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MONOGRAFIA APRESENTADA AO CURSO


DE GRADUAÇÃO EM DIREITO DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA,
COMO REQUISITO À OBTENÇÃO DO GRAU
DE BACHAREL EM DIREITO

DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS


(estudo doutrinário)

Acadêmico: Marcelo Maienberger Coelho


Orientador: Prof. João Leonel Machado Pereira

Florianópolis, julho de 1999.

A presente monografia final, intitulada Direitos Reais Sobre Coisas Alheias (estudo
doutrinário), elaborada por Marcelo Maienberger Coelho e aprovada pela banca examinadora
composta pelos professores abaixo assinados, obteve aprovação com nota 8 (oito), sendo
julgada adequada para o cumprimento do requisito legal previsto no artigo 9º da Portaria nº
1.886/94/MEC, regulamentado na UFSC pela Resolução nº 003/95/CEPE.

Prof. João Leonel Machado Pereira


Presidente da banca
Profª. Msc. Renata Raupp Gomes
Integrante da banca
Mestrando André Lipp Pinto Basto Lupp
Integrante da banca

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao professor João Leonel Machado Pereira pela sua orientação na realização
dessa monografia, bem como a colaboração de diversas pessoas pelas suas sugestões e críticas.

Agradeço aos meus pais pelo incentivo na busca constante de novos caminhos e por terem
ensinado a perseverar na direção do objetivo traçado.

Agradeço especialmente a minha noiva pelo apoio e compreensão, sem os quais esse
trabalho não teria sido possível.
2

RESUMO

Quando o exercício do direito de propriedade sofre restrições, desmembrando-se um dos


seus elementos (posse, uso, gozo ou disposição) para ser titularizado por outra pessoa, caracteriza-
se o direito sobre coisa alheia, que pode decorrer de interesse público, testamento ou contrato.
Contudo, é fundamental a inscrição do título constitutivo no competente Registro, a fim de
dar publicidade ao ato e para que esse direito adquira a natureza de real, conferindo ao seu titular o
direito de oponibilidade contra todos e de seqüela, pois não sendo inscrito somente resultará
obrigação pessoal entre o proprietário e o detentor do direito sobre coisa alheia.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1 DIREITO DAS COISAS


1.1 Conceito
1.2 Distinção entre direitos reais e pessoais
1.3 Direitos reais sobre coisas alheias

2 DIREITOS REAIS DE USO E FRUIÇÃO


2.1 Enfiteuse
2.1.1 Generalidades
2.1.2 Modos de constituição
2.1.3 Direitos e deveres
2.1.4 Modos de extinção

2.2 Servidões prediais


2.2.1 Generalidades
2.2.2 Classificação
2.2.3 Modos de constituição
2.2.4 Modos de extinção

2.3 Usufruto
2.3.1 Generalidades
2.3.2 Distinções
2.3.3 Modos de constituição
2.3.4 Direitos e obrigações do usufrutuário
2.3.5 Modos de extinção
3

2.3.6 Direito real de uso e habitação

2.4 Rendas Constituídas Sobre Imóveis


2.4.1 Generalidades
2.4.2 Modos de constituição
2.4.3 Modos de extinção

2.5 Promessa Irretratável de Venda


2.5.1 Generalidades
2.5.2 Requisitos do direito real do compromisso de compra e venda
2.5.3 Rescisão do contrato por inadimplência do comprador

3 DIREITOS REAIS DE GARANTIA 33


3.1 Penhor
3.1.1 Generalidades
3.1.2 Espécies de penhor
3.1.3 Penhor legal
3.1.4 Penhor rural
3.1.5 Caução de títulos de crédito
3.1.6 Extinção

3.2 Anticrese
3.2.1 Generalidades
3.2.2 Natureza jurídica e modo de constituição
3.2.3 Extinção

3.3 Hipoteca
3.3.1 Generalidades.
3.3.2 Espécies
3.3.3 Efeitos
3.3.4 Inscrição
3.3.5 Remição
3.3.6 Extinção

3.4 Alienação fiduciária em garantia


3.4.1 Generalidades
3.4.2 Requisitos
3.4.3 Direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário
3.4.4 Execução do contrato

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
4

Introdução

A pesquisa desenvolvida neste trabalho tem por objeto o estudo doutrinário dos direitos
reais sobre coisas alheias, cujas modalidades estão previstas no art. 674 e o disciplinamento legal
nos seguintes, até o art. 862 do Código Civil.
A questão principal que se coloca no estudo das diversas espécies de direitos reais sobre
coisas alheias, é a concernente ao disciplinamento da relação estabelecida entre duas ou mais
pessoas que titularizam direitos reais sobre a mesma coisa. Com efeito, a constituição do direito real
sobre coisa alheia não exclui o direito do proprietário original. Assim, importa investigar os limites de
cada titular no exercício de seu direito, objetivando também verificar as restrições impostas a cada
um.
Para a realização dessa pesquisa, o método de abordagem adotado será
preponderantemente indutivo, na medida em que se formulará sínteses a partir da leitura da
bibliografia apresentada em contejo com a legislação regulamentadora, seja do objeto em estudo
seja da que lhe é conexa.
A fim de atender o objetivo mencionado, o plano de desenvolvimento do trabalho foi
dividido em três partes:
A primeira envolve os aspectos gerais do direito das coisas, visando estabelecer conceitos,
distingui-lo dos direitos pessoais e elencar características. Nessa parte também será tratado o
conceito, classificação e constituição dos direitos reais sobre coisas alheias. Essa parte é
preparatória para o entendimento das duas outras partes que se seguirão.
A segunda parte contempla os direitos reais de uso e fruição, abrangendo a enfiteuse,
servidões prediais, usufruto, uso, habitação, rendas constituídas sobre imóveis e a promessa
irretratável de venda, procurando entender os efeitos que cada uma dessas espécies produzem no
exercício do direito de propriedade, mediante a apresentação de conceitos, características, modos
de constituição e de extinção.
A terceira e última parte tratará dos direitos reais de garantia, como o penhor, a anticrese e
a hipoteca, além da alienação fiduciária em garantia, tendo o mesmo objetivo e a metodologia de
apresentação da segunda parte.
É pertinente esclarecer que apesar de a promessa irretratável de venda e a alienação
fiduciária em garantia não constarem do rol dos direitos reais sobre coisas alheias previsto no
Código Civil, serão eles estudados neste trabalho, porque a legislação extravagante lhes confere
natureza de direito real.
O tema é atual porque é comum o surgimento de conflitos envolvendo a transferência e
aquisição de bens, ainda mais quando se trata de direitos reais que se exercem sobre coisas alheias.
5

1 - DIREITO DAS COISAS

1.1 - Conceito

Em razão da capacidade do ser humano de se apossar dos bens terrenos no estado natural
ou transformando-os, bem como em virtude de sua comercialização, impôs-se a regulamentação da
relação estabelecida em face da subordinação da coisa à vontade humana.
Encontra-se essa relação positivada no Código Civil Brasileiro no livro II, sob o título
Direito das Coisas, que na definição de Clóvis Beviláqua 1 “é o complexo das normas reguladoras
das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem”.
Mas não é qualquer coisa que interessa ao mundo jurídico, pois o ar atmosférico e a luz
solar são tão abundantes que qualquer pessoa tem acesso a eles, sem ter que pagar ou trocar
alguma coisa para usufrui-los.
Afirma Silvio Rodrigues2, que “só quando tais coisas são úteis e raras, isto é, quando
passam a constituir bens, é que se tornam objeto de apropriação, estabelecendo-se entre elas e o
homem um vínculo jurídico, que é o domínio”.
Na opinião desse autor, a composição dos conflitos entre os homens em razão do domínio
dos bens é o campo do Direito das Coisas, de maneira que o seu conceito pode ser ampliado, para
dizer que “é o conjunto das normas que regulam as relações jurídicas entre os homens, em face às
coisas corpóreas, capazes de satisfazer às suas necessidades e suscetíveis de apropriação”3.

1.2 - Direitos Reais e Direitos Pessoais

Essa distinção de nomenclatura surgiu primeiramente no direito canônico. Após


estabeleceu-se a concepção da teoria dualista ou realista, distinguindo os direitos reais dos pessoais,
caracterizando “o direito real como o poder imediato da pessoa sobre a coisa, que se exerce erga
omnes. O Direito pessoal, ao contrário, opõe-se, unicamente, a uma pessoa, de quem se exige
determinado comportamento”4.
As teorias unitárias contrapõem-se a essa concepção sustentando que há apenas uma
categoria de direitos. Dividem-se, no entanto, em duas teorias opostas: a teoria personalista e a
teoria impersonalista ou patrimonialista.
Segundo a teoria personalista todos os direitos são pessoais. Mesmo nos direitos reais
haveria um sujeito ativo (o proprietário) e um sujeito passivo (todas as pessoas, sujeito passivo
universal), sendo a coisa o objeto da relação jurídica.

1
Apud MONTEIRO, W. Curso de direito civil. v. 3. p. 1.
2
RODRIGUES, Silvio. Direito das coisas. p. 3.
3
Ob. cit. Idem, ibidem.

4
GOMES, Orlando. Direitos reais. p. 2.
6

Na opinião de Planiol, “essa relação é de natureza pessoal, como as demais obrigações,


mas de conteúdo negativo. Os demais indivíduos acham-se obrigados a respeitar o direito do titular
e devem abster-se da prática de qualquer ato tendente a lesá-lo” 5.
Para a teoria impersonalista todos os direitos (reais ou pessoais) têm caráter patrimonial. O
objeto da prestação (direito pessoal), constitui um patrimônio.
“tem como ponto de partida a idéia de que toda obrigação possui um
fundo patrimonial, um valor econômico, independente da pessoa do
devedor. Pretendem seus adeptos, objetivando a obrigação,
transformá-la num direito sobre a respectiva prestação, numa espécie,
portanto, de direito real, com abstração da pessoa do devedor.”6

O direito brasileiro adota a clássica distinção entre direitos reais e pessoais. Em razão
dessa distinção e como o direito das coisas procura regular as relações jurídicas referentes às coisas
que podem ser apropriadas pelo homem, somente lhe interessa os direitos reais e não os pessoais.
O direito real na definição de Lafayette “é o que afeta a coisa direta e imediatamente, sob
todos ou sob certos respeitos e a segue em poder de quem quer que a detenha.” 7
Já o direito pessoal, o define Washington de Barros “como relação jurídica mercê da qual
ao sujeito ativo assiste o poder de exigir do sujeito passivo determinada prestação, positiva ou
negativa” 8.
No direito real o traço característico é o poder direto do indivíduo sobre a coisa,
possuindo como elementos essenciais o sujeito ativo da relação jurídica, a coisa objeto do direito e
a inflexão imediata do sujeito ativo sobre a coisa. No direito pessoal o que se destaca é a relação de
pessoa a pessoa, possuindo como elementos o sujeito ativo, o sujeito passivo e a prestação que ao
primeiro deve o segundo.
Afirma Fernando Noronha que o direito real e o de crédito diferem quer funcional quer
estruturalmente. Esclarece que do ponto de vista funcional o direito de crédito
“tem como única finalidade a satisfação do direito do credor, que pressupõe a
realização da prestação debitória, já os direitos reais, incidindo sobre coisas, visam
ou proporcionar ao titular a fruição dessas coisas, ou garantir ao mesmo, através
delas, o cumprimento de obrigações, ou assegurar-lhe a aquisição do direito de
propriedade sobre elas”.

Sob o aspecto estrutual ensina que


“enquanto o direito de crédito é um vínculo entre duas pessoas, tendo por conteúdo
pretensão de uma delas (credor) a certo comportamento da outra (devedor), já o
direito real se caracteriza por incidir diretamente sobre uma coisa e por ser oponível,
pelo titular, a todas as pessoas”9.

Silvio Rodrigues destaca as seguintes características dos direitos reais 10:


Aderência à coisa, sujeitando-a diretamente ao titular, que exerce o seu poder direto e
imediato sobre a coisa, independente da colaboração de terceiro;11

5
Apud MONTEIRO, W. Idem. p. 9.
6
MONTEIRO, W. Idem. p. 10.
7
Apud RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 5.
8
Ob. cit. p. 11.
9
NORONHA, Fernando. Apostila o direito das obrigações face a outros direitos. p. 133.
10
Ob. cit. Idem. p. 5-10.
7

Absolutidade, incide sobre uma coisa ou bem, material ou imaterial, e tem eficácia erga
omnes;
Direito de seqüela, “prerrogativa concedida ao titular do direito real de seguir a coisa nas
mãos de quem quer que a detenha, de apreendê-la para sobre a mesma exercer seu direito real.”
Exclusividade, “no sentido de que não se pode conceber dois direitos reais, de igual
conteúdo, sobre a mesma coisa. Se sobre esta recaírem dois direitos reais, não serão da mesma
espécie, ou, não serão integrais.”
Criação exclusiva do legislador, pois como a constituição de direitos reais sobre imóveis,
consoante o art. 67612 do Código Civil está condicionada à sua inscrição no Registro Imobiliário,
cuja lei especial prevê os atos possíveis de inscrição e da maneira como esta se faz, não será
possível registrar o direito real estabelecido por convenção entre as partes.
Maria Helena Diniz concorda com esse posicionamento e Washington de Barros discorda,
entendendo que é possível as próprias partes criarem outros direitos reais, desde que não
contrariem princípios de ordem pública.
Na lição de Silvio Rodrigues os direitos reais podem ser classificados quanto ao objeto
sobre que recaem em direitos reais sobre coisa própria, hipótese do domínio e direitos reais sobre
coisas alheias; e quanto à finalidade, distinguem-se em direitos reais de gozo e de garantia. O
objetivo deste trabalho centra-se nos direitos reais sobre coisas alheias, no que concerne aos
direitos reais de fruição e de garantia, decorrentes da divisão do domínio em direitos elementares,
que na conformidade do art. 524 do Código Civil, são o uso, o gozo e a disposição dos bens
móveis ou imóveis.

1.3 - Direitos reais sobre coisas alheias

Conceito

O conceito de propriedade está expresso no art. 524 do Código Civil, sendo a


propriedade o direito de usar, gozar e dispor dos bens, bem como de reavê-los do poder de quem
injustamente os possua.
Ensina Levenhagen que a propriedade não representa um direito absoluto, estando sujeita
a determinadas restrições impostas pelo Poder Público ou por convenção das partes13.
Nesse sentido, esse autor classifica a propriedade em plena e limitada, afirmando que será
plena, “quando todos os elementos que a compõem – posse, uso, gozo e disposição – acham-se
reunidos no proprietário.” E será limitada, quando “algum desses elementos se desprende, passando
a constituir direito real de outra pessoa”14.
É justamente a restrição imposta ao exercício da propriedade, destacando um de seus
elementos para ser titularizado por outra pessoa que caracterizará os direitos reais sobre coisas
alheias, que na definição de Levenhagen15 é “aquele que, dando a uma pessoa um poder jurídico

11
No direito pessoal a colaboração do devedor, espontânea ou forçada, é indispensável para o gozo do direito.
12
Art. 676. Os direitos reais sobre imóveis constituídos ou transmitidos por atos entre vivos só se adquirem
depois da transcrição, ou da inscrição, no registro de imóveis, dos referidos títulos (arts. 530, I, e 856), salvo os
casos expressos neste Código.
13
LEVENHAGEN, Antônio josé de souza. Código civil : comentários didáticos. p. 90.
14
Idem. p. 90.
15
Idem. p. 217.
8

direto e imediato sobre a coisa, é, por isso mesmo, suscetível de ser exercido, não somente contra
uma pessoa determinada, mas para com e contra todos”.
Para Silvio Rodrigues16 os direitos reais constituídos sobre coisas alheias se apresentam
sob dois ângulos: o passivo, em que “apenas paralisam a faculdade correspondente naquele que
mantém a propriedade; detêm temporariamente seu exercício, sem que jamais se destaquem do seu
tronco” e o ativo, em que “são prerrogativas de uns sobre coisas de outros, diminuindo o direito
destes sobre elas”.
Portanto, na lição de Levenhagen17, os direitos reais sobre coisas alheias “resultam do fato
de ser a propriedade suscetível de certas restrições que se traduzem em desmembramento de algum
ou de alguns dos elementos que a constituem, que vão, então, proporcionar proveito a outra
pessoa”.

Classificação

Sem olvidar da propriedade, o art. 674 do Código Civil enumera as espécies de direitos
reais sobre coisas alheias, que são a enfiteuse, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, as
rendas expressamente constituídas sobre imóveis, o penhor, a anticrese e a hipoteca.
Contudo, apesar de não constar desse rol o legislador acrescentou a promessa irretratável
de compra e venda a essa lista, atribuindo-lhe natureza real através do Decreto-lei nº 58/1937, na
forma que lhe deu a Lei nº 649/1949, corrigida pela Lei nº 6.014/1973.
Preleciona Silvio Rodrigues que os direitos reais sobre coisas alheias podem ser divididos
em dois grupos: os direitos de fruição, tendo o titular a prerrogativa de usar e gozar da coisa e os
direitos de garantia, em que determinado bem é dado em garantia de um débito18.
A partir dessa divisão, pertencem aos direitos de fruição a enfiteuse, as servidões, o
usufruto, o uso, a habitação, a promessa irretratável de venda e as rendas constituídas sobre
imóveis; em relação aos direitos de garantia, estão o penhor, a anticrese e a hipoteca.

Constituição

Os direitos reais sobre coisas alheias se formam pela tradição, quando se tratar de bens
móveis e pela transcrição ou inscrição no Registro de Imóveis no caso de bens imóveis. É o que
prescreve, respectivamente, os arts. 675 e 676 do Código Civil19.
O registro em relação aos bens móveis é desnecessário, porque a coisa já foi entregue,
contudo, quanto aos imóveis é formalidade essencial para assegurar o direito de seqüela (perseguir a
coisa nas mãos de quem estiver, onde quer que se encontre) e de prevalência (o seu direito vale

16
Ob. cit. p. 246.
17
Ob. cit. p. 218.
18
Ob. cit. p. 247.
19
Art. 675. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só
se adquirem com a tradição (art. 620).
Art. 676. Os direitos reais sobre imóveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos só se
adquirem depois da transcrição, ou da inscrição, no Registro de Imóveis, dos referidos títulos (arts. 530, I, e 856),
salvo os casos expressos neste Código.
9

contra outros direitos reais de data posterior e prefere a qualquer direito de crédito, à exceção dos
trabalhistas e fiscais).
Sem o registro do pacto firmado surge para os contratantes tão-somente um direito
obrigacional. É o que demonstra Silvio Rodrigues com a seguinte passagem transcrita de sua obra

(...) a servidão de trânsito, estabelecida por escritura pública,


representa, até o momento da inscrição, apenas um direito pessoal do
dono do prédio dominante contra o dono do prédio serviente.
Entretanto, uma vez registrada, surge o direito real, ou seja, nasce o
ônus que se liga à coisa, que a ela se prende como se fora uma chaga e
a acompanha indefinidamente ou até que se extinga por um meio
comtemplado na lei.20

Portanto, mesmo que o bem imóvel seja várias vezes vendido, o titular da escritura
registrada terá seus direitos garantidos em razão dessa aderência do encargo ajustado, cuja regra do
Código Civil está assim disposta no art. 677 “Os direitos reais passam com o imóvel para o domínio
do adquirente”.

2 - DIREITOS REAIS DE USO E FRUIÇÃO

2.1 - ENFITEUSE

2.1.1 - Generalidades

Consoante o artigo 678 do Código Civil, a enfiteuse, também denominada emprazamento,


é o ato jurídico inter vivos ou de última vontade, onde o proprietário atribui a outrem o domínio útil
do seu imóvel, pagando o adquirente (enfiteuta) uma pensão ou foro anual, certo e invariável, ao
senhorio direto. O art. 679 estabelece que o contrato de enfiteuse é perpétuo, considerando-se
arrendamento o firmado por tempo limitado.
Para Caio Mário “é um direito real e perpétuo de possuir, usar e gozar de coisa alheia e de
empregá-la na sua destinação natural sem lhe destruir a substância, mediante o pagamento de um
foro anual invariável”21.
O imóvel aforado tem como partes: o senhorio (o proprietário do bem gravado por
enfiteuse) e o enfiteuta ou foreiro (aquele que usufruirá diretamente do bem).
É considerado o mais amplo direito real sobre coisa alheia, porque o enfiteuta ou foreiro
pode usar, gozar e alienar o bem imóvel. Resulta desse instituto que o senhorio fica com o domínio
eminente ou direto do imóvel e o enfiteuta com o domínio útil.

20
Ob cit. p. 248.
21
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. p. 171.
10

Orlando Gomes não concorda com o emprego da expressão domínio útil e a considera
imprópria no Código Civil, entendendo que o direito do foreiro sobre o imóvel aforado “é de gozo
da coisa alheia, tanto que deve conservar sua substância” 22.
Dos dispositivos civilitas citados e do conceito transcrito, é possível constatar que a
enfiteuse tem por objeto somente coisas imóveis, todavia, o art. 680 do Código Civil limita a sua
aplicação somente às terras não cultivadas e aos terrenos que se destinem à edificação.
Explica Orlando Gomes essa limitação em razão da função sócio-econômica da enfiteuse,
com origem no Direito Romano, de possibilitar o cultivo e a ocupação da terra para que houvesse o
seu aproveitamento econômico23.
Outra característica é a perpetuidade dos aforamentos, que Caio Mário considera
elementar desse instituto, mas que Orlando Gomes não considera essencial em razão da
possibilidade de resgate, “geralmente autorizado após o decurso de certo prazo, inutiliza a vantagem
assegurada, pela perpetuidade, ao senhorio direto”24.
Na opinião de Orlando Gomes, o elemento essencial para a caracterização da enfiteuse,
sem o qual ela não existe, é a obrigação de pagar o foro, também chamado de cânon ou pensão,
que tem por finalidade “afirmar o reconhecimento do domínio direto e compensar o proprietário da
privação do seu prédio”25.
Apesar dessas características a enfiteuse possui semelhanças com os institutos do
arrendamento e do usufruto, sendo importante estabelecer as diferenças para evitar confusões.
Difere do arrendamento, porque a enfiteuse possui a característica da perpetuidade, o
foreiro tem o “direito de disposição da coisa e a possibilidade de transformá-la ou alterá-la” e a
modicidade do preço, que no arrendamento, diversamente do foro pago na enfiteuse, cuja finalidade
está transcrita acima, “representa a retribuição dos capitais imobilizados no imóvel” 26.
Quanto ao usufruto27, difere porque enquanto o usufrutuário tem apenas direito de usar a
coisa e perceber seus frutos, o enfiteuta tem direito também aos produtos28. Não pode o
usufrutuário transformar ou alterar o bem, enquanto o foreiro tem esse direito, desde que não
deteriore a sua substância. O usufruto pode ocorrer sobre coisa móvel ou imóvel, a enfiteuse só
sobre imóvel. O usufruto é temporário e a enfiteuse é perpétua. O usufruto em regra não pode ser
transferido a outrem, já a enfiteuse pode.

2.1.2 Modo de constituição

Na lição de Orlando Gomes a enfiteuse se constitui por:


Convenção, cujo título constitutivo é o contrato, sendo indispensável a transcrição desse
documento no Registro Imobiliário para a aquisição do direito real. Na realização do contrato de
enfiteuse, não podem as partes pactuar cláusulas “que discrepem dos preceitos legais relativos aos
elementos essenciais à configuração desse direito real ...”.
22
Ob. cit. p. 267-268.
23
Ob. cit. p. 264 e 270.
24
PEREIRA, C. Ob. cit. p. 172 e GOMES, O. Ob. cit. 263.
25
Idem. p. 264 e 270.
26
GOMES, O. Ob. cit. p. 269.
27
GOMES, O. Ob. cit. p. 268-269.
28
Produto é toda coisa ou utilidade que se extraiu de outra ou que dela se obteve (mediante fabricação). Produto é
gênero e fruto é especie. Fruto é o que vem periodicamente da coisa sem que esta se altere em sua substância,
enquanto o produto, não sendo espontâneo nem periódico, diminui a quantidade da coisa de que se extraiu ou de
que se originou. O fruto é propriamente o resultado de uma reprodução, e o produto, o resultado da produção. De
Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico. p. 646.
11

Testamento, sendo o modo de aquisição do direito real a sucessão hereditária, por isso
sendo desnecessária a transcrição, contudo, é exigida “do formal de partilha para que o direito
possa ser objeto de alienação”.
Usucapião, servindo a sentença judicial como título que deve ser transcrito no Registro
Imobiliário. Para exemplificar essa situação, o autor citado menciona a situação em que
“alguém, sem título, possua imóvel como enfiteuta, exercendo os
direitos e cumprindo as obrigações correspondentes a essa posição
jurídica; se o proprietário desse bem se comporta como senhorio, e
recebe o foro, o decurso do tempo sana a falta de título, convertendo a
posse no direito real de enfiteuse” 29.

2.1.3 Direitos e deveres

Com a constituição da enfiteuse surgem para o foreiro e o senhorio direitos e deveres


previstos nos arts. 678 ao 694 do Código Civil, assim, são direitos do foreiro:
1) a posse direta do imóvel, podendo “aproveitá-lo segundo o seu interesse e nos limites
legais, perceber os seus frutos e rendimentos, e usá-lo sem lhe destruir a substância”30, não podendo
dividi-lo sem o consentimento do senhorio;
2) de “alienar o seu direito onerosa ou gratuitamente”, desde que o senhorio seja
comunicado, para exercer “o seu direito de opção ou à percepção do laudêmio”;
3) de preferência, no caso de o senhorio querer alienar onerosamente o imóvel, tendo o
prazo de 30 dias para se manifestar após notificado;
4) de transmissão por sucessão hereditária do imóvel aforado, porém, não pode ser
dividido em glebas sem consentimento do senhorio;
5) de instituir subenfiteuse, situação em que o subenfiteuta sub-roga-se em todos os
direitos do enfiteuta, não havendo solidariedade na obrigação de pagar o foro. Orlando Gomes31
entende que o senhorio não precisa ser avisado, pois a subenfiteuse cria relações apenas entre o
enfiteuta e o subenfiteuta. No entanto Caio Mário 32 entende que se tal obrigação constar do
contrato originário de enfiteuse, deve o senhorio ser avisado;
6) de constituir servidões, usufrutos e hipotecas sobre o imóvel aforado, com cláusula de
extinção com o término da enfiteuse;
7) de resgate da enfiteuse, libertando o imóvel desse gravame decorridos 10 (dez) anos de
sua constituição, mediante o pagamento ao senhorio de 10 (dez) pensões anuais e de um laudêmio
no importe de 2,5% sobre o valor atual da propriedade;
8) de renunciar à enfiteuse independente de concordância do senhorio. Não pode ser
tácita, sendo necessária a sua inscrição no registro imobiliário;
9) de ressarcimento pelas benfeitorias realizadas, na hipótese de extinção da enfiteuse
porque não mais pagou a pensão anual.
Ademais, é dever do foreiro pagar a pensão anual, que deve ser invariável e módica,
fixada no título constitutivo de enfiteuse, cuja obrigação é portable, devendo pagá-la no domicílio
do senhorio sem a necessidade de ser cobrado. Outrossim, possui a obrigação de pagar os
impostos e os ônus reais que gravarem o imóvel.

29
Idem. p. 271.
30
PEREIRA, C. Ob. cit. p. 173.
31
Ob. cit. p. 277.
32
Ob. cit. p. 174.
12

São direitos do senhorio:

1) de receber o pagamento da pensão anual, que não sendo paga por 3 (três) anos
consecutivos, poderá resultar para o enfiteuta a perda do seu direito por sentença judicial que
aplique a pena de comisso;
2) de receber o pagamento do laudêmio no importe de 2,5% sobre o valor atual da
propriedade, toda vez que o foreiro transferir o seu direito por venda ou dação em pagamento;
3) de preferência, na hipótese de o enfiteuta querer vender ou dar em pagamento o
domínio útil, tendo o prazo de 30 dias para se manifestar após notificado, se quer adquirir pelo
mesmo preço;
4) de adquirir o domínio útil, se o enfiteuta falecer sem herdeiros.

2.1.4 Modos de extinção

Segundo Orlando Gomes33 a enfiteuse pode extinguir-se por:


a) deterioração do imóvel aforado, quando ele for destruído ou deteriorado, não valendo o
capital correspondente ao foro e mais um quinto deste;
b) confusão, quando senhorio e foreiro forem a mesma pessoa, na hipótese de o enfiteuta
se tornar herdeiro do proprietário ou quando o senhorio adquire o domínio útil do enfiteuta por
consolidação, como no exercício do direito de preferência pelo proprietário, no abandono do
imóvel enfitêutico pelo foreiro e “quando o senhorio se torna herdeiro do enfiteuta”;
c) caducidade, quando o foreiro falece sem deixar herdeiros;
d) comisso, quando por sentença judicial for decretado o atraso no pagamento da pensão
anual por 3 (três) anos consecutivos;
e) resgate34, conforme já mencionado dentre os direitos do foreiro, cumpridos os requisitos
legais, pode ele adquirir o domínio direto do senhorio que a isso não pode opor-se.

Apesar de conter o Código Civil previsão quanto ao instituto da enfiteuse, é ele de escassa
utilização, tendo se tornado desinteressante economicamente, em razão:
a) da possibilidade de resgate pelo foreiro decorrido certo tempo da enfiteuse, sem que o
senhorio possa se opor, equivalendo nas palavras de Orlando Gomes35 a uma “alienação virtual”;
b) o pagamento de uma pensão anual fixa e invariável, que se torna irrisória em face do
rendimento obtido ou da valorização do imóvel;
c) e o direito conferido ao foreiro de transferir o domínio útil. O projeto de Código Civil
de 1975 não contém disciplinamento da enfiteuse.

33
Ob. cit. p. 276.
34
Nos aforamentos de bens públicos, não há direito de resgate.
35
Ob. cit. p. 266.
13

2.2 - SERVIDÕES PREDIAIS

2.2.1 - Generalidades

As servidões são direitos reais que têm por fim proporcionar uma participação na utilidade
da coisa a quem não é seu proprietário. São chamadas servidões, porque a coisa onerada serve,
presta utilidade ao titular deste direito.
Assim está disposto no Código Civil
Art. 695. Impõe-se a servidão predial a um prédio em favor de outro,
pertencente a diverso dono. Por ela perde o proprietário do prédio
serviente o exercício de alguns de seus direitos dominicais, ou fica
obrigado a tolerar que dele se utilize, para certo fim, o dono do prédio
dominante.

Na esteira do dispositivo civilista, Orlando Gomes conceitua servidão como “o direito real
sobre a coisa imóvel, que lhe impõe um ônus em proveito de outra, pertencente a diferente dono” 36.
Do exposto, o imóvel que suporta a servidão e que sofre restrições denomina-se
serviente e o outro em favor do qual se constitui e que tem a sua utilidade aumentada, chama-se
dominante.

Possui a servidão como elementos constitutivos:


a) uma “obrigação negativa” para o proprietário do imóvel serviente, não devendo se opor
a sua utilização para determinado fim pelo dono do imóvel dominante;
b) na “restrição imposta ao titular de um prédio em proveito de outro”, que uma vez
inscrita no registro imobiliário grava o imóvel serviente, importando aumento na utilidade do prédio
dominante e diminuição para o serviente, acompanhando-o em todas as transferências até que a
servidão venha a ser extinta por uma das causas em direito admitidas;
c) “imóveis pertencentes a donos diferentes”, porque se o proprietário do imóvel serviente
e dominante fosse o mesmo, ele teria o pleno domínio não havendo nenhuma restrição ao seu
exercício e, por conseqüência, inexistindo servidão. Não obstante, pode o dono dos dois prédios
estabelecer serventia 37. Além disso, não há necessidade de os prédios serem contíguos ou
confrontantes para que se estabeleça a servidão.
Possui como natureza jurídica o fato de ser um direito:
a) “real sobre coisa alheia”, que é constituído unicamente sobre bens imóveis, conferindo
ao seu titular o exercício erga omnes, que pode ser defendido através dos interditos38 possessórios,
bem como, pela ação confessória (visando o reconhecimento judicial da servidão) e pela ação
negatória (objetivando o dono do imóvel serviente declaração de inexistência da servidão);
b) de “caráter acessório”, pois adere ao imóvel serviente seguindo-o em todas as
transferências, não podendo ser alienada separadamente;

36
Ob. cit. p. 281.
37
Serventia representa a utilidade ou a utilização proveitosa da coisa, somente privativa ao proprietário do imóvel
ou à pessoas por ele autorizadas. De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico. p. 750.
38
Interditos possessórios são as ações ou medidas judicialmente intentadas ou formuladas para proteção da
posse, como a manutenção de posse, a reintegração de posse, o interdito proibitório, a imissão de posse e a
nunciação de obra nova. De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico. p. 442.
14

c) “perpétuo”, porque adere a um imóvel e é “irresgatável sem a anuência do proprietário


do prédio dominante”39;
d) “indivisível”40, uma vez que não se adquire e nem se perde por partes.
Na lição de Orlando Gomes o fundamento da servidão

“é a utilidade do prédio dominante. Se lhe não traz vantagem alguma,


servidão não há. De sua essência, que importe aumento para um prédio
e dominuição para o outro. Necessário por fim que torne o prédio
dominante mais útil, mais cômodo ou, ao menos, mais agradável” 41.

Estabelecidas as premissas que envolvem a caracterização da servidão, é preciso delinear


as diferenças de outros direitos que comportam certa semelhança. Assim, segundo Orlando
Gomes42 difere do:
a) usufruto, porque este implica cessão do direito de uso e gozo da coisa ao usufrutuário,
dos quais fica temporariamente privado o proprietário, já a servidão é encargo que não impede o
proprietário de usar e gozar sua propriedade perpetuamente;
b) direito de vizinhança, porque neste as limitações impostas aos proprietários são
recíprocas, na servidão somente o prédio serviente sofre limitação em favor do dominante;
c) ato de tolerância, porque este é precário e pode a qualquer tempo ser proibido pelo
proprietário;
2.2.2 - Classificação

A servidões podem ser classificadas em:


- urbanas (para utilidade dos edifícios, como a obrigação de não levantar mais alto, não
importando que o prédio se ache no campo ou na cidade) ou rústicas (as que se ligam ao solo,
como as de trânsito);
- positivas (são as que conferem ao dono do prédio dominante o poder de praticar algum
ato, como as de trânsito) ou negativas (as que impõem ao dono do prédio serviente uma abstenção,
como a de não construir);
Não obstante essas classificações, não são elas consideradas importantes43 porque são de
pouco interesse teórico e prático, já que não influem de modo relevante na constituição das
servidões.
Para o estudo das servidões, interessa a classificação em contínuas e descontínuas,
aparentes e não-aparentes, já que interferem na constituição e no modo de exercício.
Contínuas, são as servidões que dispensam a intervenção humana para que continuem a
existir e sejam exercidas, como as de aqueduto ou de passagem de energia elétrica;
Descontínuas, as que têm o seu exercício condicionado à intervenção humana, como a de
passagem, de tirar água, de pastagem e outras mais;
Aparentes, são as servidões que se “revelam por obras exteriores, indispensáveis ao seu
exercício, como a servidão de caminho por uma estrada que conduz ao prédio dominante”44;

39
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 262.
40
Código Civil. Art. 707. As servidões prediais são indivisíveis. Subsistem, no caso de partilha, em beneficio de
cada um dos quinhões do prédio dominante, e continuam a gravar cada um dos do prédio serviente, salvo se, por
natureza, ou destino, só se aplicarem a certa parte de um, ou de outro.
41
Ob. cit. p. 282.
42
Idem. p. 282-283.
43
Conforme Caio Mário. Ob. cit. p. 186; Orlando Gomes. Ob. cit. p. 284 e Silvio Rodrigues Ob. cit. p. 264.
15

Não-aparentes, as que não se revelam por obras externas, como a obrigação de não
construir acima de certa altura.
Essas denominações podem ser combinadas, resultando em servidão contínua-aparente e
não-aparente, descontínua-aparente e não-aparente, cuja distinção não se restringe apenas a estudo
doutrinário, mas a aplicação das regras legais na constituição, proteção e extinção das servidões.
Com efeito, o Código Civil no capítulo referente aos efeitos da posse, restringe o uso dos
interditos possessórios na proteção da posse, quando tratar-se de servidão contínua-não-aparente
ou descontínua, como é transcrito:
Art. 509. O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões
contínuas não-aparentes, nem às descontinuas, salvo quando os
respectivos títulos provierem do possuidor do prédio serviente, ou
daqueles de quem este o houve.

É possível verificar então que não há restrição em relação às servidões contínuas-


aparentes, que, portanto, podem ser objeto de posse. Situação que na opinião de Silvio Rodrigues45
harmoniza-se com o conceito de posse, pois se esta “é a exteriorização do domínio, tal
exteriorização só se pode manifestar, no que concerne às servidões, quando estas são aparentes e
são contínuas; pois, a falta de um desses pressupostos impede que ocorra exteriorização de poderes
inerentes ao domínio”46.

2.2.3 - Modos de constituição

Preceitua o art. 696 do Código Civil que a servidão não se presume, assim, a sua
comprovação depende de ter sido constituída por um dos modos em lei admitidos. Para que
adquira a característica de direito real, deve ser registrada no registro de imóveis, consoante o
prescrito pelo art. 167, I, nº 6, da Lei de Registros Públicos nº 6.015/1973. Não havendo o
registro é direito pessoal o negócio jurídico constitutivo de servidão.

Na lição de Silvio Rodrigues47 a servidão pode ser constituída por:


a) ato jurídico, que pode ser através de testamento (quando se impõe ao beneficiário do
imóvel testado o encargo de uma servidão) ou de contrato (quando o dono do prédio serviente,
mediante determinada quantia, concorda em atribuir ao prédio dominante determinadas vantagens);
b) sentença judicial, resultante das ações de divisão previstas no Código de Processo
Civil, cujo inciso II do art. 979, contempla a hipótese de instituir-se servidões “a fim de possibilitar a
utilização dos vários lotes em que foi repartido o imóvel”48;
c) usucapião49, que pode ser ordinário, quando ocorrer a posse incontestada e contínua
de uma servidão por 10 (dez) anos entre presentes ou 15 (quinze) anos entre ausentes,
44
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 265.
45
Idem, ibidem.
46
Ver modo de constituição de servidão por usucapião na página 18.
47
Ob. cit. p. 267.
48
RODRIGUES, S. Idem, ibidem.
49
Código Civil. Art. 698. A posse incontestada e continua de uma servidão por 10 (dez) ou 15 (quinze) anos, nos
termos do art. 551, autoriza o possuidor a transcrevê-la em seu nome no Registro de Imóveis, servindo-lhe de
titulo a sentença que julgar consumado o usucapião.
Parágrafo único. Se o possuidor não tiver titulo, o prazo do usucapião será de 20 (vinte) anos.
16

acompanhada de justo título e boa-fé, ou extraordinário, quando a posse for mansa e pacífica por
20 (vinte) anos, sem a exigência de título.
Não obstante a justicativa apresentada50 de que somente as servidões contínuas-aparentes
são passíveis de posse e portanto usucapíveis, preleciona Silvio Rodrigues51que jurisprudência
inovadora tem admitido “que as servidões de passagem possam ser objeto de posse quando, a
despeito de serem descontínuas, se revelem por obras externas, visíveis e incontestáveis”.
d) destinação do proprietário, é a situação em que o proprietário de dois prédios
estabelece serventia em favor de um prédio sobre outro, que mais tarde passam a pertencer a donos
diversos, por alienação ou herança. A serventia então estabelecida, se aparente, transforma-se em
servidão. A exigência de que a serventia seja aparente decorre de construção jurisprudencial, que
no ensinamento de Silvio Rodrigues52 tem o “propósito de proteger a boa-fé do adquirente do
prédio dominante, que, vendo-o beneficiado pelas serventias estabelecidas pelo proprietário
anterior, tem a justa expectativa de imaginá-lo titular daquelas vantagens, a título de servidão”.

2.2.4 - Modos de extinção

Em regra a servidão possui a característica da perpetuidade, contudo, pode se extinta por


um dos modos abaixo citados, que, considerando a sua condição de direito real da servidão, devem
ser complementados com o cancelamento do registro efetuado. “A servidão se constitui pelo
registro e se extingue pelo cancelamento desse registro”53.
Dentre os modos de extinção elencados nos arts. 708 a 710 do Código Civil, se destacam
a(o):
a) confusão, quando o prédio serviente e dominante passam a pertencer ao mesmo dono,
surgindo a serventia. Voltando a donos diferentes, restaura-se a servidão;
b) renúncia, “é ato jurídico unilateral, expresso, através do qual o titular de um direito
declara seu propósito de afastá-lo de seu patrimônio”54;
c) não-uso, durante 10 (dez) anos contínuos, pois se a servidão é um ônus imposto a um
prédio (serviente) para o aumento da utilidade de outro (dominante), o seu não-uso pressupõe a sua
inutilidade;

2.3 - USUFRUTO

2.3.1 - Generalidades

Com base no art. 713 do Código Civil, Caio Mário conceitua usufruto como “o direito
real de fruir as utilidades e frutos de uma coisa sem alterar-lhe a substância, enquanto
temporariamente destacado da propriedade” 55.
Instituído o usufruto sobre determinada coisa, tem-se como conseqüência o
desmembramento do domínio em mãos do usufrutuário (aquele a quem foi concedida a posse
direta e o direito de usar e gozar de coisa alheia) e do nu-proprietário (dono da coisa e detentor da
50
parte final do tópico 2.2.2 classificação das servidões.
51
Ob. cit. p. 269.
52
Ob. cit. p. 270-271.
53
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 274.
54
RODRIGUES, S. Idem, ibidem.
55
Ob. cit. p. 196.
17

posse indireta; assim chamado porque o seu direito de propriedade se despe dos atributos de usar e
gozar).
Do conceito estabelecido é possível constatar que esse instituto possui a característica
de:
a) direito real, pois adere ao bem sobre que incide, conferindo ao usufrutuário o direito de
seqüela e oposição erga omnes;
b) incidir sobre coisa alheia, podendo ser bem móvel ou imóvel, em um patrimônio inteiro
ou parte deste, corpóreos ou incorpóreos, cujo uso e gozo são exercidos pelo usufrutuário;
c) uso e gozo, em que o usufrutuário tem o direito de utilização pessoal da coisa e de
retirar-lhe os frutos naturais e civis56;
d) temporário, extingue-se o usufruto pela morte do usufrutuário (art. 739, inciso I) ou,
quando constituído em favor de pessoa jurídica, com esta ou pelo decurso do prazo de 100 (cem)
anos (art. 741, ambos do Código Civil);
e) inalienável, estando autorizada apenas a sua alienação ao nu-proprietário e a cessão do
exercício do direito de usufruto a título gratuito ou oneroso, situação em que é possível arrendar a
propriedade a terceiro (art. 717 e 724).
A finalidade do usufruto é a de assegurar a subsistência a certas pessoas, por isso,
normalmente é restrito às relações familiares, resultando de negócio gratuito e realizado por
testamento.
Incidindo sobre coisa alheia, o usufruto pode ter por objeto:
a) coisa imóvel, sendo exigência do art. 715 do Código Civil a sua transcrição no Registro
Imobiliário, entretanto, desnecessária, se resultar do direito de família;
b) coisa móvel, não podendo ser fungíveis (substituíveis por outras do mesmo gênero) e
consumíveis (desaparecem com o primeiro uso), já que o usufrutuário tem o dever de conservar a
substância da coisa.
Apesar da regra estabelecida, admite-se o usufruto sobre esse tipo de bem, sendo então
chamado de usufruto impróprio ou quase-usufruto, recaindo não sobre a coisa, mas sobre o seu
valor. Extinguindo-se esse tipo de usufruto, o quase-usufrutuário está obrigado a devolver coisa
equivalente ou pagar o seu valor.
c) um patrimônio, podendo incidir no patrimônio inteiro ou em parte dele (na hipótese de o
testador gravar parte dele com o ônus do usufruto), todavia, não pode recair sobre coisas
acessórias;
d) um direito, sendo condição para a constituição que seja transmissível, tendo em vista
que o usufruto importa em “transmissão parcial das faculdades contidas no direito em que recai” 57.
São exemplos: os créditos (podendo o usufrutuário cobrar a dívida e aplicar a quantia
paga), as ações de sociedades anônimas, apólices da dívida pública e o usufruto de empresa
(incidindo sobre a universalidade).

2.3.2 - Distinções

Distingue-se o usufruto58:

56
Frutos civis são vantagens pecuniárias que se tiram das coisas, em virtude de sua utilização por terceiros, como
lucros, aluguéis ou juros. De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico.
57
GOMES, O. Ob. cit. p. 298.
18

a) da locação, porque o direito do locatário é pessoal exercido contra o locador, enquanto


que o usufrutuário possui direito real exercido erga omnes;
b) do comodato, porque o direito do comodatário é pessoal;
c) da enfiteuse, porque esta é perpétua, alienável e recai somente sobre terrenos, já o
usufruto é temporário, inalienável e tem por objeto bens móveis, direitos e todo tipo de bem imóvel;
d) da constituição de renda sobre imóveis, porque nesta o beneficiário tem direito apenas
ao recebimento das prestações periódicas de dinheiro; enquanto que o usufrutuário tem o direito de
utilizar a coisa em todas as suas formas;
e) da anticrese, porque para a sua constituição depende da preexistência de uma
obrigação, já o usufruto não necessita desse pré-requisito para a sua constituição;
f) do fideicomisso, porque neste os direitos do fiduciário e do fideicomissário são
adquiridos sucessivamente, enquanto que no usufruto os direitos dos usufrutuário e do nu-
proprietário são adquiridos simultaneamente. Para entender como se realiza o fideicomisso, Orlando
Gomes o explica da seguinte maneira: “O fideicomisso resulta de uma disposição pela qual alguém –
o fideicomitente – institui herdeiros ou legatários, impondo a um deles – o fiduciário – a obrigação
de, sob termo ou condição, transmitir ao outro, que se chama fideicomissário, a herança ou o
legado” 59.

2.3.3 - Modos de constituição

O usufruto constitui-se por:


a) determinação da lei, como na hipótese do art. 389 do Código Civil, em que os direitos
do pátrio poder compreende o direito de usufrutuário sobre os bens dos filhos; o § 1º do art. 1.611
do Código Civil, conferindo ao cônjuge viúvo o usufruto dos bens do cônjuge falecido enquanto
durar a viuvez e o art. 2º da Lei Federal nº 8.971/94, regulamentadora do direito dos companheiros
a alimentos e à sucessão, dispondo que o(a) companheiro(a) terá direito ao usufruto dos bens do(a)
companheiro(a) falecido(a), extinguindo-se se constituir nova união.
b) ato jurídico, que pode ser gratuito ou, muito raramente, oneroso, entre vivos ou causa
mortis. Ocorre quando, por contrato ou testamento, o proprietário do bem (nu-proprietário)
concede a outrem (usufrutuário) o uso e gozo da coisa. Outra hipótese, quando, por contrato, o
proprietário do bem o aliena a terceiro, mas reserva para si o usufruto da coisa.

2.3.4 - Direitos e obrigações do usufrutuário

Em relação aos direitos do usufrutuário, o art. 718 do Código Civil dispõe que ele tem
direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos, todavia, direitos limitados e
subordinados ao correlato direito do nu-proprietário em reaver a substância da coisa gravada por
esse direito real.
a) a posse, tendo o usufrutuário a posse direta do bem, pode ele valer-se dos interditos
possessórios para protegê-la, até contra o instituidor do usufruto ou contra o nu-proprietário;

58
GOMES, O. Ob. cit. p. 294-295.
59
Idem. p. 295.
19

b) o uso, que é o de fruir as utilidades da coisa, inclusive podendo ceder a título gratuito ou
oneroso a terceiro o exercício do direito de usufruto;
c) de administração, que é o de administrar a coisa sem a ingerência do nu-proprietário
visando melhorá-la para conseguir maior utilidade, desde que não lhe transforme ou altere a
substância. Pode perder esse direito se a coisa se deteriora ou se não quiser ou não puder dar
caução;
d) de percepção dos frutos, tendo o usufrutuário direito aos frutos naturais e civis
produzidos pela coisa, dependente do começo ou cessação do usufruto.
Quanto aos frutos naturais, dispõe o art. 721 e parágrafo único do Código Civil que
pertencem ao usufrutuário se pendentes ao começar o usufruto, sem ter que pagar as despesas de
produção. Entretanto, pertencem ao dono se pendentes ao tempo em que cessa o usufruto, sem
compensação de despesas.
Quanto aos frutos civis, prescreve o art. 723 do Código Civil que pertencem ao
proprietário se vencidos na data inicial do usufruto, porém, se vencidos na data que cessa o
usufruto, pertencem ao usufrutuário.
No que concerne as obrigações do usufrutuário, a matéria está regulada nos arts. 729 a
738 do Código Civil, destacando-se as seguintes:
a) fazer inventário, que será realizado às custas do usufrutuário antes de assumir o usufruto,
determinando quais os bens que está recebendo e o estado em que se encontram, tendo em vista
que terá que devolver a coisa no estado em que a recebeu;
b) prestar caução, que pode ser real ou fidejussória, tendo por finalidade proporcionar ao
nu-proprietário garantia por prejuízos decorrentes da deterioração da coisa. Se não puder ou não
quiser prestar a garantia suficiente, perderá o direito de administrar o usufruto.
Segundo o art. 730 do Código Civil, nessa hipótese os bens serão administrados pelo
proprietário, que ficará obrigado, mediante caução, a entregar ao usufrutuário o rendimento deles,
deduzidas as despesas da administração, inclusive a quantia fixada pelo juiz para remunerar o
administrador.
Estão dispensados de prestar caução o doador, que reservar o usufruto da coisa doada e
os pais, usufrutuários dos bens dos filhos menores;
c) conservar a coisa, considerando que é direito sobre coisa alheia e que terá que devolvê-
la ao proprietário, o usufrutuário deve conservar a sua substância para que seja devolvida no mesmo
estado em que foi recebida;
d) despesas de conservação, que são de responsabilidade do usufrutuário quando forem
ordinárias e módicas, porém, se forem extraordinárias ou ordinárias não-módicas, competem
ao nu-proprietário. Possuem a finalidade de manter a coisa no estado em que foi recebida.
Conforme o art. 734, parágrafo único, do Código Civil, não se consideram módicas as despesas
superiores a dois terços do líquido rendimento de um ano.
e) restituir a coisa, considerando que é um direito temporário, findo o prazo, deve ser
restituída ao proprietário no estado em que foi recebida, consolidando-se a posse plena.

2.3.5 - Modos de extinção

Não obstante o disposto nos arts. 739 a 741 do Código Civil, Silvio Rodrigues60 ensina
que são causas de extinção do usufruto:
60
Ob. cit. p. 291.
20

I - as relativas à pessoa do usufrutuário.


Extinguindo-se o usufruto pela sua morte ou pelo decurso do prazo de 100 (cem) anos
quando for pessoa jurídica. Desse modo, limitando a duração do usufruto e evitando que o bem
fique fora do comércio indefinidamente. Todavia, excepciona o art. 740 do Código Civil a regra de
extinção do usufruto pela morte do usufrutuário, na hipótese de ter sido constituído em favor de dois
ou mais indivíduos, permitindo a transmissão aos sobreviventes, do quinhão do falecido, desde que
haja cláusula expressa nesse sentido. Suscita Silvio Rodrigues o conflito entre essa cláusula e a
legítima do herdeiro, já que este tem direito a receber a herança sem qualquer restrição. Assim,
entende que “a cláusula que determina o acrescimento do usufruto em favor do consorte
sobrevivente é ineficaz, até quando prejudique a reserva dos herdeiros necessários”61.
Extingue-se ainda pelo advento do termo de sua duração e pela culpa do usufrutuário,
quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de
conservação.

II - as relativas ao seu objeto.


Extingue-se o usufruto pela destruição da coisa. No entanto, se o fato ocorreu por “culpa
de terceiro, que foi condenado a reparar o prejuízo, se a coisa estava no seguro, ou, se foi
desapropriada, o direito do usufrutuário se sub-roga na indenização recebida”62, tendo direito a
receber os juros produzidos pela importância da indenização.
Com relação ao seguro, as diretrizes sãos as seguintes:
a) não está o usufrutuário obrigado a segurar a coisa;
b) se o nu-proprietário fizer o seguro da coisa após a constituição do usufruto, não pode
obrigar o usufrutuário a pagar o prêmio, mas ocorrendo o sinistro, o usufruto não se sub-roga no
valor da indenização;
c) se a coisa já estiver segurada antes de ser constituído o usufruto, o usufrutuário tem que
pagar as contribuições do seguro;
d) se o usufruário fizer o seguro, ao nu-proprietário caberá o direito dele resultante contra
o segurador, porém, o usufruto se sub-roga na indenização.

III - as que incidem sobre a relação jurídica.


Por derradeiro, extingue-se o usufruto pela:
a) consolidação, quando o usufrutuário adquire a propriedade ou quando o nu-
proprietário adquire o direito de usufruto;
b) cessação da causa que o origina, como na hipótese de usufruto do pai sobre os bens
do filho, atingindo este a maioridade ou aquele decaindo do pátrio poder, termina o usufruto;
c) prescrição extintiva, configura-se pelo não-uso do usufruto durante o prazo previsto
no art. 177 do Código Civil63.

2.3.6 - Direito real de uso e habitação

61
Ob. cit. p. 292.
62
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 293.
63
Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em 20 (vinte) anos, as reais em 10 (dez), entre
presentes, e entre ausentes em 15 (quinze), contados da data em que poderiam ter sido propostas.
21

Esses dois tipos de direitos reais sobre coisas alheias serão analisados nesse sub-tópico e
em conjunto, porque o uso na verdade é uma espécie de usufruto mais limitado e a habitação uma
modalidade de uso e, também, em razão da irrelevância econômica desses direitos, pois de escassa
aplicação prática64.
O uso confere ao seu titular o direito de usar coisa alheia móvel ou imóvel
temporariamente, fruindo as utilidades, porém, limitadas à satisfação de suas necessidades
(considerando a sua condição social e o lugar onde viver) e as de sua família. É indivisível, não
podendo ser parceladamente gravado e intransmissível, devendo ser exercido pessoalmente. Não
pode ser constituído por lei.
O direito de habitação consiste no uso gratuito de casa para moradia, não podendo alugá-
la ou emprestá-la. O seu exercício consiste em residir com a família em casa ou apartamento alheio.
Sendo vedado transferir esse direito ou o exercício a terceiro.
Aplicam-se a esses dois institutos as disposições concernentes ao usufruto, desde que não
contrariem a sua natureza e finalidade.

2.4 - RENDAS CONSTITUÍDAS SOBRE IMÓVEIS

2.4.1 - Generalidades

O Código Civil prevê duas espécies de constituição de renda, a realizada através de


contrato, sem a vinculação a um imóvel, resultando desse negócio jurídico direitos de natureza
pessoal que são regulados pelo direito das obrigações (arts. 1.424 a 1.431) e a renda vinculada a
um imóvel que possui caráter de real, regulada pelo direito das coisas, cujo estudo se propõe.
Clóvis Beviláqua65 define a renda constituída sobre imóvel como “o direito real
temporário, que grava determinado bem de raiz, obrigando o seu proprietário a pagar prestações
periódicas de soma determinada”.
Configura-se esse direito quando uma pessoa, chamada rentista ou censuísta, transfere o
domínio de um imóvel a outro contratante, chamado rendeiro ou censuário, obrigando-se este a
pagar regularmente por tempo determinado uma renda a favor do instituidor ou de outrem, que se
denomina beneficiário. Essa renda, vinculada a um imóvel através da inscrição do contrato no
Registro de Imóveis, constitui direito real de gozo ou fruição sobre coisa alheia.
A vigência desse direito é temporária, sendo vedada a sua perpetuidade66. Contudo, a sua
duração pode estar subordinada a termo certo, sendo fixada a data em que acabará a obrigação do
censuário ou incerto, permanecendo válido enquanto viver o beneficiário. Vindo a falecer o
censuário (devedor da renda) o imóvel continua gravado, subsistindo a obrigação de pagar a renda
ao beneficiário.
Havendo prestações não-pagas pode o beneficiário demandar o devedor ou o atual
proprietário do imóvel, que possui direito de regresso contra o alienante. Pertencendo o imóvel a

64
GOMES, O. Ob. cit. p. 310 e RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 291.
65
Apud RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 309.
66
PEREIRA, C. Ob. cit. p. 214, entende que falecendo o beneficiário e tendo sido a renda constituída a termo
certo, subsiste a obrigação para com os herdeiros pelo tempo restante do contrato, salvo cláusula em contrário.
22

mais de uma pessoa, todos são solidariamente responsáveis pelo pagamento da prestação, que é
indivisível. Como última alternativa, pode o beneficiário executar o imóvel a fim de obter o que lhe é
devido, pois é considerado título executivo extrajudicial67 a renda de imóvel.
No caso de falência possui o beneficiário direito de preferência aos outros credores, tanto
para obter as prestações atrasadas como a constituição de capital que lhe assegure renda
equivalente.
Diferencia-se da anticrese, porque o pressuposto desta é a existência de uma dívida,
enquanto que nas rendas não existe esta dívida.

2.4.2 - Modos de constituição

Pode ser constituída por ato entre vivos ou causa mortis, a título oneroso ou gratuito,
todavia, para surgir o direito real é necessária a transcrição do título constitutivo no Registro de
Imóveis. A sua constituição pode ocorrer mediante:
a) contrato68, que é real (porque o imóvel é transferido ao rendeiro), unilateral (porque
gera obrigações somente para a parte que aceitou pagar a renda), comutativo (porque celebrado
para durar prazo certo, se subentende a equivalência entre a aquisição do imóvel e o valor da renda)
ou aleatório (se foi celebrado para durar enquanto viver o beneficiário, pode ser vantajoso ou
desvantajoso para o devedor da renda);
b) testamento, é a hipótese em que “o testador lega a alguém um bem imóvel com o
encargo de pagar, durante algum tempo, a determinada pessoa, certa renda”69. A obrigação de
pagar a renda inicia com a morte do testador, mas só vale contra terceiros depois de transcrita no
Registro de Imóveis;
c) sub-rogação, quando a renda será constituída sobre o preço pago pelo imóvel, na
hipótese de desapropriação ou no valor da indenização do seguro no caso de destruição.

2.4.3 - Modos de extinção

Extingue-se a renda sobre imóvel pela(o):


a) resgate, situação em que o devedor da renda pode pagar importância em dinheiro, cujo
rendimento, calculado pela taxa legal dos juros, assegure renda equivalente ao beneficiário, que não
pode impedir essa remissão. Com o pagamento extingue-se a obrigação real;
b) superveniência do termo de sua duração, pelo advento do prazo fixado ou pela morte
do beneficiário, conforme já explicitado em relação a sua vigência;
c) confusão ou consolidação, quando o beneficiário da renda adquire a propriedade do
imóvel;
d) destruição do imóvel, extinguindo se não estiver segurado, pois se estiver a renda se
sub-roga na indenização;

67
Código de Processo Civil. Art. 585 - São títulos executivos extrajudiciais:
IV - o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio desde
que comprovado por contrato escrito;
68
GOMES, O. Ob. cit. p. 315.
69
GOMES, O. Ob. cit. p. 316.
23

e) resolução, quando por sentença se “reconheça a culpa do rendeiro na deterioração ou


arruinamento do prédio, ou na falta de pagamento das prestações”70;

2.5 - PROMESSA IRRETRATÁVEL DE VENDA

2.5.1 - Generalidades

Em razão da crescente venda de lotes a prestação, a possibilidade de arrependimento do


promitente-vendedor e de sua recusa em outorgar a escritura ao promissário-comprador, que não
obstante visar a aquisição do terreno que havia comprado, nessa situação podia apenas requerer
perdas e danos, o legislador através do Decreto-Lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937, inseriu
dentre os direitos reais o contrato irretratável de compromisso de compra e venda.
Com efeito, esclarece Silvio Rodrigues71 que consoante a regra do art. 22 desse decreto
“a promessa irretratável de venda de um bem de raiz, desde que inscrita no Registro de Imóveis,
confere ao promissário comprador um direito real sobre a coisa vendida, direito real cujo conteúdo
é a oponibilidade erga omnes e a possibilidade de alcançar a adjudicação compulsória”.
Não obstante, a aplicação dessa lei restringia-se somente aos imóveis loteados e vendidos
a prestação, não contemplando a venda de imóveis não-loteados e a vista. Para resolver esse
inconveniente, veio a Lei nº 649, de 11 de março de 1949, dando nova redação ao art. 22 do
Decreto-Lei nº 58/1937.
Orlando Gomes72 prefere denominar esse contrato de compromisso de venda e não como
promessa, para evitar ambigüidade com o contrato preliminar de venda, que também pressupõe
uma promessa. Na sua lição esses dois contratos possuem causa diversa, pois no compromisso de
venda tendo o promissário-comprador pago todo o preço do bem, pode requerer ao juiz a
adjudicação compulsória, o que implica em uma obrigação de dar. Já no contrato preliminar de
venda gera uma obrigação de fazer, a de celebrar o contrato definitivo.
No seu entender o compromisso de venda é “o contrato típico pelo qual as partes se
obrigam reciprocamente a tornar eficaz a compra e venda de um imóvel, mediante a reprodução do
consentimento no título hábil”73.
É oponível a terceiros, esclarecendo Silvio Rodrigues74 o seu significado com a seguinte
assertiva
“(...), uma vez inscrita a promessa de venda, perde o proprietário o
poder de dispor da coisa prometida, pois sobre ela se prende o direito
do promissário comprador de torná-la sua, uma vez pago o preço. De
modo que, quaisquer alienações que o dono faça, fugindo à fé do
contrato, são anuláveis por colidirem com um direito preexistente do
promissário. E mais: por seu direito ser oponível a terceiros, está o
mesmo munido da prerrogativa da seqüela, podendo o promissário
comprador, por conseguinte, ir buscar a coisa nas mãos de quem quer
que a detenha, para sobre ela exercer o seu direito real”.

70
GOMES, O. Ob. ci. p. 319.
71
Ob. cit. p. 295.
72
Ob. cit. p. 322-324.
73
GOMES, O. Idem. P. 324.
74
Ob. cit. p. 302.
24

Com efeito, firmado o compromisso irretratável de compra e venda e inscrito no Registro


Imobiliário o poder de disposição do bem é paralisado, de tal modo que pago o preço e recusando-
se o promitente-vendedor a transferir o bem, possui o promissário-comprador o direito de propor
ação de adjudicação compulsória, a fim de obter sentença que lhe forneça o título para realizar a
transferência do bem adquirido (art. 16, § 2º, do Decreto-Lei nº 58/1937).
A Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, que dispõe sobre o parcelamento
do solo urbano, no seu art. 27 e parágrafos, ampliou a exigibilidade do cumprimento da promessa
de venda, quando o imóvel desmembrado ou loteado é adquirido sem ter sido firmado o contrato de
compromisso de venda, havendo apenas promessa de cessão, proposta de compra, recibo de
sinal, reserva de lote ou qualquer outro instrumento, do qual conste a manifestação de
vontade das partes.
Portanto, existindo apenas um pré-contrato pode o promissário-comprador notificar o
promitente-vendedor para outorga do contrato irretratável de compromisso de compra e venda ou
impugnação da pretensão, sob pena de proceder-se ao registro do pré-contrato, passando as
relações entre as partes a serem regidas pelo contrato padrão e, posteriormente, tendo sido
pago o preço do bem, a sua adjudicação compulsória.

2.5.2 - Requisitos do direito real do compromisso de compra e venda

a) irretratabilidade do contrato: não é necessário que conste expressamente cláusula de


irretratabilidade para caracterizar a sua irrevogabilidade, bastando que não conste cláusula de
arrependimento. Ademais, com esta não se confunde a cláusula resolutiva e a sua existência não
descaracteriza o direito real, tendo em vista que tem por objetivo sancionar o inadimplemento do
promissário-comprador;
b) imóvel: a disposição legal abrange imóveis loteados e não-loteados, afirmando Caio
Mário que “não existe o direito real na promessa de venda de coisa móvel”. Orlando Gomes76
75

também entende que o seu objeto, em princípio, são bens imóveis, todavia, admite que bens móveis
sejam prometidos irrevogavelmente a venda, como as ações de uma sociedade anônima;
c) preço: para a constituição desse direito real independe se o pagamento é realizado a
vista ou em prestações;
d) inscrição: é condição obrigatória para que adquira o caráter de direito real, sem essa
formalidade apenas existe entre as partes direitos obrigacionais. Com a inscrição do contrato
irretratável de compromisso de compra e venda no Registro de Imóveis, “o direito real nasce e se
prende à coisa, liga-se indelevelmente a ela e a persegue onde quer que se encontre, nas mãos de
quem quer que a detenha”77.
e) outorga uxória: é necessário o consentimento do cônjuge do promitente-vendedor para
a validade do direito, tendo em vista que o contrato irretratável de compromisso de compra e venda
registrado no Registro Imobiliário resulta em um direito real;
f) instrumento público ou particular: em relação aos imóveis loteados o art. 11 do Decreto-
Lei nº 58/1937 e o art. 26 da Lei Federal nº 6.766/1979, prescrevem que o contrato irretratável de

75
Ob. cit. p. 316.
76
Ob. cit. p. 325.
77
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 308.
25

compromisso de compra e venda pode ser contratado por instrumento público ou particular. Em
relação aos imóveis não-loteados, embora não haja preceito legal a respeito, Silvio Rodrigues78
entende que deve ser por escritura pública, em face da exigência do art. 13479 do Código Civil e
porque “o contrato de promessa irretratável de venda, devidamente inscrito, constitui direito real
sobre imóvel”.

2.5.3 - Rescisão do contrato por inadimplência do comprador

No que tange a venda de imóveis loteados, a rescisão do contrato por inadimplemento do


promissário-comprador, estabelece o art. 14 e parágrafos do Decreto-Lei nº 58/1937, que
“vencida e não paga a prestação, considera-se o contrato rescindido 30 (trinta) dias depois de
constituído em mora o devedor”. Segundo o § 1º para constituir em mora o promissário-
comprador, será ele intimado pelo oficial do registro de imóveis a requerimento do promitente-
vendedor.
Outrossim, em relação aos negócios realizados com imóveis não-loteados, o Decreto-Lei
nº 745/1969, prescreve a exigência de constituição em mora do promissário-comprador
inadimplente para a resolução do contrato.
Em ambas as modalidades a exigência deve ser cumprida mesmo que conste cláusula
dispondo que a mora do promissário-comprador importa em rescisão do contrato.
Rescindido o contrato de imóveis loteados por inadimplemento do promissário-
comprador, tem ele direito a indenização correspondente às benfeitorias necessárias e úteis, bem
como que lhe seja devolvido o valor que exceder de 1/3 (um terço) do que pagou, conforme dispõe
os arts. 34 e 35 da Lei Federal nº 6.766/1979. Desse modo, limitou o legislador a multa por
rescisão contratual a um terço do valor pago.
No que concerne aos imóveis não-loteados, não há disposição legal expressa em relação
a indenização por benfeitorias e a devolução de parte do valor pago. Silvio Rodrigues80 defende a
extensão a essa modalidade negocial dos dispositivos legais citados da Lei Federal nº 6.766/1979,
em razão da situação de injustiça que poderia acarretar a sua não-aplicação, pois rescindido o
contrato em que o promissário-comprador pagou aproximadamente 60% do preço, o promitente-
vendedor ficaria com todo o preço pago, as benfeitorias e ainda poderia vender o imóvel.

78
Ob. cit. p. 306.
79
Art. 134. É, outrossim, da substância do ato a escritura pública:
II - nos contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis de valor superior a Cz$ 50,00
(cinqüenta cruzados), excetuado o penhor agrícola.
80
Ob. cit. p. 305-306.
26

3 - DIREITOS REAIS DE GARANTIA

Generalidades

O pagamento de uma dívida pode ser garantido de dois modos: com garantia pessoal ou
com garantia real. No primeiro, uma pessoa se responsabiliza a pagar ao credor, caso o devedor
não o faça; no segundo, uma coisa fica vinculada para tal fim.
A garantia pessoal ou fidejussória é um direito obrigacional, tendo como exemplos o aval e
a fiança. Possui limitações em razão de o devedor não conseguir quem garanta a dívida ou porque
no vencimento desta o garante se torne insolvente.
Já a garantia real apresenta maior segurança, aumentando a possibilidade de o credor
receber integralmente o seu crédito, tendo em vista que a dívida estará garantida por um bem do
patrimônio do devedor.
O direito real de garantia é conceituado como aquele “que confere a seu titular a
prerrogativa de obter o pagamento de uma dívida com o valor ou a renda de um bem aplicado
exclusivamente à sua satisfação”81. Prevê a legislação brasileira três espécies de garantias reais: o
penhor, a hipoteca e a anticrese.
Em relação ao penhor ou hipoteca, não pagando o devedor a dívida, o bem dado em
garantia é leiloado e o credor tem direito de preferência para receber a importância obtida no
pagamento de seu crédito, ficando os demais credores com as sobras que houverem.
Quanto a anticrese, “o bem dado em garantia se transfere para as mãos do credor que,
com as rendas pelo mesmo produzidas, procura se pagar”82.
O bem gravado por penhor ou hipoteca, conforme o art. 759 do Código Civil, confere ao
credor a preferência na satisfação do seu crédito, consistindo essa prerrogativa no direito “de
pagar-se com o produto da venda judicial da coisa dada em garantia, excluídos os demais credores
que, dessa forma, não concorrem com o primeiro, no que diz respeito a essa parte do patrimônio do
devedor. Somente após pagar-se ao preferente é que as sobras, se houver, serão rateadas entre os
demais devedores.”83.
Se apesar da venda judicial realizada o produto da venda não bastar para o pagamento da
dívida, o devedor responderá pela diferença com o restante do seu patrimônio e, nessa hipótese, o
crédito apurado não terá preferência, tornando-se quirografário (Código Civil, art. 767).
No que concerne à anticrese, o credor não se beneficia da preferência, mas tem o direito
de reter em seu poder a coisa dada em garantia, enquanto a dívida não for paga. Extingue-se,
porém, esse direito, decorridos 15 (quinze) anos do dia da transcrição (Código Civil, art. 760).
Distingue-se o direito real de garantia do direito real de gozo, porque este é um direito
autônomo, no qual o titular desfruta da coisa, aproveitando total ou parcialmente as suas vantagens;
enquanto que aquele é um direito acessório, visando o credor extrair da coisa determinado valor
para assegurar o pagamento de seu crédito.

81
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 317.
82
RODRIGUES, S. Idem. p. 316.
83
RODRIGUES, S. Idem. p. 317
27

Outrossim, distingue-se do privilégio84, porque neste a lei confere ao credor a garantia do


seu crédito sobre todo o patrimônio do devedor, possuindo inclusive preferência aos créditos
garantidos por penhor, hipoteca ou anticrese; enquanto que no direito real de garantia, o crédito está
garantido por determinado bem.

Natureza jurídica

A natureza jurídica de direito real desses institutos, decorre do fato de que recaem
diretamente sobre a coisa, podendo o credor apreender o bem nas mãos de quem quer que o
detenha, fazendo valer o seu direito de preferência para a satisfação do crédito que possui. O
penhor, a hipoteca e a anticrese são direitos reais acessórios, porquanto tem por finalidade garantir
o pagamento da dívida, assim, existem enquanto esta existir.
Esses direitos reais são indivisíveis, tendo em vista que o pagamento de parte da dívida
não importa exoneração correspondente da garantia, ainda que esta compreenda vários bens,
continuando a assegurar o pagamento do saldo remanescente (Código Civil, art. 758).
Nesse sentido, Silvio Rodrigues85 exemplifica as seguintes hipóteses:
a) Se um condômino no imóvel hipotecado paga sua parte no débito, não obstante, todo o
imóvel continua gravado pelo ônus real;
b) Se o imóvel garante dois créditos hipotecados e um é anulado, a garantia
correspondente ao outro continua a incidir sobre todo o prédio;
c) Se partilhado o crédito entre os herdeiros do credor, qualquer deles, para cobrar o seu
quinhão, pode penhorar o imóvel hipotecado em sua integralidade.
Em relação aos sucessores do devedor, o Código Civil no art. 766 e parágrafo único,
estabelecem que para liberar o bem do ônus real, qualquer dos herdeiros deve pagar a totalidade do
débito, sub-rogando-se nos direitos do credor pelas cotas que houver satisfeito.

Requisitos de validade para constituir a garantia

Tendo em vista que no penhor ou hipoteca há um início de alienação, já que o credor


poderá vender judicialmente o bem gravado pela garantia, o Código Civil no art. 756 exige que só
aquele que pode alienar é que poderá constituir o ônus real e só as coisas que se podem alienar
poderão ser dadas em penhor, anticrese ou hipoteca.
Desse modo, é necessária a outorga uxória qualquer que seja o regime de bens e
autorização judicial para os bens pertencentes aos incapazes86.
Quanto a constituição de hipoteca de ascendente para descendente, Silvio Rodrigues87
entende que é válida, ao argumento de que a regra do art. 1.13288 do Código Civil não deve ser
estendida aos direitos reais de garantia.

84
Como por exemplo os créditos trabalhistas e tributário.
85
Ob. cit. p. 320.
86
PEREIRA, Caio. Ob. cit. p. 222-223, defende a idéia de que os bens pertencentes a curatelados não podem ser
hipotecados.
87
Ob. cit. p. 325.
88
Art. 1132. Os ascendentes não podem vender aos descendentes, sem que os outros descendentes
expressamente consintam.
28

Em relação ao condomínio, o Código Civil no art. 757 prescreve que a constituição do


direito real de garantia pode ocorrer sobre a coisa comum segundo três condições:

a) se todos os condôminos consentirem;


b) se for divisível a coisa, cada condômino pode gravar a sua parte;
c) se a coisa for indivisível, não é admitida a constituição.

Com referência a proibição de gravar a coisa comum indivisível, Silvio Rodrigues89 afirma
que não há razão alguma para essa restrição e que essa regra entra em conflito com o art. 623,
apesar de aquele estar coerente com o art. 1.139, ambos do Código Civil90.

Requisitos para validade contra terceiros

Para que estes direitos valham contra terceiros é necessário a especialização e a


publicidade91.
A especialização é a enumeração permenorizada dos caracteres estabelecidos no art. 761
do Código Civil, devendo constar do contrato constitutivo de penhor, hipoteca e anticrese, o valor
total da dívida ou sua estimação, o prazo fixado para pagamento, a taxa de juros, se houver, e a
coisa dada em garantia com as suas especificações.
Silvio Rodrigues sinala que a finalidade da especialização é a de

“caracterizar a posição do devedor, colocando terceiros, porventura


interessados em com ele negociar, ao corrente de sua situação
econômica. Com efeito, se no contrato figura o montante da
responsabilidade do devedor, e se nele se declaram quais os bens
destinados preferencialmente ao resgate daquele débito, quem quer que
tome conhecimento do conteúdo dessa convenção não pode se queixar
quando tais bens ficarem excluídos da execução, promovida pelos
quirografários” 92.

A publicidade consiste no registro do contrato constitutivo do direito real de garantia e na


tradição, na hipótese de bem móvel. Com efeito, a hipoteca e a anticrese se constituem por ato entre
vivos com a inscrição no Registro de Imóveis e o penhor, além da tradição, necessita da transcrição

89
Ob. cit. p. 323.
90
Art. 623. Na propriedade em comum, co-propriedade, ou condomínio, cada condômino ou consorte pode:
(...)
III - alhear a respectiva parte indivisa, ou gravá-la.
Art. 1139. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a
quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda poderá, depositando o preço,
haver para si a parte vendida a estranho, se o requerer no prazo de 6 (seis) meses.
Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de
benfeitorias, o de quinhão maior. Se os quinhões forem iguais haverão a parte vendida os co-proprietários, que a
quiserem, depositando previamente o preço.
91
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 321.
92
idem, ibidem.
29

do contrato no Registro de Títulos e Documentos, conforme o art. 135 do Código Civil e art. 127,
II, da Lei nº 6.015/1973 - dos Registros Públicos.
A ausência do requisito da especialização ou da publicidade não gera o direito real, apenas
vincula as partes contratantes e configura situação de direito pessoal, situação em que o credor se
torna quirografário.

Vencimento antecipado da dívida

A fim de diminuir o risco de o devedor não pagar a obrigação e ao mesmo tempo de


reforçar a garantia do credor, o art. 762 do Código Civil prevê as hipóteses de vencimento
antecipado da dívida, possibilitando a tempestiva execução da garantia. São elas:
I- se, deteriorando-se, ou depreciando-se a coisa dada em segurança, desfalcar a
garantia, e o devedor, intimado, a não reforçar. Em virtude de deterioração ou depreciação a
coisa se torna insuficiente para garantir o pagamento da dívida. Incumbe ao credor a prova desse
fato.
II- se o devedor cair em insolvência, ou falir
III- se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se
achar estipulado o pagamento. “O legislador presume que a impontualidade do devedor encobre
sua insolvência; de modo que, ocorrendo aquela, considera vencida a dívida”93. Também a falta de
pagamento dos juros se enquadra nessa hipótese. Contudo, consta ainda do dispositivo que
aceitando o credor o pagamento da prestação atrasada, renuncia ao direito de execução imediata.
IV- se perecer o objeto dado em garantia. Perece o direito, perecendo o seu objeto
(Código Civil, art. 77). Não obstante, pode o devedor evitar o vencimento antecipado oferecendo
garantia real adequada, que sendo recusada pelo credor, importa em abuso de direito94.
V- se for desapropriada a coisa dada em garantia.

Pacto comissório

É a autorização para que o credor da dívida garantida por penhor, hipoteca ou anticrese,
fique com o objeto da garantia se a dívida não for paga no vencimento. Em que pese a existência
dessa cláusula no contrato e a ciência do devedor a seu respeito, é ela nula e de nenhum efeito,
consoante o art. 765 do Código Civil.

3.1 - PENHOR

3.1.1 - Generalidades

93
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 326.
94
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 327.
30

Partindo da disposição do art. 768 do Código Civil, Silvio Rodrigues define penhor como
“o direito real que submete uma coisa móvel ou mobilizável ao pagamento de uma dívida”95.
Sendo o penhor um dos direitos reais de garantia, a sua finalidade coincide com a
daqueles, ou seja, assegurar o cumprimento de uma obrigação, pois não sendo a mesma paga em
seu vencimento, pode o credor proceder à execução, fazendo recair a penhora sobre a coisa dada
em garantia. Realizada a venda do bem em hasta pública, o produto alcançado será destinado,
preferencialmente, ao pagamento da obrigação garantida, enquanto que os demais credores
quirografários só concorrerão às sobras, se houverem.
Estabelecida a relação jurídica de penhor, surge de um lado o credor pignoratício e de
outro o devedor pignoratício, que pode ser o próprio sujeito passivo da obrigação principal ou
terceiro que tenha oferecido a garantia.
Possui como elementos característicos:
a) natureza real. Pois estabelecido por contrato o penhor e efetuada a transcrição do
instrumento no Registro de Títulos e Documentos, nasce em favor do credor um direito real que se
prende à coisa, que a vincula ao resgate da dívida e a segue nas mãos de quem quer que a detenha.

b) caráter acessório. Já que tem por finalidade garantir o pagamento de uma dívida. Assim,
se a obrigação principal for nula ou vier a extinguir-se também o penhor será nulo ou se extinguirá.
Consoante o art. 772 do Código Civil, paga a dívida deve o credor devolver a coisa empenhada,
porém, terá o direito de retê-la até que sejam indenizadas as despesas devidamente justificadas que
o credor houver realizado com a coisa ou até ser satisfeito do prejuízo que houver sofrido por vício
da coisa empenhada (art. 773, Código Civil).
c) a tradição. O contrato de penhor depende para seu aperfeiçoamento da entrega efetiva
do objeto ao credor (art. 768 do Código Civil). Contudo, essa exigência não é absoluta, pois
conforme o art. 769 do mesmo código, o penhor agrícola ou pecuário está dispensado da posse do
bem pelo credor, continuando ele em poder do devedor.
Esclarece Silvio Rodrigues96 que esse requisito tinha por escopo dar publicidade ao
negócio realizado, condição que hoje se alcança pela transcrição do título no Registro de Títulos e
Documentos. Não obstante, a transferência dificulta ou impossibilita a alienação fraudulenta do
objeto da garantia.
Realizada a entrega da coisa ao credor, ele se torna depositário do bem dado em garantia,
devendo cumprir todas as obrigações de depositário (art. 774 do Código Civil). Assistindo-lhe,
porém, o direito de reter a coisa para se cobrar das despesas efetuadas na sua guarda (segunda
parte do art. 772 do Código Civil).
d) bens móveis. Em regra o penhor recai sobre coisas móveis, todavia, existem penhores
especiais que incidem sobre bens imóveis, como o penhor rural e o industrial, e outros que incidem
sobre direitos.
e) alienabilidade da coisa. Requer que o bem empenhado seja de propriedade do devedor
ou do terceiro garante, já que não sendo pago o débito o credor realizará a venda judicial do bem.
f) indivisibilidade. O penhor é um direito real uno e indivisível, ainda que a obrigação
garantida ou a coisa onerada seja divisível. Enquanto o débito não for totalmente pago, o ônus real
sobre o bem permanece em sua integralidade.

95
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 331.
96
Ob. cit. p. 333.
31

Formalidade

O contrato de penhor se última por instrumento público ou particular. Se realizado


mediante instrumento particular, será firmado pelas partes e deverá ser elaborado em duas vias,
ficando um exemplar com cada um dos contratantes, que poderá levá-lo à transcrição (Código Civil,
art.771).
Segundo Silvio Rodrigues cada uma das partes deve guardar uma via do contrato por
questão probatória, pois assim o credor poderá exigir o pagamento do crédito e o devedor poderá
exigir a devolução da coisa. “Só pela exibição do instrumento de contrato pode o devedor
comprovar que o objeto, que o credor retém, foi-lhe entregue apenas a título de garantia” 97.
A eficácia desse contrato entre as partes, depende da determinação precisa do valor do
débito e a discriminação do objeto empenhado (art. 770 do Código Civil). Já para valer contra
terceiros, o contrato deve declarar98 o total da dívida, ou sua estimação, o prazo fixado para
pagamento, a taxa de juros, se houver, a coisa dada em garantia, com as suas especificações e deve
ser transcrito no Registro de Títulos e Documentos.

3.1.2 - Espécies de penhor

Esse direito real de garantia pode ser dividido em:


a) penhor comum99, que segundo Orlando Gomes100 é “constituído pela tradição efetiva
que ao credor faz o devedor, ou algém por ele, de um objeto móvel suscetível de alienação, para
segurança do direito daquele”, cuja modalidade é a que está sendo estudada nesse tópico sobre o
título penhor.
b) e penhor especial, que se subdivide em penhor legal, penhor rural e caução de títulos de
crédito. Conquanto essas modalidades possuam as próprias peculiaridades diferenciando-se do
penhor comum, aproveitam-lhe as principais regras no que a lei expressamente não as afastar.
3.1.3 - Penhor legal

O penhor legal decorre da lei, diferentemente do penhor convencional que se constitui


mediante contrato. Não há a necessidade de uma convenção para a sua constituição, surgindo única
e exclusivamente da vontade do legislador.
Pode ser definido como a “garantia instituída pela lei para assegurar o pagamento de
certas dívidas, que, por sua natureza, reclamam tratamento especial” 101.
Silvio Rodrigues102 ensina que o legislador visou com esse tipo de penhor dois objetivos: o
de proteger diretamente o interesse do credor, assegurando-lhe o recebimento de certas dívidas e,
indiretamente, a preservação do interesse social.

97
Ob. cit. p. 334.
98
Requisitos previstos no art. 761 do Código Civil.
99
Também conhecido por convencional ou tradicional.
100
Ob. cit. p. 362.
101
MONTEIRO, Washington. Curso de direito civil. p. 344.
102
Ob. cit. p. 339.
32

O credor pignoratício se transforma em titular de um direito real de garantia, com todas as


prerrogativas que este direito real possui, quais sejam, a seqüela, a preferência e a ação real
exercitável erga omnes.
As pessoas que podem ser credores pignoratícios, independentemente de convenção, são
as relacionadas no art. 776 do Código Civil. No entanto, leis posteriores coferiram esse direito a
outros credores, como se verá adiante.

Assim, são credores pignoratícios:

a) os hospedeiros, estalajadeiros ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as


bagagens, móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo
nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que ai tiverem feito
(art. 776, inciso I, do Código Civil);
A intenção do legislador foi a de proteger os fornecedores de hospedagem e alimento, que
têm a peculiaridade de tratar com pessoas absolutamente desconhecidas, de permanência transitória
e aparentemente sem condições de oferecerem nenhuma garantia, salvo os bens e valores que
consigo possuem, garantindo-se a esses proprietários o direito de apreenderem103 os pertences dos
seus clientes para o eventual resgate de seus créditos, desde que evidentemente homologado o
penhor via judicial em ato subseqüente104.
Homologado o penhor, tem o credor o prazo de 6 (seis) meses para efetuar a cobrança
executiva da dívida, sob pena de prescrição da ação, conforme o art. 178, § 5º, V, do Código
Civil, resultando ainda a perda da garantia pignoratícia.
Reforçando essa proteção o Código Penal, em seu artigo 176, estabelece uma pena de
detenção de quinze dias a dois meses, àquele que tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel
ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento.

b) o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou


inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos alugueres ou rendas (art. 776, inciso II, do
Código Civil);
Além dessa proteção, o art. 1.566, V, do Código Civil confere ao credor de aluguéis
privilégio especial sobre as alfaias e utensílios de uso doméstico, nos prédios rústicos e urbanos,
quanto às prestações do ano corrente e do anterior.
Washington de Barros Monteiro105 esclarece que não recebendo o locador o aluguel, tem
ele direito de apreender os bens móveis que guarnecem o prédio locado, salvo se forem
impenhoráveis ou pertencerem a terceiros. Não obstante, tratando-se de prédio urbano o penhor
legal abrangerá a mobília do inquilino e demais bens móveis que forem encontrados no interior do
imóvel. Sendo prédio rústico o penhor legal recairá sobre a mobília, animais de custeio, sementes,
frutas colhidas, madeiras cortadas, instrumentos agrícolas etc.

c) Além das duas hipóteses explicitadas, o art. 31 da Lei nº 6.533/1978, prevê a


possibilidade de os artistas e auxiliares apreenderem o material cênico da empresa teatral pela
importância de seus salários e despesas de transporte.

103
Segundo Silvio Rodrigues, ob. cit. p. 343, a apreensão violenta não defere penhor legal, porque o direito não se
compadece com a violência.
104
Caio Mário, ob. cit. p. 239; Silvio Rodrigues, ob. cit. p. 340; W. Barros Monteiro, ob. cit. p. 345.
105
Ob. cit. p. 346.
33

d) Outrossim, o Decreto-Lei nº 4.191/1942 ao dispor “que o penhor industrial não tem


preferência sobre o penhor legal do locador do imóvel, reconheceu competir a este tal garantia,
sobre as máquinas e aparelhos utilizados na indústria, que se encontrem instalados no prédio dado
em locação”106.

Homologação do penhor legal

O penhor legal não se constitui pela apreensão da coisa. Somente após a sua homologação
é que surge o direito real de garantia. Com efeito, enquanto não ocorrer a homologação, o credor é
apenas detentor dos bens apreendidos do devedor.
Para requerer a homologação do penhor legal, o credor protocolizará petição instruída
com a conta pormenorizada das despesas, a tabela dos preços e a relação dos objetos retidos.
Verificando o juiz que o requerimento está suficientemente provado, homologará imediatamente o
penhor legal (art. 874 e parágrafo único do Código de Processo Civil).
Todavia, se o juiz não homologar imediatamente o penhor, mandará citar o devedor que,
além das defesas do art. 875 do Código de Processo Civil, poderá alegar que o penhor é nulo,
porque a tabela dos preços não estava prévia e ostensivamente exposta (art. 777 do Código Civil).
Com a homologação do penhor os autos serão entregues ao credor, constituindo o
processo o título que comprova a existência da garantia real. Contudo, se não for homologado, os
bens apreendidos serão devolvidos ao devedor, porém, é assegurado ao credor o direito de cobrar
a dívida através de ação ordinária (art. 876 do Código de Processo Civil).
Quando os bens apreendidos visarem a garantia dos aluguéis ou rendas o processo será o
mesmo, mas deverá “o locador apresentar, em vez da conta de despesas, a prova de sua
propriedade; o juiz deverá, sempre, ouvir o locatário; pois este pode não apenas alegar a
inexistência de locação, como o pagamento da dívida, fatos esses capazes de excluir a ação”107.
“Se o credor deixar de requerer a referida homologação, nos termos da lei civil, cometerá
esbulho, desde que não devolva o bem que apreendeu” 108.
É oportuno esclarecer que o penhor legal não se confunde com o direito de retenção,
diferenciando-se pelas seguintes razões109:
Penhor legal Direito de retenção
- o credor toma posse do bem que se - o bem já se acha em poder do credor;
encontra em poder do devedor;
- para ter eficácia tem que ser homologado - não necessita dessa homologação;
pelo Judiciário;
- após a homologação o bem é vendido - é meio de defesa, não assistindo ao credor
judicialmente; o direito de proceder a venda do bem retido;
- é conferido somente às pessoas - é conferido a qualquer credor que tenha
mencionadas em lei; crédito conexo à guarda do bem.

106
RORDRIGUES, S. Ob. cit. p. 341.
107
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 342.
108
DINIZ, Maria H. Curso de direito civil brasileiro. p. 416.
109
MONTEIRO, W. Ob. cit. p. 347.
34

Do exposto, constata-se que o penhor legal é um meio direto de defesa conferido ao


credor para a satisfação do seu crédito, mediante a apreensão dos bens pertencentes ao devedor,
cuja homologação judicial depende da ocorrência e comprovação das condições em lei previstas.

3.1.4 - Penhor rural

Sob essa denominação serão estudados o penhor agrícola e pecuário. Nesse sentido,
embora o Código Civil tenha disciplinado essas espécies de penhor nos arts. 781 a 788, alerta Silvio
Rodrigues110 que a Lei nº 492/1937 refundiu essa matéria, disciplinando-a como penhor rural sendo
posteriormente complementada pelo Decreto-lei nº 167/1967.
Dispõe o art. 1º da Lei nº 492/1937 que “constitui-se o penhor rural pelo vínculo real
resultante do registro, por via do qual agricultores ou criadores sujeitam suas culturas ou animais ao
cumprimento de obrigações, ficando como depositários daquelas ou destes”.
Assim, consoante o disposto nesse artigo é possível verificar que essa espécie de penhor
possui peculiaridades que o diferenciam do penhor comum.
De fato, no penhor rural foi suprimido o requisito da tradição, já que o bem não é entregue
ao credor, ao reverso, permanece sob a guarda do devedor que detém a posse direta e assume a
condição de depositário.
Em virtude da qualidade de depositário conferida ao devedor, ele deve entregar o bem
quando iniciada a excussão, sob pena de prisão, pois caracterizaria a figura do depositário infiel. De
outra parte, nesse diapasão, tem o credor o direito de verificar o estado dos bens dados em garantia
quando achar necessário.
Outra diferença concerne ao objeto dado em garantia, pois enquanto no penhor comum o
objeto é bem móvel, no penhor rural são bens imóveis, tendo em vista que essa espécie recai sobre
culturas e animais, que classificam-se como imóveis em razão do disposto nos arts. 43 a 45 do
Código Civil.
Por derradeiro, o penhor agrícola pode ser constituído sobre coisas futuras, uma vez que o
agricultor pode dar em garantia colheita em via de formação, enquanto o penhor comum exige a
entrega da coisa para se aperfeiçoar.
Constitui-se o penhor rural através de instrumento público ou particular, sem necessidade
de outorga uxória (art. 11), cuja eficácia contra terceiros depende da transcrição do título no
Registro Imobiliário da comarca em que estiverem situados os bens empenhados (art. 2º), conforme
dispõe a Lei nº 492/1937.
Pode ser constituído o segundo penhor sobre os mesmos bens já empenhados, desde que
o valor dos bens seja superior ao da dívida anterior, independentemente de consentimento do
credor. Não obstante, o primeiro credor tem prioridade de pagamento com o produto da safra que
financiou (Lei nº 492/1937, art. 4º, § 1º). No entanto, se “o primeiro contrato de penhor sofre
prorrogação por frustração parcial da colheita apenhada, o segundo conferirá as mesmas
conseqüências”111.

Penhor agrícola

110
Ob. cit. p. 345.
111
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 349.
35

a) consoante o art. 6º da Lei nº 492/1937, podem ser objeto desse penhor:

“I- colheitas pendentes ou em vias de formação, quer resultem de prévia


cultura, quer de produção espontânea do solo;
II- frutos armazenados, em ser, ou beneficiados e acondicionados para
venda;
III- madeira das matas, preparada para o corte, ou em toras, ou já
serrada e lavrada;
IV- lenha cortada ou carvão vegetal;
V- máquinas e instrumentos agrícolas”.

Sinala Silvio Rodrigues112 que em razão do disposto nesse artigo podem ser objeto de
penhor agrícola bens imóveis e móveis, pois observa que estão incluídos “bens imóveis por acessão
física, como os frutos pendentes; ao lado de bens móveis, como os frutos já separados ou a lenha
cortada; e, ainda, ao lado de imóveis por destinação do proprietário, como as máquinas e
instrumentos agrícolas”.

b) O prazo do penhor agrícola é de 3 (três) anos, prorrogável por mais três, devendo ser
mencionada no contrato a época da colheita da cultura empenhada, e, embora vencido o contrato e
a prorrogação, permanece a garantia enquanto subsistirem os bens que a constituem (arts. 61 e 79
do Decreto-Lei nº 167/1967).

c) abrangência do penhor agrícola 113.


Se a safra que garante o empréstimo não é suficiente para o pagamento da dívida, dispõe a
lei que esse penhor abrangerá a próxima safra.
Dispondo-se o credor da primeira safra a também financiar a segunda, o seu novo crédito
se incorpora ao antigo, formando um só, que será garantido pela nova safra. Contudo, se notificado,
se recusar a financiar a segunda safra, pode o devedor constituir novo penhor. Nessa hipótese, o
segundo credor terá preferência sobre o primeiro no pagamento da dívida, ficando as sobras
vinculadas ao resgate do débito anterior (Lei nº 492, art. 7º, § 1º).

Penhor pecuário

a) possui como objeto: os animais que se criam pascendo, para a indústria pastoril,
agrícola ou de laticínios, em qualquer de suas modalidades, ou de que sejam eles simples acessórios
ou pertencentes de sua exploração (art. 10 da Lei nº 492/1937).

b) o título constitutivo de penhor pecuário deve, sob pena de nulidade, designar os animais
com a maior precisão, indicando o lugar onde se encontrem e o destino que têm, mencionando de
cada um a espécie, denominação comum ou científica, raça, grau de mestiçagem, marca, sinal,
nome, se tiver, e todos os característicos por que se identifique (art. 10 da Lei nº 492/1937). A
exigência de individuação pormenorizada dos animais é para que esse contrato tenha validade contra

112
Ob. cit. p. 350.
113
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 350.
36

terceiros, que assim poderão identificar o ônus real que recai sobre esses bens, tendo ciência das
conseqüências na hipótese de aquisição.

c) a venda de qualquer dos animais apenhados depende do consentimento por escrito do


credor. Todavia, se o devedor ameaça vender os animais, ou se por sua negligência cria risco de
prejuízo para o credor, pode este, ou exigir o pagamento imediato da dívida, ou requerer que se
depositem os animais com terceira pessoa (Lei nº 492, art. 12, § 1º).

d) ficam sub-rogados no penhor os animais da mesma espécie comprados para substituir


os que morreram e as crias dos que foram empenhados, devendo-se lavrar aditivo ao contrato para
valer contra terceiros.

Cédula rural pignoratícia

Transcrito o título constitutivo de penhor rural no Registro Imobiliário, o credor pode


requerer ao oficial do registro que lhe seja entregue uma cédula representativa do crédito, a qual
poderá ser negociada mediante endosso em preto, de modo que o endossatário exerce os direitos
do credor, e o pagamento final só valerá contra entrega da cédula (Lei nº 492/1937, arts. 15, 16 e
18).
A segurança da cédula rural pignoratícia é assegurada pela sua publicidade (já que é
averbada a expedição desse título à margem da transcrição do penhor), pelo endossante (que
responde pela legitimidade da cédula e a existência dos bens apenhados) e pela possibilidade de o
credor ou o endossatário da cédula de requererem ao juiz a remoção do objeto da garantia para o
poder do depositário, a fim de evitar que o devedor o desvie sem que lhes seja dado ciência (art.
20).

3.1.5 - Caução de títulos de crédito

Esta é outra modalidade de penhor especial, regulada pelos arts. 789 a 795 do Código
Civil, cuja garantia são títulos de crédito. Assim, de maneira diferente das espécies de penhor
anteriormente estudadas, cuja constituição recaía sobre coisas corpóreas, nesta o legislador
autorizou o penhor sobre direitos imateriais.

Com efeito, o penhor pode ser constituído sobre:


a) títulos públicos nominativos da União, dos Estados ou dos Municípios, desde que
transcrita a garantia real, ainda que os títulos não tenham sido entregues ao credor (art. 789). Silvrio
Rodrigues114 afirma que a transcrição se faz na repartição fiscal competente, onde se anota que o
título foi objeto de contrato de penhor e que está afetado, por vínculo real, ao pagamento de uma
prestação.
Assevera ainda que esse dispositivo legal não contemplou os títulos ao portador115, porque
são tratados como objetos corpóreos, em razão de constituírem “um valor objetivo, desligado da
pessoa que os recebeu em primeiro lugar”.

114
Ob. cit. p. 357.
115
A Lei nº 8.021/1994 proibiu os títulos ao portador e dispôs que todos os títulos deverão ser nominais.
37

b) títulos de crédito pessoal (art. 790 e seguintes). Explica Silvio Rodrigues116 que “não
são os papéis em si, ou seja, a coisa material, que é dada em garantia; mas, sim, o direito que tais
papéis representam. Como eles contêm um valor econômico, a lei faculta a seu titular oferecê-los em
garantia de um débito”.
Orlando Gomes117 distingue a caução de títulos de crédito do penhor de direitos,
afirmando que:
- a caução de títulos de crédito recai num crédito incorporado a um título, documento em
que se incorporam dívidas contraídas em relação jurídica de direito privado, como a letra de
câmbio e a nota promissória, assim, tendo por objeto o próprio título que documenta o direito;
- já o penhor de direitos recai num crédito ordinário pelo seu valor patrimonial, não
havendo coisa que o represente, como as ações de sociedades anônimas, em que o acionista não
possui um direito de crédito contra a sociedade.
Em que pese os argumentos de Orlando Gomes, penso que a razão está com Silvio
Rodrigues ao afirmar que essa espécie de penhor recai sobre o direito que os títulos representam.
Constitui-se a caução de títulos de crédito pela entrega do título ao credor e pela lavratura
de contrato escrito (art. 791 do Código Civil). Assim, surge a figura do credor pignoratício (aquele
que recebeu o título), o credor caucionante (aquele que entregou o título) e o devedor do título
caucionado. Com o contrato fica o credor pignoratício constituído mandatário do credor
caucionante para a cobrança do título do devedor (art. 792, III).
Ensina Silvio Rodrigues118 que realizada a caução, o título é transferido mediante endosso
ao credor pignoratício. “Esse endosso equivale à constituição de um mandato, autorizando o credor
pignoratício a receber, em nome do mandante, o título, a imputar a importância recebida na dívida,
e compensá-la com o seu crédito, devolvendo ao devedor o remanescente, se houver”.
O contrato escrito é importante para justificar a transferência do título e necessário para
demonstrar que a operação realizada é de penhor, pois se inexistente o contrato, o título endossado
poderia levar à conclusão de que a sua transferência ocorreu por cessão.
Diferem a caução e a cessão de títulos de crédito. Na cessão de crédito o devedor aliena
o título. Enquanto que na caução ele transfere a posse do documento para o credor pignoratício
cobrar o crédito, pague-se do que lhe é devido e entregue o saldo ao credor caucionante, o qual,
nessa modalidade de negócio jurídico, não perde a condição de dono do título em razão da
transferência.
A notificação do devedor do título caucionado deve ser realizada para intimá-lo do
negócio de caução realizado. A partir desse momento passa a fazer parte dessa relação jurídica,
não podendo mais pagar ao credor caucionante, mas devendo fazê-lo ao credor pignoratício. O
devedor que após a notificação ou da ciência da caução fizer o pagamento ao credor caucionante,
não poderá receber quitação do seu débito (art. 794 do Código Civil).

Silvio Rodrigues119 lista alguns direitos e obrigações do credor pignoratício, como os de:
- conservar e recuperar a posse dos títulos caucionados, por todos os meios cíveis ou
criminais, contra qualquer detentor, inclusive o próprio dono;
- agir diligentemente na cobrança dos créditos, não permitindo que por sua negligência o
direito do credor caucionante feneça, sob pena de responder pelo prejuízo a que der causa;

116
Idem. ibidem.
117
Ob. cit. p. 366-367.
118
Ob. cit. p. 358.
119
Ob. cit. p. 359.
38

- receber o montante dos títulos caucionados, devolvendo o saldo, se houver, e prestar


contas das importâncias recebidas.

3.1.6 - Extinção do penhor

O artigo 802 do Código Civil enumera os casos de extinção do penhor, a saber:

I- extinguindo-se a obrigação.
Tendo em vista que o penhor é a garantia de uma dívida, extinguindo-se esta não há mais
razão para a sua existência. Nessa circunstância o credor deverá devolver a coisa ao devedor, com
os respetivos frutos e acessórios, salvo o direito de retenção para cobrar as despesas feitas com a
coisa e os prejuízos experimentados por força de seus defeitos. Contudo, se a dívida foi
parcialmente paga, o penhor não se extingue, em razão do princípio da indivisibilidade da garantia
previsto no art. 758 do Código Civil.

II- perecendo a coisa.


Dispõe o art. 77 do Código Civil que perece o direito, perecendo o seu objeto. Portanto,
desaparecendo a coisa empenhada, desaparece o penhor. Todavia, o crédito continua existindo,
mas agora o credor perde o direito de preferência e passa a condição de quirografário. “Se a coisa
pereceu por culpa de terceiro, ou se está no seguro, o direito do credor se sub-roga na importância
da indenização. O mesmo ocorrerá em caso de desapropriação”120.

III- renunciando o credor.


É a situação em que o credor renuncia a garantia que lhe proporciona preferência no
recebimento do crédito, passando a condição de quirografário. A renúncia pode ser expressa ou
tácita. Será tácita quando consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, quando
restituir a sua posse ao devedor, ou quando anuir à sua substituição por outra garantia (art. 803 do
Código Civil).

IV- dando-se a adjudicação judicial, a remissão, ou a venda amigável do penhor, se


a permitir expressamente o contrato, ou for autorizada pelo devedor (artigo 774, III), ou
pelo credor (artigo 785).
A adjudicação judicial encontra previsão legal no art. 714 do Código de Processo Civil,
ocorrendo quando “após a avaliação e a praça, sem que se apresente lançador, o credor requer a
incorporação ao seu patrimônio do bem em causa, oferecendo preço não inferior ao que consta do
edital”121.
A remição é a situação em que o devedor122, antes de arrematado ou adjudicado o bem,
pode remir a execução pagando ou consignando a importância da dívida, mais juros, custas e
honorários advocatícios (art. 651 do Código de Processo Civil).

V- confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e dono da coisa.

120
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 337.
121
RODRIGUES, S. Idem. ibidem.
122
Alerta Silvio Rodrigues, ob. cit. p. 337, que essa legitimação é conferida ao devedor solvente e também para o
cônjuge, descendentes e ascendentes (arts. 787 e seguintes, do CPC), sendo negada ao devedor insolvente.
39

É a hipótese de confusão em que o titular do crédito é também o titular do domínio da


coisa dada em garantia. Neste caso extingue-se a garantia real, porém, a dívida não desaparece.

3.2 - ANTICRESE

3.2.1 - Generalidades

Em consonância com o disposto no art. 805 e § 1º do Código Civil, Orlando Gomes123


conceitua a anticrese como “o direito real sobre imóvel alheio, em virtude do qual o credor obtém a
posse da coisa a fim de perceber-lhe os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros e
capital”.
Na lição de Silvio Rodrigues124, essa espécie de garantia real possui duas finalidades:
1ª) a primeira de propiciar ao credor anticrético o pagamento de seu crédito através da
exploração do imóvel do devedor oferecido em garantia;
2ª) a segunda como meio compulsivo, estimulando o devedor a pagar logo a sua
obrigação a fim de obter a devolução do imóvel.
Não obstante, entende Silvio Rodrigues125 que esse instituto é obsoleto e que a sua menor
difusão decorre dos efeitos e inconvenientes que apresenta, como:
a) representar ameaça de prejuízo para o devedor e para a sociedade, em razão de o
imóvel ser entregue a pessoa que tem um interesse menor em sua produtividade.
b) constituir óbice à alienação do bem onerado, pois dificilmente alguém se interessará “em
adquirir imóvel cujo uso e gozo pertence, por prazo mais ou menos longo, ao credor do alienante”.
c) impedir o devedor de obter novos créditos garantidos pelo imóvel onerado, porque não
é possível subanticreses e porque dificilmente alguém concederá empréstimo, “recebendo como
garantia hipotecária bem que se encontra onerado com anticrese”.
Ademais, na anticrese o credor não possui preferência, nem direito a excussão do bem
dado em garantia. Portanto, em razão desses inconvenientes é melhor que o devedor garanta
determinada obrigação constituindo hipoteca sobre o imóvel.

3.2.2 - Natureza jurídica e modo de constituição

Nesse passo, importa distinguir a anticrese da hipoteca e do penhor. Diferentemente


desses dois institutos, na anticrese não existe qualquer direito à venda da coisa dada em garantia
para obter o pagamento da dívida. O direito existente é de reter para fruir os rendimentos até a
completa amortização da dívida, cujo direito se extingue decorridos 15 (quinze) anos (art. 760 do
Código Civil).
Apesar disso, a anticrese é um direito real de garantia constituído sobre bens imóveis,
conferindo ao credor anticrético o direito de seqüela e ação real.
Tem preferência o credor anticrético ao adquirente do imóvel, aos credores quirografários
e aos credores hipotecários posteriores à transcrição da anticrese (art. 808, caput, do Código
Civil). Contudo, na venda judicial do imóvel, não tem preferência no pagamento do crédito,

123
Ob. cit. p. 369.
124
Ob. cit. p. 361.
125
Ob. cit. p. 362.
40

permitindo a lei que se oponha à execução opondo o seu direito de retenção, para pagar-se com as
rendas obtidas do imóvel. Se, porém, executar o imóvel ou permitir que outro credor o execute, sem
opor o seu direito de retenção, não terá preferência sobre o preço obtido (art. 808, § 1º).
Ensina Silvio Rodrigues126 que em face do direito de retenção, tem o credor anticrético a
posse direta do imóvel, podendo defendê-la através dos interditos contra terceiros, contra o
proprietário ou contra credores quirografários e hipotecários posteriores à transcrição da anticrese,
que pretendam penhorar o objeto da garantia (art. 808).
O modo de constituição da anticrese ocorre mediante escritura pública e aperfeiçoa-se
pela entrega da coisa. Surgindo como direito real oponível erga omnes com a transcrição do título
constitutivo no Registro da circunscrição imobiliária da situação do bem dado em garantia (Lei nº
6.015/1973, art. 167, I, nº 11). Além disso, não pode ser ultimada sem a concordância do outro
cônjuge, seja qual for o regime de bens (Código Civil, arts. 235, I, e 242, I).
Aponta Silvio Rodrigues127 os efeitos da anticrese, resultantes da entrega do imóvel ao
credor anticrético, que nessa situação assume a condição de possuidor e mandatário, como:
- o dever de o credor zelar pela coisa como se fosse sua, respondendo pelas
deteriorações que por sua culpa o imóvel sofrer (art. 807 do Código Civil);
- possui o credor anticrético o direito de fruir o imóvel “diretamente ou por meio de
arrendamento feito a terceiro”;
- a exploração do imóvel “deve ser adequada, não podendo o credor, na ânsia de pagar-
se muito depressa, sacrificar a substância da coisa, para obter renda excessiva. Pois tal
procedimento seria abusivo”;
- o credor “não deve permitir que por sua negligência a renda caia abaixo do normal”;
- tem o credor a obrigação de prestar contas, a fim de possibilitar a verificação do
montante até então amortizado;
- se a data da prestação de contas não foi predeterminada, pode o devedor reclamá-la a
qualquer tempo, desde que não abuse desse direito.

A cumulação de hipoteca e anticrese é permitida (Código Civil, art. 805, § 2º).


Esclarece Silvio Rodrigues128 o dispositivo legal mencionado com a seguinte explicação:

“concedendo-se hipoteca ao credor anticrético, vinha-se acrescentar,


às suas anteriores prerrogativas, o direito de excutir a garantia e de
preferir outros credores no produto apurado em praça; concedendo-se
anticrese ao credor hipotecário, propiciava-se a este a possibilidade de
explorar a coisa, e de tentar, através da percepção dos frutos, pagar-se
de seu crédito, sem necessidade de excussão”.

3.2.3 - Extinção

Extingue-se a anticrese:
a) pelo pagamento ou prescrição da dívida, já que é um negócio acessório condicionado à
existência da obrigação principal;

126
Ob. cit. p. 363.
127
Ob. cit. p. 364.
128
Ob. cit. p. 365.
41

b) perecendo o imóvel dado em garantia. Se o imóvel for destruído ou desapropriado, o


direito do credor anticrético não se sub-roga no valor da indenização (art. 808, § 2º, do Código
Civil), extinguindo-se a anticrese.
c) pelo decurso do prazo de 15 (quinze) anos contados da data de sua transcrição (art.
760 do Código Civil).
Nas duas últimas hipóteses de extinção, a dívida continua a exisitr, mas o credor terá
apenas a condição de quirografário.

3.3 - HIPOTECA

3.3.1 - Generalidades

Silvio Rodrigues129 define hipoteca como “o direito real recainte sobre um imóvel, um
navio ou um avião, que, embora não entregues ao credor, o asseguram, preferentemente, do
cumprimento da obrigação”.
O negócio de hipoteca tem como partes o credor hipotecário (sujeito ativo da obrigação
garantida) e o devedor hipotecante (aquele que dá o bem em garantia do pagamento da dívida)130.
Transcrito o ato constitutivo de hipoteca no Registro de Imóveis da circunscrição onde se
situa a coisa dada em garantia, surge o direito real de garantia, conferindo ao seu titular
oponibilidade erga omnes, preferência e o direito de seqüela.
A hipoteca tem a finalidade de garantir o pagamento de uma obrigação, em razão disso, é
um direito acessório que se extingue com a extinção da dívida cujo pagamento visa assegurar.
É indivisível a hipoteca, pois ainda que uma parte da dívida seja paga, continua a existir a
garantia real sobre a coisa inteira (art. 758 do Código Civil).

Princípios que regem a hipoteca

Ensina Silvio Rodrigues131 que o regime hipotecário é regido pelos princípios da


especialização e da publicidade.
“A especialização consiste na determinação precisa e pormenorizada dos bens dados em
garantia, com sua descrição, localização etc., bem como do montante da dívida, prazo, taxa de
juros, se houver” (arts. 761 e 846 do Código Civil). Através do cumprimento dessa exigência,
terceiro pode avaliar o ônus que incide sobre o bem dado em garantia e a situação patrimonial dos
contratantes. Faltando a especialização é ineficaz a hipoteca em relação a terceiros.
“A publicidade se faz através da inscrição. Pois a inscrição dá ciência a todos de que
aquele bem determinado está sujeito ao ônus hipotecário”. Além disso, a inscrição também dá
surgimento ao direito real (art. 848 do Código Civil).

Pluralidade de hipotecas

129
Ob. cit. p. 368.
130
GOMES, O. Ob. cit. p. 375.
131
Ob. cit. pp. 373-374.
42

O art. 812 do Código Civil permite que o proprietário do imóvel hipotecado constitua
sobre ele, outra hipoteca em favor do mesmo credor ou a outro, mediante novo título.
Para a constituição de sub-hipotecas é necessário que o valor do bem onerado exceda o
valor da dívida garantida e que o credor sub-hipotecário concorde com a constituição da nova
hipoteca, após verificar que o saldo apurado é suficiente para pagar novos débitos.
É pertinente esclarecer que o direito do primeiro credor não será prejudicado com o novo
gravame, conservando a preferência no pagamento do seu crédito. A preferência entre os credores
hipotecários é determinada conforme a ordem de inscrição dos títulos constitutivos no Registro de
Imóveis (arts. 759, caput e 833 do Código Civil).
Com efeito, ainda que ocorra o vencimento da sub-hipoteca não pode o credor executar o
bem dado em garantia antes que vença a primeira hipoteca. Se ocorrer o vencimento de ambas as
hipotecas e executado o bem dado em garantia, primeiro é pago o crédito do credor primitivo e
após pagam-se os demais credores hipotecários segundo a ordem de inscrição das hipotecas.
Pode o sub-hipotecário remir a primeira hipoteca quando tiver ocorrido o seu vencimento,
pagando a importância correspondente ao crédito e mais despesas judiciais, se estiver sendo
promovida a execução do bem dado em garantia. Com isso ele ficará sub-rogado nos direitos da
hipoteca anterior (Código Civil, arts. 814 e 985, I).
Por oportuno, dispõe o art. 826 do Código Civil que não será válida a venda judicial de
coisa dada em hipoteca sem que todos os credores hipotecários tenham sido notificados
judicialmente da execução promovida.

Objeto da hipoteca

Estabelece o art. 810 do Código Civil que podem ser objeto de hipoteca os imóveis, seus
acessórios conjuntamente com eles, o domínio direto e o útil, as estradas de ferro, as minas e
pedreiras, independentemente do solo onde se acham e os navios, ainda que em construção (art.
825 do Código Civil).
As aeronaves também fazem parte desse elenco, consoante estabelecido no Código
Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986).
A hipoteca em regra recai sobre bens imóveis, à exceção referente aos navios e aeronaves,
que segundo Silvio Rodrigues132 “se justifica no fato de que, sendo suscetíveis de identificação e
individuação, e tendo registro peculiar, podem ser especializados e inscritos”.
Outrossim, as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel são abrangidos pela
hipoteca (art. 811 do Código Civil).

3.3.2 - Espécies de hipoteca

As espécies133 de hipoteca dividem-se: conforme a causa determinante e o objeto sobre


que recaem.
Quanto a causa, classificam-se em convencional (se origina do contrato), legal (emana da
lei) e judicial (decorre da sentença);

132
Ob. cit. p. 376.
133
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 371.
43

Quanto ao objeto, classificam-se em comum (recai sobre imóveis) e especial (a que incide
sobre navios, aeronaves e vias férreas).

Hipoteca convencional

É aquela que resulta do acordo de vontade das partes mediante contrato, em que o
devedor ou alguém por ele, oferece bens em garantia do pagamento da dívida. Com a formalização
do contrato há um direito pessoal entre as partes e com o registro da hipoteca surge o direito real.
A hipoteca convencional se constituti através de escritura pública, quando o valor do bem
onerado for superior ao fixado pelo art. 134, II, do Código Civil, sendo que o devedor necessita da
autorização do cônjuge para constituir a hipoteca.

Hipoteca legal

É aquela “imposta por lei, em garantia de algumas pessoas, que se encontram em


determinadas situações e que, ao ver do legislador, merecem ser protegidas”134.
Também nessa modalidade, a sua constituição só adquirirá eficácia contra terceiros
proporcionando o surgimento do direito real, com a sua especialização e inscrição no Registro de
Imóveis (art. 828 do Código Civil).
Leciona Silvio Rodrigues135 que em regra, a hipoteca legal é “uma garantia que a lei
oferece a quem tem bens administrados por outrem, sobre bens do administrador, para assegurar a
boa administração e a devolução dos mesmos, finda a administração”.
Sem olvidar de outras hipóteses em que a legislação extravagante confere a hipoteca legal,
dentre as relacionadas pelo art. 827 do Código Civil, pode-se destacar as seguintes explicadas por
Silvio Rodrigues136:

a) aos descendentes, sobre os imóveis do ascendente, que lhes administra os bens.

Como o usufruto dos bens dos filhos é inerente ao exercício do pátrio poder (art. 389 do
Código Civil), é constituída hipoteca legal sobre os bens dos pais para proporcionar aos filhos
garantia contra prejuízos patrimoniais decorrentes da administração de seus bens, pela perda ou
deterioração derivados de dolo ou culpa.

b) as pessoas que não tenham a administração de seus bens, sobre os imóveis de seus
tutores ou curadores.

Tanto nesta hipótese como na anterior, visa a lei complementar a proteção conferida aos
incapazes, assegurando-lhes a constituição de hipoteca legal sobre os bens daqueles que lhes
administram o patrimônio.

134
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 382.
135
Ob. cit. p. 383.
136
Ob. cit. pp. 384-385.
44

c) ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente, para


satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das custas.

Conforme o art. 134 do Código de Processo Penal, existindo certeza da infração e


indícios suficientes da autoria, pode o ofendido requerer em qualquer fase do processo a
constituição de hipoteca legal sobre os imóveis do indiciado.

Hipoteca judicial

Em consonância com o objetivo de as decisões judiciais alcançarem efetividade, ou seja,


satisfazendo o direito pleiteado, a lei confere ao beneficiário de sentenças condenatórias o direito de
constituir hipoteca sobre os bens da parte vencida (art. 824 do Código Civil).
Importa ressaltar que sendo a hipoteca um direito acessório, cuja finalidade é assegurar o
cumprimento de uma obrigação, só surgirá de sentenças condenatórias que imponham uma
prestação ao vencido. “Assim, as sentenças declaratórias, ou as sentenças sem conteúdo
patrimonial, não fazem surgir hipoteca judiciária”137.
Transitando em julgado a sentença condenatória, “surge de pleno direito, como relação
entre os litigantes independente de acordo entre eles”138.
A hipoteca judicial apresenta uma peculiaridade em relação as demais espécies, pois
estabelece o legislador que nessa modalidade o credor não possui direito de preferência,
concedendo-lhe, porém, o direito de seqüela e de oponibilidade contra todos (art. 824 do Código
Civil).

Hipoteca de vias férreas

Diferente das outras espécies, ensina Silvio Rodrigues139 que essa hipoteca não recai sobre
um determinado bem, mas sobre uma universalidade, composta de bens móveis e imóveis, tais como
“o solo onde assentam os trilhos, a zona marginal, as edificações destinadas à administração, as
estações, o material rodante e a ferramentaria”.
Apesar de a ferrovia se espalhar por diversas circunscrições, não há necessidade de se
fazer a inscrição em cada uma, dispondo o art. 852 do Código Civil que bastará a inscrição
hipotecária no Município da estação inicial da respectiva linha.
Tem direito o credor hipotecário de se opor à alienação da via férrea ou de parte
considerável do material de exploração, bem como à fusão com outra empresa, se tais negociações
importarem diminuição da garantia do seu crédito (art. 854, segunda parte, do Código Civil).
Sendo executada essa hipoteca e procedendo a venda judicial da via férrea, deverá ser
intimado o representante da Fazenda Nacional ou do Estado Federado para exercer o direito de
preferência na aquisição desse bem, se quiser, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação
(art. 855 do Código Civil).

3.3.3 - Efeitos da hipoteca

137
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 388.
138
RODRIGUES, S. Ob. cit. p. 386.
139
Ob. cit. p. 388.
45

Aponta e explica Silvio Rodrigues140 os efeitos da hipoteca em relação ao devedor, ao


credor hipotecário e a terceiros.
a) em relação ao devedor. Existem dois momentos a serem considerados:
a.1) antes de proposta a ação executiva. Nessa fase o devedor pode exercitar todos os
direitos sobre a coisa, desde que não pratique atos que possam desvalorizá-la, deteriorá-la ou
destruí-la; e
a.2) depois de proposta a ação executiva. Momento em que o devedor perde a posse
da coisa dada em garantia e, por conseqüência, o direito de aliená-la e de receber os frutos,
presumindo-se em fraude à execução qualquer ato nesse sentido.

b) em relação ao credor hipotecário. Possui ele o direito de vencida e não paga a dívida,
promover a execução e conseqüente venda judicial do bem dado em garantia. Tendo preferência 141
na satisfação do seu crédito.

c) em relação a terceiros. Constituída a hipoteca e inscrita no Registro de Imóveis, nasce o


direito real oponível contra todos, não podendo terceiro-adquirente de imóvel hipotecado impedir
que o credor hipotecário promova a execução, alegando desconhecimento do gravame existente
sobre a coisa.

3.3.4 - Inscrição da hipoteca

Para o surgimento do direito real é exigência da lei a inscrição da hipoteca no Registro de


Imóveis da circunscrição onde se situar o bem dado em garantia (Código Civil, art. 831 e Lei nº
6.015/1973, arts. 167, I, nº 2, e 238). A inscrição possui dupla finalidade: uma de dar publicidade
do negócio e outra de fixar a data do nascimento do direito real.
Com efeito, determina o art. 831 do Código Civil a inscrição da hipoteca no registro do
lugar do imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um imóvel. Através da
publicidade terceiros estranhos ao negócio de hipoteca poderão verificar a existência do ônus real
sobre o bem dado em garantia.
Adverte Silvio Rodrigues142 que ocorrendo o desmembramento da circunscrição
imobiliária, deve-se proceder o registro da hipoteca na nova circunscrição formada, a fim de
proporcionar segurança ao regime hipotecário.
Outrossim, o registro da hipoteca fixa a data de surgimento do direito real (art. 848 do
Código Civil), sendo oponível contra todos e conferindo ao credor hipotecário ação real e
preferência. Além disso, se as partes contratantes não estipularam prazo para a sua duração, fixa o
seu termo final, uma vez que o art. 817 do Código Civil dispõe que o período máximo é de 20
anos143. Podendo ser renovada a hipoteca mediante a constituição de novo título e novo registro.
Havendo mais de uma hipoteca sobre o mesmo bem dado em garantia, a que for
registrada em primeiro lugar conferirá ao credor preferência na satisfação do seu crédito sobre o

140
Ob. cit. pp. 376-377.
141
Não obstante essa preferência, a Lei de Falências e o Código Tributário Nacional, estabelecem que possuem
preferência a qualquer credor, os créditos de indenização por acidente do trabalho, por salários, tributários,
parafiscais, por encargos e por dívidas da massa.
142
Ob. cit. p. 378.
143
Consoante dispõe a Lei nº 2.437, de 07 de março de 1955.
46

credor da segunda hipoteca registrada e assim sucessivamanete (art. 833 e parágrafo único do
Código Civil).
Se duas hipotecas forem apresentadas para registro no mesmo dia, terá prioridade no
Registro Imobiliário aquela protocolizada em primeiro lugar, protelando-se o registro da outra
hipoteca para o dia seguinte (Código Civil, art. 836 e Lei dos Registros Públicos nº 6.015/9173,
art. 191).
Sendo apresentada para registro a segunda hipoteca sem ter sido registrada a primeira, o
oficial do registro sobrestará a inscrição da segunda hipoteca pelo prazo de 30 (trinta) dias,
aguardando que o interessado promova a inscrição da primeira hipoteca. Esgotado o prazo, a
segunda hipoteca será inscrita e terá preferência sobre a primeira (Código Civil, art. 837 e Lei dos
Registros Públicos nº 6.015/9173, art. 189).

3.3.5 - Remição da hipoteca

A remição da hipoteca consiste em liberar o bem do vínculo que o prende ao pagamento


da dívida, pagando-se ao credor o valor desta ou do bem dado em garantia.

Explica Silvio Rodrigues144 que tem direito de remir a hipoteca:


a) o devedor, sendo-lhe permitido a remição da hipoteca desde que o faça depois de
realizada a primeira praça e antes da assinatura do auto de arrematação (art. 818, segunda parte, do
Código Civil).

b) o credor da segunda hipoteca que, verificando não obter a venda judicial do bem dado
em garantia valor suficiente para o pagamento da primeira e segunda hipoteca, assim, convindo-lhe
aguardar momento oporturno para realizar o leilão, pode remir a primeira hipoteca pagando o valor
referente à dívida e custas judiciais, com isso, sub-rogando-se nos direitos do primeiro credor (art.
814 do Código Civil).

c) o adquirente do imóvel hipotecado. Como o credor hipotecário possui o direito de


seqüela, indo buscar o bem nas mãos de quem quer que se encontre, convém ao adquirente que
proceda a remição do bem hipotecado. Para tanto, deverá notificar judicialmente o credor
hipotecário nos 30 (trinta) dias seguintes à transcrição do seu contrato, propondo o pagamento da
dívida, no mínimo, pelo preço que adquiriu o imóvel (Código Civil, art. 815 e § 1º).
Contudo, pode o credor recusar a oferta e requerer que o imóvel seja licitado, podendo
participar os credores hipotecários, fiadores e o adquirente, arrematando aquele que oferecer o
maior lance (Código Civil, § 2º do art. 815, e art. 816, caput).

3.3.6 - Extinção da hipoteca

Segundo o art. 814 do Código Civil a hipoteca se extingue:

I - pelo desaparecimento da obrigação principal.

144
Ob. cit. p. 389.
47

Sendo paga a dívida ou perdoada desaparece a hipoteca, já que esta é uma obrigação
acessória. Todavia, desaparecendo a hipoteca não desaparece a obrigação principal.

II - pela destruição da coisa ou resolução do domínio.


A primeira parte está em consonância com o art. 77 do Código Civil, que dispõe perecer
o direito, perecendo o seu objeto. A segunda parte refere-se a hipótese em que o devedor perde a
propriedade do imóvel, assim, a hipoteca perde o objeto sobre que recaía.

III - pela renúncia do credor.


Não necessita de consentimento do devedor. Pode ser da dívida extinguindo-se a hipoteca
porque é uma obrigação acessória, ou da hipoteca, nessa situação, subsiste a dívida e o credor
perde a garantia real, tornando-se quirografário. A hipoteca legal é irrenunciável por envolver
interesse de ordem pública.

IV - pela remição.

V - pela sentença passada em julgado.


Que a declara nula ou a rescinde (Código Civil, art. 847).

VI - pela prescrição.
O que prescreve é a dívida e a hipoteca extingue-se por ser uma obrigação acessória.
Dispõe o art. 177 do Código Civil, que as ações reais prescrevem em 10 (dez) anos entre presentes
e em 15 (quinze) anos entre ausentes.

VII - pela arrematação ou adjudicação.


São situações em que o devedor perde a propriedade do bem arrematado ou adjudicado
em processo de execução. Para cuja validade impõe-se a notificação judicial dos demais credores
hipotecários (art. 826 do Código Civil).
Por derradeiro, para a extinção da hipoteca valer contra terceiros deve ser averbada no
respectivo Registro Imobiliário (art. 850 do Código Civil).

3.4 - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA

Justificativa

Embora esse trabalho tenha por escopo os direitos reais sobre coisas alheias e a alienação
fiduciária em garantia seja na verdade um direito real sobre coisa própria, será ela contemplada
nesse estudo em razão da sua importância econômica e porque não deixa de ser um direito real de
garantia, tendo em vista que averbado o contrato no competente registro, a coisa é afetada
preferentemente ao pagamento da dívida.
48

3.4.1 - Generalidades

A Lei Federal nº 4.728, de 14 de julho de 1965, que disciplina o mercado de capitais e


estabelece medidas para o seu desenvolvimento, através do art. 66, introduziu no ordenamento
jurídico nacional a alienação fiduciária em garantia. Posteriormente o Decreto-Lei nº 911, de 1º de
outrubro de 1969, deu nova redação a esse artigo, acrescentando normas de processo.
Mais tarde, as Leis nºs 6.071/1974 e 9.514, de 20 de novembro de 1997 (arts. 22 a 33)
introduziram outras modificações, esclarecendo questões referentes aos sujeitos e ao objeto desse
negócio jurídico.
Prescreve o art. 66 da Lei Federal nº 4.728/1965 que:
“A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio
resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independetemente
da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em
possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e
encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal”.

Constituída a alienação fiduciária surge de um lado:


a) o fiduciário, que é o credor da dívida e o adquirente do bem, detendo o domínio e a
posse indireta; e
b) o fiduciante, que é o devedor da dívida e o alienante do bem, detendo a posse direta.
Realiza-se esse negócio jurídico obrigatoriamente por escrito, através de instrumento
público ou particular, transferindo o fiduciante a propriedade e a posse indireta ao fiduciário, de uma
coisa dada em garantia do pagamento de uma dívida, cujo adimplemento da obrigação contraída
pelo fiduciante, permite-lhe readquirir a propriedade da coisa.
Por isso que o fiduciário detém a propriedade resolúvel da coisa dada em garantia, pois
tendo o fiduciante pago a dívida, ele readquire a propriedade e cessa o domínio do fiduciário sobre
a coisa.
Não sendo paga a dívida pode o fiduciário proceder a venda do bem para com o preço
obtido pagar o seu crédito. Se, contudo, a importância obtida não bastar para o pagamento da
dívida, esta continua a existir, mas agora o credor não possui garantia específica.
O contrato de alienação fiduciária em garantia é bilateral (porque resulta em obrigações
para o fiduciante e o fiduciário); oneroso (porque beneficia os contratantes, já que proporciona um
crédito ao fiduciante e uma garantia ao fiduciário); acessório (porque sua existência depende da
dívida que visa garantir); formal (porque é constituído obrigatoriamente por escrito, através de
instrumento público ou particular).

3.4.2 - Requisitos

Subjetivos

Pode ser sujeito passivo da alienação fiduciária em garantia, ou seja, alienar um bem em
garantia de uma obrigação, qualquer pessoa física ou jurídica, bastando que seja o proprietário e
que possa livremente dispor do bem. Esclarece Caio Mário 145 que pode constituir alienação

145
Ob. cit. pp. 301-302.
49

fiduciária aquele que ainda não é proprietário do bem, mas que virá a adquiri-lo posteriormente,
situação em que a aquisição da propriedade “retrotai os seus efeitos à data do contrato,
considerando-se o domínio fiduciário transferido no momento em que se opera a aquisição do
objeto pelo devedor, independentemente de qualquer nova formalidade”.
Pode ser sujeito ativo as instituições financeiras e pessoa jurídica de direito público, tendo
em vista que essa modalidade de negócio jurídico não é privativa das entidades financeiras
(conforme o parágrafo único do art. 22 da Lei Federal nº 9.514/1997) e porque na execução da
alienação fiduciária em vez de o credor intentar a apreensão da coisa, pode optar por recorrer à
ação executiva, ou, se for o caso, ao executivo fiscal (art. 5º do Decreto-lei nº 911/1969).

Objetivos

A alienação fiduciária em garantia incide sobre bens móveis (art. 66 da Lei Federal nº
4.728/1965) e sobre bens imóveis (art. 22 da Lei Federal nº 9.514/1997).

Formais

Como já foi salientado, a constituição da alienação fiduciária em garantia exige instrumento


escrito, público ou particular, que dentre outras informações, deverá conter a discriminação da
dívida, com os seus encargos e os elementos indispensáveis à identificação do bem dado em garantia
(§ 1º do art. 66 da Lei Federal nº 4.728/1965).
Se a coisa não se identifica por números, marcas e sinais, é ônus do fiduciário provar
contra terceiros a identidade do bem alienado em garantia que está na posse do devedor (§ 3º da
Lei Federal nº 4.728/1965).
As cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas para o fiduciário e a
retomada do bem alienado, em razão do inadimplemento do devedor, são nulas de pleno direito
(segunda parte do art. 53 do Código de Defesa do Consumidor).
Com efeito, é nula cláusula comissória pela qual os contratantes estabeleçam que se a
dívida não for paga no seu vencimento o fiduciário ficará com a coisa alienada fiduciariamente,
devendo, pois, proceder a venda a terceiros (§ 6º da Lei Federal nº 4.728/1965).
Para ter eficácia contra terceiros e assim, constituir o direito real, o contrato de alienação
fiduciária em garantia de bens móveis terá que ser registrado no Registro de Títulos e Documentos
do domicílio do fiduciário (§ 1º do art. 66 da Lei Federal nº 4.728/1965). Tratando-se de bens
imóveis terá que ser transcrito no competente Registro Imobiliário (Leis nºs 9.514/1997, art. 23, e
6.015/1973, art. 167, I, item 35).
Com o registro, a alienação fiduciária é oponível contra terceiros, transmite a propriedade
ao fiduciário e torna público que o bem dado em garantia, embora na posse do devedor, não lhe
pertence.

3.4.3 - Direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário

Fiduciante

Assiste-lhe o direito de ficar com a posse direta da coisa alienada em garantia fiduciária; de
recuperar a propriedade plena tendo sido paga a dívida; de receber o saldo referente a venda do
bem, se foi obtida importância superior ao valor da dívida e encargos; de propor ação de
50

consignação em pagamento, recusando-se o fiduciário a receber o pagamento da dívida; de purgar


a mora se já tiver pago 40% da dívida; de transmitir, com anuência expressa do fiduciário, os
direitos de que seja titular sobre o imóvel (Lei Federal nº 9.514/1997, art. 29).
Por seu turno, tem a obrigação de pagar pontualmente a dívida com os seus acessórios,
sujeitando-se à execução do bem dado em garantia na hipótese de inadimplemento; de permitir que
o fiduciário fiscalize o estado da coisa gravada; de conservar a coisa em seu poder na condição de
depositário, não podendo transferi-la a título oneroso ou gratuito; de entregar a coisa ao fiduciário
no caso de inadimplemento da dívida, se não o fizer, estará sujeito às penas impostas ao depositário
infiel; de pagar o remanescente da dívida se a venda do bem não for suficiente para pagá-la.

Fiduciário

Tem o direito de reivindicar a coisa alienada fiduciariamente; de vendê-la a terceiros se


inadimplente o fiduciante, sem necessidade de execução judicial; de propor ação de depósito para
que a coisa lhe seja entregue; de considerar vencida a dívida se uma das prestações não for paga;
de requerer a devolução da coisa se houver falência do fiduciante.
Como corolário aos direitos do fiduciante, tem o fiduciário a obrigação de entregar o
empréstimo ou a mercadoria a que se obrigou; de respeitar o uso da coisa alienada pelo fiduciante;
de restituir a propriedade assim que paga integralmente a dívida; de entregar o saldo correspondente
a venda do bem, se a importância obtida foi superior a dívida; de ressarcir perdas e danos, quando
se recusar a receber o pagamento da dívida.

3.4.4 - Execução do contrato

O Decreto-lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, estabelece as normas processuais que


deverão ser observadas na execução do contrato de alienação fiduciária em garantia.
Assim, não pagando o fiduciante pontualmente a dívida garantida mediante alienação
fiduciária, o fiduciário poderá vender o bem a terceiros independentemente da realização de leilão,
devendo aplicar o produto da venda no pagamento de seu crédito e nas despesas decorrentes da
cobrança (art. 2º, caput).
Antes disso, deverá constituir o fiduciante em mora, cuja comprovação poderá ser
efetivada mediante protesto do título ou carta registrada, expedida pelo Cartório de Títulos e
Documentos (§ 2º do art. 2º).
Estando comprovada a mora ou o inadimplemento, o fiduciário poderá requerer contra o
fiduciante ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida
liminarmente (art. 3º, caput).
Executada a apreensão liminar será o fiduciante citado para, em 3 (três) dias, apresentar
contestação ou, se já tiver pago 40% (quarenta por cento) da importância financiada, requerer a
purgação da mora (§ 1º do art. 3º). Na contestação só poderá alegar o pagamento do débito
vencido ou o cumprimento das obrigações contratuais (§ 2º do art. 3º).
Requerendo o fiduciante a purgação da mora, o juiz marcará prazo para o pagamento, não
superior a 10 (dez) dias, e remeterá os autos ao contador para cálculo do débito existente,
composto pelo principal, juros, comissões, correção monetária e despesas com a cobrança (§ 3º do
art. 3º).
51

Após o prazo para o fiduciante apresentar defesa, havendo ou não contestação e não
tendo sido purgada a mora, o juiz prolatará sentença independentemente da avaliação do bem (§ 4º
do art. 3º).
Com a prolação da sentença, que cabe recurso apenas no efeito devolutivo, a propriedade
e a posse plena consolidam-se nas mãos do fiduciário, que deverá promover a venda judicial ou
extrajudicial do bem (§ 5º do art. 3º).
Não sendo encontrado o bem, o fiduciário poderá requerer nos mesmos autos a
conversão da busca e apreensão em ação de depósito, citando o fiduciante para que o apresente no
prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de prisão prevista para o depositário infiel (art. 4º).
Ocorrendo a falência do fiduciante não há alteração na estrutura de execução, podendo o
fiduciário requerer contra a massa falida a devolução do bem alienado fiduciariamente (art 7º).
Se ocorrer a falência do fiduciário, terá o fiduciante direito de adquirir a propriedade do
bem desde que pague a dívida, tendo em vista que o fiduciário tem apenas a propriedade
condicional, cujo adimplemento da obrigação importa na sua resolução.

Considerações Finais

O estudo dos direitos reais sobre coisas alheias, mediante a investigação de suas diversas
modalidades, permite a formulação das seguintes conclusões:
1ª) a constituição do direito real sobre coisa alheia inexoravelmente resulta em uma
restrição ao exercício da propriedade, tendo em vista que um dos elementos integrantes do
exercício pleno da propriedade(uso, gozo e disposição), dela é destacado para ser titularizado por
outra pessoa.
2ª) é fundamental a transcrição do título constitutivo que atribui um direito sobre coisa
alheia no Registro de Títulos e Documentos ou no Imobiliário, conforme se trate de bem móvel ou
imóvel, respectivamente, para dar publicidade ao negócio jurídico firmado e para que esse direito
adquira a natureza de real, conferindo ao seu titular oponibilidade contra todos e o direito de
seqüela, pois se não for transcrito somente resultará obrigação pessoal entre as partes contratantes.
3ª) os direitos reais sobre coisas alheias somente podem ser criados por lei, não estando
ao arbítrio das partes atribuir natureza de real aos direitos resultantes de todo e qualquer contrato
avençado, tendo em vista que para a aquisição do direito de oponibilidade contra todos e de
seqüela é preciso a transcrição do título constitutivo. Assim, como a lei dos registro públicos
disciplina os atos que podem ser inscritos e a maneira como se realiza, não haverá permissão legal e
tampouco livro adequado para fazê-lo.
4ª) aquele que titulariza uma das modalidades de direito real sobre coisa alheia tem o
dever de conservar a substância da coisa onerada, tendo em vista que terá que devolvê-la no
mesmo estado em que foi recebida.
5ª) os direitos reais sobre coisas alheias podem ser divididos em direitos reais de uso e
fruição, nos quais o titular terá o direito de gozo da coisa; e direitos reais de garantia, em que
determinado bem será afetado ao pagamento da dívida.
6ª) a enfiteuse tem como partes o senhorio, proprietário do bem gravado por enfiteuse e o
enfiteuta ou foreiro, aquele que tem o direito de gozo da coisa alheia e a obrigação de pagar o foro.
É um contrato perpétuo que só recai sobre bens imóveis, sendo sua aplicação restringida às terras
não cultivadas e aos terrenos que se destinem à edificação. Esse instituto não apresenta vantagem
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econômica, tendo em vista que o foreiro pode adquirir a propriedade plena sem que o senhorio
possa se opor, o pagamento do foro é anual, fixo e invariável, tornando-se irrisório e o foreiro pode
transmitir o domínio útil.
7ª) nas servidões prediais há uma diminuição da utilidade de um imóvel em proveito do
aumento da utilidade de outro, sendo que devem pertencer a donos diferentes. O imóvel que
suporta a servidão e que sofre restrições denomina-se serviente e o outro em favor do qual se
constitui e que tem a sua utilidade aumentada, chama-se dominante.
8ª) o usufruto tem como partes o usufrutuário, aquele a quem foi concedida a posse direta
e o direito temporário de usar e gozar de coisa alheia móvel ou imóvel, bem como o de retirar os
frutos naturais e civis; e o nu-proprietário, dono da coisa e detentor da posse indireta. A sua
finalidade é a de assegurar a subsistência a certas pessoas, por isso, normalmente é restrito às
relações familiares, resultando de negócio gratuito e realizado por testamento.
9ª) o uso confere ao seu titular o direito de usar coisa alheia móvel ou imóvel
temporariamente, fruindo as utilidades, porém, limitadas à satisfação de suas necessidades e as de
sua família. A habitação consiste no uso gratuito de casa para moradia, não podendo alugá-la ou
emprestá-la. O seu exercício consiste em residir com a família em casa ou apartamento alheio. São
direitos de escassa aplicação prática, em razão da irrelevância econômica.
10ª) na renda constituída sobre imóvel, uma pessoa, chamada rentista ou censuísta,
transfere o domínio de um imóvel a outro contratante, chamado rendeiro ou censuário, obrigando-se
este a pagar regularmente por tempo determinado uma renda a favor do instituidor ou de outrem,
que se denomina beneficiário. Outrossim, reduzida é a importância desse instituto tendo em vista a
desvalorização da moeda.
11ª) a promessa irretratável de venda é constituída através de contrato, que para ser
irretratável não deve conter cláusula de arrependimento, em que o promitente-vendedor assume o
compromisso de tornar eficaz a compra e venda de um imóvel, mediante a transferência da
propriedade ao promissário-comprador uma vez pago o preço avençado. Recusando-se o
promitente-vendedor a transferir, possui o promissário-comprador o direito de propor ação de
adjudicação compulsória, a fim de obter sentença que lhe forneça o título para realizar a
transferência do bem adquirido.
12ª) no penhor, estabelecida a relação jurídica, surge de um lado o credor pignoratício e
de outro o devedor pignoratício, que pode ser o próprio sujeito passivo da obrigação principal ou
terceiro que tenha oferecido um determinado bem para garantir o pagamento de uma dívida, que
não sendo paga, pode o credor proceder à execução fazendo recair a penhora sobre a coisa
onerada realizando a venda judicial do bem para pagar-se de seu crédito.
O penhor pode ser dividido em comum, no qual uma coisa móvel é entregue ao credor
pignoratício para o pagamento de uma dívida; e especial, que se subdivide em legal (garantia
instituída por lei), rural (contemplando o penhor agrícola e pecuário; que recaem sobre coisas
móveis e imóveis; sem necessidade de serem entregues ao credor pignoratício) e caução de títulos
de crédito (recai sobre coisas imateriais, transferindo o devedor a posse do título de crédito ao
credor pignoratício).
13ª) na anticrese, o devedor entrega ao credor bem imóvel, cedendo-lhe o direito de
auferir os frutos e rendimentos até o montante da dívida a ser paga. O credor anticrético tem o
direito de reter a coisa para fruir os rendimentos, não lhe assistindo, porém, o direito de vender a
coisa dada em garantia para obter o pagamento da dívida. É um instituto obsoleto e inconveniente,
porque o credor não possui direito de preferência, tem um interesse menor na produtividade do
imóvel e dificilmente alguém se interessará em adquirir imóvel onerado por anticrese.
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14ª) a hipoteca, para ter efeito contra terceiros é regida pelos princípios: da
especialização, segundo o qual é preciso determinar precisamente os bens dados em garantia; e da
publicidade, através da inscrição do título constitutivo. Uma ou mais hipotecas podem ser
constituídas sobre o mesmo bem imóvel, navio ou avião, que, embora não entregues ao credor, o
asseguram, preferentemente, do cumprimento da obrigação. Existe a hipoteca convencional (resulta
do acordo de vontade das partes mediante contrato), a legal (imposta por lei em garantia de quem
tem os bens administrados, sobre os bens do administrador), a judicial (conferindo a lei ao
beneficiário de sentenças condenatórias o direito de constituir hipoteca sobre os bens da parte
vencida) e a hipoteca de vias férreas (constituída sobre uma universalidade, composta de bens
móveis e imóveis).
15ª) a alienação fiduciária constitui uma garantia real atípica, uma vez que não se exerce
sobre coisa alheia, mas sobre coisa própria. O financiado, ou devedor fiduciante, dá em alienação
fiduciária um bem móvel ou imóvel ao credor fiduciário, que se torna proprietário e possuidor
indireto da coisa, ficando o devedor fiduciante com a posse direta, na qualidade de usuário e
depositário. Essa transferência, porém, é apenas em garantia, tornando-se sem efeito,
automaticamente, logo que paga a última prestação.
Por derradeiro, é preciso esclarecer que não obstante a preferência conferida a alguns
direitos reais de garantia, a Lei de Falências e o Código Tributário Nacional estabelecem que
primeiro é pago os créditos de indenização por acidente de trabalho, por salários, tributários,
parafiscais, por encargos e por dívidas da massa, para só após serem satisfeitos os créditos com
garantia real, que assim sendo, só possuem preferência em relação aos demais credores
quirografários.

Referências Bibliográficas

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GOMES, Orlando. Direitos reais. 14 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999.

LEVENHAGEN, Antônio José de Souza. Comentários didáticos - direito das coisas. 2 ed., São
Paulo: Atlas, 1992, v. 3.

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1986.

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