se havia perdido” (Lc.19.10).
5
Donald Guthrie – Gálatas, introdução e comentário – Ed. Vida Nova, São Paulo, 1999, p. 134.
6
As leis do Antigo Testamento podem ser divididas assim para facilitar a nossa compreensão
quanto à aplicabilidade delas. A lei civil é o conjunto das ordenanças dadas à sociedade ou ao estado de
Israel. Nesta lei estão estabelecidos os castigos para vários delitos contra a ordem social. A lei cerimonial
é o conjunto de regras que regulava os sacrifícios e a adoração a Deus. A lei moral representa em todos os
tempos a vontade de Deus para o homem no que diz respeito aos seus deveres principais. Dividida assim,
entendemos que só o aspecto moral da lei é que continua sendo útil e totalmente aplicável para os nossos
dias. (Para maiores detalhes sobre estes aspectos da lei, veja-se: Mauro Meister – Lei e Graça – Ed.
Cultura Cristã, São Paulo, 2003 e Solano Portela – A Lei de Deus Hoje – Ed. Os Puritanos, São Paulo,
2000).
7
R. N. Longenecker – Op. Cit., p.144.
8
Archibald Thomas Robertson – Imágenes Verbales en el Nuevo Testamento 4 – Ed. CLIE,
Terrassa, Barcelona,1989, p. 402.
A promessa foi feita a Abrão, estendeu-se a Cristo (3.16) e de Cristo, a todos os
que nele confiam, pois estes também se tornam filhos de Abraão e herdeiros da
promessa, de acordo com o ensino de Paulo em 3.28-29: “Dessarte, não pode haver
judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós
sois um em Cristo Jesus. E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e
herdeiros segundo a promessa”.

No seu eterno propósito, Deus focalizou e deu o devido valor a fé e a obediência


que os homens deveriam depositar em Cristo, e isto era evidenciado, no Antigo
Testamento, quando os homens confiavam na promessa de Deus sobre a vinda do
Messias.

O propósito da lei foi manifesto. Ela foi a medida temporária que visava levar os
homens a buscar outro caminho de vida, através da promessa, por meio de fé. Romanos
11.32 expressa a mesma idéia: “porque Deus a todos encerrou na desobediência, a fim
de usar de misericórdia para com todos”.

Portanto, a justificação pela fé e a salvação plena e gratuita são dádivas


concedidas a todos aqueles que abraçam Jesus Cristo através de uma simples confiança,
independente das obras da lei.

Pro. tou/ de. evlqei/n th.n pi,stin u`po. no,mon


evfrourou,meqa - “antes que viesse a fé estávamos sob a tutela da lei” – Se
observarmos bem existe uma suave transição entre “encerrou sob o pecado” e “sob a
tutela da lei”. Antes de vir Cristo os homens estavam presos e a lei e o pecado eram
seus carcereiros, pois, conforme aprendemos com Paulo, o pecado deriva a sua força da
lei: “O aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei”. (1Co. 15.56).

O verbo “evfrourou,meqa” é parecido com o verbo “sune,kleisen” e


significa “confinado”, “guardado”, “tutelado” – a idéia é de montar guarda para
proteger, lembra uma guarnição que mantinha a guarda de uma cidade.

Nota-se, portanto, que a lei não era de todo hostil, ela também pretendia vigiar e
guardar os homens de praticar aquilo que Deus desaprovava, nesse sentido a lei nos
serviu de proteção.

A tutela da lei durou até a vinda da fé. Mas, será que não existia fé no Antigo
Testamento? Não é isso que o apóstolo quer dizer. Fé, aqui é a fé no Cristo encarnado.
O objeto da fé é o mesmo tanto no Antigo como no Novo Testamento, a diferença
reside no fato de que os do passado olhavam para frente e depositavam fé no Cristo que
haveria de vir, todavia, desde que Cristo veio, desde a época de Paulo e até o presente
momento, nós contemplamos e depositamos nossa fé no Cristo que já veio. Sem
condições de cumprir a lei que lhes era imposta, os judeus do A.T. deveriam confiar na
promessa da “salvação sem dinheiro e sem preço” (Is.55.1). Enquanto o Cristo
“histórico” não aparecesse todos estavam tutelados pela lei.

A explicação sobre como a lei exercia essa tutela está mais claramente
evidenciada no versículo seguinte e é expressa da seguinte forma:
w[ste o` no,moj paidagwgo.j h`mw/n ge,gonen eivj
Cristo,n - “a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo” – A palavra traduzida
como aio é “paidagwgo.j” e pode ser mais propriamente traduzida como “guia
disciplinador”. Ao contrário do que alguns chegam a pensar, o pedadogo, destacado por
Paulo não exercia função de ensino, mas necessariamente de disciplina.

O pedagogo referido no texto era o escravo responsável pela disciplina da


criança. Tinha o dever de conduzir a criança ou o jovenzinho à escola e de volta dela e
supervisionar a sua conduta de modo geral, da idade escolar até os dezoito anos. Não há
em nossos dias um correspondente exato para o pedagogo dos dias de Paulo. Muitos
deles eram severos a ponto de serem cruéis, aparecem nos desenhos antigos com uma
vara ou bengala na mão. Parece que o rigor disciplinar do pedagogo foi destacado por
Paulo em 1Coríntios 4. No versículo 15 ele diz: “Porque, ainda que tivésseis milhares
de preceptores em Cristo, não teríeis, contudo, muitos pais; pois eu, pelo evangelho,
vos gerei em Cristo Jesus”. A palavra “preceptores”, aqui, é a tradução para
“paidagwgou.j” – “disciplinadores”; então, era como se o apóstolo estivesse dizendo:
“há muita gente para discipliná-los, mas eu sou o único que os amo”; isso pode ser
entendido, pois mais adiante, no mesmo capítulo, no versículo 21 ele pergunta: “Que
preferis? Irei a vós outros com vara ou com amor e espírito de mansidão?”; trançando
um contraste entre a disciplina do pedagogo e o amor de um pai (vara versus amor e
espírito de mansidão).

William Barclay retrata o pedagogo dos tempos antigos da seguinte maneira:

O paidagogos não era, de modo algum, um professor em nosso sentido da


palavra. Seu dever era acompanhar o menino para a escola todos os dias, para que este
chegasse ali com segurança; carregar os livros e a lira do menino; fiscalizar sua conduta
na escola; supervisionar sua conduta na rua; treinar o menino na moralidade, nas boas
maneiras e na conduta. Devia fazer com que o menino andasse modestamente, com a
cabeça baixa na rua; devia fazer com que desse lugar às pessoas de mais idade e com
que mantivesse um silêncio decoroso na presença destas; devia ensiná-lo a ter boas
maneiras à mesa e a usar suas roupas de modo gracioso. Tinham de ensinar-lhe tudo
quanto os gregos entendiam por eukosmia, boas maneiras, boa conduta, vida agradável.9

E é com esse profissional que Paulo compara a lei, para dizer que a lei cumpriu
todo o seu propósito conduzindo-nos a Cristo. A lei pode ser comparada com o
pedagogo no sentido de que ela cobre um período da vida e não a vida toda e,
conduzindo a Cristo, torna o indivíduo apto para desenvolver-se espiritualmente, para
uma obediência a Deus mais completa e verdadeira. É essa a idéia ensinada por Van
Groningen, quando fala a respeito do papel da lei entregue no Sinai:

A lei como dada no Sinai aos descendentes de Jacó, revela que eles eram crianças e não
adultos maduros. Como sempre existe o potencial em uma criança de se tornar um
adulto responsável, se for sob instrução, direção e cuidado amoroso, assim os
descendentes de Jacó foram assegurados no Monte Sinai, pela verbalização de Yahweh
da sua lei, de que no caminho da obediência, submissão e devoção amorosa, eles
poderiam se desenvolver em adultos maduros. O apóstolo Paulo informou aos gálatas
cristãos que a lei, como dada no Sinai, foi para crianças que tinham que crescer para
liberdade do modo de vida pactual de Yaweh (Gl 4.1-7). A lei de Deus revelou o caráter
de Yaweh e o caráter dos filhos de Jacó. No entanto, a lei, como dada, não assegurou

9
William Barclay – Palavras Chaves do Novo Testamento – Ed. Vida Nova, São Paulo, 1985, p.
147.
que a cegueira, corrupção e rebelião fossem removidas. A lei não foi dada com essa
intenção e nem poderia fazer isso.10

Considerando que a disciplina exercida pelo pedagogo era severa, os que eram
tutelados por eles suspiravam pelo dia da emancipação. Cumprindo esse papel a lei
preparou o coração dos crentes do passado para a fé em Cristo, para a justificação pela
fé, pela qual suspiramos quando ouvimos e atendemos a chamado do evangelho. Para a
salvação a lei era inadequada e insatisfatória e, portanto, destinada a ter um fim. E neste
sentido podemos afirmar com toda segurança, junto com o apóstolo: “Porque o fim da
lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê”.

i[na evk pi,stewj dikaiwqw/men\ - “a fim de que fôssemos


justificados por fé” – Tendo a lei cumprido seu papel, agora, em Cristo pode haver
salvação pois nele a promessa de vida eterna é concretizada e ele pode tornar justos os
que confiam nele. Ser justificado “dikaiwqw/men” significa ter toda culpa removida.
É isso que Cristo fez, diante de Deus, para aqueles que depositaram fé nele, removeu a
culpa plenamente. Na linguagem de Paulo, Cristo... “tendo cancelado o escrito de
dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial,
removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; e, despojando os principados e as
potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz” (Colossenses
2.14). Sim, foi o que Cristo fez, cancelou o prontuário que nos acusava diante de Deus.

A lei colocou-nos na situação de cárcere, mas o Redentor veio e libertou-nos,


por meio de fé, a única condição para sair do estado miserável, portanto, era depositar fé
no Redentor.

Todo raciocínio e argumentação de Paulo foram desenvolvidos até aqui para


destacar o que podemos considerar o tema ou assunto mais importante desta carta: a
justificação pela fé. Diante de tão claras explicações, seus oponentes e os próprios
gálatas deveriam ficar convencidos de que a circuncisão ou a incircuncisão nada eram,
pois independente das obras da lei, a justificação vem pela fé em Cristo.

evlqou,shj de. th/j pi,stewj ouvke,ti u`po. paidagwgo,n


evsmen - “mas, vindo a fé já não permanecemos subordinados ao aio” – Quando os
meninos que eram tutelados pelo pedagogo cresciam, eles se viam livres para sempre e
preparados para prosseguirem sozinhos no aprofundamento do conhecimento. A lei
cumpriu seu papel, e agora, os que foram justificados por Cristo, não estão mais debaixo
da lei.

Nesta frase, a palavra “fé” é sinônima da palavra “Cristo”, fé e Cristo andam


juntos e por isso, quando Cristo encarnou-se veio a fé no Cristo encarnado, conforme já
consideramos. A conjunção adversativa “de.” –“mas” indica a nova ordem de coisas, o
novo relacionamento entre Deus e o homem ancorado na fé.

É necessário deixar bem claro aqui que Cristo aboliu a lei, e dela nos libertou,
nos seus aspectos civis e cerimoniais, mas não do caráter moral. Nenhum rito religioso
ou lei regulamentadora das atividades no estado teocrático de Israel, podem ser

10
Gerard Van Groningen – Op. Cit., p. 375.
aplicados ao povo de Deus nos nossos dias, mas as exigências morais perduram, pois
representam a vontade de Deus para o homem em todos os tempos, além do que, no
Novo Testamento, em nenhum momento se fala de abolição para esse caráter da lei,
pelo contrário, o próprio Senhor Jesus enfatizou a importância dos Dez Mandamentos ,
resumindo-os em dois que destacam o compromisso que os homens devem ter com
Deus e o compromisso que eles devem ter com o próximo. Ele o fez nas seguintes
palavras: “Respondeu-lhe Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de
toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento.
O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mateus
22:37-39). Depois de pronunciar estas palavras o Mestre declarou que destes
mandamentos dependem “toda Lei e os Profetas”.

Sendo assim, devemos compreender que a justificação e a liberdade que


obtemos em Cristo nos limitam para viver de acordo com as ordens de Cristo, pois não
estamos mais debaixo de aio.
CONCLUSÕES

A epístola de Paulo aos Gálatas é considerada, com razão, como sendo a carta
magna da liberdade cristã. Isto porque o apóstolo dá uma dimensão precisa sobre o
relacionamento do crente em Cristo com a lei.

O apóstolo nos ensina a dizer não ao legalismo. Os judaizante queriam que os


crentes fossem circuncidados e Paulo claramente explica que a circuncisão nada é e que
muitos estavam impondo sobre os outros um jugo que nem eles mesmos podiam
carregar.

Da experiência de Paulo e da carta que ele escreveu aprendemos que devemos


dizer não ao legalismo independente da forma como ele aparecer. Para tanto, é
necessário lembrar que a mensagem do evangelho é pura e simples: “salvação só pela fé
em Jesus Cristo” e seja “anátema” quem anunciar evangelho diferente desse (Gl. 1.8),
pois ninguém deve ser “árbitro entre os crentes com pretextos de humildade”(Cl. 2:18).

Ao mesmo tempo que nos ajuda a combater o legalismo, a carta aos gálatas
adverte a igreja também contra a libertinagem.

O fato de os crentes serem libertos por Cristo, não significa que eles podem
viver libertinamente, cometendo pecados mil, baseados na obra de redenção de Cristo.
Os crentes devem saber que aqueles que morreram para o pecado de modo nenhum
podem viver pecando. Na mesma carta o apóstolo escreveu: “...porque vós, irmãos,
fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne;
sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor”(5.13). O que Paulo esperava dos crentes
de seu tempo, era o que se deve esperar dos crentes do nosso tempo que estudam com
honestidade as Escrituras, uma vida cristã equilibrada, sem extremos, sabendo
exatamente como obedecer a lei moral de Deus registrada na Bíblia toda.

É interessante notar também que Paulo, de modo nenhum ignorou o Antigo


Testamento. Ele sempre faz menção dele para explicá-lo e fazer as ligações e aplicações
para o seu tempo presente. Isto deve ser destacado para neutralizar aqueles que querem
descartar o Antigo Testamento da Bíblia como se ele não fosse Escritura autoritativa.
Paulo amava e compreendia a lei ele não era inimigo e nem escravo dela. Eis o ponto de
equilíbrio compreender os propósitos da lei e aplicar, na vida cristã, aquelas leis de
valores eternos.

Regozijamo-nos no Senhor, porque, sendo o seu povo não vivemos sem lei.
Porque em Cristo, podemos cumprir os mandamentos de Deus e agradá-lo, porque nele
fomos feitos justiça de Deus, e porque, na eternidade, vamos aprender cada vez mais da
lei de Deus, mais pura que o ouro e mais doce que o mel, louvando-o sempre por tudo o
que ele fez por nós e, por fim, por que estamos sob a “lei perfeita, lei da liberdade”
(Tiago 1.25). Quanto amo a tua lei! É a minha meditação, todo o dia! (Sl119.97).
BIBLIOGRAFIA

Barclay, William – Palavras Chaves do Novo Testamento, Ed.


Vida Nova, São Paulo, 1985.

Guthrie, Donald – Gálatas, introdução e comentário, Ed. Vida


Nova, São Paulo, 1999.

Hendriksen, William – Comentário do Novo Testamento –


Gálatas, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, 1999.

Longenecker, Richard N. – Word Biblical Commentary, vol. 41,


Galatians, Word Books Publisher, Dallas, Texas, 1999.

Meister, Mauro – Lei e Graça – Ed. Cultura Cristã, São Paulo,


2003.

Portela, Solano – A Lei de Deus Hoje – Ed. Os Puritanos, São


Paulo, 2000.

Robertson, Archibald Thomas – Imágenes Verbales en el


Nuevo Testamento 4, Ed. CLIE, Terrassa, Barcelona,1989.

Van Groningen, Gerard – Criação e Consumação vol. 1, Ed.


Cultura Cristã, São Paulo, 2002.

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