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A crise no Rio e o pastiche midiático

quinta-feira, 25 de novembro de 2010


http://luizeduardosoares.blogspot.com/?spref=fb

Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns


casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e
profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo
não se inviabilize. Faço-o por ética –supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos
eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso,
me esforço por atender aos que me procuram, porque sei que atuam sob pressão,
exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises,
por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso, quando
ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa
Civil, trabalhamos tanto –ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas.
Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar
com a mídia:
(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal
ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de
cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de
secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a
oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos
repórteres, produtores ou entrevistadores que me procuraram.
(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro
lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso
poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os
discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes, reproduzindo o senso
comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito
grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de
modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como
fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores?
Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –
em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das
emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente
triunfalista do discurso oficial?
(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção
à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso
e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas
recorrentes são: (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência? (b) O
que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? (c) Por que o
governo não chama o Exército? (d) A imagem internacional do Rio foi maculada? (e)
Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?
Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a
legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns
colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e
imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas
aspas –nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas.
Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou
proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não
funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao
modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí
predominantes. Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua
contínua reprodução.
Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo
corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos
mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um
entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso, aproveitando-me do expediente
discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir. Eis as
respostas, na sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:
(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da
insegurança?
Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na
crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os
sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é
possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma
enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas,
de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o
cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo
hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem
para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo
para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a
realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança
pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua
intensificação, expressa nas sucessivas crises?
Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige
uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que
não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude
representa, exatamente, a postura que tem impedido avanços consistentes na segurança pública.
Se a sociedade, a mídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema
em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento
sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando, enquanto Nação, a tratar do problema na
perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas,
para as quais não há soluções mágicas.
A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução
das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada
senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza,
reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.
A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.
(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico
de drogas?
Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos
“arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de
negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam
também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias,
territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por
meios cruéis.
Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro
problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir
crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de
segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio
de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico
armado, assim como as milícias.
Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo
contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam,
estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da
degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o
convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios
ou mesmo empreendedores do crime.
Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em
franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua
incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte
histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição
de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas
drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do
tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa
muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias,
posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes
de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda
podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É
excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida
que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas.
Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais
rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por
delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em
outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se
fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos
danoso para a sociedade, por óbvio.
(c) O Exército deveria participar?
Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem
está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de
controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais
passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda
podre das polícias.
E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no
controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos.
Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas,
controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.
(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?
Claro. Mais uma vez.
(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?
Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o
“espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a
rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.
Palavras Finais
Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado.
O canto de cisne do tráfico era esperado. Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a
tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a
um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale
dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego
administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que
acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que
tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco,
com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A
despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria
estadual de assistência social --um dos melhores gestores do país--, elas não terão futuro se as
polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública
terão de incluir duas qualidades indispensáveis: escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser
assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM
seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.
O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo
territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da
polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto
histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios –as bandas
podres das polícias-- prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos,
economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.
Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o
foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma
radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias,
tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as
instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados?
Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis,
ineficientes na prevenção e na investigação?
As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito.
Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição.
Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas
relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de
sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de
transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa
sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à
defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à
defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e
a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento
corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são
rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas,
onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições:
oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.
E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam
aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada
informal e ilegal.
Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato
orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do
orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em
segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois
sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam
sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas
malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança;
unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como
máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo
(pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou
legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as
polícias.
O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro,
salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o
dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me
tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar
milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.
Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou
será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.
Postado por Luiz Eduardo Soares às 21:08

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http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,policia-ocupa-alemao-todas-as-casas-serao-
revistadas--afirma-comandante,646403,0.htm

Polícia ocupa Alemão; 'Todas as casas serão revistadas',


afirma comandante
Segundo comandante da operação, é um trabalho de paciência e policiais 'não
tem hora pra sair'

28 de novembro de 2010 | 7h 06

estadão.com.br

RIO - "Todas as casas serão revistadas. Beco por beco, buraco por buraco", afirmou o
comandante geral da PM Mario Sergio Duarte, no complexo do Alemão, na Grota. Segundo
ele, ninguém foi baleado, mas ainda não é possível fazer um balanço da operação.
O delegado Rodrigo de Oliveira, comandante da operação, disse que a área já está em poder da
polícia. Apesar de ter enfrentado dificuldades no início, Oliveira disse que os policiais "furaram
o bloqueio". Durante a operação, policiais ocuparam a casa do traficante Pezão (veja foto
abaixo), considerado um dos chefes do tráfico, que está foragido.

"Agora é um trabalho de paciência e não temos hora pra sair", disse ainda sobre o controle dos
pontos estratégicos nos morros. De acordo com o comandante, foram vistos rastros de sangue
onde os traficantes estariam, o que indica que pode haver pessoas feridas.

Operação. A polícia começou a subir no Complexo do Alemão pouco antes das 8 horas da
manhã deste domingo, 28. Segundo a polícia, muitos traficantes se refugiaram no topo do
morro, onde é possível ter uma vista melhor da operação.

Mais cedo, às 6h40, traficantes e policiais voltaram a trocar tiros nos dois lados da favela da
Grota. Os moradores estão sendo abrigados em um galpão localizado na entrada do morro da
Grota.

Helicópteros da polícia fazem voos rasantes e os caveirões da polícia já ocupam o morro. O


veículo conhecido como 'Cascavel', um blindado do exército, e os blindados da Marinha
também ocuparam a favela. Assim como aconteceu na Vila Cruzeiro, a invasão só foi possível
por conta do uso dos veículos das Forças Armadas, que conseguem ultrapassar as barricadas
organizadas pelos traficantes.

Fazendinha. Aos gritos de "caveira", um grupo de 30 homens do Bope avançou pela Rua
Canitar, principal acesso da Fazendinha, no Complexo do Alemão. Eles seguem a pé pela
comunidade com o apoio de um caveirão da PM e de um blindado da Marinha. O local está
tomado por dezenas de policiais e militares e muita pouca gente se aventura a sair.

Alguns moradores acompanham a movimentação das tropas de suas janelas tentando ao mesmo
tempo se esconder de uma possível bala perdida. O clima é tenso, mas as forças policiais
demonstram confiança na ação. Alguns soldados do Exército comentam entre si que gostariam
muito de participar das ações de um modo mais efetivo e lamentam que o papel deles seja
apenas de contenção e cerco.
Moradores. Embora muito apreensivos, os moradores assistem com curiosidade à investida da
polícia. "Estou achando muito legal. Já deviam ter feito isso faz tempo", disse uma moradora.

Apesar da aprovação da maioria, há moradores que reclamam de abuso policial. A atendente


Flavia Gomes, de 28 anos, por exemplo, conta que sua irmã de apenas 14 anos está detida em
um ônibus da polícia desde as 23 horas da noite de ontem.

Mesmo já tendo sido levada para delegacia e tendo sua ficha limpa confirmada, ela ainda não
foi liberada. "Concordo com a ação da polícia. Mas não acho que eles podem deter quem devia
ser liberado", disse Flavia. De acordo com ela, a irmã mais nova foi detida quando caminhava
com o cunhado durante a noite.

Uma dona de casa, Ana Paula da Silva, de 30 anos, estava com uma criança de 3 meses e tentou
levar alimento para a mãe que vive no Complexo do Alemão, mas foi impedida por policiais de
subir o morro.

Segundo Ana Paula, há três dias, os alimentos da mãe estavam no fim e por isso foi levar mais
mantimentos até o local onde ela mora. "Cheguei às 6 da manhã e os policiais não me deixaram
subir. Se não fosse o tiroteio, teria subido antes", explica Ana Paula.

De acordo com os policiais, os moradores não poderão retornar para suas casas até que a
situação esteja resolvida. Pois, caso alguma vítima seja baleada, o planejamento da operação
pode ser totalmente alterado.

Madrugada. Durante a noite, a situação no Complexo do Alemão foi de calmaria. Não houve
conflitos e nem trocas de tiros e nenhum criminoso se rendeu.

(Rodrigo Burgarelli, Alfredo Junqueira, José Maria Tomazela e Felipe Werneck)

Texto atualizado às 17h.

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http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20101129/not_imp646634,0.php#noticia

'Vejo uma regressão ao momento do 'Tropa 1''


Para antropólogo, que é ex-secretário Nacional de Segurança, clima de
confronto entre polícia e tráfico dificulta debate sobre políticas de segurança
pública

29 de novembro de 2010 | 0h 00
Bruno Paes Manso - O Estado de S.Paulo

O antropólogo Luiz Eduardo Soares, autor de Cabeça de Porco e Elite da Tropa 1 e 2, vê de


forma positiva a operação de ontem no Complexo do Alemão, mas considera o debate sobre
segurança "enviesado".

Robson Fernandjes/AE
Policial participa de operação no Complexo do Alemão neste domingo, 28

Como o senhor avalia a operação de ontem no Alemão?


O trabalho está sendo feito com prudência e teve resultados positivos. O fato de parte dos
suspeitos ter fugido diluiu a resistência e evitou um banho de sangue. A chegada do Estado ao
complexo abre espaço para o avanço de políticas sociais que estavam sendo preparadas. Por
outro lado, pode frustrar parte da opinião pública que esperava uma batalha final, uma espécie
de desembarque na Normandia. E isso porque o tom da cobertura está equivocado.

Como o sr. avalia a cobertura?


O que mais me chocou foi o tom triunfalista nas TVs e revistas. Um dia de cão como quinta-
feira apareceu como um dia histórico, de vitórias e grandes conquistas. As imagens, chocantes,
contradiziam esse discurso. Mostravam as polícias entrando na Vila Cruzeiro e completavam:
"Ninguém foi preso". A polícia não existe no Rio e tem sido parceira e sócia do crime. Não
fosse esse apoio, o tráfico não teria alcançado o patamar atual. A banda podre é uma orquestra.
É urgente reformá-la.

O sr. acha que existe um efeito pós-Tropa de Elite na forma como as pessoas estão
assistindo a essas cenas?
Sinto uma regressão ao Tropa de Elite 1. O filme que agora está sendo projetado na cabeça da
população é o primeiro. Era o momento de confronto entre polícia e tráfico, com o
protagonismo do Bope e toda a polaridade entre bem e mal. Já o Tropa 2 é mais amargo, difícil
de digerir porque traz questões mais complexas, mostra que o verdadeiro problema é outro.

Parece estranho ver o oficial que inspirou o Capitão Nascimento, Rodrigo Pimentel,
também seu parceiro nos livros, comentando as ações do Bope diariamente. Como o
senhor vê o desempenho dele?
O Pimentel, quando era policial, teve uma trajetória lúcida, crítica, e sempre se preocupou em
refletir sobre a polícia. Por ser crítico e eloquente, acabou tendo a carreira trincada, foi preso e
punido, situação que o conduziu a outro caminho na vida civil. Mas é natural que ele tenha o
coração dividido porque tem amigos no Bope e há algo do caveira que continua. Afinal, ele
passou por todos aqueles ritos de passagem. De um lado, há o espírito
crítico; de outro, a identificação com sua própria trajetória. Isso pode
contaminar as opiniões dele. Mas muito menos que os limites que a
própria emissora estabelece por meio de sua linha editorial.

As questões essenciais estão passando ao largo?


Mais que passar ao largo, está havendo uma inversão das prioridades. Nós, em geral, pensamos
pelo filtro do bem e do mal, do maniqueísmo mais simples, os mocinhos como oponentes dos
bandidos, que seriam os maus. De um lado os policiais, de outro os traficantes. Ocorre que, no
dia a dia, ao longo desse processo, essa distinção não existe. O tráfico tem essa dimensão por
causa do apoio da polícia, que domina comunidades por meio das milícias.

QUEM É - Luiz Eduardo Soares


Antropólogo, ex-secretário Nacional de Segurança, coautor dos livros Cabeça de Porco,
Espírito Santo e Elite da Tropa 1 e 2, base para os filmes da série "Tropa"

sábado, 27 de novembro de 2010


UPP e resistência do tráfico no RJ

http://rudaricci.blogspot.com/2010/11/upp-e-resistencia-do-trafico-no-rj.html?
spref=fb

Do site do Núcleo de Estudos em Cidadania, Conflito e Violência Urbana (NECVU):


A iniciativa é reconhecidamente louvável do ponto de vista da segurança pública, mas o
sociólogo Michel Misse, professor associado do Departamento de Sociologia do Instituto de
Filosofia e Ciências Sociais (Ifcs-UFRJ), lembra que a UPP não foi responsável pela
diminuição do tráfico nos morros que vêm sendo ocupados. “O número de traficantes nessas
regiões diminuiu após uma política repressiva e violenta que levou à morte uma média de 10
mil pessoas oficialmente, sendo cerca de quatro mil crianças e adolescentes”, comenta o
professor, que dirige o Núcleo de Estudos em Cidadania, Conflito e Violência Urbana
(NECVU). Segundo Misse, o tráfico de drogas no Rio de Janeiro não deixará de existir. Afinal,
enquanto houver demanda, haverá oferta. O que diminuiu foi o tráfico associado ao poder
ostensivo sobre os moradores das comunidades e conflitos intermitentes entre os traficantes
pelo domínio desses territórios. “Tem gente vendendo drogas no Santa Marta (morro de
Botafogo, primeiro a receber a UPP), só não tem mais aquele controle de território, ostensivo,
armado”, esclarece o professor do Ifcs. Ele afirma que a diminuição desse estilo tem origem no
crescimento do tráfico de drogas na classe média, assim como maior consumo de drogas
sintéticas, em detrimento da cocaína. O sociólogo frisa que há três comunidades no Rio de
Janeiro plenamente dominadas por traficantes, onde a implantação de UPPs será muito mais
difícil: Jacarezinho, Complexo da Maré e do Alemão. Misse diz que, nessas comunidades, o
tráfico não parece estar em declínio como nos morros que já foram ocupados para a instalação
das UPPs.
Postado por Rudá Ricci às 08:48

28 de novembro de 2010 às 11:32

Marcelo Freixo: Não haverá vencedores


http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/marcelo-freixo-nao-havera-vencedores.html

Pode parecer repetitivo, mas é isso: uma solução para a segurança pública do Rio terá de passar
pela garantia dos direitos dos cidadãos da favela

por Marcelo Freixo, na Folha de S. Paulo, via Vermelho

Dezenas de jovens pobres, negros, armados de fuzis, marcham em fuga, pelo meio do mato.
Não se trata de uma marcha revolucionária, como a cena poderia sugerir em outro tempo e
lugar.

Eles estão com armas nas mãos e as cabeças vazias. Não defendem ideologia. Não disputam o
Estado. Não há sequer expectativa de vida.

Só conhecem a barbárie. A maioria não concluiu o ensino fundamental e sabe que vai morrer
ou ser presa.

As imagens aéreas na TV, em tempo real, são terríveis: exibem pessoas que tanto podem matar
como se tornar cadáveres a qualquer hora. A cena ocorre após a chegada das forças policiais do
Estado à Vila Cruzeiro e ao Complexo do Alemão, zona norte do Rio de Janeiro.

O ideal seria uma rendição, mas isso é difícil de acontecer. O risco de um banho de sangue,
sim, é real, porque prevalece na segurança pública a lógica da guerra. O Estado cumpre, assim,
o seu papel tradicional. Mas, ao final, não costuma haver vencedores.

Esse modelo de enfrentamento não parece eficaz. Prova disso é que, não faz tanto tempo assim,
nesta mesma gestão do governo estadual, em 2007, no próprio Complexo do Alemão, a polícia
entrou e matou 19. E eis que, agora, a polícia vê a necessidade de entrar na mesma favela de
novo.

Tem sido assim no Brasil há tempos. Essa lógica da guerra prevalece no Brasil desde Canudos.
E nunca proporcionou segurança de fato. Novas crises virão. E novas mortes. Até quando? Não
vai ser um Dia D como esse agora anunciado que vai garantir a paz.

Essa analogia à data histórica da 2ª Guerra Mundial não passa de fraude midiática.

Essa crise se explica, em parte, por uma concepção do papel da polícia que envolve o confronto
armado com os bandos do varejo das drogas. Isso nunca vai acabar com o tráfico. Este existe
em todo lugar, no mundo inteiro. E quem leva drogas e armas às favelas?
É preciso patrulhar a baía de Guanabara, portos, fronteiras, aeroportos clandestinos. O lucrativo
negócio das armas e drogas é máfia internacional. Ingenuidade acreditar que confrontos
armados nas favelas podem acabar com o crime organizado. Ter a polícia que mais mata e que
mais morre no mundo não resolve.

Falta vontade política para valorizar e preparar os policiais para enfrentar o crime onde o crime
se organiza – onde há poder e dinheiro. E, na origem da crise, há ainda a desigualdade. É a
miséria que se apresenta como pano de fundo no zoom das câmeras de TV. Mas são os homens
armados em fuga e o aparato bélico do Estado os protagonistas do impressionante espetáculo,
em narrativa estruturada pelo viés maniqueísta da eterna “guerra” entre o bem e o mal.

Como o “inimigo” mora na favela, são seus moradores que sofrem os efeitos colaterais da
“guerra”, enquanto a crise parece não afetar tanto assim a vida na zona sul, onde a ação da
polícia se traduziu no aumento do policiamento preventivo. A violência é desigual.

É preciso construir mais do que só a solução tópica de uma crise episódica. Nem nas UPPs se
providenciou ainda algo além da ação policial. Falta saúde, creche, escola, assistência social,
lazer.

O poder público não recolhe o lixo nas áreas em que a polícia é instrumento de apartheid. Pode
parecer repetitivo, mas é isso: uma solução para a segurança pública terá de passar pela garantia
dos direitos básicos dos cidadãos da favela.

Da população das favelas, 99% são pessoas honestas que saem todo dia para trabalhar na
fábrica, na rua, na nossa casa, para produzir trabalho, arte e vida. E essa gente — com as suas
comunidades tornadas em praças de “guerra”– não consegue exercer sequer o direito de dormir
em paz.

Quem dera houvesse, como nas favelas, só 1% de criminosos nos parlamentos e no


Judiciário…

*Marcelo Freixo é deputado estadual (PSOL-RJ), presidente da Comissão de Defesa dos


Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

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Carcaça de uma sociedade
A tragédia carioca, maldito fruto de instituições públicas que convertem
miséria em violência

27 de novembro de 2010 | 14h 54


JOSÉ PADILHA
Para Padilha, se o governo insistir nas UPPs, os confrontos serão inevitáveis. “Espero que o
governo federal entre de cabeça e implemente um plano nacional de segurança sério”

Por que o Rio de Janeiro é uma cidade tão violenta? Por que tem um
número tão alto de homicídios e de assaltos todo ano? Por que grande
parte da capital carioca, sobretudo as áreas mais carentes, está dominada
por grupos armados? Por que a história do Rio é marcada pela repetição
de acontecimentos traumáticos na área de segurança pública, acontecimentos que chamam a
atenção do mundo?

Veja também:
A chegada da cavalaria
Droga de combate

Vigário Geral e Candelária explicitaram a violência absurda da polícia carioca. O sequestro do


Ônibus 174 demonstrou a precariedade dessa polícia e deixou à mostra a violência de um ex-
menino de rua que preferiu “tentar a sorte” a se entregar ao Estado que o torturou a vida inteira.
O brutal assassinato de Tim Lopes mostrou que os traficantes cariocas não são Robin Hoods do
morro, mas criminosos que utilizam métodos brutais. A tortura de jornalistas de O Dia por
milicianos deu origem à CPI que revelou máfias de bombeiros, policiais civis e policiais
militares no comando de comunidades carentes, com o apoio de vereadores, deputados
estaduais e até deputados federais. E, finalmente, o ataque sistemático do tráfico a vários
pontos da cidade, e a reação subsequente da polícia, “desentocou” um verdadeiro exército
armado na Vila Cruzeiro e o expôs para todo mundo ver.

Afinal, por que o Rio de Janeiro é assim?

Uma resposta, a da esquerda naïve, postula que a violência no Rio de Janeiro decorre da
miséria e da luta de classes, e diz que para combatê-la é necessário acabar com as diferenças
sociais, distribuir a renda e educar a população. Há também a resposta da direita naïve, que
reduz a violência do Rio a um problema de repressão e diz que ela se explica pela falta de
firmeza da polícia e das leis.

As duas respostas estão erradas, contradizem fatos conhecidos.

A primeira não dá conta de cidades que têm índices de desenvolvimento humanos (IDH) piores
do que os do Rio de Janeiro e índices de violência menores. A segunda está na contramão da
história, que demonstra que incrementos na repressão podem piorar os índices de violência. Foi
assim no governo Marcelo Alencar, quando o Estado adotou a remuneração faroeste e passou a
premiar os policiais em função do número de criminosos que “abatiam”. A partir daí, o número
de autos de resistência, de policiais que declararam ter matado criminosos que resistiram à
prisão, cresceu e continua absurdo até hoje.

Muitas vezes, o passo mais importante para encontrar a solução de um problema é enunciá-lo
corretamente. Ônibus 174, Tropa de Elite e Tropa de Elite 2 são uma tentativa de enunciar o
problema da segurança pública do Rio de Janeiro a partir da premissa de que a violência
carioca resulta, em grande parte, da atuação direta de instituições públicas que convertem
miséria em violência. À luz dessa premissa, a violência urbana está relacionada à falta de
educação e à concentração de renda, mas a relação não é direta e simples, é intermediada por
fatores complexos. Acredito que no Rio o mais importante desses fatores seja o efeito perverso
que certas organizações administradas pelo Estado têm sobre parte da população.

Ônibus 174 conta a história de Sandro Rosa do Nascimento, um menino que fugiu de uma
tragédia familiar e foi viver nas ruas do Rio. Sandro se tornou um pequeno criminoso para
sobreviver. Como menino de rua, viu representantes do Estado (policiais militares) matar
crianças como ele na Candelária, foi preso e tratado com extrema violência pelo sistema
socioeducativo do Estado, foi espancado e obrigado a conviver com traficantes e criminosos
muito mais violentos que ele no Instituto Padre Severino e deu entrada no sistema prisional
carioca, onde o Estado o colocou em uma cela superlotada e insalubre. O torturou por anos.

A tese de Ônibus 174, exemplificada pela trajetória de Sandro, é muita clara: as organizações
que deveriam reeducar os pequenos criminosos os convertem em criminosos violentos. Não fui
eu quem formulou essa tese, diga-se de passagem. Foi o próprio Sandro, que a gritou em altos
brados da janela do ônibus para quem quisesse ouvir.

Em Tropa de Elite tentei dizer que a mesma coisa acontece no âmbito da polícia. O Estado trata
muito mal os indivíduos que se propõem a trabalhar nas organizações policiais. Paga pouco,
treina mal, e os submete a uma cultura organizacional militarizada e kafkiana, que tolera a
corrupção e estimula a violência. Como disse o capitão Nascimento: “Quem quer ser polícia no
Rio de Janeiro tem que escolher: ou se omite, ou se corrompe, ou vai pra guerra”. Tanto a
violência e o desrespeito aos direitos humanos do capitão Nascimento quanto a corrupção
desenfreada do capitão Fábio são forjadas no mesmo lugar, pela mesma organização. Certa
feita um governador do Rio de Janeiro disse a mim e ao jornalista Rodrigo Pimentel que Tropa
de Elite era um filme demasiado pessimista. Em sua opinião, a PM do Rio não era tão corrupta
quanto pensávamos. Pelas suas contas, um terço dos policiais do Rio é corrupto, outro terço é
honesto, e o restante variava conforme o comando. Se a PM do Rio tem mais de 13 mil homens
corruptos, então o problema não são seus homens, é a organização. Os policiais do Rio de
Janeiro são vítimas da PM.

A tese de Tropa de Elite, instanciada na trajetória do aspirante André Mathias, é igualmente


óbvia: as instituições que deveriam combater a criminalidade convertem boa parte das pessoas
que trabalham nelas em policiais corruptos e violentos. Fazem isso com grande eficiência e em
altas taxas.

Acredito que cada um dos casos simbólicos que listei, de Vigário Geral à tomada da Vila
Cruzeiro, ilustra essa tese. Cada um deles envolve traficantes, policiais corruptos e policiais
violentos cuja subjetividade e comportamento criminoso foram moldados por instituições do
Estado.
Fiz um terceiro filme, Tropa de Elite 2, para tentar dizer por que o Estado funciona assim. Em
Tropa de Elite 2 o capitão Nascimento é promovido a subsecretário de inteligência e obrigado a
lidar com as conexões que existem entre a polícia e a política. São essas conexões, muitas vezes
calcadas em interesses e lógicas eleitorais, que criam e mantêm as instituições que descrevi nos
filmes anteriores.

Voltando ao mundo real, deixo claro que apoio as UPPs e sou favorável a esse projeto do
governador Sérgio Cabral. Reconheço que ele é fundamental para recuperar o território que o
tráfico tomou. Acredito que o Rio não pode recuar no primeiro confronto. Todavia, acho que o
projeto das UPPs é apenas meio projeto, e não um projeto inteiro. Onde está a reforma da
polícia? Não a maquiagem, mas a reforma concreta, o programa eficiente de seleção e
treinamento de policiais, o programa de capacitação profissional, o pagamento de salários
dignos, o seguro saúde e o auxílio-educação para as famílias dos policiais? Onde está a
corregedoria que funciona? Onde está a reforma do sistema prisional? A capacitação dos
agentes penitenciários? A reforma do sistema socioeducativo? A boa formação dos seus
operadores?

O projeto das UPPs é fundamental para a sobrevivência do paciente, mas ignora as causas da
doença. Na ausência de uma real reforma das instituições que mencionei, o esforço e o
engajamento da população carioca no projeto das UPPs pode ser em vão. Afinal, quem vai
ocupar as comunidades libertadas? A mesma polícia que conviveu com o tráfico de drogas na
cidade por mais de 30 anos, o viu crescer e se expandir e o deixou se instalar. O projeto das
UPPs não é um projeto da polícia, é um projeto do governo. O que garante, no médio ou no
longo prazo, quando este governo sair e outro entrar no lugar, que as UPPs não se tornarão
áreas de milícia?

Eu me lembro, na ocasião do Ônibus 174, que o então presidente Fernando Henrique Cardoso,
do PSDB, foi à TV prometer um plano nacional capaz de reformar as instituições ligadas à
segurança pública em todo o Brasil. Teve dois mandatos para cumprir a promessa, e não o fez.
Depois veio o atual presidente Lula, do PT. Apresentou um Plano Nacional de Segurança bem
bolado, escrito pelo professor Luiz Eduardo Soares. Estamos ao final do seu segundo mandato
e o plano continua engavetado. Finalmente, não vamos esquecer o PMDB, do governador
Sérgio Cabral, que em ambos governos nada propôs de significativo na área da segurança. A
verdade é que nos últimos 30 anos nossos políticos ficaram vendo inocentes morrer. Lavaram
as mãos.

O que aconteceu no Rio de Janeiro nessa semana foi significativo. Creio que vai acontecer de
novo se o governador insistir com as UPPs. E, como a Copa do Mundo e a Olimpíada estão aí,
não há outra alternativa viável. Os confrontos serão inevitáveis e recorrentes. Espero que esses
confrontos sirvam para, além de libertar comunidades carentes, forçar o governo federal a
entrar de cabeça na luta contra o crime e implementar um plano de nacional de segurança sério,
capaz de resolver de uma vez por todas o problema da segurança pública no Brasil.

JOSÉ PADILHA É CINEASTA E DIRETOR DE 'ÔNIBUS 174', 'TROPA DE ELITE',


'TROPA DE ELITE 2', 'GARAPA' E 'SEGREDOS DA TRIBO'
http://portalimprensa.uol.com.br/colunistas/colunas/2010/11/29/imprensa803.shtm
l

Colunistas » Igor Ribeiro Publicado em: 29/11/2010 18:16 Rio de Janeiro: dúvidas, incêndios e
TV paga

Li um monte de jornais, revistas, sites, blogs; vi e ouvi programas de TV e rádio, acompanhei


tweets e até assisti a um live streaming sobre a guerra urbana no Rio de Janeiro. Falei com
colegas e amigos cariocas, troquei alguns e-mails, e ainda assim, depois de um bombardeio de
informações na semana passada, só uma notícia realmente me assustou: equipes de TV paga
chegaram sexta-feira à Vila Cruzeiro para oferecer seus serviços aos moradores. Frise-se:
sexta-feira, 26 de novembro. Somente um dia após a invasão das polícias do Rio e da Marinha
à comunidade, que resultou na fuga da bandidagem para o vizinho Complexo do Alemão.
Parece exagero meu? Explico.

Como boa parte das periferias do Brasil, as favelas cariocas são carentes de tudo. Maioria das
ruas não é asfaltada, não têm saneamento básico, não há escolas por perto e muito raramente se
encontra um posto de saúde. E o primeiro a chegar lá é a TV paga...

Faz muitos anos que não trabalho com segurança pública, portanto indico, mais abaixo, três
outras opiniões muito consistentes e fundamentais para refletir sobre o que vem ocorrendo no
Rio. Mas essa notícia específica, da TV paga, se desdobra em dois sintomas, os quais analisarei
rapidamente.

Primeiro: A mídia pode andar meio combalida, sem aquele poder de outrora que movia as
massas. Mas, de forma geral, ainda exerce influência sobre a população. Especialmente a TV. E
a mídia abusa desse poder, da mesma forma que abusam os traficantes que aterrorizam o
cidadão, o policial que tortura inocentes para arrancar informação, o governo que não consegue
estabelecer políticas de longo prazo. A imprensa não fornece os subsídios necessários para
que o telespectador/leitor possa formular juízo consciente das coisas que consome. E com
isso não me refiro só aos noticiários sensacionalistas, mas também a toda gama de informações
e entretenimento disponível. Uma parte disso é consequência do calabouço educacional que
perdura no país, incapaz de formar cidadãos. Outra parte - considerando a quantidade de gente
de nível superior que mal lembra em quem votou para deputado - é culpa da própria mídia, que
amparada em pesquisas pouco fundamentadas e na falaciosa desculpa de que "provê o que o
povo quer", produz jornalismo e entretenimento de péssima qualidade, inclusive nos canais a
cabo.

Vejo poucas apurações inquerindo a ilegalidade latente no "apoio logístico" de militares às


ações da polícia, por exemplo. Ou reportagens tentando traçar o caminho da primeira ordem de
terror no Rio: Foi numa visita íntima ou foi num celular? E se foi num celular, como foi parar
ali? Ou ainda, investigações sobre o real estopim do tumulto no Rio, para além do ateamento de
fogo em carros e ônibus. No dia 17 de novembro um assaltante foi preso com escoriações
leves por conta de um atropelamento e, preso pela polícia, chegou morto ao hospital com
um tiro no abdôme. Embora menos tenso, foi muito parecido o caso de Sandro Nascimento,
do episódio do ônibus 174, lembrado por José Padilha neste texto para o Estadão.

Será que isso não teve nada a ver com o início da revolta? Mais dúvidas: Agora, que a aparente
tomada do Complexo do Alemão determinou o fim das operações, como o Estado vai se impôr?
Sérgio Cabral disse que não havia UPPs previstas para esses lugares. Mudou de ideia? Eduardo
Paes anunciou que vai levar todo tipo de serviço público para as comunidades. É verdade, ou
vai ficar só na TV paga? Pretendem fazer algo a respeito das outras comunidades ocupadas por
traficantes e milícias ou vão esperar mais incêndios para apagar? A imprensa vai desvendar a
legitimidade dessas ações e questionar o cumprimento de premissas básicas de direitos
humanos, a despeito da sede de sangue da classe média brasileira? Estes e outros
questionamentos já deveriam estar em curso. Caso contrário, a mídia assinará um gigantesco
atestado de incompetência.

Outro sintoma da história da TV por assinatura é ser esse um indício do fatídico jeitinho
brasileiro. À parte do fato de todos terem direito a receber em sua casa, legalmente, sinal de 60-
e-não-sei-quantos canais em HD, a corrida por essa prestação de serviço passa por cima de
coisas muito mais importantes a serem resolvidas - e quem vai reclamar do esgoto a céu aberto
a poucos metros do barraco quando está passando "Vale Tudo" na TV 40 polegadas de LCD
¬adquirida em 30 prestações nas Casas Bahia? Da mesma forma, quem vai discutir de forma
séria e adulta a regulamentação do mercado de drogas? Novamente: apesar do que pensa a
classe média, a Igreja e os setores mais conservadores da sociedade. Afinal, as operações foram
um combate emergencial ao narcotráfico, um expediente urgente, um "jeitinho" imediatista. E é
assustador ver a imprensa aceitar essas medidas como a salvação da criminalidade e
continuar surda, cega e muda à raiz do problema: ainda que matem e prendem todos os
traficantes deste país, pessoas vão consumir maconha, cocaína, êxtase e o que mais inventarem.
Sempre, em qualquer lugar. Ao não promover o debate sobre a regularização das drogas, a
mídia estará abdicando de seu papel mais fundamental, que é informar a população. Ou será
que a imprensa realmente pensa que o tráfico um dia vai acabar?

Talvez este seja o único ponto em que eu discordo um pouco dos articulistas que vou sugerir a
seguir. Nos textos indicados, eles parecem defender que a repressão ainda é o melhor jeito de
acabar com o tráfico - ainda que eu saiba que, no fundo, esse discurso atende a um debate
específico sobre os acontecimentos recentes no Rio. Mas, como acima eu fiz mais perguntas do
que dei respostas e detesto terminar textos com interrogações, ficam aqui essas três dicas para
refletir gravemente sobre o que acontece na Cidade Maravilhosa (e no Brasil por extensão).
Não por acaso, são três pessoas com muitos pontos em comum. O autor do texto já citado, José
Padilha, é diretor do documentário "Ônibus 174" e da série "Tropa de Elite"; o antropólogo
Luiz Eduardo Soares é co-autor do livro "Elite da Tropa", que deu origem ao filme de Padilha,
e publicou este post; e Marcelo Freixo, deputado estadual (PSOL-RJ) que inspirou o
personagem Fraga, de "Tropa 2", escreveu este artigo para a Folha.

Essas personalidades sempre estiveram envolvidas nesse debate, mas preferiram abordá-lo de
um ponto de vista sistêmico do que apagar incêndios, como aconteceu semana passada no Rio
de Janeiro. Oxalá as autoridades um dia os escutem.

* Igor Ribeiro, editor-executivo da revista IMPRENSA, é jornalista com passagens


por diversos veículos nacionais, incluindo Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo
e editora Escala Educacional. veja mais
http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,a-chegada-da-
cavalaria,646176,0.htm

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A chegada da cavalaria
Forças Armadas são chamadas para intervir contra o tráfico no Rio. Das outras
vezes houve problemas e a situação ficou a mesma

27 de novembro de 2010 | 16h 43


GUARACY MINGARDI

A disputa, que já dura duas décadas, entre traficantes e polícia no Rio de


Janeiro esquentou novamente. A TV mostra os lances mais emocionantes
e a população assiste a tudo ao vivo. Veículos queimados, tiroteios,
ataques a postos policiais e, como cereja do bolo, a invasão da Vila
Cruzeiro, um bunker dos traficantes, feita pela polícia e blindados dos fuzileiros navais.

O início dos eventos se deve, segundo a Secretaria de Segurança do Rio, à pressão exercida
sobre os traficantes, que estariam perdendo território para as UPPs. Para pressionar o governo,
partiram para o asfalto, realizando arrastões e queimando ônibus e carros particulares.

Esse é um resumo dos fatos, mas, como toda exposição apenas factual, não permite
compreender o que ocorre e, principalmente, prever suas consequências.

A primeira coisa a considerar são os resultados do ataque à Vila Cruzeiro. Foi uma ação bem-
sucedida, pois ocupou um território sob domínio do tráfico, mas houve uma falha que pode
complicar o dia seguinte. Por falta de efetivo, logística ou planejamento, foi deixada uma rota
de fuga aos traficantes, que migraram, com a maior parte de seu armamento, para o Complexo
do Alemão. Em termos estratégicos, o comando policial não seguiu as lições de Clausewitz, o
grande teórico da guerra, que prega dividir as forças inimigas e cercar cada grupamento,
forçando a rendição. Fizeram o oposto: agruparam os opositores. No médio prazo isso significa
que o Estado vai ter de empregar um efetivo ainda maior para tomar o próximo objetivo.

E de onde vêm esses reforços? Do Exército, novamente chamado para intervir contra o tráfico
no Rio de Janeiro. Se a memória não me falha, em todas as outras vezes ocorreram problemas e
a situação continuou a mesma. Há o caso do tenente que entregou garotos de uma facção para
os rivais, que os torturaram e assassinaram. Também existem relatos de tortura, feita pelos
próprios militares, durante a chamada Operação Rio. Essa operação, em que atuaram milhares
de soldados, foi apelidada por traficantes de Operação Espanador: só fez o “pó” mudar de
lugar. Os militares ocupavam um morro, os traficantes saíam, vendiam em outro local e
voltavam quando a ocupação terminava.

Esse, porém, não é o grande problema. O Exército aprendeu com os erros do passado (espero) e
a segurança carioca está disposta a manter os locais resgatados do tráfico, utilizando as UPPs.
Isso levanta uma questão interessante. Até onde vai o fôlego da PM carioca para criar e manter
mais unidades pacificadoras? Para cada uma delas precisa buscar novos efetivos, e com uma
característica especial – a capacidade de manter bom relacionamento com a população. Na
prática, uma UPP tem as mesmas características do policiamento comunitário. A grande
diferença é que no Rio as regiões primeiro precisam ser ocupadas por forças de combate para
depois serem alocados os policiais “bonzinhos”. Outra questão relativa à UPP, que o
secretário Beltrame já mencionou, é que seu principal objetivo é manter o controle da
área pelo Estado, não combater o tráfico, que muitas vezes continua na comunidade
ocupada, de forma mais discreta.

Quanto aos que fugiram e se acoitaram no Alemão, estão se sentindo cada vez mais acuados, o
que pode resultar em duas situações bem distintas. A mais favorável à segurança da população
carioca é que o desânimo e o medo se instalem e aos poucos os traficantes abandonem as armas
e se misturem à população comum. Isso é provável que ocorra com os mais jovens e menos
aguerridos. A segunda opção é muito mais complexa, pois envolve a ideia de que “agora não
tenho mais nada a perder”. Encurralados, podem ficar cada vez mais perigosos. É como tirar
um gato de baixo da cama. Você tem de dar uma escapatória para o bichano, senão ele vai se
assustar cada vez mais e arranhar, buscando uma saída. Essa saída pode vitimar mais ainda a
população refém dessa guerra urbana.

E isso levaria o governo a adotar uma atitude que deve ser evitada – militarizar cada vez mais
uma atividade puramente policial. Essa tendência ficou clara após o governador recusar ajuda
da Força Nacional, composta de policiais treinados, e dois dias depois pedir auxílio ao
Exército.

As Forças Armadas já tiveram graves problemas quando foram designadas para funções
policiais. Além dos problemas já relatados, houve um período em que o Exército foi usado para
combater o contrabando de café. Segundo relato de oficiais, eles acabaram por deixar a
atividade devido ao aumento da corrupção na tropa.

Esse não é um problema só do Exército. Em São Paulo a PM deixava uma viatura defronte a
um cortiço, num casarão pertencente à família Santos Dumont, onde funcionou por anos um
ponto de venda de drogas. Para diminuir o risco de perder homens para o dinheiro fácil, a
operação foi cancelada.

Como disse no início, estamos vendo ao vivo uma guerra urbana, real e muito próxima. A
nossa torcida deve ser para que acabe e vire somente mais um episódio policial. As vidas e o
futuro de uma grande população é que estão em jogo.

GUARACY MINGARDI É DOUTOR EM CIÊNCIA EM POLÍTICA PELA USP E EX-


DIRETOR CIENTÍFICO DO INSTITUTO LATINO-AMERICANO DAS NAÇÕES UNIDAS
(ILANUD)

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