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O TERRITORIO ANEGIA E A ORGANIZACAO ADMINISTRATIVA E MILITAR DO CURSO TERMINAL DO DOURO (Séculos IX - XII) Anténio Manuel de Carvalho LIMA * Henrique da Gama Barros e Torquato de Sousa Soares (BARROS 1954: 11 - 69 ¢ 221 ~ 396), € Amorim Girdo ¢ Paulo Meréa (MEREA e GIRAO 1943) assinaram alguns dos mais classicos trabalhos sobre a evoluggo da organizacdo administrativa € militar alti-medi- eval, numa linha de investigac30 que hoje se encontra j4 muito explorada, Nao cremos que seja possfvel dizer muito mais, com alguma inovagao, sem arientar a investigagao em direccdes diferentes, nomeadamente a do confronto entre os parcos dados que nos transmite a nossa lacénica documentacdo dos séculos IX a XI, com dados de outra natureza, sobretudo os que nos podem ser fornecidos pela arqueologia espacial e cartografia histérica. Foi entao neste sentido que orientamas o nosso trabalho, 0. que permitiu a obtengao de dados com alguma importancia para a compreensiio daquilo que foi a organizacao administrativa e militar do vale do Douro na Alta Idade Média, em especial do territoriam da civitas Anegis. 1, Génese e afirmagao do territorio Anegia Nao nos deteremas muito sobre a cronolagia da génese do territerio Anegia. & hoje consensual que se trata de uma fundagao datavel dos primeiros anos do reinado de Afonso lll das Astirias, cerca de 870 (ALMEIDA e LOPES 1981/82: 133), Nao se tratou de uma construgo progressiva de uma 4rea paulatinamente tornada segura, Os mais antigos documentos que referem este terrilorium mostram-no jd com as dimensées que manteria até a0 seu desaparecimento, Foi pois certamente o resultado de uma deliberagio régia, e enquadra-se perfeitamente na reorganizacdo politico-militar levada a efeito por aquele monarca com vista A criagao de condigdes de seguranga que permitissem a fixagao da populagao no vale do Douro. Asua.criagao é globalmente contemporanea das prestirias de Portucale (868) e Coimbra (878), e dos primeiros sinais de alguma dindmica populacional na drea por ele ocupada, nomeadamente nos actuais concelhos de Cinfaes (DC 6 e DC 7, de 870 € 874), Penafiel (DC 8, de 875), Marco de Canaveses (DC 9, de 882), Castelo de Paiva (DC 10, de 883) € Arouca (idem) Estas primeizas prestirias privilegiam a ocupagao de pontos estratégicos onde se criam fortalezas e estabelecem os comites, delegados dos reis astur-leoneses. ‘Tais fortalezas passam a encabecar vastos territérios, onde tém por misso garantira seguranga necesséria & fixacdo da populag3o nesta area de fronteira, permanentemente abalada pelas incursdes e razias muculmanas, e desta forma garantir também a estabilidade da fronteira mugulmano-crista. Qs locais escolhidos para a implantagdo de tais fortalezas sao criteriosamente escolhidos, 399 ANTONIO MANUEL DE CARVALHO LIMA _ Para 0 caso que nos ocupa, foi escolhido um pequeno espordo, hoje denominado Cividade, locatizado na freguesia de Eja, concelho de Penaliel! Os sucessivos aterros e desaterros a que 0 local jd foi entretanto sujeito pouco deixam adivinhar da vetusta civitas Anegia. Alguns trocos de muralha, visiveis ao nivel dos alicerces, ou desenhados na topografia local, 86 ganharao sentido quando uma intervencao atqueolégica no local os enquadrar devidamente 5e a localizagao da civilas é consensual, o mesmo nao se podera dizer da extensdo e limites do seu lerritorium, que desde ha muito carecem de esclarecimento. 2, Extensdo e limites geograficos. © territorio Anegia e os outros territoria Os autores que j4 tentaram definir a extensdo ¢ limites do territarium da civitas Aneaia 80 sempre muito vagos. Embora sem se afastarem muito da drea efectivamente ocupada por ele, nao parecem ter realmente @ nogo do que o delimita (¢fr. LIMA 1993: 32-35] Por isso, cartografamos mais uma vez todos os sitios referidos nos diplomas medievais como parte integrante do terriiorio Anegia, Para isso, ¢ relativamente as cartografias tradicionais, retiramos algumas referéncias ertadas?, inserimos outras geralmente esquecidas?, e corrigimos a localizacdo de algumas outras’, A esta cartogtafia, juntamos alguns elementos relevantes da orografia e hidrogratia regional, e - com base numa reconstrugao fundamentada em dados documentais - inserimos nela o tragado provavel da principal via terrestre jd existente na época, jd entao chamada carraria anliqua. O resultado 6 um territério surpreendemente coerente com os objectivos para 0 qual foi criado (FIG. 1) O territorium da civitas Anegia ndo é mais do que um corredor natural’, de orientacdo NW - SE, delimitado, a Leste pelo Maro (mons Maraonis)* e Montemuro (mons Muro), a Sul pelo maciga da Freita (mons Fusle), € a este pela cumeada a que hoje a toponimia nao confere qualquer unidade, mas a que os medievais chamavam, na margem Sul, Serra Sica’ Esta Serra Sicca 6 uma cumeada cuja altitude maxima oscila entre os 400 ¢ 05 600 m, e que culmina, na margem Sul do Douro, no alto de Séo Domingos. Esta linha de alturas "ignora” aquele rio, prolongando-se, na margem Norte, nas serras das Banjas, Flores / Santa Iria e Pias / Santa Justa. Ela delimita e separa, naturalmente, a zona granitica - fértil e densamente povoada - da mancha xistosa e também carbonifera - pouco produtiva e deserta de gente. Mais ainda, esta cumeada é uma dltima linha natural a isolar Portucale do interiore a defender o litoral de possfveis ataques vindos de Leste. Delimitava os territoria de Anegia e Portucale (na margem Norte) e também provavelmente Anegia e Sancta Maria (na margem Sul), ¢ devia ser intensamente fortificada na Alta Idade Média Os trés pontos fracos desta barreira natural, isto é, os pontos onde esta linha de alturas é rasgada pelos rios Douro, Sousa Ferreira eram fortificados. Sobre o tio Douro, 0 Monte do Castelo em Broalhos, e 0 Alto do Castelo, em Medas (Gondomar}; sobre o rio Sousa, o famoso Castelo de Aguiar (Paredes), tomado por Almavsor, quem sabe se vindo de Aneaia e procurando aceder a Portucale; sobre o rio Ferreira, 0 Alto do Castelo, em Campo (Valongo)*. Peguemos agora no elemento estruturante de todo este corredor de Anegia: uma importante via, de origem romana, provinha da zona de Arouca, atravessava o Paiva na zona de Espiunca, percortia o vale deste rio na sua margem Leste, e ia atravessar o Douro 400 OVTERRITORIO ANEGIA E A ORGANIZAGK DMINISTRATIVA E MILITAR DO CURSO TERMINAL DO DOURO. na foz do rio Paiva, em direccoa Varzea do Douro e depois Alpendorada (LIMA 1993: 260 ~ 265) Na zona de travessia do Douro, junto a0 porto de Pavia, {4 referido em 1108 (DP Ill 267), ambas as margens estado intensamente fortificadas e defendidas, ja desde época romana. Esta via foi certamente muito utilizada pelos muculmanos para as incursdes e razias que frequentemente faziam em direccdo ao Norte. Certamente também o foi por Almansor, o mais famoso e temido dos chefes militares muculmanos. Para além das narracées apocal{pticas que existem para a regido de Arouca, a propésito das razias 4rabes (DC 746), a propria toponimia registou, ao longo deste eixo, © nome deste famoso personage a que certamente estas gentes nao ficaram indiferentes: Mansores em Arouca, ¢ Almansorem Castelo de Paiva, recordam tempos que devem ter sido bem dificeis. Por esta via, poder ter fugido um abade que, escapando das investidas do mesmo Almansor nas tertas de Santa Maria, se veio refugiar no Mosteiro de Pago de Sousa como nos relata um diploma de 994 (DC 169 = LTPS 132) Foi muito provavelmente esta via que ainda Almansor utilizou pata chegar ao castelo de Aguiar de Sousa, o qual tomou no ano de 995, como nos relatao Livro das Eras: Era Mt XXXIIL JIL? [sic] sepe Almancor castellum Aguilar quod est in ripa de Sausa prouincia portucalensi (cfr. ACMA, p. 75). Sobre o protagonismo de Anegia em todas estas \utas, as fontes narrativas quedam completamente mudas, Talvez o seu siléncio nao seja um mero capricho das circunst4ncias em que se conservou - ou ndo - a nossa documentacao alti-medieval. Na vastidao de téo grande territorium deve ter residido a fraqueza da civilas Anegia incapaz, ao que parece, de assumir qualquer papel relevante nos confrontos militares que assolzram esta regi3o nos finais do primeiro milénio, 3. Fragmentacao do territorio Anegia. Do territorium as terre: A Gltima referéncia documenta! ao territorio Anegia 6 extremamente tardia. Data de 1185 (LTPS 141). Por mecanismos varios, de tradigao documenta] ou outra, mecanismos esses que julgamos jA terem sido esclarecidos noutra obra (LIMA [993: 21 ~ 29), os escribas medievais acabaram por induzirem erro muitos historiadores modernos, e transmitiram uma imagem muito confusa da divisdo administrativa, militar e judicial em vigor nos séculos XI e XII. Passemos, pois, a outro tipo de argumentos. Nao 6 por acaso que a passagem do Douro se fazia pelo perte de Pavia, ¢ ndo pelo porto civitatis Anegia, situado mais a jusante A local izagio da civilas Anegia, a meia encosta, nao longe do local onde a carraria antiqua desembocava no Douro, mas invisivel a partir desta, mostra uta intengéo claramente defensiva. Devia, antes de mais, ser a base de uma guarnicdo permanente, capaz de, em caso de necessidade, fazer frente aos autores das frequentes razias a que a regio certamente esteve sujeita Mas, como {4 vimos, nem no aspecto defensivo deve ter sido muito eficaz, A partir do cambio de milénio, os tempos sao outros, Desde a morte de Almansor, em 1002, e de Aéd al-Malik, seu filho, logo em 1008, que nao mais este trogo da Douro terd sido afectado pelas razias muculmanas que tanto devem ter afligido e mesmo afugentado as populacdes destas paragens. 401 ANTONIO MANUEL DE CARVALHO LIMA - $6 além-Montemuro, a partir das terras de Aregos e de S40 Martinho de Mouros para montante, seria preciso esperar pelas vitoriosas campanhas de Fernando o Magno, a partir de 1055, para a definitiva pacificagao da regiao. Alids, os grandes movimentos - militares, populacionais ou outros ~fazem-se, a partir da segunda metade do século XI, j4 ndo tanto pela carraria antiqua do vale do Paiva, mas sobretudo pela sua homénima do vale do Bestanca", que por isso fol desde ent’io densamente fortificada. Para cé do arcaico mans Geronza!', velha designacao do mows Muro, incluindo a sua vertente ocidental, rasgada pelo Paiva, 0 processo de desagregacdo do territorium comeca nitidamente mais cedo As presses, certamente demogrdficas, mas também sociais, nomeadamente das néveis familias de infangdes que o Livro Velho de Linhagens refere terem andado a la guerra a filkar 0 reino de Portugal, no sentido de uma maior reparticao de poderes militares, administrativos e judiciais, levou a divisdo do vasto e arcaico territorium Anegia numa série de terra, de dimensdes bastante mais reduzidas e encabecadas cada qual pelo seu castelo (FIG. 2) Os primeiros indicios documentais da desagregacao do vastissimo lerrilorium da civi- Las Anegia comegam em 1038 (MA III; dr. LIMA 1993: 49-50) A partir desta data, e até aos anos 70 do século XI, so relativamente frequentes os diplomas que localizam as propriedades em territoria inexistentes ou que usam referéncias geograficas bastante confusas (LIMA 1993: 38 ~ 39), o que pode ser interpretado como um sinal concreto de alguma indefinigao, au até mesmo algum vazio administrativo, que caracterizaria esta época de charneira. Tal situagao poderia até ser anterior, e arrastar-se jd desde o infcio do milénio, mas 0 brusco - e com certeza significative - desaparecimento, durante um espago de trés décadas, da documentacdo relativa a toda esta regio”, impede-nos de o verificar, sen’io apenas pela interpretagao do préprio vazio documental A partir da década de 40, comegam a surgir sinais bem mais claros: em 1047 (DC 357), surge a primeira referéncia ao castelo de Penafidel de Kanas, talvez | desempenhando © seu papel de “cabeca-de-terra’, em 1048 e 1049 (DC 370 e 373), surgem os primeiros diplomas que integram propriedades desta regiao no lerritorio portucalense, ignorando Anegia - jd inexistente enquanto centro de um lerritorium - enquanto que até essa data Portucale tinha o seu territorium confinado aos limites ocidentais do da velha civitas do Douro”. Em 1054, surge pela primeira vez uma referéncia explicita a uma nova unidade administrativa dentro da area outrora ocupadz por Anegia. a terra de Arauka (DC 392), A partir desta data, sucedem-se as referéncias as restantes terra: A terra de Pavia (Paiva), referida desde 1064 (DC 441 = LTPS 12), estendia-se do Paiva ao Arda, e do Douro ao Alto do Seixo, este tiltimo nao longe dos actuais limites dos concelhos de Castelo de Paiva ¢ Arouca A terra de Penafidel de Canas (Penafiel), referida desde a mesma data (DC 441 = LTPS 12} ocupava a regido entre Sousa e Tamega. A terra de Aguilar (Aguiar de Sousa), referida desde 1066 (DC 451), situava-se entre os rios Sousa e Ferreira A lerra de Baiam (Baiao), cuja primeira referéncia data também de 1066 (DC 451), ocupava um espago delimitado pelos rios Douro (a Sul), Galinhas (a Oeste), Ovelha Norte) e ainda 0 rio Teixeira ea ribeira de Zézere (a Leste] 402 OTERRITORIO ANEGIA E A ORGANIZACAO ADMINISTRATIVA E MILITAR DO CURSO TERMINAL DO DOURO Ainda de 1066, data a primeira referéncia & terra de Benviver (DC 451), ocupando o espaco entre o Douro e 0 Tamega, estendendo-se inicialmente, para NE, somente até a zona de Ariz. Em 1070, surge a primeira referéncia a terra Sancto Saloator (S4o Salvador — dr. DC 491), mais tarde chamado Sao Salvador de Nogueira. Ocupava, na margem Sul do Douro, o espaco compreendido entre a ribeira de Pides e 0 rio Bestanga Ainda no século Xl, mais precisamente em 1091, um diploma do cartério de Alpendorada (DC 767) dé-nos a primeira noticia da exist@ncia da lerra Sancto Felcis (Sanfins), O seu castelo, no entanto, aparece jd referido desde 1067 (DC 459). Os limites desta terra medieval eram os ios Douro (a Norte), Paiva (a Oeste), Ardena (a Sul) ea ribeira de Pides (a Nordeste) por onde confrontava com a jd referida terra de Sao Salvador Ja do século XII datam as primeiras referéncias as terrae de Terdales (Tendais, em plena Serra de Montemuro, a Sul da terra de Sao Salvador ~ ofr, DC 335 = LTPS 145) e de Ferrarios (Ferreiros, entre o Bestanga e o Cabrum ~ dr, LTPS 16), ambas no actual concelho de Cinfaes; ¢ ainda a de Lousada (entre o rios Sousa e Mezio - gr. Mem. n.° 37), esta dltimana extrema dos lerriloria de Anegia e Bracara'’, 3 custa dos quais se formou Temos pois que o artanque da formacao das terra, sinal expressivo da ascensdo social das famflias de infangées, por contraposicéio 8 poderosa nobreza condal, j4 entao em franco dectinio, é um processo cujo inicio é nitidamente anterior as vitoriosas campanhas. de Fernando © Magno, que, ao fazer recuar para Sul uma boa centena de quilémetros a linha de fronteira mugulmano-crist3, mais ndo terd feito do que acelerar este movimento. ‘A Sul do Douro, mas apenas além-Montemuro, s6 mesmo as suas campanhas militares da década de 50 terao permitido alastrar este processo a tais paragens (ALMEIDA. © LOPES 1981/82; 133, ALMEIDA 1989: 49, BARROCA 1988: 159 € 1990/91: 118). Para cd do mons Muro, nao tera havido diferencas cronolégicas significativas em telacho a margem Norte, a nao ser, talvez, na propria serra, sobretudo na sua vertente oriental, que se manteve ainda como zona de fronteira até 1055, dificultando assim @ nova organizaggo administrativa da regiao Esta ideia parece ganhar ainda mais consisténcia, se tivermos em linha de conta as diferencas—notérias, quando cartografadas em escala adequada —da extenso das terre a Norte do Douro e a poente do Paiva, por um lado; e do Montemuro para nascente, a0 longo da margem Sul, por outro. Estas tiltimas, claramente sobre-divididas se comparadas com as anteriores, parecem corresponder a uma fase em que a luta por uma maior repartica0, de poderes terd levado 3 ctiagdo de unidades administrativas € militares menores ¢ mais humerosas (FIG. 2) Nalinha do que Fournier defende a respeito deste processo além-Pirinéus (FOURNIER 1978: 32), dirfamos que, ao contrdrio da criagdo - enquanto acto intencional e deliberado - dos territoria, a nova geogratia das terre nao terd sido concebida de ura maneira global pela autoridade régia, mas ter-se-4 formado como resultado de um determinado equilibrio de forgas entre as diferentes categorias da nobreza, e pela progressiva desagregaczo do poder condal e pulverizacao dos direitos que outrora Ihes eram exclusivos. 4, Da civitas Anegia aos castelos cabega-de-terra. A defesa do curso terminal do Douro no cambio do primeiro milénio, No 6 credivel, 4 0 dissemos, que a velha civitas Anegia fosse criada com a pretensao de defender, por si propria, todos os pequenos nticleos habitacionais desta tegiao Estes tinham que ter, obrigatoriamente, os seus préprios locais de refugio. 403 ANTONIO MANUEL DE CARVALHO LIMA - A eficdcia de tais sftios, cuja localizago teria um papel fundamental atendendo 3 exiguidade dos meios de defesa, deveria depender maximamente da possibilidade de alertar atempadamente as populacdes em perigo, facto ao qual nao deverao ser alheios ‘os Fachos € outros montes cuja toponimia, relacionada com 0 aviso por meio de sinais luminosos, é deveras sugestiva”. Os aterros / desaterros, como os que veinos na fartilicagao do mons Genestazolo (Vila Boa do Bispo, Marco de Canaveses), referido desde 1054 (DC 391, 455, 473, 606 © 688); os Tecintos amuralhados como os de Agua de Frades (Vila Cova, Penafiel) e de Fandinhaes (Pagos de Gaiolo, Marco de Canaveses); ou as frustres construgSes pétreas como as que ainda hoje sao visiveis em Vale de Papas (Ramires, Cinfées) no castellum Aquilar (Inq. 984; cfr. LIMA 1993; 195 ~ 197 € 292) deviam constar entre os pouces recursos de defesa com que se poderia contar, a par das indispensdveis condicdes naturais dos locais escolhidos. Estas velhas fortificagGes, de labor certamente comunitario, tenderao a desaparecer com a desagregacdo da longfnqua autoridade condal e sua substituicdo pela nova nobreza em ascenséo, com um poder mais préximo ¢ mais interventivo, cujo simbolo maximo passa a ser o castelo senhorial ‘Aextensdo des poderes senhoriais retitou as comunidades livres a maioria das suas prerrogativas - entre as quais certamente a da préptia defesa - colocando-as dependentes do senhor, e fazendo dele o detentor das fungSes que outsora pertenciam 2 colectividade Os castelos senhoriais, cada um capitaneando a respectiva terra, implantam-se em lugares de destaque na paisagem circundante, para verem e serem vistos, como que num esto permanente de ostemtacao e demonstracio de imponéncia, de preferéncia em PosigdSes centrais face a terra que capitaneiam e em locais com condigdes naturais de defesa que tornem minimo o esforgo construtivo. Por vezes buscam ainda o prestigio de locaig de remota e mistica ocupagao, sobretudo de época romana, ou nao se intitulassem de dominateres ou mesmo princeps ou imperatores, aqueles que geralmente usam apenas os tftulos de tenens, comtinens ou mandantes (LIMA 1993: 275) Convém sublinhar que estas profundas mudancas nas estratégias de defesa desta parcela do vale do Douro, nao se fez sem alguns sobressaltos. Sao frequentes os registos documentais da conflitualidace que envolveu esta passagem de testemunho e consequente dispersao de poderes administrativos e militares (MATTOSO 1992: 503 e LIMA 1993: 274) E até no proprio registo arquealdgico ficaram marcas: 0 inico castelo cabeca-de-terra desta regiao até agora submetido a escavagGes arqueoldgicas cientificamente orientadas, revelou uma primeira estrutura defensiva em madeira, datdvel da primeira metade ou meados do sécula XL pasteriormente destruida pelo faga, ¢ mais tarde substitu(da par uma nova estrutura pétrea que mais se deveria enquadrar no protstipo de castelo romanico que viriaa ser materializado neste tipo de fortalezas. Adestruigio, pelo fogo, da estrutura castelar primitiva, indicia um possivel recontro violento, de que Castelo de Matos terd sido alvo (BARROCA 1984: 164-165), € a prépria construgdo em madeira pode ser interpretada de acordo com a necessidade de erguer - no mais curto prazo, e mesmo que em condigdes precdrias - uma estrutura que simbolizasse as novos poderes. Esto jd identificados quase todos os castelos cabeca-de-terra desta regia!” Na dtea outrora abrangida pelo territorio Anegia, (4 nos foi possivel localizar ascastelos que capitanearam asterras de Aguiar (Castelo, freg, Aguiar de Sousa, conc. Paredes), Penafiel (Alto do Castelo, freg, Oldrdes, conc. Penafiel), Benviver (Monte Aradros, freg, Alendorada e Matos, conc. Marco de Canaveses], Baldo (Castelo de Mates, freg. Ovil, conc. Baio), Paiva 404 OTERRITORIO ANEGIA E A ORGANIZAGAO ADMINISTRATIVA & MILITAR DO CURSO TERMINAL 00 DOURO (Crasto, freg. Fomos, conc. Castelo de Paiva), Arouca (Crasto de Sao Jodo de Valinias, free, Santa Eulalia, cone, Arouca), e Saufins (Senhora do Castelo, freg. Nespereira / Pides, conc. Cinfaes), Ainda no Montemuro, mas provavelmente jé fora do velho territario Anegia, haveriam de surgir os castelos que capitaneatam as terras de Sao Salvador (Castelo de Sampaio, freg CinfSes, conc. CinfSes|, Tendais (Castélo, freg, Tendais, conc. Cinfaes), Ferreitos (Senhora da Aparecida, freg. Ferreiros, conc. Cinfaes), Aregos (Penedo de Sio Joie, freg. Aregos, cone. Resende) e Séio Martinho (Castelo, freg. S40 Martinho de Mouros, conc. Resende). No entanto, 0 precoce abandono destas fortificagdes, por cessacao Sbvia da sua utilidade, implicou que hd muito se iniclasse a sua degradacio, o que dificulta muito -na auséncia de escavacées arquealégicas sistemticas - 0 reconhecimento dos seus principais aspectos arquitectonicos. £ no entanto possivel adiantar desde [4 alguns aspectos para uma melhor compreensao destas estruturas - Em todos os casos onde foram detectadas muralhas pétreas, néo hd um dnico em que essa muralha no integre no seu tracado grandes batdlitos de granito que sao assumidos como parte integrante da propria muralha Ou a muralha pratege o acesso ao niicleo central apenas pot um dos lados (como acontece em Vale de Papas e em Fandinhaes|, em principio aquele lado onde a natureza no se encarregou de o fazer ce forma mais eficaz; Ou se trata de uma cerca destinada a criar e fechar um espago ao lado do nticleo central do castelo (como acontece na civitas Sancti Falics); Ouse trata de facto de um circuito fechado constitufdo parcialmente por uma muralha pétrea, ¢ ainda por grandes penedos que funcionam como se de panos de muralha se tratasse (Penafiel de Canas, Benviver, Sao Salvador). - Em nenhum dos castelos cabega-de-terra, que em principio deveriam ser aqueles gue melhor darizm corpo 20 modelo de castelo romanico, encontramos vestigios inequivacos da existéncia de torre de menagem"’, simbolo maximo do caracter sen horial gue foi o grande beneficirio da nova geografia administrativa, militar e judicial que se corporizou nas terre. - © abastecimento de dgua [vital em caso de cerco prolongado, e que era maximamente assegurado pelas nascentes 4s quais nao deveria ser estranha a implantagéo. das fortalezas] teria sido assegurado, no castelo romanico, pela presenga da cisterna Mas, para suspeitar da existéncia deste tipo de estruturas, apenas temos elementos no castelo de S40 Salvador, onde uma depressio circular, em posicao central no interior do recinto amuralhado, e um elemento de calha, assim o dao a entender. Esta segunda grande vaga de forca do processo de encastelamento do curso ter minal do Douro, jd nao vai procurar tanto as pévoas - cuja defesa procuravam assegurar os velhos mons referidos na dacumentacao dos séculos IX e X - mas sobretudo as vias. Essencialmente as vias de trnsito inter-regional, como as que, aproveitando os vales do Paiva é Bestanga, desembocavam no Douro, respectivamente em Castelo (de Paival"* em Porto Antigo e Mourilhe (LIMA 1993: 251 — 260). Nao obstante alguns vagos ind{cios - documentais e arqueoldgicos - da presenca de possiveis torres e/ou estruturas habitacionais no interior de algumas destas estruturas castelares”, nao sabemos pois em que medida os castelos do curso terminal do Douro terdo - ou nao - ficado & margem das grandes inovaces que 6 romanico viria a introduzir na arquitectura militar. 405 ANTONIO MANUEL DE CARVALHO LIMA, Aestas questdes, como a muitas outras, s6 a arqueolagia, e em especial a escavagao arqueolégica, poderé responder. 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Sobre este problema, ver LIMA 1993: 33 e 100, nota 53 * Por exemplo, 0 vale de Arouca, integrado no terntorium Aneaia camo o demonstra 0 texto de MA Il, datado de 7 “Ver notas & cartogratia do leritorc Aueoia, em LIMA 1993: II, 5-8e 12-15. * Sobre a oro-hidrografia da regido, veja-se sobretudo a obra de Aristides de Amorlin Girdo (GIRAO 1940) € 0 elucidativo Mapa Oro-Hidreardjice de Portugal, Escala |: 200.000, Lisboa, Centro de Estudos Geogrdticos / Inst. de Alta Cultura, 1965, fis. 9, 10, (314 ‘Quanto ao terierium Anegia, 6 0 seu limite Norte no muito nitido, As confrontagdes entre o territorum Anegia, no sau limite Notte, 2 0 ternterium de Bracara, no seu extremo Sul, andartam, nos séculos IX / X, por terras de Lousada € Amarante. Sobre 05 limites arcaicos do terrterium Bracharensis, ver COSTA 1959: mapa apts a p..934 € FERNANDES 1968 mapa apés a p. 10 “E possivel que o teritanium da cvitas Aredia se ficasse, na margem Norte do Douro, um pouco aquém do Matao, talver pelo mons"Toeraze, que julgamos poder identificar com a actual Serra da Aboboreira Cir DR132, DRI 187e DRI307 7 DC 157 (989), MA IH (1038), DC 424 (1060), DC 428 (1061). OC 432 = DC 255 (1062), DC 821 (1095). DP M1 65 (1102), BP il 250 [1107), DP Ill 352 (1110), DP TV 66 (1119), MA 49 (1125) e LTPS 119 (1147) * $6 no segundo destes locals estd materialmente comprovada a ocupagéo alti-medieval, carecendo os restantes de provas que s6 uma mais demorada investigacéo ix situ poderé fornecer *DC 25. diploma falso, datado de 922 mas redigido cerca de [1115-6] cf, MATTOSO 1968: 9 e OLIVEIRA M. 1956) "Sobre o tragedo desta via, respectivas referencias documantais e fortificagoes adjacentes, veja-se LIMA 1993 Bless. 407

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