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Evelina Dagnino
Professora da Unicamp
(Texto produzido a partir da palestra da autora)
1
radicalizá-la e ampliá-la no sentido de estendê-la para muito além do sistema
político, estendê-la às relações sociais no seu conjunto. O marco formal de todo o
processo de redefinição da democracia é a Constituição de 1988, que assegurou
vários elementos deste projeto.
Duas idéias que são centrais nesse projeto. A primeira é a idéia de cidadania.
Esse projeto significava o aprofundamento da democracia porque também
redefiniu, re-significou a idéia de cidadania e essa idéia é fundamental quando
falamos da reinvenção democrática. O outro princípio fundamental, trazido para a
Constituição de 1988, é a idéia da participação da sociedade civil. As redefinições
de democracia contidas já na Constituição de 1988, e concretizadas
posteriormente através de experiências como os Conselhos Gestores e os
Orçamentos Participativos, não partiram do Estado, mas da sociedade civil. Não
que tal projeto tenha sido constituído de maneira autônoma. Muito pelo contrário,
foi uma vitória da sociedade que conseguiu impor-se ao projeto dominante de
uma democracia elitista e restrita.
2
preside o ordenamento social brasileiro e de tantas outras sociedades na América
Latina, como o autoritarismo social. E é justamente contra o autoritarismo social
que essa redefinição de cidadania se põe, alvo político fundamental do processo
da redemocratização (assim como o autoritarismo político).
Há, portanto, uma clara distinção em relação a outras versões de cidadania. Esta
cidadania chamada, naquele momento, de “nova cidadania”, uma cidadania
ampliada, não está mais confinada dentro dos limites das relações com o Estado
ou entre o Estado e o indivíduo. A cidadania liberal se confina nesse espaço. Mas
essa redefinição pensa a cidadania como algo que deve ser estabelecido também
no interior da própria sociedade, uma cidadania que funcione como um parâmetro
do conjunto das relações sociais que se travam nessa sociedade. O processo de
construção de cidadania como afirmação e reconhecimento de direitos é,
especialmente na sociedade brasileira, um processo de transformação de práticas
muito arraigadas não apenas no Estado, mas na sociedade como um todo. O
significado dessa cidadania está muito longe de ser limitado à aquisição formal e
legal de um conjunto de direitos. E, nesse sentido, ela também não está limitada
ao sistema político-jurídico.
A nova cidadania seria então um projeto para uma nova sociabilidade, um formato
mais igualitário das relações sociais, inclusive novas regras para viver em
sociedade, para a negociação de conflitos. Um novo sentido de ordem pública e
de responsabilidade pública. Aquilo a que alguns autores se referem como sendo
um novo contrato social. Ora, um formato mais igualitário de relações sociais em
todos os níveis implica aquilo que a professora Vera da Silva Telles chama de “o
reconhecimento do outro como sujeito portador de interesses válidos e direitos
legítimos”. Isso implica, evidentemente, a constituição de uma dimensão pública
na sociedade em que os direitos possam se consolidar como parâmetros públicos
para a interlocução, para o debate, tornando possível a reconfiguração de uma
dimensão ética da vida social. Isso significa também que essa cidadania tem que
se abrir não só, evidentemente, ao direito à igualdade, que é constitutiva da
cidadania, mas, especialmente, tem que se abrir e considerar o direito à diferença.
3
E nesse sentido, me parece que tal redefinição de cidadania estabelece um
vínculo indissolúvel entre o direito à igualdade e o direito à diferença, na medida
em que não é mais possível na sociedade contemporânea pensar a realização da
igualdade sem considerar que essa realização passa integralmente por assegurar
também o direito à diferença. Não há como falar em igualdade se as diferenças
persistirem e são usadas como base para a desigualdade, a discriminação etc.
4
O que é que possibilitou que essa idéia de participação como partilha do poder
pudesse ser realista, no período entre os anos 1980 e início dos anos 1990?
Primeiro, com a democratização, a reorganização partidária e as eleições livres,
houve um trânsito, especialmente durante os anos 1990, de manifestações desse
projeto democrático participativo que se engendrou na sociedade civil para dentro
do aparato do Estado nos seus vários níveis. A princípio, nos níveis municipais e
estaduais. O que era, entre os anos 1970 e começo dos 1980, um projeto gestado
na sociedade, transitou, em alguns casos, para dentro do aparato do Estado.
A segunda condição, que é uma decorrência dessa e que ocorre nos anos 1990, é
a principal novidade dos anos 1990. Os movimentos sociais e a sociedade civil,
dado este trânsito, resolveram fazer uma aposta na possibilidade de uma atuação
conjunta entre o Estado e a sociedade civil, através, exatamente, do princípio da
participação. Ou seja, se consolidou, nos anos 1990, a idéia de que a sociedade
tem o direito de participar e que, portanto, pode e deve compartilhar o poder do
Estado. Para isso, a Constituição de 1988 assegurou alguns mecanismos.
5
assegurar o projeto dominante. Mas com certeza ele é mínimo quando se trata de
alocar recursos para as políticas sociais. Tal projeto de Estado mínimo configura-
se com o encolhimento das suas responsabilidades sociais e a sua transferência
para a sociedade civil, como maneira de implementar os ajustes estruturais
exigidos pelo FMI.
6
democrático no Brasil. Uma das tarefas fundamentais que temos que enfrentar
hoje para resgatar a invenção democrática, a reinvenção democrática que
iniciamos e que nos deu grandes avanços é enfrentar a aparente homogeneidade
do discurso, é reafirmar os significados que o projeto democratizante conferiu a
eles, apontando a distinção entre eles e o uso, a apropriação neoliberal que deles
se faz.
Por outro lado, é preciso reconhecer tais avanços. Não haveria como concordar
com a idéia de que avançamos pouco desde a década de 1980 ou de que a
democracia não tenha servido para nada. Evidentemente, onde não houve
avanços, onde houve regressão até, foi em relação à igualdade econômica. A
derrota que este projeto sofreu com relação à necessidade de diminuição da
desigualdade não pode obscurecer todos os outros ganhos que tivemos, inclusive
em outras dimensões de conquista da igualdade. Se considerarmos o percurso
que tivemos desde esta época no reconhecimento dos direitos de inúmeros
setores na sociedade, direitos à igualdade e à diferença (de negros, mulheres,
deficientes físicos etc), podemos ter um olhar um pouco mais relativizado sobre os
anos que hoje nos separam da formulação original do projeto democrático e
participativo.
7
É preciso, então, examinar as redefinições, seus significados e suas implicações.
Em primeiro lugar, a redefinição da idéia de sociedade civil, que é a mais
conhecida delas. Houve uma profunda transformação no conteúdo da idéia de
sociedade civil em relação aos anos 1980, já que a sociedade civil foi afirmada
nos anos 1980 como a arena e o alvo da política. A expressão foi trazida para o
vocabulário político porque tinha esse significado, afirmar a ampliação da política.
Hoje, o sinônimo mais freqüente para sociedade civil é a idéia de terceiro setor,
oriundo do projeto neoliberal.
8
A segunda redefinição é a da noção de participação. A participação, que era o
núcleo central do projeto participativo, percorre um pouco os mesmos caminhos
que percorreu a redefinição neoliberal da sociedade civil. A re-significação da
participação se constitui através da emergência da chamada “participação
solidária”, que vem acompanhada da ênfase no trabalho voluntário e na chamada
"responsabilidade social", tanto de indivíduos quanto de empresas. O princípio
básico nestas noções, extremamente difundidas hoje em dia, é a adoção de uma
perspectiva privatista e individualista, capaz de substituir e redefinir o que era o
significado coletivo da participação social. A própria idéia de solidariedade, que
virou a grande bandeira da participação redefinida, é, neste outro projeto, despida
do seu significado político coletivo e passa a apoiar-se no terreno privado da
moral. As redefinições promovem então a despolitização da participação. E se
pensarmos que, no modelo da participação do voluntariado, da responsabilidade
social, não há mais a necessidade de espaços públicos, onde o debate sobre os
próprios objetivos da participação pode ter lugar, vemos que o significado político
e o potencial democratizante destes espaços é, de novo, substituído por formas
estritamente individualizadas de tratar questões tais como a desigualdade social e
a pobreza.
Em segundo lugar, a cidadania está cada vez mais sendo apresentada através de
uma conexão, que é muito sedutora, entre cidadania e mercado. Tornar-se
9
cidadão, em muitos discursos hoje em dia, passa a significar a integração
individual ao mercado, como consumidor e como produtor. Este me parece um
princípio que subjaz a uma enorme quantidade de programas para ajudar as
pessoas a “adquirir cidadania”: aprender como iniciar uma micro empresa, se
tornar qualificado para os poucos empregos ainda disponíveis etc. Em um
contexto onde o Estado se isenta progressivamente do seu papel de garantidor de
direitos, o mercado é oferecido como uma instância substituta da cidadania. É
problemático denominar a isto cidadania, reduzindo e distorcendo seu significado
original.
10
não mais como cidadãos, mas como carentes que devem ser atendidos pela
caridade, seja ela pública ou privada.
A energia da sociedade civil não deve ser inteiramente voltada para a participação
nas instâncias de co-gestão com o Estado. Certamente há uma enorme
multiplicidade de formas daquilo que vários autores chamaram de socialização da
política, fazer com que a política seja uma atividade assumida por uma parte cada
vez maior da sociedade, não apenas a política institucional (igualmente
importante), mas também todas as outras formas de política.
E o que temos? Os representantes eleitos pela sociedade civil postos face a face
com o Estado, isolados, "pendurados no pincel". Porque as bases que eles
supostamente representam muitas vezes estão rarefeitas e desmobilizadas. É
necessário fazer com que estas duas frentes estejam profundamente interligadas.
11
Fórum Social Nordestino, Recife, 24 a 27 de novembro de 2004
Rodrigo Simões
Marco Crocco
Professores do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional
(Cedeplar) da Universidade Federal
de Minas Gerias (UFMG)
Introdução
1
preocupação básica é discutir o desenvolvimento regional, apresentando um
diagnóstico e propondo linhas gerais para enfrentar o atual quadro. O documento
é dividido em três partes, além desta introdução. Na próxima seção é discutida a
desigualdade regional brasileira e suas principais interpretações. Na seção
seguinte, são analisadas as características das políticas de desenvolvimento
regional da década dos 1990. Finalmente, algumas sugestões de política de
desenvolvimento regional e de financiamento deste são apresentadas.
2
capital no espaço, a fim de produzir um diferente padrão locacional (SIMÕES,
2003).
3
Esse esforço governamental – mesmo que não tenha surtido os efeitos desejados
em toda a sua magnitude – deixou clara a preocupação com as políticas regionais
de desconcentração produtiva. Estas, com início no final dos 1950 com a criação
da SUDENE, permearam toda a discussão de eqüidade regional na década de
1970. Nos anos 1980, apesar de vez ou outra ameaçarem um redivivo, foram
colocadas em segundo plano – assim como quase todas as questões estruturais
da economia brasileira - face à crise fiscal do Estado e a urgência da estabilização
monetária.
(em %)
Regiões/Estados 1970 1980 1990 2000
Norte 0,8 2,4 3,1 4,5
Nordeste 5,7 8,1 8,3 9,0
Bahia 1,5 3,5 4,0 3,9
Ceará 0,7 0,9 0,9 1,7
Pernambuco 2,2 2,0 1,7 1,1
Centro-Oeste 0,8 1,2 1,8 2,2
Sudeste 80,7 72,6 69,5 66,0
Minas Gerais 6,5 7,7 8,7 9,5
4
Espírito Santo 0,5 0,9 1,0 2,0
Rio de Janeiro 15,7 10,6 9,8 9,4
São Paulo 58,1 53,4 50,0 45,2
RMSP 43,5 33,7 30,2 22,0
Interior de SP 14,6 19,8 19,8 23,2
Sul 12,0 15,8 17,3 18,3
Paraná 3,1 4,3 5,7 5,7
Santa Catarina 2,6 4,1 4,2 4,3
Rio Grande do 6,3 7,3 7,7 8,3
Sul
Fonte: Elaboração própria a partir de FIBGE, Censos
Industriais, 1970 e 1980, e FIBGE PIM/PF e PIA. *
Estimativa com base na produção física da indústria da
transformação no período 1990 / 2000.
5
Sul do país (DINIZ, 1993). Torres apresenta uma visão complementar e
diferenciada, evidenciando que os estados de Minas Gerais, Espírito Santo e
Bahia podem vir a concentrar os maiores ganhos de participação percentual no
VTI devido às suas especializações na produção de bens intermediários, face à
sua participação relativa no comércio exterior brasileiro (TORRES, 1991).
Pacheco, por sua vez, enfatiza os efeitos da abertura comercial na estrutura
regional da indústria brasileira, concluindo por uma tendência de fragmentação
do espaço nacional, com possibilidade de repercussões no próprio pacto
federativo brasileiro (PACHECO, 1998). Diniz & Crocco destacam também a
influência do Mercosul, que pelo “efeito de arraste” aumentou o potencial de
crescimento industrial do sul do país. Voltam também a reafirmar a prevalência da
Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), destacando a recentralização
financeira e de serviços produtivos complexos como reforço à posição primaz da
metrópole paulistana no cenário econômico brasileiro, posicionando-a como o
único espaço localizado brasileiro integrado ao sistema mundial de cidades
globais (DINIZ & CROCCO, 1996).
6
dado que o maior aumento diferencial se deu no próprio entorno ampliado da
RMSP; basicamente na interiorização da indústria paulista e no eixo Belo
Horizonte / Porto Alegre; e ii) a consideração das próprias mudanças ocorridas na
estrutura produtiva mundial, e prospectivamente apontando para uma
reconcentração da produção em São Paulo. Analiticamente, Torres resume os
principais argumentos:
7
modificações ocorridas no paradigma tecnológico vigente, a dinâmica da inserção
brasileira na Divisão Internacional do Trabalho, além da própria Divisão inter-
regional do Trabalho no Brasil.
Diniz ressalta que a única política regional de âmbito federal na gestão Fernando
Henrique Cardoso – os Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento, do
Ministério da Integração Nacional – avançou ao tentar vincular potencialidades
regionais com o mercado externo e criar efeitos sinérgicos entre a infra-estrutura
física/social e atividades produtivas, trazendo, também, implicações contraditórias
à idéia de redução das desigualdades regionais, a saber: 1) viés excessivamente
exportador, sem preocupação com a integração inter-regional brasileira; 2)
abandono de uma integração mais orgânica com os países do Mercosul; 3) falta
de ênfase nas questões estruturais – saneamento, habitação, educação – que
amenizariam a brutal concentração de renda no país; 4) existência de projetos
concorrentes sem definição clara das instâncias de arbitragem; 5) inexistência de
uma política tecnológica regionalizada; 6) incompatibilidade entre instâncias e
instrumentos de política econômica existentes como os objetivos explícitos do
programa; e 7) inexistência de diretrizes de integração urbana entre os eixos,
respeitando suas centralidades e espaços polarizados (DINIZ, 2002). Também
Cano afirma que os eixos “(...) constituíam vetores ligando zonas produtivas a
portos de exportação (...) apenas tocando pontos de origem-destino, pouco ou
nada fazendo em prol dos maiores espaços regionais em que estavam inseridos,
(...) praticamente ignorando os problemas urbanos e sociais das cidades maiores
8
envolvidas pelos eixos” (CANO, 2002:281). Ao contrário de políticas regionais
integradas e de âmbito macro-espacial, o que vimos acontecer durante os anos
de 1990 é aquilo que podemos designar como sobrevalorização da ideologia do
poder local2. Como bem destacou Cano3 (CANO, 2002:282 et passim):
Dessa forma,
2
Não nos cabe aqui avaliar e nem mesmo apresentar a discussão sobre poder local. Ver BENKO &
LIPIETZ (1992), ALBAGLI (1999), GRANOVETER (1985), ZEITLIN (1992), PUTNAN (1993),
FERNANDES (2001), dentre outros.
3
Esse autor, assim como PACHECO (1998), também destaca a efetiva possibilidade de
fragmentação nacional derivada deste processo.
9
Enfatizando a dimensão locacional, a famosa tríade marshaliana4 destaca que as
vantagens da produção em escala operam de forma mais eficiente a partir da
concentração espacial de um grande número de pequenas e médias empresas
(PME’s) num locus específico. Tal concentração provocaria o equacionamento da
dicotomia competição-cooperação, aumentando a eficiência e por conseguinte a
capacidade competitiva das empresas envolvidas no processo. Isto dar-se-ia pela
articulação entre economias externas – resultado imediato da aglomeração
espacial – e “ação conjunta” dentro do próprio distrito. A “eficiência coletiva”
resultante propiciaria as vantagens deste tipo de aglomeração5. Neste contexto, o
papel das economias de escala externas torna-se essencial.
Mais que isso, para o bom funcionamento do cluster, este papel de coordenação
deve ser exercido por instituições, públicas e/ou privadas – tais como sindicatos
patronais, centros de apoio às empresas, poder público local – dando suporte
organizacional às empresas participantes.
Desta forma, as clustering policies passam a ser vistas como uma nova panacéia
para a resolução dos problemas regionais, e sua implementação a garantia de
aproveitamento das potencialidades regionais levando a uma melhor inserção nos
4
Sinteticamente, essa tríade pode ser definida como as economias externas decorrentes de
spillovers de conhecimento, formação e especialização do mercado de trabalho e encadeamentos
setoriais com fornecedores e prestamistas.
5
Vale dizer, “(...) a divisão do trabalho entre as firmas do distrito provoca fortes economias de
escala ao potencializar o uso especializado de recursos produtivos, como treinamento de mão-de-
obra e na rápida circulação de informações” (GARCIA, 1996:26).
6
Estas sinergias advêm de “(...) interações diversas, parcerias público-privadas, envolvendo oferta
de recursos de infra-estrutura, e cooperação fornecedores-clientes” (LINS, 2000:237).
10
mercados nacionais e até internacionais. Como destaca o documento “Cresce
Minas: um projeto brasileiro”(FIEMG, 2000) :
Martin & Tyler destacam ainda que a ênfase nesta nova política regional deve ser
entendida a partir da situação específica dos países centrais, nos quais os
desequilíbrios inter e intra-regionais se dão marginalmente, ou seja, acontecem
preponderantemente nas diferenças entre taxas de crescimento e de desemprego
(MARTIN & TYLER, 1999). Países como o Brasil, nos quais os desequilíbrios
7
A Professora Tânia Bacelar, citada em SIMÕES (2002), destaca a centralidade da escala nacional
na formulação de políticas de desenvolvimento regional e a atualidade dos “velhos” instrumentos de
política regional para encarar desequilíbrios regionais da monta do brasileiro. Apesar disso também
reafirma a importância da escala local, principalmente no que se refere ao papel das instituições
locais e regionais na identificação de especificidades e potencialidades setoriais. Esse fato,
segundo Bandeira, garantiria, ademais, maior representatividade política e transparência na gestão
(BANDEIRA (2000).
11
regionais manifestam-se fortemente no valor das magnitudes iniciais dos
agregados (PIB, VTI, dotação de infra-estrutura etc), necessitam de mediação
entre o abandono puro e simples das tradicionais “políticas de áreas assistidas” e
a adoção de estratégias de picking winners, tais como as preconizadas pelas
clustering policies8 . Como afirma Martin (MARTIN, 1999:9 et passim):
8
Não cabe aqui uma avaliação das clustering policies como política industrial e tecnológica. Para
uma rigorosa avaliação sobre o tema, ver Suzigan (SUZIGAN, 2001) e Cassiolato (CASSIOLATO
(2000).
12
“Problemas mais gerais de desequilíbrios econômico
regionais devem ser tratados por políticas de âmbito regional
ou nacional. Estudos de aglomerações industriais devem
visar apenas entender e avaliar empiricamente fenômenos
de organização industrial no espaço geográfico.” (SUZIGAN,
2001:37)
Pelo exposto até aqui fica evidente que, dada a magnitude da desigualdade
regional brasileira e a virtual inexistência de uma política de cunho regional em
âmbito nacional no país, qualquer diretriz para a formulação de uma política que
vise a mitigação dos desequilíbrios regionais no Brasil deve partir,
necessariamente, da recuperação da capacidade de planejamento do Estado
brasileiro. Nas palavras de Diniz, é preciso retomar “(...) o planejamento nacional,
13
no qual a visão de problemas, potencialidades e prioridades regionais e setoriais
esteja organicamente inserida”, para que possa-se obter coerência e
funcionalidade entre políticas, sejam de cunho macroeconômico ou setorial, e as
diretrizes para o desenvolvimento regional (DINIZ, 2002:267). Atrelado a isso faz-
se imprescindível a criação de um sistema de coordenação da política regional,
inserido no sistema nacional de planejamento, que operacionalize
institucionalmente:
Sobre esse último ponto Crocco destaca que pode-se pensar em três pilares,
necessariamente integrados, na construção de uma política de financiamento do
desenvolvimento regional: os Fundos Oficiais de Financiamento; o papel dos
Bancos Oficiais (BNDES, BNB, Banco do Brasil, etc.); e, por fim, o marco
regulatório dos Bancos Comerciais Privados (CROCCO, 2003) . Vale dizer, o
autor enfatiza a idéia de que o financiamento do desenvolvimento regional deve
combinar instrumentos públicos e privados, que seriam combinados de forma a
criar sinergias.
9
A discussão sobre os efeitos deletérios da guerra fiscal no desenvolvimento brasileiro merece um
estudo à parte. Aqui cabe destacar que, além de desestruturar os preços relativos, a renúncia de
arrecadação por parte dos estados nem sempre é compensada pela geração de empregos e
estímulo à economia.
14
(Funder)10, facilitando uma intervenção coordenada em todas as regiões. A idéia
central é superar, tanto do ponto de vista da elaboração de uma política regional,
quanto do financiamento desta, a regionalização administrativa (CROCCO, 2003).
Como destaca Diniz, é necessário estabelecer uma nova “(...) regionalização para
fins de planejamento, estabelecendo os macro, meso e micropólos, e as
respectivas macro, meso e microrregiões, como referência para a política
regional.”11 (DINIZ, 2002:268) Este procedimento poderia dar à política regional
uma dimensão nacional, evitando contradições e superposições de instrumentos e
recursos.
10
Essa sugestão de criação de um fundo único aparece primeiramente em Diniz, em artigo
preparado para os “Painéis do Desenvolvimento Brasileiro” realizado pelo BNDES (DINIZ, 2002).
11
Diniz argumenta, ainda, que a delimitação do espaço nacional através das regiões administrativas
do IBGE, não atende às necessidades de planejamento, uma vez que a indução do
desenvolvimento é associada a uma dinâmica espacial que não é captada pela divisão do país nas
tradicionais regiões administrativas (DINIZ, 2002) .
15
distintos dos objetivos do fundo único. Pode-se pensar que
12
Para uma discussão aprofundada deste tema ver CROCCO (2003) e CROCCO et. al. (2002).
16
locais, atuando em espaços geográficos determinados, e pequenos bancos
nacionais, com pouca liberdade de atuação (ALESSANDRINI & ZAZZARO, 1999).
Como enfatiza Crocco:
13
Fato este que já ocorreu na regulamentação bancária brasileira.
17
Um outro elemento de apoio à política de desenvolvimento regional seria a sua
articulação com as políticas de outras áreas. A política de desenvolvimento
tecnológico, por exemplo, poderia ser utilizada como instrumento adicional,
através de diversas ações, tais como: o financiamento de aglomerações
produtivas locais e a diversificação regional da estrutura de produção científica e
tecnológica do país. Devemos atentar que as políticas industrial e setorial podem
tanto contribuir para combater o desequilíbrio regional, como também ampliá-lo.
Vale dizer, ao incentivar a concentração da produção industrial em áreas que
possuam vantagens comparativas já estabelecidas – ao estilo das clustering
policies – o componente de desigualdade é inerente. A suposta vinculação do
ambiente local diretamente à escala global – por intermédio da ênfase na
competitividade externa – pode vir a promover uma desintegração regional em
tudo maléfica ao país, dada a importância do fortalecimento dos linkages
intersetoriais internos na geração de renda e emprego (SIMÕES, 2003).
18
BIBLIOGRAFIA
BENKO, G & LIPIETZ, A. Les régions qui gagnet: districts et reseaux: les noveaux
paradigmes de la geographie economique. Paris: PUF, 1992.
19
CANO, W. Reestruturação internacional e repercussões interregionais. In:
CARLEIAL & NABUCO, Op.cit., 1989.
CANO, W. & PACHECO, C.A. São Paulo no limiar do século XXI, perspectivas
dos setores produtivos, 1980-2000. São Paulo: Metrô / SRL / FECAMP, 1990
(mimeo).
20
DINIZ, C.C. Repensando a questão regional brasileira: tendências, desafios e
caminhos. In: CASTRO, A.C. (org). Desenvolvimento em debate. Painéis do
desenvolvimento brasileiro – II. Rio de Janeiro: MAUAD / BNDES, 2002 b.
DINIZ, C.C. & CROCCO, M.A. O novo mapa da indústria brasileira: aglomeraçòes
industriais relevantes. VII SEMINÁRIO SOBRE ECONOMIA MINEIRA, Anais...,
Diamantina: Cedeplar, 1995
DINIZ, C.C. e LEMOS, M.B. Dinâmica regional e suas perspectivas no Brasil. In:
PARA a década de 90; prioridades e perspectivas de políticas públicas.
Brasília: IPEA-IPLAN, v.3, 1989.
21
MARSHALL, A. (1890) Principles of economics, London: McMillan, 1920.
PIORE, M.J. & SABEL, C. The second industrial divide. New York: Basic Books,
1984.
PUTNAN, R. Making democracy work: civic traditions in modern Italy. New Jersey:
Princeton University Press, 1993.
22
Painéis do desenvolvimento brasileiro – II. Rio de Janeiro: MAUAD / BNDES,
2002.
23
Fórum Social Nordestino, Recife, 24 a 27 de novembro de 2004
A Reinvenção da Democracia
John Holloway
professor da Universidade de Puebla (México)
Brasil es un lugar muy especial para plantear esta pregunta. Hace apenas dos
años la izquierda mundial festejó el triunfo de Lula en las elecciones. Aquí por
fin hubo una gran victoria para la democracia, una victoria real para la izquierda.
Y no cualquier izquierda, sino de un partido de militancia comprobada, con un
líder obrero de militancia comprobada. Aquí por fin todo el mundo podía ver que
era posible cambiar la sociedad a través de las elecciones democráticas.
1
El fracaso de Lula no es simplemente un fenómeno brasileño. Es la repetición
en Brasil de una experiencia mundial. Hay una palabra que ocurre una y otra
vez en la historia de la izquierda estadocéntrica en todo el mundo: traición. El
hecho de que la traición se repite tan seguido hace que el concepto mismo de
“traición” es ridículo. El fracaso de la izquierda no puede ser simplemente
cuestión de traición, de la culpa de un líder ni de la culpa de un partido: tiene
que tener algo que ver con las estructuras mismas. El hecho de que no es
simplemente una experiencia brasileña significa que tenemos que ir más allá de
una crítica de Lula o del PT.
II
2
movimiento de separación que fragmenta la socialidad del hacer. El capital toma
lo que los hacedores han hecho y dice “¡esto es mío!” El capitalista rompe el
hacer, separa lo hecho del hacer y del hacedor, y con eso todo se rompe, cada
aspecto de la vida. Sobre todo nosotros estamos rotos. Nosotros estamos rotos
como sujeto social, despedazados en millones de individuos atomizados. El
capital es la ruptura del hacer social, y cuando el hacer se rompe, el ser se
impone, lo que es domina.
Vemos los horrores del mundo, los niños que mueren, la pobreza y la injusticia,
las bombas que caen, y gritamos “¡NO! No puede ser. Tenemos que cambiar el
mundo, tenemos que hacer otro mundo” Y ellos se ríen: “Ustedes son nada más
un grupo de individuos. No pueden cambiar el mundo porque el mundo es así,
así son las cosas”. Están equivocados, por supuesto. Lo que es es solamente
porque nosotros lo hemos hecho y lo seguimos haciendo. Lo que es depende de
nuestro hacer. El capital depende de nosotros. El capital se ve tan estable, se ve
como algo eterno. Pero no lo es. Existe solo porque nosotros lo creamos, no
porque lo creamos hace doscientos años, sino porque lo creamos hoy, lo
estamos creando hoy. El problema no es abolir el capitalismo, el problema es
dejar de crearlo.
3
democracia.
III
Pero entonces ¿por qué es un desastre? ¿Por qué no funciona? ¿Por qué
sentimos que estamos excluidos? ¿Por qué, bajo Bush y Blair, la democracia se
ha convertido en un arma de destrucción masiva? ¿Por qué es que cuando la
gente elige a Lula para cambiar la sociedad, no pasa nada?
4
sujetos hasta que tengamos la oportunidad de renovar la separación en las
próximas elecciones. Se crea un mundo de la política, separado de la vida
cotidiana de la sociedad, un mundo de la política poblado por una casta distinta
de gente que habla su propio lenguaje y tiene su propia lógica, la lógica del
poder. No es que esta gente esté totalmente separada de la sociedad y sus
antagonismos, porque se tienen que preocupar por la próxima elección y las
encuestas y los grupos organizados de presión, pero ven y escuchan solamente
aquello que está traducido a su mundo, a su lenguaje, a su lógica. Al mismo
tiempo se crea un mundo paralelo, un mundo teórico, académico que refleja
esta separación entre política y sociedad, el mundo de la ciencia política y del
periodismo político, que nos enseña el lenguaje y la lógica peculiares de los
políticos y nos ayuda a ver el mundo a través de sus ojos ciegos.
III
5
"¡Que se vayan todos!” es un grito que resuena en todo el mundo porque en
todo el mundo la gente está harta de los políticos profesionales, de aquellos
miserables que toman nuestro lugar, que nos representan.
6
desde las negaciones, las insubordinaciones, las proyecciones en-contra-y-más-
allá que existen por todos lados. El mundo está lleno de fisuras de este tipo, de
negaciones. En todas partes del mundo hay gente diciendo, individual y
colectivamente “No, no vamos a hacer lo que nos dice el capitalismo: vamos a
moldear nuestras vidas como nosotros queremos”. A veces estas fisuras son tan
pequeñas que ni los rebeldes mismos están conscientes de su propia rebeldía,
a veces son tan grandes como la Selva Lacandona – y mientras más nos
enfocamos en ellas, más empezamos a ver el mundo no como un sistema
cerrado de dominación total capitalista, sino como un mundo lleno de fisuras, de
negaciones, de resistencias, un mundo preñado de otro mundo. Cada fisura es
un impulso hacia este otro mundo, es decir un impulso hacia la auto-
determinación. Nuestra lucha es para extender y multiplicar y profundizar y
fortalecer estas fisuras. Estamos hablando de revolución, pero en la única forma
en la cuál es posible concebir la revolución ahora, como revolución intersticial.
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análisis de Marx de la Comuna de Paris, que se puede encontrar en los soviets
de la revolución rusa, los concejos comunitarios de los zapatistas, las
asambleas barriales argentinas y en muchos otros movimientos.
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una comunidad basada en el reconocimiento mutua de la dignidad humana.
IV