1. A aquisição de um terreno «a meias» funda uma situação de compropriedade
(cfr. artigos 1403.º e seguintes). A compropriedade não faz surgir uma nova pessoa jurídica, mas já partilha de certos aspectos próprios da personalidade colectiva: institui um modo de formação de uma «vontade colectiva» e permite uma certa organização (cfr. artigo 1407.º). 2. J e J, além de adquirirem o terreno, acordam a prossecução de uma actividade agrícola (cultivo de tremoços), com o objectivo de comercializarem a produção. Coloca-se o problema de saber se já estamos ou não perante um contrato de sociedade civil (e, em caso afirmativo, adicionalmente o problema da personalidade jurídica da sociedade civil). 2.1. De acordo com o artigo 980.º, não há sociedade civil quando, por um lado, a actividade cujo exercício em comum seja acordado seja de mera fruição (v. g., compra do terreno para arrendamento, com repartição do produto das rendas) e, por outro lado, os lucros da actividade se verifiquem directamente na esfera jurídica das partes, sem ser necessária a sua repartição (v. g., contrato de consórcio). No caso concreto, não faltam os correspondentes pressupostos. 2.2. Os Professores Oliveira Ascensão e Pedro Pais de Vasconcelos defendem uma interpretação restritiva do artigo 980.º, com fundamento no facto de a disciplina legal do contrato de sociedade civil (cfr. artigos 980.º e seguintes) pressupor a criação de um novo ente (a sociedade), não sendo, por isso, directamente aplicável aos «contratos de sociedade» «incipientes». Concretamente o artigo 980.º não integraria: a chamada «sociedade oculta»; as «sociedades» com finalidade efémera; e ainda as «sociedades» não dotadas de uma estrutura empresarial mínima. Opinião diversa da do Professor Castro Mendes (o artigo 980.º aplica-se à generalidade dos contratos de sociedade; aqueles que forem celebrados nos termos do artigo 158.º, n.º1 e do artigo167.º implicam a criação de uma pessoa colectiva) a) No caso, o contrato celebrado entre J e J parece criar uma «sociedade oculta» que progressivamente se vai transformando numa verdadeira sociedade, dada a alteração no plano das relações externas (J e J obtêm um nome para a sociedade junto do Registo Nacional das Pessoas Colectivas e começam a invocar a sociedade nas relações com terceiros; fazer referência à posição do Professor Menezes Cordeiro quanto aos elementos de personificação e à exigência de registo) e na estruturação (é contratado um trabalhador). Preenche-se o artigo 980.º. 3. Pode a CCA pedir o cumprimento a um dos sócios? Como limitar a responsabilidade? 3.1. Pode: à luz do artigo 997.º, com a possibilidade de ser exigida a excussão prévia do património social. 3.2. Constituição de uma sociedade por quotas, nos termos do CSC, que seria uma sociedade sob a forma comercial (J & J, Lda.) 4. José exige «continuar a trabalhar para Jasmim». Terá razão? 4.1. A sociedade civil tem personalidade jurídica (segundo os Professores Oliveira Ascensão, Pedro Pais Vasconcelos e Menezes Cordeiro, este último, quando a sociedade seja registada no RNPC). Nos contratos celebrados em nome da sociedade é parte a própria sociedade e não os sócios. José nunca foi trabalhador de Jasmim, mas da J & J. A dissolução da sociedade, seguida da liquidação, conduz à cessação de quaisquer contratos de execução duradoura de que aquela fosse parte. 5. Pode a J & J constituir sobre o terreno hipoteca para garantir a dívida de Jacinto, proveniente de um acidente de viação? 5.1. Não. Trata-se de um acto que não é necessário nem conveniente à prossecução do fim da sociedade, que é o da obtenção do lucro (cf. artigo 160.º, não obstante este demarcar o «princípio da especialidade» em termos muito amplos). 5.2. A limitação decorrente do art. 160.º/1 constitui uma limitação à capacidade de gozo das pessoas colectivas? Não. Não lhes é vedada a titularidade de certa ou certas categorias de situações jurídicas. 5.3. Qual o valor dos actos contrários ao fim fora do domínio do CSC? (repare-se que o enunciado não coloca directamente a questão) a) Doutrina maioritária: nulos, por aplicação do art. 294.º. b) Segundo o Professor Oliveira Ascensão: a nulidade teria consequências desajustadas e o art. 160.º/1 não é uma disposição imperativa que proíba o acto em si mesmo considerado. Aplica-se então, por analogia, o regime das deliberações sociais inválidas das Assembleias Gerais das associações (artigos 177.º a 179.º; mas esta solução coloca, designadamente, o problema de saber quem tem legitimidade para requerer a anulação dos actos contrários ao fim: se for a própria sociedade, a sua inércia permitirá convalidar o acto, prejudicando credores sociais). c) Professor Pedro Pais de Vasconcelos: aplicação analógica do art. 6.º/4 do CSC às pessoas colectivas civis quanto aos actos contrários ao objecto social: esses actos são válidos, vinculam a pessoa colectiva e apenas responsabilizam internamente quem os praticou (no entanto, tratando-se de actos contrários ao próprio fim, não deverá aplicar-se antes analogicamente o artigo 6.º, n.º3 CSC?). d) É ainda possível defender, quanto aos actos contrários ao objecto, que o único sujeito a proteger é a própria pessoa colectiva, devendo considerar-se tais actos ineficazes em relação à pessoa colectiva, mas conferindo-se-lhe a possibilidade de os aproveitar, ratificando-os. Quanto aos actos contrários ao fim estes são nulos e não podem ser alvo de sanação. Não confundir a validade/invalidade dos actos contrários ao fim com a prossecução reiterada de uma actividade contrária ao fim (lato sensu), que pode desencadear a extinção da pessoa colectiva (artigos 182.º, n.º 2, alíneab) e 192.º, n.º 2, alínea b)).