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Origem da Vida e Evolução

Élgion L.S. Loreto

Departamento de Biologia - UFSM

"Entre as doutrinas científicas modernas, o darwinismo é a única que tem


incomodado muita gente fora do mundo acadêmico. Tem tido inimigos à direita e a
esquerda, e algumas nações, como a União Soviética, liquidaram darwinistas por suas
convicções científicas" (Rose,1998).

A Ciência e a Tecnologia são uma das fontes de mudanças dos valores culturais e da forma
com que o homem vê a si mesmo. Tomemos com exemplo a teoria heliocêntrica e a revolução
estrondosa que ela causou nos séculos XV e XVI (ver páginas 11 a 23, parte I). Naquele tempo a
idéia de uma Terra redonda, girando ao redor do Sol, pareceu um absurdo. Hoje, no entanto, as
crianças aprendem desde muito cedo que o mundo é assim. Nussbaum (1979), em um estudo com
crianças nas primeiras séries escolares, mostrou que elas vão acomodando a concepção de um
mundo plano que observam em sua volta, com a informação recebida na escola, na tv e em
revistas, de que a terra é redonda e gira ao redor do Sol (Figura 1). Como podemos observar dos
estudos de Nussbaum, a teoria heliocêntrica é “absorvida” e entra para o senso-comum sem que as
evidências experimentais, as observações que estiveram por trás de Copérnico a Galileu para
fundar o heliocentrismo, sejam necessárias. Este exemplo nos mostra que a Ciência pode mudar
substancialmente nossa visão de mundo, ainda que não necessariamente conduza a uma “visão
crítica”. Desde muito cedo aprendemos o “heliocentrismo” mas não quer dizer que aprendemos a
pensar “cientificamente” onde estamos.
Figura 1 - Representação esquemática das principais mudanças da concepção de uma visão de mundo das crianças nas primeiras
séries do ensino fundamental. Em (A) as crianças ainda imaginam a terra como plana e as setas apontam o que para elas é a noção
de “para baixo”; em (B) as crianças acomodam em sua visão de mundo visto em (A) a informação recebida de que os grandes
navegadores como Marco Pólo e Colombo deram “ a volta ao mundo”; em (C) as crianças acomodam as informações recebidas
por fotografias de naves espaciais que mostram a terra “redonda”; em (D) a terra já é esférica mas o homem só pode habitar a
parte superior, caso contrário ele “cairia”. Na população estudada, em torno de 9 anos as crianças já desenvolveram uma noção
“heliocêntrica” atual (modificado de Nussbaum, 1979).

Podemos nos perguntar porque tendo passado mais de 150 anos da publicação da “Origem
das espécies” por Darwin, estamos ainda muito longe de uma aceitação popular, mesmo que
“acrítica” de que as espécies mudam no tempo e que temos todos uma origem comum. É
surpreendente ver que mesmo entre pessoas “cultas” é muito comum observarmos um discurso de
que evolução é “apenas uma teoria”. Uma frágil teoria que muito provavelmente é equivocada e
logo chegaremos a uma explicação melhor (Alters e Nelson, 2002).
Seriam as evidências da teoria heliocêntricas mais sólidas ou mais fáceis de entender?
Certamente não. A idéia de evolução é bastante simples e facilmente assimilável. As evidências de
que a evolução ocorreu são inúmeras e de várias fontes como a Genéticas, Paleontologia,
Anatomia e Embriologia comparadas, Biogeografia e de muitas outras áreas. Muitas dessas
evidências, além de muito sólidas, são fáceis de serem compreendidas .
Para a Ciência, a evolução é um fato. No entanto, vemos seguidamente na mídia que a
teoria evolutiva está em crise, ou que a teoria darwiniana está sendo questionada. A teoria
evolutiva, como toda teoria científica está sempre sendo questionada e, também em constante
evolução. A teoria darwiniana original, sofreu contribuições importantes de ciências que foram
desconhecidas de Darwin, como a Genética e surgiu daí o neodarwinismo. O neodarwinismo é
uma teoria que incorpora novos conhecimentos à teoria de Darwin, sem no entanto negar o
darwinismo. É um refinamento da velha teoria, não sua negação. A explosão das pesquisas
biológicas nas últimas décadas, principalmente em áreas como a Biologia Molecular, tem
possibilitado questionar alguns pontos da teoria neodarwiniana. Uma visão mais clara do processo
evolutivo vem emergindo dessas pesquisas, mas novamente, a essência da teoria evolutiva
continua intacta, no entanto, surgem com as novas pesquisas, melhorias a velha teoria. As atuais
fronteiras do conhecimento sobre a origem da vida e evolução, ao contrário de contradizer as
idéias darwinianas, reforçam-nas. Antes porém de apresentarmos as principais idéias referentes às
fronteiras atuais desta área do conhecimento, vamos fazer um breve apanhado histórico com
relação ao desenvolvimento desses conceitos.

A explicação darwiniana

Entre as inúmeras contribuições de Darwin, duas ganham destaque. A primeira pode ser
resumidamente expressa como a noção de que as espécies não são entidades fixas, mas que, ao
contrário, sofrem evolução. Evolução é a descendência como modificações, de diferentes
linhagens a partir de ancestrais comuns. Em sua obra "A origem das espécies", Darwin apresenta a
idéia de afinidade dos seres vivos como sendo representado por uma árvore, em que cada folha ou
botão, nas pontas dos ramos, representa uma espécie existente. As folhas que já caíram, que
estavam presentes em anos passados, representariam as espécies extintas. No passar do tempo,
com o crescimento da árvore, foram surgindo ramos e galhos, mas todos estes galhos estão
ligados no tempo ao surgimento da primeira folha, na germinação da semente. Portanto, todas as
formas de vida estão ligadas a uma origem comum. É isto que nos mostra a árvore da vida.
A segunda importante contribuição de Darwin foi fornecer um mecanismo para o
surgimento de novas espécies. Apontou ele a "seleção natural" como a força motriz para a
evolução. Basicamente a seleção natural funciona da seguinte maneira: a) os organismos de uma
população possuem diferenças e algumas dessas diferenças são hereditárias (transmissíveis à
prole); b) a capacidade reprodutiva dos organismos é maior que a capacidade do ambiente em
fornecer os recursos necessários para mantê-los; c) necessariamente haverá uma seleção, os mais
adaptados ao ambiente sobrevivem e deixam mais descendentes. Assim, os portadores das
características mais adaptadas ao meio tornam-se mais e mais predominantes na população. Este
mecanismo, posto em marcha, principalmente pensando em longos períodos de tempo, pode
explicar como os organismos vão mudando e novas formas de vida vão surgindo, pela seleção de
“pequenas vantagens”. O mecanismo explica o "crescimento da árvore da vida".
Figura 2 - A árvore da vida de Haeckel - Ernst Haeckel (1834-1919) foi o primeiro a descrever as relações entre os seres vivos
como uma analogia a uma árvore e postulou a origem comum a todas as formas de vida.

O que Darwin não explicou

Apesar da importância da contribuição de Darwin, ele não conseguiu uma teoria


satisfatória para o fenômeno da transmissão das características hereditárias. Ter uma teoria para a
hereditariedade era fundamental para sua teoria evolutiva. Darwin defendida a teoria pangênica da
hereditariedade, em que minúsculas partes de todos os órgãos convergem para os órgãos da
geração, misturando estes constituintes e o novo ser é reconstituído. Entretanto, esta teoria é
incompatível com a teoria da seleção natural, isto porque, se ao reproduzir, os indivíduos
"misturassem" suas características, a população em poucas gerações seria homogenia. A seleção
natural, então não teria o que selecionar, uma vez que todos os indivíduos seriam iguais (Mayr,
1998).
No período em que Darwin estava a divulgar suas idéias, Mendel também apresentava a
sua teoria da herança, mas Darwin e todos os seus contemporâneos ou desconheceram ou não
deram importância ao trabalho de Mendel - (ver paginas 2 e 3 do capítulo genomas e proteomas).
Com a redescoberta do trabalho de Mendel no início do século XX, uma das "fraquezas" da teoria
darwiniana, que era a ausência de uma teoria da hereditariedade, foi resolvida.
Com a Genética, a teoria evolutiva ganha um aspecto das teorias da Física e ganha
modelos matemáticos, capacidade preditiva e hipóteses perfeitamente testáveis. Enfim, uma teoria
nos moldes das "boas" teorias científicas. Era preciso agora um novo nome e batizaram-na de
nova síntese ou neodarwinismo. Assim ficou marcada a primeira metade do século XX.
Um aspecto novo que o neodarwinismo trás, é a possibilidade de que ocorra evolução, ou
seja de modificações nas populações, por um outro mecanismo e que não fora identificado por
Darwin: o puro acaso. Se , em uma população, há duas ou mais característica com diferenças entre
os indivíduos, e essas diferenças não provocam um diferencial na possibilidade dos seus
possuidores em sobreviver e deixar descendentes, estas características são ditas neutras. Isto
porque a seleção natural não pode "selecionar" uma delas. Os modelos matemáticos dos
neodarwinistas mostram que, neste caso, a evolução vai ocorrer, por puro acaso. O que vai ser
importante, quando as características são neutras, é o tamanho da população e outros aspectos da
estrutura das populações. Esse fenômeno foi chamado de deriva genética, que poderíamos dizer
ser uma força evolutiva "não darwiniana".
Na segunda metade do século XX houve muita discussão se a principal força que conduz a
evolução é a seleção natural ou se a deriva genética. Foi uma disputa ferrenha entre os ditos
selecionistas e os neutralistas. Visto de fora, pelo tom das discussões, parecia que algo estava
errado com a teoria evolutiva, afinal nem os biólogos evolutivos se entendiam. Hoje, basicamente
há um consenso de que as duas correntes estavam certas. Nas principais características que
adaptam os seres vivos ao seu ambiente, temos a ação da seleção natural. No entanto, muito da
variabilidade genética é neutra em boa parte das situações a que os organismos estão expostos, e
neste caso a força evolutiva é a deriva genética. Seleção natural e deriva genética não são teorias
rivais para explicar a evolução, são forças evolutivas que se completam.

Atuais fronteiras

Se a disputa entre selecionistas e neutralistas ficou no passado, outras discussões entre os


evolucionistas são mais recentes. Uma delas diz respeito à velocidade com que ocorre a evolução.
A teoria darwiniana clássica sugere que a evolução é um fenômeno gradual em que pequenas
modificações vão aos poucos se acumulando, e assim, dado um longo período de tempo, vão
surgindo novas formas de vida. A evolução seria um fenômeno lento e contínuo. A análise do
registro fóssil, entretanto, nem sempre mostra este padrão. Muitas vezes o observado é um longo
período em que a forma dos fósseis pouco varia, seguida de um período curto em que ocorrem
profundas mudanças. Este fato levou aos paleontólogos Eldredge e Gould a propor a teoria do
equilíbrio pontuado. Neste modelo a velocidade da evolução não é constante, mas temos períodos
de estase, seguidos de períodos de mudanças.
Recentes pesquisas na área da genética do desenvolvimento vêm fornecer bases biológicas
para os achados dos paleontólogos. Uma delas é a descoberta dos genes mestres, ou seja, genes
responsáveis por "ligar ou desligar" uma bateria muito grande de outros genes. Mutações nesses
genes produzem alterações muito complexas na forma ou no funcionamento dos organismos. Por
exemplo, na mosca drosófila, a alteração de um único gene, como o eyeless pode fazer aparecer
diversos olhos pelo corpo do inseto e podemos ver uma mosca com olhos em todas as patas, e
também no lugar das asas. Note que este "novo animal" é resultado de uma pequena mudança
genética. Mudanças nos genes reguladores mestres podem fazer surgir um padrão completamente
novo, fruto de uma mudança genética muito pequena. O mais interessante é que esses genes são
extremamente conservados ao longo da evolução. Por exemplo, o gene eyeless das moscas é
praticamente idêntico ao gene anirídia encontrado em humanos, e que também está envolvido em
na formação do olho em nossa espécie durante o desenvolvimento embrionário. Estes genes são
tão parecidos que é possível isolar o gene humano e colocar em uma mosca e ele funciona
perfeitamente no inseto. O estudo dos genes que controlam o desenvolvimento tem mostrado a
existência de vários genes desse tipo, que uma vez mutados produzem padrões completamente
novos. Isto talvez possa ser uma explicação para a descontinuidade que muitas vezes são
observados nos registros geológicos. Pequenas alterações genéticas em genes mestres específicos
podem levar a grandes alterações evolutivas.

A partir da década de 1980 houve um crescimento exponencial em pesquisas sobre o


DNA. É interessante lembrar que esta molécula é também "um fóssil", isto porque, muito do que
ocorre na história evolutiva de uma espécie fica gravado na seqüência de quatros letras que
compõem o DNA. Além de esclarecem como um ser vivo funciona, o estudo dos genes e
genomas também conta, ao menos parte, a história de como os seres vivos evoluíram e com que
velocidade. A lógica que está por trás desses estudos filogenéticos moleculares é o seguinte:
1) o DNA é composto por 4 diferentes nucleotídeos A, T, C e G;
2) durante a evolução o DNA vai mudando e se temos um determinado nucleotídeo em
uma posição, ele pode mudar para qualquer um dos outros três nucleotídeos;
3) quanto mais longo for o tempo em que dois organismos compartilham um ancestral
comum, quanto mais diferente será a sua seqüência de DNA (ver a Figura 3 ).

Figura 3 – Seqüência de DNA de um mesmo gene presente em humanos, ratos, sapos, peixes, moscas e
bactérias. Note que quanto mais afastados evolutivamente são os organismos, maior as diferenças na seqüência dos genes.

Com o decorrer do tempo novos genes são estudados e a seqüência de suas “quatro letras”
vão sendo determinada, essas seqüências são depositadas em bancos públicos de seqüências, como
por exemplo no GENEBANK - http://www.ncbi.nlm.nih.gov.
O acúmulo de seqüências de DNA dos mais variados tipos de organismos, nos bancos de
seqüências, permitiu que se chegasse a algumas valiosas conclusões. Por exemplo, nos genes mais
importantes geralmente a taxa de mudanças é muito pequena. Já em genes menos importantes
essa taxa é um pouco maior. Isto ocorre porque nos genes importantes poucas mudanças são
possíveis sem comprometer o bom funcionamento do organismo. No entanto, em muitos
organismos a maior parte do DNA não corresponde a nenhum gene, ou seja não é responsável por
nenhuma característica ou função, sendo chamado por muitos de DNA lixo. Por exemplo, 95%
do genoma humano é composto por esse tipo de DNA. O “DNA lixo” muda muito mais
rapidamente que o DNA que corresponde a genes. Porém, mais do que variar em uma taxa maior,
este tipo de seqüência muda a uma taxa constante no tempo, que corresponde a aproximadamente
1,5% por milhão de anos. Assim, se compararmos uma região de "DNA lixo" com 100
nucleotídeos de duas espécies que se separaram a um milhão de anos, vamos encontrar algo como
3 nucleotídeos diferentes (1,5% para cada espécie). Como esta taxa é constante no tempo,
podemos comparar o número de diferenças no DNA de duas espécies que, pela ausência de
fósseis, não temos informação de quando divergiram, e assim determinar o tempo em que elas se
separaram. Por isso, este método é chamado de relógio molecular.

Recentemente as pesquisas genômicas, em que todo o DNA de uma espécie é seqüenciado,


permitiram avanços ainda maiores de compreensão do processo evolutivo. Uma das importantes
contribuições dessas pesquisas foi a constatação de que somos mais parecidos com as moscas e
com os ratos do que pensávamos. Entre homens e camundongos por exemplo, as similaridades
vão muito além do fato de que estas duas espécies gostam de queijo. Na verdade, temos
aproximadamente o mesmo número de genes, com seqüência bastante similar. Dos 30.000 genes
dos camundongos, 99% tem seu correspondente em humanos. Mas as similaridades não param ai.
A ordem com que os genes estão dispostos nos cromossomos é bastante conservada. As diferenças
de ordem encontradas, podem facilmente ser explicadas por rearranjos cromossômicos que
trocaram a ordem de blocos de genes, mas dentro dos blocos, a ordem dos genes continua a
mesma. Ainda mais, até os locais nos cromossomos onde se acumulam o dito “DNA lixo” é
bastante conservado. Por que os dois genomas guardam o “lixo” nos mesmos lugares? Só o
avanço nas pesquisas genômicas poderá responder a esta pergunta.

Outra novidade das pesquisas genômicas é a constatação da evolução reticulada. Esta é,


sem dúvida, uma alteração importante a analogia da árvore evolutiva de Darwin. Hoje sabemos
que, olhando mais de perto a árvore, podemos perceber que existe passagem de informação
genética de uma espécie para outra. Ou seja, os galhos não são “únicos” mas, ao contrário, sofrem
anastomoses (ver Figura 4). Muitas vezes ocorre a entrada de informação genética no genoma de
uma espécie vinda de espécies muito distantes.
Já a bastante tempo sabemos que as mitocôndria presentes nas células de plantas e animais
foram “bactérias” que entraram tempos atrás em células maiores e selaram uma simbiose, a
“célula maior” fornecia nutrientes e a bactéria, que era aeróbica, fazia a oxidação completa dos
alimentos, fornecendo ATP em abundância. Nascia assim a célula eucariótica. Da mesma forma
os cloroplastos das plantas tiveram origem semelhante, pela simbiose com algas. Temos
exemplos desse tipo de simbiose bem mais recente. Por exemplo, vários insetos têm células
especializadas que contém grande número de bactérias endosimbiontes que são responsáveis por
funções específicas. Nas células dos “rins” das baratas, chamado de túbulos de malpighi, existem
bactérias envolvidas na reciclagem do ácido úrico. Se tratadas com antibióticos que eliminem as
bactérias, as baratas acumulam ácido úrico, sem conseguir eliminá-lo. Existem vários outros
exemplos de bactérias que vivem dentro de células de animais, exercendo ai importantes funções,
através de uma relação de simbiose.
Mas a evolução reticulada é muito mais que isto. Por exemplo, no genoma humano
existem 233 genes que codificam proteínas e que foram importadas de bactérias. Isto quer dizer,
que no nosso processo evolutivos, incorporamos genes de bactérias e estes hoje tem importante
função nas nossas células.
Voltando ao “DNA lixo”, este é preponderantemente incorporado ao genoma vindo de
fora, principalmente de vírus. Muitos vírus, principalmente os retrovírus, alojam o seu genoma no
nosso genoma. Por exemplo, no genoma humano 37% corresponde a esse tipo de seqüência.
Assim, nosso genoma é, literalmente, um museu de infecções virais sofrida pela humanidade e por
nossos ancestrais. As viroses fizeram-nos o que somos hoje.
Figura 4 - Figura mostrando uma árvore evolutiva em que podemos ver no detalhe o padrão de
evolução reticulada. No decorrer da evolução ocorre transferência horizontal de informação genética
(TH) entre as diferentes espécies.

A árvore darwiniana já não pode mais ser vista como nos pintou Darwin, com um tronco
único se bifurcando em galhos cada vez menores até chegar as folhas nas pontas dos galhos, que
seriam as espécies. A árvore darwiniana “atual” mostra galhos que se anastomosam, que emitem
pequenos galhos e se unem com outros. A evolução é reticulada. Isto não corresponde a tirar
méritos da genialidade de Darwin. Somente agora, com o uso de ferramentas poderosas
conseguimos ver esse detalhe do processo.
O avanço fantástico ocorrido em várias áreas das Ciências Biológicas, no final do século
XX e que prossegue no início desse século, permite que se entenda cada vez melhor como ocorreu
e ocorre o processo evolutivo. Durante muito tempo este conhecimento teve sua importância
apenas para saciar a nossa curiosidade sobre nossa origem (se é que isto é pouco). Atualmente,
entretanto, o conhecimento evolutivo tem se tornado de fundamental importância prática em
várias áreas do conhecimento humano, como na medicina, farmacologia, psicologia, agricultura,
entre outros. Para exemplificar este ponto, podemos lembrar que para o entendimento de
fenômenos como a evolução da resistência bacteriana a antibióticos ou de vetores de doenças as
drogas usadas em seu controle, precisamos empregar o enfoque darwiniano. Além disso, o
entendimento do processo de evolução molecular tem permitido a busca, em organismos modelo
como o rato, de proteínas alvo para criar drogas específicas contra determinadas enfermidades. A
sociedade brasileira de Genética, mantém em seu site um excelente livro on line discutindo estes
assuntos (http://www.sbg.org.br/EvCiSo.pdf).

A questão da origem da vida


Nem Darwin, nem os formuladores do neodarwinismo se ocuparam de explicar como a
vida surgiu, mas sim como que, dada à existência de seres vivos, eles mudam com o tempo.
Evoluem.
Como surgiu a vida era uma pergunta sem nenhum, ou com muito pouco sentido até a
época de Darwin, isto porque era “natural” acreditar que a vida surgia espontaneamente. A teoria
da geração espontânea teve uma morte lenta. Começou com os experimentos do italiano
Francesco Redi (1668) mostrando que moscas não se geravam em um pedaço de carne, se essa
fosse coberta com um fino pano que impedisse a moscas adultas de pôr ovos na carne. Por fim, os
clássicos experimentos de Pasteur (1860), demonstraram cabalmente que a geração espontânea
não ocorre.
A vida qual a conhecemos hoje é extremamente dependente de uma estrutura, a célula.
Nem todas as formas de vida possuem célula. Os vírus, hoje inequivocamente considerados vivos,
não são formados por células, mas precisam invariavelmente de células “hospedeiras” para
exercer suas características de ser vivo.
Portanto, a questão da origem da vida pode ser colocada em como surgiram as primeiras
células. Desde Pasteur sabemos que as células não se geram espontaneamente. Então, a questão de
como surgiram as primeiras células passa a ser uma questão fundamental.
As células são estruturas muito complexas. Mesmo as células mais simples, como as
bactérias são formadas por milhares de moléculas diferentes. Estas moléculas, por si só são
também complexas. Geralmente são moléculas enormes, ditas macromoléculas, e que precisam de
bastante informação para serem construídas. Vamos abordar rapidamente como puderam surgir
estas macromoléculas.
As macromoléculas orgânicas, que são os componentes básicos da formação das células,
podem ser classificadas em quatro grupos: i) as proteínas que são por sua vez formadas por
aminoácidos; ii) os ácidos nucléicos (DNA e RNA) que são formados por unidades menores
chamadas de nucleotídeos; iii) os glicídeos e iv) os lipídeos. Uma das primeiras questões a ser
respondida com relação à origem da vida diz respeito à fonte dos componentes fundamentais para
fazer as macromoléculas biológicas. Atualmente, os aminoácidos que compõe as proteínas dos
seres vivos, assim como os nucleotídeos, lipídeos, glicídios usados pelos seres vivos para fazer
suas células são sintetizados pelos próprios seres vivos. De onde vieram os componentes para
fazer as primeiras células se estes componentes são sintetizados pelas células?
O primeiro passo para se responder este paradoxo foi dado por Friedrich Wöhler em 1832,
quando demonstrou que um composto inorgânico, o cianato de amônia, quando aquecido produz
um composto orgânico, a uréia. No final do século XIX várias moléculas importantes como o
aminoácido glicina e açucares foram sintetizados a partir do modelo fornecido por Wöhler.
Em 1923 Oparin, na Rússia, propôs que a atmosfera da Terra deveria ter sido, no passado,
diferente da atmosfera de hoje. Em particular, ela não deveria conter oxigênio, mas sim
hidrogênio e outros compostos redutores como o metano e a amônia. Oparin propôs também que a
matéria orgânica formou-se espontaneamente na atmosfera redutora sob influência da luz do Sol,
dos relâmpagos e das altas temperaturas. Idéias semelhantes foram divulgados independentemente
pelo inglês J.B. S Haldane.
Em 1953, Stanley Miller, na Universidade de Chicago, baseado nas suposições de Oparin,
submeteu uma mistura de metano, amônia, hidrogênio e água à ação de descargas elétricas. Ao
fim de uma semana, o conteúdo do aparelho foi submetido a uma análise minuciosa. Os resultados
foram surpreendentes. Cerca de 15% do carbono, que originalmente estava na “atmosfera” agora
estava no “oceano” fazendo partes de importantes compostos bioquímicos como vários
aminoácidos, nucleotídeos e açúcares.
Mais recentemente verificou-se que muitos dos compostos orgânicos que compõe os seres
vivos são abundantes no espaço interestelar. Estas descobertas foram confirmadas com a presença
de aminoácidos no meteorito Murchison (1970). Assim, a queda de meteoros e da poeira cósmica
poderia ter sido outra fonte importante de compostos orgânicos fundamentais para a formação das
primeiras células.
No entanto, se não é difícil explicar como surgiram os componentes básicos para fazer as
macromoléculas que compõe as células, explicar o surgimento das macromoléculas e células é
bastante complicado. Imaginar que os aminoácidos, nucleotídeos e demais moléculas que se
formaram espontaneamente no oceano primitivo, a partir da atmosfera redutora e relâmpagos,
prontamente se uniram e formaram macromoléculas e estas se organizaram em células, tal qual as
conhecemos hoje é acreditar no impossível. Isto corresponde a imaginar que se um furacão
passasse por um ferro velho e fizesse engrenagens, latas, correias, portas e outros componentes se
movimentarem com o vento e fruto desse movimento casual resultasse na montagem de uma
Ferrari. E funcionando!
Primeiramente, temos de lembrar que a origem da vida não foi um fenômeno rápido
como um furacão, mas sim um fenômeno gradual que levou milhares de anos. Mas antes de
considerar como hoje entendemos que deve ter acontecido estes primeiros passos da origem da
vida, vamos rever rapidamente qual à distância que teve de ser percorrida entre a formação dos
componentes bioquímicos que compõem as células até o surgimento das células.
No decorrer da semana que estou escrevendo este texto, o cientista que se notabilizou por
seu papel nas pesquisas genômicas, o norte americano Craig Venter, chamou a atenção da mídia
por um novo projeto, o de criar um genoma mínimo. O seu objetivo é montar em “tubo de ensaio”
um cromossomo bacteriano contendo o número mínimo de genes necessário para fazer uma célula
funcionar. O número estimado é de aproximadamente 350 genes. Depois de montado o
cromossomo “artificial” este será colocado em uma célula bacteriana em que foi retirado o
cromossomo “natural”. Espera-se que a célula continue funcionando e transforme-se em uma
célula nova, de uma espécie que nunca existiu até então. Ainda não é uma célula totalmente feita
pelo homem, mas será um passo importante nesta direção. Dado este passo, o que faltará para se
fazer vida “in vitro”? Depois de ter montado um cromossomo artificial, faltará juntar os demais
componentes mínimos, que fazem uma célula funcionar. Dezenas de proteínas e enzimas capazes
“ligar” e fazer a transcrição dos genes, ribossomos, tRNAs, nucleotídeos e aminoácidos... Além
do mais, precisamos isolar tudo isto com uma membrana lipídica e nesta membrana devem existir
proteínas capazes de selecionar o que deve entra e sair da célula. Mondada a célula, talvez ela
ainda não funcione e teremos de descobrir o que ainda está faltando até que tudo funcione. Em
alguns anos mais o homem estará fazendo vida.
Na Figura 5 temos um esquema do que se faz necessário para obtermos a tal célula
mínima, feita no tubo de ensaio. No cromossomo com o genoma mínimo está codificado, nos 350
genes, como deve ser as 350 proteínas que farão a célula funcionar. Mas só colocar um
cromossomo dentro de uma membrana não fará a célula funcionar pois o DNA sozinho não
consegue sintetizar as proteínas. Para tal ele precisa ser copiado a RNA por proteínas específicas.
Estas proteínas por sua vez já precisam estar presentes, além de necessidade de RNAs para fazer
os ribossomos e para transportar os aminoácidos. Uma vez mais precisamos de outras proteínas
específicas. O “segredo” de como fazer estas proteínas “está escrito” no DNA, mas para ler esta
mensagem precisamos das proteínas. Cada proteína tem de ter a sua constituição precisamente
determinada pela seqüência de seus constituintes, os aminoácidos. Assim, não basta colocar um
grupo qualquer de proteínas. Elas têm de ser harmonicamente escolhidas.
Além disso, O DNA tem a capacidade de ser um molde para sua própria reprodução, assim
mantendo a informação de geração a geração. Essa capacidade de replicação é característica dos
ácidos nucléicos (DNA e RNA), já as proteínas não possuem essa propriedade. No entanto, do
ponto de vista funcional, o DNA é uma molécula um tanto “inútil”. Por ser muito regular e
homogênea do ponto de vista estrutural e tridimensional, esta molécula não é capaz de catalisar
reações químicas, ligar ou reconhecer substratos, nem mesmo fazer sua principal atribuição que é
a replicação, sem a ajuda das proteínas. Já as proteínas são muito polivalentes. Quase a
totalidade das reações químicas de um ser vivo é catalisada por elas, no entanto não são
moléculas capazes de se duplicar. Não conhecemos nos sistemas vivos, nenhuma proteína que seja
capaz de se reproduzir. Sempre a informação necessária para a síntese de proteínas está contida
nas “monótonas” moléculas dos ácidos nucléicos.
Chegamos a um paradoxo. Para fazer a célula funcionar precisamos das proteínas. O
“segredo de como fazer as proteínas está escrito no DNA. Mas o DNA, para ser lido, precisa das
proteínas. Para fazer DNA precisamos de proteínas e para fazer proteínas precisamos do DNA. O
que veio primeiro, a informação ou a função? Enfim a velha pergunta: quem veio primeiro: o ovo
ou a galinha? O DNA ou a proteína?

Figura 5- O fluxo de informação genética dentro da célula. Para fazer as proteínas, a informação contida no DNA é copiada no
RNA e posteriormente traduzida para as proteínas. São as proteínas que vão fazer a célula funcionar, inclusive copiar o DNA para
RNA e duplicar o próprio DNA.

A questão do ovo e da galinha não tem solução se ficarmos restrito a um tempo curto de
análise. Para resolvê-lo precisamos colocar um longo vetor de tempo. Assim, veremos que a
resposta pode ser: os répteis e olhando melhor no tempo passaremos pelos anfíbios, peixes,
bactérias, primeiras células.... O ovo e a galinha fazem parte de uma longa história evolutiva, que
só fazem sentido quando analisada como um todo (Figura 6).

Figura 6 - O paradoxo de quem veio primeiro, o ovo ou a galinha, deixa até mesmo as galinhas tontas sem ver uma solução. No
entanto se olharmos com uma janela de tempo suficientemente grande, veremos que não há paradoxo algum. Vieram antes os
répteis que já se reproduziam por ovos, e os anfíbios que tinham ovos mais simples e ...

O mundo de RNA
O paradoxo de quem veio primeiro, o DNA ou a Proteína é portanto respondido: O RNA.
Sabemos hoje que o RNA tem capacidade catalítica e é uma molécula muito mais dinâmica do
que o monótono DNA. O RNA tem a capacidade de adotar diversas formas tridimensionais e até
hoje, nas células, executam diversas funções decorrentes de sua forma, como transportar
aminoácidos e mesmo algumas funções catalíticas, através das ribozimas, que são enzimas feitas
de RNA. O RNA tem capacidade também de replicação, ou seja, de ser molde para fazer outra
molécula igual a si própria. Assim, o RNA possui as características presentes no DNA e nas
proteínas reunidas em uma única molécula. Vários estudos têm mostrado a versatilidade do RNA
para exercer diversas funções hoje desempenhadas pelas proteínas.
O biólogo molecular Walter Gilbert, em 1986 criou o termo “mundo de RNA” para
designar esta fase da origem da vida em que as propriedades hoje desempenhadas pelo DNA e
proteínas eram feitas pelo RNA. Segundo Gilbert, nos primeiros estágios da origem da vida, as
moléculas do RNA evoluíram para um padrão de auto-replicação e usando a recombinação e a
mutação, começaram a explorar novos nichos, desenvolvendo um amplo espectro de atividades
enzimáticas. No próximo passo o RNA começou a sintetizar proteínas, primeiro por desenvolver
adaptadores de RNA que podiam ligar-se a aminoácidos ativados e posteriormente arranjando-os
de acordo com um molde de RNA. Este processo levou ao surgimento das primeiras proteínas a
serem sintetizadas seguindo um código de um genoma. Após esta etapa, uma membrana envolveu
estes componentes e surgiu uma protocélula. Depois disso o RNA vai gradualmente passando as
atividades funcionais para as proteínas que ele “sabe” como sintetizar. Posteriormente uma nova
molécula muito mais estável, O DNA, entra em cena. Através de um mecanismo hoje bem
compreendido, a transcrição reversa, a informação de como fazer as proteínas que estava no
RNA, vai sendo transferido para o DNA. Surgiam assim as primeiras células. Na Figura 7
podemos visualizar os principais passos da origem da vida.
Figura 7 - Principais passos da origem da vida. Os componentes básicos para a formação das macromoléculas
biológicas foram sintetizados por ação da temperatura e descargas elétricas na atmosfera primitiva. Sofreram um
processo de polimerização e assim surgem moléculas auto-replicantes de RNA. No mundo de RNA, estas moléculas
são separadas por membranas lipídicas, junto com polipeptídeos rudimentares, formando as protocélulas. A evolução
darwiniana dos replicadores de RNA leva a transferência da atividade funcional para as proteínas e posteriormente
transfere a atividade de informação genética para o DNA . Surge a célula moderna.

Passaram-se 4,5 bilhões de anos desde a formação da Terra (ver Figura 8). Este é um
espaço de tempo longo demais para ser facilmente assimilável por nossa experiência cotidiana por
termos nosso cérebro programado para pensar e sentir em unidades de tempo bem mais curtas
como minutos, horas, dias... Este período é longo o suficiente para permitir a origem da vida e
sua diversificação. Estima-se que hoje tenhamos algo em torno de 3,6 a 100 milhões de espécies
no planeta*. Esta é uma história fantástica, rica em detalhes e cada um que tenta desvendar um
desses detalhes acaba por descobrir outros, geralmente ainda mais encantadores. E por ser
História, ajuda a entender, ao menos um pouco, o que somos e como chegamos a ser quem somos.

*Dessas, 1,9 bilhões foram formalmente descritas É surpreendente que em pleno Século XXI nossas estimativas de
biodiversidade sejam ainda tão pouco precisas. (Para uma discussão deste tema, ver Wilson, 2002)
Figura 8 - Principais momentos da evolução, da formação da Terra a 4,5 bilhões de anos passados até o presente em
que temos milhões de espécies presentes no planeta. (modificado de Joyce, 2002).

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