Sei sulla pagina 1di 61

CRISTIANISMO PRIMITIVO

Os ensinamentos do personagem que dividiu a História.

INTRODUÇÃO

Levando-se em consideração o grande número de adeptos do

Cristianismo, ocorreu-me fazer uma pesquisa sobre sua origem. Onde e como

surgiu, o contexto histórico, sócio-econômico e religioso da época, quem eram os

personagens existentes, como viviam sua religiosidade, em que acreditavam, e em

que perspectiva esperavam o Salvador de Israel, conforme previam os profetas

através dos escritos do Antigo Testamento.

A linha de pesquisa deste trabalho é a História das Religiões, que se

desenvolveu no século XIX, e cujo “método se voltava para determinar a precisão

dos textos religiosos, comparar os discursos sagrados e comparar as próprias

religiões através de seus mitos, símbolos e instituições”. (Albuquerque, 2003).

Ainda segundo Albuquerque:

A História das Religiões tem sido praticada de diversas maneiras: seja para
reafirmar a superioridade de uma religião sobre as demais, seja para
demonstrar que a religião é parte de um passado a ser ultrapassado pela
razão, seja para demonstrar que a religião é parte de um sistema de
opressão e de poder, seja para simples conhecimento acadêmico das
religiões ou para reivindicar a perenidade da experiência religiosa
(ALBUQUERQUE, 2005, p. 15).

Levando em consideração o estudo de Albuquerque, a intenção desta

pesquisa é o conhecimento acadêmico sobre o Cristianismo.


10

Segundo Eliade, que defende a História das Religiões como a

disciplina que trata de uma experiência irredutível a outras diz:

Parece-me, mesmo, que um dado religioso revela seu significado profundo


quando é considerado sobre seu próprio plano de referência, e não quando é
reduzido a um ou outros de seus aspectos secundários ou de seus
contextos. (ELIADE, 1978, p. 26, apud ALBUQUERQUE, 2005, p. 16).

Minha intenção nesta pesquisa é tratar do Cristianismo, de maneira

geral, sem me deter em pormenores ou aspectos específicos, conforme afirma

Eliade no texto supra citado.

O Cristianismo é tratado como um movimento, doutrina ou instituição

religiosa originários das pregações de Jesus e seus discípulos. Dentre as

numerosas seitas messiânicas desenvolvidas no mundo judeu, surge o Cristianismo,

resultado do reagrupamento dos discípulos de Jesus, que primeiramente, foram

reunidos dentre os discípulos de João Batista. As classes existentes à época, como

as dos fariseus, saduceus, zelotas e essênios, rejeitaram a comunidade dos

cristãos, que deriva do latim Christus, “Cristo”, e este do grego Khristós, “ungido”. A

aceitação do Cristianismo pelos judeus ocorreu até o ano 65 d.C., ano em que se

concretizou a ruptura entre as duas facções religiosas.

A convicção dos cristãos de que Jesus Cristo, era o messias que havia

sido anunciado pelos profetas de Israel, era inadmissível para os judeus. Repudiado

em seu lugar de origem, o Cristianismo difundiu-se no mundo pagão. Mesmo com as

perseguições do Império romano, em 61 d.C. já se encontrava em Roma, e após as

perseguições o mundo romano abriu-se à nova religião, passando daí para os

bárbaros, sobretudo no Ocidente.


11

A seita nascida no judaísmo tornou-se a religião de maior amplitude

dentre todas as conhecidas, cujo universalismo ela mesma se atribui desde a sua

origem. Esse universalismo explica a importância de que o Cristianismo se reveste,

do ponto de vista de sua influência tanto nos domínios da cultura, da vida social e da

política, como nos da moral.

Para os historiadores latinos, como Suetônio, Tácito, Plínio, o

Cristianismo era considerado como uma das numerosas religiões vindas dos confins

do império, da qual Jesus de Nazaré, fora o fundador. Para a maioria das religiões, a

sua origem é atribuída a uma divindade, e cuja revelação é recebida por homens

privilegiados, mas para os cristãos, Jesus, foi desde o início, muito mais que um

intermediário divino, encarregado de uma mensagem, e, em virtude dessa

mensagem, tomou a iniciativa da fundação de uma nova religião.

Oscar Cullman, afirma que:

Estudando, do ponto de vista da ciência histórica, o alcance de modificações


políticas e culturais que o Cristianismo ocasionou, é certo que o historiador
moderno pode, a rigor, reconhecer como legítima esta afirmação: O
surgimento de Jesus de Nazaré deve ser considerado como uma curva
decisiva da História. (CULLMAN, 2003, p. 91)

Será mesmo que Jesus Cristo se preocupou em fundar uma nova

religião? Não seria Ele o personagem da história que quebraria todos os paradigmas

religiosos, até então aceitos? Se Cristianismo é referente a Cristo e sua doutrina,

qual sua origem? De onde veio? Qual sua ascendência humana?

A importância de Jesus não advém, fundamentalmente, de seus

ensinamentos religiosos, mas de sua pessoa, introdutora do absoluto divino na

história da humanidade.
12

A fé cristã professa que o Deus revelado a Abraão, a Moisés e aos

profetas envia à terra seu filho como messias salvador. Ele nasce numa família

comum, morre, ressuscita e envia o Espírito Santo para permanecer no mundo até o

fim dos tempos. Desde o início o Cristianismo organiza-se como Igreja, sob a

autorizada dos apóstolos e dos seus sucessores. Os discípulos espalham-se pelas

regiões do Mediterrâneo, inclusive Roma, e fundam várias comunidades. Nos

três primeiros séculos, os cristãos sofrem grandes perseguições, primeiro das

autoridades religiosas do judaísmo e, a partir do século I d.C., dos romanos.

Milhares de cristãos são mortos durante o reinado dos imperadores Nero, Trajano,

Marco Aurélio, Décio e Diocleciano, por se recusarem a adorar os deuses do

Império e a reconhecer a divindade do imperador.

Em 313 o imperador Constantino converte-se ao cristianismo, que

expande-se por todo império.

As questões levantadas no início da introdução serão tratadas no

primeiro capítulo do presente trabalho. No segundo capítulo a pesquisa abordará as

seitas existentes na época de Jesus e no terceiro capítulo versará sobre a

romanização da doutrina cristã e sua expansão até se tornar a “religião” oficial do

Império Romano
13

1 O CONTEXTO: HISTÓRICO, ECONÔMICO, SOCIAL E RELIGIOSO

1.1 NO MUNDO ORIENTAL

A história do Cristianismo, teve início no Oriente, há cerca de quatro mil

anos. Desde aquela época, o povo hebreu, que habitava a região da Palestina, uma

faixa de transição entre a Ásia e a África, já acreditava na futura vinda de um

Messias à terra. Essa profecia constava das páginas do Antigo Testamento, que

continha os preceitos transmitidos por homens como Isaias, Moisés e Abraão,

segundo os quais viviam os hebreus.

Regozijai-vos, juntas lançai gritos de alegria, ruínas de Jerusalém! Porque


Iahweh consolou o seu povo, ele redimiu Jerusalém. Iahveh descobriu o
braço santo aos olhos de todas as nações, e todas as extremidades da terra
viram a salvação do nosso Deus. (ISAIAS, 52, 9-10).

O Messias solucionaria não somente os problemas do povo da

Palestina, mas traria a justiça aos homens, de modo que todos tivessem os mesmos

benefícios. Para compreender o tamanho da expectativa gerada por essa profecia

no mundo hebreu, é necessário conhecer um pouco melhor a situação da Palestina

nesse período. Era uma região aparentemente bastante próspera, já que era palco

de constantes negociações envolvendo especiarias e artigos de luxo, embora a

riqueza produzida concentrasse nas mãos da camada rica da sociedade, enquanto a

maioria vivesse em condições precárias.


14

Eis que dias virão – oráculo de Iahveh – em que suscitarei a Davi um germe
justo; um rei reinará e agirá com inteligência e exercerá na terra o direito e a
justiça. Em seus dias, Judá será salvo e Israel habitará em segurança. Este é
o nome com que o chamarão: Iahveh, nossa justiça. (JEREMIAS, 23, 5-6).

Por isso as pessoas menos favorecidas depositavam grandes

esperanças na vinda do Messias, que instauraria uma nova ordem no mundo

oriental, em que prevalecessem a compaixão e a fé. O nome do Salvador, em

hebraico, é Jehoshuà, que quer dizer “Javé é salvação” ou “Deus que salva”.

Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, ele recebeu o poder
sobre seus ombros, e lhe foi dado este: Conselheiro-maravilhoso, Deus-forte,
Pai-eterno, Príncipe-da-paz, para que se multiplique o poder, assegurando o
estabelecimento de uma paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu
reino, firmando-o consolidando-o sobre o direito e sobre a justiça. Desde
agora e para sempre, o amor ciumento de Iahveh dos Exércitos fará isto.
(ISAIAS, 9, 5-6).

As mensagens das Sagradas Escrituras espalham-se por todo o

Oriente, tanto em língua oficial, o hebraico, como em aramaico, que predominava

entre as classes populares. Dessa maneira o judaísmo fixou-se e expandiu-se. Um

fator que fortalecia o poder do Messias entre os hebreus, é que ele viria somente

para os hebreus e não para o resto do mundo, razão pela qual essa religião fosse

aceita na Palestina, ainda que pudesse ameaçar a estrutura econômica vigente. Em

face da ansiedade da espera, muitas pessoas reivindicavam a identidade de

Messias, saindo em peregrinações para pregar palavras de fé e salvação.

Segundo Flávio Josefo: ‘Em outros povos, outros critérios permitem

determinar a nobreza. Entre nós, em compensação, é a posse do sacerdócio que é

prova de origem ilustre’ (MORIN, 1988, p. 75).

A classificação social, em função dessa pureza de origem, é elaborada

por Hillel, escriba que vivia no tempo de Herodes, o Grande, cuja escola tinha
15

grande influência, na época do ministério público de Jesus. A população era

distribuída em três grupos, ou seja, a pirâmide social interna de Israel era assim:

a) O Israel puro – composto pelos sacerdotes e pelos levitas1;

b) Famílias ilegítimas atingidas por uma mancha leve – composto pelos

descendentes ilegítimos de sacerdotes, prosélitos2 e escravos pagãos libertos;

c) Famílias atingidas por uma mancha grave – são os bastardos, os escravos do

templo e os filhos de pai desconhecido e as crianças expostas, considerados o lixo

da comunidade.

Além destes três grupos, havia a população estrangeira, ou seja, os

escravos pagãos, pouco numerosos, pois custavam caro; e os samaritanos, que

embora considerassem o Pentateuco como a Escritura Sagrada no século I,

estavam completamente excluídos da comunidade judaica, pois eram considerados

desde o berço, como impuros, em último grau. Veja o que o apóstolo Paulo,

considerado o apóstolo dos pagãos, escreveu a respeito aos romanos:

A ira de Deus se manifesta do céu contra toda impiedade e injustiça dos


homens, que com a injustiça sufocam a verdade. Pois aquilo que é possível
conhecer de Deus foi manifestado aos homens; e foi o próprio Deus quem o
manifestou. De fato, desde a criação do mundo, as perfeições invisíveis de
Deus, tais como o seu poder eterno e sua divindade, podem ser
contempladas, através da inteligência, nas obras que ele realizou. Os
homens, portanto, não têm desculpa, porque, embora conhecendo a Deus,
não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças. Pelo contrário,
perderam-se em raciocínios vazios, e sua mente ficou obscurecida.
Pretendendo ser sábios, tornaram-se tolos, trocando a glória do Deus imortal
por estátuas de homem mortal, de pássaros, animais e répteis. Foi por isso
que Deus os entregou, conforme os desejos do coração deles, à impureza
com que desonram seus próprios corpos. Eles trocaram a verdade de Deus
pela mentira, e adoraram e serviram à criatura em lugar do Criador, que é
bendito para sempre. Amém. Por isso, Deus entregou os homens a paixões
vergonhosas: suas mulheres mudaram a relação natural em relação contra a
natureza. Os homens fizeram o mesmo: deixaram a relação natural com a
mulher e arderam de paixão uns com os outros, cometendo atos torpes entre
si, recebendo dessa maneira em si próprios a paga pela sua aberração. Os

1
Eles se julgavam descendentes de Levi, enquanto os sacerdotes se ufanavam da descendência de
Aarão.
2
Os prosélitos eram pagãos totalmente convertidos ao judaísmo e que aceitavam a circuncisão
16

homens desprezaram o conhecimento de Deus; por isso, Deus os abandonou


ao sabor de uma mente incapaz de julgar. Desse modo, eles fazem o que
não deveriam fazer: estão cheios de todo tipo de injustiça, perversidade,
avidez e malícia; cheios de inveja, homicídio, rixas, fraudes e malvadezas;
são difamadores, caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, soberbos,
fanfarrões, engenhosos no mal, rebeldes para com os pais, insensatos,
desleais, gente sem coração e sem misericórdia. E apesar de conhecerem o
julgamento de Deus, que considera digno de morte quem pratica tais coisas,
eles não só as cometem, mas também aprovam quem se comporta assim.
(Rm 1, 18-32)

Falando um pouco das estruturas políticas da sociedade judaica, é

preciso não esquecer que o modelo organizacional da sociedade, na Palestina

ocupada pelos romanos, permanece real e, mesmo, imperial. A ordem fiscal, a

ordem pública, o direito e a justiça constituem os três setores básicos em que o

poder é exercido.

Herodes, o Grande (37-4 a.C.), tinha implantado um regime de terror

fiscal. No ano 6 depois de Cristo, quando seu filho Arquelau foi deposto, o judaísmo

da palestina trocou um poder opressor por outro, pois o primeiro ato da nova

administração foi ordenar um recenseamento geral de pessoas e bens. A

administração fiscal dos romanos se revelou de grande criatividade para descobrir

novos objetivos sujeitos a taxas regulares e extraordinárias. Um século depois da

queda de Jerusalém em 70 d.C., Caius Pescennius Niger Justus, pretenso

imperador romano, declarou aos palestinenses chorosos: ‘Em verdade, se

dependesse só de mim, eu cobraria imposto do ar que vocês respiram’ (Baron). Na

Palestina, os impostos romanos não eram mais pesados que em outros lugares,

mas eram particularmente irritantes para os judeus. Os impostos romanos eram

cobrados da seguinte maneira: o imposto de terra que atingia todos os produtores,

devendo ser pago “in natura” e se elevava até 20 a 25% da produção. O imposto

pessoal proporcional à situação econômica de cada um. Estes dois eram os


17

impostos diretos. Havia ainda os impostos indiretos, como; direitos de alfândega,

impostos de barreira em certas pontes, em certas encruzilhadas de grandes

estradas, nas entradas de cidades e mercados. Plínio lembra estas barreiras fiscais:

Ao longo de toda estrada, eles (os transportadores de incenso da Arábia) não


cessavam de pagar, aqui pela água, acolá pela forragem ou despesas de
hospedagem nas pousadas e nas diversas barreiras. As despesas chegavam
a 688 denários1 por camelo, antes de se chegar à costa do Mediterrâneo.
(MORIN, 1988, p. 34)

Além dos impostos romanos, havia também os impostos judaicos. Os

rabis especificavam 24 tipos de tributos a título religioso. O templo tinha grande

importância econômica. Depois do exílio, pouco a pouco, o poder da aristocracia

sacerdotal substituiu o poder real, mas não modificou o modo de produção da

Palestina. Tudo, no templo, desfrutava de considerável sacralização. As receitas,

como por exemplo, a didracma2, os dízimos, os resultados do comércio de animais

consagrados ao altar, as ofertas regulares, os donativos de peregrinos vindos de

todo o mundo romano. As despesas, como: renda dos chefes dos sacerdotes,

gastos com o culto público, os pagamentos pelos trabalhos no templo e as despesas

públicas com a beneficência. Segundo Flavio Josefo, o tesouro do templo sempre

suscitou a cobiça dos conquistadores. Este poder econômico se justificava por ser o

templo o lugar privilegiado da presença de Deus em seu povo. O símbolo deste

comprometimento é a enorme quantidade de ouro que entrou na decoração do

edifício. A propósito da ruína da cidade Santa, no ano 70 d.C., J. Jeremias escreve:

1
Denário: moeda romana que valia dez asses (moeda romana de cobre)
2
Dracma: moeda e peso da Grécia antiga. Didracma: equivante a duas vezes a Dracma.
18

O ouro era tão abundante, em Jerusalém e, especialmente, no templo que


depois da tomada da cidade, uma imensa oferta de ouro inundou toda a
Província da Síria. Resultou disso, no dizer de Josefo, que aí se vendia a libra
de ouro pela metade de seu antigo preço. (MORIN, 1988, p. 40)

A ordem pública era assegurada, internamente, pelos romanos, mas

deixavam iniciativa à polícia judaica do templo para questões ordinárias entre os

judeus. As legiões romanas estacionavam na Síria. Na Palestina havia cinco

coortes3 de infantaria e uma ala de cavalaria: cerca de 3.000 homens, porém o

grosso da tropa residia em Cesaréia, onde morava o próprio governador. Em

Jerusalém, entre 44 e 46 antes de Cristo, havia uma coorte comandada por um

tribuno romano. Na Galiléia, Herodes Antipas tinha poucas tropas e, provavelmente,

estrangeiras, como no tempo de Herodes, o Grande, seu pai. Roma tentava

controlar as suscetibilidades judaicas, especialmente a religiosa, através dos

governadores, delegados do imperador, mas a lei judaica não era outra que a Lei de

Moisés, considerada como recebida de Javé, no Sinai, para todos os israelitas. Os

fariseus acrescentavam à Lei a Tradição oral de seus escribas. As questões internas

do judaísmo eram, portanto, tratadas sob a autoridade bastante direta do Sinédrio

de Jerusalém. O Sinédrio se compunha de 71 membros, entre eles, os chefes dos

sacerdotes, dos anciãos ou representantes da aristocracia leiga, dos escribas ou

representantes da aristocracia intelectual. A assembléia era presidida pelo sumo

sacerdote. A competência do Sinédrio, diminuída sob Herodes, o Grande, foi mais

ampla sob os governadores. Roma admitia a competência desta assembléia para

todos os judeus do mundo. Na Judéia, ocupava-se, principalmente, das relações

com o poder romano: ver, por exemplo, a processo de Jesus e de Paulo. Ocupava-

se, também, da entrada em Jerusalém do imposto do templo e dos dízimos. Cuidava

3
Coorte – gente armada, multidão adepta de alguém. A décima parte de uma legião romana.
19

da interpretação da Lei e, zelava sobretudo pela guarda de seu depósito. Enfim,

funcionava como corte de justiça, e para condenar alguém à morte era preciso reunir

um tribunal de 23 membros, e a sentença de morte só era executada depois de

ratificada pelo representante de Roma, embora haja controvérsias sobre isso, já que

as autoridades romanas, às vezes, fechava os olhos.

De acordo com o testemunho de Flávio Josefo,

...alguns povos colocaram o poder político supremo nas monarquias, nas


oligarquias e outros ainda no povo. Mas, nosso legislador não foi seduzido
por nenhuma dessas formas de governo. Ele deu à sua constituição a forma
que se poderia chamar teocracia. Colocou toda soberania e toda autoridade
nas mãos de Deus.(JOSEFO apud MORIN, p. 105)

O poder político judaico no tempo de Jesus, tinha sua origem no

templo. Certo que a Judéia estava ocupada pela força militar romana, e Pilatos, o

governador, representava o imperador Tibério, porém, os romanos costumavam

respeitar a organização interna dos países ocupados, e no caso dos judeus mais

ainda, já que eram bastante radicais em seu modo de vida. O templo, então, com

seu mais alto funcionário, o sumo sacerdote, permanecia como sede do Estado

judaico. Todos os israelitas, 600 a 700 mil na Palestina; 6 a 7 milhões no império

romano, dependiam da legislação de Jerusalém. Mas, como se escolhia o sumo

sacerdote? Na época herodiana e romana, o princípio da hereditariedade para

atribuição desta alta função, em parte, fora abandonado. Os sumos sacerdotes

foram tirados de famílias sacerdotais comuns. Rivalidades, nepotismo, intervenções

do poder romano decidiam a escolha. A família de Anás foi particularmente hábil,

por suas intrigas, para conseguir ocupar o posto durante 50 anos. Vários de seus
20

membros, entre os quais o famoso Caifás (18 a 36 dC) ocuparam o cargo. Deus

governava, pois, de muito longe, esta teocracia.

Apesar de ocupar um papel central e importante na vida do povo

hebreu, a religião não era vista da mesma maneira por todos os judeus, distinguindo

assim alguns grupos, como:

a) Fariseus – um dos grupos mais conhecidos, que seguia rigidamente as

palavras das Antigas Escrituras. Acreditam na onipotência de Deus e na chegada do

redentor.

b) Saduceus – eram um grupo menor, porém, mais ricos que os demais.

Seguiam somente as leis da Bíblia hebraica, em especial o Pentateuco, e não

aceitavam novidades religiosas. Como participavam da elite sacerdotal, eram muito

influentes na sociedade.

c) Zelotas – podem ser considerados os mais radicais da sociedade judaica,

uma vez que tratavam a questão religiosa com a determinação de quem abraça a

vida militar.

d) Essênios – tinham um modo de vida bastante tranqüilo, formando uma

comunidade monástica assentada na região de Qumrãn. Eram um grupo muito

fechado e consideravam-se o exército santo de Deus.

Apesar dos conflitos entre esses grupos, havia um ponto em comum

entre eles; a freqüência ao templo de Jerusalém, onde resolviam questões

administrativas, econômicas, religiosas e jurídicas., e também a religião judaica era

um grande elo de união entre os hebreus, por causa da profecia da vinda do

Messias, servindo também como ponto de esperança entre os mais pobres, que não

se rebelavam com a situação de desigualdade.


21

1.2 DO OUTRO LADO DO MUNDO

Deixemos um pouco, por ora, a vida da palestina, para saber o que

estava acontecendo do lado ocidental do mundo. Na época, vigorava o domínio do

Império Romano no Ocidente. A sociedade romana não apresentava muitos grupos

sociais, não adorava um Deus específico e não tinha regras como as que

orientavam os hebreus. No campo religioso predominava o paganismo, que permitia

a crença de diferentes deuses, sendo que o único elemento que unia os indivíduos

era a devoção ao imperador.

Por que apresentar o perfil da sociedade romana antes do prosseguir

com a história da religião judaica na Palestina? Para apontar as causas que levaram

os caminhos dessa religião a se cruzarem com os do domínio romano.

Ao longo dos séculos V a.C. a V d.C., antes de se tornar o grande

Império Romano, Roma foi, sucessivamente, uma monarquia, um república e um

império militar. O sistema militar romano durou de I a.C. a IV d.C., que dispondo de

um forte exército e uma população acalentada por espetáculos públicos, o Império

Romano lançou-se à expansão territorial, e no seu trajeto estava a Palestina, região

promissora por causa do comércio, já citado anteriormente neste trabalho.

Sob o comando de Otávio Augusto, no século I a.C., a Palestina foi

invadida, e seu território divido em regiões governadas cada qual por um

governador. Nas cidades de Judéia e Samaria, o governo era de Pôncio Pilatos e o

controle geral do território conquistado foi delegado a Herodes.

Naturalmente a vida dos hebreus alterou-se drasticamente. Houve

certa liberdade para que eles mantivessem seus costumes, mas em alguns casos,

os romanos impuseram seu modo de vida à população dominada, imbuídos das


22

influências gregas disseminadas por Alexandre Magno. Assim, embora o exercício

da religião judaica fosse permitido, o culto aos imperadores passou a ser obrigatório.

Cada grupo judeu reagiu de uma maneira diferente à dominação cultural. Os

Saduceus aceitaram o processo de helenização para evitar o extermínio de todo o

povo. Os Fariseus não aceitavam a presença dos romanos, e os Zelotas assumiram

uma postura ainda mais radical, apontando levantes armados como a solução para

escapar do domínio romano. Em pouco tempo, a situação estava altamente

conflituosa, e viria a se agravar quando da chegada do tão esperado Messias.

Os governadores romanos na Palestina conheciam a profecia da vinda

do Messias e sabiam do impacto que esse evento exerceria sobre a sociedade

judaica, se ocorresse.
23

2 AS SEITAS MESSIÂNICAS

O messianismo é a crença no caráter salvador e redentor de um

personagem que aparecerá no futuro, designado por messias, palavra que, no

antigo Testamento, significava inicialmente “o ungido” em geral. No judaísmo

intertestamentário, o termo ganha o sentido de “ungido” por excelência, identificado

como o futuro rei da casa de Davi, prometido por Deus, predito pelos profetas e

esperado pelo povo, que libertará do jugo estrangeiro, restaurando a antiga glória de

Israel.

O Cristianismo está relacionado de maneira estreita com esse

conceito; porém, enquanto para a tradição judaica o Messias ainda é esperado, para

a tradição cristã já se manifestou como Jesus de Nazaré, sendo todos os outros

personagens messiânicos considerados falsos messias.

Na tradição rabínica, entre o séc. II a.C. e o séc. II d.C., é construído

um conceito de messias que se conserva até hoje, ou seja, um redentor humano

para Israel, eleito por Deus e, por meio de Israel, para toda a humanidade. Um

mensageiro de Deus e instrumento humano de sua vontade, que libertará Israel de

sofrimentos, humilhação e opressão seculares, vindo da linhagem de Moisés, como

o maior de todos os profetas.

Vale lembrar que o povo judeu, desde o tempo de sua volta do exílio

babilônico (586-539 a.C.), fora condenado à existência de pequena nação numa

terra distante e pobre, se tornado uma comunidade religiosa, reunida em torno do

Templo de Jerusalém e privado de sua independência política, depois de uma série

de dominações estrangeiras. Graças à sua religião conseguira isolar-se das

potências estrangeiras, resistindo à influência de suas culturas e religiões.


24

Com efeito, o povo judeu não procura sua realização da mesma

maneira que os outros povos da terra. A Aliança e a condição de povo eleito por

Javé, um povo santo, que foi separado deste mundo, de seus interesses e ideais, e

cujo centro de existência encontra em Javé, determinam-lhe a vida.

Assim, o povo hebreu, durante séculos, subjugado por impérios

opressores, possuía uma grande e consoladora esperança: a da redenção, por um

Messias divino anunciado insistentemente por todos os grandes profetas, desde a

mais remota antiguidade judaica. O exílio marca profundamente a alma dos judeus.

Sua humilhação aumenta com o domínio estrangeiro e a esperança numa

intervenção direta de Deus – através do Messias prometido – torna-se obsessão,

visão utópica ou escatológica.(4) Nesse sentido, os profetas exerceram papel

relevante, mas, também, às vezes desconcertante, anunciando o abandono de Deus

e a destruição, cada vez que o povo judeu desobedecia a Ele ou ia em busca de

outros deuses. Institucionalizou-se a crença na retribuição divina – uma

recompensa, porém, de caráter essencialmente político, de obediência à Lei,

obrigação permanente, regulamentada pelos escribas5.

Acostumados à estrita fidelidade à letra dos textos imemorais, os

intérpretes dos livros santos, somente poderiam imaginar um Messias político, que

libertasse Israel do jugo romano e estabelecesse, em todo o seu explendor, a

pujança do povo de Deus. A imagem desse Messias poderoso e invencível não

podia conferir com a realidade do pobre carpinteiro que nem mesmo dava

importância às tradições da raça. Além do mais, e para encerrar qualquer debate

sobre a autenticidade do Messias, bastava dizer que o carpinteiro morrera

crucificado, morte infamante e ignominiosa. Todos pensavam numa figura

4
Escatologia: Doutrina que cuida do destino do universo e do homem após a morte.
5
Escriba: Pessoa que, entre os judeus, lia e interpretava as leis.
25

carismática que mudasse o rumo da História num segundo, ao sopro de sua vontade

poderosíssima, para ocupar o trono do mundo, no exercício de um poder temporal

incontestável, com sede em Jerusalém, a mais sagrada das cidades. Todos os

gentios6 seriam submetidos a Israel, aceitariam Javé e obedeceriam à Torá7. Daí em

diante, a paz se instalaria na terra fértil e abundante para sempre.

Feita esta breve explanação a respeito da expectativa do povo judeu

em relação à vinda do Messias, vamos nos deter nas principais correntes

messiânicas que precederam e/ou deram origem ao Cristianismo. O judaísmo se

diversificava ao tempo de Jesus em quatro seitas, às quais é preciso atentar para

melhor compreensão da fundação do cristianismo: saduceus (conservadores);

fariseus (nacionalistas e reformistas moderados); zelotas (ativistas, subversivos,

guerrilheiros) e essênios (escatologistas, celibatários, rurais). Estas seitas já foram

mencionadas neste trabalho, em sua introdução, porém vamos nos deter em uma

análise mais profunda para entendermos a partir de qual delas poderia ter surgido o

Cristianismo.

Flávio Josefo reduzia as seitas messiânicas a apenas três,

considerando que os zelotas eram apenas ativistas, arrolando seu membros entre

as demais seitas. Dizia ele: “Havia entre os judeus apenas três gêneros de filosofia:

um era seguido pelos fariseus, outro pelos saduceus e o terceiro, que todos pensam

ser o mais aprovado, era o dos essênios, judeus naturais, porém muito unidos pelo

amor e amizade” (Guerra Judaica, II, 7).

Da luta nacionalista, com inspiração messianista, resultou a divisão dos

judeus em seitas. Vejamos:

6
Gentio: Aquele que professa a religião pagã; idólatra.
7
Tora: O Pentateuco, denominação grega dada aos primeiros cinco livros da Bíblia, atribuídos a Moisés.
26

2.1 OS SADUCEUS E O CRISTIANISMO

Os saduceus tomam o nome possivelmente de Sadoq, sumo-sacerdote

do tempo de Davi, em cima do qual os saduceus queriam se perpetuar. Nos

documentos do Mar Morto reencontrados em 1947 fala-se de “Filhos de Sadoc”

Segundo Hoornaert, os saduceus eram um grupo composto de

sacerdotes que não aceitavam a Tora oral, ou seja, a livre interpretação da Bíblia

praticada pelos fariseus, seus inimigos. (HOORNAERT, 1994, p. 58).

Não eram os saduceus uma seita organizada e definida, nem muito

numerosa, razão pela qual, não podiam alcançar a extensão de massa popular. Era

uma classe social, ou seja, a dominante, rica, mentalmente evoluída e ajustada ao

desenvolvimento helênico. Eles controlavam diretamente o Templo, o culto divino e

as finanças do Templo, uma das maiores fontes de poder na Palestina.

Identificavam religião e culto, segundo Hoornaert, e não davam valor a certos

conceitos religiosos transmitidos pela Tora oral, como a ressurreição dos mortos ou

o reino de Deus a ser estabelecido na Terra. (HOORNAERT, 1994, p. 61)

Do ponto de vista político, eram pacifistas, mesmo porque não tinham

razões ideológicas profundas de oposição ao espírito helênico-romano. Tinham a

visão ampla do homem cosmopolita, pois tinham já há tempos superado os

conceitos de Estado-cidade.

O espírito não messianista dos saduceus permitiu que fossem ao

mesmo tempo capazes de abertura para o helenismo. Conserva como inspirados

apenas os livros da Lei (Torá) e não os Profetas. Como conseqüência disso,

conservam o judaísmo vago, como veio até os tempos de Davi, ou até o final do

reino em 487 a.C.. Os acrescentamentos posteriores, mais especializantes como a


27

ressurreição, vida futura, anjos, culto de ritual muito rigoroso, etc., são rejeitados,

visto que não procedem de Moisés, facilitando aos saduceus a acomodação com a

modernidade helenística.

O conceito saduceu de Deus é mais filosófico, ou metafísico, que o das

seitas inovadoras. Deus seria pessoa distante e de raras interferências no mundo,

contrastando com a concepção de Jesus a respeito de Deus, mais antropomorfista,

na descrição dos evangelistas. Deus é o Pai ao modo familiar, cheio de solicitude e

carinho, persuasivo para reconduzir o pecador, irado e disposto para cobrar justiça,

castigando severamente aos maus, e cumulando de bem-aventuranças os bons.

A idéia messiânica dos saduceus é igualmente comedida ou mesmo

inexistente, porque não tem o sentido de salvador do povo, como a pregava as

outras seitas. O povo que não era saduceu, sendo a maioria, via com escândalo a

acomodação filosófica dos sumos sacerdotes, sendo que eles, com a sua

conceituação moderada de Messias não estimulava a subversão e que nenhum

governo instituído reprimiria e castigaria. Dentro desta mentalidade está coerente a

narrativa de que os saduceus entregaram Jesus a Pilatos, uma vez que era acusado

de subversão, e isso, lhes escapava das mãos.

Ainda que as relações entre os saduceus e o cristianismo sejam de

distanciamento doutrinário, a abertura do cristianismo para o mundo gentio foi

preparada por eles. As doutrinas de elevação espiritual de Jesus se prestam para

uma abertura entre os gentios, cujo caminho aberto pelos saduceus será válvula de

escape para a espiritualidade nova, que será desenvolvida posteriormente.

2.2 OS FARISEUS E O CRISTIANISMO


28

Os fariseus buscavam manter a identidade do judaísmo na fidelidade à

lei e aos profetas, num momento em que a simpatia pelo humanismo helênico

levava muitos a um posicionamento mais liberal. Os fariseus tomaram seu nome da

palavra peroukim, que tem o sentido de separados, definindo-os como separados

dos judeus helenizantes, e portanto, também contrários aos saduceus.

De acordo com Hoornaert:

Trata-se do grupo religioso que detinha a maior autoridade na sociedade civil.


Embora sendo composto em grande parte por sacerdotes, o movimento
fariseu se proclamava leigo e defendia a idéia de que todos, e não só os
sacerdotes, eram chamados à santidade e à fidelidade à Torá.
(HOORNAERT, 1994, p. 60).

O ideal dos fariseus era a santidade, pela fiel observância da Lei de

Moisés, dividida em 613 mandamentos, sendo 248 prescrições e 365 proibições.

Como oposição situam-se fora do círculo dos sumos sacerdotes, os

quais dependem diretamente dos governantes. São geralmente leigos, nas funções

de escribas e rabinos. A influência dos fariseus se estendeu especialmente às

sinagogas, modalidade associativa originada nos tempos do cativeiro babilônico, e

agora difundida pelas cidades da Palestina e mundo helênico-romano. Os fariseus

tiveram algumas influências no Sinédrio, o colegiado mais alto do povo judeu.

Muito mais que os saduceus, os fariseus se organizavam em

sociedade, precedida de um noviciado, antes da admissão definitiva, de sorte que

eles tinham a aspecto de uma sociedade, com caráter de escola religiosa, podendo

ter chegado a seis mil membros no tempo de Jesus.

Ainda que os escritos cristãos os descrevam com cores negativas, os

fariseus representam em todas as épocas, uma categoria religiosa de bom nome,


29

que dava a eles ampla influência popular. Encabeçaram os fariseus a oposição a

Jesus, como mostra o trecho bíblico a seguir:

Os pontífices e os fariseus convocaram o Conselho e disseram: “Que


faremos? Este homem multiplica os milagres. Se o deixarmos proceder
assim, todos crerão nele, e os romanos virão e arruinarão a nossa cidade e
toda a nação.” Um deles chamado Caifás, que era o sumo sacerdote daquele
ano, disse-lhes: “Vós não entendeis nada! Nem considerais que vos convém
que morra um só homem pelo povo, e que não pereça toda a nação.” (JOÃO,
11, 47-50).

Jesus tinha os fariseus como hipócritas, conforme mostra o trecho

evangélico seguinte:

Enquanto Jesus falava, pediu-lhe um fariseu que fosse jantar em sua


companhia. Ele entrou e pôs-se à mesa. Admirou-se o fariseu de que ele não
se tivesse lavado antes de comer. Disse-lhe o Senhor: “Vós, fariseus, limpais
o que está por fora do vaso e do prato, mas o vosso interior está cheio de
roubo e maldade! Insensatos! Quem fez o exterior não fez também o
conteúdo? Dai antes em esmola o que possuís, e todas as coisas vos serão
limpas. “Ai de vós, fariseus, que pagais o dízimo da hortelã, da arruda e de
diversas ervas e desprezais a justiça e o amor de Deus. No entanto, era
necessário praticar estas coisas, sem contudo deixar de fazer aquelas outras
coisas. “Ai de vós, fariseus, que gostais das primeiras cadeiras nas sinagogas
e das saudações nas praças públicas! “Ai de vós, que sois como os sepulcros
que não aparecem, e sobre os quais os homens caminham sem o saber.”
(LUCAS, 11, 37-44)

A palavra fariseu tinha vários alcances, pois havia segundo o Talmud 8,

sete tipos de fariseus, dos quais um apenas seria bom. Um certo equilíbrio entre o

severo e o moderado caracterizou o farisaísmo, o que torna difícil o uso dos termos

para qualificar o farisaísmo e avaliá-lo. Referente às doutrinas e às prescrições

morais, herdou o cristianismo muito do farisaísmo, com algumas diferenças

essenciais.

8
Talmud: coleção das leis e tradições rabínicas compiladas em 02 livros pelos doutores hebreus no séc. II.
30

Os fariseus no que se refere à doutrina, admitem os livros sagrados da

Lei (Torá), e também os Profetas, além de valerem das tradições, cujo depósito é o

Talmud por eles criado. Mantiveram os Profetas e as tradições como doutrina, a qual

desenvolveu após o exílio babilônico, onde tiveram contato com os persas e sua

religião, e deles tomaram conhecimento da doutrina sobre os anjos, os demônios, a

ressurreição, incorporando-as ao seu elenco doutrinário, passando-as

posteriormente aos cristãos.

No que concerne às prescrições legais, foram praticadas com rigor

pelos fariseus, como o jejum, a observância do sábado, etc., e também o rigor em

relação às prescrições bíblicas de não contaminação com os gentios, levando as

comunidades judias fora da Palestina a viverem isoladas, em função deste

nacionalismo religioso apregoado nas sinagogas. Em que pese tudo isto, os fariseus

foram mais inovadores que os saduceus, haja vista, que eles procuraram a

conversão dos gentios para o judaísmo, o que neste aspecto, tem muita afinidade

com o cristianismo.

Quando se inicia a pregação cristã fora da Palestina, ela se fez nas

sinagogas, e sempre tiveram um caráter fariseu. O contato com as sinagogas e a

adesão do fariseu Paulo, fizeram o cristianismo muito mais ritualista do que Jesus

poderia imaginar. Os fariseus admitiam alguns aspectos da filosofia helênica, tanto é

que Paulo aparenta ser estóico9, sobretudo em filosofia moral. Não é de se

estranhar que Jesus ataque, sobretudo os fariseus por causa de seu excessivo

formalismo. Ele tinha afinidades com o grupo, por isso mesmo se degladiava com

ele, tanto é que, o uso de formas literárias simples e imaginosas como as parábolas,

por exemplo, eram usadas pelos fariseus e que Jesus também adotou como estilo.

9
Estoicismo: Doutrina filosófica de Zenão (séc. II a.C.) que pretendia tornar o homem insensível a todos os
males físicos e morais.
31

Diz por exemplo o rabino Hillel, do século I a.C.: ‘Aquilo que não queres que te faça,

não faças a outro. Esta é toda a lei e o resto é apenas comentário’. Jesus repetiu o

mesmo pensamento em forma de mandamento: ‘Tudo o que quereis que os outros

vos façam, fazei também por eles; porque esta é a Lei e os Profetas’.(Mateus, 7,

12).

Não podemos dizer que Jesus era fariseu, mas como quase um fariseu

era mestre, ou seja, rabino. Os conhecimentos de Jesus se devem em parte pela

sua inteligência acima do vulgar e em parte pela freqüência às sinagogas, nas quais

se liam e se explicavam as escrituras, função que era exercida de modo especial

pelos fariseus. Daí também as constantes discussões com os fariseus em virtude

das inovações doutrinárias de Jesus.

2.3 OS ZELOTAS E O CRISTIANISMO

A seita dos zelotas seria a ala esquerda do farisaísmo, ativista,

subversiva, guerrilheira, talvez até mesmo terrorista. Não tinha organização definida

e contava com elementos de todos os demais grupos, na medida em que

rivalizavam com as tropas dos procuradores romanos. A simpatia popular crescia

em relação ao movimento nacionalista ativista dos zelotas, solidificando a doutrina

de que o poder maior de Deus dará aos judeus a possibilidade de vitória sobre as

forças romanas. O messianismo foi, portanto, a principal idéia clara dos zelotas. Não

apresentavam como os fariseus, uma doutrina de escola, mas tinham em torno de

uma idéia-força um objetivo. Não faziam oposição direta às demais seitas, mas

julgavam que estas, ao preferirem a paz e a concórdia, seriam coniventes com os

romanos.
32

Em vista do caráter não organizado dos zelotas, ligados apenas a uma

idéia-força messiânica, de onde decorriam suas relações fáceis com os demais

grupos ideológicos, resultava que também poderiam existir cristãos zelotas.

Segundo Hoornaert:

Os zelotes eram movidos por uma profunda inquietação religiosa, associada


a um compromisso não menos sério de ordem social. Eles uniam a religião à
realidade social e política em que viviam. O zelo ardente pelas coisas de
Deus os caracterizava como, aliás, diz o termo “zelote”. Segundo eles, os
Sacerdotes e demais líderes do povo não seguiam o primeiro mandamento
da lei de Deus ao “adorarem” o princípio do poder e permitirem o domínio
estrangeiro sobre o “povo de Deus”. (HOORNAERT, 1994, p. 62).

A origem e o desenvolvimento da seita dos zelotas como partido

político-religioso se encontra nos primeiros anos de quando a Judéia no ano 6 foi

posta sob a administração direta dos procuradores romanos. Foram vários os

procuradores da Judéia, que obedeciam ao governador da Síria, e em virtude da

obrigação de recenseamento e pagamento de impostos, era natural que surgissem

grupos descontentes. Por ocasião de um recenseamento presidido por Quirino no

ano 6 d.C., um certo Judas de Gamala, da Galiléia, auxiliado por um fariseu

chamado Saduque, organizou um levante nacionalista, mas Judas foi morto, assim

como outros também o serão, conforme descrito em Atos: ‘Depois deste levantou-se

Judas, o Galileu, nos dias do recenseamento, e arrastou o povo consigo, mas

também ele pereceu e todos quantos o seguiam foram dispersados’. (Atos, 5, 37).

O descontentamento continuou, outros líderes continuaram a

resistência oculta, consolidando-se desta maneira o partido dos zelotas. Outra

revolução de cunho messiânico foi comandada por Teudas, mas foi sufocada,

conforme Atos: ‘Faz algum tempo apareceu um certo Teudas, que se considerava
33

um grande homem. A ele se associaram cerca de quatrocentos homens: foi morto e

todos os seus partidários foram dispersados e reduzidos a nada.’(ATOS, 5, 36)

Tiago e Simão, filhos de Judas, o Galileu, fomentam uma revolução,

mas são condenados à cruz. A soma desses incidentes tornam o partido dos zelotas

cada vez mais forte e o povo mais sensível ao nacionalismo messiânico. Com

assaltos sistemáticos, saindo de seus refúgios no deserto, alcançam um ativismo

eficiente. Eleazar era o principal chefe zelota. Após ele, surgiu um pregador

exaltado, judeu egípcio, que reuniu mil seguidores no monte das Oliveiras, para

atacar os romanos, porém foram dispersados pela guarnição e cerca de

quatrocentos foram mortos e mais duzentos presos. Grande parte da população,

sobretudo jovens, aderiram definitivamente aos zelotas, formando o partido da

Revolução, onde se firmou a convicção coletiva, de que uma intervenção

extraordinária do poder divino lhes daria a vitória sobre os romanos, em que pese o

grande poderio destes. Este movimento insuflado pelos zelotas – a guerra de 67 a

70 foi um desastre para a nação e mais uma vez a crença no messianismo

fracassava quanto aos resultados.

O estado de luta, no reino messiânico, é em que ocorrem semelhanças

entre zelotas e cristãos, porém com a diferença que para os zelotas a luta é política,

enquanto que para os cristãos se trata também de luta moral, contra o pecado e as

tentações do demônio. Pelo exposto, os zelotas contribuíram para o messianismo

cristão, o qual progressivamente reafirmou a tendência espiritual essênia, desde o

início mais peculiar ao pensamento de Jesus e que a crença na ressurreição de

Jesus também sugere.

Segundo o teólogo protestante Oscar Cullman, a expressão de Jesus:

‘Todos aqueles que vieram antes de mim são ladrões e bandidos’ (JOÃO 10, 8),
34

supõe uma clara alusão aos chefes ativistas zelotas, concebidos como messias,

pelo fato de serem rebeldes, e que psicologicamente um chefe messiânico terrorista

não poderia despertar uma retificação moral. Os zelotas arregimentavam seus

seguidores no proletariado rural e na população flutuante das cidades, que não

tinham nada a perder se nada lhes fosse bem. Já os cristãos tinham entre seus

seguidores uma população menos flutuante e menos disposta ao ativismo

aventureiro. Os zelotas estão presentes no grupo cristão, mesmo tendo Jesus

descrito que seu reino não seria temporal, alguns viam nele a possibilidade de um

líder temporal que os libertaria de Roma. Até mesmo um apóstolo leva o nome de

Simão, o Zelota. (Mt. 10, 4). Há a possibilidade de Judas Oscariotes ter sido um

zelota esclarecido, que percebendo que a direção espiritual de Jesus, dele tivesse

se desviado, além de o entregar aos seus inimigos. Ainda segundo Cullmam o nome

Iscariotes é uma deformação do termo latino sicarius (=sicário), que deriva de sica

(=faca). Para os romanos, sicários eram os terroristas e assaltantes como os

zelotas. Como exemplo disso, coloca-se Barrabás como um zelota preso e que foi

trocado por Jesus no episódio do julgamento deste por Pilatos.

Jesus apresenta alguns indícios de comportamento que o aproxima

dos zelotas, como por exemplo, a expulsão dos vendilhões do templo, a pregação

da libertação dos oprimidos, no episódio da tentação no deserto, a motivação do

demônio era o poder: ‘Todos os reinos do mundo dar-te-ei se prostrado me

adorares’, ‘se és o Messias, converte as pedras em pão’, etc.. São apenas alguns

comportamentos com pontos de aproximação entre zelotas e cristãos, visto que, em

66 os zelotas vão à guerra e os cristãos se declaram neutros, rompendo

definitivamente a possível relação entre eles.


35

No tempo de Cristo, a palavra Messias se assimilava mais aos zelotas,

que eram ativistas e subversivos. Ao canalizar sua liderança numa direção espiritual,

Jesus converteu a idéia de reino, até então entendido como material, em reino

espiritual. Com a derrota dos judeus em 70, vingou definitivamente a idéia de

Messias espiritual, deixando a idéia de religião messiânica para ser chamada de

religião cristã, no entanto deve-se dizer que a idéia vingou em parte, já que para a

maioria dos judeus, o Messias historicamente idealizado é aquele que ainda não

veio.

2.4 OS ESSÊNIOS E O CRISTIANISMO

Os essênios merecem especial atenção no estudo das origens do

cristianismo, pois os primeiros cristãos se confundem com eles, haja vista, que os

documentos cristãos não citam os essênios, assim como os que tratam dos

essênios não citam os cristãos como uma das seitas havidas entre os judeus.

Quem dá informações sobre os essênios é o historiador Flávio Josefo

(Guerra Judaica, livro 2, 7), que os chama de Essene. O filósofo Filon de Alexandria,

os chamou de Essaens. Há algumas referências em Plínio (História Natural) e nos

escritos rabínicos. Mais recentemente foi descoberto em 1947, às margens do Mar

Morto, escritos dos essênios. (Aguilar, 1956).

Os essênios eram uma espécie de monges ascetas10, termo derivado

do sírio khasi (=piedade), no plural, khasem e khasuya,e que pela grecização ficou

essênio.

Hoornaert, escreve:

10
Asceta: do grego asketés - pessoa cuja vida é dedicada à penitência e a contemplação
36

O último movimento que nos faz conhecer a realidade da Palestina religiosa é


o dos essênios ou “piedosos” (hasidim, em hebraico), os eremitas. O
eremitismo sempre exerceu uma certa atração sobre o imaginário humano:
edificar um convento em cima de um rochedo para viver aí na reclusão, na
oração e na penitência fascina as pessoas. Depois das descobertas de 1948
em Qumram, sabemos que também o judaísmo tinha seus monges ou
eremitas. (HOORNAERT, 1994, p.65)

Segundo Flávio Josefo, os essênios surgiram 150 anos a.C., de origem

proletária rural, como os zelotas, chegaram a ter quatro mil membros, e tiveram seu

fim marcado pela destruição da nação judia com a queda de Jerusalém em 70 d.C.,

onde foram dispersados, tendo alguns aderido ao judaísmo farisaico e outros à

igreja cristã. Há a crença de que existiam comunidades essênias na Síria, as quais

teriam se transformado em igrejas cristãs. Os escritos do Mar Morto reforçam a

teoria de que o cristianismo foi um movimento surgido em interação com o

essenismo. Externamente os essênios teriam contato e afinidades com os

pitagóricos11.

Surge no século I a.C. e prossegue nos imediatos um movimento

místico e religioso que leva o nome de neopitagorismo, que é um movimento de

inspiração nova e intensamente religiosa, e envolveu-se com todas as religiões da

época, influenciando sobretudo as novas formas, como os essênios e através destes

o cristianismo. Alguns pontos a serem analisados do neopitagorismo:

a) O dualismo é o ponto de partida: dualismo de espírito e matéria, em que a alma

sente ao mesmo tempo, algo de elevado, mas apegada à matéria, da qual procura

se desprender.

11
Pitagorismo: Conjunto de doutrinas e regras de vida atribuídas a Pitágoras de Samos (séc. VI-V a.
C.), filósofo e matemático grego, e a seus seguidores, os pitagóricos, que, dos sécs. VI ao IV a. C.,
organizados em comunidades filosófico-religiosas multiplicadas pela Magna Grécia, constituíram a
chamada escola itálica ou escola pitagórica. Define-se o pitagorismo por duas tendências: a místico-
moralista, ligada ao orfismo e ao xamanismo, e a filosófico-matemática, de que resultou brilhante
acervo de conhecimentos aritméticos, geométricos, astronômicos e acústicos, integrados pelo
descobrimento de correspondências numéricas entre as várias ordens de realidade.
37

b) Revelação: formula o princípio de autoridade em forma de revelação divina,

passa a ser uma teologia sobrenatural e é invocada como princípio de autoridade

doutrinária. Depois crescerá dentro de outras religiões a teologia da revelação

divina.

c) Purificação pelo sofrimento e pelos ritos: a purificação da alma se processa

pela repressão da sensualidade, e essa purificação é esclarecida pela revelação

divina. O batismo era o principal rito do neopitagorismo, rito que se conserva até

hoje em muitas religiões.

d) Deus: é o lugar das idéias, é uma unidade anterior na qual se situam as idéias,

não sendo reais, como propôs Platão, mas pensamentos apenas, ainda que

protótipos do que se vá criar. Deus é um ser imaterial, transcendente.

Explicado os princípios básicos do neopitagorismo, continuemos a falar

dos essênios e suas influências sobre o cristianismo. Jesus certamente teve um

contato fácil com os essênios, já que existiam em toda a Palestina, e por motivo

familiar, já que João Batista, seu primo tinha indícios claros de ter sido um essênio.

A proximidade com João Batista, deixando-se batizar por ele, sugerem relações com

os essênios, já que era peculiar a eles pregar sobre a penitência dos pecados e usar

o batismo como símbolo de purificação dos mesmos. Jesus teria freqüentado no

deserto uma comunidade essênia, onde fez sua penitência e jejum, costume dos

judeus, mas destacada pelos essênios e onde teria desenvolvido seus

conhecimentos da escritura.

Que peculiaridades seriam comuns entre os essênios e os cristãos?


38

Segundo Evaldo Pauli são as seguintes:

 Os essênios e os cristãos chamavam-se a si mesmos de santos.


 Uns e outros tinham os bens em comum.
 Eram dirigidos por conselhos de doze membros.
 Praticavam a virtude, rejeitando a riqueza e os prazeres.
 Eram celibatários e exerciam o curandeirismo.
 Batizavam.
 Perdoavam pecados
 Supunham ter revelações dos segredos de Deus.
 Os essênios seguiam o calendário litúrgico antigo, não o oficial, de modo
que a Páscoa poderia incidir em qualquer dia da semana. Comiam uma
ceia sagrada em número de doze pessoas sob a presidência de um,
como o fez Jesus com seus apóstolos. Quanto ao número doze, além dos
apóstolos, doze eram os filhos do patriarca Jacó, doze eram as tribos de
Israel, etc..
 Pregavam a justiça, a caridade, céu e o inferno, a ressurreição dos
mortos.
 Tinham um conceito espiritualístico do Messias, como os cristãos.
(PAULI, 1997)

Economicamente os essênios eram organizados de forma comunista,

conforme afirma Flávio Josefo: ‘Os essênios vivem juntos, organizados em

corporações, uniões livres, associações de hospedagem, e se acham usualmente

ocupados de várias tarefas da comunidade.’

De acordo com Filon: ‘O dinheiro, que obtêm por seus vários trabalhos,

o confiam a um fideicomissário eleito, que o recebe e compra com ele o que é

necessário, provendo-os com abundantes alimentos e com tudo o que é preciso

para a vida.’

A comunidade essênia de Qumram era dirigida por um conselho de

doze membros, presidido por três sacerdotes, apresentando aqui, mais uma curiosa

semelhança com os doze apóstolos de Jesus, que tinham, mais próximos dele,

Pedro, Tiago e João. O espírito de partilha de bens da comunidade dos primeiros

cristãos não se deve necessariamente a Jesus, porém atuando sobre eles que já

praticavam, passou a fazer parte do novo grupo. Daí a idéia de que a transformação
39

do judaísmo para o cristianismo, teria ocorrido a partir do essenismo, mais do que

do farisaísmo e dos zelotas, já que as idéias de Jesus e dos essênios eram mais

afins.

Era certo que os essênios praticavam o exorcismo, o perdão dos

pecados e o curandeirismo.

Fazem estudos das Escrituras dos antigos, tirando delas principalmente


aquilo que convém para suas alma e corpos, e portanto, costumam saber a
virtude de muitas ervas, plantas, raízes e pedras, sabem a força de todas e o
investigam com grande diligência (JOSEFO, Guerra Judaica 2, 7).

De novo evoca-se a figura de Jesus e dos primeiros cristãos, quando

se fala em curandeirismo, já que tinham a preocupação com a cura dos doentes. Na

epístola do Apóstolo Tiago há uma recomendação:

Está alguém doente entre vós? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre
ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o
enfermo, e o aliviará o Senhor, e se estiver em pecado ser-lhe-ão perdoados’
(TIAGO, 5, 14-15).

A expressão de Jesus quando acabava de curar um enfermo – “vai

teus pecados te são perdoados” – não deixa de ser um ritual essênio. Quanto aos

rituais, os dos essênios também se assemelham aos dos cristãos. Em relação aos

sacrifícios do templo, divergiam os essênios e os cristãos, em relação aos judeus.

Por exemplo; os essênios praticavam uma cerimônia à parte, com destaque para a

ceia sagrada, com a participação de pelo menos dez pessoas e presidida por um

sacerdote, enquanto que na liturgia judaica a ceia era presidida pelo pai da família.

Também na ceia dos essênios, participavam somente os iniciados, superando a

idéia de família, sugerindo que eram celibatários, e nela se benzia o pão e o vinho,
40

não sendo simples transformação da antiga ceia do cerimonial doméstico da páscoa

judaica.

Outra semelhança entre essênios e cristãos, diz respeito ao calendário

litúrgico oficial do templo de Jerusalém. Os essênios praticavam a ceia da páscoa

em outro dia, e Jesus também teria praticado a chamada Santa Ceia antes da data

oficial. Annie Jeubert, uma erudita católica, procurou demonstrar em livro de farta

documentação que Jesus obedecia ao calendário de Qumram, o qual celebra a

Páscoa na tarde de terça-feira, e que a quinta-feira santa não faz parte da tradição

cristã primitiva.

A expectativa da vinda imediata de um Messias dominava mais os

essênios do que os fariseus, sendo este outro ponto em comum entre essênios e

cristãos, que suspeitavam e depois acreditaram que Jesus era o Messias prometido.

Quanto aos fariseus, basta tomar conhecimento do conselho de um rabino: ‘Se

estás para fazer uma cerca e se, neste momento, te anunciam a chegada do

Messias, termina a tua cerca: terás bastante tempo para ires ao seu encontro’.

Dentro do doutrinário cristão, os essênios já exerciam várias, dentre

elas, imortalidade, céu, inferno, justiça, caridade, ceia, messianismo espiritual. O

celibato era praticado pelos essênios, além da abstinência, banhos frios e outros

rigores. Flávio Josefo diz: ‘Rejeitam os prazeres como um mal, estimando que a

continência e o império sobre as paixões constitui a virtude’.

Vai mais fundo ainda com relação ao celibato dos essênios, quando

diz:

Depreciam o matrimônio, porém adotam crianças estranhas... Não desejam


abolir o matrimônio e a propagação do homem, porém dizem que se deve
estar prevenido da pouca castidade das mulheres, pois não há mulher que
esteja satisfeita com um homem só. (JOSEFO, Guerra Judaica 8. L.2).
41

Outra citação que não deixa dúvida em relação ao assunto: ‘Não

tomam esposa e não tem escravo. Pensam que este último não é justo, e que a

primeira dá lugar a discórdias’. (JOSEFO, Antiguidades Judaicas 18, 1). A

explicação mais detalhada é dada por Filon quando diz: ‘O esposo, encantado pelos

sortilégios de sua esposa ou preocupado com os filhos por necessidade natural, não

mais será o mesmo para os outros, e, pelo seu separatismo, torna-se um escravo e

não um homem livre’. A doutrina essênia sobre o celibato é enfatizada por Jesus,

quando diz: ‘Há aqueles que se fazem de eunucos pelo Reino de Deus. Aquele que

puder compreender que compreenda’. (MATEUS, 19, 12). Paulo apóstolo que

abandonará o farisaísmo em troca do cristianismo é um celibatário e diz: ‘É bom

para o homem não ser tocado por mulher’.

Vejamos algumas normas rígidas do manual de disciplina dos

essênios, dando destaque à modéstia, recato e respeito à autoridade:

 Quem caminhar nu perante o próximo, sem que tal seja necessário, será
castigado com seis meses.
 Quem cuspir no meio da assembléia dos chefes, será punido com trinta
dias.
 Quem tirar a mão de sob o vestuário, quando este se encontrar rasgado,
ao ponto de aparecer sua nudez, será punido com trinta dias.
 Quem rir estupidamente, fazendo ouvir sua voz, será punido com trinta
dias.
 Quem tirar a mão esquerda para gesticular, será punido com dez dias.
 Quem maldizer do seu próximo será privado, durante um ano, da
alimentação sagrada, e será castigado.
 Quem maldizer dos chefes será mandado embora para nunca mais
voltar.
 Aquele que murmurar contra a instituição da comunidade será afastado e
não voltará; e se murmurar, sem razão, do seu próximo, será castigado
com seis meses. (PAULI, 1997)
42

Para os essênios a vida na terra tem pouca importância, o que conta

mesmo é céu e inferno e sobretudo a luta entre ambos, e que terá desfecho com a

vitória definitiva de Deus sobre o mal, e que o sentido da vida consiste em apoiar o

lado do bem.

É nesse pano de fundo dos quatro principais movimentos religiosos

existentes entre os Judeus, descritos por Flávio Josefo, que dá início o projeto de

Jesus, chamado por alguns autores de “o movimento de Jesus” do qual trataremos

no próximo e último capítulo desta pesquisa, falando de seus personagens e de sua

expansão.

3 A EXPANSÃO DO CRISTIANISMO
43

A expansão do Cristianismo primitivo é favorecida pelas estruturas de

comunicação do Império Romano, cuja rede de estradas chegava a 140 mil

quilômetros, pelas rotas marítimas mediterrâneas e pelos rios e canais navegáveis.

A nova fé em geral chega primeiro às cidades, ao passo que o campo, em latim

“Pagus”, continua a ser habitado por pagãos.

A difusão do Cristianismo inicia-se no seio da comunidade judaica de

Jerusalém, escolha arriscada, porém justificada já que os primeiros discípulos de

Jesus acreditavam no seu retorno iminente. Outro fator importante, é que em

Jerusalém a cada festa acorria de toda Palestina peregrinos e os apóstolos podiam

melhor cumprir o que achavam ser sua missão: convencer os judeus devotos de que

Jesus era de fato o Messias, já que a esperança messiânica estava muito

disseminada entre os judeus.

Segundo Aimé Savard:

O relato de Pentecostes, nos atos dos Apóstolos, traduz a ambição


missionária dos companheiros de Jesus. Era a segunda das três grandes
festas judaicas: 50 dias depois da Páscoa, comemorava a entrega das
Tábuas da Lei a Moisés. Na ocasião os judeus piedosos, oriundos de todas
as comunidades da diáspora12, peregrinavam a Jerusalém. O autor de Atos –
Lucas, companheiros de Paulo, também redator do terceiro Evangelho –
conta que esses apóstolos receberam missão do Espírito Santo. (SAVARD,
2005, p. 31)

Mais adiante, Savard assevera que:

Os apóstolos pregavam o que Atos põe na boca de Pedro, o chefe do grupo


inicial dos 12 instituídos por Jesus. Os exegetas consideram esse texto a
síntese da primeira pregação cristã, o querígma13 em linguagem teológica: “A
este Jesus, Deus o ressuscitou, e disso nós todos somos testemunhas.
Portanto, exaltado pela direita de Deus, ele recebeu do Pai o Espírito Santo
prometido e o derramou, e é isto o que vedes e ouvis”. Apoiado em citações,
12
Dispersão dos judeus no decorrer dos séculos por motivos políticos ou religiosos em virtude de perseguição
por dominadores estrangeiros.
13
Do grego kérygma, 'proclamação em alta voz', 'anúncio'. Anúncio da mensagem cristã ao não cristão,
destinado a despertar nele a fé, e a convertê-lo.
44

Pedro mostra que tudo foi anunciado pelos profetas e que, por conseguinte,
Jesus é o Cristo, o equivalente grego, língua em que Atos dos Apóstolos foi
escrito, do termo hebreu “Messias”. E conclui: “Saiba, portanto, com certeza,
toda a casa de Israel: Deus o constituiu Senhor e Cristo, este Jesus a quem
vós crucificastes”. (IBID., p. 31)

Segundo o Atos dos Apóstolos, cerca de 3000 pessoas se

converteram atendendo ao apelo de Pedro que pediu o arrependimento dos

pecados e o batismo como condição para receberem os dons do Espírito Santo.

Depois de Pentecostes, aqueles que tinham abraçado a nova fé se

reuniam e partilhavam tudo o que tinham em favor dos pobres e das viúvas da

comunidade, embora isso já fosse praticado nas sinagogas.

Savard declara que:

Depois da descoberta dos Manuscritos do Mar Morto, percebeu-se que esse


“comunismo cristão primitivo”, como o qualificaram alguns, já era praticado no
mosteiro essênio de Qunran, fundado em pleno deserto, dois séculos antes
da época de Cristo, por sacerdotes que queriam reagir contra a opulência do
alto clero ligado ao Templo de Jerusalém. (IBID., p. 32)

A confirmação da conversão ao cristianismo era através do ritual do

batismo, provavelmente semelhante ao praticado por João Batista no deserto, sendo

este por imersão na água. Em Jerusalém a comunidade cristã passou a se chamar

em grego de ecclesia, ou seja, igreja, que significa reunião, servindo também para

qualificar as reuniões do povo cristão no deserto. O termo igreja depois de alguns

anos serviu para designar o conjunto das comunidades cristãs da diáspora judia que

aceitavam a autoridade da igreja de Jerusalém.

Ninguém teria profetizado que a nova religião duraria muito, visto que,

quando da morte de Jesus, um pequeno grupo de homens pobres e incultos,


45

membros de uma raça oprimida que habitava remota província do Império e

renegados pelos próprios judeus. No entanto, dentro de uma geração após a morte

de Jesus, seus ensinamentos eram conhecidos em todo o mundo mediterrâneo.

Devido à perseguição aos cristãos movida por Saulo, e a morte do

primeiro mártir, Estevão, de acordo com o livro Atos dos Apóstolos, capítulo 7,

versículos de 54 a 60, e capítulo 8, versículos de 1 a 3, o Cristianismo conquista os

judeus dispersos por todo o Império Romano, ganhando as províncias orientais – o

Egito, a Ásia Menor e a Grécia. Ao converter os judeus de Alexandria, Éfeso,

Antioquia, Corinto e outros centros, lança as primeiras bases para se fazer ouvir

pelos pagãos. Até meados do século II d.C., o número de seus seguidores cresce

em Roma, penetra na Gália e no norte da África. Apesar de submetido a duras

perseguições, por parte dos romanos e dos judeus, o Cristianismo adquire, no

decorrer dos séculos II e III, grande força política que se consolida no governo de

Constantino (306-337).

A primeira vez em que os discípulos foram chamados de cristãos foi

em Antioquia, conforme Atos dos Apóstolos, capítulo 11, versículo 26, e cuja

designação os seguidores de Cristo começam a aplicar a si mesmos por volta do

século II.

Mas para falar em expansão do Cristianismo vamos nos deter no

personagem principal desta tarefa árdua, perigosa e, sobretudo corajosa que é

Paulo, assim chamado depois de sua conversão ao Cristianismo, visto que antes era

conhecido como Saulo. Nascido em Tarso da Cilícia pelo início da nossa era Saulo

era de uma família judaica da tribo de Benjamim, mas ao mesmo tempo cidadão

romano, recebeu desde a infância, em Jerusalém, de Gamaliel, séria formação


46

religiosa segundo as doutrinas dos fariseus, defensor radical da Tora, e que ao

tornar-se discípulo de Jesus, pregaria o fim da Lei em seus escritos aos Romanos.

Cuvillier o descreve assim:

Seguro e convencido de sua nova fé, Saulo transformado em Paulo, “o


humilde”, tomou o bastão de peregrino e se fez missionário, percorrendo o
Império Romano: ele passou a ser o verdadeiro promotor do cristianismo.
Finalmente, e mais do que tudo, Paulo teorizava. Sua reflexão sobre o
acontecimento central da fé cristã – a morte e a ressurreição do Cristo - fez
dele o primeiro teólogo e escritor do cristianismo nascente. (CUVILLIER,
2005, p. 38)

A conversão de Saulo se deu por volta dos anos 33 ou 34 d.C., sem a

pregação do evangelho por parte de outro homem, conforme descrito por Paulo em

Gálatas, capítulo I, versículos 11 e 12: “Com efeito, eu vos faço saber, irmãos, que o

evangelho por mim anunciado não é segundo o homem, pois eu não o recebi nem

aprendi de algum homem, mas por revelação de Jesus Cristo”.

A partir desde momento, consagrará toda sua vida ao serviço de Cristo

que o conquistou. Depois de uma temporada na Arábia e do regresso a Damasco,

onde já prega, sobe a Jerusalém por volta do ano 37; depois retira-se para a Síria-

Cilícia, de onde é reconduzido à Antioquia por Barnabé, com o qual ensina.

Na carta aos Gálatas, Paulo apresenta todo seu itinerário de viagens

para pregar o Evangelho de Jesus Cristo.

3.1 A PRIMEIRA VIAGEM MISSIONÁRIA DE PAULO

A primeira viagem de Paulo se deu entre os anos 47 e 49 d.C.,

conforme Atos dos Apóstolos, capítulos 13 e 14. Primeiramente Paulo se

estabeleceu na Arábia, permanecendo por volta de 10 anos, partindo dali em


47

companhia de Barnabé e João Marco na direção oeste, para sua primeira viagem

missionária: Antioquia da Síria, Ilha de Chipre (Salamina e Pafos). Antioquia da

Psídia, Icônio, Listra, Derbe, Perge e Antioquia da Síria; sendo que Marcos

abandonou o grupo voltando à Jerusalém. Pregavam a palavra de Deus nas

sinagogas dos judeus e nas praças públicas, sendo sempre acolhidos por muitas

pessoas. Sempre que deixavam uma cidade onde tinham pregado e fundado um

núcleo cristão, deixavam também um encarregado preparado para continuar a

missão de evangelizar. Muitos gregos, judeus e prosélitos (pagãos que abraçaram o

judaísmo) e mesmo pagãos ouviam Paulo e Barnabé, ficavam admirados com a

pregação a aproximavam, buscando relacionamento com os missionários. Foram

apedrejados diversas vezes, encarcerados e expulsos de muitas localidades, mas a

palavra de Deus ficava no coração de muita gente.

Em 49 d.C., Paulo foi a Jerusalém para participar do que seria o

primeiro concílio apostólico, com o objetivo de resolver questões que estavam

interferindo no êxito da missão de evangelizar, entre elas, a questão sobre o que

deveria ser exigido dos gentios convertidos em relação à observância da lei

mosaica.

3.2 SEGUNDA VIAGEM MISSIONÁRIA DE PAULO

Esta segunda viagem de Paulo aconteceu entre os anos 50 e 52 d.C.,

conforme narração de Atos, capítulos de 15 a 18, em que Paulo percorreu a Síria e

a Cilícia, confirmando as igrejas que cresciam em número de fiéis, exortando-as a

perseverarem na fé. Paulo tinha como companheiro nesta viagem Silas, e em Listra

juntou-se a eles Timóteo, os quais chegaram a Trôade, cidade em que Lucas entrou
48

na equipe de Paulo, e por onde passavam recomendavam a observância dos

decretos dos Apóstolos e dos anciãos de Jerusalém. Dali partiram para a

Macedônia, onde trabalharam intensamente nas cidades de Filipos, Tessalônica,

Beréia, Acaia, e pelos muitos problemas acontecidos ali, Paulo foi forçado a fugir

para Atenas, escoltado por alguns cristãos, ficando Silas e Timóteo, só encontrando

Paulo no dia seguinte em Atenas. Lá Paulo se indignou com o grande número de

ídolos que encontrou pela cidade e pregava na Sinagoga e na Ágora 14 tentando

converter os que a freqüentavam. Alguns filósofos interessados em conhecer a

religião que ele pregava, levaram-no até o Areópago15, e ali, ele falou:

Cidadãos atenienses! Vejo que, sob todos os aspectos, sois os mais


religiosos dos homens. Pois, percorrendo a vossa cidade e observando os
vossos monumentos sagrados, encontrei até um altar com a inscrição: ‘Ao
Deus desconhecido’. Ora bem, o que adorais sem conhecer, isto venho eu
anunciar-vos. (ATOS, 17, 23).

Paulo falou sobre a criação, a bondade de Deus, que somos da graça

de Deus e que não devemos pensar que a divindade seja semelhante ao ouro, à

prata, ou à pedra trabalhada pela mão do homem, porém quando falou da obra do

Filho de Deus em favor da humanidade, que tinha sido crucificado pelos judeus, mas

que tinha ressuscitado para a vida eterna, zombaram dele, pois não acreditavam na

ressurreição dos mortos. Porém, alguns homens aderiram à fé cristã.

De Atenas, Paulo e seus companheiros partiram para Corinto, onde

encontraram um judeu com o nome de Áquila, recém chegado da Itália com sua

esposa, devido ao edito do Imperador Cláudio ordenando o afastamento dos judeus

de Roma. Em Corinto sofreram ferrenha oposição dos judeus que tentaram expulsá-

14
Praça grega antiga onde era o mercado.
15
Sede do Supremo Tribunal de Atenas.
49

los da cidade, mas, mesmo assim permaneceram lá por um ano e meio. De Corinto,

Paulo viajou para Éfeso, Cesaréia e Jerusalém, retornando para Antioquia na Síria.

3.3 TERCEIRA VIAGEM MISSIONÁRIA DE PAULO

Realizada entre os anos de 53 e 58 d.C., conforme Atos, 18, 23 e 21,

17, Paulo percorreu a Galácia e a Frigia, visitando e estimulando as comunidades

cristãs a perseverarem na fé. Partiu daí para Éfeso, onde encontrou alguns

discípulos, impondo-lhes as mãos, batizou-os no Espírito Santo, e eles puderam

falar em línguas e profetizar. Evangelizou por dois anos na região da Ásia, que tem

Éfeso como centro e forma um grupo com sete cidades, as mencionadas sete

igrejas no apocalipse de São João, capítulo 1, versículo 11, ou seja, Èfeso, Ermirna,

Pérgamo, tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodicéia. Dessa forma todos os habitantes

gregos e judeus puderam ouvir a Palavra do Senhor.

Seguindo sua missão, partiu em direção à Macedônia, onde trabalhou

por um bom tempo, partindo depois para a Grécia, onde permaneceu evangelizando

por três meses. De volta para a Macedônia, já com novos companheiros, como

Sópatros, Aristarco, Segundo, Gaio, Tíquico e Trófimo, além de Timóteo,

evangelizaram Trôade e Mileto.

Paulo queria estar em Jerusalém no dia de Pentecostes, razão pela

qual, mandou chamar os anciãos da igreja de Éfeso, para se despedir dos amigos e

irmãos na fé, fazendo um emocionado discurso, já que tinha um presentimento de

que esta seria sua última viagem à Ásia. Disse:

Agora, acorrentado pelo espírito, dirijo-me a Jerusalém, sem saber o que lá


me sucederá. Senão que, de cidade em cidade, o Espírito Santo me adverte
dizendo que me aguardam cadeias e tribulações. Mas de forma alguma
50

considero minha vida preciosa a mim mesmo, contanto que leve a bom termo
a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus: dar testemunho
do Evangelho da graça de Deus. Agora, porém, estou certo de que não mais
vereis minha face, vós todos entre os quais passei proclamando o reino. Eis
porque eu o atesto, hoje, diante de vós: estou puro do sangue de todos, pois
não me esquivei de vos anunciar todo o desígnio de Deus para vós. (ATOS,
20, 22-25)

3.4 VIAGEM DE PAULO A JERUSALÉM

Chegando em Jerusalém Paulo encontrou-se com diversos Apóstolos e

anciãos da comunidade cristã da cidade, na casa de Tiago Menor, onde relatou seu

ministério junto aos gentios. Visitando o Templo, Paulo foi reconhecido por judeus

que viveram na Ásia e que não gostavam dele, dos quais ouviu que era traidor do

povo judeu e pregava contra a lei e o Templo. Arrastaram Paulo para fora do Templo

e bateram nele. Devido a essa agitação Paulo foi algemado e levado à Fortaleza

Antonia, onde ficava o Tribunal Romano, porém pediu ao tribuno que o levava para

falar ao povo das escadarias do tribunal.

Paulo impressionou pela sua retórica, falando em hebraico e lembrou

ao povo que antes de sua conversão, era um fariseu zeloso que perseguia e matava

os cristãos, mas que Jesus o tinha mandado sair de Jerusalém para pregar aos

gentios, enquanto rezava no Templo. Ao ouvir isso o povo se enfureceu e pediu a

morte de Paulo.

Querendo saber de que Paulo era acusado, este foi levado às

autoridades judaicas, porém os judeus prepararam testemunhas falsas para

incriminá-lo. Paulo voltou para a prisão, por ordem do tribuno Cláudio Lísias,

temendo que o matassem, e na prisão, à noite o Senhor e disse-lhe: “Coragem!


51

Assim como prestastes testemunho de mim em Jerusalém, deverás também

testemunhar em Roma”. (ATOS, 23, 11).

3.5 PRISÃO EM CESARÉIA

Como os judeus continuassem a tramar contra a vida do apóstolo, no

ano de 58 foi enviado para Cesaréia para lá ser julgado pelo procurador Antonio

Félix. Ficou preso no pretório de Herodes e continuou sendo incriminado pelo Sumo

Sacerdote Ananias, o advogado Tertulo e alguns anciãos vindos de Jerusalém.

Antonio Félix não achando culpa em Paulo, dispensou os acusadores e o manteve

preso. Após dois anos, Antonio Félix foi substituído por Pórcio Festo, que recebeu

os judeus que insistiam em caluniar Paulo.

Trazendo o Apóstolo em sua presença, Festo fez alguns

questionamentos baseados nas mentiras dos judeus contra ele. Perguntou-lhe se

queria ser enviado à Jerusalém para lá ser julgado, ao que Paulo respondeu:

Estou perante o Tribunal de César, e é aqui que devo ser julgado.


Nenhum crime pratiquei contra os judeus, como tu perfeitamente
reconheces. Mas, se de fato cometi injustiça, ou pratiquei algo que
mereça a morte, não recuso morrer. Se, ao contrário, não há nada
daquilo de que me acusam, ninguém pode entregar-me a eles. Apelo
para César! (ATOS 25, 11-11)

3.6 PAULO ENVIADO À ROMA

No ano 60, o governador Festo enviou Paulo e outros prisioneiros com

destino a Roma, porém a embarcação a tempestade enfrentada entre a Grécia e a

Itália aportaram forçosamente na ilha de Malta, onde permaneceram por noventa


52

dias. Paulo aproveitou para evangelizar o povo, curando doentes da ilha, e quando

partiram os habitantes da ilha os proveram do necessário para a viagem.

Os cristãos de Roma, sabendo da chegada de Paulo, foram ao seu

encontro dando-lhe força para enfrentar a prisão, porém num regime especial de

custódia, as autoridades romanas permitiram-lhe residir numa casa particular, que a

comunidade cristã de Roma alugou. Após dois anos de cativeiro, de 61 a 63, já que

não podia se ausentar da casa, seu processo terminou e ele foi libertado, não

permanecendo em Roma por muito tempo. É provável que tenha viajado para

evangelizar a Espanha, conforme era seu desejo, manifestado em sua Carta aos

Romanos, capítulo 15, versos 24 e 28.

Nero no ano de 64 incendiou Roma e colocou a culpa nos cristãos, e

por isso os perseguiu caçando homens, mulheres e crianças para serem presos e

lançados aos leões na arena do Coliseu Romano. Paulo deixou a Espanha,

percorrendo as Igrejas do Oriente, onde nomeou Tito, bispo de Creta, em Éfeso

nomeou para bispo Timóteo. Quando em Nicópolis, voltou à Roma na primavera de

67 acompanhado por Lucas, empenhado em reconstruir a comunidade cristã

dizimada pelas perseguições do imperador Nero.

Paulo foi preso perto da ilha Tiberina, e ao contrário da primeira prisão

em Roma, era tratado com pesados grilhões e completamente isolado. No

calabouço escreveu sua última carta ao seu discípulo Timóteo, a segunda Epístola a

Timóteo, a quem nomeou executor do seu testamento.

Embora haja controvérsia entre os estudiosos, Paulo teria sofrido o

martírio, tendo sido decepada sua cabeça por um golpe de espada, no mesmo dia

em que Pedro sofreu o martírio.


53

Tendo traçado um panorama da vida e das viagens de Paulo, o

Apóstolo dos gentios, convém fazer um apanhado do que dizem suas Cartas e o

Atos dos Apóstolos sobre ele.

É uma alma apaixonada que se consagra em limites a um ideal.

Trabalhos fadigas, sofrimentos, privações, perigos de morte, prisões, nada lhe

importa, desde que possa cumprir a missão pela qual se sente responsável. O amor

pela causa de Jesus Cristo lhe inspirou imensas e santas ambições: quando

confessa sua solicitude por todas as Igrejas; quando declara haver trabalhado mais

que os outros; quando piedosamente exorta os fiéis a imitá-lo, não por orgulho

humano, mas segundo ele, unicamente pela graça do Criador as grandes coisas

aconteceram por seu intermédio.

A pregação de Paulo é o verdadeiro querígma apostólico. Sua

pregação, embora tenha falado aos gregos e judeus, foi direcionada à conversão

dos pagãos de todas as raças, na linha universalista inaugurada em Antioquia.

Embora as Epístolas de Paulo não sejam Tratados de Teologia, mas resposta e

soluções para situações concretas que ocorriam nas comunidades cristãs que ele

fundou e sabiamente soube orientar, serve para além delas, a todos os fiéis cristãos.

São ensinamentos preciosos e luzes que esclarecem e fundamentam pontos da

doutrina cristã, sobretudo colocando em evidência, o Espírito Santo. A teologia de

Paulo não foi elaborada em cima de tratados de religião e nem construída somente

sobre o acontecimento de sua conversão.

3.7 CONTINUAÇÃO DA EXPANSÃO DO CRISTIANISMO ATÉ O SÉCULO III


54

A Diáspora judaica foi de início a primeira intermediária da mensagem

cristã, haja vista, que Paulo se dirigia em primeiro lugar aos judeus espalhados pelo

império romano. A mensagem de Paulo tocou primeiramente aos que primeiro

aderiram ao judaísmo, para depois chegar aos pagãos. Embora pouco sabemos, os

outros Apóstolos também exerceram atividade missionária, embora fosse Paulo o

grande responsável por ter o Cristianismo se espalhado pelas zonas periféricas do

Mediterrâneo, e avançado pelos mais recônditos lugares do império romano.

A par da missão específica de Paulo e outros apóstolos, outros cristãos

ajudaram a espalhar a mensagem do Evangelho de Jesus Cristo em seu derredor,

como por exemplo, comerciantes, soldados e pregadores, ao longo das estradas do

império.Dessa maneira, até o século II, protegidos pela Pax Romana, o Cristianismo

ganhou raízes em todo o mundo civilizado.

3.8 EXPANSÃO NO ORIENTE

O Oriente era o centro de difusão do Cristianismo. Plínio, o Jovem,

pagão que governou a Bitínia, na Ásia Menor, entre 101 a 113, vai se deparar com

um grande número de cristãos, tanto no seu território como no Ponto, que resolve

consultar o Imperador Trajano, de como se comportar em relação a eles.

“O assunto pareceu-me justificar uma consulta”, escrevia então,


“particularmente em função do elevado número daqueles que
poderiam ser envolvidos num processo. Pois muitas pessoas de
qualquer idade, estado social e sexo estarão em perigo. Esta
superstição contagiante (o Cristianismo) não só contaminou as
cidades, como as aldeias e a planície. É praticamente impossível
suste-la ou remediá-la, uma vez que se pode já verificar que se
começa a visitar, de novo, os templos que estavam quase desertos,
que ressurgem as festividades solenes há muito não praticadas e que
se volta a comprar comida para os animais destinados ao sacrifício,
para o que até agora só raramente se encontrava compradores.
Daqui se pode facilmente concluir quantas pessoas poderiam ser
55

reconduzidas, se lhes fosse dada a oportunidade de conversão.”


(Plínio, epístola 96). FRANZEN, p. 32-33).

Já existiam no século II, cidades com população em sua maioria

cristãos, com extensão da conversão também ao campo. Na segunda metade do

mesmo século II, houve a evolução do montanismo16, na Frigia, para uma espécie

de movimento popular, atingindo todo seu território.

No século III, nem mesmo as perseguições de Diocleciano, impediram

que cidades inteiras se tornassem cristãs, penetrando através da Ásia Menor e da

Síria, na Mesopotâmia. Em Edessa, por exemplo, o rei Abgar se converteu com sua

família ao Cristianismo, e a cidade se transformou num centro missionário por volta

do ano 200. No Eufrates, na cidade de Dura-Europos, foi encontrada a capela cristã

mais antiga conservada até hoje, remontando ao ano de 232, e onde existem

conteúdos bíblicos em seus afrescos.

Há poucas fontes em relação a cristianização do Egito, porém

Alexandria constituiu seu ponto de partida, através de sua escola de teologia, e pelo

fato do bispo Demétrio de Alexandria ter organizado a Igreja egípcia.

3.9 EXPANSÃO NO OCIDENTE

Roma era o centro da Igreja no Ocidente. Em meados do século III, o

papa São Fabião, reorganizou a comunidade urbana romana, provavelmente com

números múltiplos de dez mil em seus membros.

Franzen afirma:

16
Heresia de Montano (séc. II), originário da Frígia, que professava uma encarnação do Espírito Santo
e extremo rigorismo moral.
56

As enormes proporções da comunidade romana surgiam já de tal


forma ameaçadoras ao imperador Décio (249-251), que este terá
afirmado que reagia de forma mais tranqüila e serena face à
sublevação de um rival imperial do que à notícia da eleição de um
novo bispo de Roma (Cipriano, epístola 55, 9). (FRANZEN, p. 34).

Em relação a África, a primeira fonte segura de sua cristianização é o

relato do martírio de Cílio na Numídia por volta de 180, e a partir dos escritos de

Tertuliano em Cartago por volta de 220 podemos concluir um número grande de

cristãos no continente africano. Em Cartago no ano de 220, o bispo Agripino de

Cartago reuniu um sínodo de mais de 70 bispos; vinte anos mais tarde, já eram 90 e

em fins do século III, a predominância nas cidades, eram de cristãos.

Na Gália no século III, cresce o número de comunidades em cidades

como Marselha, Lião, Vienne. Na Germânia, as mais recentes escavações provam a

existência de locais de cultos cristãos em Trier, Colônia, Bona e Augsburgo, datados

do século III.

Concluindo este pequeno histórico da expansão do Cristianismo,

apresentamos números apresentados por Ludwig von Herling, onde ele divide o

império ocidental e o oriental.

Sua conclusão é de que no ano 100 no Ocidente, existiam cerca de

poucos milhares de cristãos; por volta do ano 200, várias dezenas de milhar e no

ano 300, cerca de dois milhões. Já no Oriente, nos primeiros três séculos, não se

pode esboçar vagas suposições, mas afirma que no ano 300 poderiam existir de 5 a

6 milhões de cristãos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
57

O Cristianismo surgiu da junção do misticismo oriental, do

messianismo judeu, do pensamento grego e do universalismo romano. Para

entender o surgimento do Cristianismo, estudamos antes o que os autores chamam

de o Acontecimento-Jesus, situando-o e percebendo-o no aspecto econômico,

social, política e religiosa do mundo judaico do século I. Como eram as estruturas

econômicas, as estruturas familiares, as estruturas sociais em função da pureza de

origem, as estruturas políticas e as estruturas culturais e cultuais, ou seja, religiosas

do tempo em que precede o nascimento de Jesus.

Quando falamos em estrutura, utilizamos para falar de disposição e

organização das coisas. E é estudando essas estruturas do povo judeu, que vamos

perceber com mais clareza a implosão que o Acontecimento-Jesus produziu nesta

sociedade.

Rememorando os assuntos abordados no primeiro ano do curso de

História, que ora concluímos, um assunto muito debatido foi o dos paradigmas. E

num dado momento da explanação do professor de Metodologias do Ensino de

História sobre paradigmas, pensei comigo mesmo, se Jesus Cristo não teria

quebrado todos os paradigmas religiosos até então aceitos pelo povo judeu.

As profecias eram claras em relação a chegada de um Messias, e por

isso mesmo, muitos “messias” surgiram; lunáticos e fanáticos se diziam um deles.

Várias seitas messiânicas existiam, e que acabaram de um modo ou de outro,

servindo de base para o surgimento da filosofia que ganharia o mundo e se

estabeleceria até os dias de hoje.

O Messias esperado por eles tinha conotação política, capaz de libertar

o povo judeu subjugado e cativo, fazendo dele uma grande nação capaz de

enfrentar qualquer império. Além dessa expectativa não ter se concretizado, o


58

Messias recém-chegado, ainda prega o amor aos inimigos, a tolerância, a caridade

sem limites, quebrando inclusive costumes tradicionais do povo, única e

exclusivamente com a intenção de mudar o interior do homem. Exemplos disso,

podemos citar, a cura de doente no sábado que era proibido pela Torá, comer em

casa de pecadores e sem lavar as mãos, dar lugar às mulheres excluídas da

sociedade judaica, dar vez aos doentes com doenças infecto-contagiosas de se

aproximarem dele e receberem a cura, e outras situações que quebravam todas as

regras conhecidas e praticadas pelos judeus.

Esse Cristo que pregava e vivia o amor universal não interessava à

sociedade judaica, razão pela qual foi desprezado, perseguido, preso, humilhado e

condenado à morte mais humilhante conhecida na época; a morte de cruz. O povo

para o qual fora enviado para salvar, condenou-o por afrontar seus costumes e suas

posições privilegiadas exercidas sobremaneira no Templo de Jerusalém.

Porém o Cristianismo se funda, nos ensinamentos de amor ao próximo,

na partilha dos bens, na vida de comunidade, mas, sobretudo na paixão, morte e

ressurreição de Cristo. Foi a partir de sua ressurreição, de sua volta ao Pai e da sua

promessa de enviar o Espírito Santo, que o Cristianismo toma corpo na pessoa dos

apóstolos, que assumem o compromisso de espalhar a Boa Nova a todos os cantos

da terra.

Pelas pesquisas por mim realizadas, em nenhum momento me deparei

com a afirmação de que Jesus teria tido a intenção de fundar uma nova religião. Sua

intenção, pelos escritos bíblicos era levar os homens a olharem para dentro de si

mesmos e perceberem a centelha divina que cada um traz dentro de si. Que a vida

não é só comer, beber, dormir, galgar posições sociais e tudo o mais, mas viver de

uma maneira que inclua o próximo, seja ele de que cor, posição, raça ou filosofia for.
59

Foi acreditando nesses ensinamentos que os Apóstolos partiram em

busca de adeptos para essa filosofia cristã, mesmo que custasse suas vidas, como

aconteceu com a maioria. Foi em Antioquia que o nome Cristão foi utilizado pela

primeira vez, como aqueles que seguiam a Cristo, e embora se questione uma série

de coisas dentro do Cristianismo, o fato concreto é que ele atravessou vinte séculos

e está vivo nos dias atuais em todo o mundo.

O que as pesquisas nos permitem questionar, é que o Cristianismo

vivido hoje, não tem nada a ver com o Cristianismo primitivo. Esta mesma conclusão

levou Gandhi a afirmar ao ler os Evangelhos: “Como pode uma árvore com esta dar

os frutos que conhecemos?” Kalil Gibran Kalil viu metafisicamente numa colina do

Líbano Jesus de Nazaré conversando com o Jesus dos Cristãos, e retirar-se

murmurando: “Não podemos nos entender”.

São conjecturas que nos remete ao Cristianismo dos primeiros tempos,

às primeiras comunidades cristãs descritas em Atos, capítulo 2, versículos 42 a 47,

que diz:

Eles mostravam-se assíduos ao ensinamento dos Apóstolos, à


comunhão fraterna, à fração do pão e às orações. Apossava-se de
todos o temor, pois numerosos eram os prodígios e sinais que se
realizavam por meio dos apóstolos. Todos os que tinham abraçado a
fé reuniam-se e punham tudo em comum: vendiam suas
propriedades e bens, e dividiam-nos entre todos, segundo as
necessidades de cada um. Dia após dia, unânimes, mostravam-se
assíduos no Templo e partiam o pão pelas casas, tomando o
alimento com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e
gozavam da simpatia de todo o povo. E o Senhor acrescentava cada
dia ao seu número os que seriam salvos. (ATOS, 2, 42-47).

Ao provável leitor deste trabalho, deixo os questionamentos que

também me faço:

1 Se Cristianismo vem de Cristo, porque tantos ensinam tantas coisas diferentes em

nome Dele?
60

2 Se Cristo veio para que todos tivessem vida e vida em abundância, por que tantos

mataram e morreram em nome Dele?

3 Se Cristo ensinou que o importante é o interior do homem, por que tantos se

destroem e destroem seu próximo para acumular o que não levarão a lugar

nenhum?

4 Se Cristo é um só, e veio para salvar a todos, por que se disputam fiéis nas Igrejas

ditas cristãs, cada um enaltecendo a sua e desmerecendo a do outro?

5 Se Cristo voltasse hoje à Terra, o que diria aos que falam em nome Dele?

6 E nós que acreditamos que os Judeus mataram o seu Messias, como agiríamos

se Cristo aparecesse e dissesse para nós que veio nos salvar?

O homem tem o poder de criar mitos e o poder de destruí-los. Este

trabalho se encerra, abrindo caminho para pesquisas mais profundas a respeito do

Cristianismo; de seu surgimento, de sua expansão, de sua evolução, enfim de sua

história através dos séculos.

Deixo para reflexão a afirmação de José Carlos Reis, num discurso

teleológico da conquista romana do mundo:

O cristianismo, inicialmente combatido, foi depois reconhecido e


incorporado como religião oficial, pois apoiaria com o sentimento
religioso e o discurso teológico a conquista romana do mundo. Havia
uma aparente tensão entre os projetos de história universal dos
romanos e dos cristãos. Os romanos queriam subjugar politicamente
os povos não-romanos e só encara-los como “humanos” depois de
despojá-los de sua diferença; os cristãos, por serem originariamente
“religiosos orientais”, tinham uma idéia mais radical de “humanidade”:
para eles, a ela também pertenceriam os pagãos, que mereciam
conhecer a Verdade. Essa tensão se dissolveu no curso da conquista
do mundo pelos romanos, que se apresentavam como cristãos e
portadores da Verdade, tendo portanto, o direito divino de subjugar e
catequizar os “pagãos”, que, coincidentemente, eram todos os povos
não-romanos. A Igreja Romana e o Império Romano formaram o
verso e o anverso de uma mesma (e primeira) idéia de “história
universal”, como vontade de potência universal legitimada por um
discurso de salvação da humanidade. (REIS, 2003, p. 19)
61

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBUQUERQUE, Eduardo Basto de, Manual de introdução à História das


Religiões. Laboratório de História das Religiões do Departamento de Historia da
Faculdade de Ciências e Letras da UNESP, Assis/SP, 2005.
62

BURROWS, Millar. Os documentos do Mar Morto, comentários e textos.


Tradução: Irondino Teixeira de Aguilar. Porto, 1956.

CHALLAYE, Félicien. As Grandes Religiões. Tradução de Alcântara Silveira.


São Paulo: IBRASA, 1981.

CULLMAN, Oscar. Conceito cristão de História. IN: Antologia Teológica. Org:


Júlio Andrade Ferreira. Novo Século. São Paulo, 2003.

DUFFY, Eamon. Santos & Pecadores – História dos Papas. Tradução: Luiz
Antonio Araújo. Cosac & Naify Edições Ltda. São Paulo, 1998.

FRANZEN, August. Breve História da Igreja. Tradução: Manuela Ribeiro


Sanches. Org. Remigius Bäumer. Editorial Presença.

História das Religiões – Cristianismo. Companhia dos Livros Editora, 2004.

HOORNAERT, Eduardo. O movimento de Jesus. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.

KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testamento, volume 2: história e


literatura do Cristianismo primitivo. Tradução: Euclides Luiz Calloni. Editora
Paulus: São Paulo, 2005.

MCDOWELL, Josh. Cristianismo: fraude ou fato Histórico. Tradução Neyd


Siqueira. São Paulo: Editora Candeia, 1999.

MEEKS, Wayne A. Os primeiros cristãos urbanos: o mundo social do


apóstolo Paulo. Tradução: I.F.L. Ferreira. Edições Paulinas, São Paulo, 1992

MORIN, Émile. Jesus e as Estruturas de seu tempo. Tradução: Vicente


Ferreira de Souza. São Paulo: Paulus, 1988.

PAULI, Evaldo. Fundação do Cristianismo. Enciclopédia Simpózio, 1997.

THEISSEN, Gerd. Sociologia do Movimento de Jesus. Editora Sinodal. São


Leopoldo-RS, 1989.

FONTES

BARSA, Encyclopaedia Britânica do Brasil Publicações Ltda. Rio de Janeiro –


São Paulo. Volume 6.

BÍBLIA DE JERUSALÉM. Editora Paulus. São Paulo, 2002.


63

GUIMARÃES, Carlos Antonio Fragoso. A Formação do Cristianismo depois de


Jesus. Disponível em: http://www.vivernatural.com.br/filosofias/cris_form.htm.
Acesso em: 22 Janeiro 2007.

História do Cristianismo. Disponível em:


http://www.espirito.com.br/portal/artigos/geae/historia_do_cristianismo_00.htm.
Acesso em: 22 Janeiro 2007.

HISTÓRIA VIVA. Jesus: O Homem e seu tempo. São Paulo: Duetto Editorial;
Grandes Temas História Viva nº. I.

HISTÓRIA VIVA. Os Primeiros Cristãos. São Paulo. Duetto Editorial. Ano II, nº.
17, março, 2005.

Manuscritos de Qumran ou do Mar Morto. http://www.presbiteros.com.br/B


%EDblia/Qumran%201.htm. Acesso em 22/08/2007.

O Apóstolo Paulo. Disponível em


http://www.geocities.com/Athens/Agora/8337/teologia21b.htm. Acesso em
22/08/2007.

RAINHA DA PAZ, Colégio. Roma: da formação ao Império. “Cristianismo –


nascimento e expansão”. Disponível em:
http://www.rainhadapaz.g12.br/projetos/historia. Acesso em: 22 Janeiro 2007.

São Paulo, O Apóstolo dos gentios. Disponível em


http://www.geocities.com/novaes01/index37.htm. Acesso em 22/08/2007.
64

ANEXOS

ANEXO A

Mapa da Palestina no tempo de Jesus


65

ANEXO B

Mapa de Jerusalém no tempo de Jesus


66

ANEXO C

Mapa da primeira viagem missionária de Paulo


67

ANEXO D

Mapa da segunda viagem missionária de Paulo


68

ANEXO E

Mapa da terceira viagem missionária de Paulo


69

Potrebbero piacerti anche