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Gustavo Corção
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A polícia, por definição, é um instituto montado para promover a ordem da
sociedade, mas já temos observado circunstâncias em que é a própria polícia
que traz a desordem. Um exército, por definição, é um órgão destinado a
garantir a segurança de uma nação; mas existem exércitos aparelhados para
sua finalidade própria, que só funcionam como piramidal organização destinada
a dar prestígio político a um oneroso mandarinato de generais. Tudo isso são
sinais de enfermidade social, e não provas da malignidade daquelas
instituições.
Ora, por escandalosa que possa parecer tal afirmação é no ócio, no lazer, no
descanso ou na vadiação que o homem atinge, ou pode atingir, a plenitude de
sua condição. O trabalho, em outras palavras, não tem caráter de fim. É um
meio. A vida humana está condicionada para o trabalho. Metafisicamente, é
mais importante chegar à casa do que chegar ao local do emprego; é mais
elevado, mais plenamente humano, levar o filho ao jardim zoológico, ouvir um
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quarteto de Bocherini, conversar com os amigos, do que ser general do
exército, engenheiro ou presidente da república. Todos os títulos extrínsecos
são inferiores ao título fundamental que todos possuem em casa, quando
encontram o cerne de sua personalidade e recuperam o nome de batismo.
E não se diga que o problema do lazer é só dos abastados. Será dos povos
abastados, mas aí a todos interessará. Não é do ócio dos ricos que estão
cuidando os dirigentes americanos; é do ócio de todos. Mas o que entrevi do
problema não me tranqüilizou. Ou melhor, me trouxe outro problema: o
problema dos psicólogos, políticos e sociólogos que estão abordando o
problema do lazer. A tendência geral, ao sabor da mentalidade americana, é a
de promover os recursos e meios para encher o tempo disponível. Eles querem
organizar, ao lado da máquina da produção, a máquina do passa-tempo. A
solução verdadeira, a única a rigor, está no desenvolvimento espiritual que
deve acompanhar o desenvolvimento técnico. Se isto não for feito nós veremos
um mundo em que a força espiritual dos homens, numa espécie de magia
como a do "Retrato Oval" de Edgar Poe, se transferirá para as máquinas. Mas
não é esse caminho o da valorização do lazer, que estão tomando. Ao que
parece, a solução procurada está na linha do divertimento e do passatempo. E
não há maneira mais imprópria, mais anti-humana de resolver o problema das
horas livres. A rigor, o modo correto de resolver o problema é o de providenciar
para que não haja técnico. Se isto não for feito no esquema pragmático, o lazer
será sempre, definitivamente um problema, um medíocre e triste problema.
Onde iremos hoje? E amanhã? Consultemos o cardápio oficial, tiremos para o
caso peculiar de nossos nervos e de nosso orçamento, uma dieta de prazeres
que nos escamoteiem as horas que sobram.
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penso desse esquema de matar o tempo, releia o seu Pascal. Lá verá, num
denso e definitivo resumo, toda a filosofia do divertimento; e então se
convencerá que não há pior receita para um povo e para uma civilização do
que esta que está em vigor nos países superdesenvolvidos: produzir e divertir-
se.