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Resumo:
Este artigo procura compreender a trajetória e a inserção do conceito de
corporativismo nos contextos europeu e brasileiro. Para isso, está estruturado de maneira a
permitir uma compreensão mais genérica do conceito para então, analisar a maneira pela qual
esse conceito se insere nessas duas conjunturas e as transformações e adaptações que ele
sofreu em cada um dos casos. Neste sentido, o corporativismo é um conceito fundamental
para entender o panorama político da primeira metade do século XX.
Palavras-chave: Corporativismo, Política e Autoritarismo.
1
Graduado em História pela UFRRJ/IM. Membro do grupo de pesquisa: Revendo a relação entre o movimento
operário e Estado na América Latina: O sindicalismo classista no México, Argentina e Brasil, coordenado pelo
Prof. Dr. Alexandre Fortes.
Tendo base neste panorama, o objetivo principal deste breve estudo é o de contribuir
fornecendo indicações e perspectivas para um melhor entendimento do conceito através de
uma análise de suas trajetória e aplicação prática em determinados contextos históricos.
Para se entender o conceito e sua aplicação nas Ciências Humanas e Sociais, faz-se
necessária uma breve caracterização, seguida de uma explanação de seu desenvolvimento. De
maneira geral, o corporativismo é entendido como uma doutrina ou sistema sócio-político
baseado na representação dos interesses dos grupos sociais junto ao Estado ou às esferas mais
altas de poder em função de atividades profissionais, tendendo à harmonia entre esses setores
para a realização de um bem comum, algo maior que extrapola os interesses definidos de cada
grupo social.
Do corporativismo Europeu.
“A grande diferença entre a direita fascista e não fascista era que o fascismo
existia mobilizando massas de baixo para cima. Pertencia essencialmente à era da
política democrática e popular que os reacionários tradicionais deploravam, e que
os defensores do “Estado orgânico” tentavam contornar.” (HOBSBAWN, 1995. p.
121)
O corporativismo brasileiro.
Sobre o primeiro aspecto, a autora afirma que se desenvolveu no Brasil uma tradição
de estudos que visam esclarecer os termos da formação de atores coletivos e a participação
desses atores no espaço público brasileiro. Neste sentido, a análise de alguns trabalhos
clássicos como o de Wanderley Guilherme dos Santos e de Elisa Pereira Reis dá
fundamentação à tese de que, no período em questão, havia uma restrição da atuação de
amplos setores da sociedade no âmbito das representações político-partidárias, em que pesem
na questão as análises das ambigüidades e limites do liberalismo brasileiro presente na
Primeira República, e uma valorização da atuação através da esfera político associativa ou do
associativismo de classe. Contraria-se assim o já referido discurso que propunha a ausência de
instituições associativas e de representação na Primeira República.
Para o entendimento das razões que levam à formulação de tal discurso, a autora se
dedicou à analise da obra de Oliveira Vianna. Ela ressalta que, para este pensador, o problema
principal residiria na desarticulação do povo na primeira República. Ele até percebia as
intensas movimentações sociais que estavam ocorrendo durante a Primeira República,
entretanto, a negação em seu trabalho dessa tradição associativa, se deve à intenção deliberada
de se fazer esquecer, ou no mínimo de não considerar, a experiência de representação desse
período, por ter uma concepção própria do que consistiria o corporativismo. Para ele,
“corporativismo era a forma de estabilizar a ordem política e faze-la promotora do
desenvolvimento econômico, ampliando-se a participação do povo”. (GOMES, 1991. p. 56)
Esse processo de implantação de um discurso e mesmo da implantação efetiva de uma
ordem corporativista ganha reforço no Estado Novo. Nesse momento ocorre um
distanciamento do projeto político de Vianna do projeto efetivamente implementado por
Vargas. No modelo corporativista de Vianna, o partido é substituído pelo sindicato
corporativo como canal preferencial de representação dos interesses dos grupos sociais. Isso
se concretiza no projeto Varguista através da implementação das leis trabalhistas. Contudo, o
afastamento ocorre a partir do momento em que, através da ideologia trabalhista, ocorre uma
aproximação entre o sindicato e o partido.
“Portanto, os anos que medeiam 1942 e 1945 são chaves para a implementação do
“corporativismo brasileiro”, que se mostra flexível, ganha legitimidade com a
ideologia trabalhista e começa a ser preparado para conviver com partidos
políticos. É neste contexto que nasce o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB),
competindo com o tradicional Partido Comunista (PC) e destinado a se aproximar
dos sindicatos de trabalhadores, contrariando a norma separatista de Vianna.”
(GOMES, 1991. p. 60)
Esta autora, por sua vez, desenvolve estudo altamente contributivo no sentido de
delimitar as influências do chamado “corporativismo católico”, no Brasil. Esta tradição
remete diretamente à definição antes referenciada de corporativismo tradicional. Baseia-se
numa concepção antiliberal da sociedade, propõe a divisão e estruturação social em função
das corporações ou associações profissionais tendo em vista sempre a coletividade ou o bem
comum, aqui identificado ao ideal de justiça social.
No caso brasileiro, porém, não aspirava à volta de uma tradição medieval. Aceitava a
inevitabilidade das transformações decorrentes da Revolução Francesa contudo, opunha à
agressividade do ideal liberal a noção de justiça social calcada na idéia bastante difundida da
incapacidade do capitalismo de resolver os problemas sociais. A noção de justiça surgia como
órgão supremo norteador da sociedade que prezava a cooperação entre as todas as
corporações, através principalmente da caridade cristã, em função do bem maior da
coletividade.
A ação da Igreja católica no período era desempenhada pelos círculos Operários e da
Ação Católica, que prezavam pela adoção de um projeto integral de corporativismo,
predominando entre nós o que a autora designa por “traços secundários”, tais como
assistência social, mutualismo e cooperativismo. Não se podendo desprezar, contudo,
“Era uma contradição o fato de a nova ordem democrática estar sendo gestada
com a expedição de decretos-leis por parte do Executivo. Assim, apesar da queda
do estado Novo, o novo Presidente da República, democraticamente eleito, ainda
governava por decretos-lei.” (CARVALHO, 2009. p.5)
Considerações finais.
Com base nos relatos acima, resta-nos afirmar que, guardadas as devidas proporções, o
corporativismo no Brasil sempre esteve associado ao desenvolvimento do Estado autoritário,
como um instrumento de dominação e controle da atuação das classes populares no espaço
público brasileiro. Neste sentido, a maioria dos estudos se concentra na análise do aparelho
estatal varguista, período considerado fulcral para o entendimento dos limites impostos pelo
estado à mobilidade dos populares na sociedade, principalmente através da legislação
trabalhista.
Essa tendência só há bem pouco tempo vem sendo relativizada pela historiografia
brasileira, como podemos ver nas indicações de Ângela de Castro Gomes (GOMES, 1991).
Esse movimento que se inaugurou na historiografia brasileira deve suas contribuições, acima
de tudo, à tradição de estudos historiográficos que, a partir dos anos 80, tenderam a questionar
certos paradigmas de análise como, por exemplo, a pretensa manipulação da classe
trabalhadora pelo Estado Populista.2
Apesar dos esforços recentes, fica a indicação da necessidade de um maior
aprofundamento sobre o tema, no sentido de aproveitar a indicação feita por Eley, de que
mesmo em essência teórica corporativismo e liberalismo sejam instâncias conflitantes, o
desenvolvimento histórico efetivo nos mostra que na prática, os acontecimentos podem
determinar o surgimento de processos e sistemas políticos “híbridos”, forjados na combinação
de elementos diametralmente opostos. Mostra ainda que, se durante muito tempo,
corporativismo foi associado ao cabedal político de perspectivas da direita, o contrário não é
necessariamente incorreto. Como pudemos ver no caso europeu, medidas corporativistas
foram tomadas por governos situados à esquerda no espectro político, sem que isso
determinasse a perda de sua essência.
Para finalizar, cumpre ressaltar a indicação feita por Daniel Aarão Reis de que, no
caso brasileiro, o Estado corporativista inaugurado na década de 30 (que o autor denomina
nacional-estatismo) foi esvaziado de todo o seu conteúdo esquerdista. Advogando a
necessidade de realocá-lo, então, no campo político das esquerdas, provoca-se uma séria
inversão de perspectiva que, por enquanto, ainda está por ser dimensionada.
“Assim, essa tradição até hoje é muito mal estudada, a rigor, nem sequer
considerada no campo das esquerdas. Trata-se, a meu ver, de um erro de avaliação
e de uma injustiça histórica, resultando em muitas perdas, porque, como sabemos, a
melhor maneira de sermos dominados pelas tradições é ignora-las.
Penso, portanto, que é preciso examinar com atenção a tradição nacional-
estatista, ou trabalhista, integrando-a, com seus múltiplos aspectos, no campo
diversificado das esquerdas brasileiras.” (REIS, 2005. p.176)
1
NOTAS
Este termo não aparece em momento algum no artigo ora referenciado, sendo de inteira
responsabilidade da interpretação efetuada pelo autor do presente texto.
2
Desnecessário dizer de que maneira o desmantelamento do arcabouço teórico do populismo pela
historiografia recente influenciou nos estudos acerca do tema do corporativismo brasileiro, já que
parece ser evidente a relação ou referência ao conceito para legitimar a tão propalada manipulação de
classe.
BIBLIOGRAFIA
ELEY, Geoff. Forjando a democracia. A história da esquerda na Europa, 1850-2000. São Paulo:
Editora Fundação Perseu Abramo, 2005.
GOMES, Ângela de Castro. Os paradoxos e os mitos: o corporativismo faz 60 anos. Revista Análise e
conjuntura, v.6, nº 2, 1991. Disponível em pdf em:
http://www.fjp.mg.gov.br/revista/analiseeconjuntura/viewarticle.php?id=225&layout=abstract.
Acessado em: 07/12/2009.
HOBSBAWM, Eric. A era dos Extremos. O breve século XX 1914-1991. São Paulo: Companhia das
letras, 1995.
REIS FILHO, Daniel Aarão. As esquerdas no Brasil. Culturas Políticas e tradições. In. FORTES,
Alexandre (org.). História e perspectivas da esquerda. São Paulo/Chapecó: editora Fundação
Perseu Abramo/Argos, 2005.
SOUSA, Jessie Jane Vieira de. Uma sociedade juxta totum naturare ou um corporativismo incompleto?
Topoi, v.7, n. 13, jul. - dez. 2006, pp. 424-444.
SOUZA, Francisco Martins de. Raízes teóricas do corporativismo brasileiro. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1999.
VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e sindicato no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.