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EDITORIAIS

Nota do Editor:
Com esta edição a revista Igreja Luterana atinge seu 50"
volume. São 50 anos de muitas e expressivas bênçãos. É um
marco significativo a que se pode galgar apenas orvalhado pela
graça divina. Poucas são as revistas neste país que chegam, a
este pedestal etário, razão pela qual Igreja Luterana ocupa lugar
de destaque na história religiosa e no cenário teológico em que
vivemos.
Porta-voz de um luteranismo sólido e coerente, Igreja Lu-
terana tem-se mantida altaneira em sua posição confessional num
contexto marcado por não pouca confusão no pensamento teoló-
gico. Cada número desta revista espelha o testemunho de uma
total consagração às Sagradas Escrituras e às Confissões Lute-
ranas. Com o passar dos anos Igreja Luterana muda seus edito-
res, renova seu conselho editorial, unifica sua língua sem entre-
tanto comprometer seu fundamento teológico.
Um aniversário por natureza começa com reflexão e nisto
há sempre um mérito porque previsão sem retrospecção é um
empreendimento arriscado e raramente prudente. É nesta con-
vicção que celebramos o passado homenageando figuras proemi-
nentes na história do Seminário Concórdia com um culto especial
cujo sermão proferido pelo Prof. Curt Albrecht transcrevemos.
A saudosa lembrança de homens santos é estímulo à con-
tinuidade na obra do Santo Ministério numa realidade em que
o pastor é cada vez mais desafiado a posicionar-se no campo da
ética. Em seu estudo sobre "Código de Ética do Pastor" o Dr.
Martim C. W a r t h apresenta os resultados submetidos a concilia-
res em que a ética do ministro de Deus é abordada no prisma
da liberdade, valores, propriedade, honra, responsabilidades e
autoridade no ambiente social e especialmente na relação com
sua congregação e co-pastores.
A questão da autoridade é outro assunto que o mesmo
autor apresenta sob o tema "A Responsabilidade dos Pais na
Educação dos Filhos". Embora aparentemente restrita, esta res-
ponsabilidade é tratada de forma abrangente envolvendo diver-
sos segmentos vivenciais do ser humano sob a ótica da Sagrada
Escritura e Confissões.
A série de artigos encerra-se com. "Prolegômenos à Escato-
logia do Antigo Testamento" (Prof. Acir Raymann) onde se
busca mostrar que a polaridade do binômio "já — ainda não"

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incentiva o Israel de Deus a (re)vivenciar Seus atos salvíficos
no mundo enquanto aguarda o plêroma destes atos na dimensão
celeste.
Com esta edição, em "Auxílios Homiléticos" concluímos
o estudo dos Evangelhos da Série Histórica Revisada. A partir
do próximo número voltamos ao estudo das perícopes da Série
Trienal.
Uma abençoada leitura e muito obrigado por celebrar co-
nosco as bênçãos cinqüentenárias do S E N H O R . — AR

FÓRUM

A CRISTOLOGIA DA PÁSCOA,
SEGUNDO I CO 15.20-28
A leitura de I Co 15.20-28 deu ensejo a uma reflexão sobre
a pessoa e obra de Jesus Cristo. Quando Paulo diz que "Cristo
ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primícias dos que
dormem" (v. 20) ele afirma que Cristo morreu e ressuscitou.
Ora, "o salário do pecado é a morte" (Rm 6.23). Só se morre
por causa do pecado. Mas Cristo é "o Santo de Deus" (Mc 1.24;
Jo 6.69; At 3.14; 4.30), pois Maria deu à luz o "ente santo"
(Lc 1.35). Por essa razão se afirma a "perfeita impecaminosi-
dade" (anamartesia) de Jesus Cristo, segundo a natureza huma-
na (Dogmática Cristã, J . T . Mueller, Vol. I, p. 268). Claro, se-
gundo a natureza divina ele é o próprio Santo Deus. Ele era
verdadeiramente homem, mesmo sem pecado, pois o pecado não
faz parte da essência do homem. A Fórmula de Concórdia cha-
ma o pecado de "accidens" (FC, Ep I, 23; SD I, 57). Uma das
conseqüências desta impecaminosidade é a imortalidade (atha-
nasia) de Jesus Cristo, também segundo a natureza humana.
Assim Jesus Cristo não está sujeito à morte, nem segundo a na-
tureza divina, nem segundo a natureza humana.
Como então morreu e ressuscitou dentre os mortos? E v i -
dentemente não morreu a sua morte, mas a minha. Sua morte
foi vicária em lugar de todos os homens. Assim também a res-
surreição não foi a sua ressurreição, mas a minha. Sua ressur-
reição também foi vicária em lugar de todos os homens. Por essa
razão Paulo diz que sua ressurreição é "primícias dos que dor-
mem", é vicária em lugar dos que dormem. Quanto consolo:
cm Cristo vicariamente já ressuscitei e vou ressuscitar efetiva-
mente para a vida eterna no último dia.

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Como aconteceu então a morte e a ressurreição de Jesus
Cristo? Evidentemente não morreu segundo a natureza divina,
mas segundo a natureza humana no estado da humilhação. Mas,
como 0 Concilio de Calcedônia (451) nos ensina, as duas natu-
rezas estão unidas na única pessoa de Cristo de forma incon-
Fusa, imutável, indivisível e inseparável para sempre. Desta
forma nem a morte vicária separou as duas naturezas. Assim a
natureza divina participou efetivamente da morte vicária de
Cristo e lhe conferiu valor eterno. Mas a natureza divina não
saiu machucada ou diminuída. Na comunicação de atributos há
apenas um gênero majestático, em, que a natureza divina comu-
nica ou cede à natureza humana qualidades divinas. Não há um
gênero tapeinótico, em que a natureza humana passaria qualida-
des humanas à natureza divina, fazendo-a diminuir ou ser humi-
lhada. A humilhação não consistia na humanação, mas no fato
de que Cristo não usou sempre e inteiramente as qualidades di-
vinas comunicadas à natureza humana. A natureza humana ti-
nha sempre a posse dessas qualidades divinas, mas na humilha-
ção não fez sempre uso delas, como depois acontece na exaltação.
A "forma de Deus" e a "forma humana" de Fp 2.6,7 dizem res-
peito à natureza humana: ela tinha a posse da "forma de Deus",
mas usou a "forma humana" na humilhação para poder assumir
a morte vicária por todos os homens.
E o que aconteceu na morte e na ressurreição de Jesus
Cristo? Na morte não houve a separação das duas naturezas,
mas a separação de corpo e alma, que ambos ficaram continua-
mente unidos à natureza divina. Assim o próprio Cristo deu a
sua vida (não a tiraram dele) e a retomou, ressuscitando-se a si
mesmo (junto com o P a i e o Espírito Santo) em lugar de todos
os homens, unindo novamente corpo e alma. Agora o corpo era
glorioso, pois já não estava " n a carne", mas "no espírito" (I Pe
3.18), isto é, já não havia humilhação, mas iniciou a exaltação.
Assim "no espírito" desceu ao inferno, antes de aparecer res-
suscitado, para mostrar-se vivo e vitorioso sobre a morte e Sa-
tanás.
Paulo, no entanto, ensina que ainda há muito a vencer na
exaltação. Cristo quer vencer todos os inimigos: as forças do
mal dentro e fora de nós que conduzem à morte. O diabo já
está vencido. O homem já está remido. Falta, porém, vencer
a morte. Este é o último inimigo. Até lá Cristo vence continua-
mente a morte em nós pelo Evangelho do perdão. E quando
chegar o último dia e Cristo tiver vencido a morte pela ressur-
reição geral dos mortos, então a tarefa da humanação estará
cumprida. Segundo a natureza humana Jesus Cristo "também
se sujeitará àquele que todas as cousas lhe sujeitou, para que
Deus seja tudo em todos" (v. 28). Segundo a natureza humana

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Jesus Cristo recebeu de Deus Pai a sujeição de todas as coisas
(Mt 28.18). O juízo final encerra a tarefa de Jesus Cristo, ho-
mem. Como homem não é somente o Mediador, mas também o
juiz (1 Tm 2.5; II Tm 4.1; Jo 5.22,27). Então Jesus, segundo a
natureza humana, devolve a Deus a autoridade que lhe foi con-
fiada por ser "o Filho do homem" (Jo 5.27). Segundo a natu-
reza divina não há nada a devolver, pois nada foi recebido. Na
presença de Deus na eternidade os salvos confraternizarão com
o Rei Jesus, que é seu irmão amigo e seu Deus para sempre. Até
lá os cristãos recebem a presença real do corpo e do sangue de
Jesus Cristo na Santa Ceia, o corpo e o sangue dado e derramado
vicariamente pelos homens para selar a aliança eterna de Deus
com o Seu povo. Pela ressurreição está vivo e garante a nossa
vida eterna. Pela Santa Ceia se torna presente na vida dos
cristãos para preparar e garantir a ressurreição final. Pela fé
esta presença é graciosa e consoladora, pois garante o perdão e
a vida para sempre. Que consolo nos dá esta Cristologia da
Páscoa! — M . C . W .

ETERNA (IN)SATISFAÇÃO
Quem poderia dizer, neste momento, que está plenamente
satisfeito? Será que ninguém tem nada a reclamar, nada a cri-
ticar? Pergunto: Estás satisfeito contigo mesmo, teu relaciona-
mento com os outros, o ambiente em que vives? Duvido muito.
Afinal, estamos numa escola. E uma escola, embora o termo
originalmente significasse "ócio", "descanso", é hoje sinônimo
de atividade. Escola é quase que por definição um viveiro de
insatisfeitos. Se cada um de nós estivesse plenamente satisfeito,
não estaríamos aqui. Eterna insatisfação. Parece que faz parte
da vida.
Jesus Cristo, o Messias da linhagem de Davi, observou isso
na criançada que brincava na praça de Nazaré. Brincavam de
festa de casamento e de enterro. Mas não se entendiam. Tinha
um grupo de crianças chatas, despóticas e insuportáveis. Que-
riam sempre impor a sua vontade. Estavam com a flauta na
mão e queriam que todos dançassem conforme a música que eles
tocavam. E r a m uns chatos insatisfeitos.
Mais tarde, no fogo da controvérsia com os líderes de
Israel, Jesus lembrou aquela brincadeira das crianças aos adul-
tos que, em sua atitude diante da visitação definitiva de Deus,
mostravam um comportamento idêntico. Contou-lhes a parábola
das crianças na praça.
João veio da parte de Deus e não comia nem bebia. Isto
significa que ele vivia do mínimo necessário. E r a um nazireu,

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um asceta. E r a uma imagem ambulante a pregar a necessidade
de profunda conversão face ao juízo que estava por despencar
sobre a cabeça do povo. João estava, por assim dizer, em pano
de saco e cinza. Estava de luto. Mas os líderes judaicos, que
tinham a flauta na mão, queriam fazer João Batista dançar. E
porque João não dançou conforme a música deles, foi tachado
de louco. Ou, no dizer deles, "tem demônio".
Veio Jesus Cristo, o Filho do homem, o Agente escatológi-
co do Pai, que comia e bebia. Isto significa que ele ia a jantares,
tanto na casa de fariseus como de publicanos. Jesus sabia o
que é se alegrar e até incentiva a alegria dos seus, ao perguntar:
"Podem acaso estar tristes os convidados para o casamento, en-
quanto o noivo está com eles?" (Mateus 9.15a) Para Jesus, cada
um desses jantares com pecadores era uma parábola viva, uma
alegre antecipação tipológica do banquete celestial (mais ou me-
nos como temos hoje na Santa Ceia), pois quem estava reunido
à mesa era o Salvador com pecadores arrependidos e perdoados.
Mas os líderes judaicos, que tinham a flauta na mão, queriam
fazer Jesus bater no peito, em sinal de tristeza e luto. E porque
Jesus não dançou conforme a música deles, foi chamado de glu-
tão, beberrão, amigo de publicanos e pecadores.
Jesus avalia a situação e se refere àqueles seus contem-
porâneos insatisfeitos, despóticos, rebeldes, em termos de "esta
geração". Esta é uma expressão que vem carregada de juízo e
ira de Deus. Em Mateus 12.39 Jesus se refere a ela como sendo
"geração má e adúltera". Jesus se dirige a ela com seu pungente
" A i de ti, Corazim! ai de ti, Betsaida!" (Mateus 11.21)
Tu e eu podemos até concluir: Que geração aquela! Eter-
namente insatisfeitos! Mas será que somos diferentes? Não é
assim que também nós estamos instalados em nossa cadeira de
juiz, emitindo pareceres o tempo todo? Temos a flauta na mão
e queremos que todos dancem conforme a nossa música. "Aque-
le aluno é um desastre." "Professor fulado de tal não está com
nada." "Aquele pregador não leva jeito." "O pastor é um desli-
gadão." " A s devoções são uma eterna mesmice, por isso não vou
mais." "A lei que aparece nos sermões é muito amarga; pre-
firo o evangelho." " A s mensagens são muito adocicadas. Demais
evangelho. Falta l e i " . Sabemos criticar. Queremos dominar.
Todos devem dançar conforme a nossa música. Por isso, tam-
bém a nós se aplica o ai de vós, pronunciado por Jesus. Também
nós fazemos parte desta geração, o que, por certo, nos entristece.
No entanto, em meio a esse quadro de juizo, não percamos
de vista o grande consolo da palavra de Deus. Mas onde haveria
consolo num texto como o nosso, repleto de acusações? Pois o
evangelho está exatamente numa das farpas jogadas contra Je-
sus. Chamam-no, em tom zombeteiro, de amigo de pecadores.

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Amigo de publicanos, de pecadores. Meus amigo. Teu amigo.
Amigo daqueles que precisam dele e o recebem, colocando de
lado a sua flauta desafinada e ouvindo a música que ele toca
no trombone da lei e na flauta doce do evangelho.
Jesus, o amigo de pecadores. Nenhum título é tão precio-
so quanto este. Sempre que Deus, por sua lei, te tirar a flauta
desafinada ou te derrubar da cadeira do falso juiz que a todos
julga e por ninguém quer ser julgado.. . ao caíres, lembra-te:
Jesus, amigo do pecador. Aí terás eterna satisfação. Amém. —
VS
Devoção proferida no Seminário Concórdia no dia 27 de junho
de 1990, sobre Mateus 11.16-19.

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ARTIGOS
SE VÓS PERMANECERDES NA MINHA PALAVRA,
SOIS VERDADEIRAMENTE MEUS DISCÍPULOS
Curt Albrecht
Em Cristo Jesus, prezados ouvintes!
Certa vez "Indo Jesus para as bandas de Cesaréia de F i l i -
pe, perguntou a seus discípulos: Quem diz o povo ser o Filho
do homem? E eles responderam: Uns dizem: João Batista;
outros: Elias; e outros: Jeremias, ou algum dos profetas. Mas
vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou? Respondendo Si-
mão Pedro, disse Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo." Mt
16.13-16.
À época da Reforma a situação não era muito diferente.
Poucos eram os fiéis que conheciam bem a Cristo Jesus. Em
ambas as épocas o evangelho de Cristo estava escondido entre
inúmeros preceitos humanos.
Hoje — penso — a situação é quase a mesma. Poucos são
os fiéis discípulos que realmente sabem quem é Jesus, que crêem
nele e que o servem. Mas há aqueles que conhecem e que con-
fessam a "Cristo, o Filho do Deus vivo". Entre os que confes-
sam isso estamos nós.
É a seus discípulos, aos que crêem nele, que Jesus diz: SE
VÓS PERMANECERDES NA MINHA PALAVRA, SOIS VERDA-
DEIRAMENTE MEUS DISCÍPULOS, pois I — C O N H E C E R E I S A
V E R D A D E e II — A V E R D A D E VOS L I B E R T A R Á .

I
CONHECEREIS A VERDADE
Havia uma grande confusão entre os judeus a respeito de
Jesus (Jo 7.40-43); confusão que provocou dissensão entre eles.
Jesus ia identificando-se nos seus discursos: " E u sou a luz do
mundo" (8.12); "Vós sois cá de baixo, eu sou lá de cima; vós
sois deste mundo, eu deste mundo não sou" (8.23); "Quando
levantardes o Filho do homem, então sabereis que eu sou, e que
nada faço por mim mesmo; mas falo como o P a i me ensinou"
(8.28).
Os fariseus, os escribas e os principais sacerdotes, justa-
mente aqueles que, por primeiro e melhor, deveriam reconhecer

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em Jesus o verdadeiro Filho de Deus, falharam e não só não o
reconheceram como tal, mas ainda o perseguiam e contradiziam,
E a multidão ficava confusa. Muitos, no entanto, creram nele.
Em nossa perícope, Jesus está falando àqueles judeus que
creram nele. Ele lhes diz algo muito importante, lhes diz três
coisas importantes: 1) Permanecer na palavra dele é caracterís-
tica do verdadeiro discípulo dele; 2) Permanecer na palavra dele
é conhecer a verdade; 3) Conhecer a verdade da palavra dele e
permanecer nela é sinônimo de ser e estar libertado da escravi-
dão ao pecado. Isto foi dito aos que creram nele; mas quem lhe
retrucou foram os judeus incrédulos.
"Somos semente de Abraão." Achavam que. por serem
descendentes de Abraão segundo a carne, eram, automaticamen-
te, filhos de Deus salvos e livres: "Jamais fomos escravos de
alguém" —disseram para Jesus. Consideravam-se livres de tu-
do e de todos, senhores de sua própria vida. Pensavam assim de
si na qualidade de "semente de Abraão".
Jesus, porém, lhes mostra, que não é bem assim, e diz:
"Todo o que comete pecado é escravo do pecado". O pecador
peca não porque é senhor do erro, mas porque é escravo do erro.
Ou teriam aqueles judeus querido dizer que eles não eram peca-
dores? É ilusão o homem natural pensar que é livre, que é
senhor de si, que é autoridade máxima no mundo. Praticar erros
é ser escravo do erro, escravo do pecado. É o que Jesus está
dizendo.
Além disso, escravo não é filho, e filho não é escravo na
casa. 0 escravo é passageiro; ele não é da casa; ele não fica
para sempre na casa, porque não é senhor; ele é dependente,
está à mercê do senhor. Já o filho é da casa, é herdeiro, é
senhor. Por isso o escravo depende do filho.
Também nós somos, por natureza, escravos do pecado, por-
que "Não há homem justo sobre a terra que faça o bem, e que
não peque" (Ec 7.20); "pois todos nós somos como o imundo,
e todas as nossas justiças como trapo da imundícia" (Is 64.6).
"Todos pecaram c carecem da glória de Deus" (Rm, 3.23). "ft
como confessa o salmista Davi: " E u nasci na iniqüidade, e em
pecado me concebeu minha mãe" (Sl 51.5).
O escravo do pecado só pode ser libertado pelo Filho de
Deus, que é o Senhor da casa. Sem Cristo Jesus todos estão
perdidos e condenados.
É por causa disso que Jesus disse: "Se, pois, o Filho vos
libertar, verdadeiramente sereis livres"! E ele nos libertou,
([liando morreu com e pelos nossos pecados e quando ressuscitou
dentre os mortos, "Porquanto Deus enviou seu Filho ao mundo,
não para que julgasse o mundo, mas para que o mundo fosse

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salvo por ele" (Jo 3.17). Jesus " f o i entregue por causa das nos-
sas transgressões, e ressuscitou por causa da nossa justificação"
(Rm 4.25).
0 perdão dos pecados e a conseqüente justificação só são
possíveis e são válidos eternamente, porque o próprio "Deus es-
tava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando
aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da
reconciliação" (II Co 5.19).
Esta palavra da reconciliação é a mesma, à qual Jesus se
refere em nosso texto, quando diz: " S E VÓS P E R M A N E C E R D E S
NA M I N H A P A L A V R A , SOIS V E R D A D E I R A M E N T E M E U S DIS-
C Í P U L O S ; e conhecereis a verdade".
Oh! como é de vital importância conhecer a verdade de
que Deus, em Cristo, está reconciliado conosco! Conhecer esta
verdade e crer nela liberta do pecado, do diabo c da morte
eterna, "pois se o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis
livres"!
Por isso, essa palavra, que traz Cristo como Filho de Deus
e Salvador para as pessoas, precisa ser pregada, proclamada,
falada ao coração para aqueles que são escravos do pecado. É
tarefa nossa fazer isso para os nossos contemporâneos.
Lembramos hoje cinco pregadores desta verdade. Lem-
bramo-los, para imitar-lhes a fé que tiveram e também para
inspirar-nos no seu zelo, na sua consciência, no seu espírito mis-
sionário, na sua dedicação c persistência em proclamar a ver-
dade, que é a palavra de Cristo. E, ao lembrá-los, pelo seu cen-
tenário de nascimento, queremos fazê-lo em obediência à reco-
mendação bíblica, que diz: "Lembrai-vos dos vossos guias, os
quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atenta-
mente o fim de sua vida, imitai a fé que tiveram" (Hb 13.7).
Estes cinco pastores, formados pelo nosso Seminário Con-
córdia, permaneceram discípulos e apóstolos fiéis de Cristo até
o fim, porque conheciam a verdade e creram na palavra de
Cristo.
E assim como eles, em sua vida e no seu tempo, levaram
outros ao conhecimento da verdade, assim nós, agora, no nosso
tempo, precisamos levar outros, nossos contemporâneos, ao co-
nhecimento da verdade, anunciando-lhes perdão dos pecados e
vida eterna em Cristo.
São válidas para nós as palavras de Jesus em nosso texto:
" S E VÓS P E R M A N E C E R D E S NA M I N H A P A L A V R A , SOIS V E R -
D A D E I R A M E N T E M E U S DISCÍPULOS; e conhecereis a verda-
de e

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II
A VERDADE VOS LIBERTARÁ
A partir de 1483 havia uma pessoa no mundo, que, desde
tenra idade, viria a ter a grande preocupação de como ser salva,
de como libertar-se dos pecados — preocupação rara — conve-
nhamos. Esta pessoa era Martinho Lutero.
Nascido a 10/11/1483 e tendo sido batizado no dia seguinte,
cresceu em Eisleben, estudou em Mansfeld, Eisenach e Erfurt.
Cresceu sem conhecer direito o Salvador Jesus Cristo. Por isso,
em plena juventude, fez uma promessa a Santa A n a de entrar
para um mosteiro, fazer-se monge, com o fim de adquirir a sua
salvação e paz na alma. Tornou-se padre, visitou Roma, apli-
cou-se ao estudo da Palavra de Deus, foi feito doutor em Teologia
e tornou-se professor c pregador na Universidade de Wittenberg.
Provocado pela infame venda das indulgências e movido
pelo zelo para com a palavra de Deus, afixou Lutero as 95 Teses
à porta da igreja, em 31/10/1517, que desencadearam a Reforma
luterana e a conseqüente mudança radical na Igreja e no mundo
do Ocidente. Começara uma nova era.
A Reforma de Lutero recolocou a Palavra de Deus, as
Sagradas Escrituras como única regra de fé e de vida cristã para
a Igreja. A Reforma luterana proclamou a palavra da verdade
que liberta. A Reforma proclamou que Jesus Cristo é o Filho
do Deus vivo, único Salvador de cada pessoa.
Lutero enfrentou árduas lutas pela defesa e propagação
do Evangelho. Sustentou debates teológicos, combateu o erro,
exortou as autoridades da sua nação, compareceu à Dieta de
Worms diante do imperador; pregou, lecionou, escreveu, cantou
e viveu o Evangelho de Jesus Cristo.
Aos 42 anos casou-se com Catarina von Bora e foi pai de
seis filhos. F o i excomungado da Igreja Romana e proscrito pelo
governo imperial; mas morreu de morte natural aos 63 anos.
É graças à ação de Deus através de Lutero que nós, hoje,
conhecemos a palavra de Cristo que liberta do pecado. " F o i o
homem pelo qual Deus purificou ou reformou a Igreja".
Mas convém advertir contra o perigo do "somos semente
de Abraão" dos judeus incrédulos de nosso texto; contra o pe-
rigo de sermos "luteranos tradicionais" apenas; contra o perigo
de nos acomodarmos nessa condição de luteranos nominais, não
sendo discípulos fiéis de Cristo, evangelizadores, mas escravos
do pecado que não permanecem para sempre na casa.
"Semente de Abraão" e "luterano por tradição" não liber-
ta ninguém do pecado e da condenação eterna. Aos que invoca-

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ram a tradição e a genealogia de Abraão como qualidade de sal-
vação, Jesus lhes disse: "Vós sois do diabo, que é vosso pai, e
quereis satisfazer-lhe aos desejos" (Jo 8.44a). "Ninguém, será
justificado diante dele (de Deus) por obras da l e i " — escreveu
São Paulo aos Romanos (3.20).
Para ser salvo é preciso permanecer na palavra de Jesus,
ser discípulo dele, conhecer a verdade e ser libertado pela ver-
dadeira fé em Cristo. Por isso diz Jesus: "Se, pois, o Filho vos
libertar, verdadeiramente sereis livres".
Jesus Cristo é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do
mundo. Quem nele crê torna-se beneficiário da morte e da res-
surreição do Senhor. E quem permanece nesta fé, este é discí-
pulo dele, conhece a verdade e esta verdade o libertará da escra-
vidão ao pecado e da condenação eterna.
Libertados do pecado pela fé em Cristo e conhecedores da
verdade, podemos confessar, cantando com o poeta sacro: " N i n -
guém nos amou / como o Cristo Senhor, / que as almas guiou /
como seu bom Pastor; / na Bíblia nos deu / consolo do céu"
( H L 269.3).
Sim, ouvintes, a Bíblia, que Lutero devolveu ao uso na
Igreja, traduzindo-a para o povo, ela contém o consolo do céu
de que, quem a conhece, nela crê e nela permanece, será liber-
tado por Cristo para a vida eterna. Então, " S E VÓS P E R M A -
N E C E R D E S N A M I N H A P A L A V R A , SOIS V E R D A D E I R A M E N -
TE M E U S DISCÍPULOS, e conhecereis a verdade; c a verdade
vos libertará".
Nós recordamos, hoje, cinco discípulos fiéis de Cristo, que
nasceram há um século e que foram pastores apegados à pala-
vra de Cristo e, por conseguinte, aos princípios da Reforma.
Hirschmann, Raschke, Hasse, Doege e Flor podem ser imi-
tados nas virtudes de sua fé por nós pastores, para um Minis-
tério eficiente na I E L B .
Em si não era errado os judeus lembrarem-se de Abraão,
de Moisés e de Davi; pois estes foram discípulos fiéis, porque
permaneceram firmados nas promessas de Deus. Também nós
podemos alegrar-nos por causa do parentesco que temos com. os
cinco pastores fiéis que foram os que hoje são lembrados; ale-
grar-nos com a história da I E L B , enriquecida por estes cinco
obreiros; alegrar-nos também por Lutero, Chemnitz, Gerhard,
Walther e tantos outros que se tornaram mais que vencedores
por meio daquele que os e a nós amou. E, sobretudo, alegrar-nos
com a nossa filiação a Deus por meio de seu Filho, Jesus Cristo,
lembrados das palavras do próprio Cristo: " S E VÓS P E R M A -
N E C E R D E S N A M I N H A P A L A V R A , SOIS V E R D A D E I R A M E N T E

12 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
M E U S . DISCÍPULOS, e conhecereis a verdade; e a verdade vos
libertará".
Irmãos ouvintes, graças à misericórdia de Deus, temos um
Salvador, temos sua palavra, temos a verdade. Temos ao Deus-
conosco todos os dias conosco!
Procuremos conhecer mais e mais esta verdade, para crer
nela, permanecer nela, ser discípulos dela. Esta verdade — Cris-
to — nos libertará para sempre.
E saibamos que uma maneira de viver bem nosso cristia-
nismo luterano é não esquecer a história da Igreja, lembrando-
nos de nossos guias, os quais nos pregaram a Palavra de Deus
e nos levaram, assim, ao discipulado de Cristo.
Imitemos a fé na verdade da palavra de Deus que nossos
antepassados tiveram e continuemos sendo discípulos fiéis de
Cristo, esperando a libertação final e total no lar celeste.
Mas, enquanto nos é dado viver na Igreja militante, em
meio a um mundo confuso, saibamos nós confessar e testemu-
nhar com os apóstolos do Senhor Jesus, que Cristo é o Filho do
Deus vivo; que nós cremos nele e somos seus discípulos. Pro-
clamar que Jesus é o Salvador, o único que liberta do pecado e
da morte eterna. Amém.

Sermão proferido na capela do Seminário Concórdia no dia 26


de outubro de 1990 em culto especial comemorativo à Reforma,
aniversário do Seminário e centenário de nascimento dos pasto-
res Ewald Hirschmann, Curt Raschke, Rodolpho Hasse, Wühelm
Doege e Benjamin Flor.

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 13
CÓDIGO DE ÉTICA DO PASTOR
Martim C. Warth
O pastor é chamado para pastorear o rebanho de Deus
sob o Bom Pastor, Jesus Cristo (1 Pe 5.2,4). Há regras de con-
duta bem específicas para os obreiros de Deus na Escritura. Elas
mencionam a capacidade de trabalho, a motivação pessoal, a
conduta social e os proibitivos. Encontram-se em 1 Pe 5.1-4;
1 Tm 3.1-7; 4.16; 2 Tm 2.24-25; 4.2,5; Tt 1.7-9; 2.1,7-8.

A. Capacidade de trabalho para cumprir o ministério:


a. O ministro deve ser apegado à Palavra e ter cuida-
do da sã doutrina (não pode ser neófito);
b. para pregar a Palavra, instar com integridade, re-
verência, com, linguagem sadia e irrepreensível;
c. ser apto para ensinar e instruir, como evangelista e
despenseiro de Deus;
d. para exortar, convencer, disciplinar, corrigir, re-
preender — com mansidão e longanimidade;
e. e para suportar aflições.
B. Motivações pessoais:
a. 0 ministro deve ser piedoso;
b. de forma espontânea, de boa vontade;
c. que tenha cuidado de si e domínio de si.
C. Conduta social:
a. O ministro deve ser irrepreensível, com bom teste-
munho dos de fora;
b. deve ter família padrão: uma só mulher, filhos
educados;
c. deve ser hospitaleiro, amigo do bem, padrão de
boas obras, modelo;

14 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
d. deve ser temperante, sóbrio, modesto, cordato, i n i -
migo de contendas, brando, paciente, justo.
D. Proibitivos:
0 ministro não pode ser: constrangido ao ofício,
ganancioso (avarento, cobiçoso), dominador, vio-
lento, arrogante, irascível, que goste de contenda e
de muito vinho.

A espiritualidade recebida pela fé está continuamente sob


ataque da natureza corrompida. Isto torna também o pastor
frágil. Pode sentir-se exausto e sem recursos espirituais, segui-
do de um sentimento de frustração, fracasso ou revolta. A ver-
dadeira espiritualidade só pode ser dada pela meditação no
evangelho que é o poder de Deus que move a fé. A devoção
diária com estudo e oração é básica para o pastor. Como espi-
ritual aceita os seguintes princípios de conduta na grande tarefa
de equipar o povo de Deus para serviço que são extensivos aos
obreiros de todas as categorias dentro da I E L B , inclusive leigos.

I. Aceitar Autoridade. — Há um elemento muito sensível que


garante a existência da sociedade e que, no entanto, está sob
contínuo ataque na rebelião do homem: a autoridade. Como o
homem em rebelião não aceita que Deus é Deus, assim ele tam-
bém não quer servir sob nenhuma autoridade. Mas o "espírito
voluntário" (Sl 51.12) do cristão aceita a autoridade.
1. Como cristão e pastor eu aceito pela fé, acima de tudo a
autoridade de Deus e de sua Palavra, revelada em lei e
evangelho. Minha primeira resposta é a adoração, demonstrada
na confissão da fé, na oração e no culto pessoal ao meu Deus.
2. Como cristão e pastor luterano eu aceito a autoridade das
confissões luteranas, como estão no Livro de Concórdia de
1580, por serem, a clara e correta exposição da Palavra de Deus.
3. Como cristão e pastor eu aceito a autoridade daqueles que
são colocados por Deus acima de m i m nas diferentes ordens
sociais: na relação familiar e econômica, no governo, e na igreja.

4. Como pastor aceito especialmente a autoridade daqueles que


foram eleitos para governarem na igreja: o presidente e a
direção da igreja, os conselheiros, a diretoria da congregação, e
outros que receberam esta autoridade. Entendo que também os
colegas me foram dados por Deus para mútuo conselho e exor-
tação necessários para um ministério mais espiritual e eficiente.
Onde eu mesmo exerço esta autoridade, seja na igreja, na con-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 15


gregação ou na família, entendo que não o posso fazer como
dominador (1 Pe 5 3). Entendo que preciso exercer a autorida-
de recebida como quem serve em humildade ao seu próximo
(Jo 13.14-17) de quem recebeu esta autoridade.

5. Como pastor aceito a autoridade de uma paróquia que me


chama, e respeito o seu direito de receber uma imediata
participação do seu recebimento e uma pronta solução para o
chamado. Estando a serviço de outra paróquia ou agência da
igreja reconheço o direito desta de opinar comigo sobre o novo
chamado. Reconheço que chamado é coisa pública na ordem
social da igreja, ficando inclusive sob a autoridade do seu pre-
sidente e dos seus conselheiros distritais, com os quais preciso
me comunicar. Reconheço que a paróquia ou o segmento da
igreja que me chamou também tem o direito de reavaliar o cha-
mado e propor modificações.

6. Como cristão aceito a autoridade de todo aquele que se di-


rige a m i m por carta ou por outra forma de comunicação
pessoal, reconhecendo a necessidade de dar uma resposta ade-
quada dentro do menor prazo possível.

7. Como cristão aceito a autoridade de todos os que vivem


comigo na família, com os quais pratico a submissão mútua
(Ef 5.21) porque abri espaço com ternura para viverem comigo.
Lembro que nem mesmo sou a única autoridade sobre o meu
corpo, pois o uni à esposa.

II. Aceitar a liberdade e seus limites. — A liberdade sempre é


dada: Deus a dá e distribui. Há uma liberdade de mim
mesmo que Deus me dá pela fé. Esta liberdade me determina
como aquele que está aí para servir o seu Senhor, servindo ao
seu próximo. Como o meu próximo tem a mesma liberdade,
surge o limite pela vocação de cada um.

8. Como pastor eu aceito a liberdade de filho de Deus e a coloco


à disposição do meu Senhor para servir ao meu próximo.

9. Como cristão eu aceito a liberdade de dispor do meu tempo,


dos meus bens, da minha nova vida em Cristo para servir
sob o reino de Deus.

10. Como cristão eu aceito o limite da minha liberdade, pro-


curando respeitar o tempo, os bens e a vida do meu pró-
ximo.

16 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


11. Como cristão eu respeito o direito que meu próximo tem
à sua privacidade, afastando-me de qualquer tentativa de
especular a respeito de vantagens ou defeitos de meu próximo.
12. Como cristão e pastor eu aceito o direito à privacidade dos
congregados, não procurando penetrar curiosamente em seu
mundo de erros e ofensas quando não são públicos.

13. Com,o cristão e pastor eu aceito o direito dos outros de


modelar a sua vida de acordo com os privilégios éticos que
lhes cabem. Nesse sentido procurarei não impor os meus pa-
drões, nem abusar de seu tempo por visitas alongadas, nem so-
brecarregando-os com os problemas dos outros.

14. Como pastor lembrarei aos congregados o meu direito de


ser consultado em assuntos que dizem respeito à minha
paróquiai Nesse sentido falarei com meus colegas para não acei-
tarem meus paroquianos para aconselhamento, sem que o tenha-
mos acertado devidamente. Também não aceitarei pessoas de
outras paróquias para aconselhamento, sem acerto devido com
o colega.

15. Como cristão e pastor eu aceito o direito que meu colega


que me precedeu no ministério naquela paróquia tem de
ver o seu nome protegido, de falsas interpretações. Nesse senti-
do procurarei sempre falar bem do colega, interpretando tudo da
melhor maneira.

16. Como cristão e pastor aceito o direito de meu colega pastor,


não intrometendo-me em sua área de trabalho, nem ofi-
ciando em sua paróquia sem autorização clara dele e de sua
paróquia.

17. Como cristão e pastor aceito a liberdade de trabalhar em


equipe com os outros, tanto com os líderes paroquiais como
com os colegas pastores, sem ver neles concorrentes, mas dons
de Deus para aperfeiçoamento dos santos (Ef 4.12). Entendo
que trabalho em equipe também inclui aceitar admoestação
quando eu faltar a compromissos assumidos.

III. Respeitar a escala de valores. — Como cristãos nós enten-


demos que há certas prioridades. Estas precisam estar sem-
pre claramente diante de nós quando precisamos decidir.

18. Como cristão eu aceito uma escala de valores em que o


espiritual tem precedência sobre o físico e o material.
Lembro-me de que uma pessoa tem mais valor do que todo o

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 17


mundo, e que vem em primeiro lugar o reino e sua justiça, sendo
depois acrescentadas as coisas.
19. Como cristão aceito a primazia do reino de Deus sobre as
coisas, procurando distribuir meu tempo, meus bens e meus
talentos de acordo com esta escala de valores. Assim com "espí-
rito voluntário" (Sl 51.12) buscarei, em primeiro lugar, uma
orientação segura na Palavra do Senhor para então fazer a
distribuição do meu tempo, meus bens e dos meus talentos nas
ordens sociais em que Deus me colocou por sua vocação. E n -
tendo que equipar os santos é tarefa básica do pastor.
20. Como cristão e pastor eu quero discernir entre tarefas ur-
gentes e outras menos urgentes, entre tarefas necessárias e
outras menos necessárias.
I V . Defender a honra do próximo. — O mundo entende que é
fácil destruir alguém, destruindo a sua honra. Já se ma-
tava com a língua em tempos bíblicos. O cristão entende que a
honra é quase uma ordem social, pois Deus defende a honra do
próximo no oitavo mandamento.

21. Como cristão e pastor eu me comprometo a preciso guardar


o segredo confessional. Minha congregação precisa saber
que jamais trairei segredos que me foram confiados em confissão
ou no aconselhamento pastoral.
22. Como cristão e pastor eu quero falar pelo mudo. Sei que
preciso falar sempre quando alguém é acusado injusta-
mente.
23. Como cristão e pastor eu vou procurar cobrir, o quanto
possível, os pecados dos irmãos. Nesse sentido quero ser
um parácleto: quero estar aí para os! outros, para ajudar a car-
regar o peso de sua vida.

24. Como cristão e pastor eu quero interpretar tudo da melhor


maneira, defendendo os meus colegas no ofício, meu presi-
dente, meu conselheiro, minha diretoria, minha igreja, os mem-
bros da minha congregação e meu próximo.
25. Como cristão e pastor quero usar de moderação (epiquéia)
ao julgar os outros, sabendo que também eu tenho minhas
fraquezas.

V. Reconhecer os direitos de propriedade. — Cada um tem, cer-


tas coisas que são suas conquistas na vida. Podem ser pro-

18 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


priedades, invenções, idéias. O mundo reconhece que quem i n -
ventou pode patentear sua invenção. O cristão também reco-
nhece que o próximo tem direito a sua propriedade. E l a não
está simplesmente à minha disposição.

26. Como cristão e pastor eu reconheço o direito do meu pró-


ximo sobre a sua propriedade. Desta forma não posso
simplesmente invadir a sua propriedade, nem fazer uso dela sem
a sua autorização.

27. Como cristão reconheço também que todos os bens que me


foram confiados por Deus possuem uma variada qualidade:
suprir minhas necessidades, e de minha família, mas também as
do próximo como parte do meu culto a Deus. Desta forma não
devo utilizar meus bens egoisticamente, mas administrá-los para
Deus dentro das ordens sociais.
28. Como cristão e pastor não quero enfeitar-me com "plumas
alheias". Assim, quando quero usar pensamentos, sermões,
poesias e artigos de outros, e que não são de domínio público,
eu quero primeiro verificar se tenho autorização para usá-los.
E quando o fizer, eu quero dar crédito ao seu autor, citando as
fontes.

29. Como cristão e pastor eu quero valorizar os esforços dos


outros que me ajudaram a crescer. Entendo que não me
diminui quando reconheço e valorizo a aprendizagem que fiz
com alguém.
30. Como cristão e pastor quero ser muito cuidadoso e cons-
ciencioso com valores que me foram confiados!. Entendo
que preciso administrar os bens que me foram confiados e pres-
tar contas com exatidão a quem mos confiou.

VI. Equilibrar responsabilidades. — Quando uma pessoa fica


envolvida demasiadamente com um certo assunto, ela pode
ficar unilateral em seu julgamento ou em suas ações. Todos nós
pertencemos a todas as ordens sociais: família, governo e igreja.
Em cada uma temos certas responsabilidades.
31. Como cristão e pastor eu quero cuidar para equilibrar m i -
nhas responsabilidades como pastor com as demais. Pois
reconheço também as minhas responsabilidades como esposo,
pai, assalariado, súdito, e como membro da minha sociedade e
do meu país. Nesse sentido preciso reavaliar continuamente mi-
nha permanência na mesma paróquia ou tarefa por tempo acima
ou abaixo do conveniente e produtivo.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 19


32. Como pastor reconheço minha responsabilidade de pastor-
mestre para equipar os santos (Ef 4.12) na paróquia. E n -
tendo que só assim cada um do povo de Deus poderá desempe-
nhar sua tarefa como membro do corpo de Cristo. Reconheço a
responsabilidade de equipar os congregados para viverem sua
vida cristã de adoração a Deus em confissão de fé e missão, em
oração e culto doméstico e público. Da mesma forma preciso
equipar os santos para viverem a sua fé em amor e serviço ao
próximo nas inúmeras oportunidades de sua vocação nas dife-
rentes ordens sociais. A i n d a preciso equipá-los para compreen-
derem a vida sob a cruz na esperança cristã.
33. Como cristão e pastor eu quero dividir bem o meu tempo
para atender todos os meus compromissos. Lembro espe-
cialmente o meu compromisso de pregar, de escrever devoções e
artigos, de estudar, de visitar, de aconselhar, e de instruir para
equipar os santos. Para isso preciso buscar energias novas e
conhecimentos atualizados em conferências, concílios e outras
oportunidades de estudo, na certeza de que não estou caminhan-
do sozinho nesta tarefa sublime.

34. Como cristão e pastor reconheço minha responsabilidade


com a sociedade em que vivo, usando a linguagem, os m o -
dos e os trajes adequados a cada momento de convívio social.
Entendo que também tenho responsabilidade com minha saúde
pessoal e social, dando um bom exemplo de preparo físico e
mental, de limpeza e asseio pessoal, de equilíbrio entre trabalho
e lazer, de sensatez e seriedade na administração dos recursos
disponíveis, de moderação no comer e no beber, evitando drogas
e vícios da sociedade e guardando distância da poluição moral
do mundo em que vivemos.

VIL Respeitar a responsabilidade dos outros. — A tendência


humana é sentir-se o centro do mundo. Achamos que te-
mos soluções para os problemas do mundo. Desta forma muitas
vezes tomamos a liberdade de decidirmos pelos outros, não dan-
do-lhes a oportunidade de tomarem a sua decisão ética que Deus
requer.

35. Como cristão e pastor quero aprender a incentivar os outros


a tomar as suas decisões diante de Deus. Entendo que nin-
guém pode crer pelo outro, ninguém pode viver pelo outro, e
que ninguém, por isso, deveria decidir pelo outro. Pois cada um
será responsabilizado diante de Deus.

36. Como cristão e pastor quero ajudar o meu próximo, e es-


pecialmente meu congregado, a tomar as suas decisões, en-

20 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


sinando-lhe o processo de decisão. Entendo que o processo de
decisão, depois de ter recebido de Deus pela fé um espírito vo-
luntário é o seguinte: 1. conhecer a l e i imutável de Deus, os
Dez Mandamentos; 2. conhecer as leis variáveis de Deus, como
são verificadas nas diversas ordens sociais e na experiência do
povo de Deus; 3. pedir em oração que Deus nos faça decidir
bem; 4. fazer a nossa decisão, na certeza de que Deus n,os guia
v que quer nos perdoar os erros; 5. agradecer a Deus quando
nos permitiu decidir bem; voltar a Deus em arrependimento
quando decidimos erradamente; 6. viver a vida com alegria,
quando houve boa decisão; fazer nova decisão quando possível,
quando esta não foi correta.

87. Como cristão e parácleto quero estar à disposição do meu


próximo para aconselhar e ajudar, respeitando, no entanto,
a sua responsabilidade de decidir. Mesmo que nem sempre pos-
sa concordar com a sua decisão, quero aprender a respeitar a
decisão do meu próximo, pois ele será responsabilizado por Deus.

38. Como cristão entendo que não há espaços livres de pecado,


porque continuamos a ser simultaneamente justos pelo
evangelho e pecadores pela lei. Como, no entanto, pela fé rece-
bemos a verdadeira espiritualidade a minha decisão como cris-
tão será a favor da justiça e contra a injustiça. Isto não garante
sempre uma decisão entre certo e errado. Muitas vezes deverá
ser uma decisão entre menos e mais prejudicial. Mesmo saben-
do que não serei perfeito eu sou chamado a decidir continua-
mente como um pecador espiritual que recebeu um novo espi-
rito) voluntário pela fé.
Apresentado no Concilio Nacional de Obreiros, reunido em Cam-
po Limpo, São Paulo, de 5 a 9 de julho de 1989, com adendos
sugeridos pelos conciliares.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 21


A RESPONSABILIDADE DOS PAIS NA
EDUCAÇÃO DOS FILHOS
Martim C. Warth

A. INTRODUÇÃO AOS CONCEITOS


Na discussão a respeito do tema destas reflexões a pro-
posta do uso de "responsabilidades" venceu sobre o uso de " d i -
reitos e deveres". Parecia mais global, pois se refere a uma
relação entre pessoas em que uma autoriza e a outra "responde".
A autorização sempre é uma vocação em que alguém é autoriza-
do com direitos e deveres a responder convenientemente. Fare-
mos inicialmente uma reflexão a respeito destes conceitos, como
eles são usados na linguagem teológica e confessional da igreja
luterana.

1, Responsabilidade e Vocação.
Na Apologia da Confissão de Augsburgo se confessa que
"a educação dos filhos" é uma questão da "vocação da cada
qual" (Ap X V , 25) 1 A vocação, que pode ser escolhida, como no
caso dos pais, ou imposta, como no caso dos filhos, pode até ser
decorrente de um "costume c i v i l " (Ap X V , 47). O próprio casa-
mento e a formação de um lar, embora estabelecidos a partir
de instintos naturais (o instinto sexual e o instinto gregário),
criados por Deus, são considerados por Lutero "ein weltlich
Geschäft", um assunto do mundo. 2 Este "costume c i v i l " se trans-
forma em vocação nas ordens sociais, criadas e ordenadas por
Deus. Lutero menciona geralmente três ordens: o "ordo" eco-
nômico, que inclui a família; o político, e o eclesiástico. Deus
regulamenta a vocação na família pelo primeiro uso da lei, es-
pecialmente nos seus 4º e 6º mandamentos.
A responsabilidade dos pais na educação dos filhos se re-
sume na aceitação consciente ou inconsciente da sua vocação de
pais. A vocação é uma transferência de autoridade. Essa auto-

22 i .. IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
ridade é necessária nas ordens sociais, pois só ela torna a vida
possível entre pessoas dentro de uma ordem social. Sem autori-
dade incia o caos. A última autoridade é do autor último, Deus.
Na estruturação das ordens sociais Deus autoriza outros a exer-
cerem autoridade em seu nome. São as "máscaras" de Deus,
como diz Lutero, 3 através das quais sempre ainda cumpre ver a
autoridade última de Deus. Como "não há autoridade que não
proceda de Deus" (Rm, 13.1), isso implica em responsabilidade,
tanto dos que exercem a autoridade, como dos que estão sob a
autoridade. A Apologia da Confissão de Augsburgo caracteriza
a responsabilidade como "obediência na vocação". 4
2. Responsabilidade como Direito e Dever.
Responsabilidade pressupõe direitos e deveres. Se há ne-
cessidade de "obediência na vocação" está também implícito que
alguém nos chamou e nos investiu de direitos. Ser chamado é
ser escolhido para exercer o privilégio de representar alguém e
de exercer autoridade em seu nome. Significa que alguém, teve
confiança em nós e nos honrou com uma distinção sem par. É
o privilégio da individuação em relação à massa. Somos alguém
porque alguém nos chamou pelo nome e nos autorizou a receber
destaque para exercer uma função. Somos "máscaras" daquele
que nos chamou. Exercemos um ofício que deve ser reconhecido
pelos demais. Este é o grande direito da vocação.
É implícito com esta honra que haja "obediência na voca-
ção". A pessoa chamada precisa integralizar a vocação e exercer
a tarefa inerente ao chamado. Daí resulta o dever. Precisamos
"responder" ao chamado, exercendo-o convenientemente. Os de-
veres podem ser implícitos ou explícitos, mas eles são inerentes
em qualquer posição de responsabilidade. Há o dever de re-
presentar bem, aquele que nos chamou. E há o dever de cumprir
a tarefa em relação àqueles para os quais se destina o interesse
da vocação. Sempre somos chamados para uma relação de pri-
vilégio com outros. Os outros têm o direito de esperar o meu
cumprimento do dever de ofício a que me levou o chamado.
Assim a vocação implica em obediência. A responsabilidade,
portanto, se verifica em direitos e deveres, como podemos ver
no caso específico da responsabilidade dos pais na educação dos
filhos.

B. A VOCAÇÃO DOS PAIS: 0 DEVER DOS FILHOS


A responsabilidade poderá ser verificada sob diferentes
perspectivas. Nos limitaremos a examinar algumas afirmações
das Escrituras Sagradas e das Confissões Luteranas, além de ve-
rificar como a própria natureza concorda com esta perspectiva.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 23


1. Escritura.

Há várias passagens bíblicas que ressaltam a vocação dos


pais em relação aos filhos, mas o conceito central está delineado
no 4° mandamento. Já na criação Deus fez homem e mulher
para que se multiplicassem, criando a vocação de pais, com todas
as suas responsabilidades (Gn 1.22). O ofício de pais tinha va-
lidade permanente, mas transferia responsabilidades quando os
filhos consitituiam sua própria família. O homem "deixa pai e
mãe" para se unir à "sua mulher" para aceitar uma nova voca-
ção de pais (Gn 2.24). É uma escolha livre, mas que atende a
um chamado da natureza instintiva criada por Deus.
A responsabilidade dos pais pelos filhos é totalmente
abrangente, pois não envolve apenas a doação e o desenvolvi-
mento da vida física, mas também a educação para a vida. E
vida para o filho de Deus engloba a sua relação com Deus pela
fé e a vida eterna. Colocar filhos no mundo sem lhes dar a
vida eterna é crime pela lei de Deus. Por essa razão Deus re-
quer que os pais ensinem seus filhos a respeito da Páscoa (Ex
12.26-27), dos mandamentos (2 Rs 23.2), e de todas as palavras
de Deus (Dt 6.7; 31.12-13). Por essa razão os pais traziam os
filhos à presença da congregação para buscarem o Senhor (2 Cr
20.4,13). Não era apenas uma vocação na sociedade patriarcal,
mas uma vocação permanente dos filhos de Deus que se torna-
ram pais. No Novo Testamento continua a mesma advertência
para que os pais criem os seus filhos "na disciplina e na admoes-
tação do Senhor" (Ef 6.4).

2. Confissões.
Lutero acentua esta responsabilidade nos sobrescritos das
diversas partes do Catecismo Menor, mostrando "como o chefe
de família deve ensiná-los com toda a simplicidade a sua casa".
Ele faz então uma exposição magistral desta responsabilidade
dos pais no seu comentário do 4º mandamento do Catecismo
Maior. Entende que a vocação dos pais está essencialmente na
palavra "honrar", guando o mandamento diz "Honrarás a teu
pai e a tua mãe". Com isso

Deus distingue o estado paterno e materno de modo


especial, acima de todos os estados que estão abaixo
de Deus.6
Com o termo "honrar"' Deus

separa e destaca pai e mãe acima de todas as outras


pessoas na terra e os põe ao lado dele. Pois honrar

24 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


muito mais elevada coisa é que amar. Não abrange
apenas o amor, senão modéstia, humildade e reverên-
cia como para com uma majestade aí oculta.6
É a vocação em que Deus "separa e destaca" para serem "más-
caras" da sua majestade. Esta majestade é oculta no ofício.
Os pais ocupam o "lugar mais elevado depois de Deus" e são
"representantes de Deus". Claro, não é a pessoa cm si, mas a
"autoridade" que os pais receberam pela "vontade de Deus, que
assim estabelece e ordena". 7 Podem até nem ser os pais genéti-
cos, mas todos aqueles que estão "em lugar dos pais". 8 Lutero
chega a quase desesperar da situação reinante, pois "os pais ge-
ralmente nada sabem. Um néscio educa o outro". 9 Mesmo assim
o ofício permanece, pois

se não tivéssemos pai e mãe, deveríamos, em razão


desse preceito, desejar que Deus nos erigisse troncos
e pedras a que pudéssemos chamar de pai e mãe.10

Lutero reduz tudo à vocação feita no mandamento. Como


"Deus assinou o primeiro lugar a esse estado" e determinou "que
seja seu representante na terra"11 é dever dos filhos "demons-
trar honra e obediência" e considerar esta "a maior obra que se
pode fazer depois do sublime culto divino descrito nos manda-
mentos anteriores".12 Por causa do mandamento de Deus Lutero
vê no pai "um homem diferente, ornado e revestido com a ma-
jestade e a glória de Deus". É o mandamento, ou vocação de
Deus,

é a corrente de ouro que leva ao pescoço, sim a cor-


rente em sua cabeça, que me indica como e porque se
deve honrar esta carne c sangue.13

Mas Lutero não é nenhum visionário. E l e sabe que os


pais precisam de auxiliares.

Quando um pai não pode sozinho educar seu filho,


apela para um mestre de meninos que o ensine; se
está demasiadamente fraco, pede ajuda de seus amigos
ou vizinhos; se falece, encomenda e delega o governo
c autoridade a outros, para tal fim ordenados.14

Mas sustenta a tese de que "da autoridade dos pais deflui e se


irradia toda outra autoridade". Por essa razão concentra a res-
ponsabilidade pela educação dos filhos nos pais, que podem e
devem delegar poderes, direitos e responsabilidades da sua pró-

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 25
pria vocação a outros. No seu louvor Lutero já inclui, a exem-
plo de "gente antiga e sábia", os mestres, quando diz:
"Deo, parentibus et magistris non potest satis gratiae
rependi", isto é: "A Deus, aos pais e aos mestres, nun-
ca se poderá agradecer e recompensar de modo su-
ficiente."15

Nesta perspectiva de Lutero, como a aprendeu da Escritu-


ra Sagrada, se nota não somente o compromisso dos pais com
respeito a seus filhos, mas também o seu privilégio de decidirem
livremente, sob o Senhor Jesus, o tipo de educação que entendem
ser necessário darem aos filhos. Ficam os limites, que Lutero
coloca da seguinte forma:
Se a palavra e a vontade de Deus têm seu curso e são
observadas, nenhuma outra Coisa deve valer mais do
que a vontade e a palavra dos pais, todavia assim, que
essa obediência aos pais fique subordinada à obediên-
cia a Deus e não vá de encontro aos mandamentos
precedentes.16

Gomo entende que Deus "não quer patifes e tiranos nesse ofício
e governação",17 Lutero já havia apelado cinco anos antes aos
conselheiros de todas as cidades alemãs para estabelecerem e
manterem escolas cristã, reconhecendo neles uma autoridade
auxiliar para a educação dos filhos de acordoi com; a vontade
de Deus.18 Mesmo assim permanece a tese básica que reconhece
os pais como os primeiros e fundamentais responsáveis pela edu-
cação dos filhos. Essa perspectiva também foi reconhecida como
um direito natural pela humanidade.

3. Os Direitos Humanos.
As Nações Unidas aceitaram a tese da responsabilidade
dos pais pela educação dos filhos. Com isso apenas confirma-
ram o humanismo do homem que já traz embutido por natureza
o preceito fundamental de Deus da responsabilidade individual
dos pais e da liberdade humana de escolher. Claro, esta liber-
dade o cristão só encontra quando aceita pela fé o único Senhor,
Jesus Cristo. Os pais que geram o filho são individualmente res-
ponsáveis por ele. Isso diz respeito ao desenvolvimento da vida
e da cultura, para habilitar o filho individualmente a afirmar a
sua liberdade em relação com aqueles que formam o seu am-
biente social e de vida. As teses do "kibbutz" e do socialismo
de estado não são inerentes à natureza, mas uma imposição filo-
sófica e política. A natureza do homem tende à preservação da

'2(J IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


liberdade individual (pela qual responde a Deus!), enquanto que
os interesses do estado procuram uma massificação manejável
pelo grupo dominante.
A O N U publicou em 1948 a "Declaração Universal dos
Direitos Humanos". No art. X X V I , inciso 3, se diz que "os pais
têm, com prioridade, o direito de escolher o gênero de educação
a dar a seus filhos", confirmando a posição bíblica e confessional.
E na "Declaração Universal dos Direitos da Criança", publicada
em 1959, se afirma no Princípio 6º que

Para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua


personalidade, a criança precisa de amor e compreen-
são. Criar-se-á, sempre que possível, aos cuidados e
sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipó-
tese, num ambiente de afeto e de segurança moral e
material; salvo circunstâncias excepcionais, a criança
de tenra idade não será apartada da mãe.19

No Princípio 7" se diz que "os melhores interesses da criança


serão a diretriz a nortear os responsáveis pela sua educação e
orientação; esta responsabilidade cabe, em primeiro lugar, aos
pais". Estas declarações, embora feitas num ambiente univer-
sal não necessariamente cristão, refletem a lei natural implan-
tada por Deus em toda a humanidade e dada de forma positiva
nos 10 Mandamentos.
C. A VOCAÇÃO DOS FILHOS: O DEVER DOS PAIS
Embora a vocação de ser pai seja uma opção livre, que
depois se transforma em responsabilidade, a vocação de ser f i -
lho é imposta. Ninguém é consultado a respeito da liberdade
ou não de ser concebido ou nascer. Quando houve concepção o
casal também já não tem opção de serem pais ou não: já são!
Logo, chamar um filho à vida é uma vocação que impõe tam-
bém imediatamente deveres aos pais. A responsabilidade dos
filhos é assumir a vida e "honrar" os pais. A responsabilidade
dos pais é zelar pela vida que chamaram à existência e se tor-
narem dignos da "honra" dos filhos.

1. Escritura.
Lutero, ao "pregar aos pais, e a quantos lhes fazem as
vezes, sobre como devem portar-se com os que a seu governo
estão encomendados", reconhece que este assunto "não ficou
exarado nos Dez Mandamentos de modo expresso", mas que é
"amplamente ordenado em muitos passos da Escritura". 20 A re-
ferência básica que Lutero colocou na Tábua dos Deveres do

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 27


Catecismo Menor encontra-se em Ef 6.4: "E vós, pais, não pro-
voqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na
admoestação do Senhor". Há também uma autoridade oculta
nos filhos que precisa ser reconhecida e respeitada. Os pais não
podem "irritar" os filhos, mas precisam valorizar a individua-
lidade e a personalidade dos filhos. Precisam ver a sua voca-
ção e respeitá-la. Os filhos têm, um outro chamado de Deus,
Talvez ouvem um outro ritmo, que os pais precisam respeitar.
Cada filho tem certas ordens seladas pela vocação de Deus, que
precisam ser descobertas e desenvolvidas. O importante é que
os pais os "criem", eduquem, desenvolvam, respeitem, fazendo-os
crescer "na disciplina e admoestação do Senhor". Em última
análise, que façam os filhos conhecer e reconhecer sua vocação
por Deus e para Deus. O Senhor chamou tanto os pais como
os filhos. 0 respeito a essa vocação dos filhos deve ser o obje-
tivo da educação deles. Já que os filhos existem por opção dos
pais, confirmada e reconhecida pelo Senhor, os pais precisam
respeitar esta autoridade dos filhos e encaminhá-los ao Senhor
para que possam desenvolver o seu chamado à vida e à vida
eterna. Uma educação que não inclui a fé no Senhor é incom-
pleta, parcial e destrutiva.

2. Confissões.
Na exposição do 4" mandamento Lutero lembra esta res-
ponsabilidade dos pais. Para ele os pais e "quantos lhes fazem
as vezes" devem
ponderar no fato de que devem obediência a Deus, c
acima de qualquer coisa desempenhar-se-ão, de cora-
ção e fielmente, dos encargos de seu ofício, não cui-
dando apenas do sustento material de filhos, emprega-
dos, súditos, etc, porém sobretudo educando-os para
louvor e honra de Deus.21

Nesta reflexão de Lutero pais, patrões e governo são vistos Como


numa sociedade patriarcal, quase teocrática. Na sociedade mo-
derna já não se entende que "patrões e governo" devam educar
"para louvor e honra de Deus". No entanto ainda entendemos
que também patrões e governo estão sob a autoridade de Deus
e não têm o privilégio de não prestar contas a Deus por seus
atos. Toda ação contrária ao reino de Deus se vinga. Há uma
retribuição nas próprias ordens sociais, mas há também uma
retribuição final pelo autor e Senhor da autoridade. A sociedade
que esquece a Deus está com problemas. Dentro dessa perspecti-
va no Brasil o governo concede liberdade religiosa, auxilia alu-
nos em escolas "particulares c confessionais, c fomenta o ensino

28 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


religioso nas escolas públicas. Nos Estados Unidos da América
o princípio de separação de igreja e estado proíbe toda menção
de religião em escolas públicas, criando um ensino anti-religioso
que deturpa a formação integral da juventude, semelhante a
países declaradamente ateus no leste europeu do passado.

Lutero entende que isso não


é matéria entregue a teu talante e capricho. ,Trata-se,
ao contrário, de rigoroso preceito e injunção de Deus,
ao qual também terás de prestar contas a esse res-
peito.22

Os pais precisam compreender


quão grande é a necessidade de nos ocuparmos a sério
da juventude. Se queremos pessoas excelentes e hábeis
tanto para o governo secular como para o espiritual,
cumpre deveras não nos poupemos empenho, faina e
gastos na tarefa de ensinar e educar os nossos filhos,
a fim de que possam prestar serviços a Deus e ao
mundo.23

Como os filhos receberam a vocação de Deus, os pais não podem


faltar "ao dever de educar" seu filho "de maneira útil e para
salvação".24

D. A IMPORTÂNCIA DA RELAÇÃO DE PAIS E FILHOS


A responsabilidade dos pais na educação dos filhos é tão
relevante por causa da importância da relação dos pais com os
filhos em vários aspectos do seu desenvolvimento. Podemos en-
focar três aspectos: a transferência do modelo, a continuidade
do exemplo, e a segurança da alegria de viver.

1. A Transferência do Modelo.
Os pais não são apenas "máscaras" de Deus no sentido de
serem autoridade em lugar de Deus para os filhos, mas, na rea-
lidade, representam a "imagem de Deus". Embora o. homem
perdesse a imagem de Deus com a queda dos primeiros pais,
ainda permanecem aspectos dessa imagem que são passados aos
filhos. Há um relativo conhecimento natural de Deus e uma
noção da vontade de Deus como aparece nas leis das ordena e
é reconhecido pela consciência moral. No cristão a imagem d i -
vina começa a ser restaurada pela fé para atingir a plenitude
apenas na ressurreição.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 29


Mas neste tempo de restauração a responsabilidade dos
pais na educação dos filhos é exatamente a de representar bem
o amor de Deus. 0 pai é o modelo do P a i Celestial. A noção
de " P a i " com relação a Deus será moldada de acordo com, o
modelo de " p a i " que a criança tem diariamente diante de si.
É verdade que a fé é um dom de Deus que o Espírito Santo nos
dá através do contato com o Evangelho, seja na Palavra ou no
sacramento do Batismo. Mas a aprendizagem a respeito da fé,
ou a fé que reflete sobre o seu conteúdo (fides reflexa), é mol-
dada a partir dos conceitos e imagens que aprendemos na in-
fância. A criança compreende o amor de Deus quando tem uma
relação de amor com o seu pai na família. A justiça e o perdão
de Deus são conceitos formados a partir da justiça e do perdão
dos pais. O modelo do pai e da mãe é transferido para a com-
preensão do Pai Celestial, que quer amar semelhante a uma mãe
que ama o filho que gerou. Se este amor for convincente, a
transferência do modelo para Deus será fácil.

2. A Continuidade do Exemplo.
A criança copia modelos. Isso ressalta a grande respon-
sabilidade dos pais na educação dos filhos. Não são apenas as
palavras de estímulo e encorajamento ou repreensão que vão
moldar o comportamento da criança. São especialmente os
exemplos vividos pelos pais que educam e moldam os filhos.
Há uma continuidade nesta modelagem de uma geração a outra.
Quando o pai aceita a autoridade de Deus, do governo, do pa-
trão, da polícia, o filho poderá copiar o exemplo de obediência
à autoridade que o próprio pai representa. Os pais representam
exemplos de valores morais, de padrões, de etiqueta, de gentile-
za, de ternura, de amor, que são copiados pelos filhos. A opinião
que os pais têm dos filhos são o padrão para a avaliação que
o próprio filho faz de si mesmo. Nós geralmente vivemos de
acordo com a reputação que temos. O relacionamento dos pais
com a sociedade dará as dicas para o filho se orientar fora do
lar. O sucesso ou o fracasso dos pais geralmente são copiados
pelos filhos. O modelo sexual dos pais forma a estrutura básica
para o relacionamento sexual do filho. O amor dos pais conti-
nua normalmente no amor dos filhos. O problema é que o mau
exemplo dos pais geralmente se fixa mais profundamente nos
filhos do que os exemplos bons, talvez por causa da tendência
natural do ser humano para o caos. Isto mostra a importância
da relação positiva dos pais como exemplos para os filhos.

3. A Alegria de Viver.
V i d a é algo precioso que defendemos por instinto natural.
A pessoa humana se realiza mais quando pode sentir a alegria

30 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


de viver. Não há momento mais bonito para viver do que hoje.
Este otimismo faz parte da responsabilidade dos pais na educa-
ção dos filhos e lhes dá segurança. Os pais que aprenderam a
viver com fracassos e deram volta por cima sabem incentivar
os seus filhos a olharem com confiança para o futuro. Quando
nos sabemos amados apesar de eventuais fracassos então cria-
mos a coragem de fazer tentativas de risco para progredir. Não
vamos ganhar sempre, mas os pais podem dar aos seus filhos a
alegria de viver e a segurança de viver quando valorizam não
apenas as vitórias dos filhos, mas o seu esforço e sua tentativa
corajosa de risco calculado. Quando os pais dão a segurança do
sen amor e respeito, o filho pode se desenvolver de acordo com
o seu próprio ritmo e os dons que recebeu da parte de Deus. O
encorajamento dos pais que dizem: "Por que não tenta? Tenho
certeza que você pode conseguir!" é melhor do que a critica:
" E u lhe falei! Você é o fracasso de sempre!" O filho geralmen-
te vive de acordo com as expectativas que os pais têm dele. Que
bom quando os pais entendem a sua responsabilidade na educa-
ção dos filhos e fortalecem neles a alegria de viver.

E. A TRANSFERÊNCIA DA VOCAÇÃO

Não há lugar mais importante do que a família, pois ali


aprendemos a viver e a partilhar um com o outro a alegria de
viver. Mesmo assim os pais nunca conseguiram convincentemen-
te cumprir sozinhos com todas as responsabilidades na educação
dos filhos. Mas formam o núcleo de comando desta educação
por causa da vocação de serem os pais. O conceito de "próxi-
m o " é muito importante 11a solução do problema. Deus entende
que a vida cristã se realiza no serviço de amor ao próximo. O
"amarás o teu próximo como a ti mesmo" implica na presença
do próximo que necessita do meu amor. Na sua liberdade ele
me vai indicar qual é a melhor forma de amor que existe para
lhe servir. Quem me indica quais são as boas obras do momento
é o meu próximo. Mas, de outro lado, eu posso ter a certeza de
que Deus colocou muitos "próximos" também ao meu redor para
me servir e amar. Desta forma posso ficar descansado: a tarefa
e obrigação da minha vocação de pai pode ser transferida e com-
partilhada com os meus "próximos" que Deus me coloca à dis-
posição no seu reino. E Deus ainda me dá a liberdade de esco-
lher o "próximo" que mais corresponde ao meu critério de
realização da minha vocação. A autoridade da minha vocação
de pai pode ser compartilhada com a escola, o trabalho, o go-
verno, a igreja, sem diminuir a minha autoridade e responsabi-
lidade que tenho diante de Deus.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 31


1. A Escola e o Trabalho.
Lutero inclui no 4º mandamento todas as autoridades que
completam o ofício dos pais. F a l a da "multímoda obediência
aos superiores, que têm a seu cargo mandar e governar". Mas
entende que esta autoridade faz parte da autoridade dos pais e
não a diminui, "porque da autoridade dos pais deflui e se irradia
toda outra autoridade". Para mostrar como entende este "de-
fluir" e "irradiar" da autoridade, ele menciona especialmente a
escola e o trabalho, dizendo: "Quando um pai não pode sozinho
educar seu filho, apela para um mestre de meninos, que o en-
sine". E então vê o pai como empresário, pois "além disso deve
subordinar também a si domésticos, empregados e empregadas,
para o governo da casa". Entende que há outros que estão "em
lugar dos pais". E "cumpre que deles (dos pais) recebam poder
e autoridade para governar" no "ofício de pai". 25
Em 1580, um ano depois de escrever os catecismos, Lutero
escreveu um tratado26 em que prestigia a escola e insiste que os
pais compartilhem a sua autoridade com os mestres. Seu argu-
mento é que os filhos não são exclusivamente dos pais, mas de
Deus. E Deus os precisa para serem preparados para se torna-
rem pastores e professores, bem como para ocuparem bem os
seus lugares nas ordens sociais. Ele entende que Deus diz aos
pais: Tu podes melhorar o convívio humano nas ordens sociais,
pois "eu te dei filho e bens para isso". É só prepará-los pela
escola!2' E Lutero apela: " E u acho que nunca houve tempo me-
lhor para estudar do que agora!"28 Por isso

deixa teu filho estudar, e mesmo que às vezes tenha


que pedir pão. Tu estarás dando a Deus uma madei-
rinha boa, da qual Ele te poderá fazer a escultura de
um senhor.29

Acha que estes filhos irão governar o mundo. Considera uma


das maiores virtudes na terra o educar fielmente os filhos de
outra gente. Lutero mesmo queria ser professor, se não fosse
pregador. Entende que a um professor fiel não se pode pagar
o suficiente com, nenhum dinheiro, como já dizia Aristóteles.30
Mas são os pais que possuem a autoridade para enviarem; os f i -
lhos à escola para se tornarem escritores (como Lutero se con-
sidera ser), secretários, juristas, médicos, teólogos, pastores, pro-
fessores, comerciantes, sem esquecer os afazeres do lar e os
demais ofícios e trabalhos. No entanto, como os pais não cum-
prem com o seu ofício de pais, Lutero apela para outra autori-
dade: "Considero que também o governo tem o dever de obrigar
os súditos a enviarem os seus filhos à escola".31 E se o pai for
pobre o governo deve usar fundos dos ricos para dar bolsas de

32 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
estudos. Lutero termina o apelo: "Bem, meus queridos alemães,
falei que chega: vocês ouviram o seu profeta!" 32
A escola nem sempre era formal no tempo de Lutero, pois
podia englobar a aprendizagem com um "mestre" em técnicas
é artes, como a aprendizagem nos Senai e Senac de hoje. Ao
mesmo tempo já iniciava uma recompensa salarial pelo trabalho
feito durante a aprendizagem. Por isso Lutero arrisca uma dei-
xa contra as greves dos sindicatos de hoje, dizendo que os em-
pregados "até que deviam voltar salário e regozijar-se com o fato
de poderem receber patrões e patroas".33

2. Governo e Igreja.
Lutero transfere a vocação dos pais também para o go-
verno e a igreja. Louva os romanos que
chamaram a seus príncipes e magistrados de patres
patriae, isto é, pais da pátria, para grande vergonha
nossa, que pretendemos ser cristãos, porquanto não os
chamamos também assim, nem ao menos os conside-
ramos e honramos como tais.34

Sem esvaziar a autoridade dos pais Lutero transfere toda a auto-


ridade também ao governo. Há necessidade "da obediência à
autoridade civil, que, conforme dito, pertence à ordem paterna
e é a mais abrangente das relações". Os governantes são pais
"tantas vezes quantas forem os habitantes, cidadãos ou súditos".
Por intermédio deles "Deus nos dá e conserva alimento, casa e
lar, proteção e segurança". Por essa razão "é dever nosso hon-
rá-los e tê-los em alta consideração, como o mais precioso te-
souro e jóia na terra".35 Lutero chega a usar os mesmos adje-
tivos que usou em relação aos pais.
No sermão sobre o 4" mandamento de 152536 Lutero argu-
menta que

esta ordem (da obediência) no lar é a primeira regra;


é a fonte de toda outra lei ou de governo. . .. Pois o
que é uma cidade, senão um grupo de lares? . . . T a m -
bém, o que é um país todo, senão um grupo de cidades,
vilas, e lugarejos? Se os lares forem mal administra-
dos, como pode todo um país ser bem governado?37

Entende que a autoridade dos pais se transfere ao governo, pois


que o governo representa a soma da autoridade paterna nos la-
res. Mesmo assim não esgota a autoridade paterna, mas a re-
força.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 33


Lutero inclui ainda os "pais espirituais", que também exer-
cem o "ofício de pai". "Chamam-se pais espirituais apenas
aqueles que nos governam e presidem mediante a palavra de
Deus."38 E como "são pais, devida lhes é também a honra, até
acima de todos os outros".39 Como é dever dos pais educarem
os filhos "de maneira útil e para salvação",40 fica clara a impor-
tância não só dos mestres, mas também da igreja toda, que pre-
cisa providenciar os "pais espirituais" para auxiliarem os pais
nesta tarefa abrangente.

F. CONCLUSÃO

A responsabilidade da educação dos filhos permanece com


os pais. Se de um lado têm, o direito de darem e providenciarem
aos filhos a educação que corresponde à sua visão de mundo,
de outro lado este direito se transforma em dever. Os pais não
podem se omitir nesta educação. A escola, o trabalho, o gover-
no, e a igreja são apenas agências auxiliares nesta tarefa dos
pais. A autoridade dos pais precisa ser respeitada. Para que
isso possa acontecer deve haver uma múltipla escolha para a
educação dos filhos, como só um estado democrático pode ofe-
recer, fomentando, além da escola pública, a escola particular
e confessional.

NOTAS
1As Confissões Luteranas serão citadas pelo Livro de Concórdia.
Porto Alegre/São Leopoldo: Concórdia/Sinodal, 1980. A Apologia da
Confissão de Augsburgo será citada como Ap, o Catecismo Maior como
CM. Ap XXVII, 49-50: "Propõe-se o exemplo de obediência na vocação.
. . . As vocações são pessoais, da mesma forma como as próprias incum-
bências variam de acordo com o tempo e as pessoas. Mas o exemplo de
obediência é geral. . . . Destarte, perfeição, para nós, é cada qual obedecer
com verdadeira fé à sua vocação." Como isto implica em correção e
arrependimento, Melanchthon diz: "E nessas coisas colocamos a perfeição
cristã e espiritual, se crescem simultaneamente o arrependimento e, no
arrependimento, a fé." (Ap IV, 353).
2
"Eiri Traubüchlin für die einfáltigen Pfarrherrn", 1, pág. 528 de
Die Bekenntnisschriften der evangelisch-hitherischen Kirche. 4º edição.
Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1959.
3
W A 31 I, 435. Citação de 626. Der 147.Psalm Lauda Jerusalem
ausgelegt. 1532. Se encontra em WA (Weimar) 31 I (427) 430-456 ou
W 2 (St. Louis) 5, 1302-1333. — Citado também em Gustav Wingren,
Luther On Vocation. Philadelphia: Muhlenberg Press, 1957, pp. 137 a 143.
4
Ap XXVII, 49-50. Ver nota 1.
5
6
CM I, 105.
7
CM I, 106.
8
CM I, 107-108.
9
CM I, 115.
CM I, 124.

34 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


10
11
CM I, 125.
12
CM I, 126.
13
CM I, 125.
14
CM IV, 20.
15
CM I, 141.
16
CM I, 130.
17
CM I, 116.
18
CM I, 167.
676. An die Ratherren aller Städte deutschen Lands, dass sie christ-
liche Schulen aufrichten und halten sollen. 1524. WA 15 (9)27-53; W 2
19, 1468-1473.
19
Ari Herculano de Souza, Os Direitos Humanos. São Paulo: Editora
do Brasil,
20
1989, pp. 31, 35.
21
CM I, 167.
22
CM I, 168.
23
CM I, 169.
24
CM I, 172.
25
CM I, 176.
26
CM I, 141-142.
675. Eine Predigt, dass man Kinder zur Schule halten solle. (Matth.
19,14). 1530. WA 30 II, 509f., 517-588; W 2 10, 416-459. Será citado como
Eine 27 Predigt.
28
Êíne Predigt, cols. 433 e 445. Edição de St. Louis.
29
Ibid., col. 446.
30
Ibid., col. 452.
31
Ibid., col. 454.
32
Ibid., col. 457.
33
Ibid., col. 459.
34
CM I, 144.
35
CM I, 142.
36
CM I, 150.
520. Predigten über das 2. Buch Mose. 1524/1527. Pr. 537 sobre
2. Mose 20 (4.-7.Gebot). 5 November 1525. WA 16, 500-519; W 2 3,
1106-1123.
37
Será citado como Predigten, pela edição de St. Louis.
38
Predigten, col. 1106.
39
CM I, 158.
40
CM I, 160.
CM I, 176.

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 35
PROLEGÔMENOS À ESCATOLOGIA DO
ANTIGO TESTAMENTO
Acir Raymann

Uma perspectiva e confiança futuras perpassam todo o


Antigo Testamento. Cada ato salvífico de Deus é visto como
prelúdio a atos salvíficos ainda maiores. Promessas do que Deus,
fará no futuro são por Ele constantemente reiteradas para criar
em Israel esperança em Yahweh. T a l perspectiva futura pode-se
observar em cada divisão do cânone hebraico.
A começar com, Gênesis 3.15, a promessa no protevange-
lium é a linha dourada que se estende através do Pentateuco.
A promessa a Abraão em Gênesis 12 controla a narrativa da
Torah a partir deste capítulo até o final de Deuteronômio.
Yahweh reitera essa promessa com freqüência a Abraão (p. ex.,
Gn 15; 17; 26, 28; 35), a Moisés (p. ex., Ex 3.6-10; 6.2-8; 33) e a
Israel (p. ex., Ex 23/23».; Lv 20.22-26; Nm 15.18; Dt 28). Esta
promessa consiste basicamente de três partes: Deus dará a seus
descendentes a terra de Canaã; muitos serão seus descendentes;
estes descendentes serão abençoados de tal sorte que serão trans-
formados em canalizações da bênção divina a todos os povos.1
Lendo o Pentateuco pode-se notar, por um lado, como
Deus parcialmente cumpre Sua promessa já com o patriarca.
Abraão recebe efetivamente um pedaço da Terra Prometida co-
mo um sinal, uma entrada, mesmo que ela, significativamente,
sirva apenas de cemitério (Gn 23; 49.29-50.14). Deus lhe conce-
de também descendentes: setenta pessoas descem, ao Egito (Gn
16.8-27); no êxodo sua descendência é uma multidão (Nm 1;
26); e no período da monarquia Davi reina "sobre um povo tão
numeroso como o pó da terra" (2 Cr. 1.9). Deus abençoa Abraão
e faz dele e de sua descendência instrumentos de Suas bênçãos
às nações (Gn 13.2; 24.1; 20.17-18; 41.37-57; Ex 12.38).
Não obstante, o cumprimento pleno da promessa abraâmi-
ca ainda reside no futuro. Moisés suplica a Yahweh que multi-
plique e abençoe Israel no futuro (Dt 1.11) e a Terra Prometida

36 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
ainda está por ser herdada de sorte que o Pentateuco conclui
perscrutando o horizonte do futuro (Dt 33-34).2
Esta mesma dimensão futura da fé israelita pode-se veri-
ficar nos Profetas Anteriores. Em, Josué Deus dá a Israel a
Terra Prometida. Contudo, após a Conquista, há ainda muita
terra a ser conquistada (cap. 13) e distribuída (cap. 14-22). No
período dos Juizes, por mais de três séculos, Israel foi ameaçado
por inimigos. O descanso permanente que Yahweh prometera
era um "ainda não". O livro de Samuel está centrado em Davi,
seu entronamento e a aliança davídica (2 Sm 7; 23.5). A ênfase
da aliança davídica é a promessa de que Yahweh irá estabelecer
e manter a linhagem e o reino de Davi para sempre. O livro de
Reis continua a desenvelopar a promessa divina a Davi. Salo-
mão constrói o Templo e ora para que Yahweh continue a aben-
çoar Israel e as nações pela Sua presença graciosa no Taberná-
cülo (1 Rs 8). Os Profetas Anteriores encerram com a afirma-
ção de que o rei Joaquim, da linhagem de Davi, é libertado da
prisão no exílio babilônico (cap. 25). A promessa davídica per-
manece ainda intacta; no exílio há ainda esperança para Israel.
A mensagem dos Profetas Posteriores está centrada na
promessa divina pelo futuro. Embora o juízo de Deus sobre-
venba por causa da rebelião de Israel, Amós diz que passado o
juízo virá a restauração (9.11-15). A ira de Deus está a serviço
da Sua misericórdia. A ameaça da ira de Deus é Sua penúltima
palavra; a palavra final é a promessa da Sua misericórdia. Os
profetas focalizam a atenção do povo de Deus emi diferentes
quadros emoldurados pela futura promessa escatológica. No cen-
tro está Yahweh e Sua graciosa presença em Sião. Deus criará
um novo Israel que consistirá de crentes: o fiel remanescente
de Israel (Sf 3.11-20) e gentios convertidos (Sf 3.9). Tanto
israelitas quanto gentios tornar-se-ão um povo de Deus (Is
19.24-25; Am 9.11-12). Deus formará este novo Israel pelo per-
dão dos pecados (Jr 31.31-34) e pelo derramamento de Seu San-
to Espírito (Jl 2.28-29). Para o Seu povo escatológico reunido
em torna da presença de Yahweh (Jl 3.17) e do Messias (Is 11;
Mq 5), Deus criará "novos céus e nova terra" (Is 65.17-25).
Também os Escritos apontam unanimemente para o fu-
turo. Os Salmos são dominados pela esperança em Yahweh.
Maldições para os ímpios e bênçãos para os justos na Literatura
Sapiencial devem, ser entendidas como escatológicas. Perder es
ia perspectiva significa ser partícipe da superficial teologia dos
amigos de Jó, que entenderam as ameaças e bênçãos como tem-
porais. No centro do Livro de Lamentações está a confiança
do poeta de que as misericórdias) do SENHORi jamais se findam
— por isso ele espera no S E N H O R (3.19-26). Daniel proclama
o Reino escatológico de Deus ao falar de "um como o Filho do

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 37


homem" que virá em glória (cap. 7). Os Escritos terminam com
a referência ao decreto de Ciro pelo qual os exilados devem re-
tornar a Jerusalém e reconstruir o templo (2 Cr 36). Vê-se que
também, esta última secção do cânone hebraico encerra inclinan-
do-se para o futuro.
Mesmo a vôo de pássaro pode-se notar que todo o Antigo
Testamento apresenta uma perspectiva e confiança futuras. Os
escritores da antiga aliança ficam na "ponta dos pés" aguar-
dando a misericórdia de Deus por vir. Os atos salvíficos de
Yahweh no passado, os ofícios e instituições do Antigo Testa-
mento são tipos, prelúdios, entradas do prometido futuro.
O futuro escatológico é descrito no Antigo Testamento co-
mo estando tanto em continuidade quanto em descontinuidade
com o presente. A continuidade entre o "agora" e a "era esca-
tológica" é expressa de várias formas. Primeiro, o mesmo Deus
que salvou o Seu Povo e que com ele estava é o mesmo Deus
que virá, que salvará Seu povo e com ele estará. Nas palavras
de Isaías, " E l e é o primeiro c o último" (44.6). Segundo, o
povo de Deus, aqueles que "confiam em Yahweh" e "invocam, o
Seu Nome" agora, continuarão se ser Seu povo depois — mesmo
a morte não poderá separá-los de Deus (p. ex., Is 26.19; Sl
73.24-26). Terceiro, a nova criação é freqüentemente descrita
em termos da Terra Prometida do Antigo Testamento (cf. Am
9.13-15; Jl 3.17-21). A escatológica Terra Prometida será seme-
lhante à do Antigo Testamento.
Mas, o Antigo Testamento apresenta o futuro como estan-
do também em descontinuidade com o presente. O futuro será
bem mais esplendoroso. Em primeiro lugar porque a futura
salvação que Yahweh irá instaurar será bem maior que Seus
atos salvíficos no passado. Haverá um novo e maior êxodo da
escravidão (Is 11.15-16; 52.12). Deus "tragará a morte para
sempre" (Is 25.8). A kavôd de Deus, Sua glória, encherá toda
a terra (Nm 14.21; Is 11.9). Por outro, o povo de Deus será
maior. O escatológico povo de Deus será integrado por multi-
dões de gentios (p. ex., Is 25.6ss; Sf 26.19). Os crentes de todas
as gerações estarão nele incluídos (Dn 12.2). Por fim, a esca-
tológica Terra Prometida, os "novos céus e nova terra", será
bem maior que o seu tipo mencionado no Antigo Testamento
(Is 35; 65.17-25).
A descontinuidade entre o agora e a era escatológica in-
dica que o futuro prometido do Antigo Testamento não é sim-
plesmente aqui e agora, como também não culmina num milê-
nio terreal. Daniel afirma que o Reino escatológico de Deus é
bem diferente dos reinos dos homens (caps. 2, 7), razão pela qual
este futuro também não é secular ou humanista. Ele se caracte-
riza por bênçãos futuras que Deus concede, por graça somente,

38 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
e que serão desfrutadas apenas pelos crentes. O prometido fu-
turo do Antigo Testamento é um futuro centrado no Evangelho;
é o futuro Reino de Deus, não uma utopia econômica ou política.
A ameaça da ira escatológica de Deus contra os, incréus
tem por objetivo conduzir pecadores ao arrependimento (p. ex.,
Sf 2.1-3; Is 66.24). Mas a promessa da misericórdia escatológica
de Deus visa criar e manter a esperança em Yahweh (Sl 73; Is 35;
40-66). A escatologia do Antigo Testamento é, pois, de uma
relevância muito prática. Não é uma especulação abstrata; pe-
lo contrário, ela conclama ao arrependimento do pecado e ao
exercício da fé (p. ex., Is 8.17). A certeza que as promessas es-
catológicas produzem é uma certeza em Yahweh, não um, senti-
mento piedoso com vistas à otimização do mundo; é uma cer-
teza em Deus, não no homem ou no processo natural da história
(Sl 39.7).3
Este aspecto sola fidei do Antigo Testamento precisa ser
enfatizado em contraposição às re-leituras secularizadas ou mar-
xistas que se fazem do Antigo Testamento.4 Da mesma forma a
função das promessas escatológicas de conclamar pessoas à fé
e à esperança em Deus deve ser reiterada para neutralizar neo-
apocalípticos que utilizam profecias do Antigo Testamento como
bola de cristal para satisfazer a curiosidade humana sobre o
futuro.5
O Novo Testamento apropria-se destas promessas do A n -
tigo Testamento e enquadra-as na moldura do "já — ainda não".
Por um lado, as promessas escatológicas vetero-testamentárias
cumprem-se em Cristo. Na carta ao Gálatas o apóstolo São Pau-
lo afirma que Cristo é o "descendente" de Abraão, o Israel re-
duzido a U m , através de Quem todas as nações da terra são
abençoadas (cap. 3). Em outros textos, a Escritura atesta que
o novo, o maior Davi chegou e assenta-se no trono davídico como
Rei sobre todos (p. ex., Lc 1,32; At 2.29-30). Um novo e maior
Templo surgiu (Mt 12.6; Jo 2.18ss). Um, novo Israel Cristo fez
nascer formado tanto por judeus quanto por gentios pelo perdão
dos pecados e o derramamento do Santo Espírito (Gl 3.28-29);
At 2.1-4). O escatológico Reino de Deus manifestou-se em Cristo
(Lc 11.20; Cl 1.13). A morte foi tragada pela vitória (1 Co
15.54); o " D i a do S E N H O R " chegou (2 Co 6.1-2).
Por outro lado, o Novo Testamento projeta as promessas
do Antigo Testamento na tela do futuro e declara que a consu-
mação é um "ainda não". Cristãos hão de herdar as promessas
feitas a Abraão (Rm 4.13ss.; Gl 3.14). O Filho de Davi e o
S E N H O R de Davi virá novamente (Ap 22.16-20). Deus "taber-
naculizará" com Seu povo para sempre (Ap 21.3,22). O Novo
Israel de Deus será congregado no Último D i a para adorá-Lo
(Mt 24:31; Ap 14). O Reino escatológico de Deus é ainda futuro

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 39


(Mt 25.34). A morte ainda será tragada (Ap. 21.4). O " D i a do
S E N H O R " ainda está por vir (1 Ts 5.1-11).
Por um lado, os cristãos já se regozijam com as bênçãos
escatológicas de Deus pela fé. Por outro, os cristãos são também
pecadores vivendo num m,undo caído e, por isso, aguardam ain-
da o desfrutar destas bênçãos ao vivo e em celeste dimensão.

Sinais escatológicos
0 Antigo Testamento apresenta o escatológico " D i a de
Y a h w e h " como sendo precedido e acompanhado por determina-
dos sinais que podem ser agrupados em duas categorias, ou seja,
fenômenos cósmicos e intensa tribulação contra os santos. Os fe-
nômenos cósmicos têm sua imagem provavelmente derivada da
teofania divina no Monte Sinai onde havia trovões e relâmpagos
e o monte esfumaceava e tremia (Ex 19.1-25). Esta linguagem
teofânica é projetada no futuro yôm Yahweh. Os profetas o des-
crevem como um; dia assombroso em que a terra irá estremecer
e até os corpos celestes irão se entenebrecer (p. ex., Am 5.18-20;
Sf 1.14-18; Jl 2.30-31). Estes sinais cósmicos dão testemunho
Daquele que está por vir: O S E N H O R dos Exércitos aproxima-se
e com tão grande ira que, como diz o profeta Isaías, os incréus
esconder-se-ão ante o Seu terror (2.10-19).
Textos do Antigo Testamento falam de uma intensa per-
seguição contra os santos pouco antes do eschaton. O intérprete
bíblico precisa reconhecer que tais textos estão escritos em gê-
neros proto- e apocalípticos. Por esta razão não devemi ser in-
terpretados literalisticamente como os dispensacionalistas geral-
mente o fazem.6 Deve-se considerar que estes textos empregam
figuras e vestem, sua mensagem com indumentária antes de Cris-
to. Os capítulos 38 e 39 de Ezequiel, por exemplo, descrevem os
últimos dias como de guerra contra Israel. Os inimigos são
nações distantes do norte e do leste (38.2-6). Não obstante a
dificuldade em identificar os lugares, Meseque e Tubal foram
localizados na Anatólia. A identidade de "Gogue da terra de
Magogue" é imprecisa mas com certeza não se referem à União
das Repúblicas Socialistas Soviéticas como, de novo, dispensa-
cionalistas sustentam.7 O texto enfatiza que Yahweh trará estes
inimigos contra Seu povo Israel e depois os destruirá para vin-
dicar Sua santidade perante as nações. Ezequiel 38 e 39 não
devem ser interpretados literalisticamente; não se pode cogitar
em uma guerra moderna no Oriente Médio ou no atual conflito
no Golfo Pérsico. A ordem divina ao profeta de falar "às aves
de toda espécie, e a todos os animais do campo" (39.17) de-
monstra a natureza simbólica da linguagem. O profeta emprega
linguagem tipológica para descrever os derradeiros estertores dos

40 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
inimigos do povo de Deus. Esta guerra final estará sob o con-
trole de Deus e através de Sua vitória Yahweh vindicará Sua
santidade diante de todos. São João, em Apocalipse 20.7-10,
utiliza esta figura de Ezequiel para descrever o "pouco tempo"
de Satanás contra a Igreja.
O profeta Zacarias no capítulo 14 também descreve, em
linguagem apocalíptica, uma guerra final contra Jerusalém. A
ênfase de Zacarias está novamente em que Yahweh manifesta
Seu domínio sobre todas as coisas vencendo os inimigos do Seu
povo. O profeta, entretanto, revela um outro propósito para es-
ía intensa perseguição. E l a tem por objetivo "refinar" e "testar"
o Israel de Deus visando primordialmente fortalecer a fé do re-
manescente (13.8-9).
Daniel 7 e 11 também mencionam uma perseguição esca-
tológica contra os santos, embora numa abordagem diferente da
de Ezequiel e Zacarias. Daniel enfatiza que tal perseguição será
comandada por um " r e i " mau. Em sua descrição este persona-
gem é um novo e maior Antíoco IV. A linguagem, é tipológica:
assim como Antíoco irá perseguir os santos no período grego,
da mesma forma levantar-se-á um " r e i " mau que perseguirá, os
santos na era escatológica (7.20-27). Ele se arrogará prerroga-
tivas divinas e atacará o povo de Deus (11.36-15). Seu fim, en-
tretanto, não tardará em chegar (7.26; 11.45). Nestas visões da-
das a Ezequiel este " v i l ã o " escatológico é descrito em termos
semelhantes ao tipo, ou seja, Antíoco IV. Como ocorre com
toda linguagem escatológica, o antítipo não é replica exata do
tipo. Contudo, estes textos revelam algo da natureza do perse-
guidor. Ele reinvidicará prerrogativas divinas, perseguirá os
santos, virá de Roma, a quarta besta.8 Também este será conde-
nado no julgamento final. O apóstolo São Paulo, em, 2 Tessalo-
nicenses 2 cita Daniel 11: o Novo Testamento relaciona este " r e i "
mau com o "homem da iniqüidade", o Anticristo.
Outro aspecto relevante na escatologia do Antigo Testa-
mento é o Advento de Yahweh. A teofania do Sinai, como vimos,
é o tipo da grande teofania escatológica, o yôm Yahweh. Os pro-
fetas, em especial, destacam o yôm Yahweh como evento impo-
nente, visível a todos. Zacarias lembra que Ele virá com todos
os Seus anjos (14.5); Isaías, que Ele virá "em fogo" (66.15).
Este escatológico "dia do S E N H O R " tem seu locas especialmente
em Sofonias. Jerônimo traduziu Sf 1.15 por dies irae, dies illa,
que passou a ser tema musical na Igreja Católica Romana e
Protestante sendo também parte do repertório do coral do Semi-
nário em. tempos passados. Por um lado o yôm Yahweh é um
dies irae em que Deus consumirá todos os iníquos' (1.2-3). Por
outro, aqueles "que invocam o Nome de Yahweh" — tanto o

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 41


remanescente quanto os gentios que crêem — serão salvos
(3.9-20).
A Septuaginta traduz yôm Yahweh como hê heméra tou
kyríou (cf. p. ex., Sf 1.7). O Novo Testamento fala do "dia do
S E N H O R " com uma significativa ênfase. A l i a expressão é, vez
por outra, alterada para hê heméra toa kyríou hymon lesou
Ghristòü (1 Co 1.8); ou heméra Christou lesou (Fp 1.6); ou ainda
heméra Christou (Fp 1.10). Em outras palavras, Cristo é Yahweh
que vem em glória. Não raras são as vezes, como nestes casos,
em que o Novo Testamento atribui a Jesus Cristo o que o Antigo
Testamento atribui a Yahweh. A divindade de Cristo já se ma-
nifesta na era vétero-testameniária.
A ressurreição é mais um aspecto relevante da escatologia
do Antigo Testamento. Verdade é que o Antigo Testamento não
fala sobre a ressurreição corpórea dos mortos com tal freqüência
como o faz o Novo. Silêncio, porém, não significa ausência,
muito menos negação. A l é m de exemplos de mortos que res-
suscitam em Israel (cf. 1 Rs 17; 2 Rs 4; 2 Rs 13.21), há referên-
cias claras à ressurreição escatológica no Antigo Testamento co-
mo Jo 19.25; Isaías'26; Daniel 12 e outras. Uma passagem signi-
ficante e que por vezes tem recebido interpretação desvirtuada
em cenários críticos é Ezequiel 37.9 Neste capítulo o profeta
aplica a imagem da ressurreição de mortos ao Israel em exílio, re-
tratado como ossos secos. Empregand,o a figura do "levantá-los"
da sepultura, Yahweh está prometendo restaurar Israel e trazê-lo
de volta à sua terra. Embora a figura da ressurreição seja em-
pregada metaforicamente, ela implica e pressupõe a crença na
ressurreição do corpo. A aplicação desta imagem sugerida pelo
profeta só pode ser compreendida à luz da ressurreição física.
É como se Ezequiel estivesse a dizer: assim como haverá res-
surreição dos mortos, também Israel será "ressuscitado" da "mor-
te" do exílio. A ressurreição como realidade escatológica deve
merecer a atenção devida; não apenas por ser central na teolo-
gia e pregação cristãs, como pelo fato de a cultura religiosa bra-
sileira, impregnada de conceitos, imagens e expressões espiritua-
listas imitativos do conceito bíblico de ressurreição, poder tor-
nar-se obstáculo à apreensão de seus benefícios salvíficos por
parte do ouvinte. É oportuno, portanto, que o ministro confron-
te esporadicamente perante sua congregação a mensagem bíblica
da ressurreição com a antagônica teoria da reencarnação.10
Uma característica de Yahweh que o Antigo Testamento
enfatiza repetidas vezes é Sua ira e que precisa ser seriamente
considerada ao se falar da escatologia que se propõe bíblica.
Numa sociedade com tendências ao universalismo, quando é teo-
logicamente elegante priorizar toda a humanidade indiscrimina-
damente como "povo de Deus", c mister enfocar também a ira

42 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


de Deus para que eventualmente não nos integremos a esta i n -
clinação aeróbica.
O primeiro ponto a observar é que Yahweh é provocado
à ira. É o que nossos dogmáticos denominam Sua voluntas con-
sequens.11 Ê por causa do mundo que era ímpio que Deus envia
o dilúvio (Gn 6); é por causa da abominação de Sodoma e Go-
morra que Deus as destrói (Gn 18-19); é por causa da maldade
das nações que Deus as lança fora de Canaã (Dt 9.4-5). Yahweh
"não tem prazer na morte do perverso"; Yahweh é "tardio em
irar-se". Em segundo lugar, os recipientes da ira de Deus são
dela merecedores. Eles são incréus. Sodoma e Gomorra, por
exemplo, não acolhiam nem dez justos. Deus havia dado aos
Amoritas 400 anos antes de os lançar fora da terra. Com fre-
qüência aqueles sobre quem Yahweh assopra Sua ira são chama-
dos Seus inimigos e afrontantes de Sua Igreja. Finalmente, ter-
mos como "morte", "sheol", "cova" para designar o fim são
termos de sentido ambivalente. Em determinados contextos o
termo "morte" tem a conotação de morte temporal apenas. É
"morte" no seu sentido mínimo. Em outros contextos ela assu-
me um sentido máximo; é "Morte" com " M " maiúsculo prenhe
de conotações horrorizantes para descrever uma realidade dis-
tante de Yahweh. O Saltério, vez por outra, fala da morte neste
sentido. O Salmo 88, p. ex., fala dos que estão na sepultura e
no sheol como "desamparados", aqueles de quem Deus "não se
lembra". O salmista ora por livramento da "Morte" neste sen-
tido máximo, visto ser este o tipo de morte a ser vivenciado pelo
descrente.12
A compreensão de " v i d a " no Antigo Testamento deve ser
entendida em relação ao que acabamos de dizer. Enquanto
"morte" é lei, " v i d a " é evangelho. O dom da vida está funda-
mentado na imerecida chesed, ou fidelidade, de Yahweh. Os sal-
mos não se cansam de doxologizar a frase "Yahweh salva por
amor do Seu Nome" (p, ex., 31.3; 54.1; 79.9; 113.11). Apenas
Ele é a fonte da vida (36.9; 42.8). A vida eterna é sola fidei
cujos recipientes são os que "invocam o Nome do S E N H O R "
(.11 2.32), cujos nomes são encontrados "escritos no livro" da
vida (Dn 12.1-2). Em contraste com a "morte eterna", cuja
causa está na desfé e impiedade humanas, a causa da vida eter-
na é a chesed de Yahweh, ou a Sua voluntas antecedem.13
Mesmo a morte temporal não separa o crente de Yahweh.
O salmo 139 diz que Deus estará com ele mesmo que este faça
a sua cama no sheol (v. 8). No seu contexto, o salmo 49 atesta
vida após a morte quando o autor diz: "Mas Deus remirá a mi-
nha alma do poder do sheol, pois Ele me tomará para S i " (v. 15).
À luz do versículo 10 o salmista espera morrer. Mas, ao contrá-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 43


rio do perverso, que será consumido pelo sheol, ele será remido
por Deus e, nas palavras dos salmo 73, recebido na glória.
O último aspecto relevante da escatologia do Antigo Tes-
lamento que queremos destacar é o da nova criação. Para me-
lhor compreender a nova criação, necessário se faz que retroce-
damos à situação edênica e pós-edênica. Por todo o Antigo Tes-
lamenfo os seres humanos e o mundo natural são interdependen-
tes. Em Gênesis 1 e 2 lê-se que a humanidade é o clímax da
criação de Deus. O mundo foi feito para os seres humanos. O
mundo é a praça da humanidade. Deus dá as plantas como
alimento para homens e mulheres (1.29-30) e após o dilúvio,
para surpresa de alguns vegetarianos, Deus lhes concede tam-
bém os animais como alimento (9.3). Dentro da ordem da cria-
ção o ser humano deve mordomear o mundo natural. A terra
foi dada ao homem, (SI 115.16); o homem deve "cultivar e guar-
dar" o solo (Gn 2.15); Adão dá nomes aos animais (2.19-20).
Entretanto, após a Queda, a situação se radicaliza: Yahweh
maldiz o solo. Espinhos e abrolhos amofinam o labor do ho-
mem; fome e terremotos fustigam a humanidade (Gn 12.10;
Am 1.1). Nos livros de Samuel e Reis animais selvagens atacam
pessoas (1 Sm, 17.37; 2 Rs 17.25-26). Até os profetas protestam
contra a destruição ecológica (Is 14.8; He 2.17). A partir da
Queda a natureza investe contra a humanidade e a humanidade
abusa da natureza.
A escatologia do Antigo Testamento apresenta o reverso
desta situação. Animais selvagens "não farão mal nem dano
algum em meu santo monte", diz Yahweh (Is 65.25). Violência
não haverá mais porque homens e animais viverão em harmo-
nia, diz Deus (Is 11.6-9). Ao invés de fazer brotar espinhos e
abrolhos, o solo será abundante em cereais. O profeta Amos
retrata a terra tão fértil que enquanto a ceifa se processa, já é
tempo do novo plantio (9.13). Montanhas e outeiros destilarão
vinho envelhecido e leite (Am 9.13-14). O povo não mais terá
fome (Ez 34.26-29). Águas vivas fluirão de Sião (Zc 14.8). O
deserto será frutífero e o Mar morto repleto de peixes (Is 35;
Ez 47.8ss). Estes e outros textos pintam o retorno ao Jardim
do Éden; é o reverso do mundo amaldiçoado; é o novo céu e
nova terra — é a nova criação.
Pelos textos acima pode-se ver que a nova criação é re-
Icalada como estando em continuidade com a presente criação.
Os autores bíblicos não se envergonham de serem, criaturas. Não
há nada pecaminoso ou inferior em que seres humanos habitem
a terra. O Antigo Testamento não acarinha um desejo platônico
de deixar a terra e viver com Deus em alguma esfera ideal,
etérea. 0 problema não está com a natureza criada em si. O
problema é que a ordem criada está sob a maldição divina desde

44 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


a Queda. Por isso o escatológico D i a de Yahweh trará livra-
mento e "alegria" não apenas aos homens pecadores como à
criação em geral (Sl 96.11-13; 98.7-9).
Os mesmos textos, por outro lado, revelam que a nova
criação é apresentada como estando em descontinuidade com a
presente criação. Embora os profetas mencionados ainda falem
do futuro em termos de terra de Israel antes de Cristo, sua des-
crição mostra uma terra bem diferenciada e maior do que a
Terra Prometida. A figura de animais convivendo em h a r m o n i a
e cereais em abundância indicam o reverso da natureza amaldi-
çoada. Uma escatologia bíblica precisa levar em consideração
esta descontinuidade tanto quanto a continuidade.
Em conclusão podemos afirmar que a escatologia do A n -
tigo Testamento é uma proposta missiológica-soteriológica de
Deus. Embora aterrorizantes, suas ameaças visam, chamar o
descrente ao arrependimento e à fé. Por outro, inseridas nelas
estão as promessas de vitória para o justo: os inimigos do povo
de Deus serão vencidos. A Igreja de Deus precisa constantemen-
te recorrer à escatologia porque nela encontra sua origem na
graça, seu propósito no mundo, seu final glorioso. Na escatolo-
gia está o conforto para momentos de perseguição e a certeza
da presença do S E N H O R também para o "Israel de D e u s " deste
lado da cruz.

NOTAS FINAIS
KAISER, Walter C. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo, Vida
Nova, 1980 visualiza esta promessa como permeando todo o Antigo Tes-
tamento.
2
CLTNES, David J . A . The theme of lhe pentateuch. University of
Sheffield, 1978.
3
ZIMMERLI, Walther. Der Mensch und seine Hoffnung im Alten Tes-
lament. Gottingen, Vanderhoeek und Rupreeht, 1968 explora este aspecto
com propriedade.
4
Cf., p. ex., LIBÂNIO, João B. e BINGEMER, Maria Clara L. Escatolo-
gia Cristã. In: A Libertação na História. Petrópolis, Vozes, 1985, tomo X,
série III.
5
Talvez o mais popular nesta linha seja LINDSEY, Hall e C A R L S O N ,
C . C . A agonia do grande planeta terra. David A. de Mendonça, trad. São
Paulo, Cruzada da Literatura Evangélica do Brasil e Mundo Cristão, 1973.
6
Uma breve mas excelente avaliação critica destes movimentos numa
ótica luterana (e que clama por tradução) está em The end times: a study
on eschatology and millenialism — a report of the Comission ore Theology
and Church Relations of the Lutheran Church-Missonri Synod. s. 1., s.
ed., setembro 1989. Uma análise mais popular pode ser encontrada em
P L U E G E R , Aaron Luther. Things to come for planei earth. St. L o u i s , Con-
córdia, 1977. Para um estudo mais abrangente dos movimentos milenistas
recentes, cf. ERICKSON, Millard ,J. Opções contemporâneas na escatologia:

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O T/1991 45
um estudo do milênio. Gordon Chown, trad. São Paulo, Vida Nova, 1982.
Embora Erickson se mostre crítico dos movimentos de forma geral, ele
mesmo inclina-se a um "pré-milenismo pós-tribulacionista".
Cf. Y A M A U C H I , Edwin M. Foes from the Noerthern frontier. Grand
Rapids, Baker, 1982. Cf. também LINDSEY, Hà, óp, cr/., p. 54-65.
8
Um longo estudo para a identificação da quarta besta no capítulo 7
é feito por YOUNG, Edward J. The prophecy of Daniel: a commentary.
Grand Rapids, Eerdmans, 1972, p. 275-94. Cf. também L E U P O L D , H . C .
Exposüwn of Daniel. Columbus, The Wartburg Press, 1949, p. 287 e suas
referencias ao capítulo 2 de Daniel.
9
Cf., p. ex., COOKE, G . A . The book of Ezekiel: a criticai and exege-
tical commentary. In: The International Criticai Commentary. New
York, Charles Scribner's Sons, 1937, v. 2, p. 398'ss.
A bibliografia sobre o assunto é ainda bastante incipiente mas uma
boa introdução sobre a matéria pode ser buscada em SNYDER, John.
Reencamaçao ou ressurreição? São Paulo, Vida Nova, 1985.
11
SCHMIDT, Heinrich. the doctrinal theology of lhe Evangélica!
Lutheran Church. 3. ed., rev. Charles A. Hay e Henry E. Jacobs, trad.
Minneapolis, Augsburg, 1961, p. 282-83.
12
KRAUS, Hans-Joachim. Theology of the Psalms. Keilh Crim, trad.
Minneapolis, Augsburg, 1986, p. 162-68
13
SCHMIDT, Heinrich, op. cil.

Aula inaugural proferida a alunos e professores do Seminário


Concórdia no dia 27 de fevereiro de 1991.

46 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
AUXÍLIOS HOMILÉTICOS
(Os auxílios homiléticos desta edição baseiam-se no Evangelho
do Dia, conforme a Série Histórica Revisada).

DIA DE PENTECOSTE
João 14.23-27
19 de Maio de 1991
A Festa
Ao longo dos tempos o Pentecoste tem sido visto pelos
cristãos como se tivesse sido equivalente a um espetáculo mo-
derno de luz e som, A narrativa de Atos 2 tem servido para
mostrar que afinal, sob certas circunstâncias, Deus pode e vai
impressionar os sentidos e assim sacudir os céticos e dar força
à mensagem dos seus, crentes.
T a l ingênua afirmação do Pentecoste como espetáculo im-
pressionante esquece entretanto que nem os céticos de plantão
no dia do Pentecoste se deixaram impressionar, muito menos
convencer. "Estão embriagados", disseram então e até boje go-
zam dos cristãos.
Fixar-se neste aspecto do Pentecoste tem um aspecto po-
sitivo, como diz o apóstolo: A igreja se edifica a si mesma.
Entretanto, o que o Pentecoste tem de especial e único é o fato
de ser uma data, um marco, que fixa o novo tempo de Deus com
o homem em busca do perdido.
A pregação do dia de Pentecoste deveria por isto evitar
dois desvios que facilmente se notam. Primeiro, o Pentecoste
não foi um espetáculo capaz de fazer calar os céticos. Os céticos
de plantão naquele dia gozaram: Estão embriagados. O Pente-
coste não foi este espetáculo impressionante capaz de revolucio-
nar o universo. Segundo, o Espírito Santo não age, nem, con-
vence pelo uso de truques de magia, como línguas de fogo, falar
em línguas, curas, poder. O Espírito Santo não hipnotiza, nem
arrasta os sentidos. Ele age na quietude do coração, não se sabe
de onde vem, nem para onde vai, etc. Quando o Espírito Santo
age extraordinariamente, é por sua decisão exclusiva, e todo cris-
tão é agente passivo.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 47


O Espírito Santo ilumina o entendimento a partir do anún-
cio do Evangelho. A partir do momento em que percebe o sen-
tido que teve a vida de Cristo, o homem aprende a reconhecer o
sentido da sua própria vida. Naquela ocasião aconteceu por
exemplo o pentecoste israelítico, a festa das sete semanas, a festa
que celebrava o fim da safra dos cereais, o 50° dia depois do
Passa, que se linha celebrado com as primícias. Os discípulos,
que até ali estiveram calados, ou falando na surdina, de repente
se vêem envolvidos numa situação em que já não podem não
falar. Estranhamente vão explicando o sentido de tudo aquilo
que acontecera nestas ultimas sete semanas. Não sentem barrei-
ras na comunicação.
Estão embriagados, dizem os céticos. Talvez porque os
discípulos, não acreditando no seu dom, falassem hesitantem,en-
te, dando tal impressão?
0 que e como aconteceu realmente naquele dia? Os discí-
pulos nunca mais reeditaram o Pentecoste dos fenômenos. De
tudo aquilo que se passou neste dia, o que a igreja pode guardar
e experimentar como o seu Pentecoste hoje? Isto Jesus mesmo
definiu em textos como este do Evangelho que a Igreja tem se-
parado para este dia. Aí Jesus distingue dois momentos. E n -
quanto estou convosco e depois. (.) enquanto está unido ao de-
pois "pela palavra que vos tenho dito". Onde a palavra se faz
ouvir, Jesus está vivo e presente, o Pai faz morada.
A igreja de todos os tempos é uma e a mesma em todos
os lugares sob uma condição - SE — amar a Jesus for igual ao
guardar sua palavra. Palavra esta cuja manifestação está res-
trita aquele pequeno grupo (v. 22). Amá-lo significa amar o sen-
tido que ele manifesta e objetivamente deu à sua vida na sua
Palavra.
Este sentido projeta-se em primeiro lugar sobre o próprio
indivíduo: Eu preciso de salvação. Ou não? Às vezes, ou geral-
mente, este aspecto confessional está ausente da pregação cristã
e está na origem dos desvios que sofre o Pentecoste,
Eu preciso é interpretado como " E u já precisei". Ou, " E u
ale precisaria". Ou, "o mundo precisa". Mas quando é que eu
preciso deste Salvador ao ponto de amá-lo somente por ser o
meu Salvador e ao ponto de me apropriar da sua Palavra como
sendo esta palavra que me dá a sua salvação?
Será esta talvez uma das grandes falhas dos cultos do
Pentecoste. Esta renovação da confissão da própria indigência
espiritual, este retorno ao ponto de partida, este retorno ao espí-
rito de arrependimento? Ao mesmo tempo em que os discípulos
se demonstram co-responsáveis do crime, proclamam, que aquela
morte era a libertação para todos?

48 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
É neste sentido que o Espírito do Pentecoste soprou na
Reforma Luterana. A igreja toda confronta-se outra vez com, a
primeira tese: "Quando nosso Senhor Jesus Cristo disse; Arre-
pendei-vos..."
Para guardar a Palavra de Jesus é preciso por isto antes
e acima de tudo reunir-se novamente com, toda a congregação
ao pé da cruz para reorientar a partir daí toda a avaliação que
se faz da vida individual e da vida comunitária do cristão.
Especialmente agora que E L E não está mais conosco.
Quem vai transmitir esta sua palavra que perdoa, consola e
conforta?
Muitos cultos de Pentecoste não passam de discurso "a
respeito" quando deveriam ser testemunho pessoal de uma con-
gregação/pregador que reconhece, como Pedro, que os desobe-
dientes à L e i de Deus o crucificaram.
Se alguém me ama — esta condicional exige mais do que
simplesmente ser alguém que admite e testifica diante dos ho-
mens que o pecador tem um Salvador em Cristo. Se alguém me
ama, pressupõe o testemunho pessoal como resposta.
Como alguém que tendo se acidentado contra um alimento na
estrada, mas ileso, em vez de ficar se lamentando, sai es-
trada fora avisar outros motoristas do perigo que está à frente.

O texto

"Se alguém me ama." Esta condicional que Jesus intro-


duz, deve preocupar uma igreja nos dias atuais. É na avaliação
correta desta observação que hoje pode existir Pentecoste, se...
Porque nem tudo que se chama Pentecoste, nem tudo que
se faz invocando o Espírito Santo, nem tudo que se ensina de
acordo com as Escrituras pode por este fato ser visto como o
Pentecoste. Aqueles homens não foram aqueles heróicos e in-
trépidos desafiantes de um mundo hostil. Não eram também, os
seguros e infalíveis visionários conscientes de que inspiração di-
vina era-lhes sempre acessível.
Eram, isto sim, tímidos e inseguros. Conscientes de que
falharam nem só nos momentos cruciais, de grande desafio, mas
também falharam, em levar avante a mera rotina do discípulo
daquele Jesus. Não conseguiam esquecer disto. O último a se
dar conta disto fora Tome. E com ele, nenhum linha escapado
a quedas redundantes e repreensões tanto mais contundentes,
quanto maior era o carinho e amor com que tinham sido concre-
tizadas. O que se pode ainda esperar de homens como nós?
Somos realmente capazes de provar a nossa dedicação a Jesus?
Tudo visto e provado, a resposta é não. Mas, se...

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 49


O incrível é que em tudo, até no caso de Judas, E L E teve
carinho e perdão para todos. Mesmo que isto lhe tenha acar-
retado aquela morte horrível. Mais ainda isto nos constrange e
envergonha porque ele repetidamente prevenia disto. E preve-
nia de que ele tinha de ir sozinho. Não teria ninguém por ele.
E se...
Tão completamente alheios e estranhos somos ao amor de
Deus, que nun,ca nos conseguimos; identificar com ele. Quando
os discípulos achavam que tinham, visto e reconhecido o amor
Deus como tal, n,o momento seguinte dava-se conta que o
amor era sempre novo e infinito. Por isto, se...
Desistir. A solução foi desistir de querer provar que so-
mos capazes de nos alinhar com Jesus e amar como ele ama.
Mais ainda, é reconhecer que todo o esforço de amar, em, nós não
deixa nunca de ser uma forma de amor próprio. E por isto,
temos de desconfiar de nós. E aceitar que o amor em nós será
sempre este grande SE. A única coisa segura é o amor D E L E .
Este é um amor sobre o qual se deve falar, para o qual se deve
falar, para o qual se deve apontar. Finalmente é nisto que se-
guidores tornados tímidos e inseguros se agarram como sua ga-
rantia pessoal.
O nosso amor por ele, enfim, nada mais consegue ser do
que a confissão e testemunho daquilo que o seu amor faz por nós.
Este amor por nós encontra sua expressão mais viva no sacra-
mento para o qual estas palavras são essenciais. No sacramento
este Deus por nós é o Deus que se dá por nós ao ponto de se in-
corporar totalmente em nós. No entender de Lutero, ao comer-
mos o seu corpo, comemos a sua vida e suas boas obras; enquan-
to que o seu martírio e sofrimento sacrificiais são nos incorpo-
rados no seu sangue que bebemos.
A quem isto interessa? A quem o mal, que corrói o mundo,
também corrói a consciência, assaltados pelo pecado e caídos em
pecado. Aqueles para quem pecado é uma realidade sensível.
Pessoas que têm consciência do mal feito a Cristo e aos cristãos;
os que não são indiferentes com a injustiça nem, com o sofrimen-
to do inocente; os que lutam, trabalham e oram, e, se mais não
podem, se identificam com, os que estão na adversidade.
Estes são aqueles que não só querem o benefício do Sacra-
mento, mas também aceitam a comunhão nele contida, o amor
que nos é dado de maneira tão ampla, profunda e completa.
Amar a Cristo é amar o que E l e nos dá. Com. isto aprendemos
a reconhecer o amor dele e o desamor e a falta de comunhão a
que o pecado nos relegou.
Claro, existem aqueles que desejam os benefícios do amor
de Cristo, mas evitam comprometer-se com ele, hábeis em não

50 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


envolvimento. Não se envolvem com pecadores declarados, não
têm paciência com os que se lamentam, que não partilham a dor
dos outros, não suportam os fracos de caráter, não dignificam, o
indigno, não defendem o ausente, não intervêm a favor da ver-
dade, nada arriscam (vida, propriedade, honras) a favor da
igreja e dos cristãos. São egoístas a quem este Sacramento do
amor não beneficia em nada. (Lutero)
Mas onde alguém tem consciência de que sua comunhão
com Cristo é esta comunhão mais ampla, aí existe consciência
de pecado, de faltas, de fraqueza. Aí é preciso consolo, a força
e a esperança que o amor de Cristo selou para os seus no sa-
cramento. Desta consciência brota a fome e a sede que cons-
tantemente precisam ser mitigados.
Se alguém me ama: aí está a realidade do Pentecoste — o
agir do Espírito no espírito de Cristo para a comunhão dupla
no amor de Cristo. Uma, a comunhão que nos é dada por Cristo
e por toda a cristandade passada, presente e futura. E segunda,
a comunhão que nós agora podemos oferecer aos que carecem
deste amor do qual Cristo nos enche constantemenle em, favor de
outros necessitados como eu.

O Pentecoste diário
O problema que Jesus aponta no texto é o temor e a per-
turbação da sua igreja/discípulos.
Este problema é atual na medida em que reconhecemos
que o só guardar a Palavra parece deixar a igreja insegura e
perturbada. Uma igreja que busca o sucesso em sintonia com
os movimentos e expectativas do mundo, que por isto altera suas
prioridades, evidentemente está sendo focada por Jesus como um
problem,a.
O objetivo que Jesus propõe é que esta igreja confie e
assim goze de uma paz nova, desconhecida no mundo — a sua
paz. P a r a tanto enfatiza aquilo que faz o Pentecoste permanente
nos corações — o amor do P a i para todo aquele que toma cons-
ciência de que não existe amor naquilo que o mundo oferece.
Este Deus que vem comungar a vida com o homem, (e Jesus
enfatiza: "Esta palavra não é minha mas do Pai.") este Deus é
o Deus que faz o Pentecoste. Mas este Deus comunga no singu-
lar e se manifesta no plural. Esta comunhão e sua manifestação
tem nome: o amor. O amor do Deus Salvador pelo perdido, do
perdido pelo Salvador que por sua vez comungam o amor pelos
perdidos.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 51


Tema: O Pentecoste será permanente se guardarmos a sua
Palavra.

I — Porque nela Deus confirma o seu amor.


II — Porque ela nos ensina e depender do amor de Deus.

Tema: A promessa de um Pentecoste permanente


— meu Pai o amará.
I — Diante da hostilidade do mundo
— faremos nele morada.
II — Diante dos desafios à fé
— o Consolador nos ensinará.
Conclusão: Não se turbe o vosso coração.

Tema: Este é também o meu Pentecoste.


I — Me reconheço na timidez daqueles discípulos.
II — Reconheço a mesma promessa do Pai.
III — Confio nas mesmas bênçãos.
P. P. Wairich

PRIMEIRO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


João 3.1-8
26 de Maio de 1991
E r a a primavera do ano 30 d . C .
0 primeiro ano do ministério de Jesus. Época da Páscoa.
A cidade de Jerusalém fervilhava de peregrinos. Entre os mui-
tos assuntos na boca do povo, um se destacava: quem, é este
Jesus de Nazaré? João Batista o batizara (Mc 1.9-11). Chama-
ra-o de Cordeiro de Deus (Jo 1.29; Jo 1.36). Surpreendera a
todos ao expulsar os vendilhões e cambistas do templo (Jo
2.13-16). Tornara-se benquisto do povo ao curar os seus enfer-
mos (Jo 2.23). Sua pregação (Mt 4.17) mexera com as cons-
ciências. No coração de todos estava a pergunta: "Será este,
porventura, o Cristo?" (Jo 4.29).

52 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


Uns diziam; que não. Outros, manifestavam dúvidas. M u i -
tos, porém, "vendo os sinais que ele fazia, creram no seu nome"
(Jo 2.23).
Entre os que tinham dúvidas, encontrava-se um ilustre ci-
dadão de Jerusalém. Seu nome, Nicodemos, Ele era fariseu.
Seita que, no tempo de Jesus, degenerara em fanatismo nacio-
nalista e num partido político radical. Ele era também membro
do Sinédrio, o supremo tribunal eclesiástico dos judeus. Homem
de bens, de projeção social, culto e diríamos boje, um, eminente
teólogo, portanto, "um dos principais judeus" (Jo 3.1).
Nicodemos tomou uma importante decisão. Ter um en-
contro pessoal com Jesus. Queria testar a capacidade teológica
de Jesus. Assim "de noite foi ter com Jesus" (Jo 3.2).
De noite... talvez porque durante o dia Jesus estava por
demais ocupado com o atendimento do povo.
De noite... talvez porque não queria assumir publicamen-
te esta visita. Não queria expor-se a críticas de colegas. Profe-
riu o anonimato da calada da noite.
Tanto faz. 0 importante é que Nicodemos foi encontrar-se
com Jesus. Ele inicia seu diálogo chamando Jesus de Rabi (Jo
3.2). Ou seja, Mestre. Titulação reservada aos escribasí versados
na Escritura. 0 "sabemos" se refere talvez a um grupo de fari-
seus, ou componentes do Sinédrio, liderados pelo próprio Nico-
demos que já anteriormente haviam enviado uma comissão a
João Batista para saber se ele era ou não o Cristo, Na ocasião
João Batista lhes assegurou: " E u não sou o Cristo" (Jo 1.19-28).
Agora em relação a Jesus, estavam convencidos que ele era
"Mestre vindo da parte de Deus" (Jo 3.2), uma vez que "ninguém
pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com
ele" (Jo 3.2; Jo 2.23).
Certamente Nicodemos ouvira as pregações de Jesus. Estas
versavam sobre dois temas fundamentais: a questão do arrepen-
dimento e do reino dos céus (Mt 4.17). Dai a afirmação de Jesus
a Nicodemos: "se alguém não nascer de n o v o . . . " (Jo 3.3). Acon-
tece que para os fariseus não havia necessidade de um "nascer
de novo". Segundo eles, o simples fato de serem, descendência
de Abraão lhes conferia o reino de Deus (Rm 9.6,7). João Ba-
tista já OS advertira deste falso conceito (Mt 3.9). Daí o solene
juramento de Jesus: " E m verdade, em verdade te d i g o . . . " (Jo
3.5), para mais uma vez deixar bem claro que o reino de Deus
não se concede por hereditariedade, mas procede do "nascer de
novo".
Em que consiste este "nascer de novo?" Em "voltar ao
ventre materno?" Como ironicamente perguntou Nicodemos?
Não. Jesus esclarece: "pela água e pelo Espírito" (Jo 3.5). O

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 53


primeiro nascimento, o físico, é um nascer terreno, para a morte.
Porém, o segundo nascimento, o "nascer de novo" é um, nascer
espiritual. É uma ação do Espírito Santo. 0 Catecismo Menor
(perg. 299) afirma: "mas com a palavra de Deus, a água é ba-
tismo, isto é, água de vida, cheia de graça e um lavar de renas-
cimento no Espírito Santo, como diz Paulo a Tito 3.5. É "nascer
de novo" pois o convertido nasce para Deus (Rm, 8.14; Gl
3.26,27).
Ante a incompreensão de Nicodemos, Jesus usa a figura
do vento. O vento é uma realidade. Vemos a sua força, sua
ação, "assim é todo o que é nascido do Espírito" (Jo 3.8). 0
"novo nascimento" é dinâmico. Deve agir no munido através da
santificação (1 Co 3.7; Cl 2.19; 1 Pe 2.2; 2 Pe 3.18; Gl 5.22-25).
Nicodemos tinha dúvidas sobre a messianidade de Jesus.
Assim Jesus se revela a ele como o Messias profetizado. Ele veio
do céu e para o céu retornará (Jo 3.13). Antes porém, ele sofrerá
(Is 53) e será levantado numa cruz, a exemplo do que aconteceu
no deserto no tempo de Moisés (Nm 21.9). Qual o objetivo des-
te sacrifício? "Para que todo que nele crê tenha a vida eterna"
(Jo 3.15). Este é o reino de Deus, a vida eterna. Dai a impor-
tância do "nascer de novo".

Importa-vos nascer de novo


1. pelo arrependimento
2. para que todo o que nele crê tenha a vida eterna.

A pergunta de Nicodemos: "Como pode um homem nascer,


sendo velho?"
1. A resposta de Jesus: "pela água e do Espírito.
2. Qual o objetivo deste "nascer de novo?" — "para
que todo o que nele crê tenha a vida eterna".

Walter O. Steyer

54 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


SEGUNDO DOMINGO APÓS PENTECOSTE
Lucas 16.19-31
2 de Junho de 1991
Contexto

A ilustração usada por Jesus é do ciclo das 16 parábolas


e histórias relatadas por Lucas do período das mensagens de
Jesus na Galiléia, Samaria, Peréia e Judéia, no final do ano em
que sofreu oposição, especialmente dos fariseus (Lc 9.51 a 19.27).
Jesus proclamava "o evangelho do reino de Deus", que era a
culminância da revelação de Deus. Já fora feita pela " l e i e os
profetas", um conceito que vigorou até João Batista (Lc 16.16).
Jesus Cristo c agora o cumprimento desta aliança eterna de
Deus, anunciada pelos profetas (Jr 31.31; 32.40), e agora está
aí aquele pelo qual "Deus ajuda", se quisermos traduzir o nome
de "Lázaro", a forma grega de Eleazar (Esdras 7.5). Por men-
cionar o nome de Lázaro Jesus certamente não contou uma pará-
bola, mas uma história veridica como ilustração. A ênfase nesse
período de oposição que Jesus sofria era a necessidade de dar
uma resposta de fé e vida ao evangelho e não imitar a oposição,
o descaso, e o amor às riquezas de que os fariseus sofriam (Lc
16.14).

Texto
V. 19 — O "homem r i c o " do texto não tom nome para
Jesus. E r a um mau administrador dos bens que havia recebido
de Deus (v. 25). Mesmo sendo do povo de Deus, pois conhecia
" P a i Abraão" (v. 24), hão vivia a fé de Abraão (Rm 4.3), pois
não levava a sério "Moisés e os profetas" (v. 31), que pregavam
a fé vivida em amor, em contraste com o seu amor às riquezas
em que "se regalava esplendidamente". O rico havia esquecido
de deixar que Deus fosse o seu Deus pela fé, e que era neces-
sário "fazer amigos" com as riquezas. A oportunidade de fazer
amigos estava diante da sua porta.
V v . 20/21 — Lázaro é a oportunidade do rico. Mas ape-
nas lhe dá "migalhas". Lázaro tinha tudo para oferecer ao rico:
a mensagem do "reino de Deus" (Lc 6.20), o constante convite
ao arrependimento, pois estava junto à mesa do rico para comer
as migalhas. Os cães, talvez do rico, tinha mais interesse por
ele do que o rico egocêntrico.
V. 22 — Havia a crise, o ajuste de contas. Lázaro viu o
que creu: o reino, como Abraão o recebeu. O rico não recebeu

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 55.


o que creu: sua fortuna acabou. Morreu e foi enterrado! É
uma advertência violenta: em que os homens crêem?
V. 23 — O interesse de Jesus não é dar detalhes do céu
(o lugar de Abraão) e do inferno, mas enfatizou três coisas:
1. Há dois lugares apenas: céu e inferno após a morte.
2. A pessoa que morre não fica vagando, mas entra logo
na situação definitiva, apenas aguardando a revelação total de
cada destino.
3. Nesta fase houve, na história de Jesus, possibilidade de
comunicação, concedida por Deus, que pode ser uma exceção
para enfatizar a mensagem de arrependimento e fé.
V. 24 — O rico agora lembra que estamos no mundo pa-
ra servirmos um ao outro. Mas só lembra que Lázaro deve ser-
vir (talvez era um servo dele). Agora precisa da misericórdia,
da ajuda, do alívio, da compaixão que ele próprio não deu no
sofrimento dos outros. Com um pouco de amor poderia ter ali-
viado a Lázaro. Agora o sofrimento do rico não tem mais volta.
É eterno.
Vv. 25/26 — Não é Lázaro quem responde. Abraão é au-
torizado por Deus, como "pai da fé". Certamente é nova exce-
ção. Mas não há possibilidade de ajuda. Não se ultrapassam
os limites. O consolo de Lázaro lembra a paraclesia dada por
Jesus (1 Jo 2.1), pelo Espírito Santo (Jo 14.16), e praticada em
parte já pelos cristãos (Rm 12.8).
V v . 27/28 — Havia testemunho, o rico se lembra. Mas só
agora se lembra. N u m primeiro gesto de simpatia agora quer
que alguém, talvez Lázaro, vá testemunhar aos parentes. Ora, o
testemunho estava todos os dias à sua porta.
V. 29 — A questão é apenas "ouvir"! O testemunho do
além, de Deus, está no mundo: está em Moisés (a Lei) e nos
profetas (e os Escritos). Está tudo dito: Jesus o está procla-
mando. O "evangelho do reino de Deus" está sendo anunciado.
Mas é a dureza do coração, dos fariseus, dos ricos fariseus, que
não quer aceitar um Messias humilde que veio reinar nos co-
ração.
V v . 30/31 — Sempre o homem sabe melhor: quem sabe
um resuscitado, um espírito, uma nova revelação, um novo pro-
feta. Nem o Jesus ressuscitado foi recebido pelos endurecidos
fariseus! O julgamento de "Moisés c os profetas" é final! Tam-
bém a salvação do Messias, proclamada por "Moisés e os pro-
fetas" é final! "Quem tem ouvidos, ouça!" (Mt 11.15).

56 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


Disposição

Introdução. O futuro é longo demais: dura uma eterni-


dade. 0 tempo que temos para pôr em dia o futuro é agora.
Deus nos dá a vida e o futuro.
Nossos recursos para pôr em dia o futuro.

I. " E l e desejava alimentar-se".


A. A vida é dada por Deus.
1 . Todos recebemos a vida de forma igual.
a. Nascemos com o dom. da vida.
b. Precisamos assumir a vida.
c. Somos responsáveis para servir aos outros.
2. Deus colocou os recursos para a vida no mundo.
a. A riqueza é dada por Deus para repartir.
b. Não há necessidade de pobres.
c. Temos que aprender a repartir.

B. O abuso da vida e nosso mau uso dos recursos.


1. Achamos que a vida e o futuro nos pertencem.
2. A cobiça afastam Deus e o próximo.
3. O futuro não está garantido se não deixarmos "Deus
ser Deus".
1. Todos precisamos alimentar-nos: somos "mendigos"
que Deus quer suprir.
5. O abuso da vida faz outros sofrer e destruir nosso
próprio futuro.

II. "Eles tem Moisés e os profetas: ouçam-nos!"


A. Os recursos para vida eterna são dados por Deus.
1. Precisamos de recursos internos para chegarmos à
vida eterna.
2. Deus é o "Senhor e Doador da vida".
3. Já deu os recursos para todo o homem: estão em
"Moisés e os profetas".
1. Tudo foi cumprido em Cristo, o F i e l .
B. " O u v i r " é o problema para por em dia o futuro.
1. Para receber os recursos internos é preciso "ouvir":
testemunho.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 57


2. Para "ouvir", Deus tem que dar a " v i d a " pela fé.
3. Assim estaremos na fé de Abraão: nosso futuro
— evita o "tormento" do futuro, e
— recebe o "consolo" de Deus.
Conclusão. Quando recebemos os recursos internos vamos
"testemunhar" para que outros "ouçam".
Martim C. Warth

T E R C E I R O DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E
Lucas 14.15-24
9 de Junho de 1991
Observação: É cada vez mais difícil pregar o evangelho
para o homem de nosso tempo. Observando as igrejas, no mun-
do inteiro, detectamos o surgimento de crises e questionamentos.
Parece que não existe mais ouvido para a "mensagem, cristã".
A falta de crescimento das igrejas, a aparente estagnação em
muitos setores das mesmas, parece evidenciar que a mensagem
cristã não consegue mais atingir o ouvinte. Será que a igreja
tem que mudar o conteúdo de sua mensagem? A parábola so-
bre a "grande ceia" nos convida a uma reflexão sobre o "porquê"
de nossa participação e ação na igreja cristã.
Contexto: O capítulo 14 de Lucas quer ser transparente,
especialmente nas suas parábolas, a respeito do posicionamento
do homem perante um convite importante. É claro quem é que
convida e quem ele quer atingir com. esta mensagem. Aceitar
um convite significa assumir toda a responsabilidade e não me-
dir as conseqüências. O convite recebido requer um; posiciona-
mento claro e definido.

Texto: A parábola quer colocar o ouvinte numa situação


de decisão. Descreve o homem e seu posicionamento perante o
chamado que tem sua origem em Deus. Jesus usa o momento
de uma ceia (cf. Lc 14.1), conectando este fato com uma antiga
tradição do povo de Deus. E r a convicção do povo de Deus, des-
de o antigo testamento, que o satisfazer da fome e da sede servia
como ilustração e ensinamento a respeito dos valores espirituais
da comunhão com Deus (SI 23.5 — 36.9 — 107.9 — cf. Is 25.6 —

58 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
55.1-3 — Lc 13.29 — 22.30 etc.) e da participação no reino de
Deus.
Na parábola o ponto de partida é a afirmativa do V. 15.
Esta exclamação do fariseu descreve uma situação de fato e de
direito. A bem-aventurança do membro do povo de Deus parece
ser um assunto pacífico e seguro. O crente não necessita preo-
cupar-se com o seu destino eterno, pois tem certeza de sua sal-
vação. O fariseu, com todo o seu zelo, parece ter segurança
absoluta sobre o seu destino eterno. A resposta de Jesus permite
ao ouvinte espelhar-se na verdade que ouve. Será que o fariseu
pode ser "tão seguro" de si?
Como reagem os convidados? (cf. Lc 14.7,17,24) Eles pa-
recem ser incomodados com o convite que receberam. Têm, algo
mais importante para fazer. A resposta é inequívoca. Tomaram
conhecimento do convite mas resistem e rejeitam, cada um em
conformidade com a importância de sua preocupação (as três
rejeições são representativas), a oportunidade de realizar o que
deles se espera. Sua relação íntima com as cousas conquistadas,
por sua força e com o seu empenho, não permite o envolvimento
com os conteúdos que o convite traz. A decisão é clara. Não
querem participar. A vida "material" é mais importante do que
a vida "espiritual".
A reação do Senhor é a justa ira sobre a rejeição do con-
vite. A partir do v. 21 abre-se uma nova visão, pois. os convi-
dados são deixados de lado. Importante é observar a evolução
do texto (cf. as palavras "sair" "depressa" "trazer" "obrigar"
todos etc), pois a mola mestra para a expansão do "reino" é o
grande amor do Senhor. Náo importa o "status" alcançado. Im-
porta a aceitação do convite.
Estamos perante uma severa admoestação. O portador do
convite do reino de Deus quer ser ouvido, respeitado e seguido.
Perante o seu convite outros valores se tornam obsoletos. O ou-
vinte necessita decidir entre adoração em, espírito e verdade e
a idolatria. Outra alternativa não existe.

Esboço: Deus quer salvar todos os homens. Por isto ele


a) oferece vida espiritual em abundância
b) não aceita a indiferença ou rejeição
c) convida todos os homens a ouvir e aceitar a
sua Palavra.

Hans Horsch

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 59


QUARTO DOMINGO APÓS PENTECOSTE
Lucas 15.11-32
16 de Junho de 1991
Introdução: Constatamos, especialmente em nossos dias,
que muitas pessoas vivem uma vida completamente alienada.
Parecem viver sem orientação ou objetivo em sua vida. As vidas
humanas se tornam vazias. Permanecem apegadas em cousas
superficiais. Tomou conta, de grande parte da humanidade, a
falta de sentido na vida. Onde encontramos as causas deste es-
vaziamento da vida humana? Qual o remédio para sanar esta
situação? A perícope em questão oferece uma resposta.

Texto: A parábola nos faz compreender o que significa a


"morte" e a " v i d a " para o homem de todos os tempos. E l a sur-
ge do conflito entre Jesus — o doador da vida — e os fariseus —
representantes de uma religiosidade formal e descompromissada
com a vontade genuína de Deus. O comportamento de Jesus
para com os pecadores da época provocou as mais diversas rea-
ções por parte do povo de Deus. A parábola contém o ensina-
mento decisivo para o ouvinte atento. Os filhos mencionados, no
texto são descritos em seu relacionamento para com o pai.
Observando bem a descrição de ambos, descobrimos as tentações
de nossa própria existência. Mas, o texto não pára por aí. Ele
nos oferece não somente a solução dos problemas mas também
a alegria daqueles que participam na busca do perdido. O ho-
mem "perdido e condenado" de nosso tempo merece o amor do
P a i que está no céu. O auge das afirmações encontramos nos
versículos 24 e 32. Tentaremos dar três ênfases:

A fuga descrita permite a identificação. A busca da au-


to-administração da vida, sem aceitar a interferência de uma
vontade superior, está em todos os homens. O distanciamento de
Deus traz consigo o distanciamento do homem de si mesmo e
do seu próximo. O homem de nosso tempo evidencia traços ca-
racterístieos de seu desequilíbrio psico-somático. Não consegue
mais lidar consigo mesmo. Assim ele cai na dependência de
uma vida "animalesca", ou melhor, entregue às suas próprias
paixões. A alienação da vida humana está perante os olhos da-
queles que conseguem "enxergar". Fora da influência benigna
do pai e vivendo sua apostasia "de fato", o homem degenera de
tal maneira que sua vida está sujeita às forças da desunião, de-
sordem e destruição. Viver assim significa experimentar o po-
der da morte.

GO IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


A volta do filho pródigo fala por si mesma. Forçado a
reconhecer sua situação surge a busca e a conscientização. " C a i n -
do em s i " (v. 17) e reconhecendo a sua culpa, nasce a sua de-
cisão de voltar ao pai. Necessitamos re-descobrir a mensagem
clara de lei e evangelho. Dr. Martinho Lutero reconheceu, após
muita luta interna, o quanto é necessário para o homem, o "cair
em si". Aprender a desesperar-se mesmo (sob a Lei) significa
aprender a refugiar-se sob as promessas de Jesus Cristo (Evan-
gelho). Através do arrependimento sincero, da confissão da cul-
pa e da declaração do perdão, o homem de hoje encontrará a
chance da nova vida, preparada por intermédio de Jesus Cristo,
nosso Salvador.

A aceitação e reintegração do filho na comunhão com o


pai e o alívio que o próprio Deus oferece para todo fugitivo. O
comportamento do pai, descrito nesta parábola, é comovente e
permite olhar no coração daquele que nos oferece a sua graça.
A aceitação incondicional do filho gera a grande alegria. 0
reencontro entre o pai e o filho fornece a base para o reencon-
tro do filho consigo mesmo e com o seu próximo. Vale agora
viver a nova vida. Uma vida sob o poder da ressurreição, uma
vida de esperança e de realização.

Esboço: Deus não quer que vivas uma vida alienada


a) ele conhece as tuas tentações
b) ele espera a tua volta
c) ele te oferece a vida verdadeira.
Hans Horsch

QUINTO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


Lucas 6.36-42
23 de Junho de 1991
\. A temática das perícopes: O Salmo 138 lembra que o fiel e
misericordioso Deus é rico em perdoar os humildes de cora-
ção. (v. 6)
O texto do A . T . , Gn 50.15-21 nos destaca a bondade de
José para com seus irmãos. Temerosos de uma possível vingan-
ça do poderoso irmão, os irmãos prostraram-se humildemente

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 61


diante de José, que reagiu, dizendo: "acaso estou eu em.lugar
de Deus?" E os consolou com, seu perdão e promessa de ajuda.
Na epístola, Rm 12.14-21, Paulo reafirma o mandamento
de Jesus de amarmos e bendizermos os nossos inimigos (Mt 5.44),
como também destaca a necessidade da humildade, o "não ser
sábio aos seus próprios olhos", do querer a paz com, todos e o
não querer vingar-se do próximo, porque em última análise, o
Justo Juiz e Vingador é só Ele e mais ninguém (Dt 32.35).
0 orgulho e seus "derivados" na vida dos cristãos são um
forte destestemunho perante os que não são cristãos. como Jo-
sé, o cristão não paga o mal com o mal. Guiado pelo Espírito,
o cristão vai contra o impulso natural no ser humano.

2. Contexto: A presente perícope pertence ao sermão da Planí-


cie, de Jesus, que começa com o v. 17 e vai até o v. 49. O Mestre
está preparando os seus discípulos para a grande missão. E a
lição nesse momento é: O P a i é misericordioso, por isso os seus
também são misericordiosos. Como? Não julgando, não conde-
nando, perdoando e sendo generosos para com o próximo em
suas necessidades físicas e espirituais.

3. Texto: Vers. 36: "O Pai é misericordioso, por isso os> seus tam-
bém são misericordiosos". Quem foi aceito por Deus em. sua
misericórdia, quer e vai ser misericordioso no seu agir com, os
outros. Deus não quer destruir, mas perdoar. Assim, os cristãos,
no convívio com os outros são orientados a não julgar, não con-
denar, a perdoar e ser generosos.
Vers. 37-38: Um exemplo de misericórdia c o não julgar
e condenar. Viver da misericórdia de Deus é perdoar (Mt
19.21-35). Quanto mais os discípulos viverem, no perdão, mais
experimentarão a misericórdia de Deus.
Jesus não proíbe todo e qualquer julgar. Há um julgar
justo e ordenado por Deus. Jesus não quer que seus ouvintes
fiquem indiferentes diante de idéias e atitudes condenáveis. Isso
seria um conformismo incompatível com o espírito da justiça
divina. A exortação no texto refere a um julgar leviano, sem
amor. Essa atitude reprovada inclui o pecado da língua refe-
rido por Tiago 3.
Ao julgar segue o condenar. Quem julga e condena le-
vianamente, sem, querer "ganhar o irmão", caso ele estiver em
perigo, provoca a ira de Deus e não pode contar para a sua
própria pessoa com a misericórdia divina. Quem assim agir, ele
mesmo será julgado e condenado. Quando sentamos no Seu lu-
gar de Juiz, esquecemos que nós também haveremos de estar
perante Ele (Rm 14.10).

02 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


"Perdoai e sereis perdoados" — Na grande família huma-
na um é devedor do outro. Todos nós somos devedores de amor
para com nosso próximo. Por causa da fraqueza da nossa carne,
é inevitável que surjam desentendimentos no convívio com os
irmãos. Pedir perdão e perdoar é a solução para esses pro-
blemas. Paulo escreve aos efésios: "Longe de vós toda a amar-
gura, c cólera, e ira, e gritaria, e blasfêmias, e bem, assim toda
a malícia. Antes sede uns para com os outros benignos, com-
passivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus em
Cristo vos perdoou." (Ef 4.31,32)
Em sua carta aos colossenses Paulo exorta seus leitores a
"suportarem-se uns aos outros" (Col 3.13), o que significa que
na diversidade das individualidades devemos perdoar-nos mutua-
mente, "assim como o Senhor nos perdoou".
"Dai, e dar-se-vos-á" — O que temos nós que não tenha-
mos recebido? Nosso viver é um contínuo receber. O de Jesus
foi um contínuo dar. Ele deu-se por amor. Agora nós somos
convidados a dar ao próximo o que ele necessita no corpo e na
alma. Não perdoar alguém é negar-lhe algo que ele necessita
muito. "A caridade por nós praticada não nos abre o céu, mas
o não praticá-la nos fecha o céu."
Vers. 39 e 40: É guia cego quem julga e condena e não vê
o esplendor da misericórdia divina envolver toda existência hu-
mana. Quem, não vê o seu erro não pode guiar outros. Nessas
palavras poimênicas Jesus está preparando seus alunos, os discí-
pulos, os futuros líderes, para que não queiram guiar alguém
sem estar conscientes da misericórdia de Deus. O discípulo tem
no seu Mestre o exemplo a seguir. E todos sabiam o quanto o
Mestre era misericordioso.
Vers. 41 e 42: A cegueira espiritual referida por Jesus não
só impede o homem, a ver a misericórdia divina que o quer sal-
var, como ainda o impossibilita a enxergar a seriedade de sua
natureza pecaminosa. Cristãos também sofrem recaídas em, ma-
téria de visão do dia a dia da vida, especialmente do convívio
com os irmãos.
Nós temos traves e argueiros nos nossos olhos. Orgulho,
arrogância, farisaísmo nos enche de nós mesmos. Não raras ve-
zes perdemos nossos sentimentos de compreensão e tolerância
cristã.
Quem vive no arrependimento diário e pede perdão, re-
fugiando-se na misericórdia de Deus, esse verá no irmão a sua
própria imagem — a de um pobre pecador, fraco e falho. Só
quando o acusador se coloca diante do Deus justo, como seus
defeitos, é que ele será capaz de ajudar o outro para libertar-se
do argueiro. Vivendo na misericórdia de Deus, pode-se ajudar

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 68


o outro, sem pretensões de querer ser mais. Vendo a m i m mes-
mo nos meus erros possso ter compaixão do outro no seu erro.
Antes de querer mudar os outros, eu preciso querer mudar. A
misericórdia de Deus me faz olhar primeiro para mim; mesmo
e minha fraqueza.

4. Meditação; A misericórdia de Deus é o princípio de todo o


agir dos filhos de Deus, Num mundo em que a lei condena o
infrator e onde a tendência natural do homem é julgar o outro
(Rm 2.1), o discípulo será tentado a ocupar o trono do julga-
mento de Deus e condenar o pecador (Mt 7.1). Isso ele não deve
fazer, porque ele vive do perdão de Deus (Mt 6.12) e ele pode
somente ser a voz do perdão de Deus para seu próximo. Se ele
julga, ele perde o Deus perdoador e terá contra si o Deus Juiz.
O discípulo, através de arrependimento, precisa limpar
seu próprio olho da trave de seu próprio pecado para que possa
ver claramente para então remover o argueiro do olho do irmão
(v. 42).
Jesus também ensina a seus discípulos que ninguém está
autorizado a executar o julgamento de Deus. (Rm 12.19) Todos,
no entanto, precisam comparecer diante do julgamento de Deus.
"Onde pessoas Se acham no direito de julgar sobre os outros, aí
entram no campo que compete a Deus".
"Querer estar acima dos outros é uma qualidade da natu-
reza humana. As pessoas querem aparecer. E para poder apa-
recer, justificam-se a si mesmas e julgam e condenam os outros.
Quanto mais as pessoas procuram ser as tais, tanto mais passam
a desprezar os outros".
Cristo traz uma justiça que liberta e salva, "recheada" de
misericórdia divina. Essa misericórdia em nossa vida cria uma
nova visão. E essa nova visão da minha própria culpa, a soli-
dariedade de culpa, cria uma nova comunhão, ura novo relacio-
nar-se com o próximo. Descobre-se, então, que ninguém, está
acima do outro, mas um ao lado do outro. Somente aquele que
conheceu a dor de uma trave removida do olho pode ajudar o
outro com seu argueiro alojado no mesmo órgão. Jamais quis
Jesus negar o valor da crítica misericordiosa, que descobre erros
e os aponta, mas ensinou aos seus discípulos a não condenar
injusta e impiedosamente. Esse erro ocorre quando não leva-
mos em conta a fraqueza do irmão, quando o julgamos sem, co-
nhecimento suficiente, quando falamos de modo impensado,
quando espalhamos boatos, quando desenterramos coisas do pas-
sado ou comentamos publicamente o que é secreto, quando nos
habituamos a criticar tudo e a todos, com ares de infalibilidade,
quando insinuamos segundas intenções no próximo, interpretan-

64 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


do mal seus atos e quando faltamos com o devido amor na
aplicação da disciplina cristã.
5. Disposição: Tema: Sede misericordiosos!
1. Deus é misericordioso.
2. Quem vive da misericórdia de Deus não pode
julgar e condenar.
3. Quem vive da misericórdia de Deus aprende a
ver os outros com novos olhos.

Gerhard Grasel

SEXTO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


Lucas 5.1-11
30 de Junho de 1991
"Tudo é possível ao que crê! (Mc 9.23) Há promessas
como essa e há textos bíblicos que, quanto mais conhecidos, mais
nos certificam da presença poderosa e graciosa de Deus em nos-
sa vida. No relato da pesca maravilhosa, Cristo conscientiza o
homem de sua pecaminosidade, revela-se como Ajudador, e con-
voca os crentes para serem, suas testemunhas às outras pessoas.
Tudo no belo quadro de uma pescaria, tão conhecido, tão apre-
ciado, tão simples.
O texto está inserido no ministério de Jesus na Galiléia
(Lc 4 a 9). A escolha dos primeiros discípulos foi uma de suas
primeiras tarefas, ao iniciar seu ministério. O cenário é a mar-
gem ocidental do lago de Genezaré, conhecido no Antigo Testa-
mento por "mar de Quinerete", palavra hebraica que significa
harpa (kinnor), por causa da semelhança entre a forma do lago
e esse instrumento. A primeira grande comissão ou chamamen-
to ocorre ao som das águas dessa enorme harpa construída pela
natureza de Deus, Os personagens mais atuantes, além, do Mes-
tre e Concertista Jesus são os pescadores, homens simples, sem
grande cultura, mas laboriosos e dispostos a atender à palavra
de Jesus, ouvindo e fazendo o que manda.
" N a d a apanhamos" (v. 5) — Situações de insucesso e frus-
tração na vida profissional não são novas, nem são exclusividade
da moderna era industrial. Há fases na vida em que parece não

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 (55


haver esperança de êxito, apesar de pormos em execução os
mais audaciosos planos e investirmos altas somas, capacidades
e tempo. Defrontando-se com o resultado adverso de uma noite
de trabalho em vão, o discípulo, ainda assim confiante, exclama:
"Mas sobre a tua palavra lançarei as redes". Seguindo a palavra
de ordem e convite do Salvador, Pedro e os crentes de todos os
tempos experimentam maravilhas. Jesus submeteu-se ao mais
infrutífero dos trabalhos: redimir a humanidade perdida das
malhas do pecado, do mundo e do poder do diabo — e transfor-
mou essa tarefa em sucesso e salvação. "Epídé tôo réemati —
apesar de todas as contra-indicações, hora imprópria, desânimo,
cansaço, os discípulos atendem a seu Mestre e confiam na ordem
recebida. "Senhor, aumenta-nos a fé" na lua palavra!
O propósito do milagre da pesca é o mesmo expresso em
Jo 20.31. O processo inicia com o "ensinava do barco as multi-
dões". (v. 4) Apresentou-se-lhes como Salvador através da pre-
gação da palavra de vida e sucesso pessoal. Nessa palavra foi
que Pedro confiou. Essa palavra transforma-se no convite que
leva os discípulos a seguir Jesus. E r a preciso que essa mensa-
gem exitosa fosse levada adiante por homens convictos e que
cumprissem cabalmente o seu ministério. O êxito da empreitada
tinha o objetivo de fortalecer a fé daqueles pescadores de dois
mares. Em ambos os barcos, de pesca e do ensino, eles atendem
á voz do Mestre. Em ambas as tarefas eles seriam bem sucedidos,
porque bem amparados. O mar da vida precisa ser desbravado
a serviço do Salvador Jesus, sob pena de que a nossa vida tenha
sido vivida em vão. O chamado do texto é específico aos discí-
pulos de Jesus, para pegar com vida, capturar (zoogroon) pes-
soas para as malhas do evangelho de Cristo, como seus mensa-
geiros. Mas também se aplica a todos os crentes, no sentido de
que dêem testemunho de Sua presença em suas vidas.
O sucesso da pesca tem ainda um significado positivo em
relação ao trabalho de nossas mãos, que não é vão, quando rea-
lizado "no Senhor". (1 Co 15.57,58) Muitos são os entraves à
obra da missão da igreja. Quantas desculpas se arranjam para
fugir a essa responsabilidade! A pesca maravilhosa é a promes-
sa presente de que o trabalho da igreja, através de seus membros,
na pregação e no testemunho, jamais deixará de ser bem su-
cedido. "A minha palavra não voltará v a z i a . . . " (Is 55.11) Um
dos maiores obstáculos ao progresso da palavra é a falta de
empenho e a fraqueza de fé dos cristãos. Seguir a Jesus (eko-
loúthesan/y. 11), depois de lhe entregaram tudo, barco, trabalho,
confiança e louvor, para o engrandecimento de seu reino e de
sua obra na terra.

66 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
Disposição
Tema: Sobre a tua palavra lançarei as redes!
1. A palavra de Deus corre velozmente (Sl 147.15ss)
cobre de nuvens os céus, prepara a chuva, faz
brotar nos montes a erva, dá o alimento aos
animais, ninguém lhe resiste:
Ouçamo-la, aceitemo-la, ajamos de acordo com
ela! "Desejai ardentemente... o genuíno leite
espiritual! (Contexto da Epístola do dia: 1 Pe
2.2).
2. A palavra de Deus revelada em Cristo se mani-
festa ao homem de forma salvadora e milagro-
sa: transforma sua vida, e "suas misericórdias
se renovam todas as manhãs" (Leitura do A n t i -
go Testamento do domingo).
3. A palavra de Deus é viva e eficaz em sua Igreja.
Seus pastores, ao exercer o ministério público
da pregação da palavra e administração dos
sacramentos, têm a promessa de que "prospe-
rará" (Is 55). Seus crentes, como sacerdotes
reais, nação santa e povo de propriedade de
Deus a proclamam para que todos "alcancem
misericórdia". (Epístola)
Elmer Flor

SÉTIMO DOMINGO APÔS PENTECOSTE


João 4.5-15(16-26)
07 de Julho de 1991
Jesus encontrava-se no início do seu ministério. Havia-se
revelado como o Messias por ocasião da páscoa (Jo 2.18,19 e 23).
A purificação do templo (Jo 2.13-16), os sinais realizados (Jo
3.30), o encontro com Nicodemos (Jo 3.1-15), o testemunho de
João Batista (Jo 3.30), tudo somou para uma crescente notorie-
dade de Jesus. No entanto, este prestígio gerou inúmeros ciúmes,
tanto por parte de alguns adeptos de João Batista (Jo 3.26), co-
mo principalmente dos fariseus (Jo 4.1). Para evitar atritos,
Jesus achou por bem voltar para a Galiléia (Jo 4.3).

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 67


Ele se encontrava na Judéia, e para chegar à Galiléia,
era-lhe necessário atravessar a região de Samaria. Território
hostil devido a rivalidade entre judeus e samaritanos (Ed 4 e
Ne 4). Havia três estradas que levavam através da Samaria. O
caminho do litoral, margeando o Mediterrâneo, o do vale do rio
Jordão e a estrada que atravessava pelo meio o território de
Samaria. Jesus escolheu esta última via, a de maior contato
com a população local.
Jesus e sua comitiva chegaram assim nas proximidades de
uma cidade chamada Sicar (Jo 4.5). Localizava-se a mesma
entre os montes Ebal e Gerizim (Dt 11.29). E r a uma cidade
histórica (Gn 33.19 e Jz 24.1). Venerada pelos samaritanos (Gn
34.2) devido ao poço cavado por Jacó, poço cuja água assegu-
rava a subsistência da população. Os samaritanos não eram
judeus. A origem dos mesmos achamos registrado em 2 Rs
17.24-28. Adotavam um culto misto, sincretista, com forte in-
fluência pagã e alguns traços de judaísmo. Assim aceitavam
apenas o Pentateuco, bem como a circuncisão e também, espera-
vam a vinda de um Messias. Como os judeus vedavam o acesso
de samaritanos ao templo em Jerusalém, eles construíram um
templo rival junto ao monte Gerizim. Mas este havia sido des-
truído em 128 a . C . por João Hircano. Mesmo assim o monte
Gerizim era-lhes, sagrado, pois diziam que ali se dera o encontro
entre Abraão e Melquisedeque (Gn 14.18-20), e ainda segundo
os samaritanos, neste lugar Abraão era para sacrificar seu filho
Isaque (Gn 22). Segundo a tradição, aqui também se localizava
o túmulo de Jacó, a quem veneravam como patriarca (Jo 4.12).
O poço situava-se nas proximidades da cidade. Era, ao
mesmo tempo um lugar de pouso, em cuja sombra das árvores
descansavam os peregrinos. Sendo a hora sexta, ou seja, meio-
dia, a hora era propícia. Jesus ficou junto ao poço, enquanto
seus discípulos foram à cidade a fim de buscarem alimentos.
Nisto se aproxima uma mulher samaritana para buscar água no
poço. Jesus dirige-lhe a palavra, pedindo que ela lhe desse um
pouco de água para beber. O diálogo que a seguir se estabeleceu
entre Jesus e esta mulher samaritana é um dos mais expressivos
do Novo Testamento. Comprova todo o amor de Deus a favor
de uma "ovelha perdida" (Lc 15.3-7). Evidencia o chamado de
Deus ao arrependimento. E revela a messianidade de Jesus. Es-
pecialmente o objetivo da sua vinda. Nas palavras do próprio
Jesus: "O Filho do homem veio salvar o que estava perdido".
A mulher samaritana era uma "ovelha perdida — mas através
do dom de Deus (o sacrifício vicário do Messias) e da água vi-
va — o evangelho deste amor de Deus (Jo 3.15,16) ela seria re-
conduzida ao divino aprisco. E esta salvação é completa. Quem
nele crê tem a vida eterna. Somente o Messias pode conduzir a

68 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


pastos verdejantes e levar para junto das águas de descanso (Sl
23.2).
Pelo: contexto vemos que Jesus atingiu seu objetivo. A mu-
lher samaritana reconheceu em Jesus inicialmente um profeta
(Jo 4.19), depois o Cristo (Jo 4.29), e graças ao seu testemunho
a favor do Messias, toda a cidade de Sicar veio a crer, tanto que
unânimes todos confessaram: "sabemos que este é verdadeira-
mente o Salvador do mundo" (Jo 4.42).

Jesus se manifesta como o Messias aos samaritanos


1. converte uma mulher (Jo 4.5-26)
2. leva-a ao testemunho pessoal (Jo 4.28-30 e 39)
3. e assim evangeliza uma cidade inteira (Jo 4.40-42).
Walter O. Steyer

OITAVO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


João 6.1-15
14 de Julho de 1991
ESTUDO:
1. Metá tauta: depois destas coisas, pressupõe um período de
tempo de pelo menos seis meses ao máximo de
um ano. João introduz relatos omitidos nos si-
nóticos e sublinha outros já feitos.
2. Os verbos estão no imperfeito. Jesus estava sentado por al-
gum tempo (cf. variante).
3 A festa dos judeus — explica a concentração de pessoas e a
curiosidade; estranhos vindos de fora,
4. 6 e 10b — Devem ser vistas como explicações entre parên-
teses. Ajudam a compreender mas não compõem
o objetivo pelo qual João registra o relato.
5. Agorasonem — Subjuntivo— Onde compraríamos... ou se
comprássemos, Não pede a informação. Je-
sus quer que Filipe reflita sobre o problema.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 69


6. Autos — Ele, ele próprio.

10. Ton arithmou — Acusativo, relação: em relação a números,


no que respeita números.
14. Elegon — Imperfeito: no sentido — espalhar de boca em boca.
Palavras especiais:
Semeia (v. 2, 14) É tema especial deste evangelho
(2.11, 18, 23; 3.2, 4, 48, 54, especialmente 10.41).
Tó paseha: Em João (2.13; 5.1; 6.4; 11.55) são importantes es-
tas menções para determinar a extensão do minis-
tério de Jesus. Em 6.4 Jesus está a um ano da morte,
no pico do ministério da Galiléia, mas também desa-
fiante mais e mais rejeição.

Mello — em 6 e 15 é intenção definida cuja ação é irreversível.


Denárion — salário de um dia.

Hoi ándres — (masculino) em v. 10, mas hoi antropoi (signifi-


cando o povo todo) no v. 14

V. 14 — A confissão era verdadeira nas Palavras empregadas. O


discurso era certo e dirigido à pessoa certa. Mas a ati-
tude, as intenções c o objetivo eram falsos.
V. 14 e 15 — São relato exclusivo de João
Harpazein — Envolve até violência. (Obrigá-lo)
Aspectos homiléticos:
Contexto — Qual é a missão de Jesus?

5.47 = Se porém não credes nos seus escritos, como


crereis nas minhas Palavras.
43 = "Se outro vier em seu próprio nome."
"Vós, os que aceitais glória uns dos outros e
não procurais a glória de Deus."

Jesus acusa que a misericórdia de Deus é também; consu-


mida egoisticamente pelo homem que só procura Deus para be-
nefícios pessoais.

70 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
Depois da multiplicação a multidão prova com seus atos
o que Jesus lhes via no coração.
Confira os sinóticos (Mt 14.14-21; Mc 6.34-44 e Lc 9.11-17)
- Todos enfatizam o teste que Jesus fez com os discípulos
para ver se voltariam para Ele em busca de auxílio. (Decepção?)
Só sabiam confiar nos seus recursos próprios e força. Ao mesmo
tempo não deixaram de fazer o povo assentar-se, depois!
Os sinóticos tem como contexto os ensinamentos de Jesus,
explicações sobre o Reino e curas.
O texto:
A. Revela o Deus Provera Em todas as circunstâncias.
Este Deus espera a nossa confiança porque ele não falha.
Este Deus espera confiança também quando a confiança é o
único recurso.
B. Revela o homem (anthropos do v. 14) e a inversão que faz
da bondade e do amor de Deus. (Ilustração: o texto do AT
Israel no deserto). Josefo também relata de dois charla-
tães que se intitularam profetas de Deus e atraíram e fana-
tizaram multidões com promessas de glórias futuras.

C. Dar glórias à providência de Deus, em si é nada. Dar glórias


ao Deus Barriga (no dizer de Lutero) e "obrigar" Deus por
meio de culto e orações e satisfazer necessidades materiais é
colocar aquele Jesus dos escritos de Moisés (5.47) na fuga
(6.15).

D. Todos os cálculos, seguros e garantias que se puderem ajun-


tar são postos em desafio por um Deus que olha dos céus e
prove para todos. Infelizmente, o homem julga que é seu
direito e dever apropriar-se não só das dádivas divinas, mas
também apropriar-se do Doador.

O texto nos confronta com um problema da natureza hu-


mana, identificado no contexto pelas palavras de Jesus e ilus-
trado no texto pela atitude da multidão e dos discípulos. Todos
se interessam por Jesus, o procuram e seguem,. E Jesus confirma
que o amor de Deus pela humanidade é concreto, presente na
pessoa de Jesus, nas suas palavras e atos.
O problema que se opõe à fé é o homem só reconhecer e
admitir a bondade de Deus quando as suas expectativas estive-
rem satisfeitas. Tanto os discípulos acharam que a pergunta de
Jesus só faria sentido se Deus lhes tivesse antecipadamente feito
chegar às suas mãos pelo menos 200 denários. Querer alimen-

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 71
tar aquela multidão era exigir o impossível. Nem; Deus, nem
Jesus podem fazer isto, no entender destes cristãos pragmáticos
e modestos no pedir e esperar.
Do outro lado, estão aqueles que pensam que Deus lhes
deve tudo. E que querem transformar Deus no "gênio da lâm-
pada" para suas ambições. Não tem auto-crítica, muito menos
arrependimento em si.
O objetivo do texto é fazer com que o cristão seja ambi-
cioso e confiante na sua vida de oração (por estar na presença
de Jesus); ao mesmo tempo aprenda com Jesus a canalizar os
recursos de Deus não em benefício pessoal, ou para capitalizar
honras, mas para servir o seu próximo com humildade de es-
pírito.

Organização do material:
Acima dos recursos que temos, está aquele que nos ama.
Por isto:
aprendamos a receber o seu auxílio com humildade
aprendamos a repartir os benefícios com confiança.
P. P. Weirích

NONO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


Mateus 5.13-16
21 de Julho de 1991
É importante notar, sempre de novo, o contexto destas pa-
lavras de Jesus. Em primeiro lugar, elas são ditas a Seus discí-
pulos; por outro, elas vêm logo após as bem-aventuranças onde
Jesus descreve a atitude do mundo em relação a Seus discípulos
e Sua Igreja. A última beatitude é transicional. As duas metá-
foras do texto — sal e luz — invertem o processo e descrevem a
influência que tem, o Reino de Deus sobre o mundo, ou seja, a
atuação dos seguidores de Cristo sobre aqueles que "por minha
causa" os perseguem, (cf. 5.11-12).
O pronome hymeis no início de ambos os versículos é en-
fático. Não é o mundo, não são os escribas e fariseus, más os
filhos do Reino apenas que são sal da terra e luz do mundo,
inerente nestas duas figuras está uma verdade fundamental: a

72 . IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
Igreja e o mundo são duas entidades separadas. De um lado
está "a terra"; do outro, "vós" que sois o sal da terra. De um
lado está "o mundo"; de outro, "vós" que sois a luz do mundo
(cf. o Salmo indicado para hoje onde esta distinção fica bem
definida). Verdade é que as duas entidades estão relacionadas
entre si, mas esta relação depende da sua diferença. N u m a so-
ciedade com tendências religiosas universalistas, quando é teolo-
gicamente elegante tornar obscuras as fronteiras entre Igreja e
o mundo, bem como referir-se a toda a humanidade indiscrimi-
nadamente como "povo de Deus", é oportuno lembrar esta di-
ferença para que nossos cristãos não se integrem a essa inclina-
ção aeróbica.
Sal e luz são duas metáforas extraídas da comum neces-
sidade cotidiana de qualquer família independente de sua posi-
ção social ou econômica. Tanto o sal quanto a luz exercem, uma
função salutar sobre o ambiente onde se encontram e atuam.
Pode-se dizer que o sal possui uma função especialmente nega-
tiva e secreta atuando no combate à deterioração. A atividade
dos discípulos pode ser comparada aqui ao fato que o sal não é
simplesmente aspergido, mas ele é esfregado sobre os elementos
para que estes não se decomponham. Mais do que isso, na ótica
do contraste entre Igreja c mundo, este se encontra doente, fe-
rido, de chagas abertas. E o sal — a Palavra de Deus testemu-
nhada pela Igreja — arde, precisa arder. Helmuth Thielicke
explora este aspecto dizendo que cristãos há que se apresentam
ao mundo como sendo mel e não sal e por isso o mundo os re-
jeita. "Jesus", diz ele, "não falou: 'vós sois o mel do mundo'.
Ele disse: 'vós sois o sal da terra'. 0 sal arde e a mensagem
não adulterada do juízo e da graça de Deus sempre temi sido
uma coisa que arde — tanto arde que os homens se têm revoltado
e reagido contra e l a . . . [Por outro lado,] onde não houver amar-
ga reação o puro sal está em falta" (Life can begin again: Ser-
mons on the Sermon on the Mount. Philadelphia, Fortress, 1963,
p. 28).
O sal pode perder sua capacidade de atuação ao sofrer a
influência de outros elementos químicos. Estudiosos afirmam
que o sal do Mar Morto, devido à exposição a outros elementos
químicos, possui gosto alcalino e se torna imprestável. Jesus ao
falar com Seus discípulos na segunda parte do vers. 13 deve
ter-se voltado em direção ao Mar Morto para ilustrar Seu argu-
mento.
A segunda figura utilizada por Jesus é a da luz. Sc o sal,
atuando de forma salutar, possui uma atuação negativa e age
de maneira secreta, a luz, por seu turno, tem uma função posi-
tiva iluminando abertamente, publicamente. São metáforas que
se complementam. " L u z " , na Escritura Sagrada, significa conhe-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 73


cimento de Deus (cf. 6.22-23; Sl 36.9); bondade, justiça e ver-
dade (Ef 5.8-9); alegria, glória e verdadeira felicidade (Sl 97.11;
Is 9.1-7; cf. 60.19). Em última análise " l u z " outra coisa não é
senão o equivalente aos "frutos do Espírito", como se acham
alistados na Epístola de hoje. É importante ressaltar que Jesus
não diz: "vós deveis ser... s a l . . . luz", mas Ele diz: "vós Sois
s a l . . . luz". A relação com Deus gera naturalmente, espontanea-
mente, este processo. É evidente que os discípulos, os cristãos
não são luz em si e por si mesmos. Nós somos luzes "no SE-
N H O R " (Ef 5.8). Cristo é a "luz do mundo" (Sl 27.1-43. 3;
Is 49.6; 60.1; Lc 1.78; 2.32; Jo 8.12; 2 Co 4.6). Somos a "luz
do mundo" num sentido derivado sim, mas natural, lógico.
A ilustração dessa verdade Jesus a faz por meio (de novo)
de duas realidades do cotidiano. A primeira é a da cidade, polis,
construída sobre um monte. Com suas muralhas e fortalezas,
não pode ser escondida. E l a é visível a todos de dia e de noite.
A segunda realidade é a da lâmpada, lychnos, acesa no velador.
Lâmpadas da época podem ser vistas hoje em grandes museus
ou em coleções particulares. O que Jesus tinha em mente era
uma dessas lâmpadas de terracota em forma de pires com pro-
longamento era um dos lados. Mede cerca de 1Ocm de compri-
mento, 7cm de largura e 4cm de altura. Possui duas pequenas
aberturas na parte superior: uma onde se coloca o óleo e a
outra, na extremidade do prolongamento, onde é colocado um
pavio e que, uma vez aceso, "alumia a todos que se encontram
na casa".
A luz não pode ser escondida. À moda do sal que, se não
salgar — sua razão existencial - perde sua identidade funcional,
assim a luz que é colocada sob o alqueire: consome o oxigênio
e o pavio apenas fumega, tendendo a ser sufocado. A mensagem
é evidente: Jesus não espera a auto-preservação da fé. Auto-
preservação é auto-destrunição; segurança é aniquilamento, mor-
te. Jesus quer que a fé — para se manter viva, atuante, acesa
seja exposta ao mundo, aos obstáculos, aos desafios, aos perse-
guidores (cf. a leitura do Antigo Testamento para hoje). Este
aspecto fica manifesto na expressão "diante dos homens", ém-
prosten tón antrôpon, uma expressão de caráter genérico, uni-
versal. A estes as "boas obras", kalá erga, devem ser mostradas
para que possam, ser vistas. O verbo "ver", oráo, sintetiza todo
o modus operandi da fé cristã. A ética cristã não se caracteriza
por um isolacionismo asceta; antes por uma exibição fluente,
natural, desinibida. O testemunho pessoal não se dá apenas
oralmente, mas, a partir do texto, visivelmente (cf. 1 Pe 3.1).
Sugestão de Tema:
Ardendo e Iluminando.
Acir Raymann

74 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


DÉCIMO DOMINGO APÓS PENTECOSTE
Mateus 25.14-30
28 de Julho de 1991
a) Assunto central das perícopes; O Salmo 119.105-112
dá a tônica das leituras bíblicas deste domingo: "Lâmpada para
os meus pés é a tua palavra, e luz para o meu caminho". O texto
do A T , Êx 32, mostra que e como o povo de Israel cedo se des-
viou da palavra do Senhor e adorou o bezerro de ouro. A epís-
tola, Fp 3.7-11, mostra que o conhecimento de Cristo, que se
adquire da palavra de Deus, é a sublimidade e o maior lucro,
porque a fé em Cristo dá-nos a justiça que procede de Deus e
nos põe em comunhão com Deus. O evangelho do dia mostra
que precisamos trabalhar com a nossa fé, vivendo-a em obras
para a glória de Deus e para o bem de nosso próximo.
b) Contexto: Jesus falou dos acontecimentos que have-
rão de preceder o fim do mundo (Mt 24). Conta, então, quatro
parábolas, das quais o texto de hoje é a última. As quatro pa-
rábolas são para ilustrar e ressaltar a necessidade de vigilância;
de vigilância com operosa atividade em favor do reino de Deus.
Em seguida à perícope de hoje vem o relatório sobre o juízo final.
Estamos em meio ao assim chamado " A n o da Igreja",
época em que — espera-se — a Igreja, a congregação, cada cris-
tão esteja bem ativo, empregando seus talentos, seus dons em
favor do reino de Deus. Por isso o evangelho deste domingo é
apropriado para estimular os crentes a viverem e a anunciarem
a palavra de Deus com todas as suas forças.
c) Texto: Vers. 14-17: O homem entregou seus bens a
três dos seus servos: cinco, dois e um talentos respectivamente.
O que recebeu cinco talentos "saiu imediatamente a negociar".
E l e não perdeu tempo. Ele ganhou outro tanto para o seu pa-
trão. " D o mesmo modo o que recebera dois, ganhou outros dois."
Estes dois servos se constituem em exemplo para os cristãos:
cada cristão precisa logo trabalhar para seu Senhor. Os talentos
que o Senhor Deus nos dá são os dons do Espírito Santo: Evan-
gelho, fé, perdão, esperança, alegria, etc. "Negociar" com, esses
talentos significa "pô-los a serviço do reino de Deus" (missão e
evangelização). A recompensa pelo bom e habilidoso trabalho
está mostrado nos versículos 20-23.
Vers. 18: O que ganhara um talento de seu senhor pensou
negativamente; mas também poderia ter produzido tanto quanto
os outros dois, se tão somente houvesse ganho outro tanto nego-
ciando. Ele, porém, foi mau e preguiçoso. Ele conhecia o seu

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 75


senhor e a vontade dele, mas não fez a vontade de seu senhor!
Qualificação dele: mau e preguiçoso! A recompensa pela sua
maldade e preguiça está contada nos, versículos 24-30.
Vers. 19: "Depois de muito tempo vem o senhor daqueles
servos e ajusta a conta com eles". É claro que esta parábola tem
lição espiritual: O Senhor Jesus, por fim, virá para o julgamento
final, para o acerto de contas com cada pessoa (Mt 25.31-46).
Não basta só conhecer o Senhor Deus e a sua vontade. É
preciso fazer a vontade dele. "Sem fé é impossível agradar a
Deus" (Hb 11.6). A fé, a confiança em Jesus leva a pessoa a
ser ativa na igreja, no reino de Deus. A fé verdadeira move o
cristão para o viver cristão, para a missão e para a evangeli-
zação. Portanto: "Examinai-vos a vós mesmos se realmente es-
tais na fé; provai-vos a vós mesmos". II Co 13.5a.
d) Disposição: Tema: O SERVO F I E L DE JESUS CRISTO
I — Faz a vontade de seu Senhor.
II — Recebe a recompensa do seu Senhor.
Curt Albrecht

ÚLTIMO DOMINGO DO ANO DA IGREJA


Mateus 25.1-13
24 de Novembro de 1991
a) Assunto central das perícopes: O Salmo 130 expressa
o clamor das profundezas, clamor de quem reconhece as suas
iniqüidades, mas que confia no perdão, aguardando o Senhor e
esperando na sua palavra, com ansiedade, certo de que o Senhor
redime o seu povo. Isaías 65.17-25 dá força a esta esperança no
Senhor, porque relata a criação de novos céus e nova terra para
os que esperam no Senhor. O Senhor promete ouvir o clamor
que lhe é dirigido. O apóstolo Pedro, na epístola para hoje, II,
3.3,4,8-10a,13, lembra que há zombadores c incrédulos, que não
esperam no Senhor por novos céus e nova terra. Todavia, o
Senhor é longânimo e vai cumprir sua promessa de criar novos
céus e nova terra. Nós, cristãos, "segundo a sua promessa, es-
peramos novos céus e nova terra, nos quais habita justiça". O
evangelho, por isso, exorta à perseverança na fé e na vida cristã
ao dizer: V I G I A I !

76 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
b) Contexto: " N o Monte das Oliveiras achava-se Jesus
assentado, quando se aproximaram dele os discípulos, em parti-
cular, e lhe pediram: Dize-nos quando sucederão estas coisas, e
que sinal haverá da tua vinda c da consumação do século." 24.3.
E ele passa a dizer-lhes uma série de coisas que devem preceder
o seu retorno para o julgamento final. 24.4-14. Conta, então,
quatro parábolas — das quais nossa perícope é a terceira — para
sublinhar a necessidade de vigilância da nossa parte e o empenho
por alcançar a vida eterna.
c) Texto: Vers. 1-4: "Reino dos céus" aqui é mais am-
plo do que apenas o governo de Deus, pelo Espírito Santo, no
coração, na vida do cristão. "Reino dos céus" é o (retorno de
Cristo para) instalar a vida eterna. E isto vai acontecer na prá-
tica como aconteceu com as dez virgens, que saíram para o en-
contro do noivo.
Elas saíram, tiveram de caminhar ao encontro dele. Não
era uma espera de parar quieto. Precisavam andar. A i n d a vi-
vemos, estamos indo ao encontro do Noivo celeste, Jesus Cristo.
Todas as dez levaram suas lâmpadas, mas só a metade delas
levou óleo sobressalente. As que foram sem combustível de re-
serva são chamadas de "néscias", porque foram desprevinidas.
Não se deram conta de que o noivo poderia atrasar e seu óleo
consumir-se nas lâmpadas durante a espera, vindo a faltar para
a caminhada com, o noivo para as bodas. As cinco moças que
levaram óleo sobressalente são chamadas de "prudentes". Elas
puderam manter suas lâmpadas acesas (Lc 12.35); por isso não
perderam a oportunidade nem a condição de acompanhar o noivo
para as bodas.
Vers. 5-12: O inesperado aconteceu para as néscias: o noi-
vo tardou em vir. Adormeceram (aoristo) e dormia (imperfeito:
estavam dormindo, todas), quando o noivo chegou. As prudentes
puderam reabastecer suas lâmpadas e "entraram, com ele para
as bodas". O pior de tudo para as néscias foi que a porta foi
fechada. Mas elas ainda tentaram e chegaram até a porta das
bodas, clamando lhas abrisse o noivo. Era, porém, tarde demais.
Tinham perdido a oportunidade.
Vers. 13: Este versículo encerra a moral da história, da
parábola das dez virgens: " V i g i a i , pois, porque não sabeis o
dia nem a hora". Jesus vai voltar, mas o dia e a hora não estão
marcados para nós. É uma questão de espera, com vigilância e
em militância constantes, na fé em Cristo. Estamos vivendo e,
como tais, caminhamos na direção do dia final. A luz da nossa
fé em Cristo precisa estar constantemente acesa para vermos o
Noivo celeste c para poder acompanhá-lo para as bodas nas

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 77


mansões celestiais. O tempo sobremodo oportuno, o dia de sal-
vação é aqui e agora. Não durmamos! Jesus exorta: V I G I A I !
d) Disposição: Tema: VIGIAI!
I — Porque o Noivo celeste virá.
II Porque não sabeis o dia nem a hora,
Curt Albrecht

DÉCIMO PRIMEIRO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


Lucas 19.41-48
4 de Agosto de 1991
Tema: JESUS E M J E R U S A L É M !
1 A maior parte de nosso texto é lei. 0 Senhor foi ao
seu templo em cumprimento a Malaquias 3.1, porém, Jerusalém
rejeitou a sua paz (v. 42). Por isso os Romanos virão e destrui-
rão Jerusalém, um evento que aconteceu em 70 d . C . "Não fica-
rá pedra sobre pedra" (Lc 21.6). Assim como os Babilônios
sitiaram Jerusalém (Jr 6.6; Ez 4.2), assim também o fariam os
Romanos (v. 43). A oração do salmista contra a Babilônia (Sl
137.9) tornou-se a profecia do Senhor contra Jerusalém (v. 44).
Jerusalém experimentará a "vingança" de Deus (21.22) porque
ela rejeitou a pedra angular (20.17-18). As filhas de Jerusalém
deveriam chorar por si próprios e pelos seus filhos (23.28-31).
O desejo preferencial de Jerusalém por um Messias lutador, guer-
reiro, que vencesse Roma, ao invés do Príncipe da Paz, irá con-
duzi-la à ruína.
2 — A destruição de Jerusalém no ano 70 d . C . prefigura
o Dia do Juízo. A ameaça de Jesus também nos chama ao arre-
pendimento. Naquele dia os inimigos de Cristo, que recusam
seu jugo, serão abatidos (19.27). Então Cristo dirá aos que o
rejeitaram: "Apartai-vos de mim, vós todos os que praticais ini-
quidades (13.27; veja 9.26; 12.9).
3 — Entretanto, Jesus não quer a destruição de Jerusalém
nem a nossa. Ele até chora por causa dos seus habitantes (41-42;
veja 23.28). Ele queria ajuntar seus filhos como uma galinha
ajunta os seus pintinhos, mas eles não o quiseram (13.34). Em
Cristo o tempo (kairós) oportuno da visitação graciosa de Deus

78 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
chegou (v. 44; veja 1.68; 7.16). No entanto, os líderes de Jeru-
salém procuraram destruí-lo (v. 47). Nele Jerusalém haveria de
achar paz no seu sentido mais completo, num relacionamento
correto com Deus; no entanto, a paz estava oculta aos seus olhos
(v. 12). A salvação havia chegado, "porque o Filho do homem
veio buscar e salvar o que estava perdido" (Lc 19.9-10); eles,
porém, o recusaram. Todas estas passagens evidenciam a pro-
funda angústia e o inabalável amor do Senhor.
4 — O desejo do Senhor de salvar os perdidos levou-o a
Jerusalém para sofrer e morrer (9.51; 13.33; 9.22,44; 18.31-33).
A l i , em Jerusalém, vemos na cruz o Rei da Paz (v. 38), o R e i dos
Judeus (23.88), morrendo por Israel e por nós. A l i , em Jerusa-
lém, vemos Cristo sendo amassado, quebrado, em nosso lugar,
para que possamos ser o seu povo.
5 — Agora é o tempo de nós sermos visitados por nosso
gracioso Deus. Que nós possamos dizer pelo poder do Espírito
Santo; "Bendito é o Rei que vem em nome do Senhor!" Que nós
possamos conhecer, "ainda hoje, o que é devido a paz", porque
a sua morte dá-nos a verdadeira paz. Que possamos cada vez
mais nos firmar através da fé, em suas palavras (v. 48), porque
elas são palavras de perdão de pecados e de vida através de sua
morte e ressurreição.

Egon M. Seibert, Adapt.

DÉCIMO SEGUNDO DOMINGO APÓS PENTECOSTE


Lucas 18.9-14
11 de Agosto de 1991
Introdução:
Como seriam diferentes vossas orações c o vosso culto a
Deus se vós soubésseis que o fim do mundo — o dia do Senhor,
a segunda vinda de Cristo — viesse a acontecer hoje à tardinha
(o que é bem possível), não é mesmo? O final de outro ano
eclesiástico que se aproxima e o Evangelho deste dia dirigem-nos
ao exame de nossas orações e de nosso culto à luz da segunda
vinda de Cristo.

Nossas orações e nosso culto à luz da segunda vinda de Cristo

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 79
I - O mundo em que vivemos não providencia modelos
apropriados para orações a Deus ou para o culto a
Deus.

A — O mundo coloca ênfase cm autoconfiança, auto-esti-


ma, e orgulho. Candidatos a cargos políticos bem como pessoas
à procura de emprego são encorajadas a gabar-se de saias reali-
zações e conquistas. Pessoas são louvadas e premiadas por causa
de suas ações cívicas, políticas e até mesmo religiosas.
B — O mundo, porém, não reconhece a influência do pe-
cado original no homem (Gn 6.5).
C — 0 homem não consegue justificar-se perante Deus e
permanece condenado diante dele.

II - Deus providenciou o meio pelo qual podemos escapar


do veredito de culpa.
A — Jesus Cristo viveu uma vida perfeita era nosso lugar
(Jo 8.46; Hb 4.15).
B — Jesus Cristo, por meio de seu sacrifício, pagou a dí-
vida que tínhamos com Deus por causa de nossa pecaminosidade
(2 Co 5.21; R m 5.8).
C — Através de sua ressurreição dentre os mortos, Jesus
Cristo conquistou o pecado, o Diabo, a morte, e a sepultura para
nós (Rm 6.4).

III — O veredito divino — "Inocente por causa de Cris-


to" — está à disposição de todas as pessoas.
A — Pessoas (como o fariseu) :
1 — Podem rejeitar a oferta divina de perdão
através de Jesus.
2 — Podem gabar-se de sua suposta superiorida-
de em assuntos de religião, moral e justiça
civil.
3 No dia da segunda vinda de Cristo, no dia
do Juízo, serão surpreendidas ao ouvir o
veredito divino — "Culpados! Apartai-vos
de m i m ! " (Porque o que se exalta, será hu-
milhado, v. 14; Mt 25.41).
B — Pessoas (como o cobrador de impostos) a quem, o
Espírito Santo trouxe ao arrependimento e à fé através da pro-
clamação da L e i e do Evangelho:

80 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


1 — Confessarão perante Deus, em oração parti-
cular e em culto público: — "Deus, sê pro-
pício a mim pecador!" (1 Tm 1.15).
2 — Têm já, agora, a certeza de que seus pecados
são perdoados (Mt 9.2).
3 — Na segunda vinda de Cristo ouvirão o vere-
dito: — "Inocentes por causa de Cristo!" (O
que se humilha, será exaltado", v. 14, Mt
25.34).
Conclusão:
Como pretendes aparecer diante de Cristo na sua segunda
vinda? Pretendes gabar-te de tuas participações nas atividades
da igreja, de tuas boas ações, de tua suposta moralidade supe-
rior? Ou será que é tua intenção agarrar-te na misericórdia de
Deus em Jesus Cristo? Como na parábola do Fariseu e do P u -
blicano, Deus quer declarar justos aqueles que foram guiados
pelo Espírito Santo a orar: "Ó Deus, sê propício a mim, peca-
dor!" Queira o Espírito Santo, através do precioso Evangelho,
capacitar-nos a orar e a prestar culto desta forma.

Egon M. Seibert, Adapt.

DÉCIMO TERCEIRO DOMINGO APÔS PENTECOSTE


Marcos 7.31-37
18 de Agosto de 1991
1. Próprios do dia
a) Salmo 146: o Intróito aponta para o louvor em, virtude
das grandes obras de Deus e de sua fidelidade frente à fragili-
dade e às fraquezas humanas, destacando o reinado eterno do
"Senhor que abre os olhos aos cegos".
b) Isaías 29.18-21: a leitura do AT destaca a redenção
que se cumpriria no Messias, pois "naqueles dias os surdos ouvi-
rão", apontando assim para a obra de Cristo, destacada no evan-
gelho do dia.
c) 2 Coríntios 12.6-10: a epístola destaca o "poder de
Deus que se aperfeiçoa na fraqueza", mostrando que a doença

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 81


tem seu lado positivo, pois o poder de Deus em nós é aperfei-
çoado e podemos confiar que os olhos do Pai estão sobre nós.
d) Marcos 7.31-37: o evangelho relata a cura de um sur-
do e gago e destaca o fato de que Jesus "tudo tem feito esplen-
didamente bem".

2. Contexto

"Marcos inicia seu evangelho com a afirmação de que ele


é a boa nova de Jesus Cristo, o F i l h o de Deus. E então expõe a
viva demonstração de nosso Senhor como o servo que cura c
reconcilia, e que age para atrair todos a si — culminando na
declaração de Pedro; " T u és o Cristo" (8.29). Após, Jesus é
mostrado como o Messias-Servo que voluntariamente serve até
completar a sua obra, entregando-se à morte." (Concórdia Pulpit
for 1979)

3. Texto
V. 32: "Surdo e gago" — por causa de sua surdez, o
homem tinha dificuldade em falar, mas não era mudo.
V. 33: denota o cuidado especial de Jesus, seu amor para
com aquele homem, pois tira-o da multidão, loca seus ouvidos
e língua.
V. 34: "Efatá" — em aramaico, "ser aberto", "ser liber-
tado". A idéia não é da parte específica da pessoa sendo aberta,
mas da pessoa inteira ser aberta ou libertada. É a ordem que
despedaça os grilhões com que Satanás tinha mantido presa a
sua vítima.
V v . 35-37: a ação de Jesus é concretizada — os ouvidos
do surdo se abrem e o empecilho da língua é retirado, e ele pas-
sa a falar desembaraçadamente. Isto trouxe admiração. As, pes-
soas ficaram atônitas além, de todas as medidas, excessivamente,
sobremaneira. O texto encerra com a declaração: "tudo ele tem
feito esplendidamente bem". E o ex-surdo-gago, junto com os
demais, não pode deixar de testemunhar da ação de Deus em
sua vida.

4 Pensamento central
"Jesus rompe as vidas fechadas dos homens e abre-se à
saúde da comunhão com Deus e com o próximo. Somente a pa-
lavra de Deus tem poder para abrir nossa surdez natural e tra-
zer-nos à fé e à vida. Jesus é o Messias, o prometido que traria
salvação e plenitude de vida a todos." (Concórdia Pulpit for
1979) . .

82 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


5. Persuasão
a) Objetivo: a confiança naquele que tudo faz esplen-
didamente bem, que abre nossos ouvidos para a boa nova da
salvação e nos coloca em comunicação com, o P a i .
b) Moléstia: o ser humano, por natureza, se isola e alie-
na de Deus e do seu próximo. As pessoas ainda continuam, se
afastando de Deus e deixando de ouvir sua voz. Somos surdos
para com Deus.
c) Meio: Cristo veio ao mundo para irromper em nossas
vidas com sua obra, abrindo nossos ouvidos para seu evangelho
e quebrando as barreiras entre Deus e os homens. "Tudo ele
tem feito esplendidamente bem".

6. Disposição

Tema: Jesus faz tudo bem


I — Abre nossos ouvidos e nossas vidas
1. Somos surdos de nascença.
2. Não poderíamos ouvir a voz de Cristo sem a ação do
Espírito Santo.
3. Jesus vem ao nosso encontro e toca nossas vidas.
4. Para que confiemos neste Senhor.

II — Para podermos ter comunicação com o P a i


1. Nossa alienação e isolamento de Deus.
2. O perdão que provém da obra de Cristo.
3. Pelo perdão, estamos novamente em comunhão com, o
Pai.
4. Sabemos que, mesmo em meio à doença, os olhos do P a i
estão sobre nós.
Rony Ricardo Marquardt

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 83


DÉCIMO QUARTO DOMINGO APÓS PENTEGOSTE
Lucas 10.25-37
25 de Agosto de 1991
1) As leituras do dia: Sl 142 — Davi, perseguido por Saul e
escondido na caverna, é mais uma vítima da violência (como o
foi o assaltado da história do Bom Samaritano). Sua esperança
está apenas em Deus,
Gn 4. (1-7) 8-16a — Caim teve atitude diametralmente opos-
ta a do Bom Samaritano. Faltou-lhe amor. O contraste entre a
atitude de Caim e a do Bom Samaritano é flagrante!
1 Jo 4.7-11 — O grande e belo texto: "Deus é amor." O
amor de Deus é a base e a origem do nosso amor ao semelhante.
Lc 10.25-37 — O Bom Samaritano: um exemplo de amor
ao próximo. O exemplo é dado por Jesus para ilustrar o fruto
da fé salvadora: amar a Deus acima de tudo (cf. explicação do
1" mandamento — Cat. Men,or) se reflete no amor ao próximo.
O amor não fica só em palavras, mas se demonstra em obras.

2) O texto:
V. 25 — "com o intuito de por Jesus em provas": Em
várias ocasiões tentaram arrancar de Jesus algumas respostas
erradas, que o condenassem (cf. Mt 22.15ss, Mt 22.23ss). Somos
confrontados com pessoas que não querem conhecer a verdade,
mas só querem confundir ou ridicularizar. Devemos estar "sem-
pre preparados para responder a todo aquele que pedir razão da
esperança que há em nós" (1 Pe 3.15).
V. 26 — A tática de Jesus: Ele não inventa respostas, mas
remete o interlocutor à Escritura: "O que está escrito? Como
interpretas?" (Cf.: Lc 4.1ss: Jesus rebate as tentações com a P a -
lavra de Deus!).
V. 27 — Pelas respostas, o escriba demonstrou não perten-
cer ao grupo dos que valorizavam mais a lei cerimonial. Centra-
lizou, corretamente, tudo no amor.
V. 28 — Jesus elogia suas respostas. Mas não bastava ape-
nas conhecimento desta verdade: é necessário praticá-la: "Faze
isto e viverás!" — lembramos aqui que o 1o mandamento (ou:
a primeira tábua resumida pelo escriba) só pode ser cumprida
pela fé. Não é uma mera obediência, como obra humana, mas
é um ato de fé e confiança, do que decorre toda a vida de amor
ao próximo.

84 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
V. 29 — Mesmo conhecendo, faltava a fé justificadora: o
escriba tenta justificar-se a si mesmo. No caminho da auto-justi-
ficação, a pessoa se afasta cada vez mais do caminho oferecido
por Deus. — A pergunta "Quem é o meu próximo?" deve ser en-
tendida dentro do contexto judaico (Mt 5.43): "Amarás o teu
próximo e odiarás o teu inimigo." Entre os inimigos constavam
todos os estrangeiros (todos os não-judeus).
V. 30 — Assaltantes — violência — vítimas — de ontem,
e de hoje. Quanta falta de amor existe, e quanta oportunidade
de demonstrar amor aos injustiçados se nos apresenta cada
d i a . . . ! — Cf.: O Salmo do dia: Davi perseguido; a leitura do
A T : A violência de Caim contra Abel.
V. 31 e 32 — O Sacerdote e o levita tiveram oportunidade
de exercer misericórdia, de demonstrar amor ao semelhante pros-
tra,do à beira do caminho; m,a,s não o fizeram. Cf. Tg 4.17:
"Aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisto está
pecando."
V. 33 — Há necessidade de se explicar a situação dos sa-
maritanos (cf. 2 Rs 17.24-41). Judeus e samaritanos eram ini-
migos írreconciliáveis, tanto por questões de religião como de
raça. — esplanichníste: compadecer-se: palavra-chave no texto.
V. 34 — A compaixão em ação. O samaritano não ficou
só na intenção de ajudar; seu amor ao próximo não foi feito de
grandes discursos; mas foi prático! Correndo risco de assalto,
deixando seus interesses de lado, ajudou o necessitado. (Cf. 1 Jo
3.18 c 1 Jo 4.7-11 (a leitura da epístola do dia.)
V. 35 — O samaritano pagou para que outra pessoa con-
tinuasse cuidando do ferido: Boa prática de caridade é contri-
buir para que hospitais, creches, asilos, orfanatos, etc. possam
cumprir bem suas funções.
V. 36 — Quantas perguntas e respostas aparecem neste
texto? — o estilo catequético transparece neste episódio. T o d a a
mensagem poderia girar em torno das perguntas e respostas
constantes no texto.
V. 37 — Se confrontados com desafios semelhantes, qual
tem sido a nossa reação? Como anda a prática do amor ao
próximo em nossa igreja?

3) Os problemas e a solução:
Os problemas: a intenção maldosa do escriba: por Jesus
à prova;
sua tentativa de auto-justificação;
as atitudes de desamor: dos assaltantes, do sacerdote e do
levita; omissão;
as nossas atitudes de desamor, discriminação...

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 85


— A solução: 1 Jo 4.9,10: o amor de Deus por nós, revelado
em Cristo, nos impulsiona ao amor a Deus e ao próximo.
i) O Bom Samaritano no dia a dia:
— Questionamento: Duas senhoras, dirigindo à noite, em es-
trada deserta; um homem deitado no acostamento. Será um
atropelado? será um bêbado? será uma estratégia maldosa para
um assalto? Resolvem não parar; a consciência acusa. Na pri-
meira oportunidade, avisam a polícia.
— Ilustração: Atualização da história — Duas escolas dispu-
tam um campeonato de futebol. Muita torcida, muita briga,
ameaças!... D i a seguinte um componente do time perdedor vê
o artilheiro do time adversário cair da bicicleta. Ninguém por
perto para ajudar. Sua primeira reação foi rir, debochar! De-
pois, pensando melhor, foi ver o que tinha acontecido: havia
um pé quebrado. Telefonou para casa, ajudou. Início de uma
grande amizade!

5) Disposição:

T E M A : O amor ao próximo.
O B J E T I V O : Estimular à prática da caridade em, situações
bem concretas da vida congregacional e comunitária, como fruto
da verdadeira fé.
I N T R O D U Ç Ã O : Cf. "Ponto 4 — Questionamento".

I — Por que amamos?


a) porque Ele nos amou primeiro (1 Jo 4.9,10)
b) há muitos carentes/necessitados
c) é da vontade de Deus.
II — Como amamos?
a) Não como o sacerdote e o levita (v. 32,32)
b) Não como Caim (1 Jo 3.11,12)
c) Como o samaritano (v. 33-35)
d) Como Jesus! (cf. Hino n° 269).
C O N C L U S Ã O : Cf. "Ponto 4 — Ilustração".
Carlos Walter Winterle

IGREJA LUTERANA 1/1991


86
DÉCIMO QUINTO DOMINGO APÔS PENTECOSTE
Lucas 17.11-19
1º de Setembro de 1991
Contexto

A perícope faz parte do ciclo final da viagem de Jesus


pela Galiléia, Samária, Peréia e Judéia (Lc 9.51 a 19.27). Esta-
vam chegando a Jerusalém, como o contexto vai indicando (17.11
da caminho para Jerusalém, 18.31 subindo, 18.35 perto de Jericó,
19.1 em Jericó, 19.28 subindo de fato, 19.41 chegando). Há duas
curas, dos leprosos (17.11-19) e do cego (1-8.35-43), com detalhes
semelhantes. Em ambos a invocação por compaixão (17.13 e
18.38), em ambos "a tua fé te salvou" (17.9 e 18.42), em ambos
o agradecimento e o louvor a Deus (17.18 e 18.43). As ênfases
da pericope sobre gratidão e ingratidão se espelham também em
outras perícopes deste ciclo. A fidelidade e a gratidão são o
assunto em 17.20 a 18.8 e 18.11-27. A infidelidade e ingratidão
são o assunto em 19.28-44.
Texto
Há duas partes claras: a cura dos dez (v. 11-14) e á res-
posta de fé do sàmaritano (vv. 15-19).
V v . 12/13 — A situação é típica dos leprosos da época:
tinham que ficar longe da sociedade (Lv 13.45-46). A doença
criava algumas barreiras sociais, mas derrubava outras. Havia
entre os dez um samaritano. Judeus e samaritanos não se da-
vam porque do ponto de vista religioso e social o sàmaritano era
considerado "não limpo" (Jo 4.9). Samaritanos eram de descen-
dência mista: israelitas que permaneceram quando o reino do
norte foi levado cativo e a Assíria colocou colonizadores gentios
em Israel (2 Reis 17.24). Mas o sofrimento derruba as barreiras
(leprosos com o samaritano), bem como o amor (o bom, sama-
ritano, Lc 10.33) e a fé (a mulher samaritana, Jo 4.7). Todos,
judeus e o samaritano, pediram compaixão de Jesus.
V. 14 — A cura se realizou "indo eles". Se a fé salvou e
curou o samaritano (v. 19), não teriam os demais também fé em
Jesus, pois também foram curados? Não seriam os demais ape-
nas "crentes" negligentes que esqueceram o doador quando rece-
beram uma grande bênção? A ordem de Jesus corresponde ao
que está prescrito em Lv 14.1.
Vv. 15/16 — Os dez certamente ofereceram os sacrifícios
prescritos. Os nove decerto acharam que este cerimonial já era

IGREJA LUTERANA 1 /1991 87


suficiente "compensação" para a ajuda recebida de Deus. Não
vollaram para dar "glórias a Deus" e "agradecer a Jesus". Mas
O estrangeiro voltou. Podia até ser que não fosse aceito pelo
sacerdote: as barreiras derrubadas pelo sofrimento se ergueram
novamente? Os samaritano cultuavam no monte Gerizim (Jo
4.20), onde os samaritanos haviam construído um templo em
c. 400 A C , destruído pelos judeus em c. 128 A C , porque diziam
ser este o monte (e não Ebal) que Moisés havia indicado para
construir o altar (Dt 27.4-6). O louvor do samaritano é em alta
voz, sem temor, com fé agradecendo a Jesus (eucharistein), como
antes havia implorado por compaixão (kyrie eleison). Ambos os
termos agora fazem parte da liturgia.
Vv. 17/19 — A pergunta "onde estão os nove?" fala tam-
bém. aos tempos atuais. Há muita gente que com fé clama o
"kyrie eleison" e esquece depois de mostrar o "eucharistein" na
vida cristã. A fé do samaritano não apenas o salvou fisicamente,
mas espiritualmente. O leproso curado em Lc 5.12ss. também
mostrou a sua fé e confiança em Jesus: "Senhor, se quiseres,
podes purificar-me". Jesus purifica também do pecado: "A tua
fé te salvou" (v. 19).

Esboço
Introdução: A vida é uma dádiva de Deus. No mundo é
tão frágil diante das adversidades. A história dos leprosos nos
dá três palavras para a vida: compaixão, fé, gratidão.

Três Palavras Para Vida


I. Compaixão.

A. Os leprosos viviam da compaixão. Estavam em miséria


física, emocional (sem esperança de cura na época), e
social (eram excluídos da sociedade).
B. Também precisamos da compaixão. Temos problemas
pessoais (doença, tristeza, pecado). O mundo está com
problemas (fome, pobreza, discriminação, guerra).
II. Fé.
A. O grito por compaixão crê que alguém pode ajudar.
Deus em Cristo carregava nossas dores. Ajudou os le-
prosos: A tua fé te salvou.
B. Se tudo está bem conosco, então foi a fé que salvou!
Deus é o Senhor e Doador da V i d a : nos sara física e
espiritualmente. Dá forças não só para sobreviver, mas

88 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


para agir com coragem e fé. A confiança no Deus forte
e compassivo nos dá vitórias e um espirito voluntário
para vencer (Sl 51.12).
III. Gratidão.

A. Nove aceitaram a misericórdia de Jesus, mas na alegria


da cura esqueceram o doador. Só um voltou para mos-
trar gratidão.
B. Este é o padrão para nós: quando a fé nos cura, então
nossa vida toda pertence a Deus. Nossa resposta é ado-
ração, gratidão, culto, louvor. A vida cristã em amor é
também nosso louvor a Deus: vida que recebe e espera
tudo de Deus, e que vive o amor ao próximo.

Martim C. Warth

DÉCIMO SEXTO DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E


Mateus 6.25-33
8 de Setembro de 1991
A ênfase das perícopes
Com clareza, todos os quatro textos apontam para a pro-
vidência divina em, face à ansiedade humana. O salmo n° 4
destaca que Deus sempre responde as orações dos que nele con-
fiam e assim continuará fazendo. A alegria do mundo baseia-se
sobre "cereal" e "vinho" mas o verdadeiro regozijo do cristão
depende de sua comunhão com Deus. A obediência na promessa
de providência divina, alcança a misericórdia de Deus em suprir
as necessidades físicas do homem (1Rs 17.18-14). O Evangelho,
por sua vez, procura ressaltar que a busca do reino de Deus e
da sua justiça, garante, por si mesma, o recebimento das coisas
menos importantes, ou seja, daquilo que precisamos para nossas
necessidades físicas (Mt 6.33).

0 Contexto
0 contexto imediato do Evangelho determina o uso cor-
reto das propriedades (Mt 6.19-24). Esta sessão aborda especial-
mente o materialismo, em contraste com a espiritualidade. Cons-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 89


titui o "manifesto contra o materialismo" dos ensinos de Jesus.
Estes versículos nos ensinam a verdade dos cuidados de Deus
por nós, e, em conseqüência, o fornecimento para nossas neces-
sidades materiais. Este ensino tem passado despercebido, tanto
que por muitas vezes aqueles que não tem riquezas, não as tem
somente porque não encontram a oportunidade ou a habilidade
para adquiri-las, e não porque não tivessem a vontade de pos-
suí-las. O deus "riquezas" os atraem mais fortemente do que o
Cristo da Galiléia. 0 resumo deste ensino é: "Buscai primeiro
o reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão
acrescentadas".
0 Texto
0 resumo do ensino desta perícope, determina que a con-
centração recaia sobre um, texto-base, ou seja: Mateus 6.33. Este
versículo aponta para o tema central: "Desejai as coisas celes-
tiais". Há boas razões, apontadas em toda a perícope de Mateus,
para o discípulo de Cristo evitar a ansiedade quanto à vida
fisica.
1. A vida humana é mais que a parte física, e por isso merece
mais consideração do que os desejos pelas; coisas físicas po-
dem fornecer (vs. 25). A mente começa a admitir o pensa-
mento inferior de que a vida consiste apenas em "comer,
beber e vestir-se". Quem toma esta atitude torna-se seguidor
das riquezas, não podendo ser discípulo do reino, porquanto
já perdeu a confiança no Rei.
2. Deus cuida dos animais inferiores, como as aves, que não
fazem provisão alguma para si mesmos. Assim também, cer-
tamente cuidará de seus próprios filhos (vs. 26). Jesus não
encoraja a preguiça nem falava contra o esforço do trabalho,
tão somente, mostrou que a obtenção da alimentação não de-
ve ser acompanhada pela ansiedade, porque a providência
divina funciona neste mundo até mesmo entre os animais
inferiores. Se o discípulo negar ou duvidar da providência
divina então agirá como o pagão, que nunca considerou Deus
seu Pai.
3. A ansiedade não altera as condições da vida e nem. aumenta
a sua duração (vs. 27).
4. A ansiedade pelas coisas físicas faz parte da conduta dos gen-
tios. Os discípulos do reino contam com o seu Pai celeste
vs. 32). A ausência dos desejos realmente espirituais entre
os gentios é que provocara a sua apostasia, levando-os final-
mente, à adoração dos Ídolos. O discípulo é diferente do

90 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


gentio no caráter e nos desejos porque confia nas promessas
do P a i celeste.
5. 0 conhecimento perfeito que o P a i tem de nossas necessidades
físicas garante o fornecimento para as mesmas (vs. 32). Toda
a Escritura ensina a bondade, sabedoria e conhecimento per-
feitos do P a i celeste. Por isso, podemos esperar confiante-
mente o fornecimento de todas as necessidades que temos, do
Pai celeste.
6. A busca do reino de Deus e de sua justiça, garante, por si
mesma, o recebimento das coisas menos importantes, ou seja,
daquilo de que precisamos para nossas necessidades físicas
(vs. 33).

Disposição
Tema: Desejai as coisas celestiais. Como?
1 . Confiando na providência do P a i em suprir as necessi-
dades fisicas.
a) O discípulo do reino que perde a confiança no P a i
torna-se seguidor das riquezas. O velho homem em
nós anseia pelo comer e beber.
b) 0 P a i conhece nossas necessidades físicas.
c) O P a i nos convida a confiarmos na sua providência
que nos veste (lírios) e alimenta (aves).

2. Buscando em, primeiro lugar o alimento celestial.


a) A ausência dos desejos realmente espirituais provoca
apostasia e idolatria. No exemplo dos gentios trans-
parece a nossa própria tendência.
b) O P a i nos mostrou sua providência suprindo integral-
mente nossa carência espiritual em seu Filho Jesus
Cristo. No Evangelho encontramos alimento em, abun-
dância.
c) Busquemos pois, as coisas celestiais oferecidas pelo
P a i na Palavra e nos Sacramentos.

Nereu Rui Weber

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 91


DÉCIMO SÉTIMO DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E
Lucas 7.11-16
15 de Setembro de 1991
1) As leituras do dia: Sl 116.1-9 — Um salmo de ação de
graças, pois o Senhor acudiu na aflição. "Laços de morte me
cercaram... livraste da morte a minha alma."
1 RS 17.17-24 — Elias 1 ressuscita o filho da viúva de Sa-
repta. Os paralelos deste texto com o Evangelho são muitos e
podem ser usados na mensagem.
1 Co 15.1-11 — Paulo relata a ressurreição de Cristo e
arrola uma série de testemunhas oculares. Além do grande pon-
to comum do dia — a ressurreição dos mortos, pode ser usado
também o ponto comum das testemunhas e sua reação: divulga-
ram o que viram!
Lc 7.11-16 — As leituras anteriores são preparatórias para
a leitura do Evangelho. A verdade da ressurreição dos mortos
é apresentada num crescendo. O Senhor Jesus é o Senhor da
vida e da morte!
2) O texto:
V. 11 — Seguindo a Cristo, os discípulos se defrontavam
com situações as mais variadas, tanto de alegria (bodas de Caná),
como de tristeza. Jubilaram no Monte da Transfiguração e cho-
raram no Monte do Calvário. Aquele que segue a Cristo deve
estar consciente de que nem tudo são rosas no caminho de Jesus.
Ao defrontar-se com a morte, deve saber que Cristo está ao lado.
V. 12 — A situação desamparada de uma viúva na época:
sem aposentadoria, sem seguro.. . Deus permite que as nossas
escoras humanas caiam uma a uma, para confiarmos apenas
nele! — O cortejo da morte, saindo da cidade, se defronta com
o cortejo da vida, entrando na cidade. Neste duelo, o Vencedor
e Cristo!
V. 13 — Quando a viúva viu desabar sua última escora
humana (arrímo de família), Jesus aparece em seu caminho e
diz: "Não chores!"
— compadecer-se (Cf. Lc 10.33: o bom samaritano).
"Chorai com os que choram" (Rm 12.15). A queixa de muitos
que passaram por situações de dor e de luto é que não encon-
traram um ombro amigo para se apoiar e chorar. Como cristãos,
somos "pequenos cristos" no caminho de outras pessoas. Cum-
pramos a nossa função consoladora: "Consolai o meu povo!"

9.2 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/199!


V. 14 - Uma palavra de ordem daquele que é a própria
ressurreição e a vida (Jo 11.25)! — As ressurreições realizadas
por Jesus (Mt 9.25: a filha de Jairo; Jo 11.43 — Lázaro; e o jo-
vem de Naim) são uma boa ilustração para o próprio fato da
conversão: Ef 2.1 — Estávamos mortos em nossos delitos e pe-
cados, e Ele nos deu vida! a Palavra de Jesus abre os ouvidos
mortos, penetra no íntimo e dá a vida! Isto é obra, poder e
amor de Jesus! Um homem morto não pode dar vida a si mes-
mo.
V. 15 — "E Jesus o restituiu a sua mãe." O jovem foi
ressuscitado não para uma vida egoísta, mas para uma vida a
serviço de sua mãe, como é da vontade de Deus (4° mandamento).
V. 16 — "Grande profeta — Dt 18.15,18 — "Deus visitou
o seu povo" — expressão característica dos tempos messiânicos:
Lc 1.78 — "Nos visitará o sol nascente das alturas"; Mt 1.23 —
"Emanuel = Deus conosco,"
V. 17 — A reação do povo: temor e glória (v. 16) e teste-
munho. É a reação que Deus espera diante dos seus feitos. M u i -
tas vezes ficamos apáticos c calados diante das maravilhas de
Deus.

3) Os problemas e a solução;

— Os problemas: a morte — salário do pecado


— a dor, o choro
— a solidão.

— A solução: Cristo venceu a morte e dá a verdadeira


vida!

4) Disposição:

T E M A : Morte e vida.

O B J E T I V O : Reforçar a verdade central da fé cristã: Em


Cristo temos vida, pois Ele venceu a morte, ressuscitando.

I N T R O D U Ç Ã O : Mencionar alguma situação marcante de


sepultamento na vida comunitária ou da história mundial.

I — A morte — a dura realidade


a reação das pessoas diante dela
a morte eterna

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 93
II - A vida — conquistada por Cristo: sua ressurreição
(Páscoa!)
dada pela fé
consolo na aflição
esperança futura.

C O N C L U S Ã O : Nós, que recebemos a vida, testemunhamos


a vida!
Carlos Walter Winterle

DÉCIMO OITAVO DOMINGO APÔS PENTECOSTE


Mateus 26.26-29
22 de Setembro de 1991
ASSUNTO: A INSTITUIÇÃO DA S A N T A CEIA.

Este é um dos mistérios da fé e da vida cristã: Jesus se


oferece a nós em, sua Palavra e também, de forma real e con-
creta, palpável, na Santa Ceia.
Parece que, de um modo geral os problemas com respeito
à Santa Ceia são dois.
O primeiro, e talvez principal, é a dificuldade de com-
preensão deste mistério. É uma daquelas coisas que a mente
humana não consegue captar em toda a sua profundidade. É um
dos mistérios da fé que não conseguimos compreender realmen-
te. É apropriado fazer revisões periódicas e constantes sobre o
assunto, em forma de estudo e meditação particular do pastor,
e em forma de estudos bíblicos com, a congregação.
A nosso ver esse é um típico assunto ao qual se aplica
muito bem o velho ditado latino: "repetitio est matter studio-
rum". Há tantos aspectos e nuances, há tanta riqueza de con-
teúdo e significado que é somente mediante escudo continuado
que vamos conseguir nos familiarizar e adquirir domínio a seu
respeito.
O segundo problema, decorrente do primeiro, (i.e., da d i -
ficuldade de compreensão) é a falta de motivação dos fiéis para
participarem da Santa Ceia, e a nossa frustração, como pastores,
de não conseguirmos motivá-los a buscar a Mesa do Senhor es-
pontânea e livremente.

94 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
Ora a solução deste segundo problema está na solução do
primeiro. ;É preciso promover o estudo e o conhecimento sobre
a Santa Ceia. Todo o conteúdo da Bíblia é importante, mas a
Santa Ceia é um daqueles especialmente importantes, que solici-
ta de nós muito mais do que apenas pregações esporádicas.
. Para auxiliar neste sentido lembramos aos colegas que na
coletânea "Pelo Evangelho de Cristo" há dois sermões de Lutero
(p. 253 e 287) que são um bom subsídio e um bom estímulo para
a nossa reflexão pessoal. A l é m disso também vale lembrar o
que Lutero escreveu no Catecismo Maior sobre o assunto, além
de outros escritos de sua autoria que os irmãos tenham consigo
ou aos quais tenham acesso. Lembrado que (segundo nosso mo-
do de ver) esses escritos são úteis especialmente para a nossa
reflexão e aprofundamento pessoal; para nos servir de base na
elaboração de uma mensagem contextualizada ao nosso tempo,
ao nosso povo e na nossa linguagem. Não seria de esperar, nem
mesmo no maior apuro de tempo, uma simples transposição dos
textos de Lutero para os ouvidos dos nossos congregados, até
porque sua linguagem não é acessível à média do nosso povo.
Há várias ênfases que poderiam ser dadas com relação à
Santa Ceia. Inclusive com a suplementâção por parte de outros
textos, como os relatos paralelos e 1 Co 11.17ss. A questão da
Ceia presta-se bem para uma exposição mais sistemática, do tipo
"estudo-bíblico". Aquele que vai pregar precisa escolher qual o
aspecto que deseja enfatizar. Poderia destacar a Ceia Pascal,
que era a festa maior que estava sendo realizada, dentro da qual
acontece a Instituição; poderia explorar a relação entre o signi-
ficado da Antiga Aliança, lembrada na Páscoa judaica e da Nova
Aliança, lembrada com a Santa Ceia; poderia destacar o aspecto
do "isto é meu corpo" em contrapartida aos ensinamentos sobre
o simbolismo e a trans-substanciação; poderia falar dos elemen-
tos usados (qual seja, o pão — de que tipo, com ou sem, fermen-
to; se pode ser hóstia — e o vinho — se pode ser suco de uva,
outra bebida, se o vinho "tem que ser tinto, porque o sangue é
vermelho", como acham alguns luteranos, se é vinho misturado
com água — ); poderia enfatizar o preparo/dignidade para o
recebimento da Ceia (precisando levar em conta 1 Co 11); seria
possível destacar que Jesus deu graças; poderia falar do sangue
— que estava presente na Antiga Aliança e que agora, na Nova,
é do próprio Salvador.
Será muito útil dispor de um bom comentário bíblico ou
auxílio doutrinário.
O Texto
Relata a instituição da Santa Ceia. Jesus estava reunido
com seus 12, comendo a refeição festiva da páscoa, quando, a

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 95


certa altura, interrompe a seqüência tradicional do cerimonial e
introduz algo inteiramente novo; algo diferente; algo único. Que,
no entanto, de lá para cá é repetido incansavelmente pelos cris-
tãos: o comer e beber do seu próprio corpo e sangue, junto com
0 pão e o vinho. O que para nós hoje é algo natural, pois repe-
limos vezes: sem conta, para os 12, naquela primeira vez, com
certeza foi algo de muito extraordinário e grandioso, pois Jesus
introduziu um elemento novo, um significado completamente de-
ferente no meio de uma cerimônia que eles estavam acostumados
a celebrar. O sentido da cerimônia até então era relacionado
com o sangue do cordeiro sacrificial do A T ; a partir de agora
passa a estar ligado com o sangue do próprio Cristo, que iria
ser derramado em favor de toda a humanidade, de todos os
tempos, dali a poucas horas. E r a o próprio sangue da Salvação
que estava em cena naquele momento e naquelas palavras de
Jesus. Grandioso. Milagroso. Misterioso. Abençoador!.. .

Sugestão de Esboço:
Obs.: O ponto " 3 " do esboço poderia, também, ser subidividido
em mais um, ficando " 3 " e "4".
Tema: A morte que traz vida (ou — A morte de Cristo (que)
nos traz vida)

1 . O sangue de Cristo
(sua vida, tudo o que foi e o que fez. Também no
sentido literal, pois no AT já estava presente o sangue,
que é fonte de vida.)
2. F o i derramado
(Cristo sofreu — e morreu —. A vida foi dada, foi
oferecida, foi tirada. O próprio Salvador se entregou
à morte. E l e não precisava morrer, mas quis — por
nós! Nós não gostamos da idéia da morte, mas preci-
samos morrer. A morte nos ronda. Seu principal re-
presentante é nosso inimigo mortal e nos quer condu-
zir à morte eterna. Mas nós podemos vencer o diabo
e a morte, com a morte de Cristo (i.e., com seu siangue
que foi derramado).

3. Em favor de muitos, para remissão dos pecados.


(A morte de Cristo não foi simples morte. Não foi
morte e ponto final. Mas foi morte "em favor de";
foi morte que trouxe resultados, benefícios, vida. Não
só para alguns, mas para muitos, i.e., para todos que
aceitarem a fé.

96 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991
Conclusão:
— Isto nos é lembrado na Santa Ceia, que, por isto, é festa
e alegria.
— Esta bênção (perdão que vem da morte (i.e., do sangue
derramado por Cristo) e que fortifica a nossa fé) nos é
trazida, doada, oferecida na Santa Ceia.

Irmo Arnaldo Huebner

DÉCIMO NONO DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E


Marcos 12.28-34
29 de Setembro de 1991
0 texto do Salmo introduz o assunto proposto no bloco de
leituras para este domingo. F a l a dos feitos do Senhor a favor
dos seus filhos. Mostra o amor de Deus, motivo da resposta do
cristão, que serve a Deus e ao próximo.
O escriba inquiridor procurou obter de Jesus uma resposta
que pudesse dar clareza à complexa relação de mandamentos
com seus variados valores. E r a m em número de 613 os manda-
mentos divinos que os fariseus reconheciam, e havia grande di-
vergência quanto aos que eram de maior ou menor importância.
Como conhecedores da lei de Deus, os escribas, em sua função,
tinham a tarefa de interpretá-la, retalhando-a e aplicando-a à
vida diária do povo.
Diante da pergunta pelo "principal de todos os manda-
mentos", Jesus redirecionou o assunto; não o tratou a nível de
superfície, mas foi à raiz. Jesus retornou o escriba ao seu pró-
prio conhecimento da lei (Dt 6.4,5 e Lv 19.18). O escriba apre-
ciou a resposta, elogiou-a e expressou sua concordância com o
ponto de vista de Jesus. Jesus, porém, foi mais longe e demons-
trou que o estar no e sob o reino da Deus não é obtido pelo que
o homem sabe ou faz, mas pelo que Deus faz e oferece ao homem.
O escriba, por seus méritos, chegou apenas perto. A lei não o
pode conduzir ao trono da graça de Deus. Jesus aproveitou o
momento e lembrou este fato ao escriba.
A mensagem pode explorar a questão da interiorização da
lei, da verdadeira conversão e conseqüente vida em amor a Deus
e ao próximo. Pode contrastar o "cristianismo de sabedoria"

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 97


(conhecer a letra da lei), com o "cristianismo de desgaste em
amor" (viver o espírito da lei), pela orientação e forças que
procedem da graça de Deus.
Sugestão de tema: Do principal dos mandamento à ação.
Introdução
I — Constatação I: O Senhor é o único Deus
1. T e m direito de governo sobre todos
2. Trata com amor suas criaturas
3. Quer ser reconhecido e considerado.
II — Reação esperada pelo Senhor
1. Amor a Deus: incondicional
2. Amor ao próximo: igualado.
III — Constatação II: O homem precisa de Jesus Cristo
1. Só o conhecimento da lei não basta
2. É impossível cumprir a lei
3. Jesus Cristo é a Possibilidade.
IV — Vivendo em amor
1. É preciso conhecer a Jesus Cristo e seu amor
2. O amor de Cristo impulsiona à ação
3. A ação cristã é espontânea e tem alvos certos.
Conclusão
Nelson Lautert

VIGÉSIMO DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E


Marcos 2.1-12
6 de Outubro de 1991
Contexto
O evangelho de Marcos inicia muito cedo a narrar os con-
flitos de Jesus com seus críticos; e adversários, decorrentes dos
milagres feitos ou de seus discursos, o que ocorre logo após as
primeiras curas. As situações de conflito devem-se a curas de
doenças físicas, poder de perdoar pecados, amizade com peca-

98 IGREJA LUTERANA/NÚMERO t/1991


dores, cerimônias de jejum e da guarda de sábado não cum-
pridas.
0 Conflito se estabelece
Vs. 1-4: Não obstante a oposição sofrida, ou até mesmo
em função dessa polêmica, o povo se reúne em torno de Jesus.
Quer vê-lo, ouvi-lo, tocá-lo, experimentar sinais. (Nisto tudo o
povão de nossos dias não é diferente ao expressar suas carên-
cias.) E Jesus "anunciava-lhes a palavra". Por palavra e sa-
cramentos, ainda hoje, Gristo se faz presente em, sua igreja, nos
cultos públicos:, trazendo perdão e vida plenos de real sentido.
Toda e qualquer busca terrena e imediatista de alívio e cura,
fora do âmbito da palavra e das promessas de Deus, pode levar
a descaminhos, desespero, morte espiritual.
Um grupo de pessoas chega ao lugar e à sala em que
Jesus se encontra para receber uma cura. Cura da paralisia do
amigo enfermo que carregaram, alçaram e baixaram até ali. A
paralisia é figurativa de dissolução física do corpo humano, de
impotência, de acomodação de músculos, nervos, movimentos.
Este estado de imobilidade provoca, no entanto, um testemunho
coletivo de fé e confiança dos que o conduzem: "Vendo-lhes a
f é . . . " A onisciência de Jesus revela-se, antes mesmo de iniciar
qualquer ação visível de cura. O que esquadrinha corações e
sabe todas as coisas (Sl 139.23) está presente fisicamente na
terra. E dispõe-se a ajudar.
Vs. 5-7: Certificando-se da fé nos personagens envolvidos
com a cura do paralítico, inclusive o próprio doente, Jesus ime-
diatamente promove a cura maior, a mais substancial, a mais
necessária: o perdão de pecados. Pecados que, por culpa origi-
nal ou atual, causam toda espécie de enfermidades. Mas essa
providência tão importante gera, como contraste, nos opositores,
racionalistas de todos os tempos, a descrença, a dúvida, a oposi-
ção aberta. Essa oposição se evidencia na tentativa de eliminar
a concorrência, de neutralizar o inimigo. São menscionados os
escribas (grammateís, sopherim), que surgiram de uma combina-
ção de um governo civil e religioso, no último período do A T .
E r a m ao mesmo tempo legisladores e teólogos, e interpretavam
a lei nesses dois aspectos. E r a m o que se poderia querer demais
erudito para questionar qualquer agressão à lei e à religião esta-
belecida. Torna-se clara, no texto, a intenção dos escribas e dos
demais opositores (Lucas menciona ainda os fariseus) em ofus-
car o brilho de poder e fama que Jesus irradiava. Sob a acusa-
ção de blasfêmia, lançam a acusação mais contundente à natu-
reza, aos atributos e à obra do Messias, que estaria "falando
impiamente" contra Deus, e por isso merecia a condenação.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 99


O Conflito se resolve
Vs. 8-12: Mais uma vez Jesus dá mostras de sua onisciên-
cia, a grande arma que usa para vencer seus adversários. Ao
"ler" os pensamentos dos inimigos desconcerta-os com duas per-
guntas contundentes, a segunda, na verdade, irrespondível. De-
safia-os a distinguir entre duas coisas impossíveis ao homem de
realizar — a autoridade para perdoar pecados e a realização de
um milagre fisicamente observável. Por uma conseqüência ex-
terna, a cura física, sela a verdade do perdão. Por um sinal
visível atesta o direito e o poder de fazer o que está acima do
âmbito das provas humanas. Ambos os atos são igualmente di-
fíceis, superam a capacidade humana, e despertam a admiração
expressa no v. 12.
"Levanta-te..." A capacidade de obedecer a essa ordem
final, o paralítico a recebe de Deus, por meio de seu Filho huma-
nado. E r a a mais completa afirmação da divindade de Jesus,
arrancando a admiração e o aplauso de crentes e descrentes. 0
F i l h o do homem — expressão que se cristalizou no período inter-
testamentário e se originou no uso por Daniel 7.13,14. A l i o pro-
feta profetiza o domínio, a glória, o poder do Cristo que haveria
de vir, o que se cumpre cabalmente no texto estudado. "Jamais
v i m o s . . . " — eídomen pressupõe um objeto ou fenômeno visível,
a presença do reino desse Messias e a manifestação de sua pre-
sença na vida dos crentes e da igreja.

Proposta Homilética
Deus (Messias) Presente em meio a seu Povo
1. anunciando a palavra (lei e evangelho)
2. perdoando os pecados
3. suprindo necessidades físicas (cura do paralítico)
4. maravilhando os crentes e trazendo vida e esperança.

Elmer Flor

100 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


VIGÉSIMO PRIMEIRO DOMINGO APÓS
PENTECOSTE
Mateus 15.21-28
13 de Outubro de 1991
O contexto

É surpreendente que este texto esteja sucedendo um trecho


no qual Jesus ensina que aquilo que contamina o homem não
são as coisas externas e sim o seu interior.
Os fariseus haviam se escandalizado com os ensinamentos
de Jesus (v. 12). Talvez para evitar novos confrontos com, escri-
bas e fariseus (v. 1) é que Jesus se retirou para a região de Tiro
e Sidom.

O texto
Seguem algumas observações sobre o texto.
V. 22 — A mulher cananéia, não sendo judia, ao encon-
trar-se com. Jesus, somente poderia ter para com ele uma atitude
de desprezo ou, quando muito, de indiferença. No entanto a
mulher o chama de "Senhor, F i l h o de Davi", designação que o
identificava como o Messias prometido no Antigo Testamento.
Esta designação Jesus havia recebido de pouca gente de seu povo.
Somente a fé poderia entusiasmar-se com este galileu. Não ape-
la para curandeiros, benzedeiras e outros representantes de for-
ças do ocultismo.
V. 23 — T a l como conhecemos a Jesus, os gritos persis-
tentes e patéticos desta mãe pedindo por sua filha entregue ao
poder de Satanás, iriam logo colocá-lo em prontidão para ajudar.
Jesus, porém, se conserva indiferente. Os próprios discípulos se
mostram surpresos. Diante de tal situação constrangedora eles
intervém a favor da mulher, talvez mais para se livrar da situa-
ção embaraçosa e irritante naquela terra estrangeira.
É incômodo ouvir as súplicas de uma pessoa aflita. Melhor
é despachá-la o quanto antes. É fácil despedir um mendigo dan-
do-lhe um troquinho ou alguma coisa que não precisamos mais,
sem mexer na raiz do seu problema.
V. 24 — Jesus permanece fiel ao seu povo, mesmo se este
povo é infiel e o rejeita (Mt 11.21).
A atitude de Jesus também parece contradizer a sua ordem
dada no mesmo Evangelho segundo a qual os discípulos deveriam

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 101


levar o evangelho a todas as nações. Seguem algumas sugestões
para explicar o procedimento de Jesus:
1. É possível que Jesus quisesse testar a fé desta mulher.
Como cananéia (ou grega, de origem siro-fenícia, conforme Mar-
cos 7.26) poderia ela ter preconceitos contra os judeus.
2. Jesus quis mostrar que ele ama os descendentes de
Abraão a despeito de ter sido rejeitado por eles. Apesar de toda
a infidelidade de Israel, Jesus permanece fiel. Ninguém pode
acusar Jesus de ter desprezado o seu povo como justificativa
para que Israel o desprezasse. Jesus não beneficiou os gentios
em detrimento de Israel.
3. O episódio pode ter sido utilizado por Jesus para testar
a paciência dos discípulos e posteriormente para instruí-los a
respeito da persistência na oração.
4. A demonstração de tamanha fé, protagonizada por uma
mulher estrangeira, pode ter sido provocada por Jesus a fim, de
servir como emulação (estímulo) a judeus que, posteriormente,
iriam ler este relato através dos Evangelhos de Mateus e Marcos.
V v . 25-27 — "Socorre-me". O amor pela filha fez que ela
assumisse a dor de seu sofrimento. Os pais sabem que o sofri-
mento dos filhos é, geralmente, dor mais aguda para os pais do
que para os próprios filhos.
Mesmo o aparente desprezo não impediu a mãe de pedir
socorro de Jesus. A mulher não contraria a Jesus, até lhe dá
razão: "Jesus, é verdade, se você se dedicasse aos gentios você
trataria os filhos como cachorrinhos e os cachorrinhos como fi-
lhos". De outra parte ela está convicta que com Jesus está a
abundância. As sobras de sua misericórdia seriam o suficiente
para sua filha.
Na verdade, nem se pode falar em repartir o amor de
Jesus. O seu amor é tão imenso que há abundância tanto para
judeus como para gentios. O que Jesus chama de migalha, para
nós significa mais do que um banquete pois, conforme Paulo
"ele é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quan-
to pedimos ou pensamos" ( E f 3.20).
Jesus ultrapassa os limites de sua missão em resposta aos
apelos da fé, ainda que seja de uma pessoa gentia. A sua ajuda
é acessível a todo aquele que crê, quer seja judeu quer seja
gentio (Rm 1.10).
A fé continua lutando mesmo quando todas as chances
parecem ter-se dissipado. E l a descobre possibilidades que não
se percebem sem ela. Recorre ao potencial que fica despercebi-
do àquele que não crê. E l a percebe que a mesa posta por Deus

102 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


para Israel é tão farta que pode suprir todas as nações. Nossas
dificuldades nunca são um caso perdido ou sem solução!
A mulher cananéia está disposta a aceitar a graça de Deus
da maneira mais humilde, como mendiga, mesmo debaixo da
mesa. Seríamos nós capazes de humilhar-nos tanto?
Talvez Jesus nunca mais retornaria àquela região. Era,
pois, a sua única oportunidade para conseguir ajuda para sua
filha (2 Co 6.2).
V. 28 — A fé é capaz de provocar aplausos do próprio
Jesus.
Disposição
O texto presta-se para falar sobre temas como "fé", "amor
de Jesus", "Epifania", "oração". Nossa proposta recai sobre o
último.
UMA MULHER GENTIA ORA DE UMA FORMA EXEMPLAR
1. Na sua angústia ela se dirige a Jesus (v. 22)
2. Nada a faz desistir de apelar para Jesus
a. Nem a aparente indiferença de Jesus (v. 23)
b. Nem a aparente rejeição de Jesus (vv. 24-27)
3. E l a recebe a recompensa de seu gesto (v. 28)
a. Jesus elogia sua atitude
b. Jesus atende seu pedido.
Christiano J. Steyer

VIGÉSIMO SEGUNDO DOMINGO APÓS


PENTECOSTE
Mateus 5.38-48
20 de Outubro de 1991
A leitura do Antigo Testamento apresenta o momento da
renovação da aliança do povo de Deus, ou seja, um grande culto
de reconsagração onde são (re)vivenciados os atos salvíficos de
Deus na história e vida do Seu povo, ocasião em que Israel faz
um voto de servir a Yahweh com integridade e fidelidade — voto
este perenizado através da ereção de um monumento. A epísto-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 103


la ressalta, por um, lado, a agressividade do inundo contra o Ser-
vo c Seus servos mas, por outro, a entrega nas mãos de Deus
das ameaças que sobrevêm à Igreja para que esta continue a
proclamar a Palavra com intrepedez. Viver e anunciar a Palavra
independentemente das circunstâncias é a ênfase destas leituras
ritmadas pelo som, do primeiro dos oito sinos do carrilhão que
enaltecem esta Palavra no Salmo 119.
O contexto do santo Evangelho é o do Sermão do Monte
e o auditório são os discípulos. O "ouvistes" de Jesus transpor-
ta-nos para o Antigo Testamento numa referência conhecida mas
por vezes mal interpretada. A "lex talionis" (Ex 21.24; Lv 24.20;
Dt 19.21) é freqüentemente olhada através do óculos de, Marcião
e, por isso mesmo, tomada como representando a baixa mora-
lidade e espírito de vingança reinante no Antigo Testamento num
suposto contraste com a lei do amor no Novo Testamento. E n -
tretanto, o contexto desta passagem em Êxodo mostra claramen-
te que esta lei está se referindo a uma restrição e não a uma
eventual retribuição ou vingança. Trata-se aqui de Israel atuan-
do no "reino da esquerda" e não especificamente como igreja.
No "reino da esquerda" a justiça deve ser exercida de tal forma
que ela não exceda o crime mas, por outro, que ela também não
deixe de corresponder à sua gravidade.
Jesus está se dirigindo a Seus discípulos, ou seja, à Igreja,
no domínio do "reino da direita". Não se pode esquecer, entre-
tanto, que o contexto cultural-religioso é o dos fariseus e escribas
que confundem, Igreja/estado e além disso fazem uma "re-leitu-
r a " do Antigo Testamento sob o prisma de seus costumes e tra-
dições rabínicas e pré-talmúdicas. Fariseus e escribas apelavam
para esta lei com o objetivo de justificar a retribuição e vingan-
ça pessoais que o Antigo Testamento repetidamente proíbe (cf.
Lv 19.18; Pv 20.22; 24.19).
Ao afirmar " E u , porém, vos digo" Jesus não está tentando
contrastar a lei do Antigo Testamento com uma nova realidade
ou ordem política. Antes, Ele está estabelecendo as fronteiras
da ética onde e como os crentes irão atuar — algo similar ao
que se acha expresso no Decálogo. O " E u , porém, vos digo"
coloca Jesus como o cumprimento, o padrão para os discípulos
e Sua Igreja. Os dois exemplos da perícope (juntamente com os
outros três citados anteriormente — vv. 22, 28 e 34) ilustram a
natureza da justiça que "excede" (v. 20) a "justiça" dos escribas
c fariseus,
O verbo anthisiemi (v. 39) significa resistir, opor-se a al-
guém ou alguma coisa. A Escritura ensina que não devemos nos
opor a Deus e à sua vontade (ex.: Rm 9.19; 2 Tm 3.8; Lc 21.15;
Rm 13.2). Somos, porém,, constantemente instados a resistir ao
diabo (Ef 6.13; 1 Pe 5.9; Tg 4.7). Como entender, então, que

104 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


somos solicitados a não resistir ao "perverso"? É importante
notar que tô ponerô é masculino e não neutro e que, portanto,
diz respeito não ao diabo em si, mas à pessoa má. Isto não signi-
fica que não se reconheça a pessoa como sendo má, porém o que
Cristo quer é que não haja vingança. Ao ler-se as palavras de
Cristo à luz do que imediatamente segue nos vv. 43-48 e quando
a paralela em Lucas 6.29-30 é explicada com. base no que ime-
diatamente precede nos vv. 27-28 torna-se notório que a passagem
chave, idêntica em ambos os relatos dos evangelistas, é "amai os
vossos inimigos" (Mt 5.44; Lc 6.27). Em outras palavras, Jesus
está condenando o espirito de desamor, ódio e vingança.
F i c a evidente, portanto, que a expressão "volta-lhe tam-
bém a outra [face]" significa demonstrar por atitude, palavra e
ação que se está repleto não do espírito de rancor mas do Espí-
rito do amor (cf. Rm 12.19-21). Este é o padrão que Cristo
quer; é o padrão que Ele mesmo cumpriu. É o Messias, o Servo
que está a querer o que Ele mesmo fez uma vez por todas para
todos os homens centrando Sua vida em Deus e, sem relutar,
submeter Seu amor ao desamor dos homens (cf. Is 50.5-6 e 1 Pe
2.21-23).
Não é o Antigo Testamento que acrescenta ao "amarás o
teu próximo" as palavras "e odiarás o teu inimigo". O escriba
fazia este acréscimo. A mentalidade rabínica faz a pergunta:
"Quem é o meu próximo?" (Lc 10.29) e nela está implícita a
limitação da resposta que, em última análise, deixa margem ao
ódio que para ele pode se externar no campo racial e nacional
e bem assim contra os samaritanos, inimigos religiosos, gentios,
"cães", inimigos pessoais. Ao dizer "amai os vossos inimigos"
(v. 44) Jesus remove todo e qualquer limite ao amor. O amor
não é inspirado por seu objeto como também não depende da-
quele que o recebe. O verbo agapáo implica muito mais do que
simples afeição: ele tem. origem em Deus (vv. 45, 48) e encon-
tra-se apenas no discípulo de Cristo. Este amor tem sua fonte
no amor adotivo do Pai (vv. 44, 45) que se mostra absolutamen-
te imparcial ao ponto de beneficiar também o mau e o injusto.
O amor sem limites revela sua peculiaridade não apenas
na dimensão humana como também na dimensão celeste, diante
de Deus, através da intercessão em favor, hyper, do inimigo. A
Escritura apresenta exemplos marcantes de pessoas em ação i n -
tercessória por seus adversários: Abraão (Gn 18.22-33), Estêvão
(At 7.60) e o próprio Jesus (cf. Is 53.12; Lc 23.24; Mt 11.29;
1 Pe 2.23). Tais exemplos contrastam com a animosidade dos
próprios discípulos contra os samaritanos (Lc 9.54). Por outro,
a afirmação comum entre pais: " E u vou ensinar meu filho a
como se comportar" via de regra significa uma inculcação não
cristã de vingança e revide (simul peccator).

IGREJA LUTERANA NÚMERO 1/1991 105


O padrão e o poder para amar o inimigo está no próprio
Jesus. E l e humanou-se para fazer a vontade do Pai plenamente,
completamente com a escatológica "uma vez para sempre" pelo
Seu supremo ato de amor, amando a humanidade. A este amor
o discípulo está sendo convocado e para este amor Cristo o ca-
pacita. A recompensa já está ganha e garantida, vicariamente,
por meio do Christus Victor.
Sugestão de tema:
Um Amor Sem Limites.

Acir Raymann

VIGÉSIMO T E R C E I R O DOMINGO APÓS


PENTECOSTE
Marcos 12.41-44
27 de Outubro de 1991
As Perícopes e o Tema do Domingo

O tema do domingo, contido nas leituras das perícopes do


domingo, são "os sacrifícios agradáveis a Deus" (Salmo do dia,
51.17), a saber, espírito quebrantado, coração contrito, lábios que
louvam, coração puro, espírito voluntário, ofertas cordiais. A
receita divina através do profeta Miquéias (Leitura do A T ) é
praticar a justiça, amar a misericórdia e andar humildemente
com Deus (Mq 6.8). Tudo o mais, formalismo exterior, cerimô-
nias que eram sombra do corpo, que é Cristo, não têm mais valor.
Ou nunca tinham valor em si mesmos, mas apenas na perspecti-
va da gratidão pela obra salvadora de Cristo. Na epístola, a
preocupação da igreja do NT em relação a seus necessitados se
resolve pela separação dos apóstolos para a pregação da palavra
e a oração, e pela escolha dos sete diáconos para "servir às me-
sas" e fazer a obra social. Assim a palavra de Deus crescia e o
número de discípulos se multiplicava.

O Texto

Muitas passagens paralelas ensinam as virtudes da oferta


do cristão (Ml 3.10; Lc 6.38; 1 Tm 6.17,18; Gl 6.9,10). Mas o

106 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


texto em estudo ensina sobre a oferta através de um magnífico
exemplo. Se o dízimo era, no culto de Israel, o padrão (Ex
35.22), há exemplos em que o povo de Deus ofertou até mesmo
mais que o exigido ou esperado (Ex 36.5; 1 Cr 29.3,4). De igual
forma, o Salvador Jesus assiste a um exemplo vivo e o evange-
lista relata a oferta da viúva de "tudo quanto possuía", dado
em sua pobreza (hustéreesis), sacrificando o sustento, a própria
vida (bíos).
0 contexto anterior apresenta um discurso eloqüente de
Jesus, dirigido especialmente contra a justiça própria e o forma-
lismo de fariseus, saduceus e escribas. Como ensinava no templo,
pôs-se a observar, e até mesmo a vigiar nos seus detalhes as
ofertas dos que ali prestavam culto e sacrifício. O gazofilácio
era uma das treze caixas de metal, no formato de trombetas,
colocadas em volta das paredes do átrio das mulheres no templo
herodiano, para recolher as ofertas para sustentar os serviços
do templo.
Jesus se importa com as ofertas de seu povo e controla,
além e acima da oferta em si, a motivação do doador. Não se
impressionou com as quantias, por mais altas que fossem. Lv
27.30 determinava que se trouxesse o dízimo à casa do Senhor
como oferta a Deus. Em Is 1.11ss.; Is 43.24; e Ml 3.8 Deus afir-
ma que observa o coração e a intenção do doador. Muitos não
gostam da idéia de que sua oferta esteja sob a observação de
alguém, muito menos de seu Senhor, que é ao mesmo tempo o
Senhor de seus bens. Isto exporia a pequenez de sua fé, da qual
a oferta deriva. Não se sentem à vontade ao se detectar a mo-
tivação que os leva a ofertar. Os ricos, que ofertavam muito,
faziam-no talvez por um senso de obrigação; quem sabe, para
serem vistos e admirados. Suas ofertas, em todo caso, não sen-
sibilizaram o Salvador e não mereceram maiores comentários.
A mulher que Jesus destaca é pobre, necessitada, prestes a
morrer de fome (são significados possíveis de ptoochós). E r a
viúva, com todas as conotações de abandono e solidão. As duas
moedas romanas eram as de menor valor existentes. Apesar de
todos esses dados que despertam a compaixão humana, e a tor-
nam antes alvo de doações do que doadora, o fato elogiado por
Jesus se prende a que ela ofertou voluntariamente, agradecida,
efusivamente, como fruto da fé. (1 Co 13.3) O que esta mulher
ensina pelo exemplo, a Bíblia ensina por conceitos (2 Co 9.7;
Rm 12.8). Apenas quando se oferta alegre e livremente, pode-se
experimentar a alegria de dar.
Vs. 13-44: Jesus convoca os discípulos para a aula sobre a
oferta. A importância do assunto e a gravidade do momento
estão expressos no améen légoo, em verdade digo. Os discípulos
aprendem como dar e se lhes ensinam os critérios pelos quais é

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 107


Deus que julga uma oferta. A mulher por certo não morreu e
nem passou fome. Deus cuidou dela. Os que se preocupam
doentiamente com seus bens, que têm incertezas quanto a seu
futuro material, são esses os que menos ofertam. É uma relação
da causa e conseqüência.
Como são avaliadas as tuas ofertas diante de Deus? O ato
da viúva pobre não pode ser copiado mecanicamente. Copia sua
fé. Entrega-te primeiro ao Senhor, como o fizeram os macedô-
nios. (2 Co 8.5) O amor de Cristo te fará abundar em tuas ofertas.
Tema
Uma lição sobre a oferta do cristão
1 . Eu aprendo o que é uma oferta sem valor
(formalismo, cerimônias, desejo de aparecer, preo-
cupações com os bens materiais. . .)
2. Eu aprendo a oferecer sacrifícios agradáveis a Deus
(fé verdadeira, coração puro, espírito voluntário).
Elmer Flor

VIGÉSIMO Q U A R T O DOMINGO APÓS P E N T E C O S T E


Marcos 4.35-41
3 de Novembro de 1991
Contexto
O cap. 4 de Marcos é essencialmente didático, concentran-
do 4 parábolas, sua explicação e aplicação, numa seqüência mar-
cante dos ensinos do Mestre. A referência dos vs. 33 e 34 expli-
cita ainda mais esse recurso didático, o das parábolas, contadas
"conforme o permitia a capacidade dos ouvintes." Seus discípu-
los recebiam posteriormente uma instrução particular, um apro-
fundamento especial, uma pós-graduação. No texto em estudo, a
aula, de teórica, transforma-se em prática, e orienta o crente nos
perigos da vida.

Da Bonança à Tempestade
Vs. 35-37: A aula teórica, por parábolas, estendera-se até
"tarde". Jesus transfere a situação de ensino para o barco que

108 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


estava a sua espera, e que seguiu pelo mar da Galiléia na com-
panhia de outros barcos compondo uma esquadra de seguidores.
E r a uma escola ambulante. Seus discípulos passam a ser subme-
tidos a uma prova de confiança plena no Mestre. A atividade
exaustiva do dia teve como conseqüência o cansaço terreno do
Instrutor. Estando a leste do mar, nos arredores de Gafarnaum,
devem ter rumado à costa oeste, terra dos gerasenos. De um
início tranqüilo, a viagem se torna dramática.

Da Tempestade à Bonança
Vs. 38-39: Jesus ocupa um lugar à popa do barco, a parte
traseira, reservada ao timoneiro. Aí não se sente tanto a vio-
lência com que o barco corta as ondas, nem o balanço a que é
submetido, como na proa. Enquanto Jesus descansa sobre um
travesseiro, o mar se põe travesso. O grande temporal é chama-
do de láilaps, e Mateus o chama de seismós, palavra grega que
aparece no termo português "movimento sísmico" ou terremoto,
no caso, uma espécie de maremoto. "Mestre!" é o grito de so-
corro dos discípulos apavorados. E r a a hora de aprenderem com
o divino Instrutor uma lição de vida frente aos perigos que os
ameaçam. 0 poder do Messias e do Reino de Deus que inaugura
entre os homens no Novo Testamento faz-se presente tanto nos
seus ensinamentos, como também nos atos milagrosos que con-
firmam a palavra nos que persistem na dúvida.
Na anarquia que se estabelece entre as forças da natureza,
e que se coloca como meio de disciplina, julgamento e chamado
à ordem no caos, Jesus confronta sua tranqüilidade ao temor
dos demais; o poder do Criador enfrentando a criatura insubmis-
sa; a tempestade na natureza e nos corações à bonança que traz
ao mundo com sua presença abençoadora.

Da Bonança à Confiança
Vs. 40-41: Jesus não se limita a repreender o mar e o ven-
to, acalmando sua fúria, baixando a crista das ondas. Repreende
Os discípulos, que se abalaram com o perigo, acalma seus cora-
ções agitados, baixa a crista de sua confiança em suas próprias
habilidades de navegadores, Eles aprendem uma lição de vida,
submetendo a fraqueza humana à presença do Senhor da natu-
reza. Jesus aprofunda, com' essa repreensão, sua comunhão com
os companheiros de jornada e aproxima-se deles no convívio mú-
tuo, num gesto em, que põe seu poder a serviço compassivo em
favor dos mesmos e confirmando, assim, a sua fé. O temor de
todos os circunstantes também se acalma diante da prova de
proteção e libertação que Cristo oferece a seus seguidores, não
importa quão violenta possam ser a perseguição e os transtornos

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 109


que enfrentam, tanto corporal como espiritualmente. As pergun-
tas finais, tanto as de Jesus como a do povo, são retóricas, e sua
resposta é óbvia. Jesus confirma a fé de seus seguidores e sua
confiança nele que é o Senhor de tudo, também de suas vidas.

Proposta Homilética
A Vitória do Mestre sobre a timidez e a dúvida: uma aula
sobre a fé que salva. O processo de ensino-aprendizagem
leva da teoria (parábolas) à prática (livramento dos pe-
rigos) :

1. Testa a fé dos que, por sua fraqueza, incorrem em


perigos.
2. Permite que a prova seja difícil, a ponto de repro-
vação.
3. Aparece no momento certo e oferece ajuda (perdão)
e aprovação final (livramento).
4. Ensina onde e com quem não há perigo em qualquer
circunstância da vida.

Elmer Flor

FESTA DA REFORMA
Mateus 11.12-15
31 de Outubro de 1991
LEITURAS
O salmo 46 é um salmo de louvor cantado pelo povo de
Deus, pela proteção e derrota dos inimigos. F o i de onde Lutero
tirou a inspiração para compor o hino "Castelo Forte é nosso
Deus". O texto ensina: Cada cristão deve lembrar-se do socorro
por ele recebido da parte de Deus em tantas angústias de sua
vida, e esta recordação deve levá-lo ao constante louvor e à sem-
pre maior confiança no Deus forte em todas as lidas da sua vida.
O salmo convida o cristão a se refugiar no Senhor Jesus e con-
fiante nas promessas de salvação, perseverar através das lutas
da vida.,

110 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


O texto de Apocalipse apresenta um anjo voando pelo meio
do céu levando um evangelho eterno destinado aos incrédulos
da terra exortando-os a se arrependerem! porque o fim está pró-
ximo. Ainda há tempo para se arrependerem e acharem mise-
ricórdia diante de Deus. O contexto desta leitura mostra que os
habitantes da terra ficaram maravilhados com os poderes ma-
nifestados pela besta e seu falso profeta (Ap 13.12-14). O anjo
os lembra de que se haverão com alguém que é mais poderoso
que a besta — aquele que é a origem de todas as coisas no céu
e na terra.
Nesta época da Reforma é sempre oportuna a reflexão
sobre o fascínio que as maravilhas do mundo podem exercer até
sobre os cristãos levando-os a perderem de vista o iminente juízo
de Deus sobre estas coisas passageiras. É oportuno o convite à
reconsagração ao Senhor enquanto houver misericórdia e perdão.
A leitura de 2 Crônicas sugere a necessidade que o cristão
tem de purificar constantemente a sua vida, consagrando todo o
templo do Espírito ao Senhor. Em nossa vida não há lugar para
nenhum "deus" por menor que seja. Deus Espírito Santo exige
que todo o seu templo seja a ele consagrado. O texto sugere que
esta consagração diária seja feita por meio de ofertas de sacri-
fício e ações de graça.
O Evangelho de Mateus destaca o fato de que não é sem
luta e persistente esforço que o discípulo conquista o reino do
seu Senhor. Jesus faz alusão ao fato de que certas pessoas (pu-
blicanos, prostitutas, judeus, etc), as quais tendo entrado em
contato com João Batista (Mt 3.1-10) e com Jesus (Mt 4.23-25)
os aceitaram, como mensageiros do Reino e se tornaram discí-
pulos, esforçando-se para corrigir sua vida e proclamar a che-
gada deste Reino. O destaque é dado ao empenho observado
nos discípulos que aparentemente poderiam ser considerados os
mais indignos para a tarefa do testemunho por causa da vida
que levavam antes do contato com o Evangelho, num,a verda-
deira demonstração de arrependimento e conversão, sem fingi-
mento. Esta consagração é exigida também dos discípulos da
Igreja cristã de hoje. É justamente contra a religiosidade apa-
rente, contra a frieza espiritual que este texto de Mateus vem
alertar.

DISPOSIÇÃO:

Em se tratando de festa da Reforma todas as passagens


sugerem uma reflexão em torno da reconsagração ao Senhor,
mediante a firme resolução de persistir na fé criada pelo Evan-
gelho restaurado pela Reforma do Séc. X V I . Por causa desta fé,

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 111


o cristão permanecerá de posse do reino, mesmo através de mui-
tas lutas contra a incredulidade, materialismo, etc.
O texto de 2 Crônicas reforça esta ênfase da reconsagração
que deve ocorrer pelo abandono dos pecados e maus desejos da
Carne para poder haver um processo de purificação do templo
do E. Santo.
0 Salmo 46 traz um consolo muito grande ao discípulo
que se esforça para conquistar o reino. Lutero experimentou
este consolo e pode compor, inspirado neste salmo, o seu mais
famoso hino "Castelo forte é o nosso Deus". O salmo ensina
que mesmo que se abale aquilo que é considerado inabalável e
se agite o que parece geralmente sereno, Deus continua rocha
firme, é imutável na sua atitude de salvador. Continua o refú-
gio certo de todos os que a ele recorrem.
SUGESTÃO DE TEMA: Consagrai-vos ao Senhor Deus Forte.

I — Porque os que se esforçam, se apoderam do Reino.


II — Porque no Senhor há. o refúgio e o consolo necessários
para a luta diária.
Nereu Rui Weber

A N T E P E N Ú L T I M O DOMINGO D O A N O D A I G R E J A
Mateus 24.15-28
10 de Novembro de 1991
O contexto

A perícope está inserida num conjunto que trata da se-


gunda vinda de Jesus (parusia) e da consumação dos séculos.
A destruição do templo de Jerusalém é um prelúdio do desfecho
no juízo final. O conjunto inicia com o lamento de Jesus sobre
Jerusalém que não quis receber a salvação (23.37-39) e continua
com a profecia da destruição do templo (24.1-2). A seguir os
discípulos perguntam quando "estas cousas" irão suceder e que
sinais haverá anunciando a sua vinda c a consumação do sé-
culo (24.3). Os comentários nem sempre são unânimes em dis-
tinguir quais as palavras de Jesus se referem à destruição de
Jerusalém e quais dizem respeito à sua vinda e à consumação
do século.

112 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


Nos versículos 4 a 14 Jesus anuncia os sinais que prece-
derão a sua vinda e previne os discípulos de não se deixarem
enganar por falsos cristos.
O texto

Limitamo-nos em tocar nos aspectos mais relevantes da


perícope.
A tribulação que se iria abater sobre Jerusalém, e suas
conseqüências sobre os fiéis, eram apenas um prelúdio ou uma
fase de sua volta.
A perícope gira ao redor de três assuntos: os fiéis são
alertados para fugirem da Judéia (vv. 15-19), são incentivados
a orar (vv. 20-22) e são previnidos de não confiar em qualquer
espírito que se anuncia como o guia para o encontro com Cristo
(vv. 23-28).
V. 15 — Jesus lembra palavras do profeta Daniel: "o
abominável da desolação" (Dn 9.27; 11.31; 12.11). As opiniões
divergem sobre o cumprimento das palavras de Daniel. Alguns
julgam tratar-se do santuário edificado por Antíoco Epifânio
(175-104 a.C.) dentro do templo para nele serem oferecidos sa-
crifícios a Júpiter (Zeus). Outros afirmam tratar-se dos sacri-
fícios que os romanos ofereceram aos seus ídolos nos lugares
sagrados dos judeus, conforme relata Josefo. A profecia de
Daniel, no entanto, não se esgota com estas abominações. Dentro
do princípio segundo o qual a destruição de Jerusalém e a con-
sumação dos séculos formam um conjunto, a profecia de Daniel
continua se cumprindo até a volta de Jesus. P o r isto, também
dentro deste mesmo critério incluem-se no "abominável da de-
solação" as atividades do homem da iniqüidade e da perdição
de quem Paulo fala em 2Ts 2.3.
As palavras de Jesus no v. 16 foram observadas literal-
mente pelos cristãos de Jerusalém quando os romanos reagiram
à revolta dos judeus (66-70 A D ) . Atravessaram, o Jordão e fo-
ram para um local elevado chamado Pela. Também, aqui o
sentido das palavras deste versículo não se esgotaram naquela
ocasião. O significado estende-se até o tempo da segunda vinda
do Senhor. Há uma fuga espiritual para os montes (Sl 121.1),
local bem mais seguro do que os altos além do Jordão. É i m -
portante não perder tempo para buscar abrigo junto a Jesus
antes que vem a destruição. É preciso desprender o coração das
coisas materiais (vv. 17, 18). Fugir como Ló e não olhar para
trás.
A fuga oferece dificuldades. Para alguns até muito gran-
des. Necessário se faz, por is,so, que a igreja ore, a fim, de que
a fuga possa ter êxito. No inverno, devido ao frio, a chuva e o

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 113


vento, a fuga seria dificultada ou mesmo tornada impossível.
Embaraçosa seria a situação para as mulheres grávidas e as que
estivessem amamentando (v. 19). Se a fuga precisasse ocorrer
em dia de sábado igualmente haveria perigo. Não porque fosse
proibido para os cristãos deslocarem-se neste dia, porém mais
pelo escândalo que estariam provocando nos moradores por onde
teriam que passar. Poderiam até ser barrados e mortos (Ex
31.14; Nm 15.32-35).
As orações pedindo que o Senhor removesse todos os im-
pedimentos para a fuga, deveriam ser motivadas pelas tribula-
ções mencionadas no v. 21 e 22. Josefo descreve os, horrores su-
cedidos durante a destruição de Jerusalém. O mundo nunca
havia passado por isto anteriormente. A respeito das tribulações
antes da consumação dos séculos, fala o livro de Apocalipse (cf.
Ap 13 e 16). Os dias seriam tão terríveis que, se o período não
fosse abreviado pelo Senhor, por causa dos escolhidos, ninguém
seria salvo.
Além das tribulações levantar-se-iam enganadores, falsos
profetas e falsos cristos, com doutrina falsa. Tudo tão bem es-
truturado que, novamente, se não fosse a interferência do Senhor,
os próprios eleitos seriam, demovidos de sua fé (v. 24). O após-
tolo Paulo fala que o "aparecimento do iníquo é, segundo a
eficácia de Satanás, com, todo poder, e sinais e prodígios da
mentira" (2Ts 2.9). A respeito das bestas, lê-se em Apocalipse
que a 1ª besta "peleja contra os santos, e os vence" e que a 2ª
besta seduz os habitantes da terra com seus sinais (Ap 13).
A igreja não deverá ser tomada de surpresa quando estas
coisas sucedem, pois Jesus o anuncia com antecedência (v. 25).
Não devem, os cristãos, deixar enganar-se como se Jesus pudesse
ser encontrado no deserto, no interior de uma casa ou em outro
local. Quando ele chegar não será preciso procurar por ele (v.
26). Ele virá repentinamente, como um relâmpago. Será visto
em toda a parte (v. 27). Apesar dos sinais que anunciam a sua
volta, ela será inesperada, de surpresa (2Pe 3.10). É, pois, tolice
querer determinar o dia e o horário de sua chegada (Mc 13.32).
Muito se tem discutido sobre o significado do v. 28. Quem
são os abutres e o cadáver? Se a perícope se referisse apenas, à
destruição de Jerusalém, poder-se-ia pensar, como efetivamente
muitos têm feito, nas águias, emblema das legiões romanas. Mas
este não é o caso. P E . Kretzmann diz que o significado deste
provérbio é: "onde está Cristo ali também estarão os eleitos".
Lutero, no seu sermão sobre Mt 24.27,28, com uma argumentação
interessante, interpreta o provérbio dizendo que onde estiver a
palavra de Deus ali também estará a igreja. É preciso lembrar,
porém, que na perícope Jesus está respondendo a uma pergunta
dos discípulos feita no v. 3. A pergunta foi: que sinal haverá

114 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


da tua vinda e da consumação do século? Assim, pois, como se
identifica onde está um corpo morto, pelo giro dos urubus por
cima do local, assim, pelos sinais apontados, poderá ser identi-
ficado quando será a consumação do século. A destruição so-
breveio ao templo e à Jerusalém como resultado de sua impeni-
tência, assim o juízo está pairando sobre o mundo todo, impe-
nitente e espiritualmente morto (Mt 24.10-12; 2Ts 2.1ss.; 1Tm
4.1ss; 2Tm 3.1ss.; 2Pe 3.3ss.; Ju 18). Hoje, agora, não é dife-
rente. Onde está o pecado ali está o julgamento. O mundo o
despreza, mas o único escape é Cristo.

Disposição
Jesus fala sobre os sinais que anunciam a sua volta e a
consumação dos séculos e sobre as providências que os cristãos
devem tomar.
I. A volta de Jesus será precedida de tempos muito di-
fíceis (vv. 15-19).
II. Os cristãos precisam estar atentos para não serem, en-
ganados.
1. Quanto a falsos cristos (vv. 23-25).
2. Quanto ao local e hora da volta do Senhor (vv.
26-27).
III. Os cristãos precisam orar a fim de que possam supor-
tar as tribulações e perseverar até ao fim (vv. 20-22).
Christiano J. Steyer

PENÚLTIMO DOMINGO DO ANO DA IGREJA


Mateus 25.31-46
17 de Novembro de 1991
Assunto: O discurso de Jesus sobre o grande julgamento (sobre
a sua volta, ou 2ª vinda).
1.º — Cenário
Jesus está falando sobre o fim do mundo e a sua volta para
"orquestrar" ou "dirigir" este final. Este recado de Jesus é

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 115


sempre importante para nós, de forma toda especial em tempos
de muito apego a esta vida e às coisas materiais, às coisas deste
mundo. Assim foi também com, os judeus. Por isso ele inicia
o seu sermão, já em, 24.1 e 2, fazendo referência ao Templo de
Jerusalém que, embora fosse "Templo de Deus", tinha, na ver-
dade, para a grande maioria, muito mais o significado de gran-
deza pessoal, de realização própria, de superioridade da raça, de
segurança pessoal. Orgulhavam-se de possuir um templo. A l i -
mentavam uma falsa segurança em relação ao seu destino eterno
e justificavam uma impunidade social e moral estribados; no fa-
to de terem, o Templo em, Jerusalém, o que, acreditavam muitos
dos judeus, era uma garantia incondicional de que Deus lhes era
favorável e os abençoaria e protegeria, sendo que nada de mal
lhes poderia acontecer. "Se temos o Templo, então nada nos
pode suceder". O Templo virou uma espécie de talismã da sorte.
Jesus quer derrubar esta falsa segurança e acordá-los para
a realidade. "Não se fiem nesta construção. Não ficará pedra
sobre pedra". Jesus está dizendo mais: "não se fiem nesta vida;
nas realizações que vocês conseguem obter nela; nas suas ca-
pacidades. Tudo isto vai terminar. Não se fiem neste mundo,
pois ele não vai durar para sempre, e vocês também não vão
viver nele para sempre. Prestem atenção neste fato c cuidem
para estar preparados".
Jesus contou quatro parábolas relacionadas com o fim do
mundo, alertando, nelas, para os sinais da proximidade deste
fim, bem como para a sabedoria e prudência que é recomendável
cultivar com relação à questão.

2.º - Assunto:
Nosso trecho contempla o que poderíamos chamar de
"clímax" do sermão de Jesus sobre o fim do mundo. O Salvador
está falando da fé, que é o critério de separação entre " v i d a " e
"morte"; entre "salvação" e "condenação". Em cada uma das
três parábolas anteriores a respeito do assunto ele enfatizou um
aspecto da questão. Na primeira delas (Mt 24.45-51) ele visou
os responsáveis pela igreja (ministros, líderes, dirigentes); na
segunda (Mt 25.1-13) dirigiu-se a todos, enfatizando a necessi-
dade de haver vida espiritual; na terceira (Mt 25.24-30) dirigi-
da também, a todos, ele tem em vista os dons espirituais e as
boas obras, ou seja, o uso (administração) que os, cristãos fazem
das coisas recebidas dele. Agora, com o discurso de Mt 25.31-46
ele apresenta a essência de tudo numa 4ª exemplificação, qual
seja, a do atendimento prestado (ou omitido) a quem precisava.
O nosso trecho mostra como a fé cristã é comprometimento
de vida. Tudo o que se pode dizer da vida cristã em ênfases

116 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


separadas, visando destacar com mais nitidez ora este ora aquele
aspecto, pode ser dito em conjunto e em resumo: ser cristão é
ser engajado! É assumir uma vivência cristocêntrica — e não
apenas discursar a respeito.
Há toda uma dimensão social envolvida nestas palavras
de Jesus. Não no sentido barato de "evangelho social" que anda
por aí e que se pode ler e ouvir tanto, na linha do "evangelho
dos pobres", do "evangelho da revolução", do "evangelho lati-
no-americano" ou de qualquer outra roupagem da "teologia da
libertação" (que não procura levar o homem a Cristo para ser
libertado dos pecados, preferindo, antes levar cada um a ser
libertador de si mesmo em relação a todas as ordens e estrutu-
ras que o cercam, as quais seriam todas opressoras e malignas),
mas no sentido verdadeiramente bíblico de envolvimento social,
em que o cristão, em Cristo, ao mesmo tempo em que é senhor
livre de todas as coisas e não está sujeito a ninguém, é um
servo (=. escravo, servidor, um que presta serviços; um que se
consome em obras de amor pelo próximo) de todas as coisas e
sujeito a todos.
A verdadeira dimensão social deste texto c que ele está
dizendo a cada um que se julga cristão que a fé não é algo a
guardar dentro do bolso; que a fé não é individualista nem, ex-
clusivista; que a fé implica em manifestações exteriores que não
são, absolutamente, particulares. Jesus está mostrando que a fé
tem frutos de amor. Quem confia em Cristo, quem ama Jesus,
torna-se portador deste amor para os outros, para o próximo,
para a sociedade. Esta ca dimensão social do texto: fé se tra-
duz em serviço social.
É importante notar como, no texto, este comprometimento
social está intimamente conectado com o ser ou não ser cristão;
com o estar à direita ou à esquerda do Rei no dia do julgamento.
É uma palavra muito séria. É uma palavra de julgamento para
os incrédulos e de consolo para os crentes. Sim, palavra de
conforto para os fiéis que, mesmo tendo limitações e fraquezas,
mesmo sendo imperfeitos, sabem que serão considerados justos
por causa do sacrifício de Cristo em seu lugar, o qual recebem
pela fé, a qual, por sua vez, é vibrante e frutífera, sendo, inclu-
sive, louvada pelo R e i e Senhor.

3.º — Estrutura do texto:


i . ) Descreve (não seria melhor 'refere-se', já que não há pala-
vras que possam, realmente, descrever aos nossos olhos mo-
mento tão grandioso como este) o julgamento final da
humanidade.

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 117


— O assunto não é novo. Está referido em outros textos.
Além dos relatos paralelos, também está em Mt 16.27;
19.28 e 24.29-31.
— 0 episódio tem caráter de realeza, de majestade. 0 vs. 31
fala em "assentar no trono da glória". A figura usada
na descrição é a de uma corte real reunida. Faz lembrar,
hoje, um "Tribunal do J u r i " , com toda a pompa e ritua-
lidade que o cerca. Lembra o momento de entrada do
juiz no recinto.
2.) 0 próprio Redentor e Salvador será o juiz, o que chama a
atenção. Para quem crê Cristo é Salvador; para quem, não
crê ele é pedra de tropeço. Quem não crê no Filho já está
julgado.
3.) Ninguém, escapa ao julgamento. (vs. 32: todas as nações se-
rão reunidas em sua presença). Não há como fugir.
4.) A separação entre bons e maus; entre salvos e perdidos;
entre fiéis e infiéis. Também não é assunto novo. A pará-
bola do Joio, em Mt 13.24ss, bem como a da Rede de Pesca,
em Mt 13.47-50 já tratam dele.
— Nenhum ser humano pode fazer a separação. Temos que
conviver com os fingidos. Mas o dia virá em que Jesus
irá fazer a separação, e esta será eterna.
5.) Direita c esquerda. Linguagem figurada para descrever céu
e inferno; salvação e perdição.
— Na verdade não é naquele momento que se decide. Ape-
nas é a declaração pública daquilo que já está definido
pela presença ou ausência da fé. Ter ou não ter fé, eis
a questão! (Jo 3.18).
6.) Cabritos e ovelhas. Linguagem figurada para referir os que
se salvam e os que se perdem. A ovelha, em comparação
com o cabrito, era considerada animal nobre.
7.) O prêmio: a posse do reino que está preparado desde a
fundação do mundo. É a bem-aventurança eterna. O paraí-
so. A felicidade e o gozo pelos séculos dos séculos.
8.) O critério: a fé. Quem tem fé vai para o céu; quem não tem
vai para o inferno.
— A demonstração dessa fé está nas obras, no atendimento
aos necessitados. A verdadeira fé é aquela que produz
resultados. Que cada qual se examine.

118 IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991


4° — Esboço:
Tema — A dimensão social da fé: uma questão de vida ou morte!
1 — Há muita hipocrisia e fingimento na igreja. (Espaço para
descrever o mal, os problemas, o pecado. A falta de preo-
cupação social é uma prova de fingimento, pois quem, ama
o próximo (como decorrência da fé) não pode deixá-lo
passar necessidades.
2 — V a i haver um, momento de julgamento, em, que as aparên-
cias desaparecerão. (Espaço para auto-exame. Como estou
eu?)
3 — O critério para a vida ou morte, no julgamento, é um só:
fé em Cristo.
4 — Q u a l é o critério para a verificação da fé? Jesus parece
muito claro ao dizer que é o amor ao próximo. (Esta é a
dimensão social, cf. vs. 35-36. Fé ativa no amor).
5 — Só pode amar o próximo quem experimenta o amor de Deus
em Cristo. Este amor nos é oferecido abundantemente (ci-
tar formas, frisando a coletividade do amor).
6 — Deus nos quer brindar com seu amor já neste inundo (nas
multiformes bênçãos) e na eternidade, dando-nos posse do
reino que está preparado desde a fundação do mundo.
Conclusão: Não esqueçamos do nosso próximo!
Irmo Arnaldo Huebner

Ú L T I M O DOMINGO D O A N O D A I G R E J A
24 de novembro de 1991
Mateus 25.1-13
a) Contexto: O capitulo 25 do evangelho de Mateus pode
ser dividido em três partes importantes: Na primeira Jesus se
refere à sua segunda vinda como acontecimento que tende a
levar o homem a velar, a vigiar e a ser sincero na sua religião,
na sua fé em Cristo. É o que vemos nesta parábola das dez
virgens. Na segunda alude ao mesmo fato a fim de exortar à
atividade e à fidelidade por meio da parábola dos talentos. Na

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 119


terceira parte Jesus termina, relatando como será o dia do Juízo
Final.
b) As outras leituras: O Salmo 130 expressa o clamor
das profundezas, preocupado com os pecados, que, porém,, — ele
sabe — têm perdão em, Deus. "Aguardo o Senhor, a minha alma
o aguarda; eu espero na sua palavra". Isaías 65.17-25 fala nos
novos céus e na nova terra que o Senhor cria, o que vem confir-
mado em Ap 21.1-7, onde é descrita a felicidade que haverá no
novo céu e na nova terra — a vida com, Deus. II Pe 3.3,4,8-10
lembra que há escarneccdores no mundo, os quais duvidam do
retorno de Cristo para o juízo. Deus, porém, é longânimo e não
quer a condenação de ninguém. " V i r á , entretanto, como ladrão,
o dia do Senhor".
0 f i m do Ano da Igreja leva-nos, automaticamente, a pen-
sar no fim do mundo. Por isso o tema é de exortação — V I G I A I !
c) O texto: Vers. 1: Segundo o costume da época, as
amigas da noiva iam ao encontro do noivo dela, para o recepcio-
narem e o acompanharem até ela. Iam munidas de lâmpadas.
É um quadro muito singelo, mas de uma elucidação extraordi-
nária para a vivência cristã e para a compreensão da necessida-
de de vigilância espiritual durante a nossa vida. Vers. 2-4: " C i n -
co dentre elas eram néscias, e cinco prudentes". Quando e como
pessoas são néscias ou prudentes para e perante Deus? Néscio
para Deus é todo aquele que não aceita as coisas do Espírito de
Deus; é o incrédulo; é aquele que não adquire a sabedoria de
Deus e que constrói sobre areia. Néscio para Deus é todo aquele
que vive imprudentemente e que não ajunta para si tesouro no
céu. Enfim, é todo aquele que rejeita a graça e o amor de Deus
revelados em Cristo Jesus. Prudente perante Deus é todo aquele
que se ocupa principal e primordialmente com o reino de Deus,
de como servir a Deus, de como fazer a vontade de seu Senhor
Jesus Cristo. Prudente é todo aquele que cuida onde e como
anda, sempre pensando em fazer a vontade de Deus. Enfim, é
todo aquele que aceita a Jesus como seu Salvador, nele crê e a
ele serve conscientemente.
Vers. 5-7: O noivo demorou a vir e as virgens adormece-
ram na sua espera. De repente o grito: "Eis o noivo! Saí ao
seu encontro!" Todas levantaram e todas prepararam suas lâm-
padas. Só que as cinco néscias se deram conta de que o azeite
estava se esgotando, Não conseguiriam) acompanhar o noivo.
Um vexame! Tudo perdido! Espera baldada!
Vers. 8-9: As prudentes não puderam fornecer o azeite ne-
cessário às néscias; elas mesmas precisavam dele. Ninguém po-
de dar a fé a outrem. Só Deus o pode. Naquela hora da noite
era difícil conseguir azeite. E r a tarde demais. O tempo de com-
prar já passara. Quando Cristo vier, no dia do juizo, não será

120 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


mais possivel ler a Bíblia, ir à igreja, participar dum estudo
bíblico para chegar à fé nele. 0 tempo é agora. Hoje é o dia
de salvação. Hb 3.12-15. Sejamos prudentes, prevenidos.
Vers. 10-12: Enquanto as néscias se afastaram do noivo, na
tentativa de conseguir azeite e luz, as prudentes, as preparadas
entraram com o noivo para as bodas. Pior de tudo: a porta foi
fechada! Quando, mais tarde, as néscias chegaram, a porta es-
tava fechada e de nada adiantou implorar: "Senhor, senhor,
abre-nos a poria!" O noivo não as conhecia e elas ficaram de
fora. F i c a m fora do céu todos os que não tiverem fé em Jesus
e que, portanto, não estão preparados para receber o Senhor
Jesus Cristo no dia derradeiro com a alegria da salvação.
Vers. 13: " V i g i a i ! " Esta é a exortação de Jesus nesta pa-
rábola. É certo que Ele vem; mas não se sabe o dia nem a hora.
Então, V I G I A I !
c) Disposição: Tema: VIGIAI!
I — Porque é certo que Cristo vem e
II — Porque fica fora do novo céu e da
nova terra quem não está preparado.
Curt Albrecht

IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991 121


LIVROS
D O G M Á T I C A CRISTÃ. Por Carl E. Braaten e Robert
W. Jenson, editores; e Gerhard O. Forde, Philip J. Hefner,
Hans Schwarz, Paul R. Sponheim. Traduzido por Gerrit
Delfstra, Luís H. Dreher, Geraldo Korndõrfer, Luís M.
Sander. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1990. Vols. I
e II
Na contracapa se anuncia que os autores, "em virtude de
sua identificação cora a tradição luterana. .. escrevem com urna
orientação ecumênica e sem atitude sectária, visando servir à
Igreja toda". Já avisa que essa "contextualidade consciente da
teologia não deve ser pervertida a ponto de se postular um iso-
lacionismo tão arbitrário, auto-suficiente e ilusório quanto a pre-
tensa universalidade de teologias formuladas em outros conti-
nentes". No prefácio de Walter Altmann "os autores se confes-
sam devedores dos grandes teólogos protestantes da metade deste
século, como Barth, Bultmann e T i l l i c h " por uma "exigência de
contextualidade". Acha que a Dogmática Cristã fazia falta no
cenário do "extraordinariamente importante projeto coletivo de
construção teológica latino-americana" e das "significativas con-
tribuições dogmáticas nas obras de teólogos individuais, como
Leonardo Boff e Juan Luis Segundo". Com isso já está caracte-
rizada suficientemente a obra.
No entanto Gari E. Braaten e Robert W. Jenson ainda
sublinham esta característica, dizendo em seu prefácio que "o
fato do pluralismo teológico é ineludível". Por essa razão, "em-
bora todos nós nos situemos dentro da tradição luterana, as dife-
renças entre nós (autores da dogmática), e as conseqüentes in-
coerências do livro, são consideráveis". Não sabem, se é bênção
ou maldição quando "em alguns pontos os autores simplesmente
discordam, ou ocasionalmente esse desacordo chega ao ponto da
contradição". Acham que a centralidade confessional do "artigo
da justificação somente pela fé" é um "erro reducionista" que
impediu "uma recepção plena da tradição dogmática católica"
e "produziu uma forma particularmente desumana de sectarismo
luterano". Eles confiam, que "os participantes deste projeto de
dogmática estão livres dele".
Nos seus prolegômenos à dogmática Braaten ainda assi-
nala que "a teologia confessional trabalhou para repristinar a
dogmática pré-iluminista da Igreja" (p. 60). Ele reconhece que
há ainda correntes teológicas "tentando restaurar velhas moda-

122 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


lidades de ortodoxia" (p. 62). Na sua análise da Escritura Sa-
grada, que não identifica com Palavra de Deus, mas com " u m
meio da graça" (p. 83), Braaten verifica que "o biblicismo fun-
damentalista não diminuiu de vigor, ainda que não desfrute de
muito prestigio nas grandes escolas teológicas" (p.. 91).
Numa enciclopédia de opiniões teológicas divergentes, co-
mo o livro pretende ser pelo acima exposto, em que "uma afir-
mação teológica é uma projeção da imaginação" (p. 41), é de
se admirar que Braaten sustente afirmações bíblicas e confessio-
nais como "a justificação através da fé somente". Para ele "este
artigo constitui a base existencial da vida da Igreja no mundo"
(p. 76), embora se precise perguntar se o entende como um eleito
calvinista ou um pecador salvo pela fé no evangelho de Jesus
Cristo. Em todo o caso Braaten opta pelas "grandes escolas
teológicas" e não por um confessionalismo bíblico.
A obra está dividida em 12 loci, abrangendo os assuntos
clássicos da teologia: Prolegômenos, 0 Deus Triuno, O conheci-
mento de Deus, A criação, O pecado e o mal, A pessoa de Jesus
Cristo, A obra de Cristo, 0 Espírito Santo, A Igreja, Os meios da
graça, V i d a Cristã, Escatologia.

Martim C. Warth

P E L O E V A N G E L H O DE CRISTO. Por Martinho Lute-


ro . Obras Selecionadas de Momentos Decisivos da Re-
forma . Seleção e publicação pela Comissão Interluterana
de Literatura ( C I L ) . Tradução de Walter O. Schlupp.
Porto Alegre/São Leopoldo: Concórdia/Sinodal, 1984.
Esta é a primeira tentativa de apresentar uma coletânea
de escritos de Lutero ao público no Brasil. 0 ocasião foi o 5º
centenário do nascimento de Lutero (nasceu em 10.11.1583). Já
havia escritos de Lutero publicados em português, como o Cate-
cismo Menor, Da Liberdade Cristã, Da Autoridade Secular, e Do
Cativeiro Babilônico da Igreja. Mas faltavam muitos outros es-
critos importantes. Desta forma surgiu esta tentativa de fazer
mais alguma coisa, até que pudessem ser publicadas as Obras
Selecionadas em grande estilo.
Pelo Evangelho de Cristo é um, volume que não pode faltar
na biblioteca do pastor, do estudante de teologia e da congre-
gação cristã luterana, bem como nos lares dos cristãos. A intro-
dução, escrita por Nestor Beck, dá um excelente apanhado his-

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 123


tórico da vida e da obra de Lutero. Lutero contribui com os
seguintes tratados: Prefácio ao Primeiro Volume da Edição Com-
pleta dos Escritos Latinos; Debate para o Esclarecimento do V a -
lor das Indulgências (95 Teses); Um Sermão sobre a Indulgên-
cia e a Graça; Debate e Defesa do F r e i Martinho Lutero contra
as Acusações do Doutor Eck; Carta de Lutero a Espalatino;
Sermão sobre as Duas Espécies de Justiça; à Nobreza Cristã de
Nação Alemã, acerca do Melhoramento do Estado Cristão; O
Discurso de Lutero na Assembléia de Worms; Sermão no Do-
mingo de Invocavit; Carta aos Cristãos de Estrasburgo contra o
Espírito Entusiástico; Prefácio ao Novo Testamento; Prefácio à
Epístola de São Paulo aos Romanos; Fundamento e Motivação
da Escritura para o Direito e a Autoridade de uma Assembléia
ou Comunidade Cristã Julgar sobre Toda Doutrina, Chamar,
Nomear, e Demitir Professores; Prefácio do Hinário de Witten-
berg; Um Novo Prefácio de Martinho Lutero; Os Hinos; Carta
de Lutero a Ludovico Senfl; Missa e Ordem do Culto Alemão;
Resposta a Diversas Perguntas Referentes aos Votos Monásticos,
para todos Aqueles que estão Deixando sua Condição de Padre,
Monge ou Freira, a Título de Apoio; O Manual do Batismo Re-
visado; Manual de Casamento para os Pastores em Geral; Exor-
tação ao Sacramento do Corpo e Sangue do Nosso Senhor; Con-
fissão (Adendo a Sobre a Santa Ceia de Cristo); Um Sermão
sobre Sofrimento e Cruz; Sermão no Domingo de Páscoa em
Coburgo; Como se Deve Orar, para o Mestre Pedro Barbeiro;
Carta a seu Filho Hans.
A maioria dos tratados são clássicos de Lutero e refletem
muito bem a sua teologia. Sua Confissão é um modelo de con-
fissão de fé, esperança e certeza de um teólogo cristão.
Martim C. Warth

OBRAS S E L E C I O N A D A S . Por Martinho Lutero. Sele-


ção pela Comissão Obras de Lutero: Joachim Fischer,
Martim C. Warth, Martin N. Dreher, Donaldo Schüler,
Nestor J . L . Beck, Luis M. Sander. Publicação da Co-
missão Interluterana de Literatura (CIL). São Leopol-
do/Porto Alegre: Sinodal/Concórdia, Vols. I e II, 1987/
1989.
Obras de Lutero dispensam de apresentação. É o grande
teólogo do século X V I que desafiou a Igreja a fazer a Reforma
tão necessária, com uma volta à Escritura Sagrada.

124 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


O vol. I: Os Primórdios, traz os Escritos de 1517 a 1519.
Em excelente tradução de Walter 0. Schlupp, Martinho L. Hasse,
Ilson Kayser, Luís M. Sander e Annemarie H ö h n temos os seguin-
tes tratados: Debate sobre a Teologia Escolástica, Debate para
o Esclarecimento do Valor das Indulgências (95 Teses), Um
Sermão sobre a Indulgência e a Graça, O Debate de Heidelberg,
Explicações do Debate sobre o Valor das Indulgências, Sermão
sobre o Poder da Excomunhão, Relato do Fr. Martinho Lutero,
Agostiniano, sobre o Encontro com o Sr. Legado Apostólico em
Augsburgo, Apelação do F r . Martinho Lutero ao Concilio, Uma
Breve Instrução sobre Como Devemos Confessar-nos, Sermão so-
bre as Duas Espécies de Justiça, Um Sermão sobre a Contempla-
ção do Santo Sofrimento de Cristo, Debate e Defesa do Fr. Mar-
tinho Lutero contra as Acusações do Dr. João Eck, Comentário
de Lutero sobre a 13ª Tese a respeito do Poder do Papa (Enri-
quecido pelo Autor), Comentários de Lutero sobre suas Teses
Debatidas em Leipzig, Um Sermão sobre a Preparação para a
Morte, e no final três Sermões sobre os Sacramentos; Um, Sermão
sobre o Sacramento da Penitência, Um Sermão sobre o Santo,
Venerabilíssimo Sacramento do Batismo, Um Sermão sobre o
Venerabüíssimo Sacramento do Santo e Verdadeiro Corpo de
Cristo e sobre as Irmandades.
O V o l . II: O Programa da Reforma, traz os Escritos de
1520 numa tradução de Martin N. Dreher, Ilson Kayser, Cláudio
Molz, Luís M. Sander e Walter O. Schlupp. Lutero trata dos
seguintes temas: Catorze Consolações; Modo de Confessar-se;
Condenção Doutrinai dos Livros de Martinho Lutero, Feita por
Alguns Mestres Nossos de Lovaina e Colônia; Das Boas Obras;
Breve Forma dos Dez Mandamentos, Breve Forma do Credo,
Breve Forma do Pai-Nosso; A respeito do Papado em, Roma
contra o Celebérrimo Romanista de Leipzig; Um Sermão sobre
a Excomunhão; Um Sermão a respeito do Novo Testamento,
Isto É, a respeito da Santa Missa; À Nobreza Cristã da Nação
Alemã, acerca da Melhoria do Estamento Cristão; Do Cativeiro
Babilônico da Igreja; Carta de Lutero a Leão X, Sumo Pontí-
fice; Tratado de Martinho Lutero sobre a Liberdade Cristã; Por
que os Livros do Papa e de Seus Discípulos Foram Queimados
pelo Doutor Martinho Lutero.
O programa de publicações das Obras Selecionadas prevê
um total de dez volumes. Os volumes 3 e 4 já estão traduzidos
e devem aparecer na imprensa em pouco tempo. Todo pastor
e estudante de teologia vai se beneficiar com estas leituras em
Lutero, mas a tradução está em linguagem acessível ao grande
público, às universidades, às paróquias e pessoas que queiram
conhecer Lutero.

IGREJA LUTERANA/NÚMERO 1/1991 125


Todos os tratados de Lutero vêm com uma introdução es-
crita por membros da Comissão Obras de Lutero e muitas notas
de pé-de-página que ajudam o leitor a conhecer melhor a his-
tória e as circunstâncias que motivaram os escritos de Lutero.
Desta forma os volumes se constituem em valiosa enciclopédia
e manual de informações sobre o período da Reforma luterana
e os, pais da igreja citados por Lutero.

Martim C. Warth

126 IGREJA L U T E R A N A / N Ú M E R O 1/1991


LA SALLE
Composição, impressão e acabamento na
Tipografia e Editora La Salle - Canoas, RS
19 9 1

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