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A ENCRUZILHADA DA ESQUERDA

Resenha de Esquerda 21, ano 1, nos. 1 (setembro/outubro de 1995) e 2


(janeiro/fevereiro de 1996) e de Crítica Marxista, vol. 1, nos. 1 (1994) e 2
(1995), publicada em Jornal de Resenhas (Folha de S. Paulo), 8 de março de
1996, p. 7.

Fábio Wanderley Reis

Duas novas revistas, Esquerda 21 e Crítica Marxista, ambas em seu


segundo número, tentam constituir-se em resposta, a partir de perspectivas
marcadamente distintas, às dificuldades da esquerda no novo cenário mundial
e nacional. Esquerda 21 é uma publicação concebida e dirigida por
parlamentares, todos eles supostamente de esquerda, apesar de matizes vários
nas biografias, trajetórias e filiações partidárias. Trata-se de publicação
semi-“oficial”, com direito a lançamento em evento promovido na Câmara dos
Deputados, que contou com a devida presença dos ministros do governo e de
autoridades do Congresso nacional. Como indicado pelo título alusivo ao
século que se avizinha, a orientação a que corresponde a revista pretende ser a
de uma esquerda “contemporânea e construtora do futuro”, nas palavras da
Carta do Editor do número inicial, além de comprometida com a democracia e
com “a construção dos novos paradigmas” qe a revolução técnico-científica
exigiria.
Já Crítica Marxista talvez se exponha, por algumas de suas
características mais nítidas, a ver-se alcunhada, no contraste com a auto-
imagem da publicação parlamentar, de “Esquerda 19”. Marxista sem prefixos
ou qualificações, seu manifesto de lançamento, no clássico tom de denúncia
carregado de palavras candentes (a “impostura” reativada, a “virulência” da
reação, a concentração “brutal” de poder, a miséria que “devasta”...),
“relembra” que o marxismo continua sendo o instrumento teórico decisivo e
insubstituível, aponta o caráter de “tributárias do imperialismo” a ser
encontrado não somente nas panacéias do neoliberalismo, mas também na
experiência socialdemocrata, fustiga o “pretenso e mistificador valor universal
da democracia” e reafirma “a possibilidade histórica da revolução” e do “fim
da exploração capitalista”.
Naturalmente, qualquer contribuição nova ao debate de idéias é bem-
vinda. É difícil dizer, porém, qual das duas publicações é mais expressiva –
mais melancolicamente expressiva, sem prejuízo da generosidade dos motivos
e intenções dos responsáveis – dos embaraços e dificuldades com que a
esquerda se vê confrontada. A abertura que caracteriza a postura geral de

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Esquerda 21 certamente representa um traço positivo quando contrastada com
a caturrice de Crítica Marxista. Mas as duas posições desse contraste se
relacionam equivocamente com outros aspectos.
Crítica Marxista, apegada a objetivos de óbvia inviabilidade no futuro
que se pode discernir, tem estilo mais “acadêmico”. Adotando perspectiva de
longo prazo, ela se dirige de maneira mais elaborada (sobretudo, mas não só,
nos trabalhos de colaboradores internacionais, bem como numa seção de
resenha de livros) a um punhado de temas cujo exame apropriado seria sem
dúvida importante: capitalismo, democracia e revolução, modernismo e pós-
modernismo, hegemonia burguesa e cultura de massas, acrescentando-se a
própria teoria marxista como instrumento analítico. A lamentar, naturalmente,
o fato de que a fôrma doutrinária costume marcar mais profundamente do que
seria de desejar a discussão de tais temas – e certa tendência a ignorar, em
assuntos relevantes (com destaque para a questão da democracia), as
contribuições às vezes decisivas da bibliografia mundial alheia à ortodoxia a
que a revista se filia.
Por sua parte, desprovidos da referência distintiva ao socialismo, os
esquerdistas de Esquerda 21 produzem uma revista que, dispersa com
ligeireza nos temas da ampla agenda imposta pela dinâmica econômico-
tecnológica da atualidade e pelo discurso neoliberal hegemônico, não parece
ter boas chances de vir a representar um instrumento de processamento mais
denso dos problemas, capaz de pretender traçar novas orientações de maneira
consistente. Assim, seu caráter “aberto” corre o risco de redundar apenas na
expressão desorientada de uma perplexidade básica. Fortemente apoiada nas
contribuições dos próprios parlamentares, aos quais se deve de longe a maior
parte do material publicado, a revista optou por um formato leve, constituído
por “diálogos”, em que deputados e senadores respondem brevemente a
perguntas sobre diferentes assuntos, acompanhados de artigos também breves
sobre os variados temas da agenda nacional e mundial (onde a presença dos
parlamentares é outra vez dominante) e de entrevistas com autoridades. Tudo
somado, não admira que a matéria mais atraente até aqui divulgada seja, algo
paradoxalmente para uma publicação que pretende traçar novos rumos para a
esquerda, a entrevista realizada com o presidente Fernando Henrique Cardoso,
chefe de um governo tachado de neoliberal pela esquerda. Aliás, a entrevista é
reveladora em seu próprio conteúdo, sendo com frequência confusa na
discussão de orientações e perspectivas intelectuais – e às vezes positivamente
desfrutável em certa afetação de “conversa entre esquerdistas”, com sabor,
surpreendentemente, meio “dezenove”... No varejo de temas, entrevistas e
artiguetes, o que transparece de mais nítido em termos de orientação
compartilhada e em alguma medida emblemática, além do apego à democracia

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e da referência à superação das desigualdades, são a valorização e a
mitificação das categorias de “sociedade civil” e de “público” (ver o “diálogo”
sobre estado e mercado, no no. 1, bem como o artigo de Augusto de Franco,
no no. 2), as quais seriam supostamente intermediárias entre mercado e estado
e aludiriam a recursos suscetíveis de serem mobilizados para controlá-los a
ambos.
Entre o apego rígido a velhos postulados e a ligeireza algo desorientada,
as duas publicações ficam a dever-nos os elementos que ajudem a
efetivamente “pensar pra frente” e dar respostas lúcidas a um par de questões
que o novo cenário mundial torna mais angustiantes e prementes: em primeiro
lugar, como conceber com clareza e viabilizar na prática política a solução da
tensão envolvida na própria idéia contemporânea de cidadania, que valoriza a
um tempo o ideal clássico do civismo igualitarista e solidário e o ideal
moderno e “burguês” da afirmação de si e da realização pessoal autônoma; em
segundo lugar, como avaliar com acuidade e realismo a tradução dessa tensão
nas relações entre democracia e capitalismo (e, quem sabe, eventualmente
entre democracia e certo modelo novo de socialismo, que poderia talvez
ajustar-se à designação de socialismo de mercado), de modo a potencializar o
dinamismo “autonomista” do mercado e refrear sua propensão antiigualitária
sem comprometer as condições da própria democracia.

-x-x-x-

Resposta a comentário de João Quartim de Moraes à resenha “A Encruzilhada


da Esquerda”, ambos publicados em Jornal de Resenhas (Folha de S. Paulo),
12 de abril de 1996, p. 9

SABOR DE COISA VELHA

Fábio Wanderley Reis

Minha modesta resenha causou, aparentemente, surpreendente alvoroço


nos arrais de Crítica Marxista. Esta é a segunda resposta que devo redigir em
menos de 48 horas, pois uma primeira carta-réplica aos comentários nela
contidos, assinada por outro dos editores da revista e a mim encaminhada pelo
“Jornal de Resenhas”, foi cancelada e substituída pela atual. Sinal de que
alguma reflexão e hesitação terá também havido.
Admito que há algo de temerário na incumbência que aceitei, a pedido
dos editores do “Jornal de Resenhas”: a de comentar, em breve resenha de
algumas dezenas de linhas, dois números de duas revistas. A temeridade se

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justifica exatamente pela oportunidade de confrontar duas novas publicações
contrastantes no campo da esquerda, bem como pela presunção, que parece
razoável, de que a leitura a ser feita dela terá em conta as limitações impostas
ao resenhista, que não poderia ir além de sucintas indicações (ainda assim
supostamente úteis para o leitor) dirigidas sobretudo àquilo que distingue as
duas publicações sob exame.
Isso não significa que tenha havido ligeireza na leitura de Crítica
Marxista, cujos méritos destaquei, aliás, no que se refere à consistência e à
densidade maiores, na reflexão sobre assuntos importantes, em comparação
com a outra revista examinada. Apenas, da laboriosa leitura feita (que não me
permite negar o interesse e a eventual riqueza, de diferentes pontos de vista,
deste ou daquele material publicado) resulta forte impressão geral de viés e
parcialidade em correspondência com o apego rígido a envelhecidas opções
doutrinárias e metodológicas, das quais o mínimo que se pode dizer é que
necessitam revisão crítica – e que dão, sim, à revista certo sabor dominante de
coisa velha. Trata-se de algo que, com ânimo leniente, chamei de “caturrice” –
e que continua a manifestar-se com clareza (e de maneira que exige redobrada
leniência e paciência...) na carta-réplica de João Quartim de Moraes.
Além de pespegar-me “adesismo político e intelectual” e associar-me,
sem mais nem menos, até a Antônio Carlos Magalhães, reconhece ele “sem
surpresa”, na agenda que proponho brevemente ao final da resenha, “a
problemática social-liberal do individualismo metodológico”. Imagino, na
falta de qualquer outra possibilidade, que o fundamento de tão notável
inferência seja o fato de que a palavra “mercado” aparece naquela agenda.
Mas se João Quartim de Moraes e seus companheiros fossem menos caturras e
mais abertos, dispondo-se a ler um pouco do que se publica além dos muros
de seu gueto intelectual, saberiam que tenho sido um crítico insistente do
individualismo metodológico. Para não citar bibliografia, limito-me a remetê-
los à resenha de Peças e Engrenagens das Ciências Sociais, de Jon Elster,
recentemente publicada no próprio “Jornal de Resenhas”. Isso não me impede,
naturalmente, e aqui está uma diferença crucial entre nós, de reconhecer os
méritos e a contribuição analítica decisiva de muito da literatura associada
com aquele rótulo, nem de tratar de lidar com o desafio intelectual que a
orientação representa.
Finalmente, é de estranhar a irritação dos editores de Crítica Marxista
(que já aparecia na carta-réplica cancelada) com minha ênfase no manifesto de
lançamento da revista. A ênfase me parece natural, já que o manifesto
supostamente enuncia de maneira clara e sucinta seus objetivos e orientações.
Talvez a irritação indique que eles se arrependem do manifesto divulgado e

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que, assim como reescreveram a carta-réplica, pretendem reescrever também o
manifesto e adotar novas orientações. Ótimo!

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