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Resenha de Mancur Olson, A Lógica da Ação Coletiva: Os Benefícios

Públicos e uma Teoria dos Grupos Sociais, tradução de Fabio Fernandez, São
Paulo, Edusp, 1999, 201 páginas; publicada em Jornal de Resenhas (Folha de
S. Paulo) em 13/11/99, p. 4, sob o título “A Energética do Interesse Comum”

RACIONALIDADE, CARONAS E BENS PÚBLICOS

Fábio Wanderley Reis

As deficiências das ciências sociais em nosso país transparecem bem


claramente no fato de que tenham sido necessários 34 anos para que
pudéssemos contar com a publicação brasileira deste livro. Infelizmente, elas
se mostram também na maneira pela qual ele afinal aparece, em edição pouco
cuidada, embora certamente bem-vinda.

Pode-se lamentar, por exemplo, que o livro não conte com a


apresentação que acompanha vários dos volumes da série em que se publica
(“Clássicos”). Mas o que importa é sobretudo a qualidade da tradução, que
deixa muito a desejar. Não apenas o resultado é a linguagem sem apuro a que
nos acostumamos em traduções na área das ciências sociais, mas ele envolve
mesmo uma impropriedade que, entre várias outras menores, se revela
importante por dizer respeito ao próprio cerne do argumento sustentado no
livro. Refiro-me à tradução dada à expressão “public goods”, que figura até no
subtítulo do volume. Remetendo a expressão à idéia de “bem econômico” a
ser encontrada em qualquer manual de economia, trata-se aqui de um tipo
particular de bem que apresenta a característica de ser “público”, em sentido
técnico bem preciso, donde decorrem as consequências que o livro analisa
para o problema geral da ação coletiva. Ora, a expressão é sistematicamente
traduzida por “benefícios públicos”. O inusitado da fórmula evidencia a pouca
familiaridade do tradutor com a literatura de ciências sociais, especialmente a
econômica, bem como a falta de qualquer revisão técnica.

O livro de Olson (junto com Uma Teoria Econômica da Democracia,


de Anthony Downs, também publicado recentemente pela Edusp) é um dos
mais importantes exemplos pioneiros da abordagem econômica dos
fenômenos políticos. O impacto singular por ele alcançado se deve justamente
às consequências extraídas da idéia de bem público para certos postulados
tradicionais das ciências sociais. Estas costumavam aderir ao suposto
fundamental de que os membros de um grupo ou categoria tenderiam, natural

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e espontaneamente, a agir para a realização dos seus interesses comuns ou
compartilhados, suposto este que se percebia como derivando de outro, o de
que os indivíduos que integram os grupos são racionais e movidos por
considerações de interesse próprio. Olson sustenta, em contraposição, que, em
vez de o primeiro desses supostos derivar do segundo, os dois são na verdade
incompatíveis: se aderimos à premissa do comportamento racional e
egoisticamente motivado pelo interesse próprio, somos logicamente levados
antes à consequência de que os grupos não agirão para a promoção dos
interesses comuns.

Isso se deve a que qualquer interesse comum corresponde a um “bem


público” ou “bem coletivo”, o qual, se tem seu consumo assegurado para uma
parcela qualquer dos membros de um grupo ou categoria, estará
necessariamente assegurado para os demais, mesmo aqueles que não “pagam”
ou não contribuem para que seja produzido ou obtido. Daí que o bem público
não represente por si mesmo, para indivíduos egoístas e racionais, estímulo
suficiente ao dispêndio da energia ou dos recursos necessários à sua
consecução, incentivando antes, por parte de cada um, a disposição de tomar
“carona” nos esforços dos outros. Em consequência, a presunção deve ser que
a ação coletiva não se realizará, a menos que haja coerção ou o que Olson
denomina “incentivos separados”, que atuem seletivamente em termos
individuais e “remunerem” individualmente os membros do grupo por sua
contribuição para o bem coletivo. Essa lógica operaria especialmente no caso
de grupos de grandes dimensões, chamados por Olson de grupos “latentes”,
nos quais se tem como aspecto adicional o problema de coordenação que
decorre, dadas as dimensões do grupo, da irrelevância da contribuição de cada
um para o resultado agregado – donde retira Olson a consequência de que
mesmo indivíduos altruisticamente motivados, se racionais, não investiriam os
recursos ou esforços necessários à obtenção do interesse comum.

A intuição básica contida na análise de Olson tem antecedentes no


pensamento de numerosos autores, de Hobbes, Rousseau, Kant, Mandeville,
Adam Smith e Marx a contemporâneos como Robert Merton, Karl Popper etc.
O mérito principal de Olson consiste em dar formulação abstrata e genérica ao
problema, possibilitando buscar com clareza e em campos diversos, como
exemplificado pelo próprio Olson no volume em questão, os efeitos do
paradoxo nele envolvido.

Assim, o paradoxo é certamente crucial do ponto de vista de uma teoria


do estado: a ordem pública é provavelmente o exemplo por excelência de

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“bem coletivo”, e os dilemas daí resultantes constituíram o foco, bem antes do
trabalho de Olson, de extensos debates entre os intérpretes de Hobbes sobre a
consistência da transição por ele visualizada entre o estado de natureza e a
sociedade civil. Mas a questão da constituição das classes sociais como grupos
efetivos e da eventual ação revolucionária de classe é exemplo de outro campo
importante onde se apresentam dilemas análogos: se, à maneira de Marx,
partindo da crítica a um socialismo utópico, concebemos a revolução como o
resultado da ação de proletários que se tornam conscientes dos seus interesses
e agem racionalmente para promovê-los, como nos situaremos diante da
constatação de que a própria revolução aparece como bem público e de que,
portanto, o racional para cada proletário consistiria em abster-se dos riscos e
inconvenientes da ação revolucionária e tomar carona na luta dos demais? Isso
seria, por certo, pouco solidário; mas que restará da posição reclamada por
Marx se a revolução passar a ser vista como exigindo a edificante exortação à
solidariedade?

A questão central consiste, assim, na maneira pela qual se articulam o


plano das ações individuais e o plano do coletivo ou agregado. Nas mãos de
Olson, o “individualismo metodológico” redunda em problematizar de
maneira singularmente efetiva a tendência a simplesmente postular o coletivo
ou tomá-lo como dado. Boa parte do ímpeto adquirido pelo que se veio a
designar como a teoria ou abordagem da “escolha racional” (incluindo o
chamado “marxismo analítico”) pode ser atribuída à influência de Olson.

Sem dúvida, essa abordagem de inspiração econômica acaba incidindo


em claros excessos e distorções, em particular o de pretender deduzir ou
reinventar a sociedade em sua riqueza a partir da mera suposição de
indivíduos calculadores postos como que num estado de natureza – ou, para
ilustrar diretamente com Olson, a artificial pretensão de reduzir mesmo a
motivação solidária inspirada em considerações de ordem moral a um simples
caso de “incentivo separado” ou seletivo, vale dizer, a uma espécie de
remuneração ao indivíduo. Cumpre tratar de raciocinar com maior sofisticação
a respeito das relações complexas entre a “energética” ou motivação da ação,
de um lado, com os condicionamentos que lhe são trazidos por um contexto
que já é de partida social, e, de outro, a instrumentalidade ou “economia”
própria do aspecto racional da ação, cuja postulação é indispensável a
qualquer intento consequente de explicação nas ciências sociais. Mas, se
viermos a ter êxito na tarefa, a ajuda do legado de Olson (aliás falecido
recentemente) terá sido de grande importância.

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