Sei sulla pagina 1di 13

Um Breve Estudo do Tempo: Como Pensar Deus e o Homem no

Tempo e na Eternidade

Benedito Braz da Silva Neto 1

Resumo: Já há muitos séculos, o homem pensa à sua maneira o que é o tempo. Não
importando o quão diferente de outros, cada indivíduo tem sua própria ideia quanto ao
tempo. Alguns estudiosos vêm pensando no tema e usando-o como objeto de estudo
muito frequentemente. A maneira de pensar o tempo, via de regra, parece ter forte
ligação com a época que o indivíduo vive. Esse estudo também cria naturalmente
problemas ao encontrar-se com outros princípios de ideias, além de gerar implicações
sobre o entendimento de divino e do homem. Em torno dessa maneira de pensar o
tempo que cada indivíduo tem, incluindo a época que ele vive e os problemas que o
estudo do tempo podem causar, que trataremos nesse artigo.
Palavras-chave: Tempo, Eternidade, Determinismo e Livre-Arbítrio.

Abstract: For many centuries, man thinks in his own way what the time is. No matter
how different of others, each individual has his own idea about the time. Some scholars
have been thinking on the subject and using it as object of study. The way to think about
time seems to have strong links with the epoch that the individual lives. This study also
creates problems naturally when it meets others principles of ideas, and generate
implications on the understanding of divine and man. Around of this way thinking the
time that each individual has, including the epoch he lives and the problems this study
can cause, we will deal on this article.
Keywords: Time, Eternity, Determinism and Free-Will.

Introdução
Mesmo os primeiros filósofos ocidentais já pensavam o tempo e o utilizavam
como objeto de estudo. Com o passar dos séculos, mais e mais estudiosos passam a usar
o tempo como objeto de estudo. Até a contemporaneidade o tempo é tratado de diversas
formas por diversos estudiosos. A cada época que se passa, a cada ideia nova que surge
sobre este tema, o assunto vai sendo tratado mais e mais, e de formas novas. Com cada
vez mais inovação, o estudo do tempo passa a ser um dos mais visados pelos grandes
pensadores.
1
Graduando em Administração pela Universidade Federal de Alagoas.

1
Mas o estudo do tempo traz uma serie de problemas que surgem ao desenvolver
das idéias que tratam deste assunto. Esses problemas podem surgir pelo simples contato
do estudo do tempo com um princípio de algum estudo ou cultura, ou fé.
Pretendo mostrar, de uma maneira simplificada, como o estudo do tempo foi
desenvolvido com o passar dos séculos, desde a antiguidade até a contemporaneidade,
mostrando também problemas que este causou ao encontrar-se com princípios da fé
cristã.
Dessa forma, trataremos do estudo conceitual da eternidade e do tempo, enquanto
também trataremos das implicações oriundas de cada pensamento de tempo que recaem
sobre o homem e o divino.

Desenvolvimento Teórico

O tempo vem sendo objeto de estudo da filosofia há séculos. Cada filósofo tem
sua própria idéia do que é o tempo, mesmo que esta seja muito semelhante a de um
outro filósofo anterior. Para Platão, filósofo grego, o tempo é uma imagem móbil da
eternidade, como podemos ver na seguinte passagem:

Quando o pai percebeu vivo e em movimento o mundo que ele havia gerado à semelhança dos
deuses eternos, regozijou-se, e na alegria determinou deixá-lo ainda mais parecido com seu
modelo. (...) Então, pensou em compor uma imagem móbil da eternidade, e, ao mesmo tempo em
que organizou o céu, fez da eternidade que perdura na unidade, essa imagem eterna que se
movimenta de acordo com o número e a que chamamos de tempo. (PLATÃO, 2001, p. 73).

Essa passagem acima, do livro Timeu, de Platão, mostra a ideia que Platão tem do
tempo. Através dessa passagem podemos perceber que para Platão, existe a eternidade,
que, ao contrário do tempo, é imóvel, podemos dizer até mesmo que a eternidade, para
Platão é una, ou que ela é sempre a mesma coisa, aquilo que para Platão é algo “que
sempre existiu e nunca teve princípio”2.
Para Agostinho, filósofo patrístico que viveu alguns séculos após a morte de
Platão, o tempo também é algo móvel, para ele, existe também a eternidade, como para
Platão, e que parece ser como a do pensamento de Platão.
A diferença principal entre a ideia de Platão e a de Agostinho sobre o tempo é a
definição e divisão do tempo que Agostinho mostra. A divisão do tempo para

2
PLATÂO, 2001, p. 64.

2
Agostinho, assim como para a grande maioria, senão para todas, as pessoas é: passado,
presente e futuro.
Vejamos, a princípio, como Agostinho pensava a diferença entre eternidade e
tempo. Numa passagem da obra Confissões, de Agostinho, consta o seguinte:

Mas eu digo, meu Deus, que sois o criador de tudo o que foi criado. Se pelo nome de “céu e terra”
se compreendem todas as criaturas, não temo afirmar que antes de criardes o céu e a terra não
fazíeis coisa alguma. Pois, se tivésseis feito alguma coisa, que poderia ser senão criatura vossa?
(...) Como poderiam ter passado inumeráveis séculos, se vós, que sois o Autor e o Criador de todos
os séculos, ainda os não tínheis criado? (AGOSTINHO, 1987, pp. 216-217).

Nesta passagem podemos ver que, para Agostinho, o tempo só passou a existir
depois da Criação, pois Deus criou o tempo assim como criou as demais coisas. O que,
para Agostinho, existia então antes da Criação? E onde Deus está senão no tempo? Pois
Deus não deve estar no tempo, ora, se Ele já existia antes deste ser criado, é absurdo
pensar, segundo esta doutrina, que o criador de todos os séculos exista no tempo, como
já disseram alguns filósofos.
Agostinho dá a resposta para essa pergunta na passagem de sua obra Confissões
que diz:

Os vossos anos não vão nem vêm. Porém os nossos vão e vêm, para que todos venham. Todos os
vossos anos estão conjuntamente parados, porque estão fixos, nem os anos que chegam expulsam
os que vão, porque estes não passam. Os vossos anos são como um só dia, (...) um perpétuo “hoje”,
porque este vosso “hoje” não se afasta do “amanhã”, nem sucede ao “ontem”. O vosso “hoje” é a
eternidade. (AGOSTINHO, 1987, p. 217)

Como vemos na passagem acima, para Agostinho, Deus não está no tempo, mas
na eternidade, que, ao que parece, é como a eternidade de Platão, ou seja, não se move.
Visto a diferença, para Agostinho, entre eternidade e tempo, veremos agora, o que
de fato, para Agostinho, é o tempo.
Como já sabemos, para Agostinho, assim como para a maioria, o tempo se divide
em três partes, a saber, passado, presente e futuro. O passado, para Agostinho, não
existe mais, pois já passou, e só existia enquanto era presente. O futuro, para Agostinho,
ainda não existe, pois ainda não chegou, e só existirá quando vier a ser presente. O
presente, porém, para Agostinho, é tão rápido, existe e deixa de existir com uma
velocidade tão grande que não tem extensão. Dessa maneira, para Agostinho, o tempo

3
“nasce naquilo que ainda não existe, atravessando aquilo que carece de dimensão, para
ir para aquilo que já não existe.”3
Sendo assim, podemos ver agora, ao menos espero que sim, que a diferença mais
básica entre o pensamento que Platão tinha de tempo e o que Agostinho tinha era uma
questão de complexidade.
Essa complexidade do pensamento de Agostinho, ao que se refere ao tempo,
causou um problema que ele mesmo teve de resolver, a saber, se o passado não existe
mais e o futuro ainda não existe, como posso medir o tempo? Ora, é necessário que para
que algo seja medido esta coisa exista. Como poderíamos medir o tempo se este não
existe em outro momento que não seja o fugitivo instante do presente, que é, segundo
Agostinho, o único momento em que o tempo existe?
Agostinho explica isso na passagem de sua obra, Confissões, que diz o seguinte:

Mas como diminui ou se consome o futuro, se ainda não existe? Ou como cresce o pretérito, que já
não existe, a não ser pelo motivo de três coisas se nos depararem no espírito onde isto se realiza:
expectação, atenção e memória? Aquilo que o espírito espera passa através do domínio da atenção
para o domínio da memória. (AGOSTINHO, 1987, p. 228)

Agostinho mostra nessa passagem exatamente que o que nos permite medir o
tempo, que já não existe, é a memória. Ou seja, essas três coisas, que acontecem no
espírito, a expectação, a atenção e a memória, fazem com que seja possível que nos
lembremos do tempo, que já não existe, e mesmo sem que ele exista, podemos medi-lo,
pois o espírito espera o que vem do futuro, a atenção percebe o presente e a memória
recorda o passado. É, portanto, segundo Agostinho, com essa memória que podemos
dizer, por exemplo, que um determinado evento durou três dias, outro um mês e outro
não mais que alguns segundos.
Agostinho, nessa obra, ainda questiona o seguinte: se o futuro não existe, como
poderiam então, alguns, como os profetas, ver os acontecimentos futuros, ter
conhecimento daquilo que ainda não existe. Apesar disto ser respondido pelo próprio
Agostinho ainda nessa obra, na passagem citada acima, mostrando que, ao que parece, a
expectação faz com que isso possa acontecer, essa questão foi debatida de uma outra
maneira por filósofos como Agostinho. Esta outra maneira a que me refiro está ligada à
pré-ciência divina.

3
AGOSTINHO, 1987, p. 222.

4
Para os filósofos que adotaram a fé cristã, como Agostinho, era necessário
entender como seria possível, sem haver contradição, que Deus pudesse conhecer o
futuro sem que Ele o fizesse acontecer. Essa questão baseia-se nas ideias de
determinismo, ou necessidade, e indeterminismo, ou acaso.
O determinismo é uma ideia que surgiu, aparentemente, com os filósofos pré-
socráticos, ideia essa que diz que tudo está determinado, ou seja, só acontece aquilo que
já deveria acontecer fatalmente. É, portanto, uma ideia de destino inflexível, como já
disse Epicuro.
O indeterminismo, no entanto, discorda da ideia de que tudo já está determinado, e
que acontecerá fatalmente, para aqueles que aceitam a ideia de indeterminismo as coisas
acontecem ao acaso, ou seja, não foram ditadas, acontecem de maneira imprevisível.
Isto serviu de objeto de debate entre filósofos na idade média, pois, para que os
dogmas cristãos existissem, Deus deveria conhecer o futuro de uma maneira que este
não fosse causado por Ele, para que, dessa forma, pudesse existir a ideia de liberdade, o
dogma cristão do livre-arbítrio.
A princípio parece ser impossível que o acaso, fundamental para que exista o
livre-arbítrio, e a pré-ciência divina coexistam, pois, se existe o acaso, o futuro é
desconhecido, se o futuro é desconhecido, como pode Deus conhecê-lo? Surge assim o
problema dos futuros contingentes.
Em outras palavras, o problema enfrentado por filósofos cristãos, como
Agostinho, foi: como Deus conhece as minhas ações futuras, se eu tenho liberdade de
escolha sobre elas e, portanto, não é possível saber o que eu farei no futuro?
Tal problema no universo grego não existiria, pois um deus grego podia, sem
problemas, não saber de alguma coisa, porém, para o universo cristão, esse é um
problema grave, pois o Deus cristão tem ciência de tudo. A diferença entre os universos
grego e cristão é mostrada na passagem a seguir:

Ele tudo vê e tudo ouve. / Assim é Febo, que ilumina com uma límpida luz: / Tal o canta Homero,
de cuja boca corre o mel; / E, no entanto, ele é incapaz de sondar / As secretas profundezas da terra
ou do oceano, / Pois para isso seus raios são muito fracos. / Mas assim não é o criador do vasto
mundo / Nada faz obstáculo ao seu olhar / Que pousa sobre todas as coisas; / Nem a terra opaca,
nem o negrume de uma noite nebulosa. / Tudo que é, foi e será, / Ele o vê de uma só vez; / É a Ele,
pois somente Ele vê tudo, / Que podemos chamar de verdadeiro Sol. (BOÉCIO, 1998. p. 135).

5
Essa passagem da obra de Boécio, A Consolação da Filosofia, mostra, como já
disse, a diferença entre o universo grego e o cristão.
Foi assim que surgiu o problema dos futuros contingentes que, de certa forma,
fazem oposição a pré-ciência de Deus. Evódio mostra-se confuso quanto a esse
problema e parece acreditar que Deus faz os seres humanos agirem, quando, no diálogo
com Agostinho, mostrado na obra de Agostinho, O Livre-Arbítrio, ele diz:

Assim sendo, sinto-me sumamente preocupado com uma questão: como pode ser que, pelo fato de
Deus conhecer antecipadamente todas as coisas futuras, não venhamos nós a pecar, sem que isso
seja necessariamente? De fato, afirmar que qualquer acontecimento possa se realizar sem que Deus
o tenha previsto seria tentar destruir a pré-ciência divina com desvairada impiedade. É porque, se
Deus sabia que o primeiro homem havia de pecar – o que deve concordar comigo todo aquele que
admite a pré-ciência divina em relação aos acontecimentos futuros -, se assim se deu, eu não digo
que por isso Ele não devesse ter criado o homem, pois o criou bom, e o pecado em nada pode
prejudicar a Deus. Além do que, depois de Deus ter manifestado toda sua bondade criando-o,
manifestou sua justiça punindo o pecado, e ainda sua grande misericórdia, salvando-o. Desse
modo, não digo que Ele não devia ter criado o homem, mas, já que previra seu pecado como
futuro, afirmo que isso devia inevitavelmente realizar-se. Como, pois, pode existir uma vontade
livre onde é evidente uma necessidade tão inevitável? (AGOSTINHO, 1995, p. 152).

Vemos na passagem acima exatamente os problemas que já havia dito


anteriormente. Evódio pensa que se Deus sabia que aquilo aconteceria, então, como não
pode ser negada a pré-ciência divina, aquilo deveria acontecer fatalmente, sendo assim,
para Evódio, não há liberdade, pois há uma necessidade inflexível.
Agostinho responde a Evódio, sobre esse questionamento, na passagem seguinte,
na qual diz:

Logo, se Ele [Deus] conhece qual deve ser a tua vontade de amanhã, igualmente prevê qual a
vontade de todos os homens, quer os existentes, quer os que virão a existir. Com maior razão,
prevê sua própria conduta em relação aos ímpios. (AGOSTINHO, 1995, p. 155).

Agostinho mostra a Evódio que Deus conhece tudo, incluindo o que cada um irá
querer no futuro. Isso, no entanto, por si só, não basta para responder ao questionamento
de Evódio, pois perduraria ainda a ideia de que se Deus sabe, fatalmente realizar-se-á
daquela maneira.

6
Sabendo disso, Agostinho, mais a frente em seu diálogo, complementa sua
resposta dizendo:

Ora, o que eu disse foi: quando chegares a ser feliz, tu não o serás contra a tua vontade, mas sim o
querendo livremente. Pois se Deus prevê tua felicidade futura, e nada te pode acontecer senão o
que Ele previu, visto que caso contrário não haveria pré-ciência. Todavia, não estamos obrigados à
admitir a opinião, totalmente absurda e muito afastada da verdade, que tu poderás ser feliz sem o
querer. (AGOSTINHO, 1995, p. 157).

Nesta passagem, Agostinho diz que apesar de Deus prever algo, é livremente que
escolhemos, ou não, tal coisa na determinada hora que ela virá. Em outras palavras, ao
que me parece, Agostinho quer dizer que Deus só previu isso por que nós iríamos
querer livremente essa tal coisa na hora devida, e não o contrário, que nós a quereríamos
porque Deus havia previsto.
No entanto, para responder de maneira melhor ao questionamento, Agostinho diz
ainda, mais a frente no diálogo:

E assim, como [, tu, Evódio,] tens lembrança de certas coisas que fizeste, todavia não fizeste todas
as coisas de que te lembras, do mesmo modo Deus prevê tudo de que Ele mesmo é autor, sem,
contudo, ser autor de tudo o que prevê. Mas dos atos maus, de que não é autor, Ele é o justo
punidor. (AGOSTINHO, 1995, p. 161).

Nessa passagem Agostinho responde o questionamento de Evódio de maneira


completa, usando, ao que parece, a ideia de que prever não é o mesmo que forçar, assim
como recordar não é o mesmo que ter feito, pois nem tudo o que lembramos fomos nós
que fizemos, e a previsão, nada mais é que uma memória “ao contrário”.
De certa forma, parece que Agostinho conseguiu resolver o problema gerado pelo
conflito entre a pré-ciência divina e o livre-arbítrio. No entanto, creio que o próprio
Agostinho tenha percebido que a resposta dele para esta questão não está completa, pois
ele mesmo disse: “Longe de nós negar a pré-ciência, por querermos ser livres, visto
como com seu auxílio somos ou seremos livres.” (AGOSTINHO, 1999, p. 205). Nessa
passagem, da obra de Agostinho, A Cidade de Deus, Agostinho parece mostrar uma
incapacidade de responder de forma completa esse embate entre a pré-ciência divina e o
livre-arbítrio, dizendo apenas que não devemos negar a pré-ciência em pró do livre-
arbítrio, pois somos livres com o auxílio da pré-ciência.

7
Visto que Agostinho não pareceu resolver totalmente esse problema, ele deixou,
no entanto, fundamentos para que, alguns séculos depois de sua morte, um outro
filósofo, chamado Boécio, pudesse resolver.
Boécio parece resolver com louvor tal problema em uma passagem de sua obra, A
Consolação da Filosofia, onde ele diz:

Aquele que nos observa do alto, que perdura eternamente, que tem a pré-ciência de todas as coisas,
é Deus, que, com a eternidade sempre presente de seu olhar, concorda com a qualidade futura de
nossas ações distribuindo aos bons as recompensas e aos maus os castigos. E não é em vão que
colocamos em Deus nossas esperanças e preces, as quais, sendo justas, não podem permanecer sem
algum efeito. Afastai-vos, portanto, do mal, cultivai o bem, elevai vossas almas à altura de vossas
justas esperanças e fazei chegar aos céus vossas humildes preces. (BOÉCIO, 1998, p. 156).

Podemos ver que Boécio completou agora a resposta de Agostinho ao problema, e


fez isso, ao que parece, com o pensamento que o próprio Agostinho já havia criado, que
é a ideia de que Deus não está no tempo, e sim, na eternidade, uma ideia que, com
Boécio, é melhor apresentada, a ideia de Deus ser transcendente, pois não está no tempo
e no espaço.
Se Deus está fora do tempo, na eternidade, e para Ele o tempo não se movimenta,
se para Deus tudo é presente, é, portanto, possível afirmar que o futuro, para Deus, já é
conhecido. Ora, Deus pode vê-lo assim como pode ver o presente, e vendo o passado de
maneira igual.
Agora, com a ideia de que Deus é transcendente, Boécio completou a resposta de
Agostinho. Séculos depois da morte de Boécio, no entanto, um outro filósofo, chamado
Tomás de Aquino, fez um exemplo desse pensamento de Boécio, o que tornou mais
compreensível a ideia de Boécio, se é que esta não era compreensível o suficiente
mesmo antes de Tomás de Aquino.
Em uma passagem de sua obra Comentário ao De Interpretatione, Tomás de
Aquino diz o seguinte:

Sejam muitos homens que andam por algum caminho, qualquer um deles que se encontrar sob a
ordem dos que passam tem conhecimento dos precedentes e subseqüentes, ordem que diz respeito
ao lugar em que estão colocados. (...) No entanto, se algum se encontrasse fora de toda a ordem dos
que passam, colocado em alguma alta torre onde, naturalmente, pudesse ver todo o caminho, veria
certamente simultaneamente todos os que se encontram no caminho, não sob a razão precedente e
subseqüente... (TOMÁS DE AQUINO, 1979, p. 73).

8
Tomás de Aquino mostra nesse exemplo exatamente a ideia de Boécio, como já
havia dito, de transcendência. Nesse exemplo, claramente, o homem que está na alta
torre representa Deus e os na ordem do caminho, representam os homens, a ordem dos
homens no caminho representa o movimento do tempo, onde cada um só pode conhecer
os subsequentes, enquanto o homem no alto da torre não se move e vê a todos no
caminho de uma só vez.
Dessa maneira foi resolvido o problema que existia entre a pré-ciência divina e o
livre arbítrio. Ou seja, resolvido, de maneira simples, por Agostinho, teve um
complemento com Boécio e recebeu uma facilitação de entendimento com Tomás de
Aquino.
Visto um dos maiores e mais importantes problemas causados pelo estudo do
tempo em coexistência com os dogmas cristãos, voltaremos agora para a observação de
como o tempo foi pensado no decorrer da história.
Séculos depois de Tomás de Aquino, viveu um outro filósofo, chamado Isaac
Newton, que pensava o tempo de uma maneira diferente tanto da de Platão quanto da de
Agostinho.
A diferença entre o que Newton pensava de tempo e o que Agostinho e Platão
pensavam parte do fato de que Newton não pensava em um tempo imóvel, ou seja, para
Newton não existia eternidade, o que, por si só, já diferencia muito do pensamento dos
outros dois filósofos, porém, diferente de Agostinho, Newton não pensava o tempo
como aquilo que “nasce naquilo que ainda não existe, atravessando aquilo que carece de
dimensão, para ir para aquilo que já não existe.” 4, ao contrário, para Newton, o tempo, o
verdadeiro tempo, é contínuo e flui de maneira imutável, não sendo afetado por nada
exterior, como é visto na passagem de sua obra Princípios Matemáticos de Filosofia
Natural, onde diz:

O tempo absoluto, verdadeiro e matemático flui sempre igual por si mesmo e por sua natureza, sem
relação com qualquer coisa externa, chamando-se com outro nome “duração”... (NEWTON, 1983,
p. 8)

Havia ainda uma outra diferença no pensamento de Newton com o de Agostinho,


essa relacionada menos ao tempo e mais com Deus. Para Agostinho existe a ideia de

4
AGOSTINHO, 1987, p. 222.

9
transcendência de Deus, pois Deus, segundo Agostinho, está fora do tempo, mas para
Newton, Deus não só está no tempo, como o tempo, assim como o espaço, faz parte de
Deus, é uma propriedade de Deus, sendo, segundo Newton, por conta disso que existe a
onisciência, portanto também a pré-ciência, como já vimos anteriormente, de Deus, pois
tudo, segundo a doutrina de Newton, acontece no sensório de Deus, o qual é o tempo e o
espaço. Podemos ver isso na passagem da obra de Newton, Óptica, onde diz:

Não é o sensório dos animais aquele lugar com relação ao qual a substância sensitiva está presente,
e no qual as espécies sensíveis das coisas são levadas através dos nervos ao cérebro, que ali podem
ser percebidas por sua presença imediata àquela substância? E sendo essas coisas corretamente
tratadas, não parece a partir dos fenômenos que existe um Ser incorpóreo, vivente, inteligente,
onipresente, que no espaço infinito (como o espaço seria em seu sensório) vê essas coisas em si
mesmas intimamente, e as percebe totalmente, e as compreende totalmente pela presença imediata

delas diante de si? (NEWTON, 1983, p. 40).

De fato, Newton, que era um filósofo que adotou a fé cristã, não concordava em
muito com a doutrina de Agostinho em relação ao tempo, como já foi dito antes.
Alguns séculos depois da morte de Newton surgiu um outro filósofo, chamado
Albert Einstein, que também estudou o tempo. Einstein era um grande admirador da
doutrina de Newton, mesmo assim, ele criou uma concepção de tempo diferente da de
Newton, ou seja, contrária ao tempo absoluto de Newton.
Einstein foi o criador da Teoria da Relatividade, onde ele pensa o tempo e o
espaço de uma forma nova, ou seja, diferente não só da de Newton, mas também da de
Agostinho e também de Platão.
Segundo Einstein, não há tempo absoluto, assim como não há espaço absoluto, o
que por consequência diz também não haver movimento e lugar absoluto, indo assim de
encontro aos princípios da doutrina de Newton. Deixaremos, no entanto, o que se refere
ao movimento e ao lugar de lado e nos concentraremos apenas no tempo, e no espaço
também por não haver possibilidade de separação entre os dois nesse momento.
Para Einstein, o tempo, assim como o espaço, é relativo, pois não flui sempre igual
por si mesmo, ele depende de outros fatores. Para mostrar a diferença entre o
pensamento de Newton e Einstein sobre o tempo, usarei uma passagem da obra de
Einstein, Escritos de Maturidade, onde diz:

10
O movimento jamais é observável como “movimento em relação ao espaço”, ou, como já se
expressou, como “movimento absoluto”. O “principio da relatividade”, em seu sentido mais amplo,
está contido na afirmação: a totalidade dos fenômenos físicos é de caráter tal que não fornece base
para a introdução do conceito “movimento absoluto”; ou, de forma mais breve, mas menos precisa:
não há movimento absoluto. (EINSTEIN, 1994, p. 43).

Essa passagem fala do movimento absoluto, porém, o movimento absoluto só é


possível com o tempo absoluto e o espaço absoluto, se Einstein afirma que não há como
haver movimento absoluto, então, para Einstein, não há tempo ou espaço absoluto, logo,
esta passagem nos é de proveito para entender melhor o pensamento de Einstein em
relação ao tempo e a diferença deste pensamento em relação ao de Newton.
Ainda dentre os contemporâneos de Einstein, havia um outro filósofo, chamado
Martin Heidegger, que também teve o tempo como objeto de estudo. Heidegger pensava
o tempo de uma maneira muito diferente da de Einstein ou de Newton, era ainda
diferente da de Agostinho, sendo que assemelhava-se um pouco a este, ao menos
assemelhava-se mais a este que a Newton ou Einstein.
Para Heidegger, o tempo não tem extensão, ele não deve ser medido, pois não tem
extensão, logo, creio que todos possam perceber, está oposto a Newton e Einstein a esse
respeito.
Dentre os filósofos que tratamos aqui, aquele que mais se assemelha a Heidegger
no que se diz respeito ao tempo, é Platão, talvez pelo fato de que a ideia de tempo que
Heidegger tem fora buscada na antiguidade, provavelmente no livro Ilíada, de Homero,
pois, a ideia de tempo na Ilíada, é exatamente de que o tempo não tem extensão, de que,
em sua origem, o tempo é uno, não deve ser dividido nem em passado, presente e
futuro. Há uma semelhança com Timeu de Platão aqui, quando lembramos da
eternidade que é mostrada nele.
Podemos ainda pensar em uma outra fonte, mais antiga que a Ilíada, onde
Heidegger pode, senão ter se inspirado, ter auxiliado parte de seu pensamento, que é
uma passagem do livro do Êxodo, onde diz:

Então disse Moisés a Deus: Eis que quando eu for aos filhos de Israel, e lhes disser: O Deus de
vossos pais me enviou a vós; e eles me disserem: Qual é o seu nome? Que lhes direi? E disse Deus
a Moisés: Eu sou o que sou. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: Eu sou me enviou a vós.
(Êxodo 3: 13-14)

11
Nessa passagem do livro do Êxodo, percebemos que, ao que parece, Deus dá a
ideia de que Ele não muda, é o mesmo eternamente, aquele que poderíamos dizer que
verdadeiramente é. O que, por sua vez, dá a ideia de tempo eterno, que não se move e é
sempre o mesmo, sem sucessão, como a eternidade de Platão e Agostinho.
Heidegger provavelmente teve por fontes a Ilíada e, talvez, essa passagem do livro
do Êxodo, já que nesse ponto a doutrina dele dizia o mesmo, ou seja “Nisto revela-se: o
originário lidar com o tempo não é um medir (...) porque originariamente o tempo não
tem extensão.”5.
Porém, a ideia de tempo que Heidegger tinha, difere ainda das demais vistas
anteriormente em outros pontos, como mostra a passagem a seguir:

O ser-ai [o homem], apreendido em sua extrema possibilidade de ser, é o próprio tempo, não está
no tempo. (...) Eu tenho tempo quando em meu antecipar me mantenho em meu passar. Todo o
palavreado no qual o ser-ai se mantém, toda correria, toda ocupação, todo barulho e toda agitação
desmoronam. Não ter tempo significa lançar o tempo no péssimo presente do dia-a-dia. (...) O
tempo nunca será longo porque originariamente o tempo não tem extensão. (HEIDEGGER, 1997,
p. 27)

Vemos, na passagem acima, que o pensamento de Heidegger, apesar de bastante


semelhante com o de Agostinho e Platão, tem uma diferença ao dizer, provavelmente,
que o homem é o próprio tempo, lembrando que para Heidegger esse tempo equivale à
eternidade para Agostinho e Platão, sendo que para Platão e Agostinho, principalmente
Agostinho, o homem está no tempo móbil, enquanto a eternidade está para a divindade,
seja o Deus cristão, no caso de Agostinho, ou a divindade da qual Platão fala.

Conclusão
Vimos, portanto, que ao longo da história, muitos estudiosos tiveram o tempo por
objeto de estudo, cada um deles com sua própria opinião do que é o tempo. Vimos
também que a cada época, até a época de Einstein, a ideia de tempo vai sendo mais
alterada, em vista que na mesma época os estudiosos tendem a ter uma ideia mais
semelhante do que é o tempo, a exceção, talvez não a única, é o filósofo Martin
Heidegger, que assemelha-se mais aos filósofos mais distantes de sua época, como
Platão, e diverge mais com os de sua própria época, como Einstein.

5
HEIDEGGER, 1997, p. 27.

12
Vendo todas estas coisas sobre as várias visões que os filósofos têm do que é o
tempo, percebemos que a problemática geral sobre o tempo pode gerar, ao entrar em
coexistência com outros princípios, alguns problemas. Alguns graves, inclusive, como é
o caso do problema causado pela aparente impossibilidade de coexistência entre a pré-
ciência divina e livre-arbítrio, lembrando que esse problema, como já foi demonstrado,
tem ligação direta com o tempo.

Referências Bibliográficas
AGOSTINHO, Santo, Bispo de Hipona. A Cidade de Deus. Trad., introdução e notas
de Oscar Paes Leme. Petrópolis. Rj.: Editora Vozes, 1999, parte I.
__________. Confissões. Trad. J. Oliveira, S. J. e A. Ambrósio de Pina, S. J. São Paulo:
Abril Cultural, 1987 (Coleção Os Pensadores).
__________. O Livre-Arbítrio. Trad., introd. e notas Nair de Assis Oliveira. São
Paulo: Ed. Paulus, 1995.
BÍBLIA, Êxodo.
BOÉCIO, A Consolação da Filosofia. Trad. de William Li. São Paulo: Ed. Martins
Fontes, 1998.
EINSTEIN, Albert. Escritos de Maturidade. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1994.
HEIDEGGER, Martin. O Conceito de Tempo. Trad. Marco Aurélio Werle. Cadernos
de Tradução – FFLCH – USP. São Paulo. 1997.
NEWTON, Isaac. Princípios Matemáticos, Óptica. Trad. Carlos Lopes de Mattos e
Pablo Rubén Mariconda. São Paulo, Ed. Abril Cultural, 1983.
PLATÂO. Timeu. Trad. Carlos Alberto Nunes. – 3. ed. Rev. – Belém: EDUFPA, 2001.
TOMÀS DE AQUINO. Compêndio de Teologia. Trad. Luiz João Baraúna. São Paulo:
Ed. Abril Cultural, 1979 (Coleção Os Pensadores).

13

Potrebbero piacerti anche