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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
PELOTAS, 2005
MARA REJANE OSÓRIO DUTRA
Pelotas, 2005
BANCA EXAMINADORA:
..........................................................................................................
Profa Dra Maria Manuela Alves Garcia (UFPel)
...........................................................................................................
Prof. Dr Mauro Grün (ULBRA)
...........................................................................................................
Prof. Dr Jarbas Santos Vieira (UFPel)
AGRADECIMENTOS
Como todo trabalho de pesquisa, este foi realizado a partir de um conjunto de idéias
e de contribuições. Sendo assim, contou com ajuda e cumplicidade de muitas
pessoas.
Inicio agradecendo a minha orientadora profa Dra Maria Manuela Alves Garcia que
aceitou, junto comigo, o desafio deste trabalho. Foram seu profissionalismo,
dedicação, paixão e entusiasmo pelas questões educacionais que me ajudaram a
conhecer este caminho de estudo. Sua incansável energia na garimpagem de textos
e livros para subsidiar meus estudos e a leitura crítica e atenta que fez de meus
textos foram de suma importância.
Aos demais orientandos da profa Manuela, Simone, Lourdes, Cátia, Leomar, Débora
e Marita agradeço pelo companheirismo e contribuições. Foram muito importantes e
produtivas as reuniões de orientação, a diversidade de idéias que dali derivaram
foram muito proveitosas.
A Simone Anadon, cuja amizade começou muito tímida, mas que, no decorrer do
curso, ganhou contornos de companheirismo e solidariedade. Dividimos risos,
dúvidas, ansiedades, e ganhamos uma a outra como verdadeiras amigas.
A CAPES pelo apoio financeiro, pois sem esse apoio não teria sido possível dedicar-
me exclusivamente a esse trabalho.
As minhas filhas Gabriele e Camila e ao meu filho Andrei pelo apoio e carinho
constantes.
RESUMO.....................................................................................................................9
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................10
ABSTRACT.............................................................................................................131
REFERÊNCIAS.......................................................................................................132
RESUMO
Este trabalho enfoca a relação dos professores com a Educação Ambiental (EA). A
partir da análise de um conjunto de discursos que são utilizados por onze
professores de escolas municipais de Pelotas, mostro que as representações sobre
as práticas de EA desses professores têm efeitos produtivos nos espaço escolar.
Utilizo-me de uma perspectiva pós-estruturalista foucaultiana para argumentar que
os discursos dos professores e as condições que as escolas proporcionam à EA
produzem um tipo específico de EA. Esse tipo de EA orienta-se pela direção de um
currículo turístico, por práticas pedagógicas que reduzem a problemática ambiental a
procedimentos pontuais de embelezamento e limpeza do ambiente, e pelo desejo de
produzir um sujeito auto-reflexivo, autogovernado e consciente dos problemas
ambientais. Argumento, ainda, que as representações que os professores
produziram sobre a EA vêm sendo influenciadas por diferentes discursos que os
interpelam.
Palavras-chave: Educação Ambiental, currículo, discursos, professores
10
APRESENTAÇÃO
1
No decorrer do texto estarei repetindo diversas vezes o termo Educação Ambiental, assim a partir
de agora opto por fazer isso através da sigla EA.
11
Entendíamos este espaço como de lutas e disputas em torno dos significados sobre
o ambiental.
2
Trata-se do livro “Educação Ambiental princípios e práticas”, de Genebaldo F. Dias que foi
publicado pela editora Gaia e vem sendo considerado, até hoje, como leitura obrigatória àqueles que
se interessam por EA.
13
sujeitos ainda não esclarecidos sobre os problemas ambientais. A outra, a partir dos
estudos de CASCINO (2000), REIGOTA (1995), BRÜGGER (1994), GRÜN (2002),
CARVALHO (2002) que, embora de perspectivas diferentes, tratam de mostrar a
complexidade e as dificuldades que se colocam para o desenvolvimento da EA:
trajetória histórica, questões epistemológicas e éticas, representações a partir das
quais a EA é tratada, etc. Contudo, eles pouco levam em consideração as condições
e as práticas pedagógicas que acontecem na escola.
1 CAMINHOS DA INVESTIGAÇÃO
3
Segundo Peters (2002), “o pós-estruturalismo não pode ser visto simplesmente reduzido a um
conjunto de pressupostos compartilhados, a um método, a uma teoria ou até mesmo a uma escola. É
melhor referir-se a ele como um “movimento de pensamento” complexa rede de pensamento
que corporifica diferentes formas de prática crítica. O pós-estruturalismo é, decididamente,
interdisciplinar, apresentando-se por meio de muitas e diferentes correntes. (p. 29)”
17
por sua estrutura que se definia por relações de diferença. A lingüística saussureana
propunha o estudo da língua como sistema que obedecia a certas regras de
funcionamento interno, neste sistema haveria uma diferença entre língua e fala.
Nesta perspectiva, a língua é a estrutura formal que governa os eventos da fala, ela
não se modifica.
A fala, por sua vez, é o elemento que sofre modificações diante das relações
e possibilidades determinadas pela estrutura. A linguagem é um sistema de signos
formado por significante (forma) e significado (conceito) que sincronicamente se
relacionam. Esses signos somente adquirem significação diante das diferenças que
estabelecem entre si. Por exemplo, a palavra mesa somente adquire significado
quando se estabelece num sistema de diferenças no qual mesa não é cadeira, ou
armário. A palavra mesa não possui uma origem ou natureza própria, ao contrário,
ela surge diante de um processo funcional de diferença no interior dos sistemas
(Peters, 2000).
O que os estruturalistas dos anos de 1950/60 fizeram foi tomar essa idéia de
estrutura da língua desenvolvida por Saussure para explicar o mundo social em
todos os seus aspectos, dando origem a ciência geral dos signos (Semiologia).
“Assim, a Semiologia analisa como se fossem um conjunto estrutural de regras ou
códigos fenômenos tão diversos quanto a moda, a culinária, o cinema, a
fotografia, a publicidade e o metrô”. (SILVA, 2000, p.54)
4
Processo social através do qual se produzem significados. Trata-se de um conceito central nos
Estudos Culturais de inspiração pós-estruturalista, na medida em que a cultura é concebida
essencialmente como um campo de luta em torno da produção de significados. (SILVA, 2000)
19
121 e 132) é central neste trabalho, principalmente em dois aspectos: como produto
de relações de poder-saber que definem as regras, as normas, os significados e as
representações que os discursos podem mobilizar ou não; e, também, pelos seus
efeitos produtivos, ou seja, os discursos como práticas5 que “fabricam”
sistematicamente sujeitos, identidades e representações com as quais passamos a
agir social e politicamente. Porém, é necessário salientar que os discursos
obedecem a certas regras, regularidades e processos de dispersão que lhe são
muito próprios, assim não se resumem a frases, palavras ou signos que designam
ou nomeiam as “coisas”. Os discursos fazem muito mais do que nomear algo, eles
instituem, eles produzem as coisas e os objetos a partir de relações de poder, das
tecnologias, das táticas e estratégias que colocam em ação.
5
Práticas discursivas: “é um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo
e no espaço que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica,
geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa” (Foucault, 2004, p.133).
20
que está localizado num lugar específico, como o Estado, por exemplo. Foucault
(1988), chamou a atenção para o sentido positivo do poder. Para esse filósofo, o
poder constitui, produz, cria identidades e subjetividades; o poder assume uma
condição de positividade na produção do real e seus significados. Falar em relações
de poder, nesta perspectiva, não é negar a existência de relações entre diferentes
posições e diferentes sujeitos. Mas é preciso compreender que o poder se exerce
no sentido do governo das condutas6 e dos comportamentos humanos e não no
sentido do afrontamento e da violência, isto porque se desenvolve entre sujeitos
livres (Foucault,1990). “O poder possui uma eficácia produtiva, uma riqueza
estratégica, uma positividade. E é, justamente, esse aspecto que explica o fato de
que tem como alvo o corpo humano, não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para
aprimorá-lo, adestrá-lo” (FOUCAULT, 1988, p. XVI).
É importante também ressaltar que o poder não está centrado num lugar,nem
é propriedade de alguém em particular. O poder está em todos os lugares, em todas
as relações entre sujeitos ou grupos; é ação de uns sobre os outros visando
determinados objetivos ou resultados.
Creio ser importante ressaltar que, quando falo de sujeito neste estudo, estou
falando não mais do sujeito preconizado pelo pensamento Iluminista: centrado,
soberano, auto-reflexivo, unificado e dotado das capacidades da razão, da
consciência e da ação. O sujeito ao qual me remeto não é uma unidade, uma
origem, o centro de onde derivam todas as ações; ao contrário, remeto-me a um tipo
de sujeito que é
6
“O termo “governo” foi utilizado por Foucault com múltiplos sentidos. Em geral, utilizou-o para se
referir a uma forma de atividade que tem por objetivo moldar, guiar ou afetar a conduta de alguma
pessoa ou de grupos de pessoas, incluindo o governo de si próprio. É a arte de bem dispor as coisas
e as pessoas de modo a conduzi-las a fins convenientes a cada uma das coisas a governar. Governo
é então uma atividade que pode dizer respeito a: 1) à relação do eu com o próprio eu; 2) às relações
interpessoais que envolvem alguma forma de controle ou direcionamento; 3) às relações no interior
da instituições sociais e comunidades; 4) às relações referentes ao exercício da soberania política
(Gordan, citado por Garcia, 2001, p 35).
21
Sendo assim, creio que fica claro que quando se trata de escola é impossível
não levar em consideração as questões curriculares. Desde já, quero dizer que na
perspectiva que sigo neste trabalho entendo o currículo como o conjunto de todas as
experiências de conhecimento que a escola proporciona aos estudantes (Silva,
1996), seja em seu caráter escrito de conteúdos, de disciplinas, dos valores e
conceitos, seja nas experiências vividas na prática cotidiana das salas de aula ou
nos corredores das escolas.
de bom e mau, feio e belo, certo e errado, e ao fazer isso dividem, hierarquizam,
posicionam, julgam e disciplinam o que é mais ou menos importante para ser
ensinado nas escolas. Deste ponto de vista, é impossível pensar o currículo e a
cultura sem concebê-los como envolvidos em relações de poder que produzem e
estruturam o eventual campo de ação dos outros (Foucault, 1995) e dos sujeitos
sobre si próprios.
7
Dados do IBGE censo demográfico 2000
8
Dados da Prefeitura Municipal de Pelotas (2004)
9
Dados do Relatório Anual de Impacto Ambiental Prefeitura de Pelotas (RAMB) do ano de 2002
27
Assim, a escolha das escolas deu-se a partir de uma lista11 de escolas que se
envolveram em projetos organizados pela SQA. Através desta lista, pude mapear
escolas com projetos de EA e pude observar que a maioria das escolas era
constituída de escolas municipais, o que me levou a considerar importante fazer
este estudo com estas escolas. Outro fator que, também, levou-me a fazer esta
opção foi a preocupação da Secretaria Municipal de Educação (SME) em investir de
modo especial na formação de professores das escolas municipais, inclusive
oferecendo, a partir de 2003, cursos e atividades de EA.
10
Utilizei-me da divisão geográfica adotada pela Prefeitura Municipal de Pelotas que consta de sete
regiões (Áreal, Porto-Varzea, Centro, Fragata, Zona Rural, Laranjal, Três Vendas).
11
Também tentei mapear, através de um questionário, o número exato de escolas com projetos de
EA no município, porém depois de duas tentativas, em que apenas duas escolas retornaram os
questionários, acabei desistindo da idéia de utilizar este instrumento de pesquisa e utilizei a lista da
SQA. O questionário foi enviado por duas vezes pela SME e deveria ser respondido apenas pelos
diretores ou coordenadores pedagógicos. O instrumento estava constituído de cinco questões abertas
que se resumiam em saber se a escola possuía projetos de EA, quais eram, quem participava, como
eram organizados e quem era responsável por esses projetos.
28
para os projetos de EA. Centrei meu trabalho na entrevista com esses professores e,
diante de algumas dúvidas que surgiram, também solicitei que esses coordenadores
sugerissem um ou dois professores que desenvolvessem atividades ligadas aos
temas ambientais para serem entrevistados.
12
Algumas regiões ficaram fora da pesquisa: a Zona rural devido as minhas dificuldades de acesso
às escolas que trabalham com EA e a zona do centro porque não havia, no momento, nenhuma
escola municipal desenvolvendo projetos de EA.
13
Esse é um curso, segundo a professora, oferecido todos os anos pela Escola Superior de
Educação Física (UFPel). Neste curso são desenvolvidos vários estudos na área da saúde pública.
Essa professora desenvolveu um projeto sobre seletividade de lixo, no qual pesquisou as
expectativas dos moradores do entorno da escola em relação à coleta seletiva realizada em Pelotas.
29
escolas que se localizam em pontos bem distantes do município. Farei uma breve
apresentação destes professores.
Professora Elaine15:
Professora Ana:
14
Embora participem, desta investigação, sujeitos do sexo masculino e feminino, fiz a opção de
utilizar o termo professores para me dirigir a ambos. Essa escolha se deve ao fato de entender que,
por ser um texto extenso, a marca de gênero e sua constante repetição pode tornar-se cansativa aos
leitores.
15
Conforme combinado com os professores e professoras não citarei os nomes das escolas e seus
nomes serão fictícios.
16
Observa-se a posição desprestigiada da EA na escola. Algo parecido acontece em outra escola
quando os alunos que não fazem educação religiosa são enviados a aulas de EA para completarem a
carga horária.
30
filha de agricultores e de ter vivido parte de sua vida no campo, ligada à natureza
(plantas, animais...).
Professor José:
Professora Cleusa:
Professora Verônica:
17
Conjunto Agrotécnico Visconde da Graça
31
Professor Cleber:
Professora Cátia:
Professora Maria:
Professora Érica:
Professora Rose:
Professora Jéssica:
18
Curso de EA para qualificação de professores, oferecido pela SME e desenvolvido pelo CEA
durante o período de .outubro de 2003 a junho de 2004. Não estarei analisando, neste momento, o
curso. Apenas observei os professores que fazem parte deste trabalho e participaram do curso.
Gravei as apresentações e os relatos de suas experiências durante o curso.
34
A leitura que fiz das respostas que surgiram da entrevista foi, portanto, a
minha leitura do resultado deste jogo entre eu e os professores das escolas.
Certamente que outras leituras são possíveis, outros caminhos podem ser seguidos.
No entanto, esse foi o meu olhar, contaminado pelas minhas leituras, por minhas
posições de sujeito.
No entanto, confesso que fazer entrevistas com professores não foi uma
tarefa muito fácil. Os professores vivem um momento difícil em suas profissões:
ganham salários baixos, trabalham muitas horas e, geralmente, em mais de uma
escola. Falar de EA parece ser ainda uma questão mais difícil diante das incertezas
que a escola vive em relação a esta temática.
19
Sobre essas técnicas ver “Investigação Qualitativa em Educação – uma introdução à teoria e aos
métodos” de Bogdan e Biklen.
39
Toda essa preocupação não era por nada. Ainda nos anos de 1960, em nome
do progresso, do desenvolvimento e da geração de emprego, o ambiente era visto
como um recurso a ser explorado. Em países como o Japão, o nível de poluição
chegou a índices que obrigaram as pessoas a utilizarem distribuidores automáticos
de ar puro; crianças nasceram cegas, mudas e deformadas por causa do mercúrio
utilizado por indústrias químicas. Nos Estados Unidos, tanta foi a poluição que o rio
Mississipi esteve em chamas por cinco dias. Na Europa, diversos rios estavam
mortos, encobertos por espuma venenosa (DIAS, 2002). No Brasil, não era muito
diferente. Em São Paulo, a poluição esteve em níveis altíssimos, obrigando a
população a utilizar máscaras de proteção; os rios estavam mortos e crianças
nasceram com diversos problemas de má formação por suspeitas de contaminação
por produtos químicos.
20
Esta Conferência realizada em Estocolmo, na Suécia, contou com a participação de 113 países,
250 ONGs e organismos da ONU. Este evento é considerado um marco para a problemática
ambiental.
41
Este momento foi marcado por confrontos entre as perspectivas dos países
norte-americanos e europeus e de alguns países da América Latina. Os primeiros,
preocupavam-se com a conservação dos elementos naturais e genéticos do planeta,
propunham medidas urgentes para que não ocorresse um desastre mundial, o que
causaria grandes problemas econômicos. Os últimos, especificamente o Brasil,
secundarizavam as questões ambientais, argumentando que precisavam se
desenvolver economicamente com urgência devido aos problemas de miséria em
que se encontravam: carência de moradias, de saneamento básico e alto índice de
doenças infecciosas. Os dirigentes brasileiros defendiam-se dizendo que a pior
poluição era a pobreza, assim que este deveria ser o problema principal a ser
tratado21.
21
Para Grün a atitude do Brasil e dos Países do Terceiro Mundo, que formaram um bloco, era um
atitude de reação ao Relatório do Clube de Roma (organização constituída basicamente por
empresários) que tentava “relocalizar” o capitalismo em escala mundial. Havia, segundo aquele bloco,
uma desconfiança de que a proposta de crescimento zero colocada pelo Clube de Roma levaria ao
congelamentos das desigualdades sociais.
22
Secretaria Especial de Meio Ambiente, criada em 1973 no âmbito federal.
23
Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental em São Paulo
24
Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Rio de Janeiro)
42
25
Grifo meu
43
26
Neste momento cresceu substancialmente o número destas organizações não governamentais
(ONGs): de 400 em 1985 para 700 em 1989. (CASCINO, 2000)
44
27
Declaração do Rio , com 27 princípios sobre obrigações ambientais e direito ao desenvolvimento; a
Convenção sobre Alterações Climáticas (assinada por 154 países); a Convenção sobre a
Conservação da Biodiversidade (assinada por 154 países); a Agenda 21 (assinada por 179 países).
(Carvalho, 2002)
45
28
Um dos conceitos de desenvolvimento sustentável, adotado pela Comissão sobre Meio Ambiente é
aquele desenvolvimento (econômico, social e político) que atende às necessidades do presente sem
comprometer futuras gerações.
29
Este Fórum ficou conhecido também como Fórum Global e reuniu 1300 organizações, gerou a
Carta da Terra, 36 tratados das ONGs e o relatório “Meio Ambiente e desenvolvimento: uma visão
das ONGs e dos movimentos sociais brasileiros”. (CARVALHO, 2002)
46
30
Sobre outras informações e críticas sobre a Agenda 21 ver o livro Brasil “Brasil século XXI — os
caminhos da Sustentabilidade cinco anos depois da Rio-92” produzido pelo Forúm Brasileiro de
ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento.
48
31
Cerca de 10.000 delegados, observadores e jornalistas participaram desse evento de alto nível
realizado em Quioto, Japão, em dezembro de 1997. A conferência culminou na decisão por consenso
de adotar-se um Protocolo segundo o qual os países industrializados reduziriam suas emissões
combinadas de gases de efeito estufa em pelo menos 5% em relação aos níveis de 1990 até o
período entre 2008 e 2012. Esse compromisso, com vinculação legal, promete produzir uma reversão
da tendência histórica de crescimento das emissões iniciadas nesses países há cerca de 150 anos.
O Protocolo de Quioto foi aberto para assinatura em 16 de março de 1998 e entrará em vigor 90 dias
após a sua ratificação por pelo menos 55 Partes da Convenção, incluindo os países desenvolvidos
que contabilizaram pelo menos 55% das emissões totais de dióxido de carbono em 1990. Enquanto
isso, as Partes da Convenção sobre Mudança do Clima continuarão a observar os compromissos
assumidos sob a Convenção e a preparar-se para a futura implementação do Protocolo.
32
Em 11 de setembro de 2001 aconteceu nos Estados Unidos um ataque terrorista. A derrubada das
torres gêmeas, pelo choque de dois aviões, o grande número de mortos e as imagens ao vivo do
acontecimento causaram comoção mundial.
49
Vale a pena, de antemão, ressaltar que a EA de que trato neste texto não é
qualquer uma; ela faz parte de “jogos de linguagens” que fixam, instituem quem
pode falar de EA, em que condições, em que locais e o que pode ser dito sobre a
mesma. São jogos que produzem as verdades sobre a EA ou o que se tem
chamado, a partir de Foucault (1988), de “regimes de verdades”.
33
Dados do Ministério do Meio Ambiente, consulta feita no site http://www.mma.gov.br, em 21 de
julho de 2004.
34
O texto integral das Conferências que trataram da EA pode ser encontrado na página do Ministério
do Meio Ambiente na Internet (www.mma.gov.br) e no livro de Genebaldo Freire Dias, “Educação
52
ambientais eram tratadas de forma muito pontual, não havia nenhum tipo de
formulação e de relação entre os problemas de degradação ambiental e o
desenvolvimento econômico. As atividades e ações em torno dos problemas
ambientais se resumiam em passeatas, denúncias sobre indústrias que poluíam as
águas, protestos contra as agressões à fauna e à flora, combate aos modos e a
formas de depósito de lixo urbano, combate aos projetos imobiliários que pretendiam
se instalar em áreas de preservação permanente e, ainda, protestos contra a
ineficiência dos órgãos governamentais quanto ao cumprimento das leis ambientais.
Somente nos finais dos anos 1980 é que a idéia de EA, tal como é colocada
pela Conferência de Tblisi, começou a prosperar nos discursos brasileiros. O
momento de abertura política e a organização da sociedade civil começaram a
chamar a atenção da sociedade para direitos sociais há tanto desconsiderados:
direito à liberdade sexual, direito da mulher e o direito ao meio ambiente saudável.
Plantaram-se, assim, novos discursos acerca dos modos de vida social que
passaram a ser discutidos a partir de conceitos como cidadania e organização
social. Os discursos sobre os problemas ambientais deslocaram-se dos problemas
específicos para os problemas globais, para questionamentos do modelo de
desenvolvimento econômico vigente na sociedade capitalista. Não adiantava mais
mostrar os problemas concretos, específicos ou pontuais: o lixo, a poluição,
Ambiental – princípios e práticas”,1993, o qual apresenta uma sinopse de partes consideradas, pelo
autor, mais significativas para a EA.
53
o conceito de EA:
Quanto a EA escolar, que é o que mais interessa neste trabalho diz o texto da
Lei 9795, no seu Art 9o, “Entende-se por educação ambiental na educação escolar a
desenvolvida no âmbito dos currículos das instituições de ensino públicas e
privadas”. Essa lei determina que a EA deve acontecer na escola em todos os níveis
de ensino e que não deve se resumir a uma disciplina específica, a não ser em
cursos específicos de pós-graduação que tratem de metodologias de ensino de EA.
A lei obriga, ainda, no seu Art. 110 que “A dimensão ambiental deve constar dos
currículos de formação de professores, em todos os níveis e em todas as
disciplinas”. E especifica que os professores em serviço dever receber formação em
suas áreas para que possam atender aos objetivos e princípios da Política Nacional
de EA.
No ano de 2002, o Estado do Rio Grande do Sul promulga sua lei regional de
EA, a Lei No 11.730, que segue praticamente a Lei Nacional (9795), diferenciando
em pequenos pontos onde é um pouco mais detalhada. No entanto, embora essa
legislação seja compreendida pelo campo ambiental como um grande avanço em
termos de EA, sabe-se que essas leis são muito recentes e pouco impacto tiveram
sobre os governantes, as escolas, os professores e as Universidades.
55
Certamente, este caminho que levou a uma maior ênfase na EA não pode ser
pensado como um caminho linear e livre de relações de poder e de disputas. Os
sentidos e as representações que aí se configuraram como verdades foram aqueles
que, nas disputas, nas relações, conseguiram impor suas idéias e saberes,
promovendo-os ao status de verdades. Não entrarei na discussão sobre as lutas e
disputas em torno dos significados do ambiental porque, entendo, isso exigiria outro
projeto de pesquisa; interessa-me como os discursos, que se instituíram no campo
ambiental, foram traduzidos e colocados em ação nas escolas.
35
Sobre os eventos de EA, consultar www.mma.gov.br e www.reasul.univali.br.
36
Na última reunião da ANPED esse grupo de estudos passou a ser um GT (grupo de trabalho)
56
O autor quis chamar a atenção para o fato de que é necessário refletir sobre
por que a EA vem sendo silenciada na educação escolar. Em seus estudos, Grün
vem defendendo que isso se deve a questões históricas e culturais de produção e
transformação epistemológica da própria sociedade. O autor mostra no livro “Ética e
Educação Ambiental uma conexão necessária”, que com o advento do
Humanismo (séculos XVI e XVII), acontece um deslocamento na relação seres
humanos e natureza.
É com esse olhar de existência de uma matriz cartesiana que separa seres
humanos e a natureza que Grün fala do problema das questões ambientais nas
escolas. Isso porque essa matriz estaria na própria condição de organização da
escola e de seus currículos. O autor defende que, sem a superação dos ideais
cartesianos, é impossível pensar em uma EA que não se paute pela concepção de
natureza como objeto pertencente ou subserviente aos seres humanos.
37
Edênico no sentido de Éden, paraíso
61
O que quero mostrar, a partir das contribuições dos autores citados acima, é
que a relação da educação escolar com os temas ambientais não é algo tão simples
como tem sido colocado nos discursos atuais que pregam e defendem a inclusão da
EA nos currículos escolares. Se a educação escolar silencia os temas ambientais ou
se tem dificuldades em tratá-los é porque a educação escolar é produto de um tipo
de sociedade que tem, como matriz, a concepção de natureza como objeto de
domínio, de contemplação, de experimentação e de atendimento às necessidades
humanas.
O que quero chamar a atenção, neste momento, é que esses e muitos outros
impasses que se colocam ao desenvolvimento da EA na escola não vêm sendo
discutidos, não vêm sendo pensados como importantes, apenas vêm sendo
silenciados. Porém, esse silêncio tem sido um silêncio produtivo, um silêncio que
garante uma série de experiências de EA nas escolas que eu chamaria de “práticas
38
A EA é sugerida como interdisciplinar e transversal pela Lei nacional de EA, Lei n. 9795 de 27 de
abril de 1999 e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais em seus temas transversais
62
Para preencher estes vácuos os professores contam com uma enorme “rede
discursiva”. Nesta rede, variados tipos de discursos disputam os gostos dos
professores e contribuem com a formação e produção das representações acerca da
EA e dos fazeres pedagógicos que eles desenvolvem. Essas relações estão
permeadas por relações de poder ou jogos de poder, como sugere Fischer (1995).
Esses jogos de disputas são acionados e alimentados pela necessidade de
produção de sentidos particulares. Porém, esses são jogos que acontecem a partir
de um campo discursivo o ambiental. Assim, obedecem a certas ordens, regras e
normas de organização e funcionamento deste campo: de modos de agir, de
comportamentos, de valores e de habilidades.
39
Temas que são entendidos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) como assuntos que
perpassam as disciplinas, não sendo específicos de nenhuma delas, como os estudos sobre a
sexualidade, a ética e a educação ambiental.
64
se redimir com o mesmo. É com essa perspectiva que o tema meio ambiente é
apresentado para as escolas e seus sujeitos.
40
Falarei mais atentamente sobre a questão das disciplinas em um tópico posterior
68
Atualmente, funciona deste mesmo modo. Nas escolas que pesquisei, alguns
professores deixaram claro que o fato de as escolas receberem pela seletividade
dos resíduos foi importante na decisão da escola de se incluir neste projeto. Os
41
Resíduos reaproveitáveis ou recicláveis.
70
Em uma escola que visitei, quando ainda trabalhava na SQA, uma professora
disse-me que precisava sair cedo com os alunos para fazer recolhimento de lixo
senão os “catadores” chegavam primeiro e não sobrava nada para a escola.
Segundo a professora, o lixo que era produzido na escola não gerava muito recurso,
então eles tinham que buscar na comunidade.
O lixo foi, então, a primeira relação com o tema ambiental que os professores
tiveram contato. Eles mesmos consideram isso como um ritual de passagem, como
uma primeira sensibilização para a EA.
O PAUE continua até hoje, embora, por algum tempo43, tenha ficado no
esquecimento e algumas escolas tenham abandonado o projeto diante do
argumento de que com o tempo, o lixo não era mais recolhido nos prazos
combinados e se acumulava no pátio da escola, juntando bichos e exalando cheiro
desagradável.
42
Os recursos são repassados às escolas, trimestralmente, pela Prefeitura.
43
De 1996 a 2001.
71
A partir de 2001, com a troca do governo municipal, foi criada uma nova
Secretaria que passou a cuidar exclusivamente das questões ambientais: a
Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA). O surgimento desta Secretaria não pode
ser visto se não como produto de uma relação bastante ampla de alguns militantes
de ONGs ambientalistas com o novo governo que se instaurava.
44
Alexandre Melo, membro do CEA ONG ambientalista.
72
No que diz respeito à EA, a maioria dos projetos desenvolvidos tem ligação
direta com as escolas do município: O projeto Recreando, que realiza oficinas de EA
no Ecocamping municipal área de preservação ambiental mantida pela Prefeitura;
a “Oficina Ecopedagógica”, que trabalha com reaproveitamento de sucata e é
oferecida exclusivamente a professores; o “Projeto Adote Uma Escola” (PAUE), que
trata de seletividade de resíduo.
45
Entre os temas observam-se as questões sobre os produtos transgênicos, legislação ambiental,
estações rádio base, mudanças climáticas, água.
74
Como pode ser observado nas falas dos professores, os discursos sobre as
questões ambientais e sobre a EA do governo local (SQA e SANEP) vêm sendo,
constantemente, mobilizados no espaço escolar. Todavia, há que se levar em
consideração que, embora esses discursos governamentais se aproximem muito,
eles não são os mesmos. As relações entre esses órgãos, como já falei
anteriormente, não estão desprovidas de relações de poder; eles mesmos disputam
a produção de significados sobre o ambiental, no município. Isso pode ser
observado nos constantes conflitos acerca das políticas que desenvolvem,
principalmente, no que tange a coleta seletiva de lixo.
Neste jogo por impor significados, tem que se considerar que esses discursos
não são fixos; hora um se impõe mais, hora outro. Porém, os materiais utilizados nas
escolas são, em grande maioria, segundo os professores, os distribuídos pela SQA.
Também é sabido que os professores vêm sendo muito requisitados a participarem
das atividades produzidas por esta Secretaria. Isso mostra que a escola é
reconhecida como um instrumento efetivo de produção de sentidos e de divulgação
das práticas de gestão ambiental preconizadas pelas políticas públicas municipais.
nós vamos ter grandes esclarecimentos com o Soler46 que vai falar sobre
mananciais e sobre água. Assim, a gente vai poder entender porque teve a
enchente e nós poderemos pensar o que fazer como comunidade porque isso
é condição de organização e se a Prefeitura não tem condições de fazer nós
temos que fazer. (Cleber)
Num relato que fez num curso de formação de EA, observa-se a visão
naturalista que permeia a fala da professora Verônica: Nós começamos fazendo
uma pesquisa, um levantamento com alunos, professores e funcionários sobre
quais eram os problemas ambientais da escola, porque a escola também
produz impacto no ambiente. Perguntamos o que é meio ambiente; se existem
problemas ambientais na escola; se estes problemas incomodam... por aí ...
observamos que informação eles têm e, como o lixo era o principal problema,
começamos por ele.
46
O Soler é, como ele mesmo se intitula, um advogado ambientalista de Pelotas que faz parte da
ONG CEA, foi Secretario de Planejamento Urbano do município e trabalhou também na Secretaria de
Meio Ambiente de Porto Alegre.
77
47
A fonte desses discursos é minha própria memória e meus rascunhos, haja vista que eles fizeram
parte de minhas falas enquanto exercia meu trabalho nesta Secretaria. Eu também observava esses
discursos nas falas dos meus colegas de trabalho quando os acompanhava em palestras ou visitas a
escolas.
78
48
A produtividade dos discursos sobre a EA nas escolas será tema do próximo capítulo do trabalho.
49
Apenas em uma escola não existe a função de coordenador de EA e essa questão é tratada pela
coordenadora pedagógica. No entanto, nas entrevistas, pude observar que são os professores de
Ciências e de Geografia que mais se envolvem com o tema ambiental, portanto, a situação é
semelhante as outras escolas, apenas, são invertidas as situações.
79
Apesar de eu ter o meu projeto de EA eu ando louca pra largar porque não me
é dada nenhuma hora a mais para o projeto. Apenas dizem que EA se faz na
sala de aula e eu acredito que nem tudo é sala de aula. (Cleusa)
Eu mandei os projetos para a SME e agora tenho a tarde livre para tratar dos
projetos. Eu acho que agora vai melhorar porque antes nem podia falar com os
outros colegas, era só aula e aula, eu nem encontrava os outros. (Verônica)
Verônica porque ela tá bem por dentro disso e ela nos dá o maior apoio, ela
sabe de tudo sobre meio ambiente.
Por outro lado, a EA tornou-se projeto de professores que, por sua formação,
como eles mesmos dizem, são particularmente “sensibilizados”, “tocados”,
“conscientizados” e possuem os conhecimentos necessários para tratar das
questões que afetam a natureza. Estas características afastam e diferenciam as
subjetividades docentes no âmbito da escola; como os demais professores não
possuem este “diferencial”, não podem tratar das questões ambientais. Esta é uma
das causas que, considero, dificultam a tão discutida interdisciplinaridade e
transversalidade da EA.
50
Este cenário que estou apresentando da EA, parte de questões colocadas pelos professores e,
também, de minhas observações em atividades realizadas com as escolas pela SQA.
84
Deste modo, as falas dos professores sobre o modo como a EA acontece nas
escolas levou-me a considerar esse conceito utilizado por Santomé, currículo
turístico, bastante significativo para expressar o que os professores chamam de EA
nas escolas. Citarei algumas destas falas para justificar o uso que aqui faço desse
termo:
51
Dia cinco de junho é considerado o Dia Mundial do Meio Ambiente.
85
que tá chegando o dia do Meio Ambiente, acho que a gente pode aproveitar o
trabalho pra explorar essa questão. (Cleber)
Nós temos vários projetos iniciando, mas o que está mais forte é o do lixo.
Todos participam: os alunos trazem o lixo, as merendeiras também separam e
a gente entrega para o SANEP. Com esse projeto, a gente até conseguiu que a
escola fique mais limpa porque, quando a gente fala para trazer o lixo, a gente
sempre fala, assim, na coisa de estar limpando, de não atirar papel de bala no
chão, de deixar tudo separadinho, e eles [alunos] já observaram que é muito
bom ter o ambiente limpinho. (Érica)
Layrarques quer mostrar que a educação ambiental que vem sendo realizada
nas escolas tem-se preocupado mais com medidas pragmáticas para a seletividade
de resíduos do que com os questionamentos sobre os significados que originam
essa problemática.
Porém, mais do que estas preocupações, para as empresas, estes são bons
e lucrativos argumentos, posto que “é muito mais econômico reciclar latas de
alumínio do que produzi-las a partir do metal novo. E, assim, a lata de alumínio
torna-se a mais fácil e lucrativa fatia da reciclagem” (LAYRARGUES, 2002, p.199).
Observa-se que é muito mais fácil e, principalmente, lucrativo para as indústrias
direcionarem recursos e incentivarem projetos de seletividade de resíduos (para
catadores e escolas) do que ela mesma organizar esse processo, o que legalmente
deveria ser sua tarefa. No entanto, para fazerem isso, as empresas precisariam
investir em contratação de mais funcionários, mais transportes para recolhimento
dos resíduos, e, assim, ter muito mais gastos como direitos sociais, com
combustível, etc.
52
Essa professora não fez parte do conjunto de professores que participou deste trabalho, porém
entendo que esse pode ser um bom exemplo desta relação que permeia a EA desenvolvida nas
escolas.
88
Esse interesse das professoras teria causado um certo espanto por parte do
professor de Ciências e, segundo a professora, elas foram obrigadas a pedir licença
ao professor para poder dar continuidade aos trabalhos que desenvolviam. Essas
colocações nos levam a pensar que, em termos de EA nas escolas, impera a força
da tradição, ou seja, o lugar onde se trata dos fenômenos do ambiente ou da
natureza é tradicionalmente na área de Ciências ou, em alguma medida, na área da
Geografia.
Deste modo, percebe-se que não é por nada que são os professores destas
áreas que estão à frente das atividades de EA que acontecem nas escolas, pois é a
eles que vem sendo delegada essa posição, é desses professores que vêm sendo
cobradas atitudes para com os temas ambientais nas escolas. Em minhas andanças
pelas escolas, não apenas neste estudo mas também na condição de funcionária da
SQA, tive oportunidade de me deparar com frases como: “Terás que voltar outro
dia, pois o professor de Ciências não está ou está em reunião”; “EA quem trata é
a professora de Ciências” ou “o professor de Ciências irá participar deste evento”.
Os professores, que entrevistei, manifestaram-se muito preocupados com essa
relação entre a disciplina de ciências e a EA.
Nesta escola fui eu que comecei esse trabalho sobre o ambiente, organizei
caminhadas, recolhimento de lixo e gincanas, mas é difícil fazer com que os
colegas colaborem. A escola é longe, não se tem muito tempo e o meio
ambiente fica sempre para quem é das Ciências porque é a disciplina que tem
mais ligação, então... não sei...eu vivo com bichos nos bolsos, os alunos
trazem e os colegas também. E quando eles encontram um texto ou uma
reportagem sempre tentam me ajudar e dizem olha eu achei e pensei em ti.
89
Eu não sei o que fazer para mostrar para os colegas que todos têm que se
sensibilizar com isso!!! (Ana)
Cabe lembrar que essa tem sido a posição geralmente ocupada nos
currículos escolares por aqueles conhecimentos que são tidos como menos
importantes (meio ambiente, sexualidade, ética, gênero, etnia, raça...) e que
90
Atualmente, a natureza foi tão imitada pelas novas tecnologias que pode ser
encontrada nas prateleiras dos supermercados, das mercearias e das lojas:
alimentos, perfumes, flores, enfeites e vestuários. Essa natureza tão próxima e tão
pronta dissimula e confunde nosso imaginário e nossas representações sobre a
natureza.
questionamos essa condição; não sabemos de onde vêm esses alimentos, quais
suas condições de fabricação, o que acarreta em nossa saúde e apenas, por vezes,
reclamamos dos seus preços.
Creio que, depois deste exemplo, pode ser muito interessante citar um trecho
do texto de Carlos Drumond de Andrade (1979), “Da utilidade dos animais” onde ele
coloca uma situação de sala de aula onde a professora explica a necessidade de
querer bem aos animais.
los porque são úteis e estão à disposição de nós seres humanos. Nas palavras da
Profa Ana essa idéia também fica clara e, além disto, tratar da natureza desde modo
fragmentado e isolado desloca o conceito de natureza vinculado a um “mundo vivo”
do qual seres humanos também fazem parte. E produz um significado de natureza
que se reduz a si mesmo. Neste processo discursivo de significação os animais
tornam-se cada vez mais um simples elemento natural que tem seu valor de
utilidade e subserviência aos humanos.
53
Quando falo de saberes, estou me remetendo a um sentido amplo que inclui os conhecimentos, as
competências, as habilidades e as atitudes necessárias para o desenvolvimento do tema.
94
Neste tempo histórico, disciplina era a arte de moldar, treinar os corpos para
melhor governá-los. Os alunos eram treinados para aprender códigos e sinais e
táticas de comportamentos e obedecê-los. Essa preocupação com o adestratamento
dos corpos tinha razões específicas de ser, a de fortalecer e melhorar as técnicas
militares e, mais especificamente, de garantir o desenvolvimento capitalista. Assim,
“as disciplinas foram técnicas de adestramento e individualização que pretendiam
maximizar as forças dos indivíduos, otimizar seus rendimento e, ao mesmo tempo,
extrair deles saberes e lhes conferir uma determinada natureza” (VARELA, 2002, p.
92).
54
Ver mais sobre o assunto em Foucault, Vigiar e Punir.
98
No entanto, foi somente após a I Guerra Mundial que o termo disciplina, tal
como a concebemos hoje, passou a se remeter à matéria de ensino nas escolas
(CHERVEL, 1990). Desde então, a organização disciplinar dos conteúdos escolares
e práticas pedagógicas vem sendo a perspectiva hegemônica adotada pelas
políticas educacionais, pelas escolas e seus currículos. Ao longo dos tempos,
assistimos a muitas críticas a esse tipo de organização dos conteúdos escolares e
foi possível observar inúmeras tentativas de produção e organização de currículos
não-disciplinares. Porém, nenhuma dessas tentativas conseguiu romper com a
tradição disciplinar de um currículo onde os saberes, os conhecimentos e os sujeitos
são fragmentados e hierarquizados.
No entanto, este mesmo currículo não pode ser entendido como um artefato
de determinação absoluta do que acontece nas escolas. Ao contrário, se a EA já
acontece nestes espaços é porque esse currículo com o qual nos deparamos nas
escolas está envolvido em relações sociais de poder-saber. Como já mencionei, os
currículos são artefatos de lutas e disputas em torno de representações e
significados. Assim, se EA acontece nas escolas é porque os currículos oficiais, sua
organização e concepções de conhecimento são contestados e disputados
cotidianamente.
Veiga-Neto comenta:
comunicam uns com os outros; não existe tempo para planejamento pedagógico; e
as reuniões nas escolas não conseguem articular todos os professores.
Nós temos aquelas reuniões que a SME exige, as reuniões pedagógicas, mas
vão diversos assuntos, diversas disciplinas e o meio ambiente fica sempre em
segundo plano para não dizer que quase nem se toca no assunto. É difícil ... os
colegas querem resolver todos os problemas e têm coisas dos alunos, tem
professor que nunca vem porque tem que sair correndo para outras escolas.
Essas reuniões são [sacode a cabeça], não dá para planejar nestas reuniões!!!
E, outros horários [risos] eu nem me atrevo a propor. Às vezes o que eu faço é
trocar palavras com alguns dos colegas no ônibus ou deixar bilhetinhos na
secretaria ou nas bolsas deles. Eu coloco: vamos fazer uma caminhada ou um
passeio e eles respondem... ou nem respondem. (Ana)
Eu acho que não é bem assim!!! tem que fazer trabalho em conjunto. Primeiro
tem muita coisa pra mudar ... políticas públicas de formação, de salários, a
coordenação ... a equipe diretiva ... têm que estar engajadas. O trabalho dos
102
professores que, por exemplo, com 20 horas, tem que ter 18 em sala de aula...e
tempo para planejar e organizar junto? Não achas que é difícil? Eu acho ...
parece até uma piada!!! (Cleber)
A EA não está nos planos das disciplinas o que se tem são planejamentos para
fazer um trabalho interdisciplinar, porque não se sabe muito sobre isso.
Parece que virou pecado não fazer isso [interdisciplinaridade] agora, a gente
nunca fez trabalho junto com outras matérias mas virou moda, não tem como
ficar fora. Mas acho que como tudo, isso logo passa e volta ao normal. [o que é
normal?] Ora...é... como sempre foi, ..., cada um fazendo seu papel na sua área.
Mas a gente tá tentando....errando e acertando, ... é o jeito!!!
Agora, nós somos cinco e estamos trabalhando melhor. A gente faz passeatas,
distribui materiais explicando as coisas. A professora de Português faz o texto,
o de Matemática ... eu forneço os dados e ele trabalha quantidade, valores. O
de Ciências trabalha a origem do PET, o papel, o alumínio (do que é feito,
como surgiu). Eles trabalham o meio ambiente, assim... meio integrados,
interdisciplinar.... mas ainda é difícil. Uns reclamam que têm os conteúdos
para dar, outros do tempo ... (José)
Nota-se que em termos de EA, ainda, impera nas escolas a força da tradição
curricular disciplinar. Embora pareça que estamos vivendo um momento em que
essa tradição vem sendo constante e radicalmente questionada e isso pode ser
observado nas crescentes lutas em torno da inclusão nos currículos escolares não
somente dos temas ambientais mas também de temas como sexualidade, gênero,
diversidade cultural, ética e tantos outros ela ainda é muito forte.
Eu, na medida do possível, tento fazer meu trabalho, mas tenho que aprender
muito. Num seminário, pude observar que a gente pode fazer mais coisas e a
gente consegue enxergar mais longe. Acho que os professores têm que
participar mais de cursos. Tinha que ter alguma coisa que obrigasse as
universidades a ter disciplinas de EA. (Cleusa)
Eu acho que tem muita dificuldade!!! Muita dificuldade pra nós professores e
não temos como melhorar sozinhos. Muitos colegas resistem em trabalhar
porque não sabem, não conhecem o tema ambiental. Eu acho que tem que ter
alguma coisa ... sabe ... cursos para formação de professores nas
universidades e a Secretaria [municipal de educação] também tem que
proporcionar isso, mas para todos não apenas para multiplicadores, ... vai
multiplicar com quem? (José)
Este ponto parece ser muito importante. É possível observar nas falas dos
professores suas reivindicações acerca da necessidade de cursos de formação
profissional que os capacitem a tratar dos temas ambientais; eu mesma acho isso
fundamental. Porém, creio que não é tão fácil assim. Como salientou a professora, a
maioria das universidades parece também não possuir condições de atender essas
necessidades; ou seja, a maioria dos professores universitários, suas disciplinas e
seus programas não estão preparados para subsidiar os professores que desejam
tratar da EA.
seu trabalho nas escolas. Enfim, para Moreira, essas teorias tendem a falar “da”
escola e não “com” a escola.
como diz Garcia (mimeo, s/d), questionar “qual política cultural queremos implantar,
quais vozes que queremos privilegiar, sempre admitindo que se o currículo é o lugar
da produção da identidade, também é o lugar da produção da diferença, do normal e
do anormal” (s/p.).
algo que emerge simplesmente desse sujeito individual e daquilo que ele conseguiu
incorporar durante seu processo de formação e experiência profissional e que irá,
conseqüentemente, ser transmitido a seus alunos. O que os professores fazem são
transposições didáticas das culturas e dos discursos; os professores são uma função
de diferentes discursos no interior da escola (e das pedagogias) e das diferentes
funções e posições sociais que ocupam. Assim, quando determinados discursos
passam a fazer parte das escolas eles são outras coisas, não mais aqueles
discursos que foram distribuídos e incentivados por diferentes grupos e instituições.
Vários estudiosos, entre eles Macedo (1999, 2001), Goodson (1990), Chervel
(1990) e Forquin (1990), mostraram que mais do que simples reprodutores de
conhecimento de uma ciência de referência, os professores fabricam as práticas
pedagógicas nas escolas. O que os professores fazem com os conhecimentos e
saberes estão deslocados das ciências de referência. A interação dos professores
com os alunos e outros professores, as disciplinas que ministram, a organização da
escola, a formação profissional, os discursos e muitas outras condições com que os
professores se deparam são processos constantes de subjetivação que interferem
nos sentidos, representações e ações com que os professores realizam suas
experiências nas escolas. Assim, as práticas pedagógicas não se resumem aos
saberes de uma Ciência de referência.
110
Isso parece ser o que está acontecendo com a EA. Não existe uma ciência
específica que imponha, às escolas, a EA; antes, existe uma demanda da escola e
de seus professores para que as Universidades possam prepará-los para essa
tarefa. Hoje, já se pode observar uma série de Universidades no Brasil que
implementaram disciplinas, cursos ou temas sobre meio ambiente. No Rio grande do
Sul, pode-se citar dois exemplos recentes: o Curso de Mestrado em EA da
Universidade Federal de Rio Grande (FURG) e o Curso de Especialização em EA
que se iniciou no ano de 2004 no CEFET/RS, em Pelotas. Essa demanda não pode
ficar isolada de seu caráter e finalidade de utilidade social e específica.
[ ... ] são comunidades muito pobres, alguns não têm noção de que essa
sujeira pode afetar a eles mesmos. É aí que entra a escola ... para trazer essa
informação e fazer com que eles tenham ação, que entendam. (Érica)
[ ... ] ratos, baratas, junta tudo nesses lixos ... fica uma sujeira insuportável,
imagina a natureza como fica com tudo isso. Imagina essas crianças, os
nossos alunos ... muitos deles vivem em contato com tudo isso e eu fico
pensando!!! A gente tenta falar, dizer e mostrar pra eles essas coisas. Dando o
exemplo, também, com a separação do lixo, até mesmo na sala de aula, ...
agora a gente tem duas lixeiras em todas as salas. (Maria)
Eu trabalho na praça com os alunos, e a gente está sempre tirando o que está
prejudicando. Como o trabalho é na praça, a gente está sempre exposto à
chuva, à pedra, aos galhos que caem das árvores, ao lixo; então eu passo a
mão no rastilho e vou limpando e digo pros alunos vamos limpar pessoal e
depois chamar o caminhão da prefeitura pra recolher. Tem que tirar, senão fica
uma sujeira na praça e a natureza não é assim, né? E os alunos vão
aprendendo....E a gente percebe que, nas salas de aula, não é mais tanta
sujeira como era antes, eles colocam mais no lixo, e também vêm mais
limpinhos para a aula. (Cátia)
55
Os professores confundem o conceito de reciclagem com seletividade de resíduos.
56
Apresento, aqui, exemplos de valores que as escolas receberam, de janeiro a setembro de 2004: a
escola n.1 arrecadou R$ 40; a n. 2 R$ 60; a escola n. 3 R$ 380; a escola n. 4 R$ 205; e a escola n. 5
R$ 180. A fonte desses dados foi o SANEP, órgão que trata do recolhimento desses resíduos nas
escolas.
113
Isso me leva a considerar que esse fato tem muita influência na relação que
os professores fazem da EA com a limpeza do ambiente; em suas intenções, eles
parecem entender que, ao mesmo tempo em que a escola faz sua atividade de EA
limpando o ambiente (quando fazem atividades de recolhimento de lixo), também
consegue uma verba que tem muito valor para suas escolas. Aliás, essa questão foi
bem colocada pelos professores José e Cleusa:
A escola utiliza este dinheiro pra comprar coisas para o projeto, saídas com
alunos e comprar materiais e muitas vezes isso é vital ... se não tivesse esse
recurso até ficaria difícil de fazer. Eu acho que foge dos objetivos da EA, mas é
como eu te disse, lixo por lixo, mas se não tivesse esse recurso seria inviável
alguma coisa, muitas vezes a gente quer fazer uma saída e não tem como
solicitar verba e passagem. Não tem nem pra ônibus, pra gente sair e ir nos
locais pra observar o meio ambiente, eu até acho contraditório estar sendo
pago pra fazer o que deveria ser uma consciência ecológica, mas é uma
contrapartida pra nós e é essencial. Se a prefeitura não pagar mais a gente
tem que continuar porque não dá mais pra parar, até os pais cobram, mas é
difícil. A gente tem até um projeto agora de comprar dois bebedouros...não
deixar o lixo esparramado por aí, é isso que a gente fala e vai reverter em
benefício para os alunos, então, desde o ano passado, a gente está guardando
recurso pra comprar. Isso motiva e ajuda muito a escola que....tu sabes as
condições. (José)
Eu larguei porque era tudo assim...sei lá... a diretora disse que pena! Mas
eu, às vezes, penso que a EA tem que ser de outra forma, falta muita coisa e
ninguém se preocupa. E eu me espantei com coisa do tipo e agora ... o nosso
dinheiro do lixo? Eu falei que saí mas o lixo continua vindo, porque eu trago
muito lixo da minha vizinhança. Ficaram meio assim... mas é só lucrativo
[silêncio]. Eu acho que é importante a escola receber pelo lixo porque quem
recolhe também repassa, então... não vejo problema, [mas não é para ser
educativo?] também é, mas é independente pode ser as duas coisa [mas tem
sido somente, econômica?] É .... infelizmente ... mas já se aprendeu muito com
114
isso também. Antes a gente saía e observava ... ia ver com os alunos onde
jogavam o lixo e se fazia uma grande ajuda para a natureza. Agora, acho que a
coordenadora pedagógica vai pegar [o projeto PAUE], até já começaram a falar
que temos que anunciar nas aulas que tem que trazer o lixo e que vão sortear
uma bicicleta no final do ano [baixa a cabeça]. (Cleusa)
Os professores não fazem essa leitura e, por vezes, chegam a concorrer com
essas pessoas na busca de arrecadar os materiais. Em uma visita a uma escola
municipal num bairro extremamente empobrecido, uma professora comentou que
tinha que sair com os alunos bem cedo para conseguir bons materiais para a escola,
isto porque naquele bairro existem muitos catadores que já disputam e, até mesmo,
entram em conflito pelo lixo e pelos locais de catação.
Não quero dizer que as escolas não possam fazer do tema lixo um bom
trabalho de EA, ao contrário, creio que esse tema pode ser bem desafiador se
receber um tratamento mais crítico. A partir do lixo, pode-se compreender o tipo de
sociedade em que vivemos e as relações que ela institui; pode-se entender, por
exemplo, porque a natureza é considerada como menos importante quando se trata
de questões econômicas e suas conseqüências. O que percebo é que a redução da
EA a simples procedimentos de limpeza do ambiente limita a compreensão dos
problemas ambientais a problemas específicos (lixo, poluição), desarticulando esses
problemas dos próprios processos que possibilitam sua existência.
Olha, aqui não tem espaço para nada, isso é um grande problema para
trabalhar o meio ambiente. Eu até pensei em deixar essa escola mais bonita e
plantar umas florzinhas com os alunos pra eles terem um pouco dessa coisa
de conhecer a natureza, mas tu vê!!! Como eu faço isso? (Jéssica)
que tratem das questões ambientais. Esses entendem, por unanimidade, que a
principal tarefa da EA seria a conscientização ou o esclarecimento das mentes dos
alunos. O objetivo dessa conscientização está, no entendimento dos professores,
em esclarecer essas consciências para uma ação política e ambientalmente mais
correta. Suas palavras e os textos dos projetos que escrevem expressam bem esse
desejo:
Nós temos esse compromisso de dizer pros nossos alunos e incutir neles essa
consciência mais crítica, porque é de pequenininho que eles vão se tornar os
poluidores de amanhã. Se a gente pode dizer - olha a garrafa, o saquinho, o
papel de bala – na sala de aula - já ajuda (Rose)
Foi na escola que eu comecei a mudar minha mentalidade, que fiquei mais
conscientizada. Foi na convivência, foi na reflexão sobre meus
comportamentos em relação com a natureza que mudei minha maneira de ser
e de ver a questão ambiental. (Rose)
É difícil!!! ... Trabalhar meio ambiente ... porque as pessoas, na maioria, não
desenvolveram o gosto, não se interessaram pelo meio ambiente, não se
conscientizaram e, ainda, não se deram conta da importância. (Cátia)
EA é conscientizar, falar, dizer – olha o lixo, a sala tem que estar limpa, a água
está poluída e vai faltar, tem que cuidar e não desperdiçar... Tem que mostrar
essas coisas porque eles não sabem ainda e, aos poucos, vão entendendo.
(Maria)
Nesta concepção de EA, o professor seria aquele que tem o poder de guiar,
converter os alunos a uma consciência superior, verdadeira e mais racional. Os
professores pensam que o desenvolvimento dessa consciência levará os alunos a
ações de mais respeito e amor à natureza e que isso poderá resolver
gradativamente os problemas ambientais. Numa escala mais ampla, ao se educarem
os alunos, estão educando também seus pais e, em alguma dimensão, também a
comunidade onde esses vivem. Esses professores demonstram entender que os
alunos mais conscientizados e com comportamentos corretos irão sensibilizar
aqueles que estão à sua volta e, eventualmente, chamar a atenção daqueles que
ainda não tenham sido tocados pela questão ambiental e serão, ainda, capazes de
propor ações que sejam direcionadas a resolver estes problemas.
Eu falo o tempo inteiro, se eles estão comendo uma bala e largou o papel no
chão eu digo, volta e pega o papel cara, se todo mundo for jogar o papel no
chão nós vamos ficar atolados na sujeira. Se eu vejo alguém riscando uma
árvore, eu pergunto pra que tu estás riscando na árvore? ela está te dando
sombra, mas isso só vale no momento em que a coisa está acontecendo,
depois não adianta. Isso é conscientização gente!!!! Não adianta dar textos, ler
muitos autores, filosofar, tem que mostrar (Cátia)
57
Estas foram a palavras da professora Verônica, durante um curso de qualificação sobre EA
oferecido pela SME, quando apresentou os trabalhos que desenvolvia na sua escola.
125
Outro dia estava comendo bala e fez uma careta e disse putz!!! É lixo. Então é
essa avaliação pelos hábitos e atitudes que eles desenvolvem. (Cleusa)
definem quais características devem desenvolver, aqueles que irão falar, assim
como pressupõem que aqueles que falam de determinados discursos concordam
com as verdades que esses colocam em ação. Assim, como sugere Larrosa (2002),
6 ALGUMAS PALAVRAS...
Claro que trabalhar com um referencial teórico novo, pouco conhecido (por
mim), polêmico e contestador e com um tema ainda pouco estudado como a EA
escolar foi algo muito sofrido, dolorido e exigiu muita reavaliação e desprendimento
de minhas próprias crenças e certezas. Isso me obrigou a sair de um porto seguro e
adentrar num campo de outros olhares, novas perspectivas e trilhar caminhos não
muito fáceis. Ao fazer isso tive que enfrentar freqüentes altos e baixos e muitas
incertezas quanto ao caminho a ser seguido. Em muitas ocasiões, fui levada a
mudar o processo do trabalho e iniciá-lo novamente. Porém, ao mesmo tempo em
que isso me deixava insegura e desesperada, também fui me apaixonando pelo
desconhecido, fui seguindo suas pistas instigantes e tentei aproveitá-las o máximo
possível, na medida em que desenvolvia o processo de análise. Assim, fui
acreditando e apostando na possibilidade teórica que produziu esta pesquisa e cada
capítulo que constitui esta dissertação.
movimentos sociais de modo que até hoje tem efeitos muito fortes nas práticas
educacionais, nas identidades e nas subjetividades.
Meu desejo é que este estudo possa ser considerado como um bom motivo
para reflexão sobre o poder docente, sobre os currículos e, principalmente, sobre a
EA, que mesmo estando nas escolas em condição menos nobre do que outros
temas considerados mais importantes, vem produzindo significados e
representações, as quais marcam e atravessam os modos de pensar e agir de
alunos e da comunidade escolar. Espero que essa pesquisa seja produtiva no
sentido de que possa, no mínimo, ser um bom pretexto para desencadear boas
perguntas e outros olhares sobre o que acontece nas escolas.
131
ABSTRACT
This work focuses the relationship between teachers and Environment Education
(EE). From the analysis of a set of speeches that are used by eleven teachers of
Public schools of Pelotas (RS, Brazil), I show that the representations about these
teachers’ EE practices have productive effects in the school ambience. From a
foucaultian after-structuralist aproach I argue that the speeches of the teachers and
the conditions that the schools provide to the EE produce a specific type of EE. This
type of EE is oriented in the direction of a touristic curriculum, for practical
pedagogical that reduce the set of environmental problems to isolated procedures
oriented for beautifulness and cleanness of the environment, and for the desire to
produce a self-reflexive citizen, self-ruled and conscientious of environment
problems. I also argue that the representations that the teachers had produced about
EE have been influenced for different speeches that interpellate them.
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136