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O delicado equilíbrio de um belo livro

João Batista Melo


Durante muito tempo, a literatura argentina se resumiu, para nós, brasileiros, aos
consagrados nomes de Jorge Luis Borges e Julio Cortazar. Havia, também, um espaço
reduzido para Adolfo Bioy Casares, mais pela curiosidade de ter sido parceiro de Borges na
redação de histórias policiais sob pseudônimo do que propriamente pela sua obra expressiva.
Assim, tínhamos contato com os "hors-concours" da literatura argentina, mas deixávamos de
conhecer os trabalhos de muitos outros instigantes autores que, inclusive, faziam sucesso na
Europa ou nos Estados Unidos, embora não conseguissem cruzar as fronteiras brasileiras.
A distância que mantínhamos da arte produzida em nosso país vizinho decorria,
provavelmente, da tradicional impermeabilidade entre as nossas culturas (não sabemos o que
eles fazem, e vice-versa, e nem temos muito interesse em saber), do preconceito contra os
latinos de língua ibérica, e mesmo da disfarçada animosidade que nutrimos em relação aos
argentinos. Ou seja, de hábitos que adquirimos ao longo das décadas, alimentados pelo
interesse dos países do "primeiro mundo" em incentivar a desunião entre as nações
subdesenvolvidas (em cujo grupo, à propósito, continuamos nos mantendo cada vez mais
firmes, pelo menos do ponto de vista social - apesar do Real, de FHC, do neoliberalismo e da
globalização).
Felizmente, o evento do Mercosul pode estar colaborando para acabar com essa
situação. O cenário econômico que promete a integração cada vez maior entre os países do
"cone sul" está produzindo, como consequência, uma maior proximidade entre a nossa cultura
e a de nossos vizinhos. Esse, claro, é um processo longo que ainda vai levar muito tempo para
se sedimentar. Mas, hoje, já não é mais visto como um poliglota exótico quem se aventura ao
estudo da lingua espanhola. Ao contrário, têm proliferado os cursos de espanhol, motivados
pelas perspectivas econömicas abertas pelo Mercosul. E, devagar, a nossa indústria cultural
começa também a atinar para o mercado que já está sendo criado pela gradual integração
latino-americana.
Nos últimos anos, a obra de dois grandes autores argentinos desembarcou no Brasil.
Apesar de considerados autores clássicos naquele país, aqui eles eram, até então, notórios
desconhecidos. O primeiro foi o recentemente falecido Osvaldo Soriano, com seu belo livro
feliniano "Uma Sombra Logo Serás", sendo seguido pelo barroco "Bomarzo" de Manuel
Mojica Lainez. E agora, a Editora Record agrega mais um nome a essa ainda pequena lista:
Mempo Giardinelli. Seu romance "Impossível Equilíbrio" apresenta aos brasileiros um autor
maduro e consagrado, que esbanja estilo, leveza e criatividade.
A história contada não poderia ser mais bizarra. Com o objetivo de combater a
propagação daninha de plantas aquáticas na região do Chaco, o governo provincial decide
importar da África uma família de hipopótamos. Usando esse gancho, Giardinelli tece uma
análise profunda e bem-humorada do espectro político argentino, da direita à esquerda, dos
ecologistas à Igreja. É claro que o autor fala efetivamente de questões específicas daquele
país. No entanto muito dos comportamentos e idéias que vão sendo desfiadas por todas as
matizes políticas poderiam ser factíveis em outros países latinos que saíram de uma ditadura
militar.
Se a proposta do governo é lunática, como costumam ser vários projetos de nossos
governantes, a reação da "esquerda" é igualmente despropositada. Um ex-militante, associado
a alguns amigos, resolve sequestrar os hipopótamos. A partir daí, segue-se uma longa fuga
pelas estradas argentinas, encontros com personagens bucólicos, perseguições pela polícia,
lembrando (mantida a devida distância) os filmes norte-americanos on-the-road. Tudo
entremeado por discussões sobre a morfologia e os hábitos dos hipopótamos.
Apesar de parecer a trama de uma comédia, não é esse o caso. Embora com um texto
leve, que não é sisudo em nenhum momento, "Impossível Equilíbrio" é um livro sério do
princípio ao fim. O seu objetivo não é fazer rir com uma sucessão de casos engraçados, e sim
levar o leitor a refletir, com um suave sorriso nos lábios, sobre o absurdo em que a nossa vida
em sociedade muitas vezes se converte.

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