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Sangramento Uterino Disfuncional atualização

RESUMO Lucas V. Machado


Baseado em longa experiência clínica, o autor faz uma análise crítica
da terminologia e conceituação das perdas sangüíneas uterinas irregu-
lares. Destaca a freqüente confusão acadêmica entre os termos san-
gramento uterino disfuncional e sangramento uterino anormal, o que
gera discussões acerca do diagnóstico e tratamento destas patologias.
Procura racionalizar e simplificar a investigação clínica, enfatizando os
recursos disponíveis em qualquer serviço ou consultório. Para tal, procu-
ra responder basicamente a duas questões: 1) O sangramento é de
causa orgânica ou endócrina? 2) Se for de causa endócrina, é ovu-
latório ou anovulatório? Da mesma forma, limita o tratamento a dois ou
três esquemas simples e eficazes, que funcionam também como diag-
nóstico diferencial ou tratamento de prova, pois, se um esquema
racional, baseado no conhecimento da fisiopatologia do processo, não
corrigir o sangramento, ele certamente não terá uma causa endócrina. Serviço de Ginecologia,
Este fato nos obrigará a aprofundar a nossa propedêutica para identi- Faculdade de Ciências Médicas de
ficar a causa orgânica. (Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/4:375-382) Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.

Unitermos: Sangramento uterino disfuncional; Menorragia; Polimenor-


réia; Oligomenorréia

ABSTRACT

Based on a long clinical experience, the author makes a critical analysis


of the terminology and concept of irregular uterine bleeding. He high-
lights the frequent academic confusion concerning the terms dysfunc-
tional uterine bleeding and abnormal uterine bleeding, which raises
questions on the diagnosis and treatment of these pathologies. The
author tries to rationalize and to simplify the clinical investigation empha-
sizing the common procedures available in any office. For such aim, we
should answer two basic questions: Is the bleeding originated from an
organic or endocrine cause? If endocrine, is it ovulatory or anovulatory?
By the same token, the treatment is limited to two or three simple and
efficient schemes that work also as a differential diagnostic tool. If a ratio-
nal hormonal scheme, based on the knowledge of the physiopathology
of the process, doesn’t stop the bleeding, it certainly is not from an
endocrine cause. This fact will force us to improve our investigation to
identify the specific organic cause. (Arq Bras Endocrinol Metab
2001;45/4:375-382)

Keywords: Dysfunctional uterine bleeding; Menorrhagia; Polymenorrhea; Recebido em 22/02/01


Oligomenorrhea Aceito em 01/03/01

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Sangramento Uterino Disfuncional
Machado

tanto um desafio ao senso crítico do médico, à sua


S ANGRAMENTO UTERINO DISFUNCIONAL refere-se a
um sangramento uterino anormal, cuja origem se
deve, exclusivamente, a um estímulo hormonal inade-
perspicácia na observação e interpretação dos sinais e
sintomas, e à sua capacidade de saber utilizar os meios
quado sobre o endométrio. propedêuticos adequados para a comprovação ou ex-
Entretanto, o termo é freqüentemente usado clusão das possíveis patologias. Quanto mais minucio-
como sinônimo de sangramento uterino anormal e o sa e apurada for a propedêutica, mais causas orgânicas
que vemos na prática clínica é um grande número de iremos encontrar, especialmente nas pacientes acima
sangramentos uterinos anormais provocados por lesões de 35 anos, fazendo com que um aparente sangramen-
orgânicas, genitais ou extragenitais, sendo erronea- to disfuncional seja então identificado como orgânico.
mente rotulados e tratados como disfuncionais (obvia- Aproximadamente 20% das pacientes com san-
mente sem sucesso). Até mesmo em eventos médicos gramento disfuncional são adolescentes e 50% concen-
esta confusão se perpetua, pois são inúmeras as mesas tram-se na faixa dos 40 a 50 anos.
redondas e simpósios com o título especifico “Hemor- Para conceituar um sangramento uterino
ragia ou sangramento uterino disfuncional” onde os anormal é necessário primeiro estabelecer o que se
tópicos e os expositores se perdem em métodos de considera um sangramento menstrual normal. O
diagnósticos por imagens e tratamentos modernos de fluxo menstrual médio dura de 3 a 8 dias, com uma
miomas, pólipos, adenomiose, etc. Ora, sangramento perda sangüínea de 30 a 80ml. O ciclo médio varia
uterino disfuncional já é um diagnóstico fechado e entre 24 e 34 dias (não se preocupem se outros
cabe apenas discutir o tipo da disfunção, as condutas e autores referirem um ou dois dias a mais ou a menos,
modalidades de tratamento. é questão puramente semântica, sem nenhuma
O termo sangramento uterino anormal é importância clínica). Portanto, sangramento uterino
abrangente, multi-etiológico. Dentre as causas, inclui- anormal é aquele que apresenta uma alteração em
se a disfunção hormonal. Quando falamos em sangra- um ou mais destes três parâmetros, ou seja, um san-
mento disfuncional, pressupõe-se que todas as outras gramento excessivo em duração, freqüência ou
causas já foram excluídas. O grande desafio clínico é quantidade. Com relação a este último parâmetro,
exatamente chegar ao diagnóstico preciso de sangra- não existe uma maneira prática e objetiva capaz de
mento uterino disfuncional, pois o tratamento será, medir a quantidade de sangue eliminado, porém, se
em princípio, exclusivamente hormonal e sem possibi- o sangue menstrual forma coágulos, provavelmente a
lidade de fracasso. Se falhar, com certeza não será dis- perda é maior que o normal e quanto mais coágulos
funcional. Neste caso, teremos que melhorar a nossa maior a perda. A dosagem da hemoglobina confir-
propedêutica, para identificar a real causa orgânica. mará o excesso, se estiver baixa.
Este é o primeiro e fundamental axioma: “Sangra- Existe também uma terminologia universal, uti-
mento disfuncional corrige-se com hormônios. Se não lizada para descrever um sangramento uterino anor-
corrigir, não é disfuncional, é orgânico”. mal, à qual devemos nos habituar e respeitar, afim de
não cometermos impropriedades tais como a tão usada
Conceito “hipermenorragia”, pois menorragia já é o suficiente,
Sangramento uterino disfuncional ou endócrino é um hiper é pleonasmo:
distúrbio freqüente que pode ocorrer em qualquer Hipermenorréia – Refere-se a sangramento pro-
época do período reprodutivo da mulher, mas concen- longado, acima de 8 dias, ou quantidade excessiva,
tra-se principalmente em seus extremos, ou seja, logo maior que 80ml, ou à associação de ambos. O volume
após a menarca e no período perimenopausa. É excessivo é também denominado menorragia;
definido como um sangramento uterino irregular, sem Hipomenorréia – Caracteriza um fluxo de
nenhuma causa orgânica (genital ou extragenital) duração menor que 3 dias, ou quantidade inferior a
demonstrável. É, pois, um diagnóstico de exclusão, 30ml, ou à associação dos dois quadros;
feito após cuidadosa eliminação das causas orgânicas Polimenorréia – Caracteriza um ciclo cuja fre-
de sangramento uterino representadas pela gravidez e qüência é inferior a 24 dias;
suas complicações, patologias uterinas e pélvicas Oligomenorréia – Refere-se a ciclos que ocor-
benignas e malignas, e problemas extragenitais, como rem a intervalos acima de 35 dias;
distúrbios da coagulação, doenças sistêmicas, endocri- Metrorragia – É o sangramento uterino que
nopatias extra-ovarianas, ou uso de medicamentos que ocorre fora do período menstrual;
interferem com a ação hormonal ou com os mecanis- Menometrorragia - É o sangramento que ocorre
mos de coagulação. O diagnóstico etiológico é por- durante o período menstrual e fora dele. É típico dos

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miomas subserosos ou pólipos endometriais. Começa também para a possibilidade de uma endometriose;
como uma hipermenorréia ou menorragia e com o Hipermenorréia ou menorragia. Freqüente-
evoluir, transforma-se em menometrorragia. mente devida a causas orgânicas como miomas, póli-
pos, adenomiose e distúrbios da coagulação que cur-
Etiologia sam paralelo com ciclos ovulatórios. Merece portanto
O sangramento uterino disfuncional é representado atenção especial, pois é praticamente um diagnóstico
por duas situações distintas. Aquele que ocorre em por exclusão. A congestão uterina crônica provocada
pacientes que estão ovulando e o que ocorre nas por uma retroversão uterina ou disfunção orgásmica
pacientes que não estão ovulando. (síndrome de Taylor) podem também provocar um
sangramento escuro e prolongado;
Sangramento disfuncional ovulatório Persistência do corpo lúteo (Sindrome de Hal-
Cerca de 15% das pacientes com sangramento uterino ban). Não recorre de maneira cíclica. É episódio
disfuncional apresentam ciclos ovulatórios. São esporádico e o diagnóstico geralmente não é feito,
descritos os seguintes tipos de sangramento: porque não se pensa nesta possibilidade. É confundida
Sangramento da ovulação. Ocorre com mais fre- freqüentemente com gravidez ectópica, o que já levou
qüência no fim da vida reprodutiva. É geralmente várias pacientes a cirurgia de urgência, pois ocorre um
escasso e coincide com o período ovulatório, que pode atraso menstrual, seguido de perdas irregulares, dor no
ser identificado pela secreção mucosa, clara, abundante baixo ventre e presença de massa anexial representada
e filante que se apresenta rajada de sangue e eventual- por um corpo lúteo hemorrágico. Com estes achados,
mente associada à dor da ovulação (Mittelschmerz). O há que se pensar naturalmente em ectópica. Se o diag-
sangramento pode durar de um a três dias e é pos- nóstico correto for confirmado pela ultra-sonografia e
sivelmente secundário à formação de pequenos trom- bHCG (afastando a gravidez), a evolução espontânea
bos nos vasos endometriais conseqüentes à elevação seguirá sem maiores problemas.
plasmática dos níveis de estrogênios, mas pode tam-
bém ser devida ao sangramento da rotura folicular por Sangramento disfuncional anovulatório
ocasião da ovulação, que é captado pelo óstio tubário. É uma das manifestações clínicas da anovulação crôni-
Pacientes em uso de anticoagulantes estão mais sujeitas ca, qualquer que seja a sua etiologia, e representa 80%
a este tipo de sangramento, podendo às vezes chegar dos casos de hemorragias disfuncionais. O sangramen-
até à formação de hemoperitôneo; to pode ser leve ou intenso, constante ou intermitente,
Polimenorréia. Refere-se a ciclo ovulatório com geralmente não associado a sintomas de tensão pré-
menos de 24 dias de intervalo e é geralmente devida a menstrual, retenção hídrica ou dismenorréia, embora
um encurtamento da fase folicular, embora possa tam- algumas vezes a paciente relate cólicas devido à pas-
bém ocorrer uma diminuição da fase lútea ou de sagem de coágulos pelo canal cervical.
ambas. A temperatura basal identificará com precisão
estas alterações; Fisiopatologia
Descamação irregular. É caracterizada por san- Ciclos anovulatórios podem ocorrer em qualquer
gramento prolongado e abundante com intervalos re- época do menácme, mas é particularmente freqüente
gulares. A biópsia do endométrio praticada pelo menos nos extremos da vida reprodutiva, seja logo após a
5 dias após o início do sangramento mostrará um menarca ou no período pré-menopausa. Na puber-
aspecto de endométrio misto, onde identificam-se his- dade, a anovulação se deve a uma imaturidade do eixo
tologicamente áreas de secreção avançada, reepiteliza- Córtex-Hipotálamo-Hipófise-Ovário (C-H-H-O),
ção endometrial incompleta e proliferação inicial. Este ainda incapaz de levar um folículo ao estágio maduro
quadro sugere uma regressão retardada do corpo lúteo, e desencadear o pico ovulatório de LH. Nesta época é
fazendo com que ainda persistam áreas sob a ação da comum encontrarmos os ovários policísticos (óbvio, se
progesterona do ciclo anterior juntamente com áreas existe uma população folicular adequada e a presença
de proliferação estrogênica do ciclo atual; de FSH, os folículos crescerão até um diâmetro apro-
Sangramento pré-menstrual. Caracterizado por ximado de 6 a 8 milímetros, acumulando abaixo da
perda escassa de sangue, geralmente escuro, tipo borra superfície, dando-lhe o aspecto policístico). No
de café, que antecede de alguns dias o sangramento menácme, a anovulação crônica é conseqüência geral-
menstrual. Também mais freqüente no fim da vida mente de um mecanismo de feedback inapropriado,
reprodutiva (acima dos 35 anos) e associada a uma cujo resultado levará invariavelmente aos ovários
deficiente produção de progesterona. Deve nos alertar policísticos. No período climatérico, a anovulação se

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deve à falência funcional dos ovários, quando ainda frágil e sofre soluções de continuidade na superfície,
produzem estrogênios mas não mais ovulam e conse- por onde se exterioriza o sangramento. Os mecanis-
qüentemente não produzem progesterona. Também mos vasculares de controle da menstruação normal
os ovários poderão estar policísticos, desde que exista acham-se ausentes e o sangramento não é um fenô-
ainda uma população folicular suficiente, porem, não é meno universal, atingindo segmentos isolados da
a regra. mucosa. Também não ocorrem os fenômenos de vaso-
O sangramento ocorre superficialmente, na constrição ritmados, nem aumento da tortuosidade
camada compacta, e representa uma perda por depri- das artérias espiraladas pela redução do edema intersti-
vação estrogênica (hemorragia de privação) ou por cial. O sangramento é interrompido somente pela ação
níveis estrogênicos incapazes de manter um estímulo proliferativa cicatricial dos estrogênios endógenos ou
endometrial constante e adequado (break through exógenos. Nestes casos não há descamação e subse-
bleeding, ou hemorragia de escape),portanto, diferente qüente renovação do endométrio. Haverá somente
da descamação ordenada da camada funcional do proliferação e aumento contínuo da espessura da
endométrio que ocorre na menstruação de ciclos ovu- mucosa intercaladas por perdas sangüíneas irregulares.
latórios (figura 1).
A estimulação contínua dos estrogênios Diagnóstico
induzirá uma progressão da resposta endometrial que O primeiro e mais difícil passo será afastar causas orgâ-
transitará de proliferado a uma hiperplasia em suas nicas. Feito isto, o segundo passo será separar estas
diversas formas (simples ou complexa, típica ou atípi- pacientes em dois grupos: as que estão ovulando (san-
ca), podendo chegar eventualmente ao adenocarcino- gramento disfuncional ovulatório) e as que não estão
ma. Na ausência das ações limitantes da progesterona ovulando (sangramento disfuncional anovulatório).
sobre a proliferação induzida pelos estrogênios e da Isto se faz simplesmente pela anamnese associada a
descamação ordenada da camada funcional, o qualquer método que comprove a presença ou ausên-
endométrio continuará crescendo, sem o concomi- cia da ovulação (temperatura basal, dosagem da pro-
tante suporte estrutural. Há um aumento da vascula- gesterona, colpocitologia funcional, cristalização do
rização e das glândulas que se apresentam coladas muco cervical, ultra-sonografia etc). A temperatura
umas às outras, sem o devido arcabouço do estroma de basal é simples, eficiente, não custa nada e é o sufi-
sustentação e sua malha reticular. Este tecido torna-se ciente, além de fornecer informações adicionais.

Figura 1. Representação diagramática dos níveis de estrogênio e endométrio no sangramento


uterino disfuncional. Quando há uma queda nos níveis de estrogênio, ocorre um sangramento
superficial do endométrio, sem caracterizar uma descamação da camada funcional. Ao admi-
nistrar estrogênio terapêuticamente, haverá uma interrupção temporária do sangramento,
acompanhado de um aumento da espessura do endométrio.

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Na puberdade, o sangramento uterino anormal dias após a menstruação normal. É geralmente inter-
é geralmente disfuncional (endócrino), tornando-se pretada como sangramento disfuncional. Pela repe-
progressivamente mais relacionado com doenças tição da cirurgia ou mesmo em cirurgia única, ocorre
orgânicas, à medida que se aproxima da menopausa. O uma cicatrização viciosa da histerorrafia, formando
diagnóstico é portanto mais fácil na adolescência, tor- uma espécie de vala acessória transversa na altura do
nando-se mais difícil e complexo na idade madura, segmento inferior. Durante o fluxo menstrual, ela
onde será feito por exclusão das causas orgânicas. reterá uma quantidade de sangue que será lentamente
A simples visão da paciente ao entrar no con- eliminado após o término da regra, já parcialmente
sultório poderá nos alertar para eventual distúrbio metabolizado, apresentando um aspecto de borra de
endócrino tipo obesidade, magreza excessiva, hir- café. Por tratar-se de sangue acumulado na bolsa do
sutismo, hipotireoidismo ou Cushing, que poderiam divertículo da cicatriz, portanto uma causa anatômica,
interferir no eixo C-H-H-O levando à anovulação. A qualquer forma de tratamento hormonal será total-
história menstrual informará geralmente uma menarca mente ineficaz. Sua identificação é facilmente cons-
na época habitual e ciclos subseqüentes irregulares no tatada pela histerosalpingografia e pela hidro-sono-
período e duração, o que, por si só, fala da possibili- grafia, ou suspeitada pela ultra-sonografia. A compro-
dade de ciclos anovulatórios, pois a ocorrência é vação ou simples explicação do quadro será o sufi-
comum nesta faixa etária e traduz tão somente a fase ciente para tranqüilizar a paciente, dispensando qual-
de amadurecimento do eixo hipotálamo-hipofisário. A quer outra intervenção, que no caso, resolveria apenas
maioria das perdas sangüíneas não são severas e as ado- por uma histerectomia, já que não faz sentido subme-
lescentes podem ser seguidas sem uma intervenção ter esta paciente a uma plástica da cicatriz uterina.
ativa até que se estabeleçam os ciclos ovulatórios. A biópsia do endométrio, praticada durante o
Entretanto, se o sangramento for prolongado ou seve- sangramento (fora deste período não terá nenhum
ro, deveremos afastar um distúrbio da coagulação. valor, a não ser afastar ou confirmar um câncer do
Estes distúrbios são encontrados em cerca de 20% das endométrio), nos mostrará com precisão se o ciclo é
jovens que são hospitalizadas devido a sangramento ovulatório ou anovulatório, se o endométrio foi ade-
uterino abundante. Defeitos da coagulação estão pre- quada ou inadequadamente estimulado pela proges-
sentes em cerca de 30% daquelas que necessitam trans- terona, se há hiperplasia e de que tipo e fundamental-
fusão de sangue. A menarca é, para muitas adoles- mente, nas pacientes acima de 35 anos, se existe um
centes, a primeira oportunidade que elas terão de tes- adenocarcinoma do endométrio. Mas lembre-se, estas
tar seus mecanismos de coagulação, por isso, patolo- informações só serão confiáveis se a paciente não tiver
gias como doença de Von Willebrand, deficiência de feito uso anteriormente de nenhum medicamento hor-
protrombina, púrpura trombocitopênica idiopática, ou monal pois, neste caso, a biópsia mostrará simples-
distúrbios que levam a deficiência ou disfunção pla- mente a ação deste hormônio sobre o endométrio e
quetária, como leucemias e hiperesplenismo, só serão não o diagnóstico etiológico funcional.
suspeitadas ou diagnosticadas neste período. A histeroscopia, embora represente um ótimo
Devemos indagar sobre o uso de medicamentos método de investigação invasivo da cavidade endome-
que podem interferir na menstruação, especialmente trial, não é indispensável na avaliação do sangramento
hormônios e drogas tipo sulpirida, metoclopramida, uterino anormal (2). O diagnóstico é essencialmente
tranqüilizantes e outras que atuam no sistema nervoso clínico, pois sangramento disfuncional corrige so-
central, modificando a ação dos neurotransmissores mente com hormônioterapia. Se não corrigir, certa-
responsáveis pela liberação ou inibição dos hormônios mente não é disfuncional, logo, de causa orgânica.
hipotalâmicos que regulam a atividade hipofisária. Se a Vamos então melhorar a nossa propedêutica. Aqui, a
paciente tem vida sexual ativa, indagar se faz uso de histeroscopia poderia ser utilizada, porém, não oferece
dispositivo intra-uterino. vantagens sobre a hidro-histero-sonografia (3). Perce-
Um quadro muito comum, especialmente no bam que estamos falando de sangramento por causa
Brasil, campeão mundial de cesarianas, é o que chamo orgânica e não funcional ou disfuncional. A figura 2
de pseudo-divertículo da cicatriz uterina (1). É tão fre- ilustra bem esta situação onde, além do pólipo, foi
qüente em pacientes com mais de uma cesariana ante- detectado um mioma intramural. A ultra-sonografia
rior, que atualmente dispenso a comprovação por simples não identificou o pólipo e a histeroscopia não
métodos de imagem, bastando tão somente a história teria identificado o mioma.
clínica, que é invariavelmente a mesma: perda Por ser mais simples, melhor tolerado, mais
sangüínea escassa, escura, que se prolonga por 5 a 8 barato e disponível em qualquer centro que tenha um

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Figura 2. Paciente com sangramento uterino anormal, sob reposição hormonal. A: Ultra-sonografia mostrando apenas um
mioma intramural. B: Hidro-histero-sonografia revela com absoluta nitidez um pólipo endometrial e o mioma. A ultra-sono-
grafia simples não identificou o pólipo e a histeroscopia não revelaria o mioma.

aparelho de ultra-som, dou preferência a este método apenas esclarecimento e observação. Esta conduta é
propedêutico, reservando a histeroscopia para o trata- reforçada pelo fato do sangramento disfuncional da ado-
mento dos casos de pólipos, miomas submucosos ou lescente ser uma patologia geralmente auto-limitada,
ablação do endométrio, onde tem sua indicação pois à medida que o eixo C-H-H-O amadurece, insta-
príncipe. lam-se os ciclos ovulatórios que corrigem espontanea-
mente o sangramento irregular. Nos casos de sangra-
Tratamento do sangramento uterino mento prolongado, com uma perda sangüínea maior,
disfuncional ovulatório haverá obviamente a necessidade de tratamento e aqui,
Por serem variáveis biológicas do ciclo menstrual nor- mais uma vez, devemos recorrer à fisiopatologia. Se a
mal, sem maiores conseqüências clínicas, elas necessi- paciente está sangrando é porque existe produção
tam apenas esclarecimento. Neste sentido, podemos estrogênica adequada, caso contrário ela não sangraria,
solicitar que a paciente faça o registro da sua curva de estaria em amenorréia. Portanto, em princípio, este hor-
temperatura basal durante um ciclo completo. A sua mônio não deve ser empregado. O que a paciente não
interpretação junto com a paciente ajudará a entender está produzindo é a progesterona e esta, sim, é a medi-
sua fisiologia, ao mesmo tempo que comprova e cação racional. Sua ação fisiológica é obtida na dose de
reforça as explicações do médico. Se, entretanto, os 300mg diários de progesterona pura por via oral durante
ciclos forem muito curtos, a ponto de incomodar a 10 dias, ou qualquer progestogênio oral em doses cor-
paciente, ou a perda sangüínea for abundante ou pro- respondentes (5 a 10mg de medroxiprogesterona, 1 a
longada, justifica-se um tratamento hormonal. Nestas 5mg de noretisterona, 5mg de nomegestrol). A ação
eventualidades, uma simples complementação com um progestacional interromperá imediatamente o efeito
progestogênio na segunda metade do ciclo, um esque- proliferativo do estrogênio sobre o endométrio, trans-
ma cíclico de estrogênio e progestogênio, ou um anti- formando-o em endométrio secretor. Por outro lado, o
concepcional oral resolverão o problema. progestogênio não promove a cicatrização (epitelização)
do endométrio e, conseqüentemente, a interrupção do
Tratamento do sangramento uterino sangramento. Este fato deverá ser comunicado à
disfuncional anovulatório paciente, pois ela provavelmente continuará perdendo
sangue durante o uso da medicação. Após 10 dias de
Na puberdade tratamento a medicação é suspensa e 3 a 4 dias depois
Antes de prescrever qualquer medicação, devemos ter ocorrerá uma descamação fisiológica da camada fun-
em mente a fisiopatologia do processo. Isto já nos indi- cional do endométrio, correspondendo a uma menstru-
ca que, afastada uma coagulopatia, estaremos provavel- ação verdadeira (este processo é conhecido como cure-
mente diante de um quadro de sangramento disfun- tagem farmacológica). Portanto, a paciente poderá con-
cional anovulatório. Como tal, o sangramento rara- tinuar sangrando durante os dias em que estiver toman-
mente é intenso, a ponto de exigir uma solução urgente, do o medicamento, mais 3 a 4 dias correspondentes ao
portanto o melhor tratamento é nenhum tratamento, período de deprivação hormonal, mais os dias da mens-

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truação propriamente dita. Nova série de 10 dias do formar o endométrio proliferado ou hiperplásico em
progestacional será repetida, começando no 15º dia secretor, possibilitando uma descamação fisiológica
contado a partir do início da menstruação. Afim de faci- após a interrupção da medicação. O progestogênio
litar o cálculo para a paciente, pedimos-lhe para iniciar a poderá ser acrescentado ao estrogênio durante 10 dias
segunda série 18 dias após o término da primeira série (3 ou o estrogênio poderá ser substituído por uma associ-
a 4 dias correspondendo ao período que levaria para ini- ação de estrogênio-progestogênio ou uma pílula anti-
ciar a menstruação, mais os 14 dias da fase proliferativa) concepcional combinada, com doses de 30 a 50mg de
(figura 3). Após 3 a 4 séries, a medicação é suspensa e a etinil-estradiol (a dose tem que ser elevada para poder
paciente observada durante os próximos ciclos. Caso exercer o efeito farmacológico desejado), 3 vezes ao
ocorram novos atrasos menstruais, indicando que os ci- dia, durante 10 dias. Três a quatro dias após o término
clos ovulatórios ainda não se estabeleceram, nova série da medicação ocorrerá a menstruação. A partir daí,
profilática do progestogênio deverá ser instituída. somente o progestacional oral deverá ser administrado
Se o quadro hemorrágico for de grande intensi- por mais três ou quatro séries, a partir do 15º dia do
dade, a ponto de levar a adolescente a uma anemia pro- ciclo, a menos que a paciente tenha atividade sexual e
funda, a interrupção imediata do sangramento é impe- prefira fazer uso da pílula como medida anticoncep-
riosa e nesta situação especial, o emprego dos cional (figura 3). Casos de sangramento moderado
estrogênios estará indicado, seja isoladamente ou pre- respondem bem aos preparados seqüenciais, onde os
ferentemente associado ao progestogênio. Voltemos onze primeiros comprimidos contém um estrogênio
mais uma vez à fisiopatologia (figura 1). O sangramen- (2mg de valerato de estradiol) e os dez seguintes, uma
to ocorre quando os níveis flutuantes dos estrogênios associação do estrogênio mais um progestogênio
caem abaixo de um certo nadir e interrompe quando os (0,25mg de levonorgestrel). Após a primeira série de-
níveis se elevam. Se elevarmos os níveis de estrogênios verão ser substituídos pelo esquema do progestogênio
farmacologicamente, obteremos uma rápida reepiteliza- durante 10 dias, a partir do 15º dia do ciclo.
ção do endométrio e conseqüente interrupção do san- A não observância da fisiopatologia do quadro e
gramento, mas ao mesmo tempo, estaremos provocan- do tratamento baseado nestes princípios tem levado
do um maior crescimento da espessura do endométrio, grande número de pacientes ao meu consultório, onde
que fatalmente irá descamar cessado o estímulo hor- o sangramento inicialmente disfuncional se transforma
monal, provocando um sangramento ainda maior. em iatrogênico pela salada hormonal a que são sub-
O estrogênio por via endovenosa não é mais efi- metidas. Curioso é que a história é sempre a mesma:
ciente do que por via oral. Quatro comprimidos ao dia começa com Estrogênios Conjugados por via
de 1,25 ou 2,5mg de estrogênios conjugados (5 a endovenosa ou injeção de Acetato de Noretisterona
10mg/dia) são suficientes para interromper a hemorra- associada a Etinil-estradiol, que suspendem em 48
gia dentro de 48 horas. Se tal não ocorrer devemos sus- horas o sangramento. Depois de 4 a 7 dias a paciente
peitar de uma causa orgânica não diagnosticada. Uma volta a sangrar, o que é lógico, pois trata-se respectiva-
vez obtida a hemostasia, o tratamento combinado com mente do sangramento por deprivação ou da menstru-
o progestacional deverá ser instituído, a fim de trans- ação, mas aos olhos da paciente e principalmente da sua
mãe, é o retorno do problema. O médico, se não racio-
cinar de acordo com a fisiopatologia do quadro, ao ser
contatado pela paciente relatando o ocorrido, assusta-
do, prescreve outra injeção dos mesmos medicamentos,
às vezes em dose dupla e novamente o quadro se repe-
tirá, até que a paciente procure outro colega.
A única medicação complementar indispensável
é o ferro, que corrigirá a anemia presente. Drogas co-
mo agentes antifibrinolíticos, derivados do Ergot, ou
outros hormônios não alteram significativamente a
resposta aos esquemas anteriormente sugeridos. Nos
casos de sangramento excessivo, o emprego dos anti-
inflamatórios não esteróide, especialmente os
inibidores da prostaglandina sintetase, reduzem sen-
sivelmente a perda sangüínea, equiparando-se aos
Figura 3. Tratamento do sangramento uterino disfuncional. progestogênios.

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A curetagem uterina, que é medida obrigatória transição menopausal, não é de se esperar o retorno das
nas pacientes na perimenopausa, por ser terapêutica e ovulações, portanto, é absolutamente indispensável que
ao mesmo tempo diagnóstica, não tem lugar na continue a tomar o progestogênio ciclicamente até que
paciente adolescente. O diagnóstico correto e a te- ocorra a menopausa, quando então poderemos acrescen-
rapêutica racional baseada nos conhecimentos da tar o estrogênio, dando início à reposição hormonal.
fisiopatologia evitarão este procedimento. O risco de Esta medida prevenirá o adenocarcinoma do endomé-
câncer nesta faixa etária é desprezível. trio, como também evitará uma histerectomia desneces-
sária. É freqüentemente dito a estas pacientes: - “Minha
No menacme filha, nós já fizemos uma curetagem e o sangramento
Na idade reprodutiva, o tratamento é basicamente o voltou. Isto é um mau sinal. O jeito agora é partirmos
mesmo. Lembremos apenas que a ausência da ovu- para a histerectomia, senão isto evoluirá para um câncer!”
lação neste período, como na adolescência, levará fatal- Mas, e se não responder ao tratamento hor-
mente ao aparecimento dos ovários policísticos, pois monal e continuar sangrando?
eles são simplesmente a expressão morfológica de um Certamente não será um sangramento disfun-
estado anovulatório crônico, assim como a hiperplasia cional. Teremos que rever a propedêutica. Se ainda
do endométrio. assim nada encontrarmos, não restará outra alternativa
O objetivo do tratamento poderá visar também senão a histerectomia ou, quem sabe, a ablação do
o hirsutismo, a obesidade, o hiperinsulinismo ou a endométrio por cirurgia histeroscópica. A minha
infertilidade. Uma vez controlado o sangramento preferência ainda é a histerectomia, por não deixar
através dos esquemas referidos, as medidas específicas nenhuma chance de sangramento por outras causas,
para cada uma destas situações deverão ser adotadas. inclusive uma pequena área de um adenocarcinoma
que eventualmente não tenha sido identificado pela
No climatério curetagem. Alias, nesta eventualidade, por tratar-se de
O tratamento inicial continua sendo o mesmo, porém, uma causa orgânica, não responderá ao tratamento
o estudo histológico prévio do endométrio, obtido hormonal e fatalmente voltará a sangrar, dando-nos
através de biópsia ou curetagem é indispensável, a uma segunda chance de acertar o diagnóstico. A
menos que a ultra-sonografia endovaginal revele uma racionalidade desta conduta, mais uma vez, baseia-se
espessura endometrial inferior a 5mm, o que nestes no fato de que o sangramento disfuncional corrige
casos não é comum, já que quase sempre estaremos obrigatoriamente com a hormônioterapia. Este é um
diante de um endométrio proliferado ou hiperplásico, dos poucos raciocínios matemáticos aplicáveis em
devido à ação não oposta dos estrogênios. Baseado nos medicina. Se isto não ocorrer, é porque não é disfun-
conhecimentos da dinâmica hormonal do climatério, o cional. Existe com certeza uma causa orgânica, que se
progestogênio deverá continuar ciclicamente, até que a propedêutica utilizada não conseguiu detectá-la, o
surjam sintomas de deficiência estrogênica quando, histopatologista certamente o fará e na imensa maioria
então, este hormônio será acrescido. das vezes encontrará uma adenomiose.
A preocupação primária nesta faixa etária é afastar
a possibilidade de um câncer do endométrio. Uma críti- REFERÊNCIAS
ca e um alerta entretanto devem ser feitos em relação à
1. Machado LV. Hemorragia uterina disfuncional. In:
curetagem uterina. Diz-se com freqüência que ela é ao Machado LV, ed. Endocrinologia Ginecológica. Rio de
mesmo tempo diagnóstica e terapêutica. Diagnóstica, Janeiro:MEDSI, 2000.
certamente. Irá nos dizer se o endométrio é atrófico, 2. Weber AM, Belinson JL, Bradley LD, Piedmonte MR. Vagi-
secretor, proliferado, hiperplásico simples ou complexo, nal ultrasonography versus endometrial biopsy in
com atipia ou sem atipia ou ainda identificar um adeno- women with postmenopausal bleeding. Am J Obstet
Gynecol 1997;177:924-9.
carcinoma e o seu tipo histológico. Terapêutica porém,
somente naquele momento, quando interromperá o san- 4. Widrich T, Bradley LD, Mitchinson AR, Collins RL. Com-
parison of saline infusion sonography with office hys-
gramento pela raspagem da camada funcional. É funda- teroscopy for the evaluation of the endometrium. Am J
mental termos em mente que o mesmo processo que Obstet Gynecol 1996;174:1327-34.
levou o endométrio à hiperplasia (presença contínua de
Endereço para correspondência:
estrogênio sem a oposição do progestogênio) persistirá
atuando e, se não tomarmos uma providência, o quadro Lucas V. Machado
Rua Maranhão 1567/1401
hemorrágico fatalmente retornará. É óbvio. De uma 30.150-331 Belo Horizonte, MG
paciente com sangramento disfuncional anovulatório na e.mail: lucasm@mkm.com.br

382 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 4 Agosto 2001

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