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O barroco, no Brasil, foi introduzido no início do século XVII pelos missionários católicos,
especialmente jesuítas, que trouxeram o novo estilo como instrumento de doutrinação cristã. O
poema épico Prosopopéia (1601), de Bento Teixeira, é um dos seus marcos iniciais. Atingiu o seu
apogeu na literatura com o poeta Gregório de Matos e com o orador sacro Padre Antônio Vieira, e
nas artes plásticas seus maiores expoentes foram Aleijadinho, na escultura, e Mestre Ataíde, na
pintura. No campo da arquitetura esta escola floresceu notavelmente no Nordeste, mas com
grandes exemplos também no centro do país, em Minas Gerais, Goiás e Rio de Janeiro. Na
música, ao contrário das outras artes, sobrevivem poucos mas belos documentos do barroco tardio.
Com o desenvolvimento do neoclassicismo a partir das primeiras décadas do século XIX a
tradição barroca, que teve uma trajetória de enorme vigor no Brasil e foi considerada o estilo
nacional por excelência, caiu progressivamente em desuso, mas traços dela seriam encontrados em
diversas modalidades de arte até os primeiros anos do século XX.
O Barroco apareceu no Brasil quando já se haviam passado cerca de cem anos de presença
colonizadora no território; a população já se multiplicava nas primeiras vilas e alguma cultura
autóctone já lançara sementes. O Barroco não foi, assim, o veículo inaugural da cultura brasileira,
o Maneirismo cumpriu o papel de iniciador, mas floresceu ao longo da maior parte de sua curta
história "oficial" de 500 anos, num período em que os residentes lutavam por estabelecer uma
economia auto-sustentável — contra uma natureza selvagem e povos indígenas nem sempre
amigáveis — até onde permitisse sua condição de colônia pesadamente explorada pela metrópole.
O território conquistado se expandia em passos largos para o interior do continente, a população
de origem lusa ainda mal enraizada no litoral estava em constante estado de alerta contra os
ataques de índios pelo interior e piratas por mar, e nesta sociedade em trabalhos de fundação se
instaurou a escravatura como base da força produtiva.
O Barroco no Brasil foi formado por uma complexa teia de influências européias e locais, embora
em geral coloridas pela interpretação portuguesa do estilo. É preciso lembrar que o contexto
econômico em que o Barroco se desenvolveu na colônia era completamente diverso daquele que
lhe dava origem na Europa. Aqui o ambiente era de pobreza e escassez, com tudo ainda por fazer.
Por isso o Barroco brasileiro já foi acusado de pobreza e incompetência quando comparado com o
europeu, de caráter erudito, cortesão, sofisticado e sobretudo branco, apesar de todo ouro nas
igrejas nacionais, pois muita coisa é de execução tecnicamente tosca, feita por mão escrava ou
morena. Mas esse rosto impuro, mestiço, é que o torna único e inestimável.
Também é preciso assinalar que o barroco se enraizou no Brasil com certo atraso em relação à
Europa, e este descompasso, que se perpetuou por toda sua trajetória, por vezes ajudou a mesclar,
de forma imprevista, elementos estilísticos que se desenvolviam localmente com outros externos
mais atualizados que estavam em constante importação. Os religiosos ativos no país, muitos deles
literatos, arquitetos, pintores e escultores, e oriundos de diversos países, contribuíram para esta
complexidade trazendo sua variada formação, que receberam em países como Espanha, Itália e
França, além do próprio Portugal. O contato com o oriente, via Portugal e as companhias
navegadoras de comércio internacional, também deixou sua marca, visível nas chinoiseries que se
encontram ocasionalmente nas decorações e nas estatuetas em marfim.
No início do século XVIII, o Barroco brasileiro conseguiu uma face relativamente unificada, no
chamado "estilo nacional português", cujas raízes eram de fato italianas, sendo adotado sem
grandes variações nas diversas regiões, e a partir de 1760, por influência francesa, se suavizou no
Rococó, bem evidente nas igrejas de Minas Gerais. No fim do século XVIII o Barroco brasileiro já
se encontrava perfeitamente "nacionalizado", tendo dado inumeráveis frutos anteriores de alto
valor, e apareceram as figuras célebres que o levaram a uma culminação, e que iluminaram em
grande estilo também o seu fim como corrente estética dominante: Aleijadinho na arquitetura e na
escultura, e na pintura Mestre Ataíde. Eles epitomizam uma arte que havia conseguido amadurecer
e se adaptar ao ambiente de um país tropical e dependente da Metrópole, ligando-se aos recursos e
valores regionais e constituindo um dos primeiros grandes momentos de originalidade nativa, de
brasilidade genuína. Demonstrando possuírem grande força plástica e expressiva, tornaram-se
ícones da cultura nacional. O grande ciclo de onde surgiram foi logo depois abruptamente
interrompido com a imposição oficial da novidade neoclássica de inspiração francesa, no início do
século seguinte.
Assim como em outras partes do mundo onde existiu, o barroco foi no Brasil um estilo movido
pela inspiração religiosa, mas ao mesmo tempo de enorme ênfase na sensorialidade e na riqueza
dos materiais e formas, num acordo tácito e ambíguo entre glória espiritual e êxtase carnal. Este
pacto, quando as condições permitiram, criou algumas obras de arte de enorme complexidade
formal, que nos fazem admirar a perícia do artesão e a inventividade do projetista - amiúde
anônimos e de extrato popular. Basta uma entrada num dos templos principais do Barroco
brasileiro, seja em Minas, seja em Salvador, para os olhos de pronto se perderem num quebra-
cabeças de formas e cores, onde as imagens dos santos são emolduradas por resplendores,
cariátides, anjos, guirlandas, colunas e entalhes em volume tal que não deixam um palmo
quadrado de espaço à vista sem intervenção decorativa, num luxo materialista onde foi gasto
muito ouro. Como disse Germain Bazin, "para o homem deste tempo, tudo é espetáculo".
Além da beleza de formas o Catolicismo durante o Barroco se valeu com ênfase do aspecto
devocional, e o amor e a compaixão eram visualmente estimulados pela representação dos
momentos mais dramáticos da história sagrada, e assim proliferam os Cristos açoitados, as
Virgens com o coração trespassado de facas, os crucifixos sanguinolentos, as patéticas imagens de
roca articuladas e com cabelos e vestes reais que se levavam em procissões solenes e feéricas onde
não faltavam as lágrimas e os pecados eram confessados em alta voz. Mas essa mesma devoção,
que tantas vezes adorou o trágico, plasmou também inúmeras cenas de êxtase e visões celestes, e
outras tantas Madonas de graça ingênua e juvenil e encanto perene, e doces Meninos Jesus, cujo
apelo ao coração simples do povo era imediato e sumamente efetivo. Novamente Bazin captou a
essência do processo dizendo que "a religião foi o grande princípio de unidade no Brasil. Ela
impôs às diversas raças aqui misturadas, trazendo cada uma um universo psíquico diferente, um
mundo de representações mentais básico, que facilmente se superpôs ao mundo pagão, no caso
dos índios e dos negros, através da hagiografia, tão adequada para abrir caminho ao cristianismo
aos oriundos do politeísmo".
~ O barroco no Rio de Janeiro ~
No Rio de Janeiro a presença lusitana se faz sentir mais fortemente. Distingue-se das outras
cidades por uma tendência à sobriedade neoclássica, reforçada pelas influências no Brasil da
reforma pombalina. Na arte civil, por exemplo, Passeio Público de 1779-1785 e Chafariz da
Pirâmide de 1789 (imagem acima) e sacra de Mestre Valentim o perfeito equilíbrio entre os
postulados racionais do classicismo, a dinâmica e grandiloqüência do barroco e um certo sentido
de preciosismo e delicadeza da estética rococó, sintetiza brilhantemente o espírito da arte carioca
da segunda metade do século XVIII.
O conjunto foi construído em várias etapas, nos séculos XVIII e XIX, por vários mestres, artesãos
e pintores, como Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, e Manuel da Costa Ataíde.
Tombado pelo SPHAN, atual IPHAN, em 1939, como patrimônio histórico nacional, foi
considerado Patrimônio Mundial da Unesco em 1985.
A primeira igreja do novo Matosinhos de Minas Gerais foi construída em 1773, com a construção,
anos após, entre 1780 e 1793 da Via Crúcis do sopé do morro até o santuário. A via-sacra é
composta por uma série de capelas de planta quadrada, paredes caiadas e teto de quatro águas que
abrigam cenas da Paixão de Cristo representadas mediante conjuntos esculturais esculpidos em
cedro brasileiro e policromias, seguindo a estética sentimental e rebuscada de rococó.
O sacro caminho desenrola-se em ziguezague, subindo por uma ladeira simbólica na qual
organizavam-se procissões de penitência para expiar as culpas da sociedade opulenta do final do
século XVIII neste importante centro minerário do Novo Mundo.
Bibliografia: Estudos Sobre o Barroco, Arnaldo Poesia – Edição do Autor, Niterói , 1984. – André-Vicent. L’art
ibero-américain. in Histoire de l’art III. Encyclopédie de la Pléiade. Paris, Éditions Gallimard, 1979. Affonso Ávila
(org.). – Germain Bazin. A Arquitetura religiosa barroca no Brasil. Tradução Gloria Lucia Nunes; prefácio Germain
Bazin; apresentação Roberto Marinho. Rio de Janeiro: Record, c. 1956. 398 p., il. p.b. Germain Bazin. – O
Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil. Tradução Mariza Murray. 2.ed. rev. aum. Rio de Janeiro: Record, 1963. –
Lourival Gomes Machado, Francisco Iglésias (org.). Barroco mineiro. Apresentação Rodrigo Melo Franco de
Andrade. 3.ed. São Paulo: Perspectiva, 1978. – O Barroco. São Paulo: Editora Cultrix, 1983. – História geral da arte
no Brasil. Apresentação Walther Moreira Salles. São Paulo, Instituto Walther Moreira Salles, Fundação Djalma
Guimarães, 1983. – Wikipédia, a enciclopédia livre.
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© Arnaldo Poesia, Le Monde de Paris, Quinzaine Littéraire, 1996/2010.
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