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1 INTRODUÇÃO

A minha entrada no universo do cooperativismo iniciou quando me


associei a uma Cooperativa de Trabalho Médico, um ano após a minha formatura
na Faculdade de Medicina, porque me disseram (não lembro quem) que, para ser
conhecida, deveria fazer parte dessa organização, entre outras. Era uma entre
muitos profissionais lançados no mercado de trabalho, desconhecida e ávida por
ganhar espaço num cenário acirrado em termos de números, experiência e
competência. No entanto, só percebi o que significava ser “cooperada” quando,
em 1999, participei da gestão, que duraria quatro anos, como membro do
Conselho de Administração, seguida de mais dois anos como Conselheira Fiscal.
Naquela época (1999), percebi o quanto me encontrava incapacitada para
exercer tal função, porque não basta que se possua habilidade em transitar pelos
caminhos políticos: também é necessário que se tenha conhecimento teórico e
prático em gerir um negócio. Reconheço que os gestores devem conhecer o
conjunto de relações de ordem estrutural que mantém uma empresa em
funcionamento e o sistema por meio do qual se operacionalizam e coordenam os
desempenhos pessoais (SILVA, 2001).
Assim sendo, fui buscar conhecimento em dois cursos de pós-graduação
realizados com muita satisfação. O primeiro foi o de Auditoria em Saúde, no qual
elaborei um estudo que avaliou o “Perfil dos Clientes”, referente à utilização dos
planos de saúde comercializados pela cooperativa; o segundo curso foi o de
Gestão da Saúde, cujo tema de pesquisa foi a elaboração de “Protocolos para
Cirurgia Ginecológica”, com intuito de instituir Pacotes Cirúrgicos Hospitalares,
uma entre tantas ferramentas para reduzir os custos dessa cooperativa.
O tema do meu projeto de mestrado consistia na Aplicação e Avaliação
dos Efeitos da Implantação de Pacotes Cirúrgicos Hospitalares na Redução de
Custos em uma Cooperativa Médica. Entretanto, como esse processo para ser
avaliado necessitaria de mais dois anos após a sua aplicação, considerei que o
tempo que dispunha era pouco para elaborar uma pesquisa de cunho científico,
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cujos resultados trouxessem benefícios para a organização. Em paralelo,


indagava-me – e era questionada por alguns colegas cooperados – sobre os
custos da cooperativa, custos esses que resultam num valor reduzido dos
honorários pagos aos cooperados.
Relembrei que tive uma boa formação acadêmica. No entanto, o
aprendizado de múltiplas disciplinas correspondentes às especialidades ao longo
do curso não nos permitia buscar o saber em outras áreas do conhecimento, nem
recebemos ensinamentos referentes à administração em saúde.
Quando me cooperei, não entendia o significado do cooperativismo; só fui
compreender que a saúde tem um custo, quando aprofundei meus conhecimentos
sobre a empresa e quando circulei por ela, não como uma estranha, mas como
uma pessoa que é dona e encontra-se preocupada com o sucesso de sua
organização.
Na busca de conhecimentos sobre cooperativismo e gestão, percebi,
conforme argumenta Andrade (2000), que a elevação geométrica dos custos para
a assistência à saúde resulta de vários motivos, tais como as mudanças de
hábitos alimentares e de higiene da população e as descobertas científicas, tanto
nas terapias quanto nos processos de diagnóstico que propiciam a longevidade
populacional de um modo geral.
O envelhecimento da população, por sua vez, permite a manutenção ou a
aquisição de novas patologias entre os idosos e, portanto, a utilização mais
assídua dos serviços assistenciais. Embora esse seja um fator muito importante
para a elevação dos custos em saúde, o autor alega que a crescente utilização de
tecnologias de alto custo, tanto no diagnóstico quanto nas terapias e a
modificação da relação médico-paciente, cada vez mais especializada, e distante,
são fatores preponderantes nos custos em saúde (ANDRADE, 2000).
O médico também pode ser o responsável pela maior freqüência de
consultas e exames solicitados. MORSE (1993, p.804) já referia que a “caneta do
médico é um instrumento responsável, em grande parte, pelo alto custo do
atendimento à saúde”, ou seja: só depende do médico a opção pelos métodos
diagnósticos e terapêuticos que irá utilizar na sua prática diária assistencial.
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Vários autores alegam que a partir dos anos oitenta, com a saturação dos
mercados nos países desenvolvidos, a incorporação da alta tecnologia, tanto nos
processos produtivos quanto nas prestações de serviços, a redução das barreiras
no comércio internacional e a evolução da filosofia da qualidade total modificaram
a realidade e os passos dos processos administrativos nas organizações (CAPRA,
2002; DAUPHINAIS, 2001; HARRINGTON, 1991; MAXIMIANO, 2000;
MCDONALD, 2001).
Na verdade, a “globalização trouxe apenas benefícios aos possuidores do
poder decisório, imposto pelos países desenvolvidos, e pelo capital especulativo,
ávido de lucro imediato, sem preocupações com as conseqüências de suas
atuações” (RICCIARDI et al., 2000, p.34). Esses mesmos autores advertem que
“os mercados sem fronteiras revelaram-se ‘um tiro no próprio pé’, desferido pelos
países desenvolvidos, só que os estilhaços acertaram o resto do mundo” (Idem,
ibidem, p.56).
Outros fatores também colaboram de um modo indireto para a elevação
dos custos em saúde, entre eles: “a arraigada cultura de se gastar com a cura, ao
invés de se investir na prevenção de doenças; a falta de conscientização do
usuário e sua suscetibilidade às influências da mídia; as pressões por aumentos
lineares exercidas por entidades de classe bem como por ações e políticas na
área da saúde e tributária” (ANDRADE, 2000, p.19).
De acordo com Temporão (1997), houve o fortalecimento da ideologia de
consumo, não só de medicamentos e de processos terapêuticos, mas de saúde
como um todo. Mendes adverte que “os indivíduos buscam os serviços de saúde
quando deles necessitam; ou porque adoecem, ou porque acham que adoecem.
E, por desconhecerem seu problema de saúde e a eficácia de um determinado
serviço por eles escolhido para resolver seu problema, delegam um profissional
que se responsabilizará a agir por eles” (MENDES, 1999, p.83).
Concordando com Mendes, Ismael cita que “as pessoas esperam receber
do médico quatro atitudes principais: serem ouvidas, olhadas, tocadas e
confortadas, pois quando o procuram encontram-se emocionalmente vulneráveis,
com os sentidos aguçados pela tensão e expectativa” (ISMAEL, 2002, p.65).
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A titulação, os cursos de especialização, o tempo de formado, a boa


aparência do ambiente – e não a suntuosidade do consultório –, entendendo-se
com isso o aspecto físico do ambiente, tal como “a boa iluminação, a pintura, os
móveis bem conservados, a atenciosidade e o humor do médico e da
recepcionista” - também influem de forma contundente “na pré-avaliação do
profissional” (Idem, ibidem). Porém, quando uma ou mais dessas necessidades
não são supridas, gera-se insatisfação no paciente, porque não foi bem atendido,
ou porque não obteve um diagnóstico de acordo com suas expectativas. Dessa
maneira, com o intuito de satisfazer suas necessidades, o paciente – cliente –, na
busca de respostas às suas apreensões, utiliza-se do livre arbítrio, único poder
que possui em mãos para procurar diversas opiniões para um mesmo diagnóstico.
Segundo Mendes, “em termos econômicos, essa relação não caracterizaria uma
relação de oferta e demanda, mas um concertamento entre a consciência do
profissional e a confiança do consumidor” (MENDES, 1999, p.83).
Conforme Luz (2002), as gerações médicas anteriores cultivavam uma
relação com os pacientes que, praticamente, inexiste nos dias atuais; gozavam de
prestígio e credibilidade perante a sociedade, mesmo não dispondo de um grande
arsenal terapêutico, laboratorial, cirúrgico nem anestésico, que hoje a medicina
dispõe.
Recordo que, no início das suas atividades, a Cooperativa de Trabalho
Médico desenvolvia processos empresariais que atendiam a “uma necessidade
imediata de servir a uma pequena população de clientes internos e externos”
(HARRINGTON, 1991, p.20). Atualmente, inserida em cenário cada vez mais
crescente no mercado de assistência suplementar à saúde, essa empresa, com o
objetivo de melhorar seus resultados e permanecer competitivamente nessa nova
realidade, instalou diversos processos de controle de custos em sua estrutura
organizacional.
Conforme dados fornecidos por um dos processos de controle de custos
dessa cooperativa, o Projeto Data Warehouse, paradoxalmente à instalação dos
mesmos, a produção médica tem-se elevado progressivamente, tanto na parcela
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que se refere ao Ato Médico, quanto na que se refere ao não Ato Médico 1 , de
modo que os esforços administrativos que objetivam a remuneração dos sócios,
os cooperados, atualmente não estão alcançando de forma efetiva os princípios
cooperativistas. Assim, os médicos vêm paulatinamente perdendo sua condição
de trabalho, deixando de ser profissionais liberais para serem continuamente
transformados em trabalhadores mal remunerados da saúde.
Teci muitas reflexões referentes às condições da tríade cooperativa-
cooperado-usuário e, por isso, considerei que seria salutar se realizasse uma
pesquisa entre os médicos cooperados a respeito da percepção referente à
organização e aos processos de controle de custos em uma cooperativa de
trabalho médico.
Ao trocar o tema de “Aplicação e Avaliação dos Efeitos da Implantação de
Pacotes Cirúrgicos Hospitalares na Redução de Custos em uma Cooperativa
Médica” para “Percepção de Médicos Cooperados sobre Processos de Controle
de Custos em uma Cooperativa de Trabalho Médico”, considerei que a
subjetividade permeia o ser humano em todas as esferas de sua vida como uma
teia ou o emaranhado de neurônios em nossos cérebros, e que tudo se encontra
interligado.
Tanto no pessoal quanto no coletivo, as ações humanas são fenômenos
que não podem ser captados por meio das quantificações (MINAYO, 1994); por
isso, compreendi que o melhor método para realizar esta pesquisa seria o
qualitativo, pois, segundo diversos autores, esse método tem por finalidade a
compreensão da realidade do ser humano, vivida no seu contexto social
(GROSSEMAN, 2001; LÜDKE e ANDRÉ, 2001; MINAYO, 2001, PATRÍCIO, 1999;
BOGDAN & BIKLEN, 1994).
Levando em conta tal subjetividade, teci o seguinte questionamento
acerca do cooperativismo médico: Como a prática da medicina pode ser
desenvolvida, mantendo a saúde financeira da cooperativa de trabalho médico?

1
Projeto DWH, 2004. Não Ato Médico: são as diárias, taxas, medicamentos, órteses e próteses,
exames laboratoriais, custo operacional de exames e pacotes, filmes e fisioterapia.
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O objetivo geral desta pesquisa foi identificar, junto a profissionais


médicos, como a prática da medicina pode ser desenvolvida, mantendo-se a
saúde financeira da empresa.
Os objetivos específicos foram os de identificar a percepção de médicos
cooperados sobre o cooperativismo; identificar a percepção dos médicos sobre os
processos de controle em uma cooperativa de trabalho médico; identificar se os
processos de controle de custos em uma cooperativa de trabalho médico
interferem na prática médica e identificar nos relatos onde há interferência e,
quando há, como ocorre.
Para compreender tais questionamentos, empreguei os princípios da
Abordagem Holística-Ecológica, desenvolvida por Patrício em 1996, que considera
a complexidade do ser humano no contexto social. O tipo de estudo foi o estudo
de caso.
Os sujeitos do estudo são profissionais médicos de ambos os sexos, das
áreas básicas de atendimento, como pediatria, ginecologia e obstetrícia, clínica
médica e clínica cirúrgica, que se encontram cooperados e exercem a medicina no
Brasil há pelo menos dez anos.
Espero que esta pesquisa contribua na perspectiva acadêmica a partir do
momento que traga elucidações sobre o trabalho médico cooperado, tema ainda
“carente” na literatura especializada. Espero também multiplicar o conhecimento
referente ao tema, devido à importância da cooperativa médica como uma forma
de viabilizar o acesso de pessoas à assistência à saúde de melhor qualidade do
que a fornecida pelo sistema público.
Do ponto de vista prático, espero que possa contribuir com as
necessidades de obtenção de melhores índices de eficácia e propiciar maior
efetividade no processo de estruturação da cooperativa. Nesse sentido, outras
propostas de abordagem que beneficiem a tríade cooperativa-cooperado-usuário
poderão emergir.
Justifico ainda que a forma de tratamento utilizada nesta dissertação
encontra-se na primeira pessoa porque, segundo Grosseman (2004), “esta é a
forma habitual de tratamento na metodologia qualitativa. A primeira pessoa revela
que o investigador é sujeito e assume a responsabilidade por sua investigação.
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Demonstra, além disso, o reconhecimento de que, como qualquer ser humano,


este sujeito pesquisador também tem subjetividade” (GROSSEMAN, 2004, p.7).
Contudo, conforme Bogdan & Biklen (1994), nesse tipo de estudo, a subjetividade
do autor procura a neutralidade, à medida que ele se esforça para não influenciar
os sujeitos do estudo, ouvindo e relatando suas colocações.
O segundo aspecto refere-se à revisão bibliográfica, que não foi elaborada
com intenções de esgotar o tema de estudo, pois de acordo com Bogdan & Biklen
(1994), “os investigadores qualitativos tendem a analisar seus dados de forma
indutiva. Não recolhem dados ou provas com o objetivo de confirmar ou infirmar
hipóteses construídas previamente; ao invés disso, as abstrações são construídas
à medida que os dados particulares recolhidos se vão agrupando” (BOGDAN &
BIKLEN, 1994, p. 50).
Segundo Grosseman (2001), na pesquisa qualitativa, as citações dos
sujeitos são utilizadas quando se deseja ressaltar aspectos apontados ou temas
relevantes para o objetivo do estudo.
A limitação do estudo deveu-se ao fato desta pesquisadora ser sócia da
cooperativa sobre a qual elaborou o estudo.
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2 A SOCIEDADE COOPERATIVA DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO


XXI

Há cerca de 3,5 bilhões de anos, quando o mundo passou da não vida


para a vida e com o aparecimento dos seres nucleares (eucariontes),
representados por bactérias e algas azuis, a cooperação, entre outras, foi uma das
formas de propiciar a evolução, à medida que os maiores englobavam os menores
de modo que, num processo de ajuda mútua, evoluíram e povoaram o planeta
com as mais fantásticas e diversificadas formas de vida que encontramos na
atualidade (CAPRA,1996; 2002; MORIN, 2002).
Na verdade, segundo Capra, “a evolução procedeu por meio de arranjos
de cooperação e de co-evolução cada vez mais intrincados” (CAPRA, 1996,
p.193). Esse mesmo autor afirma que “todos os organismos maiores, inclusive nós
mesmos, são testemunhas vivas do fato de que práticas destrutivas não
funcionam em longo prazo. No fim, os agressores sempre destroem a si mesmos,
abrindo caminho para outros que sabem cooperar e como progredir” (Idem,
ibidem).
Há cerca de 10.000 a.C., conforme Roberts (2001), o início da revolução
neolítica, resultante do recuo do gelo, ofereceu diversas oportunidades e desafios
aos seres humanos que se tornavam cada vez mais diferentes, tanto no aspecto
físico-intelectual, quanto no modo de fazer as coisas. É certo que o ritmo das
mudanças foi muito lento e variado na maneira como os povos viviam, exceto pela
disponibilidade de comida. Caçar e coletar devem ter sido a regra. No entanto, a
fase neolítica da existência humana trouxe várias mudanças além do uso da pedra
moída e polida para a fabricação de utensílios de cerâmica com o fim de
armazenamento e cocção dos víveres. Foi também nessa fase que o ser humano
experimentou a tecnologia da pedra para desenvolver a agricultura, garantindo,
assim, um fornecimento mais sistemático de alimentos às comunidades que se
formavam.
Outras tecnologias, como a tecelagem e o advento da metalurgia, que
podem ter ocorrido e avançado de maneira casual ou terem sido resultado da
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experimentação consciente, comprovam que, já nesse período da história, os


seres humanos, mesmo sendo criadores por natureza, manifestaram um
desenvolvimento organizacional, embora rudimentar, no sentido de regular as
normas e conseqüentemente sistematizar racionalmente a produção dos
elementos necessários à sua sobrevivência. O resultado final foi a maior
aceleração do desenvolvimento econômico e social de que se tem notícia antes do
advento do motor a vapor, nos Séculos XVIII e XIX da era cristã (ROBERTS,
2001).
Concordando com Roberts, Ricciardi et al. (2000) alegam que “o ser
humano evoluiu da vida individual para o convívio com outras pessoas no grupo.
Quando o caçador pré–histórico descobriu que, unindo seus esforços aos de
outros caçadores, poderia caçar mais e com menos riscos e sacrifícios, descobriu
o trabalho em grupo ou o trabalho em cooperação” (RICCIARDI et al. 2000, p.
115). Ainda concordando com Roberts, esses autores afirmam que a
espontaneidade do relacionamento entre as pessoas necessitou regular-se por
certas regras, iniciando-se a organização. Então, conforme Maximiano (2000),
formas organizadas de trabalho entre os humanos fizeram-se necessárias para
que os objetivos comuns fossem alcançados.
As conquistas romanas resultantes das guerras entre os demais povos por
eles considerados “os bárbaros” fundamentavam-se não apenas na crença aos
deuses e na subserviência dos exércitos ao Estado, mas também possuíam um
propósito evidentemente capitalista (ROBERTS, 2001). Weber (2004) identifica na
Roma antiga germes do capitalismo moderno expressos nos atos expansionistas
daquele povo. Entretanto, apenas na antiga Babilônia é que se evidenciou, no
código do rei babilônico Hamurábi, as preocupações em praticar processos de
controle e de responsabilidade administrativa (MAXIMIANO, 2000).
Segundo diversos autores, somente a partir da Revolução Industrial, que
demoliu sociedades antigas e criou uma civilização inteiramente nova, baseada
principalmente no progresso tecnológico e no capitalismo, que passou a enfatizar
a posse do dinheiro como ferramenta para fazer mais dinheiro, houve a
contribuição para o surgimento de organizações efetivamente mais complexas
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(ALVES, 2003; CANÊDO, 1994; FERREIRA, et al. 2001; MAXIMIANO, 2000;


RECH, 2000; TOFFLER, 2001).
A complexidade organizacional resultante da evolução do processo
tecnicista e conseqüentemente da fragmentação e mecanização do trabalho
permitiu uma perspectiva empresarial mais sistemática e de longo prazo
(FERREIRA, et al., 2001). Porém, o que ocorreu, antes de tudo, “foi uma mudança
social que transformou de forma irreversível a vida dos homens, principalmente a
dos pobres e um gigantesco processo de segregação de classes” (CANÊDO,
1994, p.2).
O êxodo rural transformou homens e mulheres dos campos em
trabalhadores industriais, abarrotou e concentrou a miséria nas zonas urbanas
periféricas, manifestada pela fome, pelo frio, pela prostituição, pelo alcoolismo e
pelas condições mínimas de higiene. Tais fatos desencadearam na Inglaterra,
entre os anos 1846-1847, a morte de milhões de pessoas, situação superada
apenas pelas grandes epidemias ocorridas na Idade Média.
O deslocamento da cultura agrária em detrimento às inovações da cultura
tecnicista, iniciada no Século XVII e marcante nos Séculos XVIII e XIX, deu “forma
e vigor à sociedade industrial conhecida atualmente” (Idem, ibidem, p.7) e
suscitou, segundo Castilho (1997), diversos questionamentos entre trabalhadores,
pensadores, teólogos e também entre alguns empresários do Século XIX. Assim,
dos modelos organizacionais que emergiram na época, a Cooperativa, nos moldes
atuais, diferenciou-se dos demais por ter como objetivo o fortalecimento
econômico de uma determinada classe trabalhadora. Por meio de um acordo de
colaboração voluntária entre si, os operários com atividades de trabalho em
comum buscavam solucionar problemas e satisfazer as necessidades individuais e
coletivas.
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2.1 DEFINIÇÕES DE COOPERAÇÃO, COOPERATIVISMO E COOPERATIVA

Compreensão mais clara e transparente referente a qualquer assunto que


se deseja abordar requer definição de determinados termos; por isso, considerei
importante neste estudo definir cooperação, cooperativa e cooperativismo.

2.1.1 Definição de Cooperação

Cooperar ou cooperare (cum e operari), verbo de origem latina, significa,


segundo Novo Aurélio (2004, p.45), “obrar simultaneamente para o bem público,
trabalhar em equipe, ajudar, auxiliar”. Dele derivam os substantivos cooperação,
cooperativismo e cooperativa.
Conforme Pinho (1966, p. 43), “cooperação é uma forma de integração
social e pode ser entendida como ação conjugada de indivíduos, para alcançar o
mesmo objetivo”. Representa, pois, um amadurecimento do trabalhador.
Concordando com Pinho, Gonçalves (2003), salienta que o amadurecimento
acontece quando o trabalhador desloca sua atividade de assalariado para a
atividade autônoma (liberdade), que lhe permite, então, flexibilização e reflexão
sobre sua própria realidade.

2.1.2 Definição de Cooperativa

Há várias definições para cooperativa; entretanto, neste estudo, apresento


as discutidas por Benato (2004), Pinho (2004) e Ricciardi et al. (2000).
Para Pinho, as cooperativas são “sociedades de pessoas organizadas em
bases democráticas, que visam não só suprir seus membros de bens e serviços,
como também realizar determinados programas educativos e sociais” (PINHO,
2004, p.124). Enquanto para Benato, uma cooperativa “é uma sociedade de
pessoas, de caráter social, sem objetivo de lucro, formada e dirigida pelos próprios
cooperados, que têm igualdade de direitos, com o objetivo de desenvolver sua
atividade econômica, eliminando os intermediários e valorizando o
cooperado/sócio através do processo produtivo” (BENATO, 2004, p.61). Já para
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Ricciardi et al., uma cooperativa “é a reunião de pessoas dispostas a utilizar seus


recursos (capital) e dedicar seus talentos (trabalho) com a intenção de oferecer à
sociedade os resultados que conseguirem alcançar (produtos ou serviços)”.
Porém, para esses autores, “como ninguém constitui um empreendimento para
jogar tempo, suor e dinheiro pela janela”, os cooperados necessitam ser
remunerados com um valor acima do investido na produção. Esse valor no
cooperativismo denomina-se sobra (lucro) (RICCIARDI et al., 2000, p.74).
Então, uma cooperativa é um empreendimento entre pessoas do mesmo
ramo de atuação ou com os mesmos interesses e aspirações que se unem por
meio da ajuda mútua para obter melhores condições sócio-econômicas, culturais e
oferecer à sociedade seus talentos na forma de trabalho, produtos ou serviços.
Sem objetivo de lucro, são estabelecidas juridicamente e administradas
democraticamente pelos sócios.

2.1.3 Definição de Cooperativismo

Há diversas definições para cooperativismo; no entanto, considerei para


este estudo as definições de Alves (2003) e de Rios (1998).
Para Alves, “Cooperativismo é fundamentalmente um estado superior de
consciência ao qual todos podem ter acesso” (ALVES, 2003, p.11). Refere ainda
que:
[...] o cooperado apropria-se do outro lado da relação econômica,
tornando-se simultaneamente sujeito ativo e passivo da mesma,
ocupando ao mesmo tempo os postos de produtor e consumidor
de bens/serviços, sendo empregado de todos, mas patrão de si
mesmo, o que faz o cooperativismo um singular Sistema
Econômico Quântico, capaz de apresentar resultados
matematicamente superiores de prosperidade com eqüidade, ao
permitir que o cooperado ocupe e domine harmoniosamente duas
posições ou espaços supostamente antagônicos, sem o que
existiriam em permanente disputa (Idem, ibidem, p.25).

Para Rios (1998), Cooperativismo é:


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[...] uma doutrina econômica estruturada para a geração de


riquezas através do livre associativismo entre as pessoas que
espontaneamente concordam em criar uma cooperativa em
qualquer segmento produtivo permitido pela legislação e, unidas
pelos mesmos ideais e tendo os mesmos objetivos, buscam
satisfazer suas necessidades financeiras e de realização
pessoal/profissional através da produtividade e da valorização
humana e não da exploração do homem pelo homem. O
cooperativismo é a ‘alma’ da cooperativa, assim como o
mercantilismo é a ‘alma’ do capitalismo (RIOS, 1998, p.21-2).

O cooperativismo é “uma doutrina econômica”, a qual todos têm acesso, e


se harmonizam nos dois lados da relação empregado/patrão, pois os sócios desse
tipo associativo são ao mesmo tempo donos e empregados. Fundamenta-se no
reconhecimento do direito de igualdade de cada um (eqüidade), estruturado para
gerar riquezas aos seus associados.

2.2 ORIGENS E EVOLUÇÃO DO COOPERATIVISMO NO MUNDO

Desde as primeiras manifestações nitidamente humanas, o homem,


buscando proteção e amparo frente às forças da natureza e das ações de outros
homens, ou guiado e atuando por seu instinto de preservação, deu-se conta da
necessidade de unir-se com o fim de obter bens e serviços indispensáveis para
ocupar lugar de importância no contexto da vida planetária (CAPRA, 1996; 2002;
MORIN, 2002). Ao assentar-se em determinados locais, explorando a terra de
uma maneira mais previsiva e permanente, a cooperação entre os indivíduos
converteu-se em uma ação muito mais complexa. Na verdade, o homem primitivo
era cooperador por natureza e, tanto o trabalho quanto seus frutos, incluindo os
bens necessários para obtê-los, era de índole coletiva (CAPRA, 1996; 2002).
Do ponto de vista econômico, a Antigüidade caracterizou-se pela
escravidão e dominação; portanto, as associações de trabalho só poderiam existir
de uma ação forçada e, por conseguinte, as associações econômicas livres não
poderiam desenvolver-se (MLADENATZ, 2003).
A pré-história do cooperativismo não foi estudada sistematicamente até o
momento; porém, foram encontradas, conforme Mladenatz, formas de
associações econômicas primitivas semelhantes às cooperativas em diversas
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culturas no decorrer da evolução social, cada qual no seu tempo, representando


uma necessidade coletiva à solução de problemas econômicos baseados na ajuda
mútua. Outros autores também concordam com Mladenatz, afirmando que, ao
longo da história da humanidade, essas formas primitivas de associações se
fizeram presentes (ALVES, 2003; BENATO, 1999; MARTINS, 2003; RECH, 2000;
RIOS, 1998).
Assim, os babilônios conheceram organizações para a exploração em
comum da terra; os gregos e os romanos possuíam sociedades de funerais e de
seguros de pequenos artesões, baseadas na ajuda mútua, enquanto que os
egípcios desenvolveram associações encarregadas de regular as atividades
comerciais na busca de amparar os seus interesses em comum. Os ágapes dos
primeiros cristãos, citados nos Atos dos Apóstolos da Bíblia, tinham por objetivo
atender às necessidades de consumo de seus integrantes.
A utilização coletiva das pastagens e da criação de gado pelos antigos
romanos; as antigas associações de pescadores que ainda existem em nossos
dias, as queijarias francesas das regiões do Jura e da Savóia, que se consistem
de associações de fabricantes dos famosos queijos gruyère, grandes como rodas,
e as associações de mulheres armênias para a fabricação de laticínios, queijo e
manteiga são consideradas formas primitivas de cooperativas. As comunidades
agrícolas coletivas – a zadruga entre os sérvios e o mir entre os russos –, as áreas
comunais – campos, bosques, pastagens –, exploradas em comum pelos
moradores das terras de domínio senhorial do castelo medieval, também são
consideradas demonstrações de ajuda mútua às soluções de problemas coletivos.
As associações cooperativas de trabalho e crédito, durante a dinastia
Chou, limitadas a um pequeno grupo de membros de uma comunidade na China
do Século XIII; o asseguramento de mercadorias por parte dos mercadores e
navegantes fenícios do Século XV - origem do seguro coletivo atual –, as
organizações agrícolas nas civilizações pré-colombianas – principalmente entre os
Incas e os Aztecas –; as Missões dos jesuítas no Paraguai, as Caixas de
Comunidade na época da colonização espanhola na América do Norte e as
colônias com o caráter religioso dos imigrantes na América do Norte, demonstram
que a cooperação é uma atividade humana tão antiga quanto sua existência.
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2.3 DOUTRINA DO COOPERATIVISMO

Segundo Pinho, a Doutrina do Cooperativismo “é uma proposta de


mudança do meio econômico-social, que se concretizará de modo pacífico e
gradativo, por meio de cooperativas de múltiplos tipos” (PINHO, 2001, p.13).
Edoward de Boyve, Auguste Fabre e Charles Gide iniciaram a elaboração das
doutrinas cooperativistas em 1886, na Escola de Nimes, na França. Em resposta
aos questionamentos e discussões referentes aos problemas sociais daquela
época, o objetivo doutrinário daquela escola era transmitir o cooperativismo
(PINHO, 1977).
O principal articulador da Escola de Nimes, segundo Pinho (1977), foi
Charles Gide (1847-1932), professor de economia política da Universidade de
França, que desde 1885 já difundia as idéias do cooperativismo no sentido de
justiça e da solidariedade humana.Toma-se como exemplo o II Congresso de
Cooperativas de Consumo, realizado na França em 19 de setembro de 1886,
quando Gide, em seu discurso em nome da justiça e da solidariedade, condenou o
trabalho assalariado, traçando, dessa maneira, linhas gerais para o
cooperativismo, que se tornou uma espécie de programa oficial para o movimento
cooperativista francês.
Contudo para Benato, “as idéias de Gide, considerado o ‘Chefe da Escola
de Nimes’, foram mais amplas ao salientar que o cooperativismo é um movimento
que atinge não somente os trabalhadores, mas também se alastra para atingir
todas as camadas sociais”. Ainda, segundo esse autor, Gide pregava em sua
teoria que o “cooperativismo visa o homem como objetivo maior, pois esse além
de ser trabalhador é também o consumidor” (BENATO, 2004, p.29).
Gide fundamentava sua teoria na união dos consumidores em
cooperativas que absorveriam todas as atividades econômicas, isto é: primeiro as
cooperativas constituídas forneceriam víveres, vestimentas, artigos do lar e outros.
Depois, elas próprias fabricariam essas mercadorias e as distribuiriam e, numa
terceira etapa, buscariam a exploração agrícola cujo objetivo seria abastecer as
cooperativas de consumo (BENATO, 2004). Assim, “em um plano mais avançado,
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as cooperativas criariam condições para a concretização da substituição do


sistema capitalista pelo cooperativismo” (GONÇALVES, 2003, p.15).
Os debates de Gide na Escola de Nimes e seus trabalhos de
sistematização das idéias cooperativas e de proposta de um cooperativismo
internacional deram a ele o papel de grande sistematizador da Doutrina
Cooperativa, no final do Século XIX, em todo o Século XX, permanecendo ainda
no Século XXI. Segundo Laidlaw (1980, p.49), citado por Gonçalves (2003, p.15),
“são poucos os que acreditam nesse tipo de sistema em nível macroeconômico”.
Acredita-se que o movimento adapta-se aos sistemas vigentes e até mesmo
possa coexistir, como uma ponte, entre o sistema público e o privado.
De acordo com a Organização Cooperativista Brasileira (OCB), o
movimento cooperativista expande-se em maior ou menor grau por todo o planeta,
cujas variadas nuances encontram-se de acordo com as diversas culturas e
sistemas econômicos existentes na atualidade (OCB, 2004).

2.4 VALORES DO COOPERATIVISMO

Valor é o modo de ser. “No caso de uma organização, o valor é o modo de


ser da instituição” (IRION, 1994, p.39). Ainda segundo Irion, “a base do
cooperativismo é formada por cinco valores: democracia, liberdade, eqüidade,
justiça social, e solidariedade” (Idem, ibidem, p.40), dos quais derivam os
princípios cooperativistas que abordo a seguir, conforme fundamenta Benato em
sua obra o ABC do Cooperativismo.

2.5 PRINCÍPIOS DO COOPERATIVISMO

Princípios são “os modos de agir ou de se pôr em prática o valor da


instituição” (IRION, 1994, p.39). Eles remontam da criação da primeira cooperativa
de consumo em Rochdalle, 1844. Desde então, foram realizadas revisões sob o
enfoque de que a situação econômica não era mais a mesma de 1844,
culminando com a que conhecemos atualmente.
29

As revisões foram iniciadas em 1988 e findaram em setembro de 1995,


quando foram apresentadas no XXXI Congresso da Aliança Cooperativa
Internacional (ACI), realizado em Manchester, Inglaterra (BENATO, 2004). A
revisão de 1995, assim chamada, examinou as questões da identidade
cooperativa, o crescimento quantitativo e empresarial dessas organizações e a
substituição dos valores básicos do cooperativismo pela eficiência econômico-
administrativa, resultante da necessidade de encontrar respostas eficazes ao
crescente desafio de um mercado extremamente competitivo e monopolista,
conseqüente ao surgimento das grandes empresas multinacionais (GONÇALVES,
2003).
Os princípios aprovados como linhas orientadoras à prática dos valores
cooperativos descrevo a seguir, conforme Benato (2004, p.37-59).

Adesão livre e voluntária. “Cooperativas são organizações voluntárias,


abertas a todas as pessoas aptas a usar seus serviços e dispostas a aceitar as
responsabilidades de sócio, sem discriminação social, racial, política ou religiosa e
de gênero” (BENATO, 2004, p.37). A adesão sem qualquer discriminação e a
permanência das pessoas é livre, desde que os objetivos sejam os propostos pelo
Estatuto da Sociedade, pois esse é a lei maior, já que se encontra atrelado à Lei
das Cooperativas.
A Adesão livre e voluntária deriva do valor “liberdade” [grifo da autora]
(IRION, 1994, p.40).

Controle democrático pelos sócios. “As cooperativas são organizações


democráticas controladas por seus sócios, os quais participam ativamente no
estabelecimento de suas políticas e na tomada de decisões. Homens e mulheres,
eleitos como representantes, são responsáveis para com os sócios” (BENATO,
2004, p.40).
A cooperativa é uma sociedade voltada para os sócios. Cada associado
possui direito apenas a um voto; ou seja, a uma decisão. Segundo Benato (ibidem,
p.42), “os dirigentes relapsos ou incapazes podem ser destituídos pelos demais
sócios”. É vedado nesse tipo de sociedade oportunizar vantagens a alguns ou a
30

alguém, já que todos, ao serem donos do mesmo negócio, possuem igualdade


tanto de direitos quanto em responsabilidades, independentemente do valor do
capital investido.
O Controle democrático pelos sócios deriva do valor “democracia” [grifo
da autora] (IRION, 1994, p.40).

Participação econômica dos sócios. Todos “os sócios contribuem de


forma eqüitativa e controlam democraticamente o capital de suas cooperativas.
Parte desse capital é propriedade comum das cooperativas. Usualmente, os
sócios recebem juros limitados (se houver algum) sobre o capital, como condição
da sociedade” (BENATO, 2004, p.43).
Se a cooperativa for bem gerida, poderá obter sobras, destinadas aos
seguintes propósitos: “desenvolvimento das cooperativas, possibilitando a
formação de reservas, parte dessas podendo ser indivisíveis e parte retornando
aos sócios na proporção de suas transações com as cooperativas e apoio a outras
atividades que forem aprovados pelos sócios” (Idem, ibidem, p.43).
A participação econômica dos sócios deriva do valor “eqüidade” [grifo da
autora] (direito de igualdade de cada um) (IRION, 1994, p.40).

Autonomia e independência. “As cooperativas são organizações


autônomas para ajuda mútua controladas por seus membros” (BENATO, 2004,
p.49). São controladas pelos donos, e qualquer condição ou acordo firmado com
outras organizações, inclusive governamentais, deve ser feito de modo que o
controle seja mantido pelos sócios. Adotam como princípio a neutralidade política,
religiosa e social, pois têm por finalidade evitar os confrontos que podem resultar
em fissura, estremecimento e até mesmo em desagregação. A neutralidade
resulta da solidariedade, da livre expressão e do valor que se dá ao homem pelo
que ele é.
Autonomia e independência derivam do valor “justiça social” [grifo da
autora] (IRION, 1994, p.40).
31

Educação, treinamento e informação. A educação cooperativista dos


sócios, dirigentes, administradores, funcionários e da comunidade em geral é um
dos objetivos permanentes desse tipo de organização. Desde os Probos de
Rochdalle, “a educação prepara o homem para a liberdade e para a cidadania”
(BENATO, 2004, p.52). Torna-o participativo, receptivo a novas tecnologias, a
novos conceitos e a novas regras de mercado. Torna o ser humano mais
comprometido com o sistema, transformando-o num “defensor intransigente do
postulado cooperativo” (Idem, ibidem, p.53). Enfim, “a educação molda o homem
para a sociedade, para a igreja, para a família, para si próprio, [...] tornando-o mais
eficaz e dinâmico” (Idem, ibidem, p.54).
A Educação, treinamento e informação derivam do valor “justiça social”
[grifo da autora] (IRION, 1994, p.40).

Cooperação entre cooperativas. A interação, colaboração recíproca no


sentido de ajuda mútua entre as empresas cooperativistas, é uma visão de
conjunto. Ao interagir, as cooperativas integram-se, reduzem custos operacionais,
estruturais, financeiros e, conseqüentemente, beneficiam diretamente os sócios e
fortalecem o sistema.
A cooperação entre cooperativas deriva do valor “solidariedade” [grifo da
autora] (IRION, 1994, p.40).

Preocupação com a comunidade. Os princípios norteadores do


cooperativismo envolveram a sociedade de um modo geral a partir do XX, a partir
do Congresso Internacional realizado em Manchester, Inglaterra, em setembro de
1995 (BENATO, 2004).
Os benefícios da ajuda mútua foram estendidos a todos os povos. Isto é,
por ser sócio desse tipo de sistema possuidor de maior cultura associativista, a
preocupação com a sociedade em termos de cultura, solidariedade, educação,
participação, comprometimento e de responsabilidade passou a ser mais um dos
objetivos do cooperativismo. Nesse sentido, as cooperativas trabalham para o
bem estar comunitário, por meio de programas socioculturais que podem ser
realizados em parceria com o Estado ou outras entidades não cooperativistas.
32

A preocupação com a comunidade deriva do valor “solidariedade” [grifo


da autora] (IRION, 1994, p.40).
De acordo com Gonçalves, “a Aliança Cooperativa Internacional (ACI)
considera dupla a natureza desse tipo associativo. É ao mesmo tempo social e
econômica. Social porque é formada por pessoas que participam da sociedade e
Econômica enquanto busca resultados positivos, sob a ótica econômica”
(GONÇALVES, 2003, p.19).

2.6 NASCIMENTO DO COOPERATIVISMO MODERNO

O cooperativismo moderno sistematizou-se principalmente nos países da


Europa, no Século XIX, afetados pelas conseqüências adversas, causadas pela
Revolução Industrial, que não só modificou as características da produção
industrial, como também empobreceu os trabalhadores. Pauta-se em razões
sociais, econômicas e utópicas de uma classe que procurou otimizar recursos
próprios para viver com dignidade; ou seja, baseou-se, em pensamentos cheios
de ideais de justiça e da esperança de se alcançar um futuro melhor.

2.7 PRECURSORES DO COOPERATIVISMO MODERNO

O cooperativismo moderno teve como precursores “os utopistas que,


desde a segunda metade do Século XV até meados do Século XVII, escreveram
sobre organizações futuras constituídas de maneira racional” (MLADENATZ, 2003,
p.27).
Em A Utopia, de Thomás Morus (1478–1535) e A Cidade do Sol, de
Tommaso Campanella (1568–1639), sociedades perfeitas nas quais não havia
miséria e propriedade privada. Os dirigentes eram escolhidos pelo povo, enquanto
que as necessidades da população proviam do poder público. As obras ensejam
um desejo de organizar a sociedade de forma mais justa, eliminando as diferenças
de ordem econômica e social por meio da apropriação e do trabalho coletivo.
Contudo, o cooperativismo, que se propõe à transformação
sócioeconômica, baseado em associações a serviço dos trabalhadores, nasceu de
33

importantes debates nos círculos econômicos, sociais, religiosos, trabalhistas e


intelectuais dos Séculos XVII, XVIII e mais contundentemente no Século XIX
(RECH, 2000; RIOS, 1998). Tanto os donos de capital quanto aqueles que
dirigiam empresas e igrejas se deram à tarefa de refletir sobre a realidade que
estavam vivendo. Nesse sentido, formularam propostas que iam desde a
transformação parcial dos modos de operação até a construção de novos modelos
de sociedade. Segundo Mladenatz (2003), destacam-se entre os pensadores
sociais: Peter Cornellius Plockboy; John Bellers (1654–1725); Roberto Owen
(1771–1858); François Marie Charles Fourier (1772–1837); William King (1780–
1865); Phelippe Josephn Benjamins Buchez (1796–1865), Louis Blanc (1812–
1882). Concordando com Mladenatz (2003), Ricciardi (1990) considera também
Pierre Joseph Proudthon (1809–1865) como mais um dos idealizadores do novo
modelo sócio-econômico, o modelo de mútua ajuda, a empresa cooperativa.
Peter Cornellius Plockboy era holandês de nascimento, estabelecido na
Inglaterra. Em 1659, publicou um panfleto que estabelecia uma ligação orgânica
entre a agricultura e a indústria numa economia coletiva. Sonhava com uma
associação econômica que preservasse a propriedade individual, onde a
exploração de uns pelos outros fosse abolida (MLADENATZ, 2003).
John Bellers era inglês, e pertencia a uma seita religiosa de puritanos
ingleses que se autodenominavam “os filhos da luz”. Propôs as “colônias
cooperativas de trabalho (a Colledge of Industry)”. Nelas, os ricos teriam lucros, os
pobres, bem estar, e os jovens, uma boa educação. Propunha a união da indústria
e da agricultura, permitindo assim uma lavoura mais racional. O excedente da
produção seria utilizado para equipar e aumentar a colônia. O lucro era, segundo
ele, calculado no fim do ano e repartido proporcionalmente ao capital aplicado de
cada depositante. Os operários associados não recebiam em dinheiro, mas
somente o suficiente para sua subsistência. Isso demonstra a importância que
Bellers dava ao trabalho, pois para ele era o trabalho e não o dinheiro que
constituía a verdadeira riqueza de uma nação (Idem, ibidem).
Robert Owen, considerado o pai do cooperativismo moderno, era natural
de Newton, norte do País de Gales, Inglaterra, e embora tenha tido uma origem
modesta, tornou-se sócio de uma grande empresa de tecelagem em New Lanarck,
34

Escócia. Observando a miséria, os maus tratos dados aos trabalhadores e os finos


cuidados que se dispunham às máquinas, iniciou um projeto de reforma social e
tomou medidas de ordem prática nesse sentido. Entre as diversas ações por ele
estabelecidas, a primeira delas foi a redução da jornada de trabalho de 17 para 10
horas por dia. A seguir, proibiu o trabalho de crianças menores de 10 anos e
assegurou-lhes o ensino gratuito. Contatou com diversos empresários, a fim de
lhes sensibilizar e, envolvê-los na nova política social. Assegurou aos operários
moradia e víveres de boa qualidade a preços razoáveis, pois entendia que a
“máquina viva” deveria ser tão bem cuidada quanto a outra. A resposta a essas
medidas foi um inesperado aumento dos resultados da empresa (Idem, ibidem).
Robert Owen preconizava a abolição da propriedade privada, de modo
que, em seu projeto de reforma social, a criação de comunidades baseava-se na
idéia da propriedade coletiva auto-sustentável; ou seja, nelas deveriam ser
produzidos tudo que fosse necessário para a sobrevivência da colônia. Combatia
também o lucro e a concorrência por considerá-los uma chaga social, pois, na
busca do ganho, “os bens econômicos seriam vendidos a um preço mais elevado
do que o preço de custo, que é o preço justo. O lucro, pois, seria injusto. Daí sua
teoria de troca equânime” (MLADENATZ, 2003, p.39). Valorizava o trabalho já
que, para ele, o valor de um produto é a combinação de duas ações: a manual e a
mental do ser humano que, num determinado momento, disponibiliza-se para
elaborar um determinado produto.
Robert Owen “é considerado o pai da cooperativa inglesa, bem como do
cooperativismo moderno” (MLADENATZ, 2003, p.35). Embora, tenha sido
amplamente contestado, contribuiu de maneira importante para a formação da
idéia cooperativista. Também “foi o primeiro a emitir a idéia de uma organização
internacional do movimento cooperativo”. [...] Fundou em Londres, em 1835, a
Associação de Todas as Classes e de Todas as Nações (Association of Class of
All Nation), cujo objetivo era contribuir para colocar em prática o seu sistema
social” (Idem, ibidem, p.141-2).
Embora, a ação iniciada por Robert Owen não tenha sido continuada,
assim que foi emitida, a idéia de uma união permanente internacional não foi
perdida, de modo que, em 19 de agosto de 1895, em Londres, delegados das
35

cooperativas de produção, crédito e consumo criaram a Aliança Cooperativa


Internacional (ACI).
Willian King era inglês e exercia a medicina em Brighton. Tinha por
objetivo “tirar as classes operárias do estado de miséria e de dependência em que
se encontravam em relação às classes capitalistas” (MLADENATZ, 2003, p.45);
assim, só a cooperativa lhes daria a possibilidade de criar uma vida independente.
Na verdade, o fundamento social e econômico da teoria cooperativa de William
King consistia na organização da força do trabalho; no interesse daqueles que
forneciam o trabalho; na libertação do estado de dependência do trabalhador em
relação ao fator capital, permitindo que os operários por meio da acumulação de
um capital próprio e coletivo organizassem essa força em seu próprio interesse.
François Marie Charles Fourier era francês, filho de um rico
comerciante, pensador e autodidata. Perdeu sua fortuna em uma especulação
desastrosa, o que o forçou a viver modestamente como empregado do comércio.
Possuía uma vida equilibrada de burguês que contrastava com sua obra audaz e
cheia de fantasia (idem, ibidem).
Assim como Robert Owen, François Marie Charles Fourier entendia que a
solução do problema social constituía-se na organização coletiva da vida em
comum dos seres humanos. Insistia “no fato de que os grupos econômicos a
serem criados só dariam bons resultados se fossem formados por diferentes
membros pertencentes a todas as classes sociais, os quais denominou ‘falanges’,
evocando as invencíveis falanges da armada macedônica” (MLADENATZ, 2003,
p.52). Para ele, a reunião dos diferentes caracteres humanos anularia seus
defeitos e, portanto, contribuiria harmoniosamente com os interesses desse tipo
de organização social. Organizadas – em completa harmonia –, as colônias não
necessitariam de meios de coerção, nem de um poder administrativo. Segundo
Fourier, os chefes das falanges seria eleitos e suas atribuições seriam honoríficas.
Valorizava o trabalho, porém considerava que esse deveria ser atrativo e em
séries, “cada um passando de uma espécie de trabalho a outra, e isso livremente”,
resultando daí a tão considerada harmonia (MLADENATZ, 2003, p.53). Atribuía
elevada importância ao trabalho agrícola e acreditava que o industrialismo era
uma recente quimera científica. Para ele, o trabalho atrativo só poderia ser
36

realizado por meio da associação e o salário deveria desaparecer; ou seja, o


trabalhador associado seria remunerado conforme a sua produção.
François Marie Charles Fourier diferenciou-se de Robert Owen não pelas
ações, apenas por expor seus pensamentos. A reforma social por ele preconizada
deveria concretizar-se pelas doações filantrópicas e sem a intervenção do poder
público. Como as associações deveriam realizar-se por meio do capital
filantrópico, elas não possuíam um caráter puramente cooperativo, pois como não
havia capital dos próprios associados, não havia, portanto, a idéia de auto-ajuda.
Nela, mantinha-se a propriedade individual, a hereditariedade, o lucro e uma vida
coletiva com diferenças na maneira de viver. Mantinha-se também o lucro do
capital, conduta condenada pela entidade cooperativista.
Idealizava um local – o falanstério - onde o camponês traria seus produtos
que seriam conservados em boas condições até a venda, podendo o produtor
receber um adiantamento, a juros baixos, equivalente a dois terços dos produtos
depositados (MLADENATZ, 2003). Nesse ambiente, reunir-se-iam “sem qualquer
tipo de coerção os donos dos meios de produção, operários, comerciantes, etc.”
(PINHO, 2004, p.188). A proposta do ponto de vista social, era que pessoas de
diferentes origens pudessem compartilhar sentimentos de solidariedade e, do
ponto de vista econômico, haveria um mínimo de despesas para se desfrutar um
máximo de conforto. Na verdade, o que François Marie Charles Fourier propunha
“era o fim da concorrência, dos abusos e da exploração, provocada pelo ambiente
anárquico e atomizado do capitalismo” (Idem, ibidem, p.189).
Phelippe Josephn Benjamins Buchez foi discípulo de Saint-Simon
(1760–1825), que preconizava a reorganização da vida sócioeconômica por meio
da transformação social dos homens. Uma espécie de socialismo do Estado
intervencionista, hierarquizado e inspirado no amor ao próximo (MLADENATZ,
2003). Para Saint–Simon, a sociedade deveria ser constituída por uma grande
associação industrial, a qual seria dirigida pelos capitães da indústria que
dividiriam as responsabilidades administrativas entre os demais membros
qualificados dessa mesma sociedade (Idem, ibidem).
Nesse tipo social, a propriedade privada, mesmo útil à coletividade, não
perdia a sua identidade privada. O direito de herança que cabe ao Estado seria
37

abolido, e os fundos por ele obtidos seriam empregados em benefício do trabalho


associado e depositados em um banco central.
Em decorrência das tendências panteístas de Saint-Simon, Phelippe
Joseph Benjamins Buchez separa-se dessa escola, expondo suas idéias em
periódicos que influenciaram os meios operários franceses daquela época. Para
esse pensador, nem o Estado, nem a filantropia deveriam intervir. Assim, os
trabalhadores constituiriam sua associação por categoria profissional do ramo de
produção, mediante a entrega dos instrumentos e das pequenas somas que
dispunham. Segundo Mladenatz, Phelippe Joseph Benjamins Buchez era um
idealista social, cuja visão voltava-se para um futuro melhor da classe
trabalhadora, sobretudo a dos pequenos artesãos (MLADENATZ, 2003).
Assim, nas cooperativas por ele preconizadas e criadas, o capital social
acumulado seria inalienável, indissolúvel e indivisível; ou seja, a sociedade tornar-
se-ia perpétua porque permitiria a admissão contínua de novos membros: “o
capital não pertenceria a ninguém e não estaria sujeito às leis sobre herança”
(Idem, ibidem, p.62). O fundo indivisível destinar-se-ia à “reforma da sociedade
com base nos princípios cooperativos, graças à transferência dos meios de
produção para as mãos dos operários” (Idem, ibidem, p. 63). Defendia também
que as sobras proporcionais ao trabalho produzido deveriam retornar aos
operários, e que toda a acumulação do capital social deveria ser administrada por
um Banco Estatal do Trabalho.
Louis Blanc era francês e, conforme Mladenatz, “foi um agitador político,
um homem de ação, tribuno do povo”. Defendia a associação na organização do
trabalho, entendida como uma verdadeira cooperativa no “sentido moderno do
termo”. Segundo Louis Blanc, a associação universal assegura ao homem o direito
ao trabalho e à sua existência. Para ele, o Estado deveria financiar a criação da
nova célula do sistema econômico – a oficina social – que seria formada por
operários de uma mesma indústria fundamentada na democracia sob o espírito da
solidariedade e da fraternidade. Elas seriam organizadas por estatutos próprios,
sobre o princípio da igualdade, segundo o qual as sobras líquidas seriam dividas
em três partes. Uma primeira parte destinar-se-ia a ressarcir o Estado; uma
segunda parte seria dividida entre os operários e a constituição de um fundo de
38

assistência social; o restante seria capitalizado tendo em vista o fortalecimento da


organização. Dessa maneira, Louis Blanc pode ser considerado o precursor das
cooperativas de trabalho e das de produção industrial (Idem, ibidem).
Pierre Joseph Proudhon, também francês, escritor, contabilista e
produtor de uma obra valiosa acerca das questões sócioeconômicas, preocupava-
se especialmente com o problema do crédito. Ao considerar que o juro sobre os
empréstimos era um dos principais vícios da economia, preconizou o crédito
gratuito.
Na busca do equilíbrio das forças econômicas e da mudança da ordem
social, Pierre Joseph Proudhon defendia a mutualidade (princípio da ajuda mútua)
em suas propostas de organização econômica da sociedade. Nesse sentido, foi o
primeiro autor a utilizar a expressão crédito mútuo. Colocou em relevância o
princípio da eqüidade ao argüir que os direitos individuais deveriam ser
preservados em equilíbrio com as relações sociais.
Assim sendo, os precursores da ideologia cooperativista moderna, tanto
nas idéias quanto nas obras, tiveram como inspiração a transformação
sócioeconômica provocada pelo deslocamento da cultura agrária às inovações da
cultura tecnicista (CANÊDO, 1994).

2.8 REALIZADORES DOS SISTEMAS COOPERATIVOS MODERNOS

O fundamento da doutrina cooperativista resultou do desejo de se


estabelecer uma nova ordem econômica e social atrelada a diversas tentativas de
aplicação prática dos pensadores sociais, como já descrevi anteriormente.
Entretanto, o sucesso dessas tentativas ocorreu de modo contundente apenas no
Século XIX com a criação das primeiras cooperativas de consumo, idealizadas
pelos pioneiros de Rochdalle, e as cooperativas de crédito que sucederam essas
primeiras. A seguir, descrevo de forma sucinta a história e as práticas dos
principais idealistas.
39

2.8.1 Os Pioneiros de Rochdalle

Foi num cenário de adversidades econômicas e sociais que, em meados


do Século XIX, nasceram os primeiros Princípios Cooperativos, conhecidos como
Princípios de Rochdalle, em referência à cidade da Grã Bretanha, Inglaterra, na
qual foram escritos. Desses princípios surgiram várias tendências de
cooperativismo: produção, autogestão, cooperativas de seguros, entre outras
(PINHO, 2004; RECH, 2003; RIOS, 1998).
Em 24 de outubro de 1844, em Rochdalle (distrito de Lancashire,
Manchester – Inglaterra), vinte e sete tecelões e uma tecelã, na busca de um meio
para melhorar sua precária situação econômica, fundaram a Sociedade dos
Probos Pioneiros de Rochdalle Ltda. (Rochdalle Society of Equitate Pioneers Ltd).
Com o resultado da economia mensal de uma libra de cada participante durante
um ano, em 21 de dezembro de 1844, segundo Pinho, “começou a funcionar em
Toad Lane, n. 31, Rochdalle, um armazém cooperativo que possuía capital
apenas para a compra de manteiga, farinha de trigo, aveia e vela” (PINHO, 2004,
p.259). Naquele contexto, a constituição de uma pequena cooperativa de consumo
estaria modificando o meio econômico - social da época e dando origem ao
movimento cooperativista. Tendo o homem como principal finalidade e não o lucro,
os tecelões de Rochdalle buscavam uma alternativa econômica para a
emancipação do trabalhador.
Mediante poupanças realizadas com a compra em comum de gêneros
alimentícios, construíam casas para oferecer alojamento a preço de custo. A
produção direta e econômica de tudo o que fosse necessário à classe operária
assegurava o trabalho aos desempregados ou aos mal remunerados e combatia o
alcoolismo. Criavam e multiplicavam outros núcleos, nos quais a produção e a
repartição eram rearranjadas (PINHO, 2004; HOLYOAKE, 2002).

2.8.2 Os Princípios de Rochdalle

A Livre Adesão ou princípio da porta aberta; a Gestão Democrática ou


administração dos próprios cooperados; a Distribuição das Sobras Líquidas; a
40

Taxa Limitada de Juros ao Capital Social; e a Constituição de um Fundo para a


Educação dos Cooperados e do Público em Geral foram inicialmente descritos em
1844 pelos pioneiros. Mais tarde, foram parcialmente modificados pelos
cooperados presentes nos Congressos da Aliança Cooperativa Internacional que
se seguiram. Impropriamente denominados por não representarem postulados
morais, os cinco princípios de Rochdalle representam as regras ou normas de
funcionamento da cooperativa (PINHO, 2004).

2.9 COOPERATIVISMO DE CRÉDITO

O cooperativismo de crédito foi marcado e representado por alguns


idealizadores que colocaram em prática suas idéias como: Helman Schulze-
Delitzsch (1808–1883), Friedrich Wilheim Raiffesein (1818–1888), Wilheim Haas
(1839–1913), Luigi Luzzatti (1841–1927) e Leone Wollemborg (1859–1932).
O surgimento do cooperativismo alemão deve-se aos esforços e à visão
de dois pioneiros: Helman Schulze-Delitzsch [grifo da autora] (1808–1883) e,
Friedrich Wilheim Raiffesein [grifo da autora] (1818–1888) seguidos por Wilheim
Haas [grifo da autora] (1839–1913).
As primeiras iniciativas de caráter cooperativo ocorreram em Delitzch,
próximo a Halle, na Saxônia, Alemanha, em 1849, a partir das iniciativas de
Hermann Schulze, advogado possuidor de um talento de organização
excepcional. Essa característica pessoal lhe proporcionou diversas oportunidades
como homem público. Atuou como Prefeito, Deputado e Magistrado; contudo, a
sua importância no contexto histórico do cooperativismo moderno deve-se à
criação das Sociedades de Crédito, que tinham por objetivo socorrer as classes
trabalhadoras em geral (MLADENATZ, 2003; THENÓRIO FILHO, 1999).
Como o nome Schulze era muito comum naquela região, adotou também
o nome de Delitzsch em homenagem à sua cidade de nascimento (MLADENATZ,
2003; THENÓRIO FILHO, 1999). Inicialmente, colocou em prática suas idéias
mediante a criação de uma caixa de socorro para os casos de doenças e óbitos,
cujos direitos dos membros eram iguais. Após, criou uma associação de
marceneiros para o abastecimento de matérias primas, baseada na
41

responsabilidade solidária dos sócios (MLADENATZ, 2003; THENÓRIO FILHO,


1999). Essa idéia propagou-se rapidamente na Alemanha com a característica de
associações não beneficentes. Fundamentava-se na idéia de auto-ajuda dos
associados, os quais aplicavam um capital bastante elevado. Possuíam também
um fundo de reserva limitado que era constituído das sobras líquidas obtidas pela
cooperativa, as quais eram distribuídas proporcionalmente ao capital
(MLADENATZ, 2003; THENÓRIO FILHO, 1999).
Os empréstimos eram realizados em curto prazo, de acordo com as
modalidades bancárias vigentes (MLADENATZ, 2003; THENÓRIO FILHO, 1999),
que possuíam uma característica de empresa bancária, fazendo todas as
operações em proveito de seus associados e que remuneravam seus dirigentes e
executivos (MLADENATZ, 2003; THENÓRIO FILHO, 1999). Eram
descentralizadas, fato explicável pela existência, na época, de grandes
cooperativas e empresas econômicas poderosas (MLADENATZ, 2003;
THENÓRIO FILHO, 1999).
Segundo Mladenatz (2003) e Thenório Filho (1999), Friedrich Wilheim
Raiffesein nasceu na Remânia, Alemanha, filho de agricultores. Ao assumir todos
os encargos familiares após o falecimento de seu pai, teve uma vida árdua de
homem do campo. Observava os lavradores e as dificuldades que eles possuíam
pela falta de crédito. Percebia a exploração a que eram submetidos pelos
comerciantes quando, na maioria das vezes, não conseguiam bons preços pelos
produtos. Por ter nascido no campo e por ter recebido uma rígida formação
religiosa, o sistema por ele criado foi organizado em regras adaptadas às
necessidades da agricultura e conforme o espírito religioso da época.
Assim, as cooperativas de crédito apresentam as seguintes
características:

[...] fundam-se no princípio cristão de amor ao próximo; admitem


auxílio de caráter filantrópico, embora prefiram o princípio da ajuda
mútua; dão grande importância à formação moral dos associados,
os quais se responsabilizam, de modo solidário e ilimitado, pelas
obrigações contraídas pela cooperativa; preconizam a organização
de um banco central para atender às necessidades das diversas
cooperativas de crédito; não remuneram os dirigentes da
42

sociedade; e não distribuem retorno (excedente) (THENÓRIO


FILHO, 1999, p.84).

O cooperativismo de crédito do tipo Raiffesein foi um dos mais difundidos


por todo o mundo, “pelos seus elevados princípios morais e humanísticos” (Idem,
ibidem), pois na sua concepção cooperativa, “predomina a convicção de que a
atividade econômica do homem deve sujeitar-se aos imperativos de ordem ética,
isto é, a moral cristã” (Mladenatz, 2003, p.122).

2.9.1 Outros sistemas cooperativos de crédito

Conforme as condições sócioeconômicas regionais, surgiram em


diferentes países diversos sistemas práticos de organizações cooperativas
inspirados nos modelos de Schulze-Delitzch e Raiffeisen, entre ao quais
destacam-se as cooperativas organizadas por Wilheim Haas (1839–1913), Luigi
Luzzatti (1841–1927) e Leone Wollemborg (1859–1932).
No Canadá, as Caixas Populares de Crédito Mútuo, um tipo especial de
cooperativa de crédito, foram criadas por Alphonse Desjardins (1854–1920), que
utilizou os conceitos das cooperativistas de Raiffeisen, Schulze-Dellitrzsch e
Luzzatti, somados à tradição das Caixas de Poupanças da Nova Inglaterra,
Estados Unidos da América do Norte.
Wilhelm Haas, nascido em Darmstadt, Alemanha, organizou um sistema
cooperativo em 1883, por ocasião do Congresso de Hamburgo, Alemanha. O
objetivo era consolidar a independência dos agricultores associados, aumentar o
crédito agrícola pessoal e o abastecimento em comum dos produtos necessários
ao seu desenvolvimento, valorizar os produtos do campo e, enfim, satisfazer
outras necessidades da exploração econômica.
Essas cooperativas são consideradas como um sistema cooperativo
intermediário entre Raiffeisen-Delitzsch (MLADENATZ, 2003).
• Do sistema Raiffeisen: a atividade cooperativista limita-se a um grupo
fechado e o agrupamento dessas cooperativas em federações
organizadas por regiões.
43

• Do sistema Schulze-Delitzsch: renuncia o caráter ético e cristão da


organização cooperativa, acentuando o caráter econômico da ação
cooperativista.
Luigi Luzzatti, considerado o verdadeiro fundador do cooperativismo de
crédito italiano, era um político, professor e escritor de obras econômicas e
financeiras. Em 1864, fundou, em Lodi e, em 1865, em Milão, os primeiros bancos
populares segundo o modelo de Schulze-Delitzch. Conforme Mladenatz (2003,
p.130), “ele caracteriza a cooperativa de crédito como o dinheirinho do
necessitado, que vai servir sempre ao necessitado”.
Os bancos populares de Luzzatti, embora tenham sido inspirados no
modelo de Schulze–Delitzsch, foram adaptados à realidade italiana, e
apresentavam as seguintes características:

O banco popular, mesmo se ele tem sua sede na cidade, não deve
negligenciar as necessidades da população agrícola. Luzzatti dá
maior importância ao lado moral da ação cooperativa do que
Schulze-Delitzch. [...] pensava que se poderia obter das massas
populares os capitais a partir de disposições menos severas, pela
persuasão e a liberdade, ao contrário da imposição, e que se pode
obter resultados favoráveis mesmo com capitais mais modestos.
[...] dá maior importância aos fundos de reserva, formados a partir
do levantamento parcial dos lucros anuais e que podem superar o
valor do capital social. [...] emitiu para seus bancos populares a
máxima: ‘Convertieri in capitale l’onestá’. Ele queria dizer com isso
que mesmo na ausência de um poderoso capital próprio que
formaria a base do crédito da cooperativa, essa não pode obter
créditos das caixas de poupanças e dos bancos privados e até
mesmo atrair depósitos, se criamos em volta da cooperativa uma
atmosfera moral de confiança. Ela será criada com a exigência de
sérias qualidades morais de seus membros, por uma fiscalização
recíproca de seus associados, pela escolha criteriosa dos
administradores, pela participação ativa de todos os associados na
direção e na organização da cooperativa, pela seriedade e
objetividade perfeita na atribuição de créditos, pela fiscalização
desses e, sobretudo, por operações feitas abertamente e
submetidas a cada momento ao controle e à crítica da opinião
pública. [...] Ao inverso do sistema Schulze-Delitzch, a
administração era gratuita. [...] não exclui, portanto, a ajuda do
Estado, mas não lhe dá importância primordial (MLADENATZ,
2003, p.131-2).
44

A respeito da ajuda financeira do Estado, na abertura do Congresso


Internacional, em Cremona, assim discursou Luzzatti:

Consideramos o cooperativista armado com sua potência


individual, que multiplica pela associação, como o Exército da paz
social, que se move nas primeiras linhas das grandes batalhas e
obtém grandes vitórias; o Estado é como um Exército de reserva
que em certas circunstâncias e na presença de certos eventos, se
coloca na primeira linha para ganhar o combate social, de onde se
retira de novo mais tarde (Idem, ibidem, p.132).

Nesse mesmo congresso, Luzzatti formulou o lema do cooperativismo


assim descrito: “Ajuda-te, Deus e o Estado te ajudarão” (Idem, ibidem, p.133).
Leone Wollemborg, natural de Pádova, Itália, preconizou a criação de
cooperativas de crédito do tipo Raiffeisen, que se distinguem dessas apenas pela
ausência do caráter cristão.
Alphonse Desjardins, nascido em Lévis, na cidade do Quebec, Canadá,
dedicou-se à vida jornalística e, por objetivar a “promoção de um ideal coletivo que
viesse atender aos anseios dos canadenses franceses, desvirtuados de sua
vocação rural pela pressão que sofriam com o sistema financeiro agressivo e
desumano da época, fundou em 06 de janeiro de 1900, a primeira Caixa Popular,
na cidade em que nasceu” (THENÓRIO FILHO, 1999, p.89). A Caixa Popular de
Desjardins era uma instituição que propiciava crédito oportuno e barato à classe
trabalhadora e aos pequenos agricultores. Fundamentava-se, principalmente, num
misto dos modelos Raiffesen e Luzzatti e nas Caixas de Poupança da Nova
Inglaterra, Estados Unidos da América do Norte (ROBY, 2001).
Esse tipo de sociedade, conforme Roby (2001), representava uma forma
de aplicação do auxílio mútuo à atividade econômica, com o objetivo de criar nos
associados o hábito da economia sistemática, por meio de depósitos regulares,
beneficiando-os com empréstimos a juros baixos, para atendimento das
necessidades profissionais, familiares e pessoais, e, ao mesmo tempo, educando-
os democraticamente, dentro do princípio de autogestão, com base em um só voto
por pessoa.
Assim, nasceu o cooperativismo moderno, fruto de propostas de
reformulação da sociedade, tanto no campo econômico quanto no social. No plano
45

econômico, as propostas foram apresentadas pelos opositores da Doutrina Liberal


e Individualista, impressionados pelas desastrosas conseqüências da
exacerbação da competição econômica, principalmente sobre a classe operária,
no século XIX. No social, o desejo das massas trabalhadoras por uma sociedade
mais justa, de superar as necessidades por seus próprios meios, atrelado a cruel
realidade do neoliberalismo econômico, demonstraram um profundo sentimento de
sustentabilidade em uma época em que a exploração do trabalhador imperava
como forma de captação de recursos financeiros.
Atualmente, por ser uma forma de organização sócioeconômica de
administração autogestionada, “o cooperativismo trouxe respostas para a geração
de empregos e redistrisbuição da renda. As possibilidades de aplicação das idéias
cooperativistas são ilimitadas e podem tornar-se contribuições fundamentais para
a transformação das relações de trabalho e melhoria da qualidade de vida da
população” (OCB, 2004).

2.10 O COMPLEXO MONDRAGÓN – MCC.

A Mondragón é, talvez, o exemplo mais bem sucedido de cooperativismo


em todo o mundo. O grupo teve seu início no ano de 1956, em Bilbao, Espanha,
quando cinco alunos da Escola Politécnica de Mondragón, fundada pelo Padre
José Maria Arizmendiarrieta, constituíram a primeira unidade produtiva da
entidade: uma fábrica de aquecedores. Atualmente, transformou-se em um grupo
que congrega 160 cooperativas, com mais de 60 mil cooperados, 42.000 postos
de trabalho, formando um grupo empresarial integrado por mais de 120 empresas.
Sua produção consiste desde a fabricação de autopeças a componentes
aeronáuticos, cujo faturamento encontra-se na faixa de 8 milhões de euros por
ano.
A corporação teve como bases a educação e a solidariedade. O padre
José Maria acreditava que esses eram os pontos fundamentais para o surgimento
de uma nova ordem social, mais humana e justa. A área educacional do projeto
conta, hoje, com cinco centros de formação e três de pesquisa e tecnologia.
Fazendo um paralelo com a democracia ateniense, em que o conhecimento era o
46

principal condutor do cidadão à Assembléia, o Complexo Mondragón também se


propõe a socializar o conhecimento. A educação corre em paralelo com a
democracia. Assim, o indivíduo primeiramente entra em contato com o
aprendizado para depois, criativamente, solucionar velhos problemas, elaborando
novas leis e ajudando nas decisões do grupo.
A participação dos sócios na gestão empresarial é dividida em três órgãos:
a Assembléia Geral, o Conselho Reitor e o Conselho Social. A Assembléia Geral
encarrega-se de eleger o Conselho Reitor, examinar a gestão social, aprovar as
contas e as estratégias da cooperativa. O Conselho Reitor, constituído por 12
membros, representa e "governa" a Cooperativa; e o Conselho Social atua como
órgão assessor na representação dos sócios ante as instâncias internas do MCC,
informando, negociando e elaborando novas propostas que canalizem iniciativas
dos sócios trabalhadores.
A cooperativa basca nos últimos anos expandiu seus investimentos para a
América Latina e países asiáticos. Podemos encontrar instalações desse
complexo em São Paulo, Medelim, Bogotá, Buenos Aires, Pequim, Bangkok,
Xangai, Tóquio, Nova Delli e em outros países. O crescimento do grupo vem
comprovando a qualidade de seus serviços e a importância da união, da
cooperação e, principalmente, da educação.

2.11 O SISTEMA COOPERATIVISTA ATUAL

O sistema cooperativista atualmente encontra-se organizado pelas


seguintes associações reconhecidas: a Aliança Cooperativa Internacional (ACI); a
Organização das Cooperativas da América (OCA); a Organização das
Cooperativas Brasileiras (OCB) e as Organizações das Cooperativas dos Estados
(OCEs) (PINHO, 2004).
A Aliança Cooperativa Internacional (ACI) foi fundada em 1895, por
iniciativa de líderes cooperativistas ingleses, franceses e alemães, com o objetivo
de criar um órgão representativo mundial que intensificasse o intercâmbio entre as
cooperativas dos diversos países no campo doutrinário, no educativo e no técnico
(PINHO, 2004).
47

Segundo Nicácio,

[...] a fundação da ACI foi precedida por intensos debates entre


duas correntes: a da ‘Hegemonia do Produtor’ [grifo da autora]
que pregava a transformação social por intermédio das
cooperativas de produção, que seria o instrumento de libertação
do trabalhador assalariado, com a participação dos funcionários
nos lucros das empresas e a da ‘Hegemonia do Consumidor’
[grifo da autora] que pregava a transformação social pela
organização das cooperativas de consumo, pois entendiam que
todas as pessoas são consumidoras e nem todas são
trabalhadoras, por isso, as cooperativas de consumo são mais
universais nos objetivos que defendem, e, portanto, atenderiam
aos interesses de todas as pessoas (NICÁCIO, 1997, p. 24).

De acordo com Schneider (1991), citado por Nicácio,

[...] a influência de Charles Gide (1847–1932) foi decisiva para que


a ACI acatasse a ‘Hegemonia do Consumidor’ (que é a vitória da
produção cooperativada de consumidores, com retorno
proporcional às operações) em detrimento da Emancipação do
produtor [grifo da autora] ou produção de trabalhadores
cooperativados, em retorno ao trabalho. Pois, segundo ele, as
cooperativas de produção, apoiadas pelas cooperativas de crédito,
pleiteavam apenas a reconciliação entre o capital e o trabalho,
gerando a paz social e defendendo somente os interesses dos
pequenos produtores da ameaça de se tornarem assalariados
(Schneider, citado por NICÁCIO, 1997, p.24).

Essa “associação não governamental e independente reúne, representa e


presta apoio às cooperativas e às suas correspondentes organizações. Objetiva a
integração, autonomia e desenvolvimento do cooperativismo” (OCB, 2004).

2.12 O COOPERATIVISMO BRASILEIRO: DO DESABROCHAR AO SÉCULO XXI

As intenções brasileiras de cooperação remontam ao ano de 1530, no


início da colonização portuguesa, demonstrando um processo de criação de uma
cultura cooperativista que, embora tenha sido quase que totalmente interrompida
no período escravista, emergiu no século XX, difundindo-se nos mais variados
ramos ou segmentos (PINHO, 2004).
48

Segundo Pinho, as informações atualmente disponíveis indicam que


[...] a história do cooperativismo formal no Brasil começa, de fato,
com a fundação da Sociedade Cooperativa Econômica dos
Funcionários Públicos de Ouro Preto, em 27 de outubro de 1889, a
mais antiga cooperativa de que se tem notícia no Brasil. É a
primeira iniciativa de trabalhadores livres, logo após a extinção do
escravismo, para criar uma espécie de banco sob a forma de
sociedade anônima, mas prevendo sua expansão em caixa de
auxílio e socorro na construção de casas para alugar ou vender
aos sócios, além de outras atividades, muito semelhantes aos
termos da Carta de Princípios, divulgada pelos Pioneiros de
Rochdalle quando fundaram sua cooperativa de consumo [...]
(PINHO, 2004, p.13).

Ainda conforme essa mesma autora, no Brasil, assim como na Europa, as


expressões cooperativistas de um modo geral também estavam ligadas a “anseios
de liberdade, tanto na esfera política, quanto na econômica, inspiradas no
idealismo religioso e em utopias associacionistas que vigoraram no início do
século XIX, como reação às conseqüências práticas do sistema capitalista” (Idem,
ibidem, p.14).
Conforme Veras Neto, três eventos fundamentais contribuíram para que o
cooperativismo fosse consolidado no Brasil, em resposta aos efeitos nefastos do
capitalismo da época, que não só afetou a Europa, como também as Américas. A
abolição da escravatura, a proclamação da República, em 15 de novembro de
1889, e a promulgação da Constituição da República, em 1891, foram os eventos
que impulsionaram a introdução do cooperativismo no país.
A dominação da aristocracia rural e o elevado número de mão de obra
escrava até a abolição da escravatura constituíam-se num cenário desfavorável ao
cooperativismo, já que a política aristocrata se caracterizava pela auto-suficiência
e pelo individualismo. Com a abolição da escravatura, seguida da proclamação da
República, e a promulgação da Constituição, o ambiente tornou-se favorável à
liberdade de associação (VERAS NETO, 2002).
A imigração européia, quase que totalmente constituída de italianos e
alemães, que veio em busca de trabalho, tanto nas áreas rurais quanto nas
urbanas, contribuiu para elevar o contingente populacional dos grandes centros.
As elevações da concentração demográfica desses centros provocaram no Brasil
problemas sociais semelhantes aos ocorridos na Europa (PINHO, 2001).
49

Submetidos aos mesmos efeitos do capitalismo, os trabalhadores


brasileiros, no final do Século XIX e início do Século XX, introduziram no país o
cooperativismo, inspirado no sucesso das cooperativas de crédito dos pequenos
agricultores europeus. Os principais modelos foram os de consumo, produção,
agrícola e crédito (Idem, ibidem). Mas, segundo Pinho, a criação desse tipo de
sociedade econômica encontrou diversos obstáculos, tais como “escassos meios
de transporte e de comunicação, relações de trabalho ainda marcadas pela
economia escravocrata e pelo individualismo, falta de tradição de associativismo
nas atividades econômicas etc.” (Idem, ibidem, p.4).
Inicialmente, o cooperativismo concentrou-se nas áreas urbanas sob
forma de cooperativas de consumo, objetivando reduzir os preços dos víveres
(alimentos). No entanto, como o tipo de economia brasileira era
predominantemente agrário e exportador, “os Poderes Públicos da Federação e
dos Estados incentivaram especialmente a multiplicação de cooperativas de
produtores agrícolas para aumentar a produção destinada ao consumo interno e à
exportação” (Idem, ibidem).
Assim, no início do Século XX, surgiram cooperativas de crédito agrícola,
sobretudo nas áreas de colonização alemã e italiana do sul do país. O Rio
Grande do Sul adiantou-se no processo de criação desse tipo associativo com a
instalação de cooperativas de crédito inspiradas em duas vertentes de
realizações. A primeira vertente foi criada por colonos alemães, liderados pelo
padre suíço Theodor Amstad. Em 1902, os alemães fundaram a primeira
cooperativa modelo Raiffeisen na localidade de Linha Imperial, hoje Nova
Petrópolis, Rio Grande do Sul e, em 1906, a cooperativa modelo Luzzatti, em
Lageado, Rio Grande do Sul. A segunda vertente foi orientada pelo italiano
Stefano Paternó, por delegação do Governo Federal, com a intenção de estimular
esse tipo de atividade econômica (PINHO, 2004).
Marcadas pela revolução de 1930, as cooperativas se consolidaram no
governo de Getúlio Vargas, em 1932, por meio do Decreto nº 22.239/32, artigo 24,
que reconhecia formalmente o cooperativismo. E foram quase que parcialmente
extintas, na década de sessenta do Século XX, pelo Decreto-lei nº 59 de 21 de
novembro de 1966, que reduziu os incentivos cooperativistas mediante o
50

cancelamento dos estímulos tributários, a eliminação das seções de crédito das


cooperativas mistas e a coibição da atuação das cooperativas além dos limites
municipais (VERAS NETO, 2002). A Lei 5.764, de 16 de dezembro de 1971,
também foi um mecanismo regulador da expansão cooperativista à medida que
normatizou e regulou a constituição desse tipo associativo (MARTINS, 2003).
No entanto, a legislação não foi a única causadora da limitação da
expansão do cooperativismo. Nesse mesmo período da história, segundo Veras
Neto (2002), citado por Meireles (2003), ocorreu a internacionalização da
economia brasileira, cujos investimentos nortearam a instalação de multinacionais,
principalmente do setor automobilístico norte-americano e europeu, as quais,
desde a década de cinqüenta do Século XX, pretendiam se estabelecer no país.
Paralelamente à internacionalização da economia, as transformações
ocorridas no setor agrícola, desencadeadas pela mecanização e pela criação de
grandes empresas rurais, provocaram o êxodo rural e a elevação desordenada do
crescimento urbano, onde os trabalhadores desqualificados foram atuar. Formou-
se na periferia das grandes cidades um bolsão de pessoas que contribuiu para a
formação de um verdadeiro exército de mão de obra de reserva para atividades
como a construção civil, a indústria, a economia informal e a criminalidade. Esses
fatos levaram à redução dos salários e ao enfraquecimento dos sindicatos e das
cooperativas.
Ainda conforme Veras Neto, citado por Meireles, “os superávites da
balança comercial garantiram recursos disponíveis para a compra de maquinário
para a infra-estrutura do parque eletro-mecânico-químico e petroquímico” e
também contribuíram “como o suporte para os grupos multinacionais e a expansão
do setor estatal (Eletrobrás, Petrobrás, Telebrás e Vale do Rio Doce)” (VERAS
NETO, 2002, citado por MEIRELES, 2003, p.65).
Embora as cooperativas brasileiras tenham sido pontuadas por políticas
econômicas que comprometeram a sua expansão, ao longo dos anos, evoluíram
por todo o território brasileiro, em diversos tipos de segmentos de atividades como
descrevo a seguir.
51

2.13 OS SEGMENTOS DO COOPERATIVISMO BRASILEIRO

Os segmentos do cooperativismo brasileiro foram definidos de acordo com


a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), cuja nomenclatura atual foi
aprovada em 28 de abril de 2000, em Assembléia Geral da OCB, com o “objetivo
de facilitar a organização vertical das cooperativas em federações, confederações
e centrais, tanto para sua organização política, como para viabilizar a economia de
escala e assim adquirir competitividade no mercado”. Segundo a OCB, “cada
segmento possui um representante estadua, que faz parte do Conselho de
Administração da Organização Estadual de Cooperativas, (OCE) e um
representante nacional, que faz parte de Conselho de Administração da OCB”
(OCB, 2003).

2.13.1 Cooperativas de Consumo

Desde os Probos de Rochdalle, as cooperativas de consumo têm por


objetivo fornecer gêneros alimentícios e bens de utilidade pessoal e doméstica a
preços acessíveis a seus associados. Foram introduzidas no Brasil como mais
uma forma de atividade econômica (ALVES, 2003; BENATO, 2004, PINHO, 2004).
A eliminação dos intermediários e a compra em grande quantidade
diretamente da fonte produtora reduzem os custos dos produtos de consumo,
sendo, portanto, a vantagem desse tipo associativo. Daí a necessidade da reunião
de um grande número de associados para que essas organizações consigam um
significativo capital de giro. A união permite que os associados beneficiem-se dos
preços das centrais de compras, da racionalização administrativa e contábil e que
também atinjam o estágio de produção que lhes proporcione fluxo regular de
produtos e relativa estabilidade de preços dos bens consumidos por eles
(cooperados).
As cooperativas de consumo classificam-se, conforme Benato (2004), em
fechadas e abertas.
Fechadas são as que admitem como cooperadas somente as pessoas
ligadas a uma mesma empresa, sindicato ou profissão e, geralmente, oferecem
52

dependências, instalações e recursos humanos necessários para o funcionamento


da cooperativa.
Abertas ou populares são as que admitem qualquer pessoa que queira a
elas se associar.
Atualmente, o maior desafio desse segmento encontra-se nos centros
urbanos, no atendimento às camadas populares, fazendo com que elas utilizem-se
de parcerias com lojas e supermercados para atender às necessidades dos
cooperados e da sociedade em geral. Contudo, necessitam repassar, aos
cooperados, mercadorias em quantidade, qualidade e preços favoráveis, o que só
será possível “se elas se unirem a exemplo das cooperativas européias, onde
vários países em uma central única fazem suas compras” (BENATO, 2004, p.74).

2.13.2 Cooperativas de Produção

As cooperativas de produção são associações que “produzem um ou mais


produtos em série, com toda infra-estrutura e instalações adequadas“ (Idem,
ibidem, p.72). Seus objetivos, segundo Pinho (1966), são eliminar o patrão,
suprimir o salário, fornecer aos operários os instrumentos para que eles produzam
e possuam o direito de dispor do produto do seu trabalho.

2.13.3 Cooperativas de Trabalho

As cooperativas de trabalho são constituídas por pessoas ligadas a uma


determinada ocupação profissional, com a finalidade de melhorar a remuneração e
as condições de trabalho, de forma autônoma. Consiste num segmento
extremamente abrangente, pois os integrantes de qualquer profissão podem
organizar-se em cooperativas de trabalho (OLIVEIRA, 1998; PEREIRA, 1999).
O cooperativismo de trabalho no Brasil teve inicio em 1938, com a
fundação da Cooperativa de Trabalho dos Carregadores e Transportadores de
Bagagens do Porto de Santos, existente até hoje. Contudo, esse tipo cooperativo
só foi alcançar desenvolvimento a partir de 1960 (BENATO, 2004).Todavia, o
grande desafio para o ramo é a clara identificação de suas bases legais, tanto no
53

que se refere à legislação cooperativista propriamente dita, como e,


principalmente, naquilo que possa causar qualquer confusão como as exigências
da legislação trabalhista.
Segundo Egwart, citado por Pereira (1999), diante dos níveis de
desemprego alcançados nos últimos anos, “qualquer profissional que queira
prestar serviço de forma autônoma possui esse espaço por meio de uma
cooperativa” (PEREIRA, 1999, p.13). Porém, a criação de cooperativas de
trabalho com o objetivo de burlar tanto as leis trabalhistas, quanto o fisco, com o
fim de reduzir os custos, ainda conforme Pereira, “tem denegrido o movimento das
cooperativas de trabalho” (Ibidem, p.13).

2.13.4 Cooperativas Agropecuárias

Conforme Alves, “as cooperativas agropecuárias são cooperativas de


produção que, geralmente, cuidam de toda a cadeia produtiva e englobam os
produtores rurais, agropastoris e de pesca” (ALVES, 2003, p.67). Surgiram em
Minas Gerais, em 1907, com o objetivo de eliminar os intermediários da produção
agrícola do café que, na época, além de ser o principal produto comercializado no
país, encontrava-se sob o poder de estrangeiros. Preocupado com os rumos da
comercialização do café, João Pinheiro, então Governador daquele Estado, criou
uma seção exclusiva para aquele produto, “concedendo-lhe isenções fiscais e
estímulos materiais” (BENATO, 2004, p.70).
Os Poderes Públicos da Federação e dos Estados também incentivaram
“a multiplicação de cooperativas de produtores agrícolas para aumentar a
produção destinada ao consumo interno e à exportação” (PINHO, 2001, p.14).
Assim, no sul do país, principalmente em comunidades alemães e italianas,
surgiram cooperativas agrícolas, tendo como principal divulgador o italiano
Stefano Paternó.
Tendo em vista uma estrutura nacional predominantemente agrícola, a
partir da década de quarenta até a década de sessenta do Século XX, o
cooperativismo agropecuário constituiu-se no principal representante desse tipo
associativo no Brasil. Contudo, a partir da década de oitenta do Século XX, o
54

processo inflacionário e a redução contínua dos recursos orçamentários, provocou


o fechamento do Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC) e,
conseqüentemente, o endividamento dessas associações; ou seja, provocou uma
grande crise financeira que culminou com o fechamento de muitas delas
(PANZUTTI, 1997; SILVA, 2000).
Com o objetivo de suavizar os efeitos do processo de endividamento
contínuo e reestruturar as cooperativas endividadas, o Governo Federal, ao final
da década de noventa, lançou o Programa de Revitalização das Cooperativas
Agropecuárias Brasileiras (RECOOP). O programa contemplaria a capitalização
continuada das cooperativas, inclusive prevendo a fusão, desmembramento,
incorporação ou associação a empresas não cooperativas, além da
profissionalização da gestão, organização e profissionalização dos cooperados.
Porém, para que as mesmas fossem enquadradas no RECOOP, o Governo
Federal elaborou um conjunto de exigências que beneficiou até o ano 2001
apenas um pequeno número de organizações, situado em sua grande maioria na
região sul e sudeste do país (UNIRCOOP, 2003).
As cooperativas agropecuárias, segundo Benato (2004), dividem-se
conforme os tipos dos produtos com os quais trabalham. Muitas são mistas, ou
seja, possuem mais de uma seção: a de compras em comum (para compra de
insumos, adubos, sementes, instrumentos e outros) e a de vendas em comum
(venda dos produtos dos cooperados).
Embora tenha sofrido profundos abalos em sua trajetória, “o
cooperativismo agropecuário brasileiro propagou-se por todo o território nacional,
sendo, atualmente, o segmento economicamente mais forte e o mais conhecido
pela sociedade, pois participa significativamente nas exportações, ao mesmo
tempo em que abastece o mercado interno de produtos alimentícios”. Presta um
“leque enorme de serviços, desde assistência técnica, armazenamento,
industrialização e comercialização dos produtos, até a assistência social e
educacional aos seus cooperados” (BENATO, 2004, p.70).
55

2.13.5 Cooperativas de Crédito

Conforme Nicácio (1997), o objetivo das cooperativas de crédito é fornecer


os recursos financeiros necessários aos seus sócios a custos baixos, de modo
que o lucro da atividade econômica (mercado financeiro) se reverta em benefício
dos seus associados. Essas modalidades associativas podem ser urbana ou rural
e, segundo Benato, “classificam-se em cooperativas de crédito rural; de crédito
mútuo e de crédito popular” (BENATO, 2004, p.71).
1 Crédito Rural. Sob a inspiração do Padre Jesuíta Theodor Amstadt,
conhecedor da experiência alemã do modelo de Friedrich Wilhelm Raiffeisen
(1818-1888), junto a pequenas comunidades rurais européias, em 1902, no Rio
Grande do Sul, foram criados os rudimentos das primeiras cooperativas de crédito
rural no Brasil. Elas fundamentavam-se no “princípio do amor cristão” (BENATO,
2004, p.71) e admitiam ajuda de outras pessoas não cooperadas. Forneciam, aos
sócios, formação moral a partir das responsabilidades contraídas solidariamente
entre eles e a cooperativa. Previam um Banco Central das Cooperativas de
Crédito e capitalizavam as sobras com o objetivo de fortalecer a sociedade.
2 Crédito Mútuo. As cooperativas de crédito mútuo surgiram no Brasil em
1950, nos moldes daquelas preconizadas por Alphonse Desjardins (1854–1920).
O objetivo era “despertar nos trabalhadores o espírito de poupança para que eles
conquistassem pelo esforço próprio, condições de crédito que resolvessem suas
necessidades do dia a dia” (BENATO, 2004, p.71).
3 Crédito Popular. Surgidas bem antes das cooperativas de crédito
mútuo, as de crédito popular foram criadas na década de trinta do Século XX, sob
a influência do italiano Luigi Luzzatti (1841–1927), por pequenos empreendedores,
comerciantes e industriais de tecidos, malhas, e outros, no Estado de São Paulo.
Seu idealizador “desenvolveu um sistema de Cooperativismo de Crédito mais
aberto, onde toda a comunidade pôde participar, não sendo necessário o vínculo a
uma empresa” (BENATO, 2004, p.72).
56

2.13.6 Cooperativas de Saúde

Cooperativas de Saúde são cooperativas de trabalho que se destinam à


preservação e à recuperação da saúde humana. Atuam na área médica,
odontológica, psicológica e outras atividades afins. Surgiram no Brasil e,
atualmente, expandem-se para outros países e a outras áreas, como a de crédito,
de seguro e de usuários (PINHO, 2004).

2.13.7 Cooperativas de Infra-Estrutura

Esse segmento é constituído por cooperativas que têm por objetivo prestar
coletivamente um determinado serviço ao quadro social. No Brasil, são
conhecidas as cooperativas de eletrificação e de telefonia rural. As cooperativas
de eletrificação rural têm por objetivo fornecer para a comunidade serviços de
energia elétrica, seja repassando essa energia de concessionárias, seja gerando
sua própria energia. Algumas também possuem seções de consumo para o
fornecimento de eletrodomésticos, bem como de outras utilidades (BENATO,
2004).
Apesar das cooperativas de telefonia rural não terem tido um
desenvolvimento satisfatório, elas vêm ocupando espaços que dificilmente seriam
mantidos pelo Serviço Público. Mesmo com os obstáculos criados pelo Poder
Público, essas cooperativas têm contribuído significativamente para evitar o êxodo
rural e manter o homem no campo, melhorando suas condições de vida e
aumentando a produção de alimentos. Nesse sistema, o próprio usuário mobiliza
recursos de poupança e crédito para os investimentos, a fim de serem
desenvolvidos os processos de construção de energia elétrica no meio rural.
Atualmente, a maior representante do segmento no Brasil e da América Latina é a
“Cooperativa Regional de Eletrificação Rural do Alto Jacuí Ltda. (COPREL),
fundada em 1968, com sede no município de Ibirubá, Rio Grande do Sul, que
conta com mais de vinte e seis mil cooperados” (BENATO, 2004, p.74).
57

2.13.8 Cooperativas Educacionais

Diante de um cenário em que a educação pública brasileira cronicamente


deteriora-se e a educação privada torna-se cada vez mais onerada, surgiu o
cooperativismo formal de alunos e de pais de alunos e de professores
especializados que visa principalmente construir empreendimentos para suprir
uma deficiência do Estado, minorar os altos custos das escolas de ensino privado
e melhorar o nível de qualidade do ensino (FRÓES, 2001).

2.13.9 Cooperativas Habitacionais

O segmento das Cooperativas Habitacionais surgiu com a extinção do


Banco Nacional de Habitação (BNH), órgão governamental responsável pelo
suprimento do mercado por meio de verbas advindas do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço (FGTS), em 1964. Os objetivos eram coordenar a ação dos
órgãos públicos, orientar a iniciativa privada, estimular a construção de habitações
de interesse social e financiar a aquisição da casa própria principalmente para as
populações de média e baixa renda
As cooperativas habitacionais, tais como estão atualmente constituídas,
em grande parte “são consórcios para construção de casas e não cooperativas, já
que têm como característica básica a sua liquidação, tão logo seja concluído o
projeto habitacional. Sua existência em novos moldes, entretanto, é de
fundamental importância para o país, cuja carência habitacional é gritante”
(BENATO, 2004, p.75).

2.13.10 Cooperativa Mineral

O segmento cooperativo da Cooperativa Mineral compõe-se das


cooperativas que pesquisam, extraem, lavram, industrializam, comercializam,
importam e exportam minerais. São as cooperativas de mineradores para o
trabalho da mineração e garimpagem, cuja diferença se faz apenas na
mecanização e tecnologia utilizada nas jazidas. A maioria delas é formada por
58

garimpeiros que possuem privilégio legal nos requerimentos de lavra


(GONÇALVES, 2003).

2.13.11 Cooperativas Especiais ou Sociais

As cooperativas especiais ou sociais são constituídas por pessoas que


necessitam ser tuteladas. São contempladas as pessoas com deficiência física,
até os deficientes “sensoriais, psíquicos e mentais, dependentes de
acompanhamento psiquiátrico permanente, dependentes químicos, egressos de
prisões, os condenados a penas alternativas à detenção e os adolescentes em
idade adequada ao trabalho e situação familiar difícil do ponto de vista econômico,
social ou afetivo” (GONÇALVES, 2003, p.28).

2.14 A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DAS COOPERATIVAS BRASILEIRAS

Segundo a Lei 5.764/71, nos artigos 38 a 56, os órgãos administrativos


estabelecem-se como descrevo a seguir:
• Assembléia Geral
∗ Assembléia Geral Ordinária
∗ Assembléia Geral Extraordinária
• Conselho de Administração
• Conselho Fiscal

Assembléia Geral “é o órgão deliberativo das cooperativas. De acordo


com a Lei 5.764/71, em seu artigo 38, a assembléia geral, “dentro dos limites
legais e estatutários, tem poderes para decidir negócios relativos ao objeto da
sociedade e tomar as resoluções convenientes ao desenvolvimento e defesa
dessa, e suas deliberações vinculam a todos, ainda que ausentes ou
discordantes” (GONÇALVES, 2003, p.33).
Conselho de Administração é formado apenas por sócios eleitos em
assembléia geral. De acordo com os artigos 47 a 57 da Lei 5.764/71, o conselho
de administração possui a função de “interpretar e pôr em prática as decisões da
59

Assembléia Geral”; devendo também “formular, planejar e traçar normas para as


operações de serviços; e controlar os resultados da cooperativa”, organizando-a
em “unidades, departamentos, divisões e seções ou serviços” (Idem, ibidem,
p.33).
Conselho Fiscal é formado apenas por sócios eleitos em assembléia
geral, conforme o artigo 56 da Lei Especial 5.764/71, possui a função “de órgão
colateral da administração, devendo acompanhar a cooperativa em todos os seus
aspectos. São atribuições desse conselho: exercer vigilância, aconselhar no
funcionamento regular da cooperativa, além de opinar e sugerir propostas à
administração” (Idem, ibidem, p.33). O Conselho Fiscal não representa a gestão,
mas sim a assembléia que o elege.

2.15 EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO COOPERATIVISTA BRASILEIRA

As formas cooperativas, do modo como as conhecemos modernamente,


surgiram no mundo ocidental em meados do Século XIX, de forma mais evidente
na França e Inglaterra, como movimentos de reações dos trabalhadores aos
efeitos da Revolução Industrial, naquela época. A normatização que surgiu foi uma
conseqüência natural do fenômeno correspondente, como uma força e, ao mesmo
tempo, regulamentação da nova forma de agrupamento humano.
Segundo Alves (2003), os primeiros diplomas normativos que surgiram no
Brasil autorizando a organização das cooperativas foram o Decreto nº 796, de 02
de outubro de 1890, e o Decreto nº 869, de 17 de outubro do mesmo ano. Porém,
a expedição de normas para a criação e o funcionamento de cooperativas,
registra-se, apenas, a partir do início do Século XX, talvez pela constatação do
direito comparado de que a sua inserção futura seria inevitável no território
nacional (PAMPLONA, 2001; PINHO, 2003). Coincidentemente com a
regulamentação jurídica, os espaços de atuação dos sindicatos e das cooperativas
foram criados no início do Século XX, no território nacional, autorizando-os para o
exercício do cooperativismo (PAMPLONA, 2001). Assim, a legislação que
regulamenta o cooperativismo brasileiro, com efeito, surgiu no país, em 06 de
60

janeiro de 1903, com o Decreto Legislativo nº 979, que tratou especificamente das
atividades cooperativas (ALVES, 2003; PAMPLONA, 2001; PINHO, 2003 ).
De acordo com Martins, determinava o artigo 10 que a função dos
sindicatos, nos casos de “organizações de caixas rurais de crédito agrícola e de
cooperativas de produção ou de consumo [...], não implicam responsabilidade
direta dos mesmos nas transações, nem os bens nelas empregados ficam sujeitos
à liquidação judicial, sendo a liquidação de tais organizações regida pela lei
comum das sociedades civis” (MARTINS 2003, p.25).
Prevenindo apenas a constituição das cooperativas sob forma de
sociedades comerciais e não definindo o cooperativismo, o artigo 10 da Lei nº
1637, de 05 de janeiro de 1907, determinou que as sociedades cooperativas
“poderiam ser anônimas, em nome coletivo ou em comandita” e seriam “regidas
pelas leis que regulam cada uma dessas formas de sociedades” (ALVES, 2003, p.
43). Assim sendo, o “Decreto nº 22.239, de 19 de dezembro de 1932”, passou a
ser a “lei fundamental do cooperativismo” quando referiu “os princípios
norteadores da constituição das cooperativas e estabeleceu características
próprias de cunho filosófico” (MARTINS, 2003, p.26). Em especial, o artigo 24
desse decreto estabeleceu os conceitos e definições constantes dos princípios de
Rochdalle quando definiu o que são cooperativas de trabalho, conforme descrevo
a seguir:

São cooperativas de trabalho aquelas que, constituídas entre


operários de uma determinada profissão ou ofício ou de ofícios
vários de uma mesma classe, têm como finalidade primordial
melhorar os salários e as condições de trabalho pessoal de seus
associados, e dispensando a intervenção de um patrão ou
empresário, se propõem contratar obras, tarefas, trabalhos ou
serviços públicos ou particulares, coletivamente por todos ou por
grupos de alguns (ALVES, 2003, p.43).

A menção a essa norma “possui importância tanto histórica quanto


doutrinária, tendo em vista que se trata da única norma que traz um conceito
expresso das cooperativas de trabalho (norma essa que, mesmo revogada,
demonstra substrato jurídico para compreensão do tema)” (PAMPLONA, 2001,
p.3).
61

Ainda, conforme Pamplona, “tal definição legal foi mantida mesmo com
modificações tópicas na norma geral das cooperativas (através do Decreto nº
24.694 de 10 de julho de 1934, e do Decreto-Lei nº 1.402 de 5 de julho de 1939)
até o advento do Decreto-Lei nº 59 de 22 de novembro de 1966, que o revogou
expressamente” (PAMPLONA, 2001, p.3).
O Decreto 22.239/32 “dava razoável liberdade de constituição e
funcionamento para as cooperativas” (MARTINS, 2003, p.28). E, de acordo com
Machado, o mesmo decreto “favoreceu um surto de desenvolvimento do
cooperativismo, no setor de consumo e na área rural. As novas cooperativas
foram criadas com grande número de associados e com volume expressivo de
operações” (MACHADO, 1975, p.20).
No entanto, segundo Veras Neto (2002), citado por Meireles (2003), o
verdadeiro sentido da legislação era neutralizar o poder político e econômico dos
grandes latifundiários da Velha República, que mantinham a hegemonia de São
Paulo e Minas Gerais, e fomentar o surgimento de pequenos proprietários
agrícolas. A consolidação desse objetivo, pela intervenção direta do Estado na
estrutura fundiária nacional, ocorreu com o Decreto-Lei nº 59, de 21 de novembro
de 1966, ao definir a política nacional de cooperativismo com a criação do
Conselho Nacional de Cooperativismo (CNC).
De acordo com Martins (2003), o Conselho Nacional de Cooperativismo
passou a controlar excessivamente as cooperativas, culminando com o
fechamento de mais da metade delas na década de sessenta do Século XX. O
controle, conforme Magnano, ocorreu com a “obrigação do pagamento do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias que, anteriormente, as cooperativas não
necessitavam pagar”, associado “à inflação que se instalava no país; à instituição
de compras a crédito; à concorrência com as redes de supermercados e a falta de
modernização das técnicas administrativas cooperativistas” (MAGNANO 2001,
p.455).
Sucedendo o mencionado decreto, a Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de
1971, denominada Lei Especial, segundo Brasil (2002), definiu e dispôs sobre o
regime jurídico das cooperativas, ou seja, passou a regular esse tipo de
sociedade. Trouxe inovações que possibilitaram a renovação das estruturas e dos
62

instrumentos cooperativistas. Contudo, ao regular essa atividade societária, a


referida lei também restringiu os movimentos das cooperativas na década de
setenta do Século XX (VERAS NETO, 2002, citado por MEIRELES, 2003).
O retorno do incentivo ao movimento cooperativista ocorreu com a
promulgação da Constituição Federal em 05 de outubro de 1988, atribuindo às
cooperativas liberdade de constituição e de atividade conforme os artigos, 3º e 5º:

Artigo 3º [grifo da autora]. Constituem objetivos fundamentais da


República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre;
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Artigo. 5º [grifo da autora]. Todos são iguais perante a lei, sem


distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País inviolabilidade do direto à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de
cooperativas independem de autorização, sendo vedada a
interferência estatal em seu funcionamento (BRASIL, 2002, p.3; 5;
7).

De modo que o Estado, segundo o artigo 174, “exercerá na forma da lei,


as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante
para o setor público e indicativo para o setor privado”, e, no parágrafo 2º desse
artigo, “a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de
associativismo” (Ibidem, p.112).
A Lei nº 9.867, de 10 de novembro de 1999, contribuiu para “a criação e o
funcionamento de Cooperativas Sociais, visando a integração social dos cidadãos”
(BRASIL, 2002, p.7), que necessitam ser tutelados (protegidos). Isto é; segundo a
lei, as cooperativas possuem o instrumento que viabiliza a interconexão e o
crescimento tanto pessoal quanto social do trabalhador na coletividade, seja ele
normal ou deficiente (UNIRCOOP, 2003). A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de
2002, que instituiu o Novo Código Civil, abriu, segundo Krueger, “um capítulo para
63

as cooperativas reguladas nos artigos 1903 a 1906 e mencionadas nos artigos


982, 983 e 1159” (KRUEGER, 2003, p.17).

Artigo 1.903 [grifo da autora]. A sociedade cooperativa reger-se-á


pelo disposto no presente capítulo, ressalvada a legislação
especial. Sem correspondente no código anterior. A lei especial a
que se reporta o texto é a de nº 5.764 de 16.12.1971.

Artigo 1.904 [grifo da autora]. São características da sociedade


cooperativa:
I – variabilidade ou dispensa do capital;
II – concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a
administração da sociedade, sem limitação de número máximo;
III – limitação do valor da soma de quotas do capital que cada
sócio poderá tomar;
IV – intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos
à sociedade, ainda que por herança;
V – quorum, para a assembléia geral funcionar e deliberar,
fundado no número de sócios presentes à reunião, e não no
capital social representado;
VI – direito de cada sócio a um só voto nas deliberações, tenha ou
não capital à sociedade, e qualquer que seja o valor de sua
participação;
VII – distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das
operações efetuadas pelo sócio com a sociedade, podendo ser
atribuído juro fixo ao capital realizado;
VIII – indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda
que em caso de dissolução da sociedade (LOURES et. al., 2003,
p.477)

Artigo 1.905 [grifo da autora]. Na sociedade cooperativa, a


responsabilidade dos sócios pode ser limitada ou ilimitada.
Parágrafo 1º: É limitada a responsabilidade na cooperativa em que
o sócio responde somente pelo valor de suas quotas e pelo
prejuízo verificado nas operações sociais, guardada a proporção
de sua participação nas mesmas operações.
Parágrafo 2º: É ilimitada a responsabilidade na cooperativa em que
o sócio responde solidária e ilimitadamente pelas obrigações
sociais (Idem, ibidem, 2003, p.477-8).

Artigo 1.906 [grifo da autora]. No que a lei for omissa aplicam-se


as disposições referentes às sociedades simples, resguardadas as
características estabelecidas no artigo 1.904.

De acordo com a UNIRCOOP (2003), as cooperativas por meio do Novo


Código Civil foram contempladas apenas com as seguintes alterações:
• não possuem mais estatutos, passando a ser regidas por contratos;
• podem ser constituídas sem capital social;
64

• não necessitam mais de um número mínimo de vinte sócios para se


constituírem, contemplando apenas um número de sócios para compor a
administração da sociedade, sem limitação de número máximo;
• as modificações no contrato só podem ser efetuadas mediante
aprovação unânime dos sócios.

Pinho (2004) acrescenta que as responsabilidades dos sócios eram


limitadas ao total das quotas-partes por eles subscritas. No Novo Código Civil, a
responsabilidade vai até o valor dos prejuízos verificados em proporção das
operações efetuadas; ou seja, os associados atualmente possuem maior
responsabilidade referente aos negócios efetuados pela organização cooperativa.
Ainda, conforme Pinho, o Novo Código Civil silenciou a respeito de
algumas questões, como:

a) princípio de portas abertas ou adesão livre e voluntária;


b) FATES (Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social)
indivisível, tal como o Fundo de Reserva (art. 4º, VIII da Lei
5.764/71);
c) item X do art. 4º da Lei 5.764/71 – “prestação de assistência aos
associados” e, conforme o caso “aos empregados da cooperativa”;
d) poder da Assembléia Geral de dispor do retorno das sobras
líquidas do exercício, proporcionalmente às operações já
realizadas pelo associado (art. 4º, VII da Lei 5.764/71) (PINHO,
2004, p.5).

Segundo Loures et al. (2003), o Novo Código Civil não sucedeu a Lei
5.764/71, apenas redigiu os artigos em linguagem mais clara e com algumas
modificações, sem mudanças substanciais no conteúdo da Lei Especial.

2.16 EVOLUÇÃO QUANTITATIVA DO COOPERATIVISMO BRASILEIRO

No início do Século XX, em 1900, registrava-se, segundo a OCB (2004),


352 cooperativas. Entretanto, devido às políticas restritivas que se instalaram pelo
poder intervencionista do Estado para coibir o expansionismo hegemônico
65

latifundiário da República Velha, em 1949, o número de cooperativas registradas


foi reduzido para 170.
Nas décadas de cinqüenta e sessenta do Século XX, de acordo com a
OCB (2004), houve um decréscimo ou um crescimento lento entre essas
associações, provavelmente resultante da interferência estatal e dos interesses
internacionais em políticas expansionistas de mercado que aqui pretendiam se
instalar.
Entre as décadas de oitenta e noventa do Século XX, a distribuição
desigual da renda mundial, em razão da enorme diferença entre os países ricos e
pobres, o colapso da União Socialista Soviética que pode ter significado o fim do
socialismo e a vitória do capitalismo, culminou com a instalação de uma nova
ordem mundial, a globalização da economia. A globalização derrubou fronteiras e
passou a se comportar como uma máquina cada vez mais violenta e incontrolável
da natureza; porém, não teve condições de eliminar os bolsões de problemas, as
desigualdades na distribuição de renda e a desigualdade social (o privilégio de uns
em detrimento de outros). Nesse contexto, conforme a OCB (2004), houve um
crescimento, embora tímido, das entidades cooperativistas, no Brasil, talvez como
forma de agregar a mão de obra trabalhadora excluída, provocada por essa nova
ordem, ou como meio de evitar o aumento das desigualdades.
Em 1990, a OCB registrava 3.549 cooperativas e 2.883.036 cooperados
ao longo do território nacional (OCB, 2004). No período de 1990 a 2003, houve
crescimento de 207,2% e 199,7%, referentes ao número de cooperativas e
cooperados respectivamente. Esse crescimento provavelmente resultou do retorno
do incentivo ao movimento cooperativista, ocorrido com a promulgação da
Constituição Federal em 5 de outubro de 1988, atribuindo-lhes liberdade de
constituição e de atividade.
Em 2003, registrava-se conforme a OCB (2004), 7.355 cooperativas;
5.762.718 cooperados e 182.026 empregados. O cooperativismo no mundo
encontra-se assim distribuído: 37% na Europa; 30% nas Américas; 22% na Ásia e
no Pacífico, e 11% na África OCB (2004). O segmento mais abrangente é o de
trabalho com 2.024 unidades, seguindo-se as agropecuárias com 1.519, as de
crédito com 1.115 e as de saúde com 878 cooperativas (OCB, 2004).
66

2.17 NASCIMENTO DA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO

No Brasil, a aceleração da industrialização e da urbanização ocorreu a


partir do Século XX, e o processo de deslocamento do exercício da medicina
liberal, predominante no período entre o fim do Século XIX e a década de trinta do
Século XX, para o da medicina tecnológica empresarial, aconteceu a partir da
década de sessenta (SCHRAIBER, 1993). Nessa década, a incorporação e o
desenvolvimento tecnológico, associado às mudanças econômicas, políticas e
sociais e a impossibilidade aritmética do Estado de propiciar assistência à saúde
com qualidade a preços justos para toda a população, estimularam o crescimento
de uma nova modalidade assistencial, viabilizada a partir do convênio-empresa
(estado-empresa), denominada medicina de grupo, que intermediava a assistência
à saúde de trabalhadores.
A literatura especializada no assunto faz compreender que a medicina
empresarial, além de oferecer um atendimento à população assistida, cuja
qualidade era, muitas vezes, questionável, mercantilizava o trabalho médico e o
direito do cidadão. Oferecia empregos aos médicos mais novos que, precisando
sobreviver, aceitavam remuneração comprometida no valor e no horário,
oportunizando a esses grupos uma rentabilidade exagerada. A situação assim
definida levou os médicos e o advogado do sindicato dos médicos da cidade de
Santos, São Paulo, a julgarem necessária a intervenção sindical em defesa da
classe médica local. Chegaram à conclusão de que deveriam constituir um órgão
cooperativista para a defesa econômica da classe (MEMORIAL UNIMED, 1992;
SCHRAIBER, 1993; MENDES, 1999, PAIM e ALMEIDA FILHO, 2000;
JUNQUEIRA, 2001).
A Cooperativa de Trabalho Médico, denominada União Nacional de
Médicos – UNIMED –, foi fundada em 18 de dezembro de 1967, em Assembléia
Geral de constituição, e teve por objetivo preservar a valorização profissional e
proporcionar qualidade na assistência à saúde, garantindo, também, o direito do
cidadão a um atendimento com mais qualidade, segundo o princípio constitucional
da igualdade (MEMORIAL UNIMED, 1992). Nesse contexto novo na história da
67

assistência médica, novas possibilidades de relações de trabalho contribuíram


para o desenvolvimento social (MEMORIAL UNIMED, 1992; PATRÍCIO e
GASPAR, 2000).
Freidson (1998), citado por Grosseman & Patrício, considera que o
exercício da profissão médica na modalidade liberal está representado pelo
“controle do profissional sobre o ato médico, desde o domínio do conhecimento
técnico e a escolha do local de atendimento até os padrões nos quais realiza a
consulta (incluindo o tempo a ela dedicado)” (GROSSEMAN & PATRÍCIO, 2004,
p.56). Assim, a prática liberal do trabalho médico caracteriza-se pela “autonomia
de escolher a quem servir, por meio do estabelecimento de critérios de definição
entre saúde e doença e a forma como essa prestação de serviço possa ser
organizada” (Idem, ibidem, p.56); o que, para Irion, denomina-se “clientela
particular” (IRION, 1994, p.83).
Diversos autores consideram a cooperativa médica fundamentada na Lei
5.764, de 16 de dezembro de 1971, como sendo uma sociedade de pessoas com
forma e natureza jurídica próprias, não sujeitas à falência que se unem para
instrumentalizar condições e diretamente colocar o resultado de seu trabalho à
disposição de quem os consome. Para eles, esse tipo de sociedade é
impulsionada por metas individuais, metas organizacionais e metas do marco
institucional da sociedade em geral, sendo que a natureza dúplice da cooperativa
– sócio/trabalhador – constitui-se numa das características desse tipo societário
(ALVES, 2003; CASTILHO, 1997; IRION, 1994; RIOS, 1998).
Consideram também a cooperativa médica como uma organização
moderna, fundamentada na economia de ajuda mútua, com objetivos econômicos
e sociais comuns, cujos aspectos legais e doutrinários diferem de outras empresas
por não possuírem o lucro como a razão de sua existência. Dessa forma,
comportam-se diferentemente das demais organizações (ALVES, 2003;
CASTILHO, 1997; IRION, 1994; RIOS, 1998).
Patrício e Gaspar destacam que:
O cooperativismo, como forma de organização de trabalho vem
crescendo, e cada vez mais afloram iniciativas em diferentes
áreas. A área dos profissionais da saúde é uma das mais
povoadas por organizações cooperativas, uma vez que o caráter
de trabalho autônomo desses profissionais, especialmente de
68

médicos, na situação atual do mercado de trabalho e das


condições financeiras da população, exige a adesão dos mesmos
a grupos cooperativistas de prestação de serviços de saúde. As
organizações cooperativas na área da saúde cumprem um duplo
objetivo: de um lado, permite ao profissional cooperado uma maior
abrangência de serviços e facilidades na aquisição de
equipamentos e, de outro, permitem a um grande contingente de
pessoas o acesso a serviços de melhor qualidade, geralmente
bastante superior à fornecida pelos órgãos de saúde pública
(PATRÍCIO e GASPAR, 2000, p.4).

Os mesmos autores enfatizam ainda que “os novos paradigmas, ou os


paradigmas emergentes, focalizados na qualidade de vida individual e coletiva,
estão vindo para confirmar a necessidade da cooperação entre os humanos, até
para a sobrevivência da espécie, mesmo que essa cooperação seja para fins
comerciais” (Idem, ibidem).
O sistema cooperativista médico, no Brasil, é representado principalmente
pela União Nacional de Médicos – UNIMED. O sistema UNIMED compõe-se,
atualmente, de 364 cooperativas médicas, entre singulares 2 , federações 3 e
confederações 4 , conforme os dispositivos da Lei 5.764/71. É um complexo
empresarial, e possui atuação empresarial no Brasil, na Colômbia e no Paraguai e
mantém acordos operacionais com instituições da Argentina e do Uruguai,
oferecendo intercâmbio para viajantes do Mercosul.

2.18 A COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO DE FLORIANÓPOLIS

Seguindo a idéia de Santos, município de São Paulo, 101 médicos, em


Florianópolis, fundaram, em 30 de agosto de 1971, em cerimônia realizada na

2
As cooperativas singulares (primeiro grau) têm como função a comercialização e prestação de
assistência médica (MEMORIAL UNIMED, 1992).
3
As federações (segundo grau) constituem-se pela união de, no mínimo, três cooperativas
singulares, tendo como principal atividade o desenvolvimento dessas em nível regional, com
competência para elaborar a regimentação das singulares, sempre regida em consonância com a
confederação. Atua como apoio institucional à cooperativa singular, até que essa unidade tenha
condições econômica e financeira de funcionamento autônomo (Ibidem).
4
A confederação é representante do sistema cooperativista em nível mundial. Formada pela união
de, no mínimo, três federações, tem como principal atividade a representação do sistema junto ao
público e aos órgãos de defesa do consumidor. É competente para editar normativas
administrativas. Tais normativas regem os inter-relacionamentos das singulares de todo o país,
opera na gestão dos contratos de abrangência nacional; também tem por princípio o apoio
operacional e tecnológico às singulares e federações (Ibidem).
69

Associação Catarinense de Medicina (ACM), a Cooperativa Médica de


Florianópolis, que passou a compor o universo do sistema nacional só em 1983.
Firmou o seu primeiro contrato em 20 de abril de 1972 com o Instituto de
Previdência dos Funcionários da Assembléia Legislativa, composto por duzentos
usuários. Naquela época, a cooperativa funcionava em duas salas alugadas,
conjuntas à Associação Catarinense de Medicina (ACM). No local “trabalhavam
um gerente, um corretor de planos de saúde e uma datilógrafa, que atendiam as
primeiras empresas e profissionais que os procuravam” (MEMORIAL UNIMED,
1992, p.102, v.1).
Segundo os relatos do Memorial UNIMED, “os dirigentes receavam que a
cooperativa não pudesse manter-se com recursos próprios, ou que os médicos
não entendessem a proposta que iniciava seus primeiros passos” (Ibidem). Um
dos primeiros sinais de crescimento foi a aquisição da primeira sede própria em
1985, situada à rua Osmar Cunha, onde atualmente funciona uma clínica. Em
1986, a cooperativa adquiriu o seu primeiro sistema de informática, o que “permitiu
a ampliação dos serviços de atendimento e a implantação da Tabela de
Honorários Médicos da Associação Médica Brasileira – AMB - como forma de
pagamento aos médicos cooperados” (Ibidem). Para adequar os espaços às
necessidades da cooperativa, em 1991, concluiu-se a construção de um prédio,
localizado à rua Dom Jaime Câmara, para onde foi transferida a sua estrutura
administrativa, lá permanecendo até hoje.
Atualmente, a sede da cooperativa foi ampliada e modernizada para
fornecer maior conforto, tanto aos seus clientes internos, cooperados e
colaboradores, quanto aos externos, os usuários. Com a ampliação, a mesma
passou a situar-se entre as ruas Antônio Dib Mussi e Dom Jaime Câmara.
A Cooperativa de Trabalho Médico é uma organização econômica social
que, norteada pela filosofia cooperativista, busca agregar profissionais médicos
para a defesa do exercício liberal, ético e qualitativo de sua profissão com
adequadas condições de trabalho e remuneração justa e propiciar, à maior parcela
possível da população, um serviço médico de boa qualidade, personalizado e a
custo compatível. Para realizar seus propósitos maiores, agrega talentos
70

humanos, recursos financeiros/materiais e busca os preceitos e prática da


excelência (HISTÓRICO, 2004). A atuação dessa cooperativa abrange o município
de Florianópolis, na ilha de Santa Catarina e parte do continente catarinense 5 .

2.18.1 Estrutura Organizacional da Cooperativa de Trabalho Médico de


Florianópolis

A estrutura organizacional de uma cooperativa de trabalho estabelece o


papel de cada membro no interior da organização, cujas normas de condutas
derivam-se dos valores e dos princípios nos quais a organização encontra-se
fundamentada (IRION, 1994). De acordo com Oliveira, “estrutura organizacional é
o delineamento interativo das responsabilidades, autoridades, comunicações e
decisões dos executivos e profissionais em cada unidade organizacional, da tarefa
mais simples à abordagem mais ampla e importante, com suas funções, a relação
de cada parte para com as demais e a cooperativa toda” (OLIVEIRA, 2001, p.71;
174-5; 306).
Do ponto de vista hierárquico, a assembléia geral ordinária é o órgão
soberano da empresa cooperativista, respeitando-se o estatuto e a legislação em
vigor. O conselho de administração compõe-se de quinze cooperados e é aquele
que representa a assembléia geral na execução das medidas necessárias à
consecução dos objetivos da organização. Na ótica organizacional, configura-se
em conselheiros e diretores. Os diretores, formando a diretoria executiva, são
aqueles conselheiros que recebem atribuições específicas para a gestão da
sociedade no dia-a-dia, eleitos em assembléia geral ordinária a cada quatro anos.
A diretoria executiva compõe-se de cinco cooperados, sendo eles: o presidente, o
vice-presidente, o superintendente, o diretor de contas médicas e o diretor de
educação cooperativista. A eles atribui-se a gerência estratégica das ações que
permitem à cooperativa ser bem sucedida. Juntamente com o conselho de
administração, são eleitos sete médicos que estejam cooperados no mínimo há

5
As cidades do continente que fazem parte da área de abrangência da Cooperativa Médica de
Florianópolis são: Angelina, Alfredo Wagner, Anitápolis, Águas Mornas, Antônio Carlos, Biguaçú,
Canelinha, Garopaba, Palhoça, Governador Celso Ramos, Paulo Lopes, Nova Trento, Rancho
Queimado, Santo Amaro da Imperatriz, São José, São João Batista, São Bonifácio e Tijucas.
71

cinco anos para compor o conselho de ética. Compete a esse conselho avaliar as
questões relacionadas às distorções ocorridas com cooperados, podendo culminar
com a indicação de exclusão do cooperado. O conselho fiscal, paralelo à
administração, é órgão formado por seis membros, também eleitos em assembléia
geral ordinária, cuja composição renova-se a cada ano, sendo que apenas um
terço pode ou não permanecer por mais um ano. Compete a eles exercer
fiscalização sobre as atividades e os serviços da cooperativa (IRION, 1994).
Diretamente ligadas ao presidente, as gerências administrativa, financeira,
de mercado e serviços médicos são ocupadas por pessoal especializado não
médico, selecionados no mercado de trabalho a cada gestão. A gerência
administrativa responsabiliza-se pelos departamentos de atendimento ao cliente,
de informática, de atendimento ao cooperado, de recursos humanos e de serviços
gerais. Cada um desses departamentos subdivide-se em divisões e serviços que
executam as atividades operacionais da empresa. A gerência financeira
encarrega-se dos departamentos de faturamento, da tesouraria e contas a pagar,
contas a receber, custos e orçamento, contabilidade e tributos, todos eles
subdivididos em divisões e serviços também operacionais. A gerência de serviços
médicos departamentaliza-se em atendimento pré-hospitalar, atendimento
domiciliar e auditoria médica.
A Cooperativa de Trabalho Médico de Florianópolis possui, portanto, uma
estrutura organizacional hierárquica, fragmentada que, segundo Tofler (2001),
baseia-se no modelo militar, cujo controle e burocracia são características
marcantes. liveira salienta que a fragmentação caracteriza a departamentalização.
Segundo ele, a departamentalização “é o agrupamento, de acordo com um critério
específico de homogeneidade, das atividades e correspondente recursos
humanos, financeiros, materiais e equipamentos, em unidades organizacionais”
(OLIVEIRA, 2001, p.305). Assim, as atividades semelhantes são desenvolvidas ou
executadas por pessoas em uma área definida da organização, no caso, a
Cooperativa de Trabalho Médico de Florianópolis.
72

Os processos de controle de custos [grifo da autora], adotados por essa


cooperativa baseiam-se nas atividades de Auditoria 6 Médica Prévia; Auditoria de
Contas e Auditoria Eletrônica; nos Comitês de Especialidades; nas Tabelas de
Materiais-Medicamentos; nas Tabelas de Materiais Especiais (órteses-próteses);
em Protocolos e Pacotes de Procedimentos Hospitalares; na Identificação Digital
dos Usuários; na Autorização Digital de Procedimentos; no Atendimento Domiciliar
a Doentes Crônicos e no Banco de dados Data Warehouse.
No Brasil, mais precisamente na década de sessenta do século XX, os
custos elevados nas instituições de saúde pública fizeram surgir os processos de
avaliação e controle da assistência médica por meio da auditoria e da
administração de contas a serem pagas. Assim, as empresas do sistema supletivo
de saúde, que também enfrentavam os mesmos problemas adotaram a mesma
sistemática de controle em suas contas. Somente a partir da década de oitenta,
com a elevação da clientela, dos custos e dos acirrados conflitos entre os
financiadores, compradores e prestadores de serviços de saúde, consolidou-se no
país a prática da Auditoria Médica (MENDES, 1996).
Vários foram os motivos que elevaram os custos da assistência à saúde.
Diversos autores concordam que a modificação da atenção prestada ao paciente
(cliente), inicialmente pautada na relação direta entre as partes interessadas
(paciente-médico), caracterizando o médico como realmente um profissional
liberal, foi lenta e progressivamente substituída por uma relação mais distante
quando se criaram as entidades hospitalares (SCHRAIBER, 1993; MENDES,
1996; CORDEIRO, 1984).
O avanço tecnológico e a educação médica – influenciada pela filosofia
cartesiana que estimulou o aparecimento das especialidades – a entrada dos
sistemas supletivos de assistência à saúde nas atividades privadas do profissional
liberal, intermediando, assalariando e praticando baixos valores aos serviços

6
A Auditoria surgiu com o objetivo de se confirmar registros contábeis e impostos na época das
emergentes companhias de navegação no século XII (FRANCO, 2001). Define-se, segundo
Franco, como o exame de livros, registros, inspeções, para obter-se informações e confirmações
internas e externas que objetivam verificar e mensurar um determinado trabalho realizado. No setor
saúde, originou-se no início do Século XIX, nos Estados Unidos da América do Norte, pela
proliferação elevada de escolas médicas, pelo nível preocupante de profissionais dessa classe
trabalhadora no mercado e pela crescente insatisfação da população assistida com os serviços
prestados (MENDES, 1996).
73

médicos, associados às necessidades cada vez mais aprimoradas de um cliente


mais informado e suscetível à influência da mídia e da globalização, modificaram a
relação médico-paciente. Na urgente necessidade de diagnosticar com precisão e
a fim de incorporar elementos para elevar sua fonte de renda, o profissional
médico passou a abreviar o tempo de sua consulta, solicitando mais exames
complementares e/ou agregando mais recursos tecnológicos aos seus
procedimentos (ANDRADE, 2000; BLASCO, 1997; CAPRA, 2000; LOWN, 1996;
MENDES, 1999).
A criação da Agência Nacional de Saúde (ANS) e a regulamentação
conseqüente dos Planos de Saúde pela Lei 9.656/98 levaram as cooperativas e as
demais operadoras de planos de saúde a praticarem cada vez mais processos de
controle de custos. O objetivo dessa regulamentação foi o de adaptar as
cooperativas e as demais operadoras de planos de saúde à realidade de mercado,
cujos preceitos baseiam-se na otimização de gastos, num produto final com
qualidade e baixos preços, na qualidade dos prestadores de serviços, na eficiência
e na economicidade (NETO, 2002).
A Auditoria Médica instituída na Cooperativa de Trabalho Médico surgiu
dessa necessidade. Portanto, é uma atividade estratégica de avaliação
independente e de assessoramento na administração dessa entidade
organizacional. Volta-se para o exame e a análise da adequação da cooperativa
ao mercado de planos de saúde. Com a observância dos preceitos éticos e legais,
possui a premissa de manter a cooperativa com competitividade no mercado de
planos de saúde.
As Tabelas de Materiais, Medicamentos, Especiais (órteses e próteses),
elaboradas mediante pesquisa de valores de mercado e entre as diversas
singulares, consistem em uma relação tanto de preços, quanto de materiais e
medicamentos, utilizados nos procedimentos médicos. Elas foram elaboradas com
o objetivo de normatizar o pagamento dos prestadores e otimizar os custos da
cooperativa. Conforme Andrade (2000), o pagamento de serviços por
procedimentos realizados ou processos de trabalho premia o absurdo, a
ineficiência e onera as operadoras de saúde, pois quanto maior o custo de um
procedimento, maior o resultado para o prestador. Com o objetivo de otimizar os
74

custos, protocolos, pacotes de procedimentos hospitalares e Comitês de


Especialidades também foram elaborados 7 .
Mais recentemente, instalou-se um programa informatizado que utiliza a
digital dos usuários para autorização em contato direto, via Internet, dos
procedimentos. Tal processo tem por objetivo: agilizar o atendimento dos clientes
e reduzir o volume de pessoas que circulam no interior da sede da cooperativa em
busca de soluções que poderiam ser resolvidas no próprio local onde o cliente
encontra-se ou será atendido, e ainda, reduzir o número de fraudes causadas pelo
usuário que empresta a sua carteira para outra pessoa não beneficiária do plano
da Cooperativa de Trabalho Médico.
O produto de assistência ao doente crônico foi instituído com o objetivo de
humanizar o atendimento desse tipo de paciente por uma equipe multidisciplinar,
no seu próprio domicílio.
O Data Warehouse consiste num “grande banco de dados, capaz de
armazenar uma grande quantidade de dados provenientes de múltiplas fontes.
Essas fontes são os sistemas transacionais comuns como atendimento ao cliente,
contas a pagar, contas a receber, faturamento, produção do cooperado, etc.”
(ROMANO, 2004, p.73).

2.19 ATOS COOPERATIVOS E NÃO-COOPERATIVOS

De acordo com o artigo 79 da Lei 5764/71 “os atos cooperativos [grifo da


autora] são as inter-relações que tenham em algum pólo uma cooperativa, noutro

7
Cata Preta define protocolos por “condutas a serem executadas pelo médico e outros
profissionais da área médica, envolvidos em um procedimento específico, visando o
restabelecimento da saúde”. Para ele, “os protocolos irão transformar a vida das operadoras”, pois
“baseia-se em estudos científicos (medicina baseada em evidências), experiência clínica, condutas
médicas, consensos de especialidades, compartilhamento de riscos, rotinas administrativas e
operacionais”. Custeiam-se “com base no sistema de apuração de custos do hospital/clínica”, ou
seja: “em fatos reais, mediante pesquisa de mercado e/ou tabela própria das operadoras de saúde,
no caso, as cooperativas, e/ou das empresas prestadoras de serviços médicos. Podem sofrer
revisões periódicas – semestrais – e permitem maior flexibilidade para negociações de casos mais
complexos”. Pacotes são “procedimentos, fundamentados em protocolos e valorizados de comum
acordo entre os prestadores e a operadora de saúde” (CATA PRETA, 2001, p.80).Comitês de
Especialidades definem-se pelo consenso de vários profissionais da mesma especialidade que se
reúnem regularmente para estudar e elaborar critérios aos procedimentos médicos e à solicitação
de exames, baseados em resultados de estudos científicos.
75

um associado ou outra cooperativa”. Conforme esse mesmo artigo, no parágrafo


único, “o ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de
compra e venda de produto ou mercadoria”, ou seja: para que se constitua um ato
cooperativo é necessária a interrelação cooperativa – cooperado, ou cooperativa –
cooperativa, deixando claro que essa relação é intributável (ATA DO CONSELHO
FISCAL, 2004, p.1).
Os atos não-cooperativos [grifo da autora], de acordo com a Ata do
Conselho Fiscal (2004), fundamentam-se nos artigos 5º, 85, 86, 88 da Lei nº
5.764/71: “Os atos não-cooperativos são as operações mercantis efetuadas pela
sociedade cooperativa, em seu próprio nome, por óbvio, e sem a participação dos
cooperados” (Ibidem).
Nos termos do artigo 5º, da Lei nº 5.764/71, as sociedades cooperativas
podem adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou atividade,
desde que os exerça nos termos da citada Lei.
O artigo 85 da Lei 5.764/71 considera que as cooperativas poderão
adquirir produtos de não associados para o cumprimento de contratos.
O artigo 86 afirma que as cooperativas poderão fornecer bens e serviços a
não associados, desde que tal faculdade atenda aos objetivos sociais e estejam
de conformidade com a presente lei.
O artigo 88 salienta que mediante prévia e expressa autorização
concedida pelo respectivo órgão executivo federal e consoante as normas e os
limites instituídos pelo Conselho Nacional do Cooperativismo, poderão as
cooperativas participar de sociedades não cooperativas públicas ou privadas, em
caráter excepcional [grifo da autora] para o atendimento de objetivos acessórios 8
ou complementares. Quaisquer outras atividades que não se conformem com os
termos desses artigos, obviamente, não são permitidas às sociedades
cooperativas.

8
Objetivos acessórios ou complementares referem-se àquelas atividades que a cooperativa possui
com prestadores de serviços não cooperados, que são necessários para que o Ato Médico seja
efetivado.
76

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 O REFERENCIAL HOLÍSTICO-ECOLÓGICO

Na indagação e na construção da realidade, a pesquisa é uma atividade


básica da Ciência, o alimento da atividade de ensino e a força atualizadora frente
à realidade do mundo. Embora seja teórica, a pesquisa vincula o pensamento à
ação (MINAYO, 1994).
Dois métodos são usualmente utilizados na busca de conhecimento: o
quantitativo e o qualitativo. No entanto, quando se trata de pesquisa com seres
humanos, cuja complexidade é imensurável, os métodos qualitativos são mais
apropriados porque “consideram que os fenômenos são construídos pela
subjetividade humana em seus significados culturais e afetivos, particulares e
coletivos” (PATRÍCIO, 1999, p.67).
A metodologia qualitativa, utilizando o Referencial Holístico-Ecológico,
conta com as diversas dimensões que percebem o ser humano holisticamente.
Focaliza a coletividade valorizando o individual, uma vez que cada indivíduo, único
e subjetivo, participa da construção e do desenvolvimento do coletivo. A dimensão
individual busca compreender o máximo possível de um dado fenômeno, por meio
do conhecimento das múltiplas dimensões: biológicas, afetivas, ambientais,
espirituais, educacionais, sociais e organizacionais e as conexões que constróem
todo o contexto (Idem, ibidem).
Para abordar os significados da percepção de médicos cooperados sobre
os processos de controle de custos em uma cooperativa médica, norteei minha
pesquisa utilizando como método os princípios do Referencial Holístico-Ecológico,
desenvolvido por Patrício, em 1996. A pesquisa tem como pressuposto 9 que os

9
Pressupostos são “afirmações provisórias de um determinado problema em estudo”; traduzem os
entendimentos do olhar do pesquisador a respeito da realidade a ser pesquisada (MINAYO, 2001,
p.40-1) e são utilizados em pesquisa qualitativa em substituição ao termo hipóteses, porque as
hipóteses traduzem um comportamento positivista e se sustentam por uma teoria básica, onde as
conclusões de uma pesquisa resultam em respostas objetivas, por meio de provas estatísticas e
matemáticas (Idem, 2000).
77

médicos cooperados não têm claro o que seja uma cooperativa no seu sentido
organizacional.
O Referencial Holístico-Ecológico propõe três momentos interligados:
“entrando”, “ficando” e “saindo do campo”, que ocorrem a cada encontro, no
ambiente ou no interior do mundo dos sujeitos, denominado “trabalho de campo”
((PATRÍCIO, 1999).
“Entrando no campo” é a fase inicial da pesquisa e consiste no
conhecimento do local, na aproximação e escolha dos sujeitos, na apresentação
da proposta da pesquisa e dos preceitos éticos aos sujeitos, na elaboração do
projeto piloto, na negociação sobre os detalhes de operacionalização do estudo,
referentes a dias, horários e locais apropriados para os encontros e estabelece os
instrumentos de coleta dos dados. Quando o campo da pesquisa for uma
organização, o pesquisador deverá solicitar autorização formal ao seu
representante, entregando-lhe o termo de consentimento escrito para apreciação e
assinatura (Idem, ibidem).
Só após a assinatura do termo de compromisso escrito e informado pelo
responsável é que se entra em contato e combina-se com os sujeitos do estudo os
encontros para a obtenção dos dados da pesquisa. O pesquisador deve “ter o
documento assinado de aceitação do estudo pelos sujeitos e, ao mesmo tempo,
deixar com os sujeitos um documento assinado por ele referente às questões
éticas e seus futuros compromissos com a devolução dos dados, se for apropriado
ao estudo” (Idem, ibidem, p.67).
De acordo com Grosseman, “o projeto-piloto testará todo o projeto do
estudo e, só a partir da sua aplicação e adaptações necessárias ao estudo, será
possível iniciar o segundo processo, “Ficando no Campo” (GROSSEMAN, 2001,
p.31).
Na entrevista semi-estruturada identificam-se os sujeitos por escrito, no
Formulário de Entrevista.
“Ficando no campo” é o momento da permanência no campo e consiste
em diferentes etapas de interação entre o pesquisador e os sujeitos. É nessa
etapa que o pesquisador desenvolve as técnicas de coleta dos dados, que
78

fundamentalmente são a observação participante e a entrevista aberta ou semi-


estruturada.
Os dados nessa fase podem ser registrados no próprio formulário de
entrevista ou no Diário de Campo. Registra-se tudo o que se observa, as reflexões
do observador e a análise, “visto que esta é feita no decorrer do processo de
levantamento de dados” (PATRÍCIO, 1999, p.72). Essa fase inicia quando o
pesquisador começa a coletar os dados e continua quando retorna, aos sujeitos
para validar e, se necessário, coletar novos dados.
“Saindo do campo” caracteriza-se pelas “despedidas, agradecimentos
ou encaminhamentos futuros ou mesmo pode representar o encontro ou
reencontros para a apresentação e devolução dos dados”. Podem “estar
acontecendo gradativamente no decorrer processo de colher dados, mas tem seu
caráter específico no final deste” (PATRÍCIO, 1999, p.73). Os encontros e
reencontros também podem ocorrer quando o pesquisador necessita esclarecer
alguns pontos que não ficaram claros na transcrição da entrevista ou para coletar
mais dados. Esses momentos tanto podem significar o final do estudo quanto o
início de outros. A interação possibilita que o pesquisador veja pontos em comum
a todos, e ao mesmo tempo algo específico em cada um dos sujeitos do estudo de
modo que no processo do vai e vem podem emergir outras categorias além
daquelas que surgiram na elaboração das questões que nortearam a pesquisa.

3.2 O TRABALHO DE CAMPO

O trabalho de campo específico para esse estudo foi iniciado há um ano,


quando iniciei a pesquisa bibliográfica sobre o tema e sobre o método, elaborei o
projeto e, posteriormente, testei os instrumentos do projeto piloto. A elaboração
final da dissertação foi iniciada em dezembro de 2004 e findou em março de 2005.
A seguir descrevo cada momento do Referencial Holístico-Ecológico com
mais detalhes.
79

3.2.1 Entrando no Campo

Em 07 de abril de 2004, encaminhei um ofício ao diretor presidente da


Cooperativa X, solicitando a permissão para elaborar uma pesquisa sobre a
PERCEPÇÃO DE MÉDICOS COOPERADOS SOBRE OS PROCESSOS DE
CONTROLE DE CUSTOS EM UMA COOPERATIVA MÉDICA (Anexo 1), o qual
declarou, por escrito, nesse mesmo dia, que concordava mediante o cumprimento
dos termos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 196/96 e suas
complementares, e que a instituição possuía condição para o desenvolvimento do
projeto, autorizando a sua execução nos termos propostos (Anexo 2).
O Projeto referente ao tema foi encaminhado e aprovado pelo Comitê de
Ética da Cooperativa X em maio desse mesmo ano. Enviei o Projeto ao comitê de
Ética da Universidade Estadual do Estado de Santa Catarina, no início de junho de
2004, para qualificação.
Na busca do entendimento sobre a percepção de médicos cooperados
sobre os processos de controle de custos em uma Cooperativa de Trabalho
Médico, optei pelo estudo de caso como tipo de pesquisa.
O estudo de caso consiste na observação detalhada de um contexto, ou
indivíduo, de uma única fonte ou de um acontecimento específico. Pode referir-se
a um ou mais casos (MERRIAM, 1988).
Na busca da resposta ao problema do estudo foram selecionados
profissionais que atuam em Florianópolis em quatro grandes áreas de atendimento
médico: ginecologistas e obstetras, clínicos gerais, cirurgiões gerais e pediatras
que compõem o quadro médico da Cooperativa X. Foram sorteados oito médicos
cooperados há, pelo menos, 10 anos, atuando na própria cidade, pois esses
profissionais puderam acompanhar o crescimento da cooperativa e vivenciar a
evolução da complexidade dessa organização.
O instrumento utilizado para a coleta de dados foi a técnica da entrevista
semi-estruturada que, segundo Minayo, “pressupõe perguntas previamente
formuladas, porém, o entrevistado também aborda livremente o tema proposto”.
[...] “Por meio dela o pesquisador procura obter informes dos valores, das atitudes
e opiniões na fala dos atores sociais” (MINAYO 2001, p.58).
80

O formulário básico da entrevista em um primeiro momento buscou a


identificação dos sujeitos a partir de informações tais como idade, sexo, estado
civil, especialidade, tempo de formação como médico, tempo de atuação como
médico, tempo de cooperação na Cooperativa X, locais e horas de atuação, local
da entrevista; data da entrevista; hora da entrevista; número de encontros e
registro da identidade.
A entrevista semi-estruturada identificava os sujeitos por escrito no
Formulário de entrevista (Anexo 4). As questões norteadoras foram: 1) “O que
representa para você uma cooperativa médica?”; 2) “Quais são as vantagens e as
desvantagens de ser cooperado (a)?”; 3) “O que você acha dos valores que a
Cooperativa de Trabalho Médico paga pelas consultas ou pelos procedimentos?”;
4) “Qual o seu esquema de atendimento?”; 5) ”O que você entende por custo e por
controle?”; 6) “O que você entende por controle de custo em uma cooperativa de
trabalho médico?”; 7) “Como você acha que são feitas as regras para o controle
de custo na cooperativa médica?”; 8) “Como é que o controle interfere na sua
prática médica?”.
As entrevistas foram registradas por meio de gravação, em mini gravador
digital e transcritas em seguida.
O projeto piloto foi realizado com três médicos, sendo dois do sexo
masculino e um do sexo feminino, sorteados no universo de profissionais
cooperados, de áreas diferentes. O contato com esses mesmos foi pessoal e
individual. Falei de forma breve sobre os objetivos e a importância do tema. Após
esse contato, fiz o convite de participação no estudo. Todos os três aceitaram,
quando então foi marcada a entrevista em local, data e hora de acordo com a
conveniência de cada um. No momento da entrevista, expliquei, mais uma vez, a
cada um dos três sujeitos, os objetivos da pesquisa, bem como a minha
disponibilidade em esclarecer qualquer que fossem os pontos por eles a elucidar.
Reforcei o meu compromisso em manter sigilo e anonimato e de apenas divulgar
os dados após o consentimento de cada um deles, constantes nas Resoluções do
Conselho Nacional de Saúde (nº 196/96). Naquele momento, solicitei autorização
para gravar a entrevista e indaguei se ainda queriam permanecer como sujeitos da
pesquisa. Com a concordância deles (os sujeitos da pesquisa), entreguei o Termo
81

de Consentimento Livre e Esclarecido, que informa a confidencialidade das


informações e solicitei a assinatura do mesmo e a anotação do número do registro
da identidade (Anexo 3). Os sujeitos confirmaram a sua participação e
concordaram com a gravação da entrevista.
Ao iniciar a entrevista, solicitei primeiro que cada um escolhesse um
pseudônimo para garantir o anonimato.
Iniciei a entrevista, gravando-a e, ao final, perguntei a todos os sujeitos
entrevistados se tinham algo a acrescentar. Todos disseram que não tinham mais
nada a acrescentar. Só então sorteei os demais a serem entrevistados, totalizando
oito sujeitos, porque na investigação qualitativa, segundo Trivinos (1987), citado
por Grosseman (2001, p. 34): “a principal preocupação não é o tamanho da
amostra, mas, sim, o aprofundamento do estudo de cada unidade e, geralmente,
decide-se intencionalmente o seu tamanho”.
Uma médica cooperada que havia sido sorteada não aceitou participar do
estudo; por isso, sorteei outro sujeito do sexo masculino, o qual aceitou com
prazer e sentiu-se lisonjeado por compor a amostra.
As três entrevistas demandaram que não havia necessidade de mudança;
portanto, segui a próxima etapa que é “ficando no campo”, utilizando o mesmo
instrumento validado na etapa “entrando no campo”. Como não houve
necessidade de alterações das entrevistas do projeto-piloto, essas foram
aproveitadas como parte dos resultados.

3.2.2 Ficando no Campo

Iniciei a coleta de dados no final de junho de 2004 com o projeto piloto.


Permaneci coletando dados, pesquisando e analisando por seis meses. Nesse
ínterim, tive o prazer de contatar diversas pessoas ligadas ao cooperativismo e
pesquisadores do país que muito me ajudaram, às vezes, até me fornecendo
material (livros), gratuitamente, ou disponibilizando suas atenções por telefone ou
por endereço eletrônico para me esclarecer acerca de melhores fontes
bibliográficas.
82

A cada encontro, seguia o protocolo do projeto piloto, e só a partir do


consentimento assinado por cada um dos sujeitos é que iniciava a entrevista.
Um dos sujeitos me questionou se havia alguma norma para a escolha do
pseudônimo. Expliquei que não e que ele poderia escolher qualquer pseudônimo
que lhe conviesse. Ele escolheu o nome do seu cão.
O tempo de entrevista variou de uma a duas horas com maioria dos
sujeitos. Apenas com um dos sujeitos a entrevista durou três horas; com esse
mesmo entrevistado, houve um problema técnico com o meu gravador que foi
prontamente solucionado por ele porque possuía outro gravador já que, segundo
disse, estava acostumado a ser entrevistado.
À medida que o processo de entrevista avançava, percebia que cada um
dos sujeitos ficava mais à vontade para responder às perguntas, e alguns deles
demonstraram alívio em ter com quem falar de forma sigilosa o que pensavam,
pois estavam certos de que não seriam identificados pelos demais colegas, fato
que os preocupara no início da entrevista. Um deles comentou: “está sendo
gravada, mas é sigilosa!”.
A todos os entrevistados retornei para validar a entrevista e entreguei a
transcrição. Perguntava-lhes se o texto encontrava-se de acordo conforme haviam
falado à gravação e, se desejavam modificar qualquer ponto da transcrição. Um
disse que não havia nada a modificar; quatro fizeram correções por escrito,
modificando o texto em alguns pontos por eles considerados importantes. Um
sujeito modificou parcialmente o texto e me enviou por correio eletrônico. Com
dois dos entrevistados necessitei fazer três retornos e utilizei algumas anotações
nos textos transcritos, nos encontros subseqüentes para esclarecimentos
referentes a dúvidas que advinham da transcrição do texto. O intervalo de tempo
entre a entrevista e a entrega da transcrição foi de 04 a 06 semanas e variou
conforme o sujeito.

3.2.3 Saindo do Campo

A despedida ocorreu em dezembro de 2004, quando retornei aos


entrevistados com a redação final dos dados e da análise conforme seriam
83

registrados no texto da dissertação. Nenhum dos sujeitos alterou o texto final. Um


deles disse: “era bem isso que eu queria dizer”.

3.3 ANÁLISE DOS DADOS

O Referencial Holístico-Ecológico utiliza a técnica da Análise-Reflexão-


Síntese, “que contempla a não-linearidade e até a possibilidade do caos, no início
do exercício da análise” (PATRÍCIO, 1999, p.72).
A técnica da Análise-Reflexão-Síntese ocorre desde o projeto piloto e
consiste na visão do todo e das partes, mediada pela reflexão, e permeia a coleta
de dados, por meio dos encontros e reencontros com os sujeitos (PATRÍCIO,
1999). Essa técnica utiliza dois processos: a análise e a síntese, os quais são
mediados “pela reflexão crítica que se refere a nossa razão, à compreensão e
autocrítica de nossas verdades. Conforme Grosseman (2001, p.33), “a análise
decompõe os dados e a síntese os integra às diversas dimensões e contextos da
vida dos sujeitos. Ambas são sinérgicas e são realizadas por meio da reflexão,
que é uma reconsideração dos dados”.
Durante a coleta dos dados, esses já iam sendo analisados, pois no
método qualitativo a análise e a coleta desenvolvem-se simultaneamente. Assim,
possibilita o retorno ao sujeito para validar sua compreensão, suas impressões e
elucidar alguns pontos que não ficaram nítidos em um ou mais momentos da
pesquisa. Permite ainda ao pesquisador tomar a decisão de continuar ou não com
a coleta dos dados no momento que percebe que os mesmos começam a se
repetir (PATRÍCIO, 1999).
Em pesquisa qualitativa, todos os dados coletados que necessitam ser
analisados precisam, antes de tudo, serem organizados. A essa ordem denomina-
se categorias, pois elas “constituem um meio de classificar os dados descritivos
recolhidos” (BOGDAN & BIKLEN, p. 221). Portanto, para classificar elementos em
categorias, deve-se investigar o que cada um desses têm em comum para,
posteriormente, agrupá-los.
No decorrer das entrevistas, percebi que as categorias iam emergindo
sendo que as mesmas passaram a se repetir a cada entrevista.
84

As categorias que emergiram foram:


Categorias referentes às expectativas dos cooperados:
• Definição de cooperativa
• Definição de Ato Médico
Categorias referentes à experiência cotidiana dos cooperados:
• Valores dos cooperados
• Percepção das ações dos cooperados
• Percepção das ações dos gestores
• Percepção das ações dos pacientes (clientes)
Categorias referentes ao conhecimento sobre controle de custos em uma
cooperativa de trabalho médico:
• Definição de custos
•Definição de controle – Auditoria Médica; Comitês de Especialidades;
Projeto Data Warehouse; Prestação de Contas do Conselho Fiscal à Assembléia
Geral.

3.4 TERMOS RELEVANTES PARA A PESQUISA

O item “termos relevantes para a pesquisa” está inserido porque, segundo


meu entendimento, os profissionais da área da saúde nem sempre possuem a
compreensão desses termos da forma como eles são tratados na Administração.
Processo “é um conjunto de atividades estruturadas e medidas destinadas
a resultar num produto ou serviço especificados com a finalidade de atender e
preferencialmente suplantar as necessidades e expectativas dos clientes internos
e externos” (OLIVEIRA, 2001, p.201). Portanto, é uma atividade de trabalho com
um começo e um fim, cujas entradas e saídas são claramente identificadas.
Controle “é a fiscalização exercida sobre as atividades de pessoas,
órgãos, departamentos, ou sobre produtos, etc., pré-estabelecidas” (NOVO
AURÉLIO, 2004, p.542).
Custos são valores correspondentes à utilização de recursos humanos e
materiais para prestação de algum serviço, produção de algum produto ou
85

realização de alguma atividade que seja finalidade da entidade/empresa (CATA


PRETA, 2001).
O custo de um processo “é o gasto relativo a um bem ou serviço utilizado
na produção de outros bens ou serviços” (MARTINS, 2003, p.25). Refere-se ao
número de pessoas envolvidas, documentações, papéis, transações e outros.
Os custos podem ser: diretos, indiretos, fixos, variáveis, inevitáveis,
suplementares, sociais, de produção e de transação.
Os custos fixos são aqueles que permanecem inalterados
independentemente do grau de ocupação da capacidade da empresa, enquanto
que os custos variáveis variam conforme o grau de ocupação da capacidade
produtiva da empresa.
Os custos diretos são aqueles que podem ser identificados diretamente
com uma unidade do produto. Já os custos indiretos não podem ser
economicamente identificados com as unidades que estão sendo produzidas.
Os custos inevitáveis, considerados em curto prazo, coincidem com os
custos fixos, enquanto que os custos suplementares não aparecem contrapostos
por nenhuma despesa, mas precisam entrar no cálculo de custos, pois
concretamente significam gastos.
Os custos de produção são a soma de todos os custos originados na
utilização dos bens materiais de uma empresa, na elaboração de seus produtos.
Os custos de transação relacionam-se com os custos necessários para a
realização de contratos de compra e venda de fatores num mercado composto por
agentes formalmente independentes.
Os custos sociais são as despesas feitas durante o processo de produção
e que não são pagas pelos que as ocasionaram, mas por terceiros ou transferidas
para toda a sociedade.
Os clientes internos são os cooperados e funcionários e os externos são
os compradores dos planos de assistência à saúde, os usuários, os fornecedores
e os prestadores de serviços (hospitais, clínicas, laboratórios e serviços de
imagem) (IRION, 1994).
86

4 OS ENTREVISTADOS E SUA PERCEPÇÃO SOBRE ASPECTOS


DE UMA COOPERATIVA MÉDICA

Neste capítulo apresento os sujeitos do estudo por área de atuação na


cooperativa, os dados provenientes das interações com eles, e a análise dos
dados com base nos diálogos.

4.1 OS ENTREVISTADOS

Os cirurgiões são dois sujeitos ambos do sexo masculino: NENO e


SÓCRATES.
NENO é casado. Tem mais de cinqüenta anos, encontra-se formado há
mais de trinta e é cooperado há mais de quinze. Atua no Sistema Público de
Assistência à Saúde, onde faz plantões e sobreaviso (doze horas por semana),
em clínica privada (vinte horas por semana) e em outras atividades médicas (dez
horas por semana).
SÓCRATES é divorciado. Tem mais de cinqüenta anos. Encontra-se
formado há mais de vinte e cinco e é cooperado há mais de vinte. É professor em
Instituição Pública de Ensino (vinte horas por semana). Atua em clínica privada
(doze horas por semana), em consultório particular (oito horas por semana) e em
outras atividades relacionadas à medicina (cinco horas por semana).
Os ginecologistas/obstetras são: CINDY, do sexo feminino, e JÚPITER, do
sexo masculino. CINDY é casada. Possui mais de cinqüenta anos de idade, e
mais de vinte e cinco anos de formada e de cooperada. Atua como profissional
liberal em consultório (sessenta horas por semana) e é plantonista de um hospital
particular (doze horas por semana).
JÚPITER é solteiro e tem mais de quarenta anos de idade. É formado e
cooperado há mais de dez anos. Atua como médico em Serviço Público (vinte
horas por semana), em clínica privada (oito horas por semana) e em outras
atividades relacionadas à medicina (quinze horas por semana).
87

Os clínicos são: VELHO, do sexo masculino, e CAMOGLI, do sexo


feminino.
VELHO é separado. Possui mais de quarenta anos de idade, encontra-se
formado e é cooperado há mais de dez anos. Atua como médico em clínica
privada (vinte horas por semana) e em outras atividades relacionadas à medicina
(vinte horas por semana).
CAMOGLI é casada. Tem mais de quarenta e cinco anos de idade.
Encontra-se formada há mais de vinte e é cooperada há mais de dez anos. Atua
como médica em clínica privada (vinte horas por semana) e em Instituição Pública
(vinte horas por semana).
Os pediatras são: SOL, do sexo masculino, e PÚRPURA, do sexo
feminino.
SOL é casado. Tem mais de cinqüenta anos de idade. Formado há mais
de vinte e cinco anos. É cooperado há vinte. Atua em instituição pública (vinte
horas por semana) e em clínica privada (quarenta horas por semana).
PÚRPURA é casada. Tem mais de quarenta e cinco anos de idade.
Formada há mais de vinte. É cooperada há mais de quinze anos. Atua em
instituição pública (vinte horas por semana) e em clínica privada (vinte horas por
semana).

4.2 AS EXPECTATIVAS DOS COOPERADOS EM UMA COOPERATIVA DE


TRABALHO MÉDICO

Para NENO, uma cooperativa é uma reunião de pessoas com os mesmos


interesses, que prestam serviços médicos a uma coletividade sem fins lucrativos,
cujas sobras revertem aos associados.

Obviamente o que é uma cooperativa... É uma reunião de pessoas


com os mesmos interesses tentando prestar serviços médicos,
sem fins lucrativos, de modo que tudo seja revertido para o
interesse de seus associados.

NENO considera a cooperativa como uma garantia do exercício da


profissão como liberal. Irion salienta que esse tipo de profissional possui “a
88

liberdade de, e só ele e mais ninguém, usando seus conhecimentos e assumindo


toda a responsabilidade decorrente, decidir sobre os meios a empregar em
benefício do cliente” (Idem, ibidem, p.48).

É a última trincheira do exercício liberal da medicina, porque


saindo daí vamos ser empregados, explorados por outros planos
de saúde que não possuem compromisso algum com a categoria
[...], e claro, prestando um serviço de boa qualidade, ético,
científico e competitivo.

SÓCRATES considera uma cooperativa como “uma reunião de


profissionais para atender bem a população e remunerar de forma justa o trabalho
do médico”.
A união de forças com o objetivo de garantir um mercado de trabalho de
melhor qualidade de atendimento da assistência à saúde é a visão de cooperativa
médica para VELHO.

A cooperativa médica significa, para mim, unir forças para que se


possa aglomerar trabalho, para fazer com que se tenha um nicho
de mercado, e que se possa transformar esse nicho [...] numa
coisa mais garantida, para poder dar um melhor atendimento. [...] a
única forma de valorizar o Ato Médico, que é tudo aquilo que é
realizado pelo médico.

SOL concorda com VELHO ao considerar que uma cooperativa representa


a junção de forças entre pessoas de uma mesma categoria. Acrescenta que a
cooperação possibilita a aquisição de benefícios, ao mesmo tempo em que torna o
associado um ser representativo no contexto social. Para ele (SOL), a inclusão do
cooperado nesse contexto permite um crescimento tanto profissional quanto
financeiro.

Representa você como grupo ou entidade médica. Tem a


capacidade de conseguir mais benefícios para todos [...], você é
incluso, está dentro de um grupo, porque o médico como categoria
tem uma tendência natural de ser uma pessoa sozinha, solitária.
Com uma caneta na mão decide sempre o que fazer com o
paciente e com a sua vida. Eu penso que a cooperativa é a forma
de estimular o outro lado dele, o lado da integração, da soma, da
humildade, de prestar contas, de estar sempre tendo feed-back
89

para o seu trabalho, o que o possibilita a crescer profissionalmente


e financeiramente também. Isso basicamente é uma cooperativa.

CINDY vê a cooperativa como a oportunidade de exercer a medicina de


forma digna onde possa obter recursos financeiros adequados à sua condição de
profissional, de ser humano e de ser social. Também considera que a cooperativa
possibilita o atendimento do paciente que a procura com qualidade e ética.

O que eu sei é que a nossa cooperativa foi criada para oferecer


um mercado de trabalho aos profissionais da nossa categoria para
que tivéssemos um trabalho com retorno financeiro adequado às
nossas necessidades e digno no sentido de exercermos uma
medicina de qualidade e ética.

Já JÚPITER salienta que uma cooperativa é uma sociedade entre pessoas


da mesma categoria profissional que prestam serviços médicos a preços
acessíveis aos clientes desse tipo de empresa. Para ele, a empresa rege-se por
parâmetros fundamentados na lei do cooperativismo.

Uma cooperativa médica para mim é um conjunto de profissionais


médicos que se associam para prestar serviços médicos de forma
justa e mais em conta à população [...], dentro de parâmetros
preestabelecidos (da lei do cooperativismo).

Conforme JÚPITER, “essa associação poderá proporcionar aos


profissionais uma [...] divisão de lucros ou prejuízos”.
CAMOGLI considera uma cooperativa como um esforço conjunto entre os
profissionais médicos, a fim de que os mesmos possam desempenhar com
qualidade a sua profissão e obter recursos financeiros para viver sua vida tanto
profissional, quanto pessoal, com qualidade.

Significa um esforço conjunto entre os médicos para que o


trabalho possa se desenvolver da melhor maneira possível em
termos de plena realização profissional, no sentido de fazer as
coisas mais adequadamente com ética e poder receber
adequadamente pelo trabalho prestado, que te permita investir na
melhoria do serviço que tu prestas, e que tu possas ter uma
qualidade de vida decente, para ter tempo, quando não estiver
trabalhando, de desempenhar atividades da vida não profissional
90

que te dêem satisfação (convívio com a família, amigos, colegas,


tempo livre para estudar, fora do horário de trabalho).

PÚRPURA vê uma cooperativa médica como um grupo de pessoas com


os mesmos interesses que se unem para constituir uma sociedade que lhes
proporcione melhores condições de trabalho, atendimento de qualidade,
autonomia e recursos financeiros adequados às suas necessidades.

No meu entendimento, uma cooperativa médica não difere das


demais cooperativas, porque são pessoas que se unem para
conseguirem o que desejam de maneira autônoma. E o desejo
pode ser: melhores condições de trabalho, mais recursos
financeiros, melhor qualidade de atendimento à população, ou isso
tudo junto.

Porque ninguém se coopera quando tudo está bem. Você acha


que eu me cooperaria se meu consultório só tivesse paciente
particular? Isso seria loucura, você não acha? Seria trocar gato por
lebre. Eu só sou cooperada porque preciso, caso contrário não
seria.

Afirma que o ser humano se coopera quando necessita de algo que supra
suas necessidades e, assim que essas são supridas, passa a agir em benefício de
si mesmo em detrimento da coletividade.

4.3 O COTIDIANO DOS COOPERADOS

NENO, SÓCRATES, CINDY, JÚPITER, VELHO, CAMOGLI, SOL e


PÚRPURA observam que o trabalho médico tem sido desvalorizado, percebido
pelo baixo valor que a cooperativa repassa aos serviços médicos que consideram
como Ato Médico (consultas e procedimentos que envolvam apenas a participação
pessoal – física – dessa categoria profissional).
NENO e SÓCRATES comentaram que o trabalho médico está sendo
desvalorizado devido ao “empobrecimento da população brasileira e da elevação
dos custos da prática médica”.
CINDY manifestou que atualmente está ganhando menos, embora esteja
trabalhando mais.
91

[...] o que e eu tenho observado é que o retorno financeiro em


relação à minha carga de trabalho tem sido cada vez menor; por
exemplo: quando eu iniciei minha vida de cooperada eu recebia X,
hoje eu recebo dez vezes menos. E isso no que resulta? Resulta
em ter que trabalhar mais horas, em uma condição financeira
menor que as minhas necessidades: de ter condição financeira
para adquirir bens, conforto, lazer, educação saúde física e mental
para mim e meus familiares.

Ela afirma que, pela redução de seu poder aquisitivo no decorrer dos
anos, não pode dedicar-se ao lazer e a outra atividade que gostaria de ter.

Gostaria de ter lazer, um descanso, gostaria de poder me dedicar


a outra coisa que também me interessa. Então, eu vejo que isso
no decorrer dos anos foi se deteriorando, porque [...] o meu poder
aquisitivo diminuiu assustadoramente, [...] então eu vejo que isso é
um aspecto impeditivo para a minha qualidade de vida.

JÚPITER pondera que a cooperativa lhe fornece clientes e rendimentos


que “são variáveis ao longo do mês”. Afirma, entretanto, que não possui a
“garantia de que o valor a ser pago será suficiente” para suprir as suas
necessidades. Expressa que o valor justo do Ato Médico é aquele que lhe
proporciona recursos para pagar suas despesas, lazer, atualização científica,
compra de bens materiais, e conforto.

[...] o valor justo é aquele que me possibilita pagar minhas


despesas; poder viajar nas férias; participar de congressos; ser
dono de um bom carro; ter conforto [...].

CAMOGLI destacou que a cooperativa não está correspondendo aos


princípios para os quais ela foi criada, entre eles, a remuneração adequada, o bem
estar de seus sócios e o desempenho das atividades profissionais de melhor
qualidade.

[...] eu não vejo que a cooperativa desempenhe aquilo que eu


imagino que seria o objetivo de qualquer cooperativa em geral, que
é permitir ao profissional desempenhar sua atividade da melhor
maneira possível; remunerar adequadamente o profissional para
que ele possa dispor de mais tempo para se aperfeiçoar, se
atualizar e oferecer um serviço de melhor qualidade.
92

Enfatizou que, “mesmo trabalhando oito horas por dia, no mínimo, e


algumas horas nos finais de semana”, não teria condições de satisfazer as suas
necessidades “se dependesse exclusivamente do exercício da medicina”, ou seja,
do que lhe remunera esse exercício profissional.
SOL afirmou que atualmente tem tido uma carga de trabalho mais elevada
que outrora. Expressou que necessita trabalhar em “véspera de feriado e pós-
feriado, no sábado, e ainda dá plantão” para ganhar “cinqüenta por cento menos,
mesmo trabalhando mais”.

PÚRPURA desabafa:

[...] estamos ganhando cada vez menos e trabalhando que nem


[...] sujeitos a todas as intempéries da profissão, da televisão, dos
pacientes que não nos respeitam, que chegam pra gente e ditam:
eu quero que a senhora peça isso, peça aquilo para o meu filho, e
coisas desse tipo.

O baixo valor, repassado aos médicos dessa Cooperativa de Trabalho


Médico, segundo os sujeitos deste estudo, decorre da realidade econômica
brasileira (baixo poder aquisitivo da população), da influência da mídia sobre a
população assistida por planos supletivos de assistência à saúde (no caso, a
cooperativa médica) e da formação tecnicista do médico e da má prática
cooperativista.
NENO percebe que o empobrecimento da população brasileira
impossibilita os aumentos dos valores das parcelas dos planos de saúde.
Conseqüente a esse fato, a cooperativa deixa de cumprir com um de seus
princípios que é a remuneração adequada de seus sócios.

Hoje a cooperativa não cumpre mais o preceito de fornecer


trabalho com remuneração adequada às necessidades do
profissional médico [...]. A população está muito pobre, e com isso
não há como [...] aumentar os valores dos planos de saúde para
que os médicos possam ganhar mais, porque o povo não tem mais
como pagar.

Acrescenta que “o médico por ser mal formado” torna-se suscetível às


“influências da mídia, que está doida para implantar um seguro contra a má prática
93

médica”, por isso “solicitam exames absolutamente desnecessários para se


resguardarem de possíveis processos, que encarecem o procedimento médico e
elevam os custos da assistência à saúde”.
A solicitação desnecessária de exames, conforme argumenta Andrade
(2000), além de ser percebida por NENO, também é percebida pelos demais. No
entanto, SÓCRATES, CINDY, JÚPITER, VELHO, CAMOGLI, SOL e PÚRPURA
não relacionaram o excesso de exames complementares a má formação médica
e/ou influência da mídia, tendo citado esse fato como um dos motivos que
desvalorizam o Ato Médico.
Já a má prática cooperativista é percebida por todos. É, entendida por eles
como má prática do cooperado e da cooperativa. Parece que havia um consenso
entre eles, pois a percepção da má prática cooperativista não variou entre os
gêneros e as especialidades dos sujeitos do estudo. A má prática cooperativista
do cooperado, segundo NENO, SÓCRATES, JÚPITER e SOL, consiste na
supervalorização de tecnologias de diagnóstico e de tratamento.
Para NENO, “o trabalho médico não está sendo valorizado”, porque
“algumas cirurgias se forem realizadas a ‘céu aberto’, que dão mais trabalho,
complicações e exigem dedicação do médico, o profissional recebe somente
setecentos CHs”. No entanto, “se o médico agregar um aparelho ao ato cirúrgico,
a Tabela de Honorários da Associação Médica Brasileira de 1992 prevê o
pagamento de dois mil CHs”, o que, para ele, “mostra uma discriminação entre
aquele que possui aparelhagem e o que não possui”. Utilizando-se desse artífice,
“um grupo [...] consegue ganhar seis mil CHs só pelo fato do endoscópio deles ter
uma câmera na ponta”.
SÓCRATES comenta que “a incorporação de tecnologias torna injusta a
lógica da Tabela de Honorários da Associação Médica Brasileira”, pois remunera
melhor aquele que incorpora equipamentos tanto nos atos clínicos, quanto nos
atos cirúrgicos e diagnósticos. Considera, ainda, que a valorização da tecnologia
[...] “é uma conseqüência do processo de trabalho da sociedade capitalista, da
indústria de equipamentos e medicamentos que influenciam de forma irracional o
médico”.
94

JÚPITER afirma que “só porque a cirurgia é por vídeo, a cooperativa paga
três vezes o valor daquela realizada a céu aberto”. Enfatiza que, no seu entender,
“não deveria pagar”. Porque “a opção de compra do equipamento foi do
profissional que comprou, mas a cirurgia é a mesma, modifica apenas a maneira
de acessar o campo cirúrgico”.
Então, JÚPITER questiona: “Quem tem que arcar com isso? E responde:
“é o profissional que o adquiriu e não a cooperativa, nem eu, que indiretamente
estou pagando por algo que não comprei, [...], e deixando de receber o justo”.
SOL considera que o Ato Médico foi “destruído porque a mídia e as
empresas que vendem aparelhos, que vendem medicação, colocaram na cabeça
das pessoas que o exame físico só é importante se for complementado com
exames” laboratoriais e outros. Afirma, então, que o “médico passou a ser um
pedidor de exames”.
NENO e JÚPITER percebem que a má prática cooperativista do
cooperado ocorre, também, quando pessoas jurídicas cooperadas comercializam
com a cooperativa medicamentos e materiais.

[...] está acontecendo uma coisa muito grave que é a


comercialização de medicamentos por alguns profissionais que
ganham não só pelo procedimento como também pela venda de
medicamentos. É claro que a venda não ocorre diretamente, isto é:
eles comercializam por intermédio de suas clínicas, mas como eles
são também os donos da cooperativa, dá tudo na mesma. [...] É
uma atitude acima de ser anti-cooperativista, anti-ética, [...] e a
cooperativa paga o valor desses medicamentos, acrescido de uma
taxa de comercialização que é cobrada dos usuários e repassado
para o colega [...]. Então, é por isso que os nossos honorários
estão aquém da realidade [NENO].

[...] outro fato que desvaloriza o Ato Médico é o pagamento de


determinados materiais de preços elevadíssimos, e que bem
sabemos, ficam consignados nas clínicas cooperadas para
utilização a valores menores do que os estabelecidos na tabela do
BRASÍNDICE, promovendo um verdadeiro mercado negro nesse
comércio de materiais pagos pela cooperativa, porque a
cooperativa paga a essas clínicas [...] um valor maior que
possibilita um grande lucro neste tipo de comércio. [...] É um
mercado negro em cima da desgraça alheia [JÚPITER].
95

CINDY e SOL observam que o atendimento do cliente encontra-se


superficial e distante, e como conseqüência desse tipo de atendimento, geram-se
múltiplos encaminhamentos e exames complementares que corroboram com a
desvalorização do Ato Médico.

Eu observo que as pacientes são atendidas como se fossem


objetos, porque elas me contam. Um objeto para poder ganhar
tempo e atender mais para ganhar mais, ou são empurradas para
outro colega solucionar aquilo que se poderia resolver, [...].Assim,
como existe esse jogo de empurra-empurra, o outro cooperado
também vai empurrar e repetir o mesmo erro. [...] e cada vez mais
vai se gastar mais [CINDY].

[...] eu atendo um paciente aqui no meu consultório pediátrico. Aí,


a mãe vem e diz que a criança não dorme direito, tem uma lesão
na pele, sua muito. Como eu vou resolver isso numa consulta?
Não posso. Tenho que mandá-la observar e retornar daqui a uma
semana. Aí, vai ser um retorno; então o que aconteceu: assim
como eu, a grande maioria dos médicos que fazem clínica geral
costuma receber queixas de três, quatro, cinco situações. Bom,
como ele não ganharia nada se solucionasse uma, duas, três,
quatro, cinco coisas, ele começou a se sentir pressionado, acuado
e sem tempo para resolver todos os problemas. Se ele fosse
dedicar todo o tempo necessário, o prazo da consulta iria estourar.
Se ele não fosse dedicar, ele poderia encaminhar para outra
especialidade. Então, o que aconteceu? Começou por aí. Como
não consigo resolver no meu tempo, mesmo tendo habilidade, não
vale a pena fazer isso, porque [...] vou ter que ficar duas horas
com o paciente e ele vai ter que voltar quatro a cinco vezes, e aí
eu não posso cobrar a consulta, e, aí o que acontece? Ele começa
a mandar para o especialista, coisa que ele poderia resolver [SOL].

VELHO e CINDY citam que há pouca interação entre os profissionais


sócios da cooperativa. Por isso, eles argumentam que esses profissionais tecem
críticas do trabalho uns dos outros, são desunidos, invejosos e desconfiados. Para
CINDY, “esse comportamento resulta de um fato simples que é o medo de perder
o cliente” e, conseqüentemente, ter a sua situação financeira reduzida”.

[...] o cooperado não conhece o outro cooperado, de modo que


isso gera [...] inveja, isso também gera desconfiança, desunião,
porque é muita gente para trabalhar [...] ninguém conhece
ninguém, não se sabe como o outro trabalha, se é de forma ética
ou não [VELHO].
96

[...] o trabalho de um cooperado, por exemplo: é criticado pelo


colega que ressalta suas próprias qualidades profissionais em
detrimento das do outro, insinuando que se o paciente operar
(fazer uma cirurgia, por exemplo) com ele (teoricamente é mais
apto, mais hábil, ou melhor, profissional), porque o procedimento
cirúrgico é mais rentável em relação à técnica executada pelo
outro; esse paciente deixará seu médico assistente para ser
atendido por aquele que lhe convenceu [...] [CINDY].

CINDY comenta, ainda, que alguns cooperados recebem “favores ou


propinas” de fornecedores de materiais especiais, utilizados em determinadas
técnicas cirúrgicas que exigem grande investimento do médico no que tange ao
aperfeiçoamento e à aquisição da tecnologia. Isso porque a cooperativa além de
criar “um múltiplo artificial para o pagamento de tais procedimentos”, já percebido
por NENO e JÚPITER, permite que “por baixo do pano, o fornecedor de órteses e
próteses” negocie com o cooperado para que esse tenha “um certo retorno
financeiro”. Assim, segundo CINDY, “a cooperativa exime-se de sua
responsabilidade empresarial de bem remunerar e o usuário, que está tendo um
atendimento diferenciado em um país de terceiro mundo, de pagar pelo material
utilizado nos procedimentos cirúrgicos especiais”.
CAMOGLI enfatiza que o “valor que a cooperativa paga pela consulta é
pouco, porque não é suficiente para ela “cobrir as despesas que possui para
exercer a profissão e manter sua vida pessoal”; por isso, afirma: “eu tenho que
atender mais para que isso compense a pouca remuneração”.
PÚRPURA também acha que a cooperativa “paga muito pouco” e que
esse valor “não paga os gastos [que ela tem] com o [seu] consultório”.
Todos os sujeitos do estudo referiram que a desvalorização do Ato
Médico, percebida pelo repasse de baixos valores às consultas e ou
procedimentos, também pode resultar da má prática cooperativista da
organização. A má prática cooperativista da cooperativa, segundo os sujeitos,
também pode ser conseqüência de má prática administrativa dos gestores.
NENO considera que a má prática cooperativista da cooperativa decorre
dos seguintes fatores:
97

• Supervalorização de tecnologias:

Eu já disse [...] que alguns colegas recebem muito mais que outros
quando utilizam equipamentos em seus procedimentos, pois,
então, esse fato no meu entender é uma supervalorização do
equipamento em detrimento ao Ato Médico, aquele que é realizado
de forma artesanal, onde o médico, e apenas ele, é o instrumento
essencial para a realização da assistência médica.

• Pagamento de materiais descartáveis reutilizados:

Outro fator importante que traduzo como má prática administrativa


é o pagamento por materiais descartáveis que são reutilizados por
clínicas e hospitais que não deveriam ser pagos, pois se o
profissional já usou, deveria jogar fora, ou se quiser reutilizar, tudo
bem, fica a critério dele, mas cobrar por algo que já foi pago, para
mim é roubo, e pagar por algo que já se pagou, em termos
administrativos para mim é incompetência. Sei que existem
acordos de se pagar X vezes por determinados materiais especiais
que são reutilizados, mas isso é uma insanidade. Tudo bem que
fica mais barato negociar dessa forma, mas se somos uma
cooperativa, deveria haver o bom senso disso não acontecer. Se o
profissional reutilizou, tudo bem, é só não cobrar, que vai sobrar
mais para ele e também para os outros.

• Comercialização de medicamentos:

[...] a comercialização de medicamentos por alguns profissionais


que ganham não só pelo procedimento como também pela venda
de medicamentos... É claro que a venda não ocorre diretamente,
isto é, eles comercializam por intermédio de suas clínicas, mas
como eles são também os donos da cooperativa, dá tudo na
mesma, [...] e a cooperativa paga o valor desses medicamentos
acrescido de uma taxa de comercialização que é cobrada dos
usuários e repassado para o colega [...]. Então, é por isso que os
nossos honorários estão aquém da realidade.

• Pagamento de procedimentos já pagos pelo Sistema Único de Saúde


(SUS):

Há também aqueles procedimentos [...] que o SUS já paga e,


mesmo assim, eles cobram da cooperativa; daí eu entrei numa
briga muito grande, mas no fim ficou o dito pelo não dito, porque
eles disseram que faziam um acerto de contas com a Secretaria
98

da Saúde, mas isso é mentira, nunca foi feito, isso é coisa de


polícia, é coisa de Ministério Público, sabias? [...]. Por isso que a
cooperativa vai mal das pernas, nada mais funciona.

• Pagamento de especialidades não médicas:

[...] existe na Tabela de Honorários Médicos da Associação Médica


Brasileira dois itens que são o da fisioterapia e o da patologia
clínica [...] que, para mim, não são especialidades médicas e como
tal não deveriam estar dentro da tabela. Por que eu digo isso?
Porque a fisioterapia não é realizada por médico e os exames
laboratoriais são realizados por bioquímicos ou, pior ainda, por
máquinas, onde se coloca uma gotinha de sangue lá, mistura-se
tudo, não se faz mais nada. Fiz, então, uma consulta ao Conselho
Federal de Medicina (CFM) referente ao assunto publicado num
livreto emitido pelo próprio CFM; no entanto, ainda não mandaram
a resposta. Bom, por que estou dizendo isso? Porque na hora em
que os médicos donos de laboratórios não puderem mais ser
cooperados, nós vamos poder negociar os valores dos exames de
laboratório de forma efetiva. E se a fisioterapia é realizada pelo
fisioterapeuta, que não é médico, então, a seção de fisioterapia [...]
não é Ato Médico e, por isso, não deveria ser paga pelos planos
da nossa cooperativa.

• Privilegiamento de alguns:

Existe um contrato que privilegia um grupo de especialistas [...]


quando seus equipamentos e serviços são utilizados. Nesse
contrato, a cooperativa remunera duas vezes o que é estipulado
pela Tabela da Associação Médica Brasileira, enquanto os demais
serviços afins são remunerados uma vez só. Dizem que esse
contrato ainda não pode ser extinto; no entanto, isso é uma
mentira, obviamente o contrato ainda não foi alterado porque não
há interesse.

• Pessoas Jurídicas cooperadas:

Outra coisa que eu penso, e acho fora do escopo do que o


legislador pensou quando legislou a cooperativa, é que por incrível
que pareça, na cooperativa dos médicos de Santa Catarina e de
Florianópolis existem pessoas jurídicas cooperadas. [...] Empresas
constituídas por médicos cooperados que se associam como
pessoa jurídica. Embora não tenha feito um estudo, repito: foge do
escopo do que o legislador quis, e para mim é um mecanismo para
burlar a Receita Federal.
99

SÓCRATES concorda com NENO quando comenta que a cooperativa


paga pouco porque gasta com o pagamento da incorporação tecnológica e o
pagamento de exames complementares.
A cooperativa paga pouco, porque gasta o dinheiro com a
incorporação de tecnologias, com os exames de laboratórios, com
exames de alto custo [...].

Alerta que “a cooperativa não lida com isso de forma racional; por isso, os
valores do Ato Médico são subvalorizados na referência da supervalorização de
equipamentos”. Também percebe que há apadrinhamentos, quando “para uns
pode para outros não pode”.
CINDY ainda acrescenta como fator para a má prática cooperativista da
cooperativa, a pouca habilidade – especialização – dos dirigentes para gerir a
cooperativa.

Os dirigentes deveriam ter habilidades em outras áreas técnicas


para poder gerir a realidade da cooperativa. Para a cooperativa ter
saúde financeira, os dirigentes deveriam estar atentos e presentes
em tempo integral.

• Monopolismo e o cartel da profissão pela cooperativa:

No que a cooperativa contribuiu para que eu possa obter recursos


financeiros adequados à minha condição de profissional, de ser
humano, de bem estar e de estado social? A cooperativa foi criada
para evitar a escravização do trabalho; no entanto, ela cartelizou
esse trabalho, e é o maior senhorio, é a grande responsável pela
cultura escravista do médico, atualmente [...].

• Planos de Saúde não co-participativos:

[...] a paciente tem a facilidade de procurar um ou outro


profissional médico para um mesmo diagnóstico, porque ela paga
um valor único mensal independente dela consultar dez vezes,
vinte vezes ou cinqüenta vezes [...] e esse fato acontece porque a
paciente não tem ônus e não tem consciência que essa atitude
possa gerar futuramente [...] um problema para o todo, ou seja:
aumento dos gastos da cooperativa e menor remuneração do Ato
100

Médico. Sabe por quê? Porque quanto mais o paciente usa o seu
plano, menos eu ganho.

JÚPITER chama atenção não só para o pagamento da incorporação


tecnológica, como também para os investimentos da cooperativa em empresas
correlatas e para a aquisição de bens móveis e imóveis:

A cooperativa vive adquirindo imóveis, carros, instalações de


serviços, sempre mudando de lugar (aluguéis de espaços físicos
para a loja de Vendas, para o SOS) [...], participou na instalação
da farmácia [...] e deixou de dividir o lucro conosco, para investir
nessa empresa, que até o momento não trouxe nenhuma
vantagem para mim que sou dono. Olha o que foi botado de
dinheiro nessa farmácia [...] daria para comprar outro edifício sede
da cooperativa.

VELHO concorda com CINDY sobre o desconhecimento teórico e prático


dos gestores que levam à má prática administrativa.

Eu acredito que a má administração da cooperativa vem da


inexperiência dos gestores, que é o resultado da falta de
conhecimento teórico e prático deles, de como administrar; do
desconhecimento de como a cooperativa é [...], e como ela
trabalha. Como resultado disso, os nossos honorários diminuem,
porque eles tomam atitudes que encarecem a estrutura
administrativa que, no meu entender, deveria ser bem menor.

VELHO acrescenta ainda que os investimentos em publicidade e esportes


que não abrangem o público alvo da cooperativa, “que é a população em geral”, o
excesso de funcionários, as múltiplas reformas na estrutura física e operacional,
os sucessivos acréscimos em Tecnologias de Informação e a elevação de
médicos em cargos de assessoria também são fatores que norteiam a má pratica
administrativa e corroboram com a desvalorização do Ato Médico.

[...] as atitudes dos gestores que podem comprometer os nossos


honorários para mim são [...]: os investimentos mal feitos em
publicidade como aqueles que financiam esportes para um
pequeno público de vinte ou trinta pessoas, que são investimentos
que não têm penetração no público alvo da cooperativa que, para
mim, é a população para a qual a cooperativa vende ou pretende
vender seus planos de saúde; ou melhor dizendo, a grande
101

população; o aumento da máquina administrativa, que penso ser


pela contratação de mais funcionários e pelo aumento do número
de médicos em funções de assessorias da diretoria, porque todo
mundo tem um carguinho de assessor da diretoria. Vi comissões
sendo formadas... os médicos recebendo com resultado zero;
aumento das despesas com reformas e informática [...]. Todo ano
a cooperativa faz reformas e adquire equipamentos de informática
[...] é certo que deva ser renovado, mas não acho que se deva
trocar tudo.

PÚRPURA concorda com VELHO ao salientar que a cooperativa “não


precisa gastar com propagandas que patrocinam esportes”. Alega que viu um
presidente dizer que a cooperativa “é uma marca”. Segundo ela, o patrocínio de
esportes é um gasto desnecessário, pois “quem fez a marca foi o próprio
cooperado” com o seu trabalho ao longo dos anos. Acha que “o maior patrocínio
seria melhor remunerar o dono”.
VELHO argumenta que o tamanho da empresa é um fator que dificulta a
gerência e “pulveriza” o trabalho. Nesse sentido, a elevação do número de
cooperados reduz, segundo ele, a parcela que cada um deve receber, porque
quanto mais cooperados houver, mais a empresa terá que repartir, reduzindo,
então, a parcela de cada um dos sócios.

Acredito que uma grande cooperativa possui muitos problemas;


um deles é o grande número de associados, pois tudo que se
arrecada tem que ser distribuído; e essa distribuição toda culmina
com a diminuição da parcela de recebimento de honorários de
cada um.

SOL sinaliza que a cooperativa não educa de forma efetiva seus


cooperados e vislumbra um universo organizacional em que não há integração
entre o dono e a cooperativa. “O dono não se sente dono”, e a “empresa não trata
o dono como dono”, de modo que responsabiliza essas atitudes como um dos
fatores que delineiam o cenário atual de custos elevados nessa entidade
organizacional.

A cooperativa, ao invés de educar seu cooperado, amassava e


ainda faz isso hoje. Se eu sou dono da empresa, eu sou a pessoa
que pode botar a empresa para cima ou para baixo; então, tudo
que está acontecendo hoje é a tradução fidedigna de uma não
102

educação do cooperado. Por quê? Porque mesmo os cursos feitos


para cooperados são feitos sem fundamentação e sem
sustentação prática.

[...] hoje você chega na cooperativa e não se sente dono [...], se


sente um estranho [...]. A cooperativa deveria ter alguém que
ligasse para você, pelo menos uma vez no mês, e perguntasse:
Você está precisando de alguma coisa? Tem alguma dificuldade?
Então, a empresa é sua e você é que dá o nome da cooperativa. A
cooperativa não seria nada sem nós. Ela existe porque existe um
batalhão de médicos para atender os pacientes [...]. Então, você
chega na cooperativa, você tem que marcar hora como se fosse
em qualquer empresa [...]. Então, essa falta, essa exclusão do
cooperado dentro da cooperativa é um grande fator do cooperado
não se importar com a cooperativa [...]. Se a cooperativa não se
importa comigo, porque eu vou me importar com ela? [...] Quando
você quer falar com alguém é muito difícil. Não é uma empresa
integrada, não é uma empresa aberta, não é uma empresa
receptiva. [...] faz um monte de coisas, faz festa, mas é tudo na
superficialidade; eu penso que as coisas quando acontecem têm
que acontecer na base. Porque quando você chegar lá, você tem
que chegar como se fosse na sua casa ou na sua empresa (eu
chego na minha clinica falo com fulano, falo com a secretária, falo
com o administrador, e as coisas andam). Porém, isso não existe
na cooperativa e não existe nessa administração.

De acordo com SOL, no universo dessa cooperativa, os sócios não se


conhecem, por isso corre-se o risco de eleger pessoas que podem utilizar-se dos
cargos que ocupam para privilegiar a si ou a outros.

Como você não conhece as pessoas com quem você convive,


corre o risco de eleger pessoas que, ao invés de privilegiar todos,
privilegiam um grupo, ou então privilegiam a si mesmos, [...] a
oportunidade pessoal. [...] Nós todos sabemos quando abrimos um
consultório da dificuldade de conhecer tudo. Toda empresa exige
dedicação e tempo disponível. Um exemplo sou eu e minha
clínica. Eu passo aqui quase vinte e quatro horas por dia, seis dias
por semana, e vejo a dificuldade que é gerenciar isso aqui;
imagina a cooperativa daquele tamanho que não tem ninguém que
seja dedicado, que fique vinte e quatro horas por dia. Ou seja: o
cara entra contínuo e chega a presidente. O que não tem nada a
ver é colocar o cara lá que sequer atende pacientes da
cooperativa, porque o que a gente vê nos últimos anos é que
muitas pessoas que entraram não atendiam ou desdenharam a
cooperativa. Hoje estão lá ocupando cargos.
103

CINDY concorda com SOL quando comenta que “para administrar bem
[...] é preciso estar alerta (presente) em tempo integral”.
SOL alega que a cooperativa foi informatizada para reduzir custos, mas o
número de funcionários aumentou, enquanto que o de usuários permaneceu
praticamente o mesmo.

Eu acho [...] que a cooperativa deveria fazer um lugar “enxuto”


para se trabalhar, o mínimo de funcionários possível, e o que nós
vimos na cooperativa? [...] aumentou drasticamente o número de
funcionários. Então, eu não entendo uma empresa que se
informatiza e que tem que aumentar o número de funcionários. Ou
faz uma coisa, ou faz outra. Se informatiza para se enxugar o
quadro de funcionários [...].Se você pegar desde que ela começou
a ser informatizada e fazer uma linha crescente, ela gastou
milhões e milhões em informatização e gasta milhões e milhões
em funcionários; então, houve uma curva ascendente dos dois
lados que não deveria ter. Deveria ter aumento de computação, de
informatização e diminuição de funcionários, até porque o número
de usuários [...] não se modificou, nem o número de consultas.

Considera ainda que a cooperativa deveria investir no sócio e no usuário e


não apenas na estrutura física e na diretoria.

Então, o que a cooperativa deveria fazer primeiro? Seria investir


maciçamente no cooperado, [...] que ele fosse realmente colocado
como dono e como co-responsável pelas coisas. Aí as coisas iriam
começar a mudar. Então, quanto mais o médico for bem tratado,
melhor o usuário será tratado. O usuário vai trazer outro usuário, e
esse vai trazer outro e teremos cada vez mais movimento, esse é
o processo. Em segundo lugar: o usuário da cooperativa – a
segunda pessoa mais importante – deveria ser informado que, em
muitas patologias, não é necessário que sejam realizados tantos
exames para se chegar a um diagnóstico. Mas, a cooperativa
investiu na diretoria não sei para quê, em prédio não sei para quê,
não precisa desse luxo todo, e não sei se precisa de tantos
funcionários como tem; eu acho que isso é o que acontece [...].

CINDY corrobora SOL quando alega que “foi feita uma reforma no prédio
da cooperativa. Nessa reforma foi feita [...] uma porção de melhorias”. Questiona-
se: “Para o funcionamento geral da cooperativa era necessário isso? Ou será que
isso foi apenas um gasto [...]?”.
104

PÚRPURA também teceu várias considerações no que concerne à má


prática da cooperativa. Para ela, elegem-se sucessivamente gestores
inexperientes. A empresa apresenta em assembléia dados que demonstram uma
produção médica aumentada, porém, não denuncia os reais causadores dos
gastos. Desconsidera a individualidade dos cooperados, privilegia alguns,
enquanto desvaloriza outros.

• Inexperiência da gestão:

[...] não penso que seja apenas o médico que trabalha o culpado
da cooperativa ter tantos gastos. Acho que tem muito a ver com
quem está no comando. Por que digo isso? Porque penso que a
cada quatro anos, quando troca a diretoria, os caras vão para lá
sem experiência alguma. Daí o que acontece? Quem manda?
Somos nós, os donos? Ou são as pessoas que já estão lá, que
conhecem a cooperativa, as manhas, ou até mesmo aquelas que
são contratadas para ajudar na direção? Eu penso que quem
manda são eles, e não nós. Nós somos apenas marionetes que
estamos desesperados, porque estamos ganhando cada vez
menos e trabalhando que nem uns jumentos, sujeitos a todas as
intempéries da profissão, da televisão, dos pacientes que não nos
respeitam [...].

• Falta de transparência:

[...] embora nos digam que é a produção dos médicos que está
acima do previsto - vi isso numa assembléia – ninguém dá nome
aos bois, [...] acho que todos nós deveríamos saber quem são e
como agem os gastadores, mas não sabemos, porque não há
transparência.

• Privilegiamento:

[...] acho que os gastos também estão naqueles contratos [...] que
privilegiam algumas pessoas. Será que já resolveram isso?

• Desvalorização dos cooperados:

[...] acho que a cooperativa não precisa gastar com propagandas


que patrocinam esportes, sabe por quê? Porque se a cooperativa
é uma marca – vi um presidente dizer isso – porque continuamos a
105

patrocinar o esporte, se quem fez a marca foi o próprio


cooperado? Acho que o maior patrocínio seria remunerar melhor o
dono que, apesar de tudo, ainda mantém o nome dessa dita
marca.

• Desconsideração da individualidade do cooperado:

[...] acho que a cooperativa não deve generalizar quando nos


manda cartinhas, porque eu me sinto culpada de algo que não
sou. Aliás, só sou cooperada, já disse isso antes, porque não
existem mais pacientes particulares.

4.4 PERCEPÇÃO DOS COOPERADOS EM RELAÇÃO AO CONTROLE DE


CUSTOS EM UMA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO

Na percepção de médicos cooperados em relação ao controle de custos


em uma Cooperativa de Trabalho Médico descrevo, enquanto analiso, a
percepção dos sujeitos.
NENO não consegue definir com clareza como a empresa elabora os
processos e as regras para controlar os custos. Acha que os ofícios enviados aos
cooperados referentes aos exames complementares; as re-consultas e os Comitês
de Especialidades são processos de controle.

Sei que existe controle, mas não sei como fazem as regras. Sei
que há muitos exames de laboratórios e de imagem, porque eles
nos enviam relatórios e justificam que o déficit da cooperativa são
os exames e as muitas re-consultas. Sei que instalaram vários
comitês, os Comitês de Especialidades que, para mim, só serviram
para aumentar os custos, porque botaram as raposas para cuidar
das uvas, por isso, a nossa trincheira irá para o saco.

Destacou que os comitês de especialidades elaboram protocolos de


procedimentos mediante parâmetros científicos; no entanto, esses parâmetros são
utilizados de acordo com os interesses dos grupos que os elaboram, cujos
principais beneficiados são eles próprios. Não acha que os controles interferem na
sua prática médica diária. Contudo, acha que são os excessos de exames
complementares que interferem.
106

O que eu acho que interfere são os excessos de exames


complementares, inclusive aqueles que não são computados nos
pacientes internados. Digo: em função do que está errado se
descarrega no que está certo. Na minha opinião, a casa deve ser
arrumada, pois sou contra redundâncias.

SÓCRATES considera que custo “é [...] apropriar aos valores gerados


para executar um procedimento“, e que “consulta não é custo”, “porque o
resultado tem que vir para o profissional que trabalha”, enquanto que “controle são
as normas”. “Quando se estabelecem regras, se está controlando. Os dados do
Data Warehouse e a Auditoria Médica são exemplos de controle”.Alega que as
regras para o controle de custo na cooperativa são feitas por “pressão das
especialidades” e que a empresa privilegia alguns, quando “para uns pode e para
outros não pode”. Por isso acha que “as regras devem ser claras para que sejam
racionais”.
Afirma que apesar de ser um incorporador de tecnologias, procurou ser
solidário com a empresa mediante um acordo estabelecido entre as partes que
incluía a prestação de serviços com menor custo.

Na verdade, eu tenho um bom relacionamento com a cooperativa.


Sou um incorporador de tecnologia, mas fui buscar ser solidário
com a cooperativa, no sentido de diminuir custos e oferecer
serviços, mediante um acordo.

VELHO define custos como “o que entra, o que sai e o quanto sobra para
investir e não o que sobra para gastar”.

[...] eu acredito que a forma como a coisa é explicada para o


cooperado é feita de uma maneira nada acessiva, e nós somos
médicos e não contadores. E como não somos contadores, como
é que podemos entender? Eu não entendo nada de como se faz
aquilo, por que nunca me disseram com clareza como se faz
aquilo. Há anos atrás fui tentar entender alguma coisa quando fui
presidente de uma comissão de sindicância. Na verdade, se eu
não tivesse um contador para me explicar eu não teria entendido
nada. Eu não sei nada.
107

Para ele, controle 10 em uma cooperativa “seria controlar mais o que entra
e o que sai e também gastar menos. Isso é o que temos que lembrar: você recebe
seis e tem que gastar menos que sete”. Afirma que não entende como se faz a
regra para controlar os custos da cooperativa, porque nunca lhe explicaram o que
são custos nem mesmo o que é controle. Embora não compreenda os processos
de controle de custos que freqüentemente são abordados nos meios de
comunicação da cooperativa (jornais, Intranet, circulares, ofícios), reuniões e
assembléias, considera que a sua prática médica diária não é afetada, mas que a
sua remuneração sim. “Interfere no financeiro; na prática médica não interfere”.
CAMOGLI alega que custo é o gasto que possui “para executar/prestar um
determinado serviço, que são gastos com vestuário, combustível, aluguel da sala,
secretária, luz, telefone, Internet, papel, canetas, pastas, tudo”. Enquanto que
controle para ela “é observar, é anotar, é fiscalizar, é dominar”. Entende que
controle de custos em uma cooperativa é possuir dados para que se possa “saber
qual o gasto que a cooperativa tem para [...] prestar o seu serviço”. Dados esses
divulgados, segundo ela, na Intranet, pois, eventualmente, costuma verificar as
notícias da cooperativa por esse meio de comunicação.
Percebe que alguns de seus colegas receberam “comunicados a respeito
de se excederem na execução de exames ou procedimentos”; no entanto, também
percebe que “alguns que deveriam receber não receberam, porque,
provavelmente, são protegidos por elementos da cooperativa”. Afirma que não
sabe como são feitas as regras para o controle de custos na cooperativa médica,
mas que o controle interfere na sua prática, na medida que “se os dados para a
realização de controle não forem bem interpretados e analisados, poderão gerar
medidas errôneas, inadequadas”, e o afetado, segundo ela, “é o trouxa do médico
operário que vive de consulta”.
Salienta que a cooperativa gasta muito com exames e tratamento com um
determinado grupo de clientes que possuem um hábito que pode provocar
doenças crônicas, enquanto deveria estar promovendo ações preventivas e que
esse tipo de “tratamento [...] não é oferecido nesse momento pela cooperativa”.

10
Conforme Novo Aurélio (2004, p.542), controle “é a fiscalização exercida sobre as atividades de
pessoas, órgãos, departamentos, ou sobre produtos, etc., pré-estabelecidas”.
108

Alega que contatou com a cooperativa mediante ligação telefônica e enviou uma
proposta para desenvolver tal programa preventivo, porém, não recebeu resposta
e, por isso, acredita que não houve interesse da empresa em seu projeto.
JÚPITER percebe que os gastos que possui com todos os elementos que
mantêm o seu negócio são custos.

Vou te dar a minha definição de custo, pode ser? Custo, para mim,
é o valor da hora do meu consultório aberto. Envolve todos os
gastos que tenho com materiais, equipamentos, funcionários,
impostos, condomínio, telefone, energia elétrica, gasolina,
associações de classe (ACM, CRM) e com o meu tempo dedicado
ao trabalho, que envolve, além do tempo real de atendimento
médico, o tempo gasto com leitura de atualização, participação em
congressos e eventos médicos, pesquisa científica e o tempo
gasto que tive com a minha formação profissional. [...] custo é todo
o gasto que se tem para manter um negócio em funcionamento.

Já controle, para ele, “é a fiscalização do andamento de um serviço”: “no


meu consultório, o controle é feito por mim, que sou o dono e tenho conhecimento
do meu negócio”. Numa cooperativa, o controle é mantido por meio das atividades
de [...] “Auditoria Médica; do Programa Data Warehouse que verifica toda a
produção dos cooperados e o que eles geram de gastos; da Prestação de Contas,
feita pelos conselheiros fiscais à Assembléia Geral; dos Comitês de
Especialidades, que estipulam padrões de conduta para os atendimentos e
prestações de serviços nas especialidades”. Considera que as regras que
estabelecem o controle na cooperativa resultam de atitudes políticas, as quais são
estruturadas em metas de trabalho da gestão.

O poder político... A chapa vencedora nas eleições da cooperativa


estrutura seus parâmetros e metas de trabalho e toda a maneira
como vai administrar a cooperativa nos quatro anos de mandato,
pois o Conselho de Administração faz parte do Conselho Diretivo.

Alega, ainda, que o controle é mal elaborado e interfere na sua prática


médica porque obedece às regras preestabelecidas, por grupos ou por decisão da
direção da empresa, sem a prévia consulta dos demais cooperados.
109

Porque é mal feito, porque os mecanismos de controle obedecem


às regras políticas preestabelecidas na cooperativa. Por exemplo:
determinações dos Comitês de Especialidades; ou quando a
diretoria executiva determina que vai pagar um determinado
material de preço alto (Grampeadores cirúrgicos, [...], etc.). Isso
interfere na minha prática, por que são pagas coisas de preço alto,
e aí o que sobra para o Ato Médico? Pouco ou quase nada.

Para CINDY, a percepção de controle de custos é identificada como


Auditoria Eletrônica, quando se refere a correspondências recebidas que
demonstram um elevado número de exames realizados por ela.

O que eu tenho identificado é [...]: Eu ter recebido as


correspondências dizendo que faço exames demais. Recebi
correspondência dizendo que se eu não atender mais pacientes,
eles serão direcionadas para outro profissional, só que fica
impossível atender mais que 10 pacientes por dia.

Percebe que a ferramenta de controle de custo, Auditoria Médica, interfere


na sua prática médica quando:

[...] o paciente é atendido, às vezes, por um profissional, ai o


profissional telefona e solicita e... ‘Isso tal pode fazer, isso tal não
pode fazer’. Sem considerar que ali está um ser humano, que ali
está uma pessoa com dificuldade de saúde. Simplesmente, eles
manobram no papel e generalizam tudo. Essas ações contribuem
para cercear a minha liberdade profissional.

Acusa que perde sua liberdade profissional quando atitudes do


instrumento de controle, denominado Auditoria, altera sua conduta médica, no
sentido de considerar ou não o procedimento por ela solicitado como sendo algo
que pode ou não ser realizado no paciente-cliente.
Para SOL, o custo é tudo que ele gasta para executar uma consulta que
vai “desde o prédio que eu aluguei à secretária que eu tenho, o telefone que eu
uso, o computador que eu uso, o material que eu uso, a faxineira que eu uso, o
papel que eu uso, a roupa que eu uso, o meu horário, o meu carro, a minha
saúde” [...]. Refere-se também aos benefícios que fornece aos clientes quando os
mesmos se encontram em sua clínica particular, porque entende que custo
relaciona-se com qualidade.
110

Procuro fazer qualidade [...] no meu trabalho. [...] Por exemplo: Eu


contrato as melhores funcionárias [...], pago muito bem, trato-as
muito bem. Segundo: Eu cuido dos meus pacientes muito bem,
procuro atender da melhor maneira possível, isso é custo. Eles
têm chá, têm café, têm bolacha; as crianças ganham balão,
ganham pirulito, ganham figurinha, fazem pintura aqui, tem espaço
para as crianças brincarem, tenho cinco vagas na frente da clínica
para estacionar, pago a Zona Azul para todos os pacientes que
estiverem na clínica [...]. Então, isso tudo é custo, quanto sobra?
Eu não sei quanto sobra, mas eu tenho o prazer de atender bem, e
tenho prazer de fazer isso com prazer. Eu atendo aos meus
pacientes e dou a eles o que eu gostaria de receber se eu fosse ao
médico. [...]. E como eu sou exigente, eu também exijo, exijo que
as minhas funcionárias atendam bem. Elas fazem a pré-consulta,
depois fazem a pós-consulta com cada paciente, explicam a
receita, eu explico aqui, elas explicam de novo, levo os pacientes
para fazer qualquer procedimento, levo para marcar consulta, tiro
as dúvidas das mães, e o paciente só sai daqui [...] com a
secretária. A mãe não sai daqui lá para fora, andando por ai
perdida. Então, eu faço o máximo possível [...]. Agora, eu poderia
fazer com um custo menor, mas não teria [...] a satisfação de
trabalhar, porque a satisfação de trabalhar também tem um preço,
pois eu poderia gastar meu dinheiro com cavalos, com barcos,
mas não, eu prefiro gastar com a satisfação dos pacientes [...].

Também relaciona controle com a educação e a satisfação do cooperado,


a qual se encontra atrelada a uma melhor remuneração. Porém, acusa a
cooperativa de fornecer o máximo ao cliente e ao funcionário e nada ao médico,
ao dono da empresa.

A cooperativa [...] deu tudo para os funcionários, deu tudo para os


pacientes e não deu nada para os médicos. Então, ela abafou
aquele que produz receita e despesa. Porque o usuário da
cooperativa produz receita e despesa, o médico também produz
receita e despesa, mas a sobra só vai se fazer com o médico
nunca com o usuário, então, quem controla o usuário é o médico,
então, quem tem que ser mais bem tratado? Em primeiro lugar,
tem que vir o cooperado. Ele é que tem que ser educado para que
consiga fazer o máximo pelo mínimo. Então, todo [...] o
investimento da [...] deveria ser na satisfação do cooperado,
porque quanto mais satisfeito estiver o cooperado, melhor ele vai
atender o paciente, [...], vai trabalhar com menor custo possível
porque sabe que vai ganhar mais. Então, eu vou dar um exemplo:
Por que até hoje ninguém se preocupava em pedir mais exames
ou menos exames? Porque até então o valor era o mesmo. Depois
daquele taco que nós tivemos de R$ 20,00 é que se colocou que,
se usássemos menos, nós iríamos ganhar mais. Ninguém disse
111

que se você pedisse menos exames você iria ganhar mais,


ninguém pôs isso no papel, se você diminuir tanto, nós vamos
ganhar tanto.

SOL considera que o controle de custo possa estar relacionado com a


planilha que a cooperativa envia a cada um dos sócios, demonstrando o quanto
cada um gera de exames. Porém, a empresa não se importa em consultar ao
cooperado o perfil dos seus clientes.

Eu sei que eles mandam a cada tempo o quanto de exame que


você pede [...], quanto que você não sei o quê. Vou pegar dois
exemplos: [...] Eu não sou um pediatra igual aos outros, não sou
melhor e nem pior. Agora, o meu tipo de cliente é diferente, porque
a maioria dos pediatras atende com sistema de emergência, o
pessoal [...] consulta e vai embora, [...] atende num sistema que
não investiga. Eu, pela minha formação, acabei me tornando um
pediatra clínico que me sinto quase completo. Então, os pacientes
que me procuram já procuraram um monte de médicos e ninguém
resolveu. Então, eu investigo, porque quando o paciente chega na
minha frente, já passou [...] por outras especialidades, e ele quer
uma solução. Aí eu preciso identificar porque a criança está
sempre doente, não desenvolve [...], por isso, eu peço exames,
porque eu tenho os meus motivos para pedir. Agora: isso ninguém
vem perguntar. Quer dizer, eles colocam lá, naquela planilha, mas
eles não explicam a história toda. [...]. Tem que ter uma reunião e
chegar lá para o cara, não como acusação ou sei lá o quê, mas
com educação e perguntar: qual é o teu perfil de paciente? Por
que você pede exames? Por que nesse ponto você está sendo
assim? Até para a cooperativa entender o cooperado, saber
porque [...] você tem mais clientes que os outros. Por que teu
cliente volta tanto? A cooperativa deveria premiar os médicos que
atendem mais, porque eles é que movem a cooperativa, eles é que
trazem novos usuários [...]. Os que atendem pouco, os que
atendem mal, os que só têm consulta para daqui a dois meses,
esses denigrem o nome da cooperativa.

Afirma que não sabe como se fazem as regras para se estabelecer o


controle de custos. “Eu não sei como isso é feito”. Comenta, também, que não
sabe se os controles interferem na sua prática médica, porque nunca parou para
pensar sobre o assunto.

Olha, eu não sei se interfere, eu nunca parei para pensar nisso,


não dá para dizer se o controle de custo interfere, não existe na
112

pediatria essa relação direta com o controle de custo, você pode


fazer isso não pode fazer aquilo.

PÚRPURA define custos como “tudo aquilo que se gasta para executar
uma tarefa”. “E a idéia que tenho de controle é como se a gente estivesse sendo
vigiado”.

Eu entendo que os auditores são controladores, que aquela


planilha que mandam para a gente a cada três meses, eu acho
que demonstra a nossa produção e o quanto geramos de exames,
também seja uma forma de nos dizer que estamos sendo
controlados e que devemos também nos controlar.

PÚRPURA alega que o controle de custos não interfere na sua prática,


porque a sua formação médica foi muito boa e sua postura perante o paciente é
bem humana. Desenvolveu uma atitude, ficando calada e ouvindo as
reivindicações, gerenciando as adversidades de uma consulta no que tange às
influências da mídia sobre o paciente, às angústias e incertezas sobre saúde e
doença, motivos pelos quais os clientes a procuram.

Eu desenvolvi uma técnica que é ficar calada enquanto a mãe ou


quem quer que seja apresenta os sinais e sintomas da criança.
Primeiro ouço tudo, não faço nenhum comentário, só interfiro
quando percebo que o rumo da consulta vai saindo do foco. Às
vezes, pareço até meio antipática. Ignoro as sugestões de exames
e tratamentos que muitas vezes ouço. Porque, muitas vezes, a
mãe vem influenciada por aquilo que viu, leu ou ouviu. Faço o
exame físico, e depois explico sobre os achados e as minhas
impressões diagnósticas, sempre incluindo a referência científica.
Certamente, muitas vezes, solicito exames simples e de alto custo,
algumas vezes faço a vontade do paciente, porque sou humana,
porque entendo que as angústias de uma mãe com medo, ou de
qualquer pessoa com medo, possa gerar pedidos e atitudes
absurdas. Por isso, digo que nenhum auditor, ou cartinha, ou
qualquer coisa que venha da cooperativa vai interferir na minha
prática médica, sabe por quê? Porque tive uma boa formação
médica, e minhas atitudes estão além da técnica. São atitudes
humanas. Assim, vou dando um jeito. Nossa, estou até aliviada!
113

5. CAMINHOS E DESCAMINHOS: COOPERADOS E


COOPERATIVA

Foi na sociedade inglesa do século XIX que o cooperativismo moderno


teve as suas referências. A Revolução Industrial, ocorrida nessa época da história
da humanidade, modificou de forma acelerada o pensamento e o processo de
desenvolvimento tecnológico, que repercutiu em todas as dimensões da
sociedade. O mundo deixou de ser um grande pensamento para viver sob a égide
do mecanicismo, onde o paradigma vivido era o de um mundo comparado a uma
máquina. O advento das máquinas modificou não só o pensamento humano, mas
as relações de produção e de trabalho. A divisão do trabalho norteada pela visão
reducionista cartesiana, conseqüentemente, permeou todas as atividades
humanas da época. A economia exercida pelas atividades caseiras dos artesões
foi perdendo seu lugar e substituída pelo sistema capitalista de produção, em que
a competição selvagem deixa suas marcas nas relações humanas. Entretanto, tais
mudanças causaram elevação dos custos, de um modo geral, e também da
prática médica. Tais mudanças promoveram no mundo e no Brasil a criação de
cooperativas. A criação da cooperativa de trabalho médico no Brasil, na década de
sessenta do Século XX, com objetivos baseados na solidariedade e na
democracia, dando primazia às pessoas e ao trabalho sobre o capital na
distribuição dos benefícios e resultados econômicos alcançados, consolidou-se ao
longo dos anos, diante de uma realidade econômica adversa e competitiva
(MACÊDO e XIMENES, 2001).
Segundo os entrevistados, a cooperativa de trabalho médico pode ser
união de forças, reunião de pessoas com os mesmos interesses para o exercício
liberal da medicina, garantia de trabalho (mercado), exercício da solidariedade,
oportunidade de exercer a medicina de forma digna, na qual se valoriza o Ato
Médico e se propicia um atendimento com qualidade e ética. Conforme Memorial
UNIMED (1992), a constituição desse tipo associativo, fundamentou-se em duas
vertentes: a preservação e a valorização profissional, e a garantia de um princípio
constitucional – o direito do cidadão a um atendimento de melhor qualidade.
114

Na concepção de Ubaldi (1985), os fenômenos sociais são “fenômenos


biológicos”. Para ele, a sociedade humana é “um organismo, tanto quanto são
organismos as sociedades animais”, e nela “tudo está intervinculado” (UBALDI,
1985, p.349); por isso, Capra afirma que “todos os organismos vivos são
testemunhas vivas de que práticas destrutivas não funcionam em longo prazo. No
fim, os agressores destróem a si mesmos, abrindo caminhos para outros que
sabem como cooperar e como progredir” (CAPRA, 1996, p.193). Ou seja,
destinado a viver em sociedade, o ser humano sempre necessitou da cooperação
para sobreviver, prosperar e conquistar seus objetivos. Oliveira & outros (2000)
citados por Macêdo e Ximenes, acrescentam que a prática médica é cooperativa,
pois é permeada pelo espírito de colaboração, “condição vital, pelo próprio
aspecto humanitário que envolve esse tipo de profissão” (MACÊDO e XIMENES,
2001, p. 13).
Patrício e Gaspar destacam que o caráter de trabalho autônomo,
especialmente dos médicos, “na situação atual do mercado de trabalho e das
condições financeiras da população, exige a adesão dos mesmos a grupos
cooperativistas”. Esses grupos “cumprem um duplo objetivo: de um lado, permitem
ao profissional cooperado uma maior abrangência de serviços [...] e, de outro,
permitem a um maior contingente de pessoas o acesso a serviços de melhor
qualidade [...]”. Salientam que “os novos paradigmas, ou os paradigmas
emergentes, focalizados na qualidade de vida individual e coletiva, estão vindo
para confirmar a necessidade da cooperação entre os humanos, até para a
sobrevivência da espécie, mesmo que essa cooperação seja para fins comerciais”
(PATRÍCIO e GASPAR, 2000, p.4).
Alguns entrevistados consideraram que esse tipo organizacional
proporciona aos profissionais divisão de lucros e prejuízos. Entretanto, segundo a
literatura pertinente, o entendimento dos entrevistados que as cooperativas são
organizações que proporcionam lucro é equivocado, pois as cooperativas são
empresas que não possuem o lucro como a razão de sua existência e, quando
eles ocorrem, são denominados sobras (ALVES, 2003; CASTILHO, 1998; IRION,
1994; RIOS, 1998). As sobras são definidas como “o excesso retido, não
consumido, para o custeio da administração da cooperativa que se revertem para
115

os sócios” (IRION, 1994, p.99). Os destinos das sobras resultam de decisões em


Assembléia Geral Ordinária. Se a decisão for divisão, elas ocorrem conforme a
produção de cada cooperado.
Um dos entrevistados enfatiza que o ser humano se coopera quando as
suas necessidades individuais não são supridas (satisfeitas) e, assim que essas o
são, passa a agir em benefício próprio em detrimento do coletivo.
Macêdo e Ximenes (2001) salientam que a necessidade humana é um
estado de privação de alguma satisfação básica, e a satisfação é a finalização
dessa necessidade. Ubaldi (1985, p. 355) afirma que “não se concebe mais o
indivíduo isolado”, e Irion (1994) considera o individualismo que permeia esse tipo
de organização como má prática do cooperativismo. Por sua vez, Capra (1996)
salienta que só aqueles que sabem cooperar compartilham com melhores
possibilidades de alcançarem os seus objetivos.
A preservação, a valorização profissional e a promoção da qualidade na
assistência à saúde, segundo o direito constitucional da igualdade que garante ao
cidadão um atendimento médico de melhor qualidade, são, conforme o Memorial
UNIMED (1992), os objetivos da cooperativa médica.
Segundo os entrevistados, o trabalho médico está sendo desvalorizado.
Para os entrevistados, a desvalorização resulta da baixa remuneração repassada
aos serviços médicos. As causas que levaram a essa desvalorização são citadas
por alguns entrevistados como o empobrecimento da população brasileira e a
elevação dos custos da prática médica. A elevação dos custos da prática médica,
segundo esses entrevistados, deve-se à formação tecnicista do ensino médico, a
influência da mídia sobre a população assistida por planos de assistência à saúde
e a incorporação de tecnologias na prática médica.
Conforme argumenta Andrade (2000), a elevação dos custos da prática
médica resulta das mudanças de hábitos alimentares e de higiene da população;
das descobertas científicas, tanto nas terapias quanto nos processos de
diagnóstico, que propiciam a longevidade populacional de um modo geral; do
envelhecimento da população, que permite a manutenção ou a aquisição de novas
patologias entre os idosos e, portanto, a utilização mais assídua dos serviços
assistenciais; da crescente utilização de tecnologias de alto custo, tanto no
116

diagnóstico quanto nas terapias, e da modificação da relação médico-paciente,


cada vez mais especializada e distante.
Outros fatores também colaboram de um modo indireto para a elevação
dos custos em saúde, entre eles: “a arraigada cultura de se gastar com a cura, ao
invés de se investir na prevenção de doenças; a falta de conscientização do
usuário e sua suscetibilidade às influências da mídia; as pressões por aumentos
lineares exercidas por entidades de classe, bem como por ações e políticas na
área da saúde e tributária” (ANDRADE, 2000, p.19).
Isso corrobora o pensamento de Fromm (1987) quando afirma que
“pautado no ter [grifo da autora] como o mais natural e até mesmo o único modo
de vida aceitável, da sociedade industrial, o ser humano adquire atitudes inerentes
do consumismo, que os identificam por eu sou aquilo que tenho [...]” (FROMM,
1987, p.46). Para os entrevistados, ao longo dos anos, a desvalorização do Ato
Médico reduziu o poder aquisitivo, a qualidade de trabalho e de vida da categoria
médica.
No caso do trabalho médico cooperado, a desvalorização do Ato Médico
segundo os entrevistados, resulta de má prática cooperativista do cooperado e da
cooperativa. Alguns entrevistados alegam que os colegas solicitam exames
laboratoriais exageradamente, comercializam materiais e medicamentos, recebem
propinas de fornecedores pelo uso de materiais especiais. Argumentam que pelo
fato do valor da consulta ser aquém do esperado, o médico abrevia o tempo
disponível para o atendimento a fim de conseguir atender mais pacientes e ganhar
mais.
O médico transformou-se num “pedidor de exames”, disse um dos
entrevistados desta pesquisa. Mais grave ainda é pensar que o médico não só se
transformou num “pedidor de exames”, como também em um empregado “mal
remunerado” das indústrias de materiais e medicamentos que assediam a classe
médica como o açúcar no formigueiro. O médico, com uma caneta na mão, pode
assumir duas posturas: prescrever o que deseja e sabe, ou tacitamente ser
manipulado com presentinhos ou propinas. Um dos entrevistados apontou os
Comitês de Especialidades como uma maneira de alguns profissionais trazerem
para si um benefício que deveria ser de todos.
117

Andrade (2000) comenta que o médico, a fim de elevar sua fonte de


renda, incorpora mais recursos aos seus procedimentos. Ao incorporar os
recursos, que podem ser novas tecnologias ou técnicas de diagnóstico e ou
tratamento, elevam os valores a pagar, os custos da organização e
conseqüentemente levam à desvalorização do trabalho médico.
Concordando com Andrade (2000), Irion salienta que o médico, ao fazer a
escolha dos meios diagnósticos e de tratamento, “de certa forma, assume a
gestão financeira dos recursos do paciente e incorpora em seus honorários o
custo dos serviços de apoio de que necessita para o caso” (IRION, 1994, p.95), ou
seja, recebe menos pelo ato prestado. Conforme esse autor, segundo o princípio
da neutralidade, nenhum sócio ou grupo de sócios pode obter benefícios em
detrimentos dos demais. Esse tipo de cooperado atua de forma perversa e anti-
cooperativista, na medida que traz para si um recurso, no caso financeiro, que
deveria ser de todos (IRION, 1994).
Na opinião de Irion, a elevação dos custos nesse tipo de organização é,
em parte, resultado do desconhecimento sobre cooperativismo; da “ambição e o
imediatismo de alguns médicos, para os quais [...] cooperação, solidariedade e
perspectivas futuras não têm valor. Nesse sentido, compromete-se a remuneração
do todo” (IRION, 1994, p.110). Segundo o autor, a ambição torna-se visível à
medida que o cooperado beneficia-se do sistema cooperativista em detrimento
dos demais sócios.
Alguns entrevistados comentaram o distanciamento que ocorre entre os
cooperados, “porque, atualmente, ninguém conhece ninguém e por isso não se
sabe como o outro trabalha”, tecem comentários que denigrem o trabalho do
outro, são individualistas, invejosos e desconfiados. Comentaram, também, que se
corre o risco de eleger pessoas a cargos diretivos que podem se utilizar desses
cargos em benefício próprio.
A dificuldade do gerenciamento à medida que a organização cresce já era
uma preocupação de Lawrence e Lorsch (1973) na Teoria da Contingência na
década de setenta do Século XX. Concordando com Lawrence e Lorsch (1973),
Macêdo e Ximenes (2001) salientam que à medida que a cooperativa se
desenvolve, aumenta seu quadro social e o volume de operações, a integração
118

entre os cooperados diminui, como também reduz a integração entre os


cooperados e a administração da organização. Esse denominador comum e a falta
de integração podem ser resultantes, segundo os autores, da inefiência ou da
ausência de comunicação. Assim, o ceticismo e a desconfiança, além de
provocarem uma imensa queda da moral e da crença na organização, promovem
entre os cooperados sentimentos de insegurança entre eles – os cooperados - e
os líderes desse tipo empresarial.
Os entrevistados alegam que a má prática cooperativista da cooperativa
decorre da supervalorização de tecnologias; pagamento de materiais especiais
descartáveis reutilizados; comercialização de medicamentos; pagamento de
procedimentos já pagos pelo SUS; pagamento de especialidades não médicas –
fisioterapia e exames laboratoriais –; privilegiamento de alguns; pessoas jurídicas
cooperadas. Consideraram também que a empresa monopolizou e cartelizou o
trabalho médico.
Conforme Irion (1994), a adoção de procedimentos deve ser aprovada por
um acordo formal na Assembléia Geral da cooperativa. A ruptura desse acordo
ocorre quando “há manobras de médicos, ou grupos de interesses, usando de
algum expediente que traz para si algum resultado, em detrimento dos demais”.
Essa atitude, segundo o autor, “quebra a isonomia e encarece progressivamente a
assistência à saúde” (IRION, 1994, p. 123).
Segundo o artigo 88 da Lei Especial 5.764/71, somente em caráter
excepcional para o atendimento de objetivos acessórios ou complementares, e
mediante prévia e expressa autorização concedida pelas normas do Conselho
Nacional do Cooperativismo, poderão as cooperativas participar de sociedades
não cooperativas públicas ou privadas.
Macêdo e Ximenes (2003) salientam que não se pode desconsiderar o
fato dessa cooperativa estar inserida dentro de uma sociedade capitalista que
adota valores e princípios de individualismo e domínio e que podem promover um
descompasso entre a doutrina e a prática cooperativista. Um estudo realizado por
esses autores revelou que, “diferentemente do proposto nos princípios básicos do
cooperativismo, apresentado pela Aliança Cooperativista Internacional, essas
organizações priorizam valores que reforçam tanto a importância do status quo
119

[...], quanto a prosperidade e a auto-afirmação para dominar o ambiente”. Revelou


também que, “paradoxalmente, os valores menos percebidos foram igualitarismo e
harmonia [...]”, que “buscam transcender os interesses pessoais na busca do bem
estar coletivo” (MACÊDO e XIMENES, 2003, p.175).
Muitos entrevistados comentaram que a gestão da cooperativa médica é
realizada por médicos eleitos num processo decisório político e não por possuírem
capacidade técnico-científica para gerir o seu negócio; por isso, também, foram
culpados pelos elevados custos e pela desvalorização do Ato Médico.
Segundo os médicos entrevistados, sem treinamento prévio, o maior erro
da gestão é gerenciar sem saber. Com o baixo poder de especialização 11 para os
cargos que ocupam, os gestores, ao contemplarem a necessidade organizacional
de se manterem competitivamente no mercado, muitas vezes repetem erros
anteriores ou conferem a especialistas capitalistas contratados, cuja visão é o
lucro, que tomem atitudes em prol da sobrevivência da empresa. As atitudes dos
gestores no sentido de manter a saúde financeira da empresa, como: regular
pagamento de procedimentos médicos e hospitalares, estabelecer contatos entre
os cooperados para sanar dúvidas, enviar correspondências e outras,
provavelmente, resultam em conflitos entre os cooperados e a cooperativa.
Conflitos esses que, para alguns, pode significar perseguição, enquanto para
outros, desconsideração, pouco ou nenhum tato nas relações humanas. Nesse
momento, provavelmente, quebra-se o elo entre a gestão estabelecida e os
demais cooperados e se estabelecem sentimentos de desconfiança naqueles
cooperados que não se encontram em cargos diretivos ou relacionados a qualquer
atividade administrativa. Ou seja, uma liderança formal 12 , cujo poder de
especialização é baixo, possui pouca capacidade de influenciar o comportamento
de outras pessoas, mesmo que tenha o poder legítimo 13 que lhe confere a função
ocupada (SILVA, 2001).

11
O poder de especialização – é a “capacidade de influenciar o comportamento de outras pessoas
por causa do conhecimento científico ou do entendimento que alguém detém” (SILVA, 2004,
p.252).
12
Liderança Formal – “exercida por pessoas escolhidas para posições de autoridade formal nas
organizações” (Idem, Ibidem, p.253).
13
O poder legítimo – é a “capacidade de influenciar o comportamento de outras pessoas em
virtude dos direitos do cargo ou da função” (Ibidem).
120

Agradar todos parece ser algo utópico; no entanto, fica visível nos relatos
que a autoridade 14 efêmera da gestão traduz a não legitimidade dessa, deixando
uma brecha aos maus cooperados que manipulam o sistema e captam para si os
recursos que deveriam ser de todos. Isso vem ao encontro do que Irion afirma em
relação a um dos pontos fracos da cooperativa: “o amadorismo nas questões de
administração” (IRION, 1994, p.109).
Sandroni (2003) alega que são os gestores que estabelecem os critérios
que permitem a operacionalização dos processos que movem a organização. São
eles que detêm a autoridade e a responsabilidade maior de estabelecer o rumo a
ser seguido pela empresa. Na opinião de Benato (1999), a organização do quadro
social e a transparência administrativa são indispensáveis para a confiabilidade da
gestão cooperativista. Assim, conforme esse autor, torna-se necessário que os
integrantes dos conselhos além de conhecerem as funções estatutárias
necessitam ser qualificados no sentido de serem treinados formalmente para
exercer as funções por eles assumidas. Lideranças formadas e preparadas
disciplinam, sistematizam discussões, evitam propostas inexeqüíveis, estéreis, e
representam, de modo geral, os interesses do quadro social.
Alguns entrevistados acrescentaram que os investimentos em publicidade
e esportes que não abrangem o público alvo da cooperativa, “que é a população
em geral”, o excesso de funcionários, as múltiplas reformas na estrutura física e
operacional, os sucessivos acréscimos em Tecnologias de Informação e a
elevação de cargos de assessorias também são fatores que norteiam a má prática
cooperativista da cooperativa e colaboram com a desvalorização do Ato Médico.
Inserida num contexto sócio-geográfico, a cooperativa, para cumprir os
seus objetivos, contrata pessoas com o fim de operacionalizar o trabalho no
interior da estrutura organizacional, os chamados clientes internos. À medida que
essa estrutura cresce, mais complexa ela se torna e mais pessoas são

14
Para Weber, o conceito de autoridade confronta-se com outras formas de influências, isto é, com
o poder e com a persuasão: poder – é a probabilidade de o indivíduo executar sua vontade apesar
das resistências opostas; inclui o controle da situação, mediante ameaças ou coações, ou por meio
da manipulação das condições de modo a obter obediência (SILVA, 2004); persuasão – é a
capacidade do indivíduo influenciar a ação ou a decisão de outro, mediante a lógica e a
argumentação (Idem, Ibidem). “Para Weber, a essência da autoridade é que as ordens ou decisões
são obedecidas voluntariamente, porque a fonte de onde elas emanam é considerada legítima e
porque envolve a prévia suspensão do julgamento da sua natureza” (Ibidem, p.162).
121

requisitadas para essa operacionalização. Tecnologias de informação também são


adquiridas no sentido de agilizar os processos organizacionais (SILVA, 2004).
Quando os computadores foram introduzidos nas atividades operacionais
e de serviço em 1950, um estudioso em cibernética, Norbert Wiener, predisse que
isso causaria um desemprego maciço. Entretanto, atualmente, as organizações
ainda utilizam um grande número de trabalhadores nas suas atividades
empresarias, contrariando o pensamento de Wiener. Na verdade, o que está
acontecendo é que esses trabalhadores são muito mais eficazes por utilizarem
tecnologia e, por isso, as empresas não têm diminuído o número de pessoas em
seu quadro pessoal (Idem, ibidem).
Inserida num contexto em que a responsabilidade social faz parte dos
objetivos estatutários, a cooperativa, além de viabilizar projetos relacionados à
prevenção de doenças, também patrocina esportes e participa junto à comunidade
disponibilizando sua estrutura organizacional ao treinamento do trabalho de
estagiários que são selecionados de acordo com o grau de necessidade desta
organização para que os mesmos possam ser introduzidos ao mercado de
trabalho a posteriori (RELATÓRIO DE GESTÃO 1999-2003).
Um dos entrevistados afirmou que o “cooperado não se sente dono” e que
“a cooperativa não cuida do dono”. Na opinião de vários autores, os cooperados
não se sentem donos porque não são aculturados, não possuem conhecimento
teórico prático dos processos administrativos e não compreendem os processos
organizacionais. Não reconhecem também, a cooperativa como um
empreendimento, porque provavelmente são frutos de uma cultura capitalista,
inseridos num contexto cooperativista, cujos interesses pessoais que extrapolam o
coletivo resultam de uma educação que prioriza o dinheiro como ferramenta para
fazer mais dinheiro. Talvez, esse seja o fator mais contundente na manutenção
desse sentimento. Decorrente dessa educação, os cooperados não possuem
motivos solidários ao serem introduzidos no cooperativismo, não participam e
associam-se a esse tipo organizacional provavelmente porque necessitam de
trabalho e/ou de serem (re)conhecidos pela população assistida (BENATO, 1994;
IRION 1994; MACÊDO e XIMENES 2004).
122

Outro motivo que promove o sentimento do cooperado não considerar a


cooperativa como sua propriedade, talvez, seja a sensibilização inadequada nas
questões cooperativistas e empresariais repassadas nos cursos de ingresso ao
cooperativismo, ministrados pela organização. A pobreza e a superficialidade do
conteúdo referente às questões de teorias administrativas, estrutura,
comportamento, cooperativismo e humanismo podem ser uns dos fatores da
pouca sensibilização. O tempo disponibilizado para aplicação do curso também
pode ser um fator, e, por isso, não alcança o sentido do humano na sua essência,
pois para um curso ser considerado profundo, necessita ser ministrado em tempo
adequado para sensibilização, fixação e aplicação do conteúdo administrado.
Segundo Benato, a empresa cooperativa começou a se transformar em
um empreendimento a partir da década de oitenta do Século XX. “Como princípio,
como doutrina, como filosofia, as leis e os estatutos cumprem os ditames
propugnados”. No entanto, “como objeto, como método, como critérios, as
cooperativas não agem com os mesmos propósitos doutrinários e filosóficos. A
razão desse desvirtuamento entre princípios e métodos seria o próprio sócio”
(Idem, ibidem, p.35). O sócio brasileiro é uma miscigenação de raças, de crenças
e de cultura, imediatista, sôfrego em buscar o resultado, oportunista nos negócios
e é, antes de tudo, o indivíduo e não a sociedade. Para o autor, o associado se
coopera de acordo com as vantagens que lhes são oferecidas, só percebe o
presente e se aninha no passado; ou seja, não é sócio na plenitude do termo.
Concordando com Benato, Macêdo e Ximenes (2003) afirmam que “o
cooperado não acredita que a empresa é um bem patrimonial [...], precisa de
resultados agora, não pode esperar para amanhã”, enquanto “o cooperativismo é
uma associação com visão para o futuro” (MACÊDO e XIMENES, 2003, p.248).
Outro fator apontado pelos entrevistados como um dos motivos que
elevam os custos da assistência à saúde e à redução do valor repassado aos
médicos cooperados é a utilização indiscriminada do plano de saúde pelo usuário,
que desconhece o que é uma cooperativa. De acordo com Temporão (1997),
durante o processo evolutivo da sociedade brasileira houve o fortalecimento da
ideologia de consumo, não só de medicamentos, processos terapêuticos, mas de
saúde como um todo. Porém, segundo Ismael (2002), quando o paciente (cliente)
123

sente-se insatisfeito, porque não foi bem atendido ou porque não obteve um
diagnóstico de acordo com suas expectativas, utiliza-se do livre arbítrio, único
poder que possui em mãos para procurar diversas opiniões para um mesmo
diagnóstico. O intuito dessa atitude é satisfazer suas necessidades na busca de
respostas às suas apreensões. Contudo, para Fernandes (2000, p.28), “a
abundância tropical encontrada pelos colonizadores clivou no ideário do tipo
brasileiro o sentido e a lógica de conseguir ‘usufruir sem pagar’. Faz parte da
cultura brasileira ‘querer levar vantagem em quase tudo”.
Pareceu-me que os cooperados acham que recebem mal porque não
existe critério de distribuição para o Ato Médico e o não médico. Na realidade,
esses critérios são pouco explícitos, embora a empresa utilize-se de métodos de
controle de custos como o Projeto Data Warehouse, a Auditoria Médica e outros,
para monitorar o processo de diagnóstico e de distribuição desde o procedimento
até o financiamento.
A maioria dos entrevistados identificou processos de controle de custos,
mesmo não definindo com clareza o significado dessas ferramentas. Para alguns,
os processos de controle de custos interferem na prática médica à medida que
ações da diretoria e da ferramenta de controle, a Auditoria Médica, sancionam
atos médicos – consulta e procedimentos – por eles realizados, enquanto para
outros não interfere. No entanto, está subjacente nas falas dos entrevistados a
interferência, na medida em que eles produzem cada vez mais para melhorar seus
rendimentos.
Alguns entrevistados definiram custos como os gastos que se possuem
para manter um negócio em funcionamento, ou tudo aquilo que se gasta para
executar uma tarefa. Conforme Cata Preta (2001), custos são valores,
correspondentes à utilização de recursos humanos e materiais, para prestação de
algum serviço, produção de algum produto ou realização de alguma atividade que
seja finalidade da entidade/empresa, enquanto controle, segundo o Novo Aurélio
(2004, p.542), “é a fiscalização exercida sobre as atividades de pessoas, órgãos,
departamentos, ou sobre produtos, etc., pré-estabelecidas”.
O Projeto Data Warehouse, a Auditoria Médica, os Comitês de
Especialidades, a Prestação de contas feita pelos Conselheiros Fiscais à
124

Assembléia Geral Ordinária foram apontados como processos de controle de


custos. Os entrevistados que identificaram esses processos relataram que o
controle na cooperativa resulta de atitudes políticas, estabelecidas nas metas de
trabalho da gestão, e que o controle é mal elaborado porque obedece à regras
pré-estabelecidas por grupos ou por decisão da empresa sem a prévia autorização
dos demais cooperados.
No passado, a relação médico-paciente sofria pouca interferência de
terceiros. Freqüentemente, o médico era contratado por uma família ou por um
grupo de famílias e permanecia à sua disposição por um determinado período. O
Estado só ocasionalmente era solicitado a responder pelos cuidados com a saúde
dos indivíduos, como nos momentos em que ocorreram as grandes epidemias
(NETO, 2002).
Com o surgimento das empresas que intermediavam o trabalho médico,
as pressões institucionais para a elevação do número de pacientes atendidos
com o fim de serem reduzidos gastos com maior resolutividade fizeram diminuir o
tempo de atendimento individual. Segundo Grosseman & Patrício (2004, p.72),
essas pressões geraram “dificuldades na relação médico-paciente e no
diagnóstico, predispondo o médico à busca da solução dos problemas [...] por
meio de prescrição de medicamentos” e de solicitação de exames
complementares, que oneram tanto as operadoras de saúde, quanto o próprio Ato
Médico. Isso permitiu às empresas, no caso, as cooperativas, a utilizarem a
Auditoria Médica para monitorar os custos/gastos da assistência prestada aos
seus usuários. Conforme Luz et al. (2002) a interferência da Auditoria sobre o Ato
Médico trata-se de um assunto relativamente novo, ainda não totalmente
regulamentado e, por isso, tem gerado muita polêmica.
A auditoria prévia avalia as solicitações de procedimentos e as enquadra
nas normas do Plano de Saúde, levando em conta o pagamento efetuado pelo
cliente e a conseqüente cobertura oferecida, que pode ser “bastante restritiva, com
carências, tabelas, peculiares referentes a intercâmbios (outras cooperativas),
devendo ser respeitadas as normas do plano de origem”. Segundo a Coordenação
Geral de Controle, Avaliação e Auditoria (CAUDI) do Ministério da Saúde (1996), a
finalidade da auditoria é a de “corrigir falhas ou preencher lacunas” com o objetivo
125

de elevar os “padrões técnico-administrativos dos profissionais da área, bem


como, a melhoria das condições hospitalares, visando em conjunto um melhor
atendimento à população” (LUZ et al., 2002, p.295).
Conforme Giglioti (2004), as informações que tramitam em uma
determinada empresa proporcionam aos gestores tomadas de decisão. A tomada
de decisão, segundo esse autor, é de extrema competência quando se baseia em
dados corretos. Assim fundamentados, os gestores reduzem a possibilidade de
tomar medidas errôneas ou inadequadas e, por conseguinte, sistematizam
discussões, evitam propostas inexeqüíveis, estéreis e representam, de modo
geral, os interesses do quadro social.
126

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi identificar junto a profissionais médicos como


a prática da Medicina pode ser desenvolvida, mantendo a saúde financeira da
empresa para que ela permaneça com competitividade no mercado de planos de
saúde. A fim de alcançar esse objetivo, esta pesquisa partiu de uma perspectiva
qualitativa, utilizando o Referencial Holístico-Ecológico e a técnica de entrevista
semi-estruturada. O método propiciou não só alcançar os objetivos propostos, mas
transcendê-lo. A implementação do estudo, dentro dessa perspectiva, permitiu-
me, desde o princípio, uma dinâmica integrada de ir e vir na busca do
entendimento das falas dos sujeitos entrevistados.
Nesse aspecto, os dados revelaram que os sujeitos do estudo esperam
que a cooperativa lhes possibilite o exercício da Medicina com qualidade e ética e,
ao mesmo tempo, garanta-lhes um mercado de trabalho com remuneração justa e
proteção da categoria, mediante a valorização do Ato Médico, realização
profissional e satisfação pessoal. Porém, no cotidiano, a experiência diária
desencontra-se das expectativas quando nas falas percebe-se o
descontentamento de todos no que tange à valorização do Ato Médico.
Os entrevistados relacionaram a desvalorização do Ato Médico com a baixa
remuneração do trabalho e aos altos custos da organização. Alegaram que a
desvalorização do trabalho se reporta à realidade brasileira (baixo poder
aquisitivo), à concepção reducionista da educação médica; à condição histórica
que modificou a relação médico-paciente; a elevação do tecnicismo nessa relação;
a influência da mídia sobre a população, e à má prática cooperativista do
cooperado e da cooperativa.
A má prática cooperativista do cooperado foi apontada pelos entrevistados
como a redução do tempo disponibilizado à consulta médica; o atendimento
superficial e distante; à solicitação elevada de exames complementares; à
incrementação de tecnologias de diagnóstico e de tratamento; o comércio de
materiais e medicamentos; o recebimento de propinas e ações anti-éticas entre
127

cooperados. Assim, enfatizaram que, muitas vezes, é o sócio que eleva os custos
da cooperativa e, com isso, reduz o valor do Ato Médico.
A má prática cooperativista da cooperativa foi apontada pelos entrevistados
como a supervalorização de tecnologias de exames e procedimentos de alto
custo; o pagamento de exames solicitados desnecessariamente pelos
cooperados; o comércio de materiais e medicamentos; o pagamento de materiais
descartáveis já utilizados; o pagamento de procedimentos já pagos pelo SUS; o
pagamento de especialidades não médicas (fisioterapia e exames laboratoriais); o
privilegiamento de alguns; as pessoas jurídicas cooperadas; monopolismo e cartel;
inexperiência e desconhecimento teórico e prático da gestão sobre as questões
administrativas; falta de transparência da gestão; desvalorização do cooperado;
desconsideração da individualidade do cooperado; investimentos desnecessários,
apontados pelos entrevistados como os investimentos em patrocínio de esportes,
múltiplas reformas, aquisição de tecnologias de informação, aquisição de bens
móveis e imóveis, e serviços em excesso de funcionários e de assessorias; e a
venda de planos de saúde não co-participativos.
Os entrevistados apontaram que os cooperados são pouco ou nada
aculturados; que a empresa promove cursos superficiais nas questões
cooperativistas e que os donos não consideram a cooperativa como sua.
Alguns entrevistados identificaram processos de controle de custos com
clareza, enquanto outros não identificaram. Entre os entrevistados que
identificaram processos de controle de custos, a Auditoria Médica, o Projeto Data
Warehouse, os Comitês de Especialidades e a Prestação de Contas do Conselho
Fiscal foram apontados como processos de controle de custos.
Para os entrevistados, os processos de controle de custos são mal
elaborados porque obedecem a regras pré-estabelecidas por grupos ou por
decisão da empresa sem a prévia autorização dos demais cooperados. Embora
alguns entrevistados tenham dito que os processos de controle não afetem a sua
prática médica diária, está implícito nas falas que afetam à medida que os
médicos cooperados necessitam elevar a sua produção para ganhar mais.
A partir dessas considerações, a aculturação, ou seja, a educação, o
treinamento, a informação e o conhecimento – que é um princípio que leva ao
128

comprometimento e a responsabilidade cooperativista– têm sua importância no


sentido de transformar o sócio em um indivíduo que possui liberdade para
transmitir e multiplicar a cultura da organização.
Sugiro, então:
• a criação de um Curso de Especialização em Cooperativismo 15 com o
objetivo de desenvolver espírito de solidariedade e talentos no negócio
cooperativo dos médicos cooperados e dos aspirantes à cooperação, mediante o
conhecimento científico do cooperativismo, das organizações e das relações de
mercado;
• introdução da disciplina Gestão/Administração no currículo do Curso de
Medicina;
• pesquisas qualitativas com os gestores;
• pesquisas qualitativas com os cooperados;
• oficinas para troca de percepções e aproximação entre os gestores e os
demais cooperados, cujo objetivo seja construir soluções nas questões
cooperativistas e administrativas;
• fornecimento de bolsas para o custeio do estudo das questões
cooperativistas e empresarias aos cooperados interessados, conseqüentemente
dando oportunidade a todos. Assim, preparar os cooperados mediante cursos que
efetivamente sensibilizem todos e não apenas aqueles que se encontram em
cargos diretivos vem ao encontro da necessidade desta empresa de possuir
equipes capacitadas para o exercício do comando, da direção, do gerenciamento
e controle. Tais estratégias têm como objetivo manter a cooperativa
competitivamente no mercado de planos de saúde.

15
O estudo do projeto de criação do Curso de Especialização em Cooperativismo está sendo
elaborado pela autora desta pesquisa com colaboração da Profª. Drª. Graziela Dias Alperstedt, que
se responsabilizará pelos tópicos da Gestão de Empresas, Gestão de Pessoas e Comportamentos
Organizacionais, Ética Empresarial, Responsabilidade Social, Planejamento e Gestão Estratégica.
Gestão de Custos e de Qualidade. A autora desta pesquisa se responsabilizará pelos tópicos da
Gestão baseada em informações, Auditoria e Análise Crítica, Acreditação Hospitalar, O Sistema de
Saúde (conceitos, e tipos de estrutura organizacional), O gestor e o paradigma da complexidade,
Operadoras de saúde.
129

REFERÊNCIAS

ALVES, M. A. P. Cooperativismo: Arte & Ciência. Doutrina, Prática e Legislação.


São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda., 2003.

ANDRADE, A. A. Curso de Pós Graduação de Auditoria em Saúde: Gestão em


Auditoria. Belo Horizonte: Editoração Eletrônica, 2000. 73 p. Apostila.

BENATO, J. V. Cooperativismo: Encontros e Desencontros. 2. ed. São Paulo: ICA


– OCESP, 1994.

BENATO, J. V. O abc do cooperativismo. 5. ed. São Paulo: OCESP – Organização


das Cooperativas do Estado de São Paulo, 1999.

––––––. O abc do cooperativismo. 7. ed. São Paulo: OCESP/SESCOOP-SP,


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137

ANEXO 1

Florianópolis, 07 de abril de 2004.

Ao Dr. X
Diretor Presidente da Cooperativa X

Eu, Elyane Rangel, médica cooperada dessa organização solicito a sua


permissão para elaborar uma pesquisa sobre a PERCEPÇÃO DE MÉDICOS
COOPERADOS SOBRE OS PROCESSOS DE CONTROLE DE CUSTOS EM
UMA COOPERATIVA MÉDICA. Para tanto, será necessária a utilização do banco
de dados dessa empresa para que se possam obter os dados necessários que
comporão a amostra (os sujeitos) que se pretende estudar.
Antecipadamente, agradeço a sua colaboração.

____________
Elyane Rangel

___________________
Diretor Presidente
138

ANEXO 2

DECLARAÇÃO (Diretor Presidente)

Declaro para os devidos fins e efeitos legais que, objetivando atender às


exigências para a obtenção do Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com
Seres Humanos, e como representante legal da Instituição, tomei conhecimento
do projeto de pesquisa: PERCEPÇÃO DE MÉDICOS COOPERADOS SOBRE OS
PROCESSOS DE CONTROLE DE CUSTOS EM UMA COOPERATIVA MÉDICA e
cumprirei os termos da Resolução CNS 196/96 e suas complementares. Como
esta instituição tem condição para o desenvolvimento deste projeto, autorizo a sua
execução nos termos propostos.

Florianópolis, ___/____/_____

ASSINATURA _________________
Diretor presidente da Cooperativa X.
139

ANEXO 3

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Meu nome é Elyane Rangel e estou desenvolvendo a pesquisa


PERCEPÇÃO DE MÉDICOS COOPERADOS SOBRE OS PROCESSOS DE
CONTROLE DE CUSTOS EM UMA COOPERATIVA MÉDICA, com o objetivo de
identificar como a prática da medicina pode ser desenvolvida, mantendo-se a
saúde financeira da cooperativa de trabalho médico. Este estudo é necessário
porque se pretende: identificar a percepção de médicos cooperados sobre os
processos de controle de custos em uma cooperativa de trabalho médico;
identificar se os processos de controle de custos em uma cooperativa de trabalho
médico interferem na prática médica; identificar nos relatos onde há interferência
como ocorre e obter dados que propiciem maior eficiência e efetividade no
processo de estruturação dessa singular. Serão realizadas entrevistas semi –
estruturadas que serão gravadas para posterior análise. Isso não traz riscos nem
desconforto à saúde dos entrevistados, mas espera-se que traga dados que
beneficiem a tríade, cooperado - cooperativa - clientes. Se você tiver alguma
dúvida em relação ao estudo ou não quiser mais fazer parte do mesmo, pode
entrar em contato pelo telefone 9989-3408. Se você estiver de acordo em
participar, posso garantir que as informações fornecidas serão confidenciais e só
serão utilizados neste trabalho. Não forneceremos ressarcimento aos
entrevistados, pois se trata de uma pesquisa auto-financiada por esta
pesquisadora.

Assinaturas:
Pesquisador principal ________________________________________
140

Pesquisador responsável _____________________________________


Eu, _______________________________________, fui esclarecido sobre a
pesquisa PERCEPÇÕES DE MÉDICOS COOPERADOS SOBRE OS
PROCESSOS DE CONTROLE DE CUSTOS EM UMA COOPERATIVA MÉDICA
e concordo que meus dados sejam utilizados na realização da mesma.

Florianópolis: _____/_____/_______
Assinatura:_________________________________
Registro de Identidade: _________________________
141

ANEXO 4

Formulário de Entrevista

Entrevista n º:________
___Encontro
Local:_______________________________________________
Participante (codinome)___________________________
Data:______________________________
Horário:____________________________
Idade:_____________anos
Sexo:___________________
Estado civil:_________________________
Especialidade:_____________________________
Tempo de formação como médico:_________
Tempo de atuação como médico:_______
Tempo de cooperado da Cooperativa X:____________
Locais e horas de atuação: ________________________________________

Questões norteadoras:
1. O que representa para você uma cooperativa de trabalho médico?
2. Quais são as vantagens e as desvantagens de ser cooperado?
3. O quanto você acha que a Cooperativa X paga por uma consulta ou
procedimento?
4. O que você entende por custo e por controle?
5. O que você entende por controle de custo?
6. Como você acha que são feitas as regras para o controle de custo na
cooperativa médica?
7. O controle de custo interfere na sua prática médica?
8. Se interfere, dá para você definir como?

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