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SÃO CRISTÓVÃO
2007/2
IEDA MARIA MENEZES TOURINHO
SÃO CRISTÓVÃO
2007/2
2
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CDU 659.3::070::316.325::004.738
3
Dedico este trabalho aos amigos,
aos professores e a todos que, de
alguma forma, participaram da
minha vida acadêmica.
4
Agradecimentos
5
A ficção consiste não em fazer ver
o invisível, mas em fazer ver até
que ponto é invisível a
invisibilidade do visível.
Michel Foucault
6
Resumo
A ascensão das Novas Tecnologias de Comunicação provocou grandes mudanças nas relações
sociais por meio da compressão tempo-espaço. Isso significa que, com um clique do mouse,
são estabelecidas relações sociais sem depender do contato real. Uma dessas provas é o Orkut,
site de relacionamento que possui cerca de 15 milhões de usuários. O presente trabalho estuda
as relações de socialidade no Orkut, site mais difundido no Brasil, especificamente na
comunidade Eu leio a Folha de São Paulo, elaborada com o intuito de promover debates
sobre notícias do Brasil e do mundo. A pesquisa foi realizada entre os dias 23 de fevereiro e
04 de março. O intuito foi o de verificar a baixa participação nas enquetes propostas na
comunidade virtual e saber os motivos pelos quais os usuários lêem esse veículo de
comunicação. Conceitos de identidade propostos pelos teóricos Stuart Hall, Michel Maffesoli
e Manuel Castells também foram relacionados ao trabalho. O estudo também procurou
estabelecer interdisciplinaridade com o Jornalismo.
Palavras-Chave: Comunidades virtuais; Orkut; Jornalismo.
Abstract
The rise of New Technologies of Communication has been provoking great changes in social
relationships through time-space compression. It infers that the user can set up social
relationships without keeping a real touch through accessing the World Wide Web. This can
be noticed in Orkut, relationship website which has about 15 million profile users. This paper
is aimed at studying sociality relationships in it, the most spread website in Brazil, specially in
the virtual community Eu leio a Folha de Sao Paulo, which was made up in order to discuss
about news in Brazil and worldwide. This research was carried out from February 23rd to
March 4th with the aim of verifying the low participation in the inquiries and speculating the
reasons why those members read this media. Identity conceptions proposed by Stuart Hall,
Michel Maffesoli and Manuel Castells were applied in this paper. This study has also set up
interdisciplinary in Journalism.
Keywords: Virtual Communities; Orkut; Journalism.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09
CONCLUSÃO 59
BIBLIOGRAFIA 61
ANEXOS 65
ANEXO I – Layout da comunidade Eu leio a Folha de São Paulo 65
ANEXO II – Enquete I – Por que vocês lêem a Folha de São Paulo? 66
ANEXO III – Enquetes – Vocês lêem a Folha impressa, on-line ou duas? 67
ANEXO IV –Entrevista por e-mail com o proprietário da comunidade 68
8
I. Introdução
9
levantar premissas sobre a baixa participação dos membros. Tabelas que variavam desde
gênero dos participantes até número de comunidades auxiliaram nessa fase da pesquisa.
Para a melhor compreensão, foi de fundamental importância no primeiro capítulo,
explicar a relação das Novas Tecnologias da Comunicação (NTICs) com a Indústria Cultural,
as quais podem ser vistas como espaços públicos de desintermediatização e de acessibilidade
porque os usuários compartilham um contexto comum e estabelecem relações
individualizadas.
Outro aspecto abordado é a relação entre modernidade e as NTICs. Nessa parte, são
abordados conceitos de modernidade, segundo Marshall Berman, compressão do tempo-
espaço de David Harvey, relações de desencaixe de Anthony Giddens, aldeia global de
Octavio Ianni, cultura de massa, além de realizar uma breve discussão e contrastar
modernidade tardia x pós-modernidade para justificar a utilização de autores pós-modernos ao
se referir ao ciberespaço. Isso foi feito com o intuito de estudar os aspectos sociológicos da
cibercultura.
Já o segundo capítulo aborda os primórdios da Internet, conceitos de interface cultural.
Em seguida, comunidades virtuais e aspectos antropológicos foram os temas esclarecidos. Foi
necessário recorrer à sociologia e à antropologia para definir comunidade antes de abordar
ciberespaço.
A fim de realizar um estudo completo sobre ciberespaço, a autora teve que remeter aos
aspectos sócio-históricos nas diversas fases, desde a Grécia Antiga até a fase da ubiqüidade
(pós-moderna). Em seguida, o ciberespaço e seus aspectos antropológicos foram retratados,
relacionando com os estudos de cibersocialidade, feitos pelo filosófo francês Michel
Maffesoli. Para tal, foram utilizados gráficos para destacar idades dos membros do site de
relacionamento, interesses, a hegemonia brasileira no Orkut e a discussão real x virtual. A
relação memes e Orkut, estudos sobre capital social foram mencionados no segundo capítulo
para conhecer melhor a linguagem usada nesse site de relacionamento.
Além de conceituar e classificar os tipos de identidade, o último capítulo fará uma
análise da comunidade Eu leio a Folha de São Paulo, levando em conta não só a identidade
cultural, sujeito descentralizado, mas também categorias tradicionais: gênero, raça/etnia, perfil
econômico. Um breve histórico do jornal Folha de São Paulo foi mencionado a fim de
auxiliar a análise de certos aspectos da comunidade.
Um dos desafios desse trabalho foi o de mostrar como funciona uma comunidade
virtual e relacionar Novas Tecnologias da Comunicação, cibersocialidade com os estudos de
10
jornalismo. Espera-se que o estudo seja um estímulo para novos estudos na área de
cibercultura aplicada ao jornalismo.
11
Capítulo I - As NTICs e sua relação com a indústria cultural
1
O paradigma pós-fordista, mais conhecido como modelo japonês, é caracterizado nas estruturas de pequenas
empresas industriais com não mais do que 15 trabalhadores, produtos sofisticados e diferenciados, processos de
trabalho e relações flexíveis, alta capacidade de inovação, tecnologia microeletrônica, homogeneidade cultural.
Disponível em <http://www.simpep.feb.unesp.br/upload/8.pdf>. Acesso em 29 de dez. 2007.
2
Um diagnóstico do sistema de produção do jornalismo nas sociedades contemporâneas revela a existência de
dois tipos diferentes de uso das redes telemáticas. No primeiro, as redes são concebidas como ferramenta auxiliar
para a elaboração de conteúdos para os meios clássicos, ainda abastecidos com métodos clássicos de coleta de
dados, enquanto que, no segundo, todas as etapas do sistema jornalístico de produção - desde a pesquisa e
apuração até a circulação dos conteúdos - estão circunscritas nas fronteiras do ciberespaço (MACHADO, 2003.
Disponível em <http://www.eca.usp.br/pjbr/arquivos/monografia4_d.htm>. Acesso em 10 de nov. 2007).
12
integral de toda atividade humana, todos os processos da existência individual e coletiva são
diretamente moldados por esse novo meio tecnológico.
É informacional porque a produtividade e a competitividade de unidades ou
agentes nessa economia (sejam empresas, regiões ou nações) dependem
basicamente de sua capacidade de gerar, processar e aplicar de forma
eficiente a informação baseada em conhecimentos. É global porque as
principais atividades produtivas, o consumo e a circulação, assim como seus
componentes (capital, trabalho, matéria-prima, administração, informação,
tecnologia e mercados) estão organizados em escala global, diretamente ou
mediante uma rede de conexões entre agentes econômicos. É rede porque a
produtividade é gerada, e a concorrência é feita em uma rede global de
interação entre redes empresariais (...). É a conexão histórica entre a base de
informações/ conhecimentos da economia, seu alcance global, sua forma de
organização em rede e a revolução da tecnologia da informação que cria um
novo sistema econômico distinto (CASTELLS, 2007, p.119).
13
as diferentes formas de vulnerabilidade financeira seriam a conseqüência lógica deste
processo de globalização do mercado. Por outro lado, podem assumir um papel de
coordenação global interempresas, que se tornaria necessária em função da ineficiência dos
sistemas de preços; neste sentido, seu papel semelhante aos das instituições, como o Estado,
seria o de conter a instabilidade provocada pelo jogo do mercado.
Para Bolaño (2007, p. 43-44), a Internet é algo substancialmente distinto de todas as
inovações tecnológicas anteriores no campo da informação e da comunicação, devido ao seu
caráter híbrido. Não se trata de uma nova tecnologia ou de uma nova indústria concorrente
com as anteriores, mas do resultado do desenvolvimento das novas tecnologias e da
interpenetração e expansão global, criando um novo espaço de ação e socialização em âmbito
mundial, a base para a constituição de uma esfera pública global, tão ou mais assimétrica e
excludente quanto aquela no estado liberal burguesa pré-democrático. Castells ao tratar dessa
questão, destaca:
O processo da formação e difusão da internet e das redes de comunicação
mediadas por computadores (CMC) a ela ligadas nos últimos 25 anos
moldou de forma definitiva a estrutura do novo veículo de comunicação na
arquitetura da rede, na cultura de seus usuários e nos padrões reais de
comunicação. A arquitetura da rede é, e continuará sendo aberta sob o ponto
de vista tecnológico, possibilitando amplo acesso público e limitando
seriamente restrições governamentais ou comerciais a esse acesso, embora a
desigualdade social se manifeste de forma poderosa no domínio eletrônico
(...). Por outro, a abertura do sistema também resulta do processo inovador
constante e da livre acessibilidade imposta pelos primeiros hackers de
computadores em seu sentido original e pelas centenas de milhares de
pessoas que ainda usam a rede como hobby (CASTELLS, 2007, p.441).
14
tal, os sistemas de informação e de comunicação permitem definir dois tipos de sistemas
comunicacionais: os sistemas fundadores correspondentes à lógica fordista e os sistemas
ligados as NTICs, referentes à regulação pós-fordista. Herscovici (2007) caracteriza os
primeiros, essencialmente por uma lógica de oferta e por mecanismos de redistribuição de
renda. Já os sistemas ligados às NTIC, ao contrário, geram fortes efeitos de exclusão social e
seu desenvolvimento depende diretamente do peso dado aos diferentes tipos de demanda
solvível, no âmbito de estratégias de segmentação dos mercados.
No entanto os sistemas ligados à cultura de massa podem ser considerados como
espaços públicos “desintermediatizados e acessíveis a todos” pelo fato dos usuários
compartilharem um contexto comum e de estabelecer relações individualizadas. Um exemplo
disso são as comunidades virtuais, interativas pelo fato dos próprios participantes poderem
modificar o contexto no qual atuam. Herscovici esclarece que isso se deve à sua centralidade:
“uma instância central envia mensagens pouco diversificadas para um público homogêneo (a
“massa”) e as capacidades de resposta dessa massa são limitadas” (2007, p.145). Ao
contrário, na World Wide Web, todos os indivíduos são iguais diante das mobilidades de
acesso ao conjunto das informações disponíveis. Assim, “os novos processos de
intermediação (...) resultam dos próprios indivíduos e correspondem (...) às necessidades e aos
interesses destes” (LÉVY,1999 apud HERSCOVICI, 2007, p.145).
É evidente o quanto a vida moderna tem sido influenciada por fatores, como grandes
descobertas nas ciências físicas, as revoluções industriais, as quais geram novas formas de
poder corporativo e lutas de classes. Os sistemas de comunicação de massa também
proporcionam a integração de indivíduos e sociedades com diferentes aspectos culturais. Para
entender as características da vida moderna, deve-se recorrer aos conceitos de modernidade.
15
mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o
que somos. A experiência ambiental da modernidade anula todas as
fronteiras geográficas e raciais, de classe e nacionalidade, de religião e
ideologia: nesse sentido, pode-se dizer que a modernidade une a espécie
humana. Porém, é uma unidade paradoxal, uma unidade de desunidade: ela
nos despeja a todos num turbilhão de permanente desintegração e mudança,
de luta e contradição, de ambigüidade e angústia. Ser moderno é fazer parte
de um universo no qual, como disse Marx, “tudo que é sólido desmancha no
ar” (BERMAN, 1986, p.15).
Uma das relações mais modificadas com o advento da modernidade foi a relação
espaço x tempo, já que dinamiza as interações sociais, antes determinada pelas relações de
parentesco e a comunidade local como lugar desses contatos. Segundo Giddens (1991), a
separação do espaço e do tempo permite o “desencaixe” das relações sociais. O espaço é
assim esvaziado de sua materialidade, definindo-se em relação a outros espaços distantes.
Giddens esclarece dois fatores que caracterizam a modernidade:
O tempo ainda estava conectado com o espaço (e o lugar) até que a
uniformidade de mensuração do tempo pelo relógio correspondeu à
uniformidade na organização social do tempo. Esta mudança coincidiu com
a expansão da modernidade e não foi completada até o corrente século -
século XX. Um de seus principais aspectos é a padronização em escala
mundial dos calendários (...). Um segundo aspecto é a padronização do
tempo através das regiões (1991, p. 26).
16
da quantidade estende-se a todas as atividades, produções culturais, modos
de ser, visões do mundo (2004, p.217).
Harvey (2002) constata que tanto o tempo e o espaço são definidos por intermédio da
organização de práticas sociais fundamentais para a produção de mercadorias. Mas a força
dinâmica da acumulação (e superacumulação) do capital, aliada às condições de luta social,
torna as relações instáveis. Parte da insegurança que assola o capitalismo como formação
social vem dessa instabilidade dos princípios espaciais e temporais em torno dos quais a vida
social poderia ser organizada, quando não ritualizada à feição das sociedades tradicionais.
A experiência da compressão do tempo-espaço é um desafio, um estímulo,
uma tensão e, às vezes, uma profunda perturbação, capaz de provocar, por
isso mesmo, uma diversidade de reações sociais, culturais e políticas. Deve-
se compreender “compressão4” como um termo que se aplica a todo estado
de coisas precedentes (HARVEY, 2002, p.218).
4
Uso a palavra “compressão” por haver fortes indícios de que a história do capitalismo tem se caracterizado pela
aceleração do ritmo da vida, ao mesmo tempo em que venceu as barreiras espaciais em tal grau que por vezes o
mundo parece encolher sobre nós (HARVEY, 2002, p. 219).
17
presente na cena; a “forma visível” do local oculta as relações distanciadas
que determinam sua natureza (GIDDENS,1991, p.27).
18
Com isso, a aldeia global5 está sendo desenhada, tecida, colorida, sonorizada e
movimentada por todo um complexo de elementos díspares, convergentes e contraditórios,
antigos e renovados, novos e desconhecidos. Formam redes de signos, símbolos e linguagens,
envolvendo publicações e emissões, ondas e telecomunicações. Compreendem as relações, os
processos e as estruturas de dominação política e de apropriação econômica que se
desenvolvem além de toda e qualquer fronteira, desterritorializando coisas, gentes e idéias,
realidades e imaginários (IANNI, 2004 p.125).
Harvey frisa que, à medida que o espaço parece encolher numa “aldeia global” de
telecomunicações e numa “espaçonave terra” de interdependências ecológicas e econômicas –
para usar apenas duas imagens conhecidas e corriqueiras – e que os horizontes temporais se
reduzem a um ponto em que só existe o presente (o mundo do esquizofrênico), tempo de
aprender a lidar com um avassalador sentido de compressão dos nossos mundos espacial e
temporal (2002, p.219).
Em relação à aldeia global, McLuhan e Powers (1989) apud Ianni (2004, p.210)
prevêem a idéia de re-modificação da aldeia global, bem como a ampliação das interações
sociais.
Mais e mais pessoas entrarão no mercado de informações, perderão as suas
identidades privadas nesse processo, mas irão emergir com capacidade para
interagir com qualquer pessoa da face do globo. Referendus eletrônicos
massivos e espontâneos atravessarão continentes. O conceito de
nacionalismo declinará e também os governos regionais cairão como
conseqüência política da criação de um governo mundial por satélite
artificial (McLuhan e Powers, 1989 apud Ianni, 2004, p.120).
Dessa maneira, Ianni ressalta o poder da mídia eletrônica nas novas relações de
sociabilidade.
19
passa a desempenhar o singular papel de intelectual orgânico dos centros
mundiais de poder, dos grupos dirigentes das classes dominantes. Ainda que
mediatizada, influenciada, questionada ou assimilada em âmbito local,
nacional e regional, aos poucos essa mídia adquire o caráter de um singular e
insólito intelectual orgânico, articulado às organizações e empresas
transnacionais predominantes nas relações, nos processos e nas estruturas de
dominação política e apropriação econômica que tecem o mundo, em
conformidade com a “nova ordem econômica mundial” ou as novas
geopolíticas regionais e mundiais (IANNI, 2004, p. 121).
Assim, o autor ainda pondera que, da mesma forma que a mídia se globaliza, junto
com a economia e política, a indústria cultural e os meios de comunicação, a eletrônica e a
informática, nessa mesma escala globalizam-se interesses e objetivos, ideologias e visões do
mundo daqueles que detêm meios políticos, econômicos sociais e culturais de mando e
desmando em escala global (IANNI, 2004, p.216).
20
Thompson ainda destaca a influência das NTICs no processo de transmissão cultural,
o qual tornou-se cada vez mais mediado por um conjunto de instituições interessadas na
mercantilização e circulação ampliada das formas simbólicas.
Nas últimas décadas essas instituições se tornaram cada vez mais integradas
em conglomerados de comunicação de grande porte, e a circulação de
formas simbólicas se tornou cada vez mais global. O desenvolvimento das
novas tecnologias de comunicação seguiu e facilitou essas tendências,
enquanto que, ao mesmo tempo, marcava o começo de um novo ponto de
partida importante na história das modalidades de transmissão cultural
(THOMPSON, 1995, p.278).
21
Já a pós-modernidade é definida por Giddens como a trajetória do desenvolvimento
social que está tirando das instituições da modernidade (industrialismo, capitalismo e poder
militar) rumo a um novo e diferente tipo de ordem social. Esse deslocamento seria a
dissolução da modernidade. A noção tempo-espaço do Iluminismo é dissolvida. Ianni (2004)
complementa que as realidades, recorrências, desencontros e descontinuidades são
fragmentados, multiplicando-se os espaços e os tempos imaginários, virtuais, simulacros.
A história é substituída pelo efêmero, pela imagem do instante, pelo lugar
fugidio. Tudo se dissolve no momento presente, imediatamente superado
pela outra imagem, colagem, bricolagem, montagem, mensagem. Assim se
deteriora o passado remoto e imediato. Privilegia-se o dado imediato,
evidente, cotidiano, inesperado, prosaico, surpreendente, fugaz (2004,
p.213).
22
2.1 Breve História da Internet
23
revolução tecno-científica para ter um papel de mediador cultural. Em outras palavras, todas
as manifestações culturais (cinema, livro, galerias de arte) foram inseridas na tela do
computador para que o usuário tivesse acesso. Manovich explica a linguagem da interface
cultural de acordo com os princípios da semiótica:
In semiotic terms, the computer interface acts as code that carries cultural
messages in a variety of media. When you use the Internet, everything you
access – text, music, video, navigable spaces- passes through the interface of
the browser (…). In cultural communication, a code is rarely simply a
neutral transport mechanism; usually it affects the messages transmitted with
its help (…). A code may also provide its own model of the world, its own
logical system, or ideology; subsequent cultural messages or whole
languages created with this code will be limited by its accompanying model,
system, or ideology11 (2001, p.64).
A interface cultural não é apenas transmissora de imagens, mas é interativa. Ela torna
os processos mentais objetivos e externos. Isso é ratificado através do uso de hiperlinks, os
quais concretizam a associação, a reflexão (manifestações dos processos cognitivos) na tela
do computador. Ou seja, o uso de hyperlinks é uma extensão dos processos cognitivos, só que
transferidos para a tela do computador. Enfim, a mídia digital pede-nos que construamos
nossa reflexão, raciocínio, associação. Isso é análogo a clicar em um link ou em uma página
ou em um novo cenário.
As interfaces gráficas são também metáforas e alegorias cognitivas visando
buscar informações (o que chamamos metaforicamente de navegação).
Assim, manipular os ícones gráficos das interfaces revela a essência da
manipulação mágica que está presente no ciberespaço. A manipulação
mágica do mundo como a manipulação de dados no ciberespaço situa-se na
mesma dinâmica (LEMOS, 2004, p. 130).
Vale ressaltar que a linguagem da interface cultural é híbrida, uma vez que existe um
contraponto entre a interface cultural e as formas tradicionais de cultura – o principal deles é o
princípio da padronização, no qual todos os elementos – menus, ícones devem ser os mesmos
em todos os programas. No entanto, uma das características da cultura é a originalidade. Os
objetos são diferentes. Logo, suas respostas também serão.
As interfaces culturais tentam equilibrar a linguagem da fotografia, da pintura, do
cinema com o olhar da interface (painel virtual). Isso cria um dilema, uma vez que os meios
impressos e o cinema vêem a tela do computador como uma simples janela, sem essa função
de interagir com essas manifestações culturais.
11
De acordo com a semiótica, a interface atua como um código que contém mensagens culturais de uma
variedade de mídias. Quando o indivíduo utiliza a internet, tudo que é acessado – texto, música, vídeo, espaços
navegáveis – é ligado através da interface (...). Na comunicação cultural, um código é raramente um transporte
de mecanismo neutro, ele afeta as mensagens que leva (...). Um código pode determinar sua concepção de seu
próprio sistema lógico, ou ideologia. Mensagens subseqüentes ou qualquer linguagem que seja criada, utilizando
esses aspectos, serão limitadas (Tradução da autora).
24
Today the language of cultural interfaces is in its early stage, as was the
cinema a hundred years ago (...). Both the printed word and cinema
eventually achieved stable forms that underwent little change for long
periods of time, in part because of the material investments in their means of
production and distribution. Given that computer language is implemented in
software, potentially it could keep changing forever. But there is one thing
we can be sure of. We are witnessing the emergence of a new cultural
metalanguage, something that will be at least as significant as the printed
word and cinema before it12 (MANOVICH, 2001, p.93).
12
Atualmente, a linguagem das interfaces culturais está em um estágio inicial, semelhante à do cinema há 100
anos atrás (...). A impressão e o cinema alcançaram estabilidade que permitiram poucas mudanças a longo prazo.
Isso ocorreu em parte devido aos investimentos na produção e distribuição. Dado à linguagem computador, um
investimento em software, ela poderia continuar sofrendo mudanças para sempre. Mas deve-se ter certeza de
uma coisa: estamos testemunhando a ascensão de uma nova metalinguagem cultural, algo que será, pelo menos,
significante como o progresso da imprensa e do cinema (Tradução da autora).
25
Com o objetivo de explicar o processo de sociabilidade mediada por computador, é
necessário remeter às definições sociológicas de comunidade de Ferdinand Tönies, Max
Weber e Émile Durkheim.
Para Tönies, a Gemeinschaft (comunidade) relacionava-se ao passado, à aldeia, à
família, isto é, aspectos à chamada pré-modernidade, de acordo com Anthony Giddens. Já a
Gesselschaft (sociedade) representava a frieza, egoísmo - conseqüências relacionadas à
modernidade-. Em outras palavras, a comunidade era considerada solidariedade mecânica 13 e
a sociedade, solidariedade orgânica14.
O sociólogo alemão afirma que a comunidade é dirigida ao passado
(disposição) e a sociedade ao futuro (aspiração). O testamento reflexivo é
um produto de sociedades. Já a comunidade seria um modo orgânico de
produção, de organização social e de pensamento. A comunidade estabelece-
se pelo que ele chama de status e a sociedade, pelo contrato. É importante
insistir que estas categorias não existem em estado puro. Temos relações não
contratuais mesmo em ambientes de trabalho, instituindo o processo
infindável de passagem de estados gregários e societários ou contratuais
(LEMOS, 2004, p.143).
13
Solidariedade mecânica é a junção da consciência coletiva – conjunto de crenças e de sentimentos comuns à
média dos membros de uma mesma sociedade, a qual forma um sistema determinado que tem vida própria - e a
personalidade individual (...). Além do mais, existem relações diversas em que a primeira faz sentir sua ação,
mas ela, por sua vez, criou os laços que ligam o indivíduo ao grupo; e mais, em conseqüência disso, a coesão
social deriva completamente dessa causa e traz a sua marca (DURKHEIM, 1984, p.76-78).
14
Solidariedade orgânica é aquela produzida pela divisão de trabalho e só é possível se cada indivíduo tiver uma
esfera própria de ação e, conseqüentemente, uma personalidade. É preciso, pois, que a consciência coletiva deixe
descoberta uma parte da consciência individual para que se estabeleçam essas funções especiais que ela não pode
regulamentar (DURKHEIM, 1984, p.83).
15
Por ação deve-se entender uma conduta humana (que pode consistir num ato externo ou interno; numa
condição ou numa permissão) sempre que o sujeito ou os sujeitos da ação envolvam-na de um sentido subjetivo.
A “ação social”, portanto, é uma ação em que o sentido indicado por seu sujeito ou sujeitos, refere-se à conduta
de outros, orientando-se por esta em seu desenvolvimento (WEBER, 1992, p.103).
26
Em suma, Recuero (2004) afirma que, para Weber, como para Durkheim, a maior
parte das relações sociais tem em parte o caráter de comunidade, em parte o de sociedade. Em
qualquer comunidade, seria possível encontrar as situações de conflitos e opressão, que, de
acordo com Tönies, não fariam parte da idéia de comunidade. Para Weber, a comunidade só
existiria propriamente, quando sobre uma base de um sentimento de situação comum e de
suas conseqüências, está também situada à ação reciprocamente referida, a qual traduz o
sentimento de formar um todo.
Palácios (1998) apud Recuero (2004) aponta os elementos caracterizadores da
comunidade: o sentimento de pertencimento, a territorialidade, a permanência, a ligação entre
o sentimento de comunidade, caráter corporativo e emergência de um projeto comum e a
existência de formas de comunicação.
O sentimento de pertencimento ou “pertença” seria a noção de que o
indivíduo é parte do todo, coopera para uma finalidade comum com os
demais membros (caráter corporativo, sentimento de comunidade e projeto
comum); a territorialidade, o lócus da comunidade; a permanência, condição
essencial para o estabelecimento das relações sociais (PALÁCIOS, 1998
apud RECUERO, 2004, p.3)
27
Antes de se falar nesse conceito, vale ressaltar que, para se compreender os desafios
do fenômeno tecnológico contemporâneo, devem-se distinguir os conceitos de técnica e de
tecnologia.
Técnica, na sua acepção original e etimológica, vem do grego tekhnè, que
podemos traduzir por arte. A tekhnè compreende as atividades práticas,
desde a elaboração de leis e a habilidade para contar e medir, passando pela
arte do artesão, do médico ou da confecção do pão, até as artes plásticas ou
belas artes, estas últimas consideradas a mais alta expressão da tecnicidade
humana. Tekhnè é um conceito filosófico que visa descrever as artes
práticas, o saber fazer humano em oposição a outro conceito chave, a phusis,
ou o princípio de geração das coisas naturais. Tekhnè e phusis fazem parte de
todo processo de vir a ser, de passagem da ausência à presença, ou daquilo
que os gregos chamam de poiésis (LEMOS, 2004, p.26).
28
Já a fase do conforto dá-se no princípio da modernidade. Com ela, o racionalismo
dessacraliza a natureza e a mente.
A modernidade é a fase da ideologia em substituição à do mito, sendo a
ideologia um discurso que atua como promessa de transformação e controle
da vida social. Poderíamos dizer que essa é a fase do conforto (domínio da
natureza) e de preparação do futuro. A modernidade tecnológica foi
estruturada pela mistura de convicções e sonhos na força racional do
homem, na conquista do espaço, no progresso tecnológico e científico, na
urbanização e na utilização intensiva em energia (LEMOS, 2004, p.52).
29
mágico, caracterizado pela ubiqüidade, pelo tempo real e espaço não-físico
(...). É a encarnação tecnológica do velho sonho de criação de um mundo
paralelo, de uma memória coletiva, do imaginário, dos mitos e símbolos que
perseguem o homem desde os tempos ancestrais (2004, p.128).
Para Santaella,
[O ciberespaço] se refere a um sistema de comunicação eletrônica global
que reúne os humanos e os computadores em uma relação simbiótica que
cresce graças à comunicação interativa. Trata-se, portanto, de um espaço
informacional, no qual os dados são configurados de tal modo que o usuário
pode acessar, movimentar e trocar informações com um incontável números
de usuários (SANTAELLA, 2004 apud OIKAWA e PINTO, 2006, p.34).
2.4.1 Cibersocialidade
31
A socialidade, para o filósofo Michel Maffesoli (2006), é um conjunto de práticas
cotidianas que escapam ao controle social rígido institucional. É a multiplicidade de
experiências coletivas baseadas no ambiente imaginário, passional do cotidiano. Maffesoli
mostra que há momentos de uma sociedade que vai expor uma determinada cultura. O
filósofo toma como exemplo a modernidade. Em outras, como na sociedade contemporânea é
a socialidade. É o não-institucional e o tribal que se sobressai. Assim, a sociedade
contemporânea estabelece que o ser humano aja conforme a situação cotidiana.
Desempenhará papéis, sem ultrapassar os preceitos de uma sociedade racional. Assim, a
socialidade manifestar-se-á em eventos do cotidiano, como agrupamentos urbanos, festas,
rituais.
O termo socialidade foi primeiramente empregado por Maffesoli para definir
os agrupamentos urbanos contemporâneos, festivos e empáticos, baseados
em emoções compartilhadas e em novos tribalismos. Enquanto a
sociabilidade se baseia em agrupamentos que têm a função precisa, objetiva
e racional, a socialidade se estabelece como um politeísmo de valores onde a
pessoa desempenha papéis produzindo máscaras dela mesma, agindo numa
verdadeira teatralidade contemporânea (OIKAWA e PINTO, 2006, p.52).
Maffesoli ressalta que o processo tribal tem influenciado o conjunto das instituições
sociais e é
Em função dos gostos sexuais, das solidariedades de escolas, das relações de
amizade, das preferências filosóficas ou religiosas que vão se constituir as
redes de influência, a camaradagem e outras formas de ajuda mútua das
quais se tratam que constituem o tecido social. “Rede das redes”, (...) onde o
afeto, o sentimento, a emoção sob diversas modulações têm um papel
fundamental (MAFFESOLI, 2006, p. 14).
32
justapõem, onde as atividades se ordenam conforme uma lógica da
separação, mas, antes de tudo, a um espaço onde tudo se conjuga, se
multiplica formando figuras caleidoscópicas de contornos diversificados (...).
A rede de redes apresenta-se como uma arquitetura que só vale pelos
elementos que a compõem (2004, p.142).
A cibercultura é um meio que rompe barreiras geográficas, uma vez que comunidades
diversas podem interagir na Internet. Não existe aquele homem com uma identidade cultural
única, visto que é absorvido por uma cultura planetária, conforme afirma André Lemos.
Assim, o sentimento de aderência é muito marcante, visto que o indivíduo pode navegar de
um lugar a outro.
Em outras palavras, a internet é um local onde se reúnem pessoas de diferentes credos,
todavia os indivíduos absorvem uma cultura planetária, comum a eles. Pode-se afirmar que a
Internet não promove o isolamento social e sim, a construção de redes comunicacionais
através de fóruns, chats. Enfim, é uma retomada às tribos coletivas da época da revolução
neolítica.
33
progressivamente a vida quotidiana e é necessário questionar acerca das
conseqüências dessa nova realidade nas práticas e nas identidades sociais
(SILVA, 2004, p.156-157).
Recuero (2001, p.5-6) aponta que Rheingold não menciona o requisito básico na
definição de comunidade: um agrupamento humano dentro de uma determinada base
territorial.
Este se constitui um dos grandes problemas da aplicação do conceito de
comunidade ao ciberespaço, para a definição da comunidade virtual, que foi
logo apontado por diversos pesquisadores: a ausência de uma base territorial,
até então um dos sustentáculos da idéia de comunidade desenvolvida pela
sociologia clássica.
Alguns autores, tais como (Jones, 1997, Weinrich, 1997 apud Recuero, 2001)
questionam essa definição de comunidades sem levar em conta um local específico. Jones,
1997 apud Recuero 2001, p.6 vê dois usos do termo comunidade virtual: o primeiro (virtual
settlement) é a comunidade virtual dos vários grupos via CMC, como e-mails, MSN
Messenger, Orkut. O segundo seria de comunidades criadas através do uso desse suporte de
CMC. Na verdade, Jones tenta distinguir a comunidade virtual do lugar que ela ocupa no
ciberespaço.
Em outras palavras, a comunidade virtual deve possuir uma base no ciberespaço, um
lugar público onde a maior parte da interação aconteça. O lócus pode ser abstrato, mas é
limitado. Para tal, Jones (1997) caracteriza os requisitos básicos para o virtual settlement.
35
Afinidades, alianças intelectuais, até mesmo amizades podem desenvolver-se
nos grupos de discussão, exatamente como entre pessoas que se encontram
regularmente para conversar. Para seus participantes, os outros membros das
comunidades virtuais, suas zonas de competências, suas eventuais tomadas
de posição obviamente deixam transparecer suas personalidades (1999, p.
128).
36
Tabela 1- Gráfico indica faixa etária de usuários do Orkut. Disponível em
<http://www.orkut.com/MembersAll.aspx>. Acesso em 08/02/2008.
Tabela 2- Estatística mostra que a maioria não informa estado civil nos perfis, independente de gênero.
Disponível em <http://www.orkut.com/MembersAll.aspx>. Acesso em 08/02/2008.
Vale ressaltar que uma das possibilidades do Orkut é a de que o usuário pode julgar os
amigos, levando em conta três características: confiável, legal e sexy, simbolizados por
smileys, cubos de gelo e corações, respectivamente. O Orkut permite que sejam escritos
scraps (recados) e testemoniais (depoimentos), os quais também devem ser aprovados ou não.
Muitos membros aproveitam dessa propriedade para escrever sobre assuntos confidenciais,
que, certamente, serão deletados após a leitura. Uma das novidades de 2007 é que o usuário
pode parcialmente controlar sua privacidade, isto é, determinar quem pode ver seu álbum de
recados, fotos ou vídeo na guia Configurações, no tópico Privacidade, ele poderá escolher se
apenas os amigos ou todos poderão ter acesso às informações contidas no perfil.
Outro serviço disponibilizado é o birthday reminder, o qual mostra os aniversários dos
amigos adicionados. Uma das novidades é que o site mostra atualizações dos amigos no perfil
(profile) do usuário. É permitido que o usuário possa omitir essas informações.
O Orkut também disponibiliza um álbum com capacidade para 100 fotos com até 5
MB (megabytes) cada. O usuário também pode dividir as fotos em “sub-albuns”, o que
permite uma melhor organização.
37
Uma das inovações do Orkut é a integração entre os sites Google Vídeo e o You
Tube16, na qual possibilita que os usuários copiem e as URLs dos vídeos favoritos para a
página do perfil. “Desde fevereiro de 2007, estima-se que mais de 300 milhões de vídeos
foram “baixados” para os perfis” (SCHWARTZ, 2008. Disponível em
http://en.blog.orkut.com. Acesso em 25 de jan. 2008).
Em se tratando de comunidades, especula-se que um dos principais intuitos dos
internautas é entrar em comunidades para participar de discussões simplesmente ou adicionar
com o propósito de mostrar preferências, como Eu adoro azul17 ou expressar características
psicológicas, como Eu sou de lua18.
Fontanella e Prysthon (2005) afirmam que muitas comunidades são criadas também
com o objetivo de discutir frivolidades.
O Orkut apresenta uma tendência bem familiar àqueles que lidam com as
teorias sobre a pós-modernidade: a grande maioria das comunidades dedica-
se principalmente a discutir frivolidades, ou que se poderia chamar de
cultura inútil. Todas essas frivolidades, além de terem uma estreita relação
com um tipo de compartilhamento de referências que acaba por instituir
vários sistemas de “modas culturais”, estão intrinsecamente associadas a um
tipo de experiência estética que parece querer o tempo inteiro afirmar o
fascínio da banalidade (2005, p.4).
16
Fundado em 2005, o You Tube (http://www.youtube.com) é um site que permite aos usuários a postagem de
vídeos, disponibilizando-os para outros internautas. Vídeos caseiros, clipes, trechos de programas televisivos,
tudo é matéria-prima do site. Verdadeiras raridades do audiovisual podem ser encontradas, como cenas da antiga
série de televisão Sítio do Pica-Pau Amarelo, um comercial de cereal de 1964 com jingle dos Rolling Stones e
uma entrevista antológica com a escritora brasileira Clarice Lispector (VERUNSCHK, 2007. Disponível em
<http://www.itaucultural.com.br/impresso.cfm?materia=7>. Acesso em: 19/11/2007).
17
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=380322. Acesso em 25 de jan.2008.
18
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=233919. Acesso em 25 de jan.2008.
38
19
importância do evento? . Seu funcionamento é elucidado na descrição da página da
comunidade:
Você, jornalista, foca20 ou veterano, seus problemas acabaram!!! Com esse
guia, o mais completo da atualidade, você vai poder fazer qualquer entrevista
de polícia à economia sem passar aperto!!! ... Confira as versões prontas
(Disponível em <http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=340786>.
Acesso em 25 de jan. 2008).
Em síntese, ao passo que o internauta ingressa nos variados tipos de comunidade, ele
constrói o perfil no Orkut. Deve-se destacar que, muitas vezes, as informações podem ser
falsas. Isso pode ser provado pela quantidade de inúmeros fakes (perfis falsos). Eles são mais
facilmente perceptíveis quando são utilizadas fotos de celebridades, personagens de novela ou
de desenho animado. Segundo França Camarão (2005) apud Oikawa e Pinto (2006, p.49),
esse tipo de situação é facilitada no ciberespaço porque não há a necessidade do contato
físico, permitindo que a pessoa assuma diferentes papéis na relação mediada. A imaterialidade
do ciberespaço nos oferece as multipossibilidades de existência ao mesmo tempo em que nos
liga ao outro.
Apesar de o Orkut fornecer ferramentas para a denúncia, é impossível estabelecer se
realmente os dados fornecidos pelo usuário são realmente verdadeiros. Outra utilidade do
Orkut é que o internauta pode pesquisar perfis de amigos de infância, parentes que moram em
outra cidade. Para tais esclarecimentos, basta deixar um recado na página de scraps.
Essa é a grande graça do Orkut. Poder vasculhar as próprias memórias
sentimentais, através daquelas fotos e – por curiosidade, voyeurismo ou
algum prazer mórbido – procurar saber como determinada pessoa está, se
casou, se não casou, se mudou de lugar, se gosta das mesmas coisas, se é
amiga dos mesmos de antes, se pode ser contatada... E – se for contatada
(nem que seja para se dizer um “olá!”) – que entenda a minha necessidade
básica de cutucá-la para simplesmente proclamar “olha, eu ainda existo”.
Pois talvez toda comunicação se resuma ao desejo de manifestar que ainda
estamos vivos – ou tentando sobreviver ao tempo que passa... (BORGES,
2004. Disponível em
<http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo1427>.
Acesso em 27 de jan. 2008).
19
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=3407863. Acesso em 25 de jan. 2008.
20
Denominação usada para designar estudantes de Jornalismo.
21
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=44430512. Acesso em 25 de jan.2008.
39
nordestinos são um povo burro e que depende de 36 reais do programa Bolsa Família, do
Governo Federal. Oikawa e Silva Pinto fazem observação sobre esses tipos de comunidades.
Não significa, no entanto, dizer que no Orkut não existem regras. O Orkut,
assim como várias comunidades virtuais, possuem suas regras próprias, as
chamadas netiquetas, mas possuem valores diferentes daquelas que temos de
cumprir socialmente no dia-a-dia. Podemos até denunciar no Orkut as
comunidades racistas, pedófilas ou que preguem a violência contra grupos
raciais. Estes, por sua vez, podem até ser retirados do site, mas são poucos os
casos em que os integrantes sofrem as conseqüências penais dessa infração.
Além disso, na Internet, as pessoas sentem-se livres para tomar certas
atitudes que, no mundo off line, seria condenado pela sociedade (2006, p.72).
Vale salientar que, em aspectos técnicos, o Orkut não é um programa em versão final.
Aspectos, como termos de privacidade, política do site, até mesmo o próprio layout são
constantemente modificados.
To be fair, Orkut is not a finished product (it is officially in "beta" phase,
although there is no explicit timeline for when it might graduate to being an
official version) (…). Changes have been made to the site that appear to be
driven by user feedback, such as allowing moderators to disallow
anonymous posts in communities to combat trolling and flaming (…). From
their actions so far, it seems as if Orkut administrators want to create a
faithful representation of how people interact in the "real world", but have
discovered that Murphy's Law also applies to social networking sites: even
under the most rigorously controlled conditions, the organism does as it
damn well pleases22 (HEMPELL, 2004. Disponível em
<http://www.anthonyhempell.com/papers/orkut/>. Acesso em 27 de jan.
2008).
40
interpessoal em suas três modalidades (um-a-um, um-a-todos ou todos-a-todos) são os
responsáveis por esse resultado23.
A popularidade dos comunicadores instantâneos (MSN Messenger e ICQ),
dos blogs e fotologs, dos sites das operadoras de telefonia móvel e das salas
de bate-papo no Brasil é interpretada como um sinal de que os brasileiros se
interessam mais pelo potencial da Internet como ferramenta de
relacionamento do que como meio de distribuição de conteúdo
(MAGALHÃES, 2005, s.p apud FRAGOSO, 2006, p.2).
Ela conclui que softwares de rede social são particularmente suscetíveis a este tipo de
acontecimento. De fato, um dos maiores e provavelmente o mais amplamente conhecido
Brazilian Internet Phenomena foi a invasão do serviço de rede social Orkut, que remonta aos
primeiros dias, em 2004.
A invasão dos brasileiros no Orkut, obviamente, gerou muita polêmica e proporcionou
o surgimento de rixas entre brasileiros e americanos. Isso pode ser ratificado pelo grande
número de comunidades estadounidenses, como Eu odeio os Estados Unidos, USA sucks e
antibrasileiras, como Brazilians, The Plague.
23
Segundo dados do Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic), no
quarto trimestre de 2006, 211,1 milhões de pessoas (com dois anos de idade ou mais) tinham acesso à Internet
nos Estados Unidos. No Brasil, no mesmo período, esse número chegou a 22,1 milhões de pessoas. O perfil do
usuário brasileiro da internet é 60% homens, faixa etária dominante de 16 a 24 anos, 88% têm curso superior
completo ou pós-graduação, 75% utilizam e-mail, 35% chat, 53% serviços de mensagem instantânea, 38% web-
rádio e 36% conteúdo audiovisual (VERUNSCHK, 2007. Disponível em
<http://www.itaucultural.com/impressao.cfm?materia=7>. Acesso em 19/11/2007).
24
O tempo médio por usuário doméstico em junho de 2005 no Brasil foi estimado em 16h54min, contra 15h35
min no Japão e 14h46min nos EUA. Os outros países considerados na mesma pesquisa e que obtiveram médias
inferiores às aqui reproduzidas foram Austrália, França, Alemanha, Itália, Espanha, Suécia, Suíça e Reino Unido
(Ibope/Netratings, 2006 apud FRAGOSO, 2006, p.2)
41
Tabela 4- Dados de fevereiro de 2008 comprovam que o Brasil ainda mantém a hegemonia no Orkut.
Disponível em <http://www.orkut.com/MembersAll.aspx>. Acesso em 08/02/2008.
25
Nós somos mesmo divertidos e originais. Achamos legal estar em mais de cem comunidades (apesar de não
postarmos ou lermos os tópicos). É também legal deixar mensagem para um amigo horas depois de nos
encontrarmos com ele em uma festa. É também divertido fazer parte de comunidades estranhas que, de alguma
forma, mostra quem realmente somos (como “Eu odeio”... ou “Eu amo”). Utilizamos comunidades para
incrementar nossos perfis. Então queremos criar comunidades originais para dizer coisas originais (Tradução da
autora).
42
Outra é o orgulho de ser brasileiro e os argumentos de como o Orkut é melhor com a
predominância desse povo latino-americano.
At last, we make Orkut much more fun and different. We like it that way.
We love to shake stuff a bit and bring some warmth and “real stuff” to this
virtual community. But we’re a nice and friendly people and we’re not
afraid, like most other Orkut users, to interact and exchange experiences
with everybody else, no matter what country26 (Ibid).
O autor ainda desabafa que essa repulsa, na verdade, é um tipo de racismo pelo fato de
o idioma ser o português e de vivermos abaixo das fronteiras mexicanas.
To make things worse, there are some Brazilians that get really mad, and
flood these communities with pointless messages, write dozens of scrapbook
texts in some foreigners' profiles because of what they think, and they begin
a war. Not like the war in Palestine, with guns and missiles, but with
offensive and needless words28 (Ibid).
Para finalizar, Torres conclui que “Brazilian identity cannot be based on the behavior
of a few guys, just like the identity of the foreigners cannot be made because of the behavior
26
Por último, fazemos o Orkut muito mais divertido e diferente. Gostamos dele dessa forma. Adoramos agitar e
trazer calor humano e “coisas reais” para essa comunidade virtual. No entanto, somos pessoas simpáticas e
amigáveis e não tememos, como outros usuários, interagir e trocar experiências como todo mundo, não importa
de que país seja (Tradução da autora).
27
Alguns colegas pensam que esta “Pirataria Brasileira” no Orkut é uma ameaça para eles, que somos
preguiçosos e não fazemos nada de útil. Alguns pensam dessa forma mesmo sem ter Orkut e apenas escutando o
que dizem sobre o Brasil e seus cidadãos. Em seguida, são convidados a acessar o Orkut e o que eles pensam?
Mais da metade dos colegas de Orkut é brasileira, conversam em português, etc. Então, querem dizer ao planeta
como se sentem: somos ignorantes, não respeitamos as regras e somos detestáveis. Falam de nós como tivessem
passado a vida inteira convivendo com brasileiros, observando e absorvendo nossa cultura (Tradução da autora).
28
Para piorar a situação, há alguns brasileiros que ficam loucos e entopem essas comunidades com mensagens
sem sentido, com dezenas de recados em perfis de estrangeiros por causa das suas opiniões e provocam uma
guerra, não comparada à guerra da Palestina, com armas e mísseis, mas com palavras ofensivas e desnecessárias
(Tradução da autora).
43
of a few. Be open-minded and respect others, and ignore the flooders and guys who can't
respect the "laws." They just want to draw attention to themselves, so if you don't give them
any, they'll give up. And if you already respect the Brazilians, thank you29”(Ibid).
A pesquisadora Suely Fragoso utilizou os trabalhos do antropólogo Roberto da Matta
como peças-chave para levantar hipóteses e embasar explicações sobre o Brazilian Orkut
Phenomena. Em seu estudo, constatou que as manifestações agressivas dos brasileiros
permitiram perceber, no entanto, que o alvo da violência não é os EUA, mas a língua inglesa.
É evidente que mesmo entre esses 15% [do total de pessoas capazes de se
comunicar em inglês] há variações no sentido de compreender o inglês
falado e ler, falar e escrever em inglês mais ou menos bem. Os brasileiros,
em sua maioria, conhecem muito pouco a língua inglesa. Diferentemente do
que muitos estrangeiros imaginam o inglês não é amplamente utilizado no
Brasil (nem, possivelmente, na maior parte dos países da América do Sul)
(2006, p.12).
Fragoso (2006, p.12) ainda comenta “uma vez que noções básicas de língua inglesa
são normalmente ensinadas na escola brasileira, dado que os usuários da Internet no Brasil
pertencem às famílias de maior e detêm os mais altos níveis de escolaridade, não surpreende
que a maioria dos usuários brasileiros do Orkut seja capaz de ler as interfaces e algumas
mensagens escritas em inglês”. Para argumentar esse pressuposto, Bauman esclarece como se
dá esse processo de deslocamento.
Estar total ou parcialmente “deslocado” em toda parte, não estar totalmente
em lugar algum (ou seja, sem restrições e embargos, sem que alguns
aspectos da pessoa “se sobressaiam” e sejam vistos por outras como
estranhos) pode ser uma experiência desconfortável (...). Sempre há alguma
coisa a explicar, desculpar, esconder, ou pelo contrário, corajosamente
ostentar, negociar, oferecer e barganhar. Há diferenças a serem atenuadas ou
desculpadas ou, pelo contrário, ressaltadas e tornadas mais claras. As
“identidades” flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras
infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta
constante para defender as primeiras em relação às últimas (2005, p.19 apud
FRAGOSO, 2006, p.13).
Ao reforçar a idéia de que as regras do Orkut são universais e que o inglês é o idioma
padrão a comunicação nesse SRS é “recusar-se a conceder a distinção de ‘familiaridade’ com
que cada usuário está acostumado: trata-se, afinal, dos brasileiros de maior renda e
escolaridade, por pressuposto, na esfera nacional, os mais bem relacionados” (2006, p.15).
Fragoso finaliza com a idéia de que “a aplicação dessas normas pode funcionar para os
brasileiros como um eufemismo para a negativa ou como um modo de informar ao outro de
29
A identidade brasileira não pode ser baseada no comportamento de algumas pessoas, só como a dos
estrangeiros não pode ser interpretada pelo comportamento de alguns. Ter a mente aberta, respeitar os outros e
ignorar os “entupidores” que não podem respeitar as leis. Querem chamar a atenção para eles próprios. Se você
não ligar, eles desistirão. E se respeita os brasileiros, obrigado (Tradução da autora).
44
sua condição de anonimato e inferioridade”. Isto porque, no Brasil, “o que sempre se espera
em qualquer situação de conflito ou disputa é o ritual do reconhecimento que humaniza e
personaliza as situações formais, ajudando a todos a hierarquizar as pessoas implicadas na
situação” (DA MATTA, 1985, p.87, ênfase adicionada apud Ibid).
Da Matta relaciona o comportamento negativo dos brasileiros em relação à rua e às
coisas impessoais que nela se encontram.
A rua é local de indesejável individualização, de luta e de malandragem.
Zona onde cada um deve zelar por si (...) [pois] não se pode mais utilizar
como moldura moral a vertente relacional e hierarquizante de nossa
constelação de valores. Mas falar que ‘cada um por si’ equivale a abrir ao de
um controle social rígido que de certo modo garante a pacificação dos
ânimos e provê a ordem das coisas (DA MATTA, 1985, p.61 apud
FRAGOSO, 2006, p.16).
Se Dawkins está certo então tudo que você aprendeu por imitação de alguém
um meme. Isso inclui todas as palavras no seu vocabulário, as estórias que
você conhece, as habilidades e hábitos que você tomou de outras pessoas e
os jogos que você gosta de jogar. Isso inclui as canções que você canta e as
regras que você obedece (BLACKMORE, 2005 apud VARELA, 2007, p.4).
45
Para que haja multiplicação, os memes devem apresentar três características:
fidelidade, fecundidade e longevidade. A primeira designa a capacidade de cópia fiel, a
segunda, habilidade de se reproduzir e a última, ultrapassar fronteiras. Os memes podem ser
classificados quanto à forma e à função. O primeiro engloba aqueles do tipo emoticons,
onomatopéias e figuras.
Os emoticons são elementos de linguagem não-verbal com o objetivo de suprir a falta
de elementos característicos da comunicação interpessoal, como o meme , o qual mostra
sorriso ou satisfação. Já as onomatopéias são representações escritas dos sons e emoções e as
figuras podem ser entendidas como memes coloridos e gráficos que chamam a atenção dos
usuários porque demonstram sentimentos.
Muito obrigada por você existir na minha vida!!Você me ajudou muito
quando eu estava por baixo e nunca vou esquecer o seu apoio!! Saiba
que te considero como se fosse um irmão pra mim..ou melhor: você É
um super irmão, melhor ainda porque a vida te escolheu pra isso e eu
sou muito agradecida por isso, sabia? Todo mundo faz promessa
quando chega essa época, já percebeu?E eu ñ vou ficar por baixo...vou
prometer pra mim mesma nunca deixar a chama da nossa amizade se
apagar!!Espero que faça o msm por mim, viu?Um super beijão, uma
maravilhosa passagem de ano e que tudo que vc queria Deus te ajude a
conseguir...ah, e outra coisa: nunca esqueça de brilhar!!Por vc e pelos
outros tb!!!
(Disponível em <http://www.orkut.com/Scrapbook.aspx?
uid=12243019591129421917&pageSize=&na=3&nst=-
2&nid=12243019591129421917-1199215349-7818544587112012726>.
Acesso em 26 de jan.2008).
46
O conceito de capital social baseia-se nos valores que surgem em um determinado
grupo, isto é, são incorporados tanto pelo coletivo quanto pelo individual. Para tal, é
necessário compreender o conceito de rede social.
Uma rede social é composta por um conjunto de dois elementos: atores e
suas conexões. No Orkut, os atores podem ser compreendidos pelas relações
sociais estabelecidas no site; através dos recados trocados entre esses atores,
por exemplo. Logo, a abordagem de rede social tem seu foco na estrutura
social, onde os indivíduos não podem ser estudados de forma independente
de suas relações. Ou seja, a interação está implicada no processo. E os atores
que fazem parte desse processo podem pertencer a laços fortes ou fracos.
Fortes, os amigos, por exemplo; fracos, se forem colegas ou outras pessoas
que façam parte de relações mais esparsas (WASSERMAN e FAUST, 1994,
DEGENNE e FORSÉ, 1999 apud RECUERO, 2005, p.5).
Vale ressaltar que a definição de capital social é ampla, entretanto devemos ter em
mente como os valores estão sendo determinados por um grupo. “O capital social é, portanto,
um conjunto de recursos, que pode ser encontrado a partir das conexões entre os indivíduos de
um determinado grupo, pois é conteúdo dessas relações” (RECUERO, 2005 apud VARELA,
2007, p.4).
Bertolini e Bravo (2004) apud Varela (2007, p.4) classificam o capital social em dois
níveis. O de primeiro nível leva em conta os valores individuais e o segundo, relaciona aos do
grupo, como, por exemplo, o grupo do qual faz parte um jornalista.
O capital social de primeiro nível é subdividido em: a) Capital social relacional; b)
capital social cognitivo e c) capital social normativo.
Capital social relacional refere-se aos valores repassados aos usuários que são amigos
ou familiares no Orkut. O caráter das mensagens é particular, portanto os memes o são. Já o
do tipo cognitivo tem a ver com as mensagens enviadas a um grande número de usuários,
muitas vezes para todos os “amigos” que fazem parte da lista de uma determinada pessoa. São
os conhecidos spams30, com diversas serventias, desde divulgar listas até sites pornográficos.
O capital do tipo normativo está intrinsecamente direcionado às normas aprendidas
pelos usuários. Recados com letras coloridas ou emoticons são exemplos que comprovam.
Em relação ao capital social de segundo nível, ele pode ser subclassificado em: a)
capital social de confiança no ambiente social e b) capital social institucional. “O capital de
confiança no ambiente geralmente é transmitido para um usuário em específico, ou para um
grupo” (VARELA, 2007, p.5).
Varela (2007) ainda conclui que tais usuários confiam no Orkut como um ambiente
propício para resolver seus problemas sociais. A noção de confiança é abrangente. Pode ser
30
Mensagens eletrônicas não-solicitadas enviadas em massa.
47
pelo fato do emissor pensar que outros usuários não irão ridicularizá-lo por causa disso, ou
mesmo pelo fato de que os usuários em questão confiam no Orkut para expor uma discussão
através de recados.
Por último, o capital social institucional concerne aos valores incorporados pelos
usuários do Orkut. Vale frisar que o site de relacionamento não deve ser visto como
instituição, mas enquanto espaço virtual. O autor citou o Orkut com o intuito de explicar de
maneira didática esse tipo de capital social.
O capítulo seguinte analisará a comunidade Eu leio a Folha de São Paulo. O estudo
será realizado por meio da aplicação de conceitos, como o de identidade cultural de Stuart
Hall, Castells e de tribalismo, do filósofo francês Michel Maffesoli.
48
O capítulo III procurará analisar a comunidade Eu leio a Folha de São Paulo31 de
forma quantitativa e qualitativa com o intuito de verificar premissas sobre a seguinte
pergunta: Por que lêem a Folha de São Paulo? Além disso, o estudo procurou verificar as
razões da baixa participação dos membros.
A fim de que a análise da comunidade (objeto de estudo) se tornasse completa, fez-se
necessário abordar conceitos, tais como: identidade cultural, sujeito descentralizado,
fragmentação do eu. Portanto, será necessário analisar mais profundamente alguns desses
conceitos, além de conhecer os elementos centrais da história do jornal Folha de São Paulo.
Aliado a isso, um dos preceitos do projeto Folha consiste em ressaltar que o exercício
da crítica jornalística não é apenas um direito, mas um encargo. Isso pode ser confirmado com
o lançamento do documento Folha depois da campanha Diretas-Já, de junho de 1984.
49
deseja retomar o desenvolvimento. A necessidade de investir no pluralismo,
na preocupação como ser um jornal ágil e moderno, de fornecer informações
precisas e confiáveis ao leitor foi-se tornando evidente e disseminando na
imprensa brasileira. (Disponível em
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/conheca/projetos-1985-1.shtml> .
Acesso em 1º de mar.2008).
50
também aos sites de relacionamento, como o Orkut. Acho que acabei
fazendo esse papel para eles, que, por outro lado, dá também oportunidade às
pessoas de comentarem as notícias (PAIVA, 2008. Depoimento enviado para
o e-mail da autora. Acesso em 01 de mar. 2008).
Tabela I - Sexo
Sexo
Homem Mulher
100% 0%
33
A enquete ou inquérito foi se constituindo como uma vulgarização “para um público vasto (embora não para o
‘grande público’) de problemas sociológicos, artísticos, científicos ou outros que ultrapassavam a
superficialidade da actualidade diária”. O inquérito esteve no cruzamento dos gêneros jornalísticos informativo e
opinativo. Nesses inquéritos também se evidenciaram os jogos de verdades, expressos nas opiniões emitidas
pelos leitores participantes (CRATO, 1989 apud SILVA, 2007, p.35).
34
Os membros do Orkut, em geral, se filiam a comunidades que se dedicam a discutir um determinado assunto,
como cinema, artes, personagens e uma infinidade de tópicos. Ao aderir a uma dessas comunidades, o internauta,
em geral, amplia o número de contatos virtuais e pode, também, aprofundar seus conhecimentos sobre o assunto.
35
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=7979138. Acesso em 08 de mar.2008
36
http://www.orkut.com/CommTopics.aspx?cmm=82594. Acesso em 08 de mar.2008.
37
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=751061. Acesso em 08 de mar.2008.
38
Deve-se frisar que essa análise trabalha com dados declarados assumidos como o perfil do internauta, visto que
não há como verificar a autenticidade das informações fornecidas.
51
Tabela II - Idade
Idade
Menos de 18 0%
18 a 25 anos 40%
26 a 40 anos 0%
41 a 60 anos 10%
Acima de 60 0%
Não declararam 50%
Profissão
Engenheiro Químico 10%
Jornalista 20%
Estudante universitário 10%
Publicitário 10%
Técnico em Processamento 10%
de Dados
Não declararam 40%
Uma das curiosidades
percebidas durante as enquetes foi a predominância da participação masculina, a variedade de
52
profissões e gostos dos perfis pressupostos do Orkut. L1 é bacharel em Direito, gosta da
coluna do jornalista do Clóvis Rossi39 e valoriza as manifestações culturais brasileiras.
Já L2 é engenheiro químico e participa de uma série de comunidades ligadas à
cibercultura, tais como Social Network Analysis, Social Software, William Gibson40.
Fotografia, vanguardas e teorias da comunicação (Escola de Frankfurt) são temas presentes
nas comunidades de L3, além de defender a separação do estado de São Paulo do resto do país
(sic). Em relação à L4, semiótica, pesquisa em comunicação, filosofia da linguagem, análise
do discurso são suas áreas de interesse.
Pode-se entender que L5 é estudante de jornalismo e gosta das telenovelas brasileiras,
principalmente àquelas escritas pelos novelistas Manoel Carlos, Gilberto Braga e Janete Clair.
L6 transmite a preocupação, a importância de que o brasileiro precisa ler mais. L7 expressa
em suas comunidades a opinião de discordar do desarmamento. Cinema, literatura e o gosto
pelos textos do jornalista Diogo Mainardi são temas recorrentes na comunidade do técnico em
processamento de dados L8.
Oposição ao Partido dos Trabalhadores (PT) e ao presidente Lula são pontos em
comum aos participantes L9 e L10. Isso é um fato curioso, visto que uma das características
da Folha de São Paulo, tradicionalmente, é o fato de que era lida por esquerdistas. Já as
pessoas consideradas de direita liam o Estado de São Paulo.
Era nítida a diferença entre os dois jornais, o confronto da linguagem do
Estadão contra aqueles que formulavam discursos mais progressistas (...)
com a linguagem mais neutra ou mais engajada da Folha, com posições de
representações da sociedade em artigos semanais (...). Enquanto a Globo
boicotava o movimento, a Folha era o órgão de comunicação que o defendia.
Conseguir alguma coisa contra a Globo não é fácil, e se conseguiu isso
mesmo perdendo as Diretas-Já. Ficou marcado um momento de profunda
intransigência com a vocação democrática desse povo (DIAS, 2003, p.63).
53
que têm uma identidade precisa e uma existência autônoma; a socialidade,
por sua vez, se fundamenta na ambigüidade básica da estruturação simbólica
(MAFFESOLI, 2006, p.163).
41
Isso se deve ao fato de que a identidade deve ser distinguida daquilo que os sociólogos chamam de papéis, e
estabelecimento de papel. O seu relativo peso em influenciar o comportamento depende de negociações e planos
entre indivíduos, essas instituições e organizações. Identidades são fontes de significado para os atores e por
eles, construído por meio de um processo de individualização (Tradução da autora).
42
No entanto, indivíduos, grupos sociais e sociedades processam todos estes materiais, além de replanejar seus
significados, de acordo com determinações sociais e projetos culturais enraizados na estrutura social e no quadro
de espaço-tempo (Tradução da autora).
54
*Resistance identity: generated by those actors who are in
positions/conditions devalued and/or stigmatized by the logic of domination,
thus building trenches of resistance and survival on the basis of principles
different from, or opposed to, those permeating the institutions of society, as
Calhoun proposes when explaining the emergence of identity politics.
*Project identity: when social actors, on the basis of whatever cultural
materials are available to them, build a new identity that redefines their
position in society and, by so doing, seek the transformation of overall social
structure43.
Giddens (1991) ainda esclarece qual é o impacto da modernidade tardia neste projeto
reflexivo.
43
*A identidade legitimadora gera uma sociedade civil que é um conjunto de organizações e instituições, bem
como uma série de atores sociais organizadores e estruturados os quais reproduzem mesmo de maneira
conflituosa, a identidade que nacionaliza as fontes de dominação estrutural.
*Identidade de resistência: gerada por aqueles atores em posição/condições desvalorizadas e/ou estigmatizadas
pela lógica da dominação, logo construindo focos de resistência e de sobrevivência nas bases de princípios
diferentes de ou opostas àquelas presentes nas instituições sociais, como Calhoun propõe quando é explicada a
ascensão da identidade política.
*Identidade de projeto: quando atores sociais, baseados em quaisquer materiais culturais disponíveis,
constroem uma nova identidade que redefine a posição deles na sociedade e, de certa forma, omitir a
transformação de toda a estrutura social (Tradução da autora).
44
A identidade não é característica possuída do indivíduo. É o “eu” reflexivamente compreendido por ele/ela em
relação à biografia. Na verdade, ser humano é saber... O que e por que está fazendo algo... No contexto da ordem
pós-tradicional, torna-se um projeto reflexivo (Tradução da autora).
55
Reflexively organized life-planning (…) becomes a central feature of
structuring of self-identity45 (1991, apud CASTELLS, 1999, p.11).
De acordo com a tabela V, pode-se verificar que os objetivos dos leitores da Folha de
São Paulo que se ligam à comunidade do Orkut são os mais diversos. Não se descarta a
importância para o universo do trabalho, uma vez que 20% dos que responderam a enquete
alegam estar preocupados com a rede de negócios. Supõe-se que o leitor da Folha de São
Paulo tenha um perfil mais intelectual, entretanto, 10% da amostra afirmam ter se associado
ao Orkut com a intenção de namorar ou não.
Objetivos no Orkut
Amigos 40%
Namoro (Mulheres) 10%
Parceiros de Atividades 20%
No entender de
Rede de negócios 20% Hall (2005), o sujeito
Não declararam 40% pós-moderno não é uma
identidade fixa, estável como na modernidade. É fragmentada, possui identidades múltiplas e
são utilizadas conforme o momento para ter ou adquirir status e até mesmo reforçar
identidades (Tabela IX). Isso é provado com a quantidade de comunidades no perfil.
56
significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por
uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis
(HALL, 2005, p.13).
57
Melhor jornal do país/mais 44,4%
completo
Melhores jornalistas/colunistas 44.4%
Menos tendencionalista 22,2%
Credibilidade 11,1%
Linguagem 22,2%
Melhores cadernos/colunas 33,3%
Estímulo ao debate 22,2%
58
Em pesquisa realizada pela Datafolha46, o estudo divulga que 68% dos leitores do
Jornal Folha de São Paulo têm nível superior (no país, só 11% passaram pela universidade) e
90% pertencem às classes A e B (contra 18% dos brasileiros). A maior parcela dos leitores
tem entre 23 e 49 anos, é usuária de internet, faz exercícios e freqüenta restaurantes,
shoppings, cinema e livrarias. São consumidores de mídia: 92% assistem a telejornais, 69%
lêem revistas, 58% ouvem notícias no rádio e 57% seguem noticiário on-line. O meio
impresso, porém, é o preferido dos entrevistados: se tivessem que optar por um, 53% ficariam
apenas com o jornal. Em síntese, a pesquisa divulgada pela Datafolha contraria, ao menos em
parte, o perfil dos internautas da comunidade Eu leio a Folha de São Paulo.
Conclusão
46
Pesquisa divulgada em 11 de novembro de 2007 no Jornal Folha de São Paulo. Disponível em <
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1111200715.htm>. Acesso em 28 de mar.2008.
47
http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=743565&tid=2583998311263296180. Acesso em 18 de
mar.2008.
59
Conforme exposto na tabela VIII, são atrativos que ajudam a demonstrar o quanto esses
internautas demonstram ler um veículo de comunicação de alta qualidade.
Em outras palavras, espera-se que a análise da comunidade virtual Eu leio a Folha de
São Paulo seja um estímulo para que estudos de sociabilidade e de cibercultura relacionados
ao jornalismo sejam desenvolvidos até mesmo com a interdisciplinaridade em outras áreas,
como análise do discurso, sociologia. Além disso, poderá fomentar um estudo sobre o
funcionamento das comunidades virtuais.
Bibliografia
60
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_______________. Economia Política da Internet. São Cristóvão: Editora UFS ; Aracaju:
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Comunidades pesquisadas:
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Entrevistados:
PAIVA, Thiago. Sobre a comunidade Eu leio a Folha de São Paulo. E-mail enviado para
<iedatourinho@hotmail.com>. Acesso em 1º de mar.2008.
Tabelas:
ANEXOS
64
Anexo II – Enquete I – Por que vocês lêem a Folha de São Paulo?
65
Anexo III- Enquetes – Vocês lêem a Folha impressa, on-line ou as duas?
66
Anexo IV – Entrevista por e-mail com o proprietário da comunidade
67
68
69
70