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Psicologia em Pesquisa | UFJF | 3(02) | 13-22 | julho-dezembro de 2009

Contribuições da Psicologia do Envelhecimento para as práticas clínicas com idosos

Contributions of the Psychology of Aging for clinical practice with older

Samila Sathler Tavares Batistoni I

RESUMO
O presente ensaio teórico buscou trazer uma revisão de alguns avanços que a temática do envelhecimento
proporcionou ao saber psicológico a partir da última metade do século XX, principalmente no que se refere à
consolidação do campo teórico da Psicologia do Envelhecimento. Apontou ainda como esses avanços
trouxeram implicações para as práticas clínicas em Psicologia e Gerontologia. O texto também destaca as
considerações feitas pela literatura no campo da Psicologia Clínica a respeito da importância da atuação com
idosos e das variáveis a serem levadas em conta no desenvolvimento de práticas mais eficazes com essa
população.

Palavras-chave: Envelhecimento; Psicologia do Envelhecimento; Práticas clínicas; Gerontologia;

ABSTRACT
This theoretical essay aims to bring a review about some advances that the topic of aging has brought for the
psychology from de half of last century, mainly regarding the consolidation of the theoretical field of the
Psychology of Aging. The article describes the implications of such developments have for assistance in
Psychology and Gerontology. The text also aims to highlight the considerations made by the literature in the
field of applied psychology on the importance of interventions with older and the variables to be taken into
account in developing more effective practice with this population.

Keywords: Aging; Psychology of Aging; Psychological practices; Gerontology;

________________________
I
Escola de Artes, Ciências e Humanidades – EACH – USP - São Paulo

O processo de envelhecimento e a Para a realização dessas tarefas,


heterogeneidade da velhice têm se destacam-se as contribuições advindas da
constituído em um dos temas consolidação do campo da Psicologia do
desafiadores à Psicologia enquanto Envelhecimento à luz do paradigma life-
“ciência do comportamento e dos span, que tem lançado os fundamentos
fenômenos mentais”, principalmente após para os saberes ligados às questões dos
a segunda metade do século XX. As idosos, da velhice e do processo de
várias subdisciplinas básicas e aplicadas envelhecer e, ao mesmo tempo, tem
da Psicologia, tais como a Psicologia do promovido e se alimentado de um maior
Desenvolvimento, a Psicologia Social, a diálogo com as demais subdisciplinas
Psicologia Clínica e a Psicologia do teóricas e campos de aplicação da
Trabalho e das Organizações, ainda estão Psicologia, dentre elas, com a Psicologia
em processo de revisão, ampliação e Clínica. Como efeitos desses avanços,
modificação de paradigmas, metodologias outros campos do saber, tais como a
de pesquisa e formas de atuação para Gerontologia, têm podido se apropriar e
responder a esse objeto de conhecimento se beneficiar do saber psicológico, pois,
e intervenção. em conjunção com a Biologia e

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Sociologia, a Psicologia é uma das influências de natureza socioculturais


ciências que compõem seus pilares. (tais como gênero, coortes, papéis),
O presente texto traz uma revisão socioeconômicas (tais como educação e
da importância da consolidação do campo renda), psicossociais (como os
teórico da Psicologia do Envelhecimento mecanismos de autorregulação do self) e
e de suas implicações práticas para as biológicas (como o status de saúde e
intervenções clínicas em Psicologia e funcionalidade física) atuantes ao longo
Gerontologia. O texto destaca ainda as de toda a vida.
variáveis que devem ser levadas em conta Além do refinamento
pelos profissionais que lidam com o metodológico da pesquisa sobre o
envelhecimento para o desenvolvimento envelhecimento, a consolidação da
de práticas eficazes com essa população. Psicologia do Envelhecimento
possibilitou, entre outros ganhos, um
maior diálogo entre as próprias
Psicologia do Envelhecimento: subdisciplinas da Psicologia (como a
influências sobre as práticas com Psicologia Cognitiva, a Psicologia da
idosos Aprendizagem, a Psicologia Social e a
Psicometria) na tentativa de descrever e
No intuito de compreender os explicar tanto os processos de declínio
processos ulteriores à adolescência e à quanto os de manutenção e
vida adulta inicial no que concerne à desenvolvimento em domínios
cognição, relações sociais, afetos, metas psicológicos específicos na velhice.
desenvolvimentais e adaptação, a Assim, vários modelos e teorias dos
Psicologia do Envelhecimento passou da diversos campos da Psicologia têm se
simples comparação etária entre jovens e tornado, na Psicologia do
idosos (“Psicologia da idade”) e do Desenvolvimento, orientados ao
reconhecimento da velhice, enquanto considerar a multidimensionalidade e
estágio desenvolvimental com tarefas de multidirecionalidade do processo de
adaptação, integração e aceitação da envelhecer e uma compreensão mais
morte (“Psicologia do idoso”) para o refinada das implicações desse processo
estabelecimento de uma subdisciplina para as dimensões da vida prática como
metodologicamente complexa (Batistoni, as do trabalho, lazer, relações sociais e
Yassuda e Fortes, 2007). Influenciada familiares (Baltes, Lindenberger &
pelo diálogo e cooperação com outras Staudinger, 2000).
áreas do saber, como a Biologia e a O diálogo da Psicologia do
Sociologia, a Psicologia do Envelhecimento com as diversas
Envelhecimento avançou nos aspectos subdisciplinas psicológicas geraram a
relativos ao planejamento e estratégias de configuração de um arcabouço lógico de
pesquisa e na integração de outras saberes em torno de microteorias e
variáveis que não apenas a idade na micromodelos explicativos sobre
explicação de fenômenos domínios específicos do envelhecimento,
multidimensionais e multicausais (Neri, os quais têm contribuído também na
2002). À luz do paradigma life-span de aplicação a realidades particulares,
compreensão do desenvolvimento visando-se à solução de problemas
humano, a heterogeneidade intra e humanos. Dentre os modelos e teorias,
interindividual do envelhecimento é frutos dessa interlocução e já
observada a partir da consideração das considerados clássicos nesse campo,

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destacam-se quatro contribuições que 1994), busca explicar o declínio nas


envolvem temas salientes na velhice, interações sociais e as mudanças no
como adaptação, autonomia e comportamento emocional dos idosos.
dependência, regulação emocional e Segundo a autora (e evidências de
qualidade de vida. Tais contribuições têm pesquisa sobre o tema), a redução na
impactado de forma contundente as amplitude da rede de relações sociais e na
práticas psicológicas com idosos (Cerrato participação social na velhice reflete a
& Trocóniz,1998). redistribuição de recursos
Teoria SOC - A teoria de Seleção, socioemocionais pelos idosos, na medida
Otimização e Compensação de Baltes e em que há mudança na percepção de
Baltes (1990) buscou estabelecer como os tempo futuro. De forma adaptativa, na
indivíduos podem efetivamente manejar velhice passam a ser mais relevantes o
as mudanças nas condições biológicas, envolvimento seletivo com
psicológicas e sociais que se constituem relacionamentos sociais próximos que
em oportunidades ou restrições para os ofereçam maior retorno emocional. Tais
seus níveis e trajetórias de alterações adaptativas permitem aos
desenvolvimento. Interessa a essa teoria a idosos poupar recursos escassos, canalizar
maneira como as pessoas alocam e para alvos relevantes e otimizar o seu
realocam seus recursos internos e funcionamento afetivo e social. Essa
externos por meio desses três processos e teoria traz implicações, por exemplo, para
como, simultaneamente, maximizam o trabalho clínico com idosos no campo
ganhos e minimizam as perdas ao longo dos relacionamentos sociais e sobre as
do tempo. A função de seleção diz estratégias de regulação emocional.
respeito à especificação e à diminuição da Dependência aprendida -
amplitude de alternativas permitidas pela Desenvolvida por Margareth M. Baltes na
plasticidade individual. A otimização diz década de 1980 e 1990 (Baltes, 1996)
respeito ao gerenciamento dos recursos revela o fenômeno da dependência na
visando alcançar níveis mais altos de velhice como multidimensional,
funcionamento. A compensação envolve relacionando-se com os mais diversos
a adoção de novas alternativas para fatores como: incapacidade, motivação,
manter o funcionamento. A teoria SOC práticas discriminativas, desestruturação
pode ser incorporada, por diferentes ambiental. Ela não é identificada como
perspectivas teóricas em Psicologia, característica da velhice, mas ela se
incluindo a comportamental, cognitiva, à manifesta diferentemente ao longo de
de ação social-cognitiva e a diferentes toda a vida. Para Margareth M. Baltes, a
processos como memória, funcionamento dependência tanto significa perdas (no
físico e a domínios do bem-estar tanto no sentido de que dificulta o engajamento
desenvolvimento e envelhecimento em ações que promovem a sua
normal ou patológico. Por isso é funcionalidade física e psicossocial)
apontada como um meta-modelo do quanto ganhos, na medida em que ajuda
desenvolvimento humano, influenciando as pessoas a obter atenção, contato social
a emergência de outras tais teorias como a e controle passivo e que as auxilia a
da Seletividade Socioemocional. preservar, canalizar e otimizar energias
Teoria da Seletividade para outros objetivos, funcionando como
Socioemocional- Desenvolvida por Laura estratégia adaptativa. Entre outras
L. Carstensen e colaboradores, na década contribuições, essa teoria traz implicações
de 1990, (Carstensen & Turk-Charles, principalmente para a prática com idosos

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frágeis, hospitalizados e Frente aos desafios do próprio


institucionalizados, pois a identificação processo de envelhecimento e do aumento
de padrões de dependência não das demandas por produtos e serviços
adaptativos pode ser corrigida na medida deflagrados pelo envelhecimento
em que os profissionais invistam na populacional, os campos de aplicação da
criação de novas contingências, Psicologia vêm incorporando os conceitos
estimulando o senso de agência na da Psicologia do Envelhecimento e
compensação de perdas e maximização da modelos baseados na perspectiva life-
autonomia, mesmo na presença de span nas práticas com idosos nos diversos
incapacidades. domínios psicológicos e contextos de
Construto de Qualidade de vida atuação (Woods & Clare, 2008). Como
na velhice de Lawton - Visa descrever a entre outros grupos etários, as
percepção que o indivíduo idoso tem a modalidades de atuação psicológica
respeito de suas relações atuais, passadas passaram a envolver uma ampla gama de
ou prospectivas com o seu ambiente. Diz possibilidades de trabalho, configurando-
respeito a uma avaliação se num “continuum de cuidados”, desde
multidimensional vinculada a critérios modificações ambientais e ecológicas,
socionormativos e intrapessoais. O institucionais até intervenções que visam
modelo de Lawton (1985) descreve a a mudanças comportamentais e
qualidade de vida em termos de quatro intrapsíquicas (humor, bem-estar,
dimensões: Competência comportamental ajustamento, atitudes, tendências da
– a avaliação do funcionamento do personalidade) e ser desenvolvidas em
indivíduo no tocante à saúde, nível individual, familiar ou grupal (Neri,
funcionalidade, cognição, comportamento 2004).
social e utilização do tempo; Condições Evidências atuais de pesquisa têm
Ambientais - diz respeito ao contexto demonstrado que idosos são responsivos
ecológico e construído e tem relação às intervenções psicológicas mais
direta com a competência diversas (Areán, 2003). Tais evidências
comportamental; Qualidade de vida apontam para a necessidade, portanto, de
percebida – avaliação subjetiva que a que também a Psicologia aplicada atente
pessoa faz de seu funcionamento em para as variáveis desenvolvimentais não
qualquer domínio das competências só na investigação, mas também na
comportamentais (como saúde percebida, implementação e avaliação das
etc.); Bem-estar subjetivo – reflete a intervenções psicológicas com idosos, o
avaliação pessoal sobre o conjunto e a que exige, por parte dos profissionais da
dinâmica das relações entre as três áreas área, um domínio de conhecimentos
precedentes, gerando indicadores específicos.
cognitivos (como graus de satisfação) e
emocionais (como estados afetivos). O
construto de Lawton auxilia o processo de Conhecimentos necessários para a
investigação e intervenção nos mais prática com idosos: diálogo com a
diversos âmbitos, principalmente devido Psicologia Clínica
ao foco no senso de ajustamento entre o
indivíduo e seu meio, gerando, por Em 2004, a revista American
exemplo, provisão de serviços de Psychologist publicou um guidelines da
adequação ambiental. Associação Americana de Psicologia para
a prática psicológica com idosos. Neste

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documento, os psicólogos são distintos. Com o envelhecimento, há


encorajados a trabalhar suas atitudes e considerável heterogeneidade dentro de
crenças sobre o envelhecimento e sobre grupos diagnósticos, tais como nos
indivíduos idosos à luz dos avanços transtornos depressivos, a qual tem
científicos da Psicologia do importantes implicações para o
Envelhecimento, tanto quanto buscar tratamento (Blazer, 2003).
conhecimentos sobre as teorias sociais, Sobre a importância dos processos
biológicas, cognitivas dos processos de de adaptação ao longo da vida, os autores
envelhecimento, principalmente dentro de trazem a reflexão de que os idosos
um paradigma life-span. No campo provavelmente diferem nas respostas ao
clínico, o documento enfatiza a tratamento que depende de suas histórias
necessidade de que os psicólogos estejam prévias de funcionamento, suas
familiarizados com o conhecimento experiências de sucesso ou falha em
corrente sobre as mudanças cognitivas, outros tratamentos ou história de
sobre os problemas e vida diária dos problemas crônicos ou não resolvidos
idosos, sobre as características peculiares (Rainsford, 2002). Normas etárias
das psicopatologias e metodologias de também contribuem para o
avaliação válidas e confiáveis para serem desenvolvimento de um construto pessoal
utilizadas com essa população. de curso da vida, sendo importante atentar
Carstensen, Elderstein e para a idade do ponto de vista do próprio
Dornbrand (1996) já apontaram paciente e utilizar a experiência e os
anteriormente domínios e aspectos conhecimentos acumulados pelo
específicos do envelhecimento que devem indivíduo ao longo da vida.
ser levados em conta uma intervenção O conhecimento do contexto de
eficaz com idosos. Em conformidade com intervenção e de outras características
o documento da Associação Americana individuais dos idosos são dimensões de
de Psicologia, os autores trazem conhecimento que ajudam a balizar as
justificativas sobre a necessidade de prioridades na elaboração e
conhecimentos específicos em, pelo implementação da atuação psicológica,
menos, cinco aspectos do envelhecimento uma vez que os contextos (tais como os
- funcionamento cognitivo, diagnósticos institucionais ou comunitários) implicam
de saúde física e mental, padrões de diferentes características
adaptação ao longo da vida, idade socioeconômicas, culturais, de
cronológica, contextos de intervenção e funcionamento social, de cognição e
características individuais – que exigem saúde física entre os idosos que deles
também um manejo específíco, conforme fazem parte. Finalmente, Carstensen,
descrito a seguir. Elderstein e Dornbrand (1996) ressaltam
No que tange ao funcionamento que atentar para as diferenças de gênero
cognitivo, os autores salientam que a no relato de problemas psicológicos e
influência de alterações patológicas tem responsividade a intervenções
implicações específicas na eficácia de psicologicamente orientadas é também
uma intervenção e suas respostas em uma tarefa importante.
curto ou em longo prazo. No campo das Esta revisão de aspectos do
psicopatologias consideram a necessidade envelhecimento a serem conhecidos
do conhecimento de algumas revela o quanto os campos de aplicação
especificidades no estabelecimento de da Psicologia se beneficiam da
intervenções para grupos diagnósticos interlocução entre a teoria e a prática. Em

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especial, a Psicologia Clínica está entre os problemas que se associam às mudanças


campos que têm fornecido evidências concomitantes ao envelhecimento
positivas dessa interlocução propiciando (Knight, 2004).
auxílio ao trabalho de diversos Posto que ainda hoje existam
profissionais que lidam com o muitas razões pelas quais os idosos nem
envelhecimento (Woods & Clare, 2008). sempre são alvo de intervenções
Cabe ressaltar, contudo, que, do psicológicas (tais como o ageímo – Neri,
ponto de vista histórico, os idosos eram 2004), houve, principalmente a partir da
considerados incapazes de se beneficiar década de 1990 e dos aprimoramentos das
integralmente de intervenções psicoterapias cognitivo-comportamentais,
psicológicas, sendo tal concepção já uma mudança paradigmática na
registrada por Freud em 1905, ao revelar concepção do trabalho clínico com idosos
que, entre as limitações da psicanálise, (Ladlaw et al, 2003). No que tange às
estava o trabalho com indivíduos acima psicoterapias, Areán (2003), em extensiva
de 50 anos devido aos limites da revisão da literatura, identificou fortes
plasticidade dos processos mentais e por evidências quanto à eficácia da
não serem “educáveis”. As primeiras abordagem cognitivo-comportamental na
atuações clínicas com idosos, muitas depressão do idoso e da terapia
delas baseadas em teorias de estágios interpessoal unida ao uso de
desenvolvimentais (tais como as de Erik antidepressivos. Apontou também a
Erikson de 1950 e Butler de 1963; ver efetividade das abordagens cognitivo-
Neri, 2002) e em alguns princípios de comportamentais no controle da
aprendizagem comportamental, ansiedade, no âmbito da sexualidade e
utilizavam-se apenas técnicas de nos problemas de adicção, como o
reminiscências e terapias de revisão de alcoolismo entre idosos e, ainda, na
vida, de orientação para a realidade ou de atuação com cuidadores de idosos
contenção de sintomas comportamentais, dependentes. Menores evidências na
principalmente com idosos que exibiam intervenção sobre a depressão foram
sintomas depressivos, e idosos em encontradas para a terapia interpessoal
processos demenciais e sozinha, para as psicoterapias breves
institucionalizados (Laidlaw, Thompson, psicodinâmicas e terapias de revisão de
Dick-Siskin & Gallagher-Thompson, vida.
2003). Autores como Rainsford (2002),
Embora o emprego das técnicas Areán (2003) e Knight (2004) fazem
citadas refletisse um diálogo com a teoria, algumas considerações especiais no
as intervenções restritas a essas técnicas trabalho clínico com idosos. Segundo
implicaram, por um tempo, a concepção esses autores, aspectos relativos ao
de que não há muito o que o idoso possa relacionamento terapêutico, à
fazer frente a sua situação psicológica, a possibilidade de flexibilização de técnicas
não ser aceitá-la e integrá-la a seu senso clássicas aplicadas a adultos jovens e ao
de história pessoal, ou contê-los através domínio de conhecimentos específicos
de princípios comportamentais. Também sobre o envelhecimento (tais como os já
implicou uma concepção de que os apontados por Carstensen, Elderstein e
problemas psicológicos na velhice são Dornbrand, 1996) precisam ser
fruto da inabilidade do idoso em aceitar o manejados para promover a eficácia das
seu passado, mais do que do proveniente abordagens clínicas.
do estresse ou inabilidades para enfrentar

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Rainsford (2002) destaca a (2004) para auxílio no trabalho


necessidade de atenção a possíveis fontes psicoterápico com idosos, que também
de dificuldades na dinâmica transferencial pode ser ampliado para uso em qualquer
com terapeutas mais jovens, intervenção psicológica com idosos.
manifestando-se sob a forma de Baseando-se na Psicologia do
supercontrole ou de superproteção, desenvolvimento life-span, na
gerando angústias contratransferenciais Gerontologia social e em suas
(idosos podem infantilizar o terapeuta ou experiências clínicas, ele denomina o
o terapeuta projetar experiências modelo de CCMSC, cuja sigla refere-se
familiares ao paciente). Também chama aos termos: Context (contexto), Cohort
atenção para a centralidade da saúde (coorte), Maturation (maturação ou
física no discurso do idoso, que tende a se variáveis desenvolvimentais), Specific
queixar dos problemas psicológicos em Challenges (desafios específicos, frutos
termos somáticos, e a tendência dos da heterogeneidade do envelhecer).
terapeutas em enfocar “problemas da Dentre esses termos, um dos aspectos
velhice” tais como as doenças, o luto ou a interessantes levantados pelo modelo de
aposentadoria. Geralmente, as demandas Knight é a atenção para as diferenças
do idoso que buscam terapia não são entre coortes ou a consideração de grupos
pelas questões normativas da velhice e, geracionais mais do que grupos etários no
sim, por aquelas nas quais os idosos trabalho clínico. Em publicação de 2008,
manifestam menor senso de controle ou Knight e Lee defenderam, por exemplo,
autoeficácia no enfrentamento, muitas que idosos são especialmente responsivos
delas fruto de mudanças não normativas a contextos de escuta, talvez por não ser
ou inesperadas (Aldwin,1994). uma experiência usual (por questões de
Permitindo extensão a outras coorte).
práticas de atenção psicológica ao idoso, Adicionalmente às contribuições
Areán (2003) defende adaptações à de Rainsford (2002), Areán (2003) e
psicoterapia com idosos, cujo produto Knight (2004), cabe a introdução de dois
seria o que chamou de “psicoterapias outros aspectos importantes derivados da
apropriadas à idade”. Segundo a autora, Psicologia do Envelhecimento que fazem
práticas psicológicas baseadas numa interlocução com o manejo das
perspectiva cognitivo-comportamental intervenções clínicas com idosos. Estes
mostram grande possibilidade de aspectos são a necessidade de um enfoque
adaptação e flexibilização, além de nos recursos psicológicos e na resiliência
evidências de eficácia na literatura dos idosos. As pesquisas de Aldwin e
internacional. Para isso, tais adaptações colaboradores (Aldwin, 1994; Aldwin,
deveriam incluir psicoeducação dos Levenson & Kelly, 2008), por exemplo,
pacientes, ajustes frente às alterações demonstram que os idosos geralmente são
cognitivas no processamento das mais resilientes e eficientes do que os
informações, embasamento no que é adultos mais jovens em suas respostas de
preconizado como estágio enfrentamento ao estresse psicológico.
desenvolvimental e flexibilização do Sendo assim, nas intervenções com
tratamento frente às limitações funcionais idosos, torna-se importante resgatar os
e contextos sociais. seus potenciais, acionar suas reservas
Outra colaboração advinda da sociais, emocionais ou cognitivas e
Psicologia Clínica é o modelo heurístico possibilitar o exercício da autonomia, por
transteórico desenvolvido por Knight meio de investimento no senso de

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autoeficácia e controle, mesmo em para a tomada de decisões na gestão de


situações de dependência física. serviços (Neri, 2004).
Complementarmente, a colaboração entre
os estudos da Psicologia Positiva e os
modelos de seleção, otimização e CONSIDERAÇÕES FINAIS
compensação de Baltes e Baltes (1990)
fortalecem a concepção de que as metas Frente aos desafios que o
de intervenção com idosos devem envelhecimento impõe ao saber
estimular e evidenciar suas habilidades e psicológico e às relações deste com área
competências pessoais, seu senso de tal como a Gerontologia, torna-se
autoeficácia, de controle percebido, de essencial que estudiosos e profissionais
engajamento social, dos benefícios das dessas áreas empenhem esforços
experiências adversas, sua espiritualidade deliberados na construção de
ou habilidades para relaxar, visando conhecimentos e práticas
ampliar seus recursos de enfrentamento contextualizadas e também na busca de
como também o senso de bem-estar especificidades e generalidades quanto à
destes (Staudinger, Marsiske & Baltes, velhice e ao envelhecimento que
1993). retroalimentarão tanto a ciência
A utilidade das contribuições da psicológica quanto aos demais campos de
interlocução entre a Psicologia do que dela se beneficiam. De maneira geral,
Envelhecimento e a Psicologia Clínica depreende-se do diálogo entre a
não se limita apenas ao âmbito de Psicologia do Envelhecimento e a
trabalho do profissional psicólogo. Psicologia Clínica que, no planejamento,
Outros profissionais, cuja formação tem a avaliação e implementação das
Psicologia como seu pilar (tais como abordagens clínicas com idosos, é
terapeutas ocupacionais e gerontólogos), necessário, além de dominar os
têm derivado da Psicologia do conhecimentos da Psicologia do
Envelhecimento metodologias e Envelhecimento, adaptar-se criativamente
estratégias de intervenção. e aprender a usar os conhecimentos
Em especial, podem ser destacadas clínicos em diversos contextos
as contribuições da Psicologia a socioculturais e de cuidado à saúde,
Gerontologia - um campo científico mais flexibilizar técnicas ou metas e dar
recente de estudo específico do preferência a modalidades de intervenção
envelhecimento humano em suas focais e breves ajustadas aos desafios
dimensões biopsicossociais. Além das específicos ligados ao indivíduo ou grupo
contribuições metodológicas, de alvo da intervenção.
operacionalização de conceitos, de Tais tarefas são ainda mais
fornecimento de instrumentos de pesquisa prementes no contexto da Psicologia
e avaliação, no campo de aplicação brasileira, uma vez que esta ainda está em
clínica do gerontólogo, esse processo de delineamento no campo dos
conhecimento instrumentaliza o saberes relativos ao envelhecimento. A
profissional ao fornecer métodos e maioria das teorias, práticas e evidências
técnicas de manejo das questões de pesquisa são baseadas em achados
psicológicas do envelhecimento, assim internacionais, havendo a necessidade de
como as bases para a prática do que o profissional psicólogo derive de
aconselhamento de idosos e familiares e suas teorias e técnicas subsídios para uma

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prática sensível às reais necessidades dos Gerontology: Medical Sciences, 58A


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Envelhecimento e práticas clínicas 22

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