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Exames Categoriais

"Exames Categoriais são exames iniciais cujo objetivo é o


de localizar existencialmente a pessoa. Exemplo: onde
mora, qual o idioma, como é a situação política e histórica
em seu país, e assim sucessivamente".
(Lúcio Packter - Propedêutica, 1997)

O conceito de Categoria em Filosofia

Categoria: do grego κατεγορια, em geral, significa qualquer noção que sirva como regra
para a investigação ou para a sua expressão lingüística em qualquer campo. (Abbagnano,
2003).

Para Aristóteles, modos em que o ser se predica das coisas, predicados fundamentais do
ser (Substância, Quantidade, Qualidade, Relação, Lugar, Tempo, Posição, Estado, Ação,
Paixão). A lista aristotélica de categorias é uma lista de tipos de predicados. “Existem
tantos tipos diferentes de predicados de Sócrates quantas espécies irredutivelmente
diferentes de perguntas acerca dele. (...) Dois predicados quaisquer que satisfazem a
mesma interrogação são da mesma categoria e dois predicados quaisquer que não
satisfazem a mesma interrogação são de categorias diferentes.” (Ryle, 1953). Quando
dizemos algo sobre um sujeito, excetuando os conectivos, usamos categorias e dizemos
algo sobre um modo de ser. “Desde que a predicação afirma às vezes o que uma coisa é,
às vezes a sua qualidade, às vezes a sua quantidade, às vezes a sua relação, às vezes a
que faz ou a que sofre e às vezes o lugar onde está ou o tempo, segue-se que tudo isso
são modos do ser”. (Aristóteles. Met. V, 7, 1017 a 23 segs.)

Quando Kant propõe o conceito de categoria, aponta modos pelos quais o intelecto ordena
as representações sob uma representação comum, ou seja, formas do juízo. Categorias,
portanto, podem ser extraídas das classes do juízo.

Ora, espaço e tempo contêm um múltiplo da intuição pura a priori e, não obstante, fazem
parte das condições de receptividade da nossa mente, unicamente sob as quais esta pode
acolher representações de objetos que portanto também têm sempre que afetar o conceito
de tais objetos. Todavia, a espontaneidade do nosso pensamento exige que tal múltiplo
seja primeiro e de certo modo perpassado, acolhido e ligado para que se faça disso um
conhecimento. Denomino esta ação síntese. (...) A síntese pura, representada de modo
universal, dá o conceito puro do entendimento. (...) A mesma função que num juízo dá a
unidade às diversas representações: tal unidade, expressa de modo geral, denomina-se o
conceito puro do entendimento. Assim o mesmo entendimento, e isto através das mesmas
ações pelas quais realizou em conceitos a forma lógica de um juízo mediante a unidade
analítica, realiza também um conteúdo transcendental em suas representações mediante a
unidade sintética do múltiplo na intuição em geral. Por esta razão, tais representações
denominam-se conceitos puros do entendimento que se referem a priori a objetos, coisa
que a lógica geral não pode efetuar.

Desse modo surgem precisamente tantos conceitos puros do entendimento (categorias),


que se referem a priori a objetos da intuição em geral, quantas eram na tábua anterior as
funções lógicas em todos os juízos possíveis. (Kant, 1787, Analítica dos Conceitos, § 10).

Conceitos do intelecto puro, as categorias, condicionam o conhecimento intelectual e a


própria experiência, mas não se aplicam às coisas em si. Oferecem as condições de
validade objetiva do conhecimento, pois é pelo juízo que o conhecimento se concretiza. O
juízo é a conexão entre representações, mas tal conexão não é subjetiva.

São as categorias kantianas ou “elenco dos conceitos puros originários da síntese que o
entendimento contém em si a priori e somente devido aos quais ele é, além disso, um
entendimento puro, na medida em que unicamente por tais conceitos pode compreender
algo do múltiplo da intuição, isto é, pensar um objeto dela.” (Kant, 1787): Categorias de
quantidade: unidade, multiplicidade, totalidade; Categorias de qualidade: realidade,
negação, limitação; Categorias da relação: inerência e subsistência (substância e
acidente), causalidade e dependência (causa e efeito), comunidade (ação recíproca entre
agente e paciente); Categorias da modalidade: possibilidade-impossibilidade, existência-
não-ser; necessidade-contingência. Diretamente derivadas das formas dos juízos –
maneiras pelas quais uma proposição pode se assemelhar ou diferir de uma outra quanto
à forma: de quantidade: universais, particulares, singulares; de qualidade: afirmativos,
negativos, infinitos; de relação: categóricos, hipotéticos, disjuntivos; de modalidade:
problemáticos, assertóricos, apodíticos. Apesar de derivadas dos juízos, as categorias não
são idênticas a eles, elas constituem as formas lógicas para a compreensão das coisas,
dos fatos, do empírico que incorpora essas categorias. O que não for empírico não pode
incorporá-las, desta forma, assim como constituem as formas que nos permitem o
conhecimento, as categorias também são as formas que limitam nosso conhecer.
Gilbert Ryle (1953) aponta uma possível pressuposição aristotélico-kantiana,
compartilhada por filósofos contemporâneos, que consiste na existência de um “catálogo
finito de categorias ou tipos”, ou seja, uma lista ou tábua de tipos finita e completa, ao que
ele aponta como um mito.

(...) não acredito que jamais possamos dizer,


a propósito de um simbolismo-código da lógica formal,
que os seus símbolos são, finalmente, adequados para a
simbolização de todas as possíveis diferenças de tipo
ou de forma. Ele poderá ser adequado, é claro, para a exibição
de todas as diferenças de tipo que nos interessam no transcurso
de alguma investigação particular. (Ryle, 1953)

O início da Clínica: aproximações e Exames Categoriais


Artigo publicado na Revista Informação Dirigida – Revista Internacional de Filosofia
Clínica.Instituto Packter, Porto Alegre/RS. Nº 1, Jan-Jun 2005, p. 11-27.
As Categorias em Filosofia Clínica

Exames Categoriais

"Exames Categoriais são exames iniciais cujo objetivo é o


de localizar existencialmente a pessoa. Exemplo: onde
mora, qual o idioma, como é a situação política e histórica
em seu país, e assim sucessivamente".
(Lúcio Packter - Propedêutica, 1997)

Aristóteles trazia de casa uma enraizada tradição metódica e empírica de seu pai, médico. Mas
durante quase vinte anos foi aluno de Platão, um homem talvez muito poeta e pouco filósofo, que
levou Aristóteles a misturar certos antagonismos que nunca se resolveram, quem sabe porque certas
coisas precisam ser apenas do jeito que são. Quando Platão lia seus trabalhos na Academia, como o
tratado sobre a imortalidade da alma, um dos poucos alunos que firmava os pés e acompanhava
atentamente toda a leitura era exatamente Aristóteles.

Aristóteles realmente amava seu mestre. E não apenas levou adiante o que aprendeu, como também
foi muito além de seu amigo filósofo.

Aristóteles desenvolveu 10 categorias, alicerces fundamentais para que possamos pesquisar qualquer
coisa: substância, quantidade, qualidade, relação,

lugar, tempo, posição, posse, atividade, passividade.

Mas não devemos nos iludir com esse aparente tecnicismo, pois Aristóteles se tornava muito mais
poeta e metafísico e muito menos cientista quando considerava o ser humano em suas emoções e
comportamentos.

Tantos séculos depois, Kant retoma as categorias de Aristóteles, e ainda que tenha afirmado ser seu
objetivo o mesmo objetivo do velho mestre estagirita, isso não é bem assim.

Da mesma forma, agora a Filosofia Clínica se utiliza dessas categorias, modificadas e adaptadas à
clínica. Acredito que nossos mestres entenderiam a necessidade de termos feito as modificações.

O objetivo de usarmos as categorias em clínica é o de localizar existencialmente a pessoa. Através


dos exames categoriais o filósofo saberá o idioma da pessoa, seus hábitos, sua época, a política e os
dados sociais da localidade onde viveu, a geografia, o contexto religioso, histórico, entre outros
aspectos que podem ter importância.

Uma decorrência imediata é que aqueles discursos avulsos simplesmente ganhariam uma localização
na história, passariam a ter um sentido, uma identidade dentro de um contexto. Portanto, agora o
filósofo pedirá à pessoa para que lhe conte sua história, desde a época mais remota da qual tenha
lembrança até os dias de hoje.

Em Filosofia Clínica usamos 5 categorias nos Exames Categoriais: assunto (imediato e último),
circunstância, lugar, tempo e relação.

Acompanhe a linha traçada a seguir, exemplificando os 25 anos vividos por uma pessoa até hoje:

--------------- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

0 5 10 15 20 25

Assunto; I I I I

Circunstância;

Lugar;

Tempo;

Relação;

Após dois ou três meses de trabalhos com a pessoa, o filósofo clínico terá referencias mais estáveis
sobre pontos importantes.

Sobre os 5 anos de idade da pessoa, por exemplo, ele saberá qual era a questão ou questões com as
quais a pessoa lidava à época (assunto); conhecerá todo o contexto em torno daquelas questões, e
quais os aspectos relevantes desse contexto (circunstância); terá uma noção de como a pessoa vivia
sensorialmente, sua vivência somática, em seu meio (lugar); poderá considerar com maior
propriedade a temporalidade nessa pessoa, se o tempo era subjetivamente curto, longo, fragmentado,
insignificante (tempo); terá ciência de quais eram as relações determinadas a essa pessoa aos 5 anos
de idade, se era com seus irmãos, com seus amiguinhos, sua professora, seu ursinho de pano ou
talvez com ela mesma (relação). O filósofo terá um entendimento da interseção entre as 5 categorias.

Será tranqüilo então constatar que às vezes a categoria circunstância pode se manter a mesma por
quase toda a vida da pessoa ou mudar a cada ano e qual as implicações disso; quais os tipos de
relacionamentos (relação) que a pessoa teve ao longo da vida, e assim por diante. O filósofo
conhecerá dados surpreendentes.

Por exemplo, vamos considerar a categoria tempo. Há pessoas que se estruturaram de modo a viver
predominantemente no futuro, de um modo tal que se o filósofo quiser trabalhar o presente ou o
passado com elas vai causar desde um embaraço até choques violentos de representação.

Em outras ocasiões virão à clínica pessoas com orientação temporal ligada predominantemente ao
passado; parece que vivem lá... Querem resolver assuntos vencidos, não para elas, óbvio. Um
exemplo pode ser a pessoa que deseja muito entender por que foi infeliz em um relacionamento
qualquer ou entender por que “jogou a vida fora”.

Fonte: Filosofia Clínica - Propedêutica

Lúcio Packter, obra publicada em 1997


Considerações Diversas

A pertinência dos Exames Categoriais consiste no conhecimento do universo no qual está


inserido o partilhante e nas relações estabelecidas entre ele e esse universo. Há casos em
que a problemática apresentada encontra-se nesse universo: circunstâncias adversas,
relações conflituosas, dificuldades para lidar com o tempo ou com o ambiente. Noutros
casos as respostas para o Assunto Último necessitam alterações, modificações nas
Circunstâncias: quais as possibilidades concretas existentes para isso? Que possibilidades
poderiam ser construídas de acordo com o universo do partilhante? Há casos em que as
Circunstâncias não precisam ser modificadas, não é esse o objetivo, pode tratar-se de
ausência de Submodos para lidar com as questões, ou ainda choques na Estrutura de
Pensamento, que precisam ser trabalhados. Ainda assim, o conhecimento dos Exames
Categoriais nos fornecerá as possibilidades circunstanciais para o encaminhamento do
trabalho clínico.

Metodologicamente, durante os Exames Categoriais, o filósofo clínico assume a postura


Fenomenológica: atém-se à descrição do partilhante, relata literalmente cada Categoria,
sem pretensões a explicações ou interpretações. A necessidade de compreensão do
processo de construção histórico das categorias leva à utilização do método histórico.
Acompanhar a história do partilhante, considerando que este processo permitirá
compreender seus modos de ser. O ser humano constrói-se, torna-se o que é através de
sua história. Considerando não apenas o subjetivo, mas o mundo no qual este sujeito está
inserido, dados observados empiricamente fundamentam o trabalho clínico, o Empirismo
faz-se presente.

Somando essas indicações metodológicas ao fato de serem as categorias não apenas


tipos, mas formas lógicas que possibilitam e limitam o conhecimento, os Exames
Categoriais têm fundamentação metodológica na Lógica, na Fenomenologia, no
Historicismo, no Empirismo, na Analítica da Linguagem... enfim, a grande “colcha de
retalhos” teórica que permite um recorte epistemológico acordante com as necessidades
clínicas. Desta forma, os sistemas filosóficos são colocados à disposição das
necessidades do partilhante, sem orientarem uma interpretação prévia. Ou seja, o
conhecimento produzido por todos esses anos de construção filosófica pode ser útil para
nos auxiliar a lidar com as questões cotidianas, desde que não seja compreendido de
maneira dogmática – o que o faria, imediatamente, deixar de ser filosofia.
CATEGORIA ASSUNTO

Assunto: Objeto do que se trata a clínica;

Assunto imediato: as queixas iniciais, os sintomas do(s) assunto(s) último(s);

Assunto último: questão deveras trabalhada em consultório; as questões fundamentais


na existência da pessoa; problemáticas profundas; as causas da necessidade de uma
terapêutica; as causas dos assuntos imediatos;

"O Assunto, que é a primeira categoria,


informará qual será a(s) questão(s) em
clínica, é o objeto que será tratado em
clínica. Como o Assunto se divide em
Imediato e Último, o primeiro se refere a
questões próximas, evidentes,
sintomáticas, já o segundo se refere ao
que é fundamental na existência do
partilhante.

O Assunto Imediato é como uma dor de


cabeça ao ser reclamada pelo paciente ao
médico, apresentada como algo próximo,
evidente e sintomático. A preocupação
com o ócio proveniente da aposentadoria
que está se aproximando se apresenta
como Assunto Último, que é aquilo que é
fundamental na existência da pessoa.
Assim, a dor de cabeça é sintoma da
preocupação com o ócio trazido pela
aposentadoria. (um exemplo simplista)

Sendo apenas um referencial de começo


terapêutico, o Assunto Imediato pode ter
toda, alguma ou nenhuma resposta às
questões existenciais do partilhante. Ele
poderá se apresentar como questões
aparentes, ou ser o próprio Assunto
Último. É com o Assunto Ultimo que
deverá verdadeiramente se ocupar o
filósofo clínico. Ao filósofo clínico compete
procurar, na historicidade do partilhante,
as variáveis associadas para tentar
identificar o(s) Assunto(s) Último(s).

É possível a pessoa não ter Assunto


Imediato/Último? Sim. O filósofo clínico
pode não ter o objeto de pesquisa, que é o
Assunto da pessoa, ou não saber qual
seja. Pode ser que o Assunto é não ter
Assunto Imediato/Último, e essa seja a
questão a ser trabalhada sendo, então, a
condição para a clínica. Mesmo assim, o
filósofo poderá seguir o trabalho clínico
pesquisando a localização existencial do
partilhante através dos Exames
Categoriais."

(Marcelo Osório Costa , Filósofo Clínico -


Belo Horizonte/MG)

Questões inportantes:

- Alguns partilhantes chegam ao consultório com a vida tão tumultuada que trazem ao
Filósofo Clínico dezenas de assuntos imediatos, como se tudo necessitasse de ajustes,
como se a própria vida como um todo fosse o assunto último. Algumas vezes são pessoas
com uma forte agonia existencial, outras vezes são pessoas que apresentam questões
ligadas a autogenia (organização das coisas), para outras não passa de uma questão de
expressividade/significação, bem como dezenas de outras possibilidades.
- Alguns partilhantes trazem o assunto imediato como sendo algo muito grande, algo com
muita força e urgência. Em alguns casos realmente trata-se de um “atendimento
emergencial”, mas muitas vezes não passa de uma questão linguística, uma significação
com demasiado peso, em outras vezes é aquilo que em linguagem coloquial chamamos de
“fogo de palha”, ou seja, algo que surge como sendo gigantesco, mas logo se mostra
pequeno ou desaparece.
- Algumas pessoas não aceitam tratar o assunto último ou qualquer outro assunto, elas
querem apenas tratar do assunto imediato, de forma objetiva. Nestes casos o Filósofo
Clínico terá que tentar dialogar com a pessoa, algumas vezes trabalhar com o submodo
vice-conceito e em outras simplesmente se limitar ao assunto designado pelo partilhante;
- Algumas pessoas omitem o motivo que as levou para a clínica, elas apenas se limitam a
expressões como “eu não posso falar” ou “eu não quero dizer nada sobre isto”, são
pessoas que algumas vezes buscam apenas um conforto existencial ou ajuda para
superar algo o qual elas não querem compartilhar.
- Existem aqueles partilhantes que alteram o assunto imediato, eles apresentam outras
questões como motivo para virem até o Filósofo Clínico. Quando isto acontece, se a
questão não estiver ligada ao assunto último, normalmente tende a não trazer maiores
problemáticas para a clínica. Algumas vezes o verdadeiro assunto imediato se revela já
nos exames categoriais, algumas vezes durante a historicidade e outras vezes nunca se
revelará e talvez o Filósofo Clínico nem saiba que isto está acontecendo.
- Algumas vezes o assunto último não é um elemento pontual, mas toda uma organização
de fatores e questões, de tal forma muitos dos elementos que compõem a EP se tornam
problemáticos. É uma questão de organização, uma questão ligada ao Tópico 30 -
Autogenia.

- Em clínica, quando identificado que determinado assunto é exclusivamente imediato,


resultante de outros fenômenos, fatores e questões, exceto em casos de urgência, não
prolongamos atenção aos assuntos imediatos, mas sim aos últimos.
CATEGORIA CIRCUNSTÂNCIA

"Aqui levanta-se as variáveis pertinentes, próximas e


longínquas, tudo o que o clínico julga necessário para situar a
pessoa dentro de um quadro mais nítido, como se de linhas
gerais chegassem a uma representação mais minuciosa e
precisa." (Lúcio Packter)

A Categoria Circunstância refere-se aos elementos circunstanciais, ao entorno, ao que


circunda a pessoa e às infinitas relações deste entorno com a subjetividade daquele ser.
Analisemos a seguinte citação: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela não
me salvo eu.” (Ortega y Gasset, 1997)

Nesta categoria estudamos, por exemplo, os elementos circunstanciais de uma caminhada


pela “Beira do Rio Uruguai”, como a chuva, as pessoas presentes, o barulho da água, os
pássaros, a neblina, o vento frio de inverno, os casacos e a capa de chuva, para
posteriormente se estudar a relação disto com o indivíduo na Categoria Lugar. Vejamos a
seguinte citação:

"Este fato é a existência conjunta de um eu ou subjetividade e


seu mundo. Não há um sem o outro. Eu não me dou conta de
mim senão como dando-me conta de objetos do contorno. Eu
não penso se não penso coisas – portanto, ao achar-me a
mim acho sempre diante de mim um mundo. Eu, enquanto
subjetividade e pensamento, me encontro como parte de um
fato dual cuja outra parte é o mundo. Portanto, o dado
fundamental e insofismável não é minha existência, não é eu
existo – porquanto é minha coexistência com o mundo."
(Ortega y Gasset, 1958, p. 153)

Nesta categoria o filósofo clínico observa o contexto, o entorno, o mundo que circunda o
partilhante em suas múltiplas dimensões: cultural, social, familiar, política, educacional,
enfim, tudo o que for circunstancial. São circunstâncias pontuais, como a caminhada pelo
Rio Uruguai, ou macro-circunstâncias como um período da vida ou a vida como um todo, e
aqui devemos considerar que as circunstâncias nem sempre se mantém as mesmas, elas
se alteram. O Filósofo Clínico deverá traçar as diversas circunstâncias vividas por seu
partilhante, observando, em cada nova circunstância, o que se mantém daquilo que é
novo, aquilo que é dado padrão ao longo da historicidade ou dado pontual, específico de
um determinado período da vida. Isso significa, na prática, observar diversos momentos da
história, traçar contextos que hoje são inexistentes, elementos que perderam, que
concedem ou destituem significados, valores, peso subjetivo... O objetivo é compreender o
universo vivido pelo partilhante e como ele se constituiu a partir de tais vivências, mesmo
que sejam passadas e superadas. O que traçar aqui? Tudo? Quase! Uma síntese de cada
contexto vivido e suas determinações, como o partilhante agendou tais circunstâncias na
sua malha intelectiva, qual a influência sobre a sua EP. A pertinência clínica de tais
observações, além da indicação do modo de constituição do partilhante, consiste no
conhecimento das circunstâncias existentes, possíveis e aceitáveis para compor um futuro
uso de Submodos.

É fundamental que a narrativa comece a partir do nascimento da pessoa ou de sua


recordação ou notícia mais distante, no que se refere à própria vida, iniciando-se desde ali
os exames categoriais.

NOTA: costuma-se dizer que na existência dos sujeitos, normalmente a categoria


circunstância é a "categoria mãe de todas as demais categorias", pois é dela que se
originam os assuntos (como circunstâncias presentes e problemáticas), é através dela
que o tempo é percepcionado e com fator algum relacionado (a relação para com o
tempo objetivo e subjetivo enquanto circunstância vivida), e é através dela que a
categoria relação se forma (pois é o objeto da relação uma circunstância do sujeito).
CATEGORIA LUGAR

CATEGORIA LUGAR: sensações, referências mentais e outras quaisquer acerca da


vivência da pessoa no ambiente onde está inserida (relação entre as vivências e os
elementos circunstanciais). Serve para saber como a pessoa se sentiu em cada endereço
existencial no decorrer de sua história e qual a sua representação destas sensações.

A Categoria Lugar, segundo Merleau-Ponty (1994) refere-se à espacialidade do corpo, é o


lugar que o corpo ocupa no mundo, suas relações com o ambiente, com os espaços,
possibilitando, via percepção, as sensações de bem-estar, mal-estar, indiferença – ao
mesmo tempo sensoriais e abstratas – sobre como o corpo vivencia o mundo, os
ambientes, as relações. Trata-se do endereço existencial do partilhante:

Quando me desloco em minha casa, sei imediatamente e sem


nenhum discurso que caminhar para o banheiro significa passar
perto do quarto, que olhar a janela significa ter a lareira à minha
esquerda, e, nesse pequeno mundo cada gesto, cada percepção
situa-se imediatamente em relação a mil coordenadas virtuais.
Quando converso com um amigo que conheço bem, cada uma
de suas expressões e cada uma das minhas incluem, além
daquilo que elas significam para todo o mundo, uma multidão de
referências às principais dimensões de seu caráter e do meu,
sem que precisemos evocar nossas conversações precedentes.
Esses mundos adquiridos, que dão à minha experiência o seu
sentido segundo, são eles mesmos recortados em um mundo
primordial e funda seu sentido primeiro. Da mesma maneira, há
um “mundo dos pensamentos”, quer dizer, uma sedimentação de
nossas operações mentais, que nos permite contar com nossos
conceitos e com nossos juízos adquiridos como com coisas que
estão ali e se dão globalmente, sem que precisemos a cada
momento refazer sua síntese.” (Merleau-Ponty, 1994. p. 182)
O filósofo clínico observará, no histórico do partilhante, as referências a esse endereço
existencial, ao próprio corpo e sua espacialidade, ao sentir-se bem ou mal diante dos
ambientes, das vivências, das relações. Obviamente, cada circunstância poderá
apresentar alterações na categoria Lugar, por isso as categorias Lugar, Tempo e Relação
são derivadas da categoria Circunstância, ou seja, em diferentes circunstâncias,
encontramos diferentes manifestações das demais categorias.

Conhecendo a categoria Lugar o Filósofo Clínico saberá escolher o modo de utilização de


Submodos, o ambiente adequado para tal, assim como necessidades de modificações nos
ambientes frequentados pelo partilhante, entre outras indicações possíveis.

"Ao apurar os dados da categoria Lugar, que é como a pessoa está


sensorialmente em cada endereço existencial, os referenciais do corpo
que indicam situações de problemáticas logo se farão anunciar.

Merleau-Ponty mostra o corpo como uma atividade expressiva que


precisa ser vivida para dar conhecimento a um sentido. Nós vivemos
nas coisas e nas idéias; estamos no corpo enquanto tocamos os
objetos e os habitamos. Toda a forma de expressão, de relação, tudo o
que posso querer, ser ou estar, tudo o que me faz ser no mundo está
vinculado ao meu corpo. As maneiras inversivas que pesquisamos nos
submodos mostram a qualidade desta relação.

Quando o filósofo estiver pesquisando a categoria Lugar (formações do


intelecto e sensações relacionadas ao meio onde a pessoa vive) deve
considerar que o corpo da pessoa é o somatório de seus modos de
existência. Então, em conformação com a interseção estabelecida, o
clínico pode constatar se a pessoa se move com liberdade ou com
dificuldade de expressão, se apresenta um corpo devastado por
moléstia e ocupações da mente com assuntos polutos, se há
confirmação do corpo às assertivas verbais, qual a qualidade da
relação com o ambiente; enfim, se é onde a alma está encarcerada
(Platão) ou se é justamente o meio que nos liberta para a confortável
alegria de apenas viver.

A categoria também pode ser definida como o modo sensorial de ser


da pessoa em cada endereço da categoria anterior, Circunstância.
Quando menciono o termo sensorial estou me referindo a tudo o que a
pessoa vivencia que está diretamente associado aos sentidos e as
vivências proprioceptivas (que é como designa o fisiologista Shenington
a certas percepções internas)." (Lúcio Packter, Caderno A)

A Categoria Lugar se refere a todas as experiências relacionadas às sensações e às


representações intelectivas que a pessoa cria para si mesma. Imagine uma pessoa que
reside em Belo Horizonte, se sente bem com o clima da capital mineira e com o visual da
cidade, mas sente-se apreensiva ao dirigir seu carro pela cidade. Estes dados preenchem
a Categoria Lugar dessa pessoa.

Esta categoria implica, em quase todo instante de sua pesquisa, ao corpo humano. É
possível observar que toda a forma de expressão do partilhante está vinculada ao corpo
porque este é o modo de ser da pessoa no mundo. O Filósofo Clínico, na pesquisa à
historicidade do partilhante, não deve ignorar que a Categoria Lugar forma o intelecto e as
sensações no que diz respeito ao ambiente onde a pessoa vive, e, ademais, o corpo da
pessoa é o somatório de seus modos existenciais.
CATEGORIA TEMPO

Nesta categoria o Filósofo Clínico pesquisará as relações entre o tempo convencionado


(medido mecanicamente – relógio) e o tempo subjetivo vivenciado pelo partilhante,
partindo posteriormente para um estudo das relações entre esta categoria e os elementos
que compõem a Estrutura de Pensamento do indivíduo.

Em seu escrito "Três Diálogos entre Hilas e Filonous", no primeiro diálogo, Berkeley
expõe:

“F. Um movimento real num corpo externo poderá ser


ao mesmo tempo muito lento e muito rápido?

H. Não, não pode.

F...,um corpo que percorre uma milha em uma hora


está animado de um movimento três vezes mais rápido
do que se percorresse uma milha durante três horas.

H. Concordo convosco.

F. E não será verdade que o Tempo é medido pela


sucessão das idéias na nossa mente?

H. Assim é.

F. E não seria acaso coisa possível que as idéias se


sucedessem na vossa mente duas vezes mais rápidas
que na minha própria, ou na de algum espírito de outra
espécie que nós?

F. A uma outra pessoa, por conseguinte, pode parecer


que o mesmíssimo corpo realiza o percurso de certo
espaço em metade do tempo que vos parece a vós. E
para outra relação qualquer o mesmo raciocínio seria
válido. Quer isso dizer: pelos vossos princípios
(admitindo que os movimentos perpecionados existem
ambos no próprio objeto), é possível que um só e
mesmo corpo se mova realmente ao mesmo tempo
com muita rapidez e com muito vagar.”
É fato comum constatar que para alguns a vida passa com muita pressa, enquanto a
outros ela transcorre serena e parece sempre em atraso. O tempo realmente considerável
é o que a pessoa tem representado em si mesma.

Questões na Categoria Tempo também podem ser observadas via analítica de linguagem,
em um estudo dos tempos e modos verbais utilizados pelo partilhante. Por exemplo: o
partilhante narra a sua historicidade conjugando os verbos no tempo presente, mas
quando fala acerca do primeiro casamento conjuga os verbos no passado – a princípio
essa modificação na conjugação verbal nada significa, mas contextualizada e pesquisada
pode indicar questões significativas envolvendo aquele período e a presente categoria.
Também o estudo temporal da linguagem podem demonstrar conectivos entre questões
presentes e passadas, além da forma de estruturação geral das ideias do partilhante no
que tende a influência temporal, sendo então necessários estudos mais aprofundados,
como o das vozes verbais (ativa, passiva e reflexiva).

Por exemplo, “Tu tá gozada”, disse Pedro Bala; usou o presente do indicativo para
expressar que achava isso no momento em que falava: o presente. Cuidando o tempo
verbal utilizado sabemos onde localizar a ação, os fenômenos ou estados: presente
(enquanto falo), pretérito (antes do que estou falando) e futuro (após falar).

Também o modo verbal é importante: as formas que o verbo assume para expressar a
atitude do falante em relação ao fato.

- “Posso fazer outras coisas”, afirma Dora de forma


categórica (Modo Indicativo).

- “Se a polícia pegar a gente não tem nada. Mas se


pegar tu?, disse Pedro Bala exprimindo algo
condicionado ou hipotético (Modo Subjuntivo).

O modo Imperativo refere-se a uma ordem ou súplica:


“Aproxima-te de mim”.

Podemos saber também pelo verbo se uma pessoa


pratica ou sofre uma ação:

- “A moça beijou o rapaz.” Na voz Ativa o sujeito pratica


a ação;
- “O rapaz foi beijado pela moça. Na voz Passiva o
sujeito sofre a ação;

- “A moça felicitou-se”. Na voz Reflexiva o sujeito


pratica e sofre a ação;

Para o nosso trabalho cabe lembrar também o Infinitivo Impessoal: ‘Vamos deixar disso’;
‘Amar’; ‘O viver em paz’. A ação é manifestada de maneira indeterminada, sem definição
precisa de tempo e sujeito;

Quando alguém afirma: ‘eu amei muito’, a pessoa dá contas de uma elaboração mental
onde as sensações e o intelecto combinaram juízos de tal ordem que ela assim concluiu.
“Eu”, o sujeito, “amei”, pretérito perfeito, indicando uma ação consumada. Portanto, a
pessoa naquele momento parou de amar oque amou.

“Depois que a minha filha caçula casou a casa ficou vazia. E nós perdemos o ar saudável
da vida”, confessa certa pessoa. Ao usar o pretérito para comunicar o Assunto, entendo
por isso o forte vínculo que essa pessoa estabelece com o passado. Em outra pessoa, o
vínculo pode dar-se no futuro: ‘Quando a minha filha casar a casa ficará vazia. E nós
perderemos o ar saudável da vida’.

Existem relações entre a Categoria Tempo e a Categoria Circunstância que podem ser
observadas de diferentes formas, a mais simples é por referências diretas, como por
exemplo:

- naquele lugar o tempo parece durar mais;

- aquilo faz o tempo passar tão rápido;

- quando eu percebi aquilo já havia acabado, tão rapidamente;

Nestes casos a Categoria Tempo poderia ser considerada como uma especificidade da
Categoria Lugar, uma vez que se reporta às vivências do indivíduo em decorrência de
determinadas circunstâncias. No entanto, esta afirmação não é válida para uma série de
questões relacionadas a esta categoria. Uma destas questões diz respeito ao
endereçamento temporal das vivencias subjetivas do partilhante, tais como:

- partilhantes que vivem subjetivamente no passado;


- partilhantes que vivem subjetivamente no futuro;

- partilhantes que se perdem temporalmente, não tendo um endereçamento fixo;

Alguns exemplos típicos de questões envolvendo a orientação temporal são:

- Há pessoas que se estruturaram de modo a viver predominantemente no futuro. Para


pessoas assim tratar de questões presentes ou passadas pode gerar desde embaraço até
choques violentos de representação. Alguns cuidados aqui são necessários para não se
confundir essa orientação estrutural com o Tópico Buscas (T11).

- Em outras ocasiões virão à clínica pessoas com orientação temporal ligada


predominantemente ao passado, são pessoas que o vivem subjetivamente no presente,
pessoas que se reportam a ele constantemente, também pessoas que querem resolver
assuntos vencidos ou que não conseguem atualizar sua percepção acerca das demais
categorias (lugar, circunstância e relação), pois não encontram-se subjetivamente no
presente.

- Em alguns casos a pessoa só vai conseguir trabalhar questões de outra temporalidade


desde que constantemente se reporte ao temo para o qual possuí orientação estrutural.

Existem, no entanto, relações mais sutis entre as Categorias Tempo, Circunstância e


Lugar, como as Relações Cruzadas, quando alguém, em determinado lugar (categoria
circunstância), sente-se emocionado (categoria lugar), pois ele lhe remete a tempos
passados (categoria tempo).

A Categoria Tempo também engloba as seguintes questões:

- amadurecimento tópico;

- atualização tópica;

- desfechos (vivências que não acabaram);

Algumas questões interessantes também devem ser notadas:

- O indivíduo dificilmente tem um tempo subjetivo linear, atômico, certinho como o


compasso de um relógio! Quase nunca é assim.

- Note, por exemplo, afirmações como “a vida é breve; você é ainda criança, tem muito
tempo para aprender; o tempo se esvai pelos dedos como a água; a vida é como um
sopro, quando se percebe ela já passou; entre a vida e a morte sempre há muito tempo; o
tempo é uma ilusão; o tempo é uma realidade; as coisas acontecem muito depressa;
nossa, como as coisas passam devagar!; o mundo dá voltas muito lentamente; etc etc”.

- Há quem tenha relatos extensos sobre pequenas passagens e também narrativas breves
para décadas inteiras de vida. São muitos os referenciais a respeito do tempo: os tempos
verbais, a distância entre os eventos, o modo como são descritas as ações, a duração, a
extensão de um fato, as correlações simultâneas e tantos mais.

- Alguns indivíduos têm especificado, tão exatamente como evolui a marcação em uma
régua, o momento de casar, de ter filhos, de viver, de morrer... outros não associam tais
compromissos ao tempo, mas usam uma espécie de escala que identifica o que
aprenderam de bom em cada etapa de vida; para ainda outros, o tempo parece não ter
importância alguma. Apenas vivem e isso parece bastar. Há infindáveis maneiras de
mensurar e de entender e de vivenciar o tempo.

Além da indicação da situação temporal das questões do partilhante, a Categoria Tempo


permite também o conhecimento do tempo necessário para o amadurecimento das
questões trabalhadas em clínica, o tempo de acompanhamento após a utilização de
submodos*, o tempo necessário para a obtenção de resultados e outras diversas questões
relacionadas.

*Submodos: procedimentos clínicos aplicados...


CATEGORIA RELAÇÃO

A Categoria Relação diz respeito ao comportar-se de determinada maneira em referência


a alguma coisa, segundo Aristóteles, tendo fundamentação também nos trabalhos de
Martin Buber e Emmanuel Levinas, e assim como no conceito de Interseção, dedica-se à
observação das relações vivenciadas pelo partilhante, tais como com ele mesmo, com
outras pessoas, coisas, instituições, animais de estimação, atividades e etc. Quais são as
relações, com quem ou com o que elas se estabelecem e qual a qualidade destas relações
em cada endereço da Categoria Circunstância, é isto que pesquisa o Filósofo Clínico
nessa Categoria.

A Relação é uma especialização dos jogos comunicativos. Em conformação com o Lugar,


Tempo e Circunstância, a Relação é sempre específica e individual.

Esta categoria observa as interseções entre a pessoa e o objeto de referência, o modo


como se comporta a pessoa em relação ao que se quer considerar, normalmente das
seguintes formas:

- Relação Positiva (+): aquela que é subjetivamente boa no sentido de bem estar entre
ambos.

- Relação Negativa (-): subjetivamente ruim, causando mal estar entre ambos.

- Relação Confusa: as pessoas envolvidas não sabem determinar propriamente o que


estão vivenciando.

- Relação Indefinida: aquela que oscila com frequência suficiente, de tal modo que não se
pode entendê-la.

Aprendemos, em resumo, que ao longo da vida cada pessoa cria um modo íntimo de se
relacionar com as coisas, o que inclui a relação com ela mesma, a isso chamamos
representação de mundo (Arthur Schopenhauer). Conforme a representação de mundo
que desenvolveu, que pode também ser chamada de “o modo de ser da pessoa no
mundo”, ela mensura e vivencia o que lhe é apresentado nas contingências e no devir da
existência.

Em clínica o Filósofo precisa se situar em relação a pessoa, saber como se dá a relação


de ambos através de contextos históricos, geográficos, temporais, circunstanciais,
relacionais, os modos com que se estabelece a interseção (Cantor). Interseção (Cantor)
refere-se à maneira como é e se desenvolve a relação entre as pessoas em questão, aqui
inicialmente entre o Filósofo Clínico e o partilhante. É evidente que tal qualidade de
relação orientará grande parte do trabalho clínico e que ela varia caso a caso. Imagine, por
exemplo, que a qualidade da relação (interseção) que cada um tem com a sua mulher é
diferente da que estabeleceu com a sua filha, elas são diferentes e ocupam e determinam
circunstâncias diferentes.

A Categoria Relação identifica a qualidade de interseção entre o sujeito e o objeto. Sujeito,


a princípio, é a pessoa que nos procura, e Objeto é tudo o que entra em relação com ela
durante a pesquisa clínica. Além disso, a pessoa pode estar se relacionando consigo
mesma, sendo então Sujeito e Objeto a um só tempo, como quando ela reporta a
sensação de prazer que sente ao estar sozinha em casa. Também a pessoa é Objeto se,
por exemplo, é tomada em relação a outro Sujeito, como o Filósofo Clínico, por exemplo.

Na prática é algo facilmente identificável. Quando for confusa a identidade do Objeto,


talvez seja oportuno saber por que isso ocorre. Talvez a pessoa esteja confusa quanto ao
que vivencia, talvez o Objeto de relação seja apenas um coadjuvante ao Objeto que de
fato importa e que não aparece. Por exemplo: posso falar contra o casamento enquanto
instituição, mas tenho em meu íntimo que isso é apenas uma resposta à péssima relação
que venho mantendo com a minha esposa.
RESUMO DOS EXAMES CATEGORIAIS

De início pouco se sabe sobre as vivências e experiências do partilhante: aquele que


procura pelos serviços do filósofo clínico. Mas, o que este sabe de início? Apenas dados
trazidos através dos pré-juízos, que são verdades subjetivas do filósofo clínico antes da
experiência vivida, como, por exemplo, o partilhante está com algum propósito; tem a pele
escurecida pelo sol; veste-se e se expressa de certo modo, e assim por diante. Os pré-
juízos, por parte do filósofo clínico, como do partilhante, podem ser compreendidos como o
início, ou como o fim da clínica porque podem ser um impedimento à interseção. Por estes
motivos, é indicado, no início da terapia filosófica, respostas às perguntas feitas pelo
partilhante acerca de sua queixa inicial: “Ainda nada sei”; “Vamos trabalhar e procurar
conhecer um pouco mais”; “Precisamos averiguar mais um pouco”; “Estamos
pesquisando”. Além disto, é tarefa do filósofo clínico proferir tais respostas às perguntas do
partilhante após a aplicação dos Exames Categoriais, salvo em casos emergenciais.

O Exame Categorial é constituído por cinco categorias: Assunto Imediato/Último,


Circunstância, Lugar, Tempo e Relação. Cada categoria permite pensar tudo aquilo que
chega via intuição, malha intelectiva ou experiência sensível. Então, o objetivo
desteexame é localizar o partilhante existencialmente formando, se possível, um conceito
bem estruturado do mundo do partilhante, para tornar uma representação do filósofo
clínico da representação do partilhante. A trajetória do processo terapêutico filosófico se
apresenta através do Exame Categorial, incluindo a Divisão e os Enraizamentos para a
elucidação de segmentos históricos e termos na historicidade do partilhante; montagem da
Estrutura de Pensamento; Autogenia; Planejamento Clínico; e, aplicação dos Submodos.
Importante não perder de vista que é ético começar a clínica através
dos ExamesCategoriais.

O Assunto, que é a primeira categoria, informará qual será a questão e o jogo lingüístico
em clínica, é o objeto que será tratado em clínica. Como o Assunto se divide em Imediato
e Último, o primeiro se refere a questões próximas, evidentes, sintomáticas, já o segundo
se refere ao que é fundamental na existência do partilhante. Mesmo que o terapeuta tenha
suas opiniões a respeito do Assunto da pessoa, este é concebido como o resultado da
pesquisa que o filósofo faz junto à pessoa sendo determinado pelo partilhante.

O partilhante, ao se mover em direção existencial à clínica procurando pelos serviços do


filósofo clínico, possivelmente, traz um Assunto Imediato que poderá ser, por exemplo, um
casamento que está em ruínas, um amor não correspondido, desemprego,
desorganização temporal, etc. Para que seja possível a identificação do Assunto Imediato
a partir da história da pessoa, é necessário que no primeiro contato (não significa o
primeiro encontro) o filósofo clínico colha o máximo de circunstâncias relacionadas ao
Assunto Imediato. É producente que o terapeuta entenda que o Assunto Imediato poderá
ser narrado de forma solta, confusa ou contraditória ou, até mesmo, estar oculto. Além
disto, ele pode ser identificado como o sintoma existencial de algo maior, que é o Assunto
Último.

É na versão existencial, contada pela própria pessoa e sem maiores interferências do


filósofo clínico, que o partilhante terá a chance de colocar seu Assunto Imediato. Este se
dará num contexto histórico, que é a própria história de vida da pessoa, na qual esta se vê
como parte possibilitando a interpretação de forma ordenada e sistemática de sua vida.
Somando a isto, o filósofo clínico terá a possibilidade de entender e aproximar, via
interseção, da pessoa e de sua estrutura de pensamento.

O Assunto Imediato é como uma dor de cabeça ao ser reclamada pelo paciente ao
médico, apresentada como algo próximo, evidente e sintomático. A preocupação com o
ócio proveniente da aposentadoria que está se aproximando se apresenta como Assunto
Último, que é aquilo que é fundamental na existência da pessoa. Assim, a dor de cabeça é
sintoma da preocupação com o ócio trazido pela aposentadoria.

Sendo apenas um referencial de começo terapêutico, o Assunto Imediato pode ter toda,
alguma ou nenhuma resposta às questões existenciais do partilhante. Ele poderá se
apresentar como questões aparentes, ou ser o próprio Assunto Último. É com o Assunto
Ultimo que deverá verdadeiramente se ocupar o filósofo clínico. Ao filósofo clínico compete
procurar, na historicidade do partilhante, as variáveis associadas para tentar identificar o
Assunto da pessoa.

É possível a pessoa não ter Assunto Imediato/Último? Sim. O filósofo clínico pode não ter
o objeto de pesquisa, que é o Assunto da pessoa, ou não saber qual seja. Pode ser que o
Assunto é não ter Assunto Imediato/Último, e essa seja a questão a ser trabalhada sendo,
então, a condição para a clínica. Mesmo assim, o filósofo poderá seguir o trabalho clínico
pesquisando a localização existencial do partilhante através dosExames Categoriais.

Circunstância, sendo a segunda categoria, é considerada como o conjunto de todas as


singularidades do partilhante que seguem a uma situação. É o mesmo que as
manifestações dos modos de ser de alguém que acompanham a pessoa interna e
externamente.
Os dados que preenchem a Categoria Circunstância são aqueles pertinentes em relação
ao Assunto Imediato/Último. O filósofo clínico deverá identificar as variáveis circunstanciais
tendo como finalidade situar a pessoa dentro de um quadro mais nítido, é o mesmo que
dizer que o terapeuta parte do geral para o particular. Uma leitura incompleta, confusa ou
errônea das circunstâncias advindas da historicidade daquele que procura o terapeuta,
pode deixar o filósofo clínico sem pontos de interseção com o partilhante. Assim, o
resultado da leitura que se faz do relato da historicidade, para identificar as variáveis que
preenchem a Categoria Circunstância, é proveniente de maior ou menor interseção com o
partilhante.

O relato da história de vida do partilhante, após a narrativa do Assunto Imediato, se


houver, deverá se iniciar a partir de seu nascimento ou de fatos mais distantes. É
importante compreender que tal relato começa com perguntas do filósofo clínico como, por
exemplo, “Onde você nasceu?”, “O que faziam os seus pais?”, “Como era a época ou
localidade?”. Provavelmente, a partir disto, o partilhante entenderá, à sua maneira, que o
terapeuta está interessado em sua historicidade e comece a relatá-la por si mesmo. Ao
filósofo clínico é correto, ao iniciar o relato da historicidade, que proceda apenas
Agendamentos Mínimos que são referenciais mais ou menos seguros para iniciar a clínica
com o intuito de não direcionar o pensamento do partilhante deixando que a sua história
de vida seja contada por ele mesmo.

Estas intervenções são feitas através de perguntas como “E então?”, “E a partir daí?”,
“Como segue sua história a partir desse momento?”, e assim por diante. Esses
agendamentos servem para que a pessoa narre a sua história por ela mesma de modo
ordenado, sistematizado e sem saltos temporais ou lógicos. Ordenado significa que a
história deverá ter um princípio, meio e fim; sistematizado implica que os termos
subseqüentes tenham vinculação com os antecedentes; e, sem saltos temporais ou
lógicos é o mesmo que a pessoa contar sua história da seguinte maneira: 0, 1, 2, 3, 4...
8...12....10...15... 40 (estes números representam as idades do partilhante). Não é
permitido à pessoa, por exemplo, narrar fatos dos quarenta anos de idade, depois dos
vinte e cinco anos, segue contando dos quatorze anos de idade e voltar aos quarenta e um
anos de idade. Esse “salto pipoca”, termo utilizado por Packter, não é permitido em
Filosofia Clínica. É tarefa do filósofo clínico cuidar os saltos temporais ou lógicos.

Poderá acontecer de a pessoa não se lembrar de eventos acontecidos entre os vinte e


cinco anos aos quarenta anos de idade, e o que isto significa? Deve-se compreender que
esta lacuna histórica não é um vácuo na malha intelectiva da pessoa, mas há alguma
razão para existir. Por exemplo, por algum motivo a pessoa não se lembra dos fatos e o
que os envolve. Esta poderá ser a forma que ela resolveu suas questões ligadas a essa
época de sua historicidade. Para este entendimento é necessário a montagem da
Estrutura de Pensamento que é resultante dos ExamesCategoriais. A ética do Filósofo
Clínico propõe respeito à forma como o partilhante resolve suas situações existenciais.

É contraproducente ao terapeuta trabalhar lacunas históricas, ou seja, saltos temporais ou


lógicos sem os Exames Categoriais e a montagem da Estrutura de Pensamento. Este fato
poderá provocar certa mutilação existencial na pessoa, e por este motivo certa
desestruturação de pensamento. Havendo vários saltos temporais ou lógicos o filósofo
clínico poderá usar o procedimento denominado Divisão. A exceção em Filosofia Clínica,
no que se refere aos procedimentos clínicos, será em casos emergenciais nos quais há
permissão da intervenção do filósofo clínico sem a aplicação dos ExamesCategoriais e a
montagem da Estrutura de Pensamento.

Independente da quantidade e da qualidade dos fatos da história de vida do partilhante é


tarefa do filósofo clínico ajudá-lo a contá-la de modo que seja compreensível para ambos.
É através da historicidade da pessoa que o filósofo clínico fará um estudo sobre as
possibilidades iniciais e seguir em clínica, dando a ele parâmetros mais seguros para
orientar e encaminhar a pessoa se for o caso, a outros profissionais, como: psiquiatra,
neurologista, clínico geral, cardiologista, etc. Diante disto, é possível mencionar alguns
aspectos da Filosofia Clínica como, por exemplo, pode ser caracterizada como
multidisciplinar e sendo mais um instrumental para o ser humano.

A procura pelos serviços do filósofo clínico; o próprio contato entre partilhante e filósofo; o
ambiente do consultório e suas composições; o modo de se vestir e de se comportar do
filósofo clínico; o clima; a temperatura; os acontecimentos no trajeto para chegar ao
consultório; ou, a estação do ano são vistos como agendamentos, dentre outros milhares
eventos que podem surgir. Percebe-se que a clínica poderá se iniciar com vários
agendamentos podendo ou não interferir no processo clínico filosófico. É através
doExame Categorial que o terapeuta poderá perceber a razão de tais agendamentos no
partilhante e tentar identificar, se possível, a importância em sua malha intelectiva,
influência nas interseções, etc. É imprescindível que o filósofo entenda que “a priori” não
se deve afirmar algo sobre a pessoa que o procura.

Lugar é a mensuração como a pessoa sente e o que pensa acerca do ambiente no qual
está inserida. É a elaboração sensorial e mental do partilhante ao vivenciar situações que
se referem ao local geográfico. A Categoria Lugar se refere a todas as experiências
relacionadas às sensações e às representações intelectivas que a pessoa cria para si
mesma. Imagine uma pessoa que reside em Belo Horizonte, se sente bem com o clima da
capital mineira e com o visual da cidade, mas sente-se apreensiva ao dirigir seu carro pela
cidade. Estes dados preenchem a Categoria Lugar dessa pessoa.

Esta categoria implica, em quase todo instante de sua pesquisa, ao corpo humano. É
possível observar que toda a forma de expressão do partilhante está vinculada ao corpo
porque este é o modo de ser da pessoa no mundo. O filósofo clínico, na pesquisa à
historicidade do partilhante, não deve ignorar que a Categoria Lugar forma o intelecto e as
sensações no que diz respeito ao ambiente onde a pessoa vive, e, ademais, o corpo da
pessoa é o somatório de seus modos existenciais.

Lugar, então, é o modo sensorial de ser da pessoa em cada endereço existencial da


Categoria Circunstância. O que significa sensorial? Este termo se refere a todas as
vivencias da pessoa, ou seja, ao que está diretamente associado aos cinco sentidos
(visão, olfato, paladar, audição e tato), e também às vivências proprioceptivas.

A propriocepção é um sentido resultante do desenvolvimento de um mapa interno do corpo


no cérebro humano. Com este desenvolvimento de um mapa o ser humano não precisa
monitorar tudo visualmente o tempo todo. No momento em que a propriocepção não
funciona bem pode ser um problema sério para a pessoa. Os olhos e ouvidos, por
exemplo, enviam informações para o cérebro sobre as coisas que se vê e se ouve; os
músculos e as articulações, por sua vez, percebem a posição do corpo humano e enviam
tal informação para o cérebro. Para saber onde as partes do corpo estão e planejar tais
movimentos é necessário a informação enviada ao cérebro pelos músculos e articulações.
Casos de pessoas que se manobram no espaço de modo a não bater nas coisas, ou
sabem e mantém certa distância das pessoas que estão à sua frente, ou sabem a
quantidade de pressão em sua mão para evitar a quebra de um lápis, exemplificam como
o sentido de propriocepção está funcionando bem.

Como se percebe a propriocepção ajuda as pessoas em funções e ações básicas do


cotidiano, mas quando não funciona bem pode acarretar dificuldades. O que isto significa?
Haverá um gasto maior de energia porque a pessoa deverá prestar atenção em coisas que
deveriam acontecer automaticamente como, por exemplo, usar sua visão para fazer
determinados ajustes nas situações vivenciadas. A pessoa, com isto, poderá sentir
desajeitada, medo e frustrada em alguns momentos experienciados em seu ambiente.
Imagine uma pessoa que tem que descer uma escada, degrau por degrau, mas não sabe
onde estão os seus pés, e uma forma de ajustar-se à situação é através da visão, ou seja,
olhar para seus pés para realizar o movimento.

Para que o filósofo clínico identifique correto e eticamente os dados que preenchem a
Categoria Lugar é producente que deixe à pessoa a tarefa de expressar o que vivenciou e
o que deixou de vivenciar sensorialmente. Durante a narrativa da história de vida, caso o
terapeuta pergunte ao partilhante como se sentia, como via, como estava em sua própria
pele e outros tantos exemplos, estará agendando indevidamente termos na malha
intelectiva da pessoa e direcionando o processo filosófico clínico.

Deve ser destacado, nesta categoria, o que é sentido daquilo que é expresso. O
partilhante pode expressar que vê, sente ou pensa algo, mas não ter relação com o
sensorial. Suponha uma pessoa que expressa que vê a face de Deus todas as noites em
seu quarto ao se deitar para dormir, mas que não há qualquer registro sensorial em sua
historicidade. É comum para essa pessoa usar o termo “ver” para as abstrações. O uso da
desconstrução, através dos procedimentos clínicos filosóficos Dados Divisórios e
Enraizamentos, pode ser um bom instrumental para esclarecer termos equívocos para,
possivelmente, torná-los unívocos. Neste exemplo, o inverso, em relação ao que é
expresso e sua relação com o sensorial, poderá ser possível.

Quando o partilhante relatar questões existenciais em sua história de vida que indicam
relações entre o tempo convencionado e o tempo subjetivo, o filósofo clínico preencherá,
com tais dados, a Categoria Tempo. O tempo convencionado é concebido por meio de
consenso social como, por exemplo, o tempo dado através do relógio. O tempo que o
terapeuta irá considerar será aquele que a pessoa representa em si mesma, isto é, o
tempo subjetivo. Uma pessoa que narra que ela vive até os dias atuais a dor de sua
separação matrimonial; que a vida passa com muita pressa; quando está no trabalho o
tempo demora muito para passar, em princípio são indicações temporais.

Sobre a Categoria Tempo, o filósofo clínico irá considerar também os tempos, os modos e
as vozes verbais. Os tempos verbais são utilizados para localizar a ação, os fenômenos ou
estados: pretérito (antes do que o partilhante está falando), presente (enquanto o
partilhante está falando), futuro (após o que o partilhante está falando). Os modos verbais
são usados para expressar a atitude do falante em relação ao fato: indicativo (certeza da
ação), subjuntivo (apresenta dúvida), imperativo (apresenta ordem, desejo, conselho, etc.).
As vozes verbais apresentam se a pessoa pratica ou sofre uma ação: ativa (sujeito pratica
a ação), passiva (sujeito sofre a ação), reflexiva (sujeito pratica e sofre a ação). Imagine
uma pessoa que diz o seguinte: “Eu sou uma leoa em minha casa”. Neste exemplo temos
que o tempo verbal está no presente, o modo verbal está no indicativo e a voz verbal é
ativa. Assim, esta pessoa pratica a ação no presente e algo certo em sua narrativa. (É
importante salientar que exemplos, como tais, estão fora de contexto histórico para uma
análise mais aprofundada).

A Categoria Tempo, como todas as outras, não deve ser figurada isoladamente e informa
como a pessoa relaciona seu tempo interno em direção ao tempo objetivo que é posto pela
sociedade. Quase nunca o partilhante apresentará um tempo subjetivo linear e equitativo,
como é o tempo objetivo, por exemplo, um período de alegria poderá ter uma velocidade
lenta e um tempo maior, enquanto outros períodos de alegria poderão ter uma velocidade
rápida e durar apenas segundos ou minutos, talvez.

O tempo em clínica filosófica é plástico e, por isto, não é igual para todas as pessoas,
onde a estruturação temporal de cada indivíduo difere da convenção temporal de uma
sociedade. Vários são os indícios temporais quando se depara com relatos como, por
exemplo, “O ano está passando tão depressa!”, “De um Natal a outro chega num minuto!”,
“Até hoje vivo intensamente a morte de minha esposa”, “Não sei o porquê, mas todos os
meus namorados me remetem a meu primeiro namorado, será que ainda o amo?”.

A quinta categoria é denominada Relação podendo ser compreendida como a qualidade


estabelecida quando da interseção, que é a maneira como é e se desenvolve a relação
entre o sujeito e o objeto. Sujeito pode ser o partilhante ao se relacionar com pessoas,
idéias, etc., sendo tais objetos do sujeito partilhante. O filósofo clínico também pode ser
sujeito enquanto o partilhante o objeto, e vice-versa. Outras relações também podem
surgir, enfim, o sujeito é aquele que analisa e o objeto é o analisado na pesquisa clínica.
Uma boa maneira de o terapeuta se tornar conhecedor dos sujeitos e objetos é aproximar-
se ao máximo da Estrutura de Pensamento do partilhante.

Tenha a idéia de uma pessoa que narre o seguinte: “Eu não lido bem com o meu gerente,
e sei também que ele não lida bem comigo, mas temos que nos agüentar mutuamente”.
Há aqui indicações de relações com qualidades de interseção negativa, ou seja, é ruim
para as duas pessoas envolvidas na relação. “Tem momentos em sala de aula que eu
percebo que os alunos me entendem, que dizem que estão entendendo o conteúdo e até
consigo brincar com todos eles, mas tem dia que não flui nada, você entende? E eu fico
sem entender o que está acontecendo, sai do meu controle”. Há indicações de relações
com qualidade de interseção confusa, ou melhor, ora boa ora ruim para ambos. “Ah, eu
adoro os meus filhos e eles me adoram, sabe. É uma coisa de Deus nossa vivência lá em
casa”. Há indícios de relações com qualidade de interseção positiva, ou seja, é bom para a
pessoa e para os filhos. “Eu estou tão bem comigo mesma, adoro meu corpo, estou no
peso que eu sempre sonhei, acho minhas roupas lindas e quando eu saio nas ruas sinto
tão à vontade com as pessoas”. Uma pessoa que se apresenta em interseção positiva
consigo mesma.

Como se percebe o Exame Categorial tem ampla importância no processo terapêutico


filosófico. Tal exame se apresenta como o início da clínica confirmando a sua significância
porque traz a historicidade do partilhante, que é a alicerce do processo. Através
do Exame Categorial é possível erguer a Estrutura de Pensamento, conceber a Autogenia,
o Planejamento Clínico e a aplicação de Submodos. Uma clínica que se faz sem a
aplicação deste exame é considerada como um trabalho que surge em caminhos distantes
da ética do Filósofo Clínico, sendo a única exceção as situações emergenciais.
O Exame Categorial situa, então, a pessoa em sua existência.

Marcelo Osório Costa.

Filósofo Clínico - Belo Horizonte/MG.


RESUMO II - EXAMES CATEGORIAIS

Os Exames Categoriais são exames iniciais, consistem em conhecer o universo no qual o


partilhante está inserido: seu contexto social, político, econômico, cultural, educacional,
familiar, suas relações, como lida com o tempo, com o próprio corpo, com o ambiente, com
suas idéias, onde mora, em que trabalha, o que estuda, o que viveu, etc.

A Estrutura de Pensamento nos fornece o modo como essa pessoa se estruturou a partir
das vivências de seu universo. São trinta tópicos que abordam desde como o

Os dados dos Exames Categoriais nos dão um quadro geral, um contexto no qual a
pessoa se situa.

A Circunstância é o universo no qual ele está inserido, cultura, linguagem, hábitos,


sociedade, enfim, ambiente, tudo o que se passa à sua volta. Pensando na acepção
Horteguiana, se eu sou eu e minha circunstância é fundamental que entendamos a
circunstância não como algo distinto do sujeito, mas como algo que é parte da constituição
desse sujeito, assim como é constituída por esse sujeito. Enfim, na circunstância
observamos esse movimento.

Categoria Lugar, observamos como a pessoa se sente nesses ambientes nos quais está
inserida, no ambiente desse universo. Dados sobre o próprio corpo e sua inserção nesse
ambiente encontram-se nessa categoria. Dados das abstrações provocadas à partir das
afetações no qual está inserida também entram aqui.

O Tempo, como a pessoa lida com o tempo, onde ela se situa no tempo. E as relações
(Relação) com quem, ou o que essa pessoa se relaciona.

Observem que se nós formos traçar as circunstâncias de uma pessoa durante a sua vida,
nós teremos diferentes circunstâncias. Em alguns casos as mudanças são poucas, quase
nada, que podemos dizer que a pessoa viveu uma mesma circunstância sem grandes
modificações. Essa plasticidade da circunstância, seja ela grande, pequena, em sua
margem, precisa ser considerada e, principalmente, o que esses movimentos provocam
em termos de movimentos estruturais nessa pessoa. O que digo com isso é que não
dissociamos os Exames Categoriais da Estrutura de Pensamento, assim como não
dissociamos o eu de sua circunstância.

Ao observarmos a Estrutura de Pensamento, se pegarmos cada um dos 30 tópicos


isoladamente, teremos tantos, mas tantos dados que ficaremos perdidos. Há critérios e os
critérios adotados para a organização deste material são Dado Padrão, ou seja, aquilo que
se mantém ao longo da vida do partilhante; o Assunto, que pode ser o Assunto Imediato
ou Último (e até agora eu não falei de Assunto Último, mas vamos falar daqui a pouco); e o
Dado Atualizado, ou seja, como a pessoa está hoje. Vejam bem, tudo aquilo que surgir no
discurso do partilhante que estiver relacionado ao Assunto será destacado, tudo aquilo que
for observado como Padrão um será destacado e a forma como ele se encontra hoje
também será destacado. “Como identificar um Padrão” geralmente é pergunta fundamental
que os estagiários fazem. Ou mais “eu não consigo identificar um Padrão, eu estou
perdido”. Calma, às vezes a identificação de um Padrão exige que se chegue em um
determinado ponto da história; às vezes exige que se chegue a um certo grau de
intimidade com a história de vida da pessoa e isso necessita da construção de uma
interseção anteriormente, para que a pessoa possa colocar os dados com bastante
segurança e tranquilidade. Há partilhantes que passa muitas consultas contando
banalidades, falando superficialmente daquilo que acontece, para, em seguida, só depois
de um bom tempo de clínica, terem confiança suficiente para propor aquilo que é
fundamental; outros já colocam o que é fundamental logo no primeiro momento. Então,
Assunto Imediato ou Último, Dado Padrão e Dado atualizado são os critérios.

Assunto Último, como prometido, lá vai. Como descobrir o Assunto Último? O Assunto
Último é a questão a ser trabalhada na clínica. Como identificá-lo? Ele surgirá, a pessoa
trará literalmente em forma de objetivo, onde quer chegar, ou ele será resultante da
observação das relações entre os diferentes Assuntos Imediatos trazidos, ou ele surgirá a
partir da leitura autogênica que permitirá a identificação de um choque, por exemplo, ou da
ausência de um submodo para efetivar determinados pontos da Estrutura de Pensamento
do partilhante.

As categorias em Filosofia Clínica

Inspirado nos conceitos aristotélico e kantiano de Categoria, mas considerando-as como


formas para identificar semelhanças e diferenças no transcurso de cada investigação
singular, Lúcio Packter propõe os Exames Categoriais como exames iniciais, formas
indicativas para investigar o universo existencial do partilhante, formas que nos permitem
conhecê-lo, ao mesmo tempo em que limitam nosso conhecimento.

O filósofo clínico não pretende conhecer plena, total e irrestritamente o universo de seu
partilhante, mas aproximar-se desse universo, partilhando, tomando parte do que lhe for
disponibilizado, apresentado. Pesquisar elementos que o constituam, sempre
considerando a representação do partilhante, pois na Filosofia Clínica o partilhante é a
medida de todas as coisas. Essa é a tarefa inicial dos Exames Categoriais. Seguindo a
derivação de seu conceito geral, as categorias são as noções que orientam nossa
investigação. O que observar em tudo o que o partilhante está apresentando?

A orientação para a observação dos Exames Categoriais indica a consideração do todo,


ou seja, os vários momentos e situações descritos pelo partilhante são considerados
para montar os Exames Categoriais. São as categorias filosófico-clínicas: Assunto
(Imediato e Último), Circunstância, Tempo, Lugar e Relação. Assim como Kant não se
refere às mesmas idéias quando apresenta categorias homônimas às aristotélicas, ou
ainda, muitos outros filósofos que tentaram estabelecer sua tábua de tipos não se ativeram
às categorias já propostas, Packter fundamenta-se no conceito de categorias, mas não
nas tábuas aristotélica ou kantiana. Ele cria sua própria tábua, com fundamentação nas
necessidades práticas impostas pela clínica, ao mesmo tempo em que também
fundamentadas em conceitos da filosofia acadêmica.

Analisemos a tábua de categorias da Filosofia Clínica, observando algumas indicações


sobre: definição, indícios para identificação no histórico do partilhante, pertinência clínica e
fundamentação, não necessariamente nessa ordem e, conforme já dito, respeitando os
limites impostos pelo formato artigo.

A primeira categoria é Assunto. Logo no primeiro contato surge a queixa, o assunto que
levou o partilhante a procurar a terapia, esse é o Assunto Imediato. Sem interpretações,
considerado literalmente, o assunto inicial preenche a categoria Assunto Imediato. Assunto
Último refere-se à questão que será trabalhada mais adiante, na aplicação de Submodos,
ou seja, o objetivo clínico, o que se pretende de fato. Algumas vezes Assunto Imediato e
Último são coincidentes, em outros casos, em nada se relacionam. Para ter acesso ao
Assunto Último, muitas vezes, o filósofo clínico necessita, anteriormente, realizar a colheita
categorial, esboçar a Estrutura de Pensamento, observar Submodos. Porém, cabe lembrar
que, nos Exames Categoriais, as categorias são preenchidas literalmente, ou seja, não se
inventa um assunto para o partilhante, é ele quem determina os objetivos da clínica.

A categoria Circunstância, fundamentada no conceito circunstância, refere-se ao entorno,


ao que circunda, ao que está em volta e às infinitas relações deste entorno com a
subjetividade: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela não me salvo
eu.” (Ortega y Gasset, 1997)

Este fato é a existência conjunta de um eu ou subjetividade e seu


mundo. Não há um sem o outro. Eu não me dou conta de mim senão
como dando-me conta de objetos do contorno. Eu não penso se não
penso coisas – portanto, ao achar-me a mim acho sempre diante de
mim um mundo. Eu, enquanto subjetividade e pensamento, me
encontro como parte de um fato dual cuja outra parte é o mundo.
Portanto, o dado fundamental e insofismável não é minha existência,
não é eu existo – porquanto é minha coexistência com o mundo.
(Ortega y Gasset, 1958, p. 153)

Nesta categoria o filósofo clínico observa o contexto, o entorno, o mundo que circunda o
partilhante em suas múltiplas dimensões: cultural, social, familiar, política, educacional,
enfim, tudo o que for circunstancial. Mas podemos considerar que as circunstâncias nem
sempre se mantém as mesmas, elas se alteram no decorrer de uma vida. Por isso o
filósofo clínico deverá traçar as diversas circunstâncias vividas por seu partilhante,
observando, em cada nova circunstância, o que se mantém e a novidade. Isso significa, na
prática, observar diversos momentos da história, traçar contextos que hoje são
inexistentes, elementos que perderam o significado... não importa, pois o objetivo é
compreender o universo vivido pelo partilhante e como ele se constituiu a partir de tais
vivências, mesmo que sejam passadas e superadas. O que traçar aqui? Tudo? Quase.
Uma síntese de cada contexto vivido e suas determinações, como o partilhante salvou sua
circunstância e a si mesmo. A pertinência clínica de tais observações, além da indicação
do modo de constituição do partilhante, consiste no conhecimento das circunstâncias
existentes, possíveis e aceitáveis para compor um futuro uso de Submodos.

Lugar é a terceira categoria da tábua filosófico-clínica. Lugar, segundo Merleau-Ponty


(1994) refere-se à espacialidade do corpo próprio, é o lugar que o corpo ocupa no mundo,
suas relações com o ambiente, com os espaços, possibilitando, via percepção, as
sensações de bem-estar, mal-estar, indiferença – ao mesmo tempo sensoriais e abstratas
– sobre como o corpo vivencia o mundo, os ambientes, as relações. Trata-se do endereço
existencial do partilhante.

O filósofo clínico observará, no histórico do partilhante, as referências a esse endereço


existencial, ao próprio corpo e sua espacialidade, ao sentir-se bem ou mal diante dos
ambientes, das vivências, das relações. Obviamente, cada circunstância poderá
apresentar alterações na categoria Lugar, por isso as categorias Lugar, Tempo e Relação
são derivadas da categoria Circunstância, ou seja, em diferentes circunstâncias,
encontramos diferentes manifestações das demais categorias.
Conhecendo a categoria Lugar o filósofo clínico saberá escolher o modo de utilização de
Submodos, o ambiente adequado para tal, assim como necessidades de modificações nos
ambientes freqüentados pelo partilhante, entre outras indicações possíveis.

Em Tempo, as relações entre o tempo cronológico, medido no relógio, externo e o tempo


subjetivo, vivenciado, sentido, interno. Essas relações podem ser observadas em
referências diretas à questão, como indicações de momentos que pareceram uma
eternidade: passara-se um segundo, mas pareciam bilhões de anos. Também podem ser
observadas na conjugação dos verbos (tempos e modos verbais): a partilhante conta toda
a sua vida conjugando os verbos no tempo presente, mas para falar do primeiro
casamento, conjuga os verbos no passado – a princípio essa modificação na conjugação
verbal nada significa, mas contextualizada e pesquisada pode indicar significados
específicos.

Além da indicação da situação temporal das questões do partilhante, a categoria Tempo


permite o conhecimento da necessidade do tempo clínico, ou tempo de amadurecimento
das questões, tempo de acompanhamento após a utilização de Submodos, tempo
necessário para a obtenção de resultados, entre outros elementos.

A categoria Relação, com fundamentação principal nos trabalhos de Buber e Levinás,


assim como no conceito de Interseção, dedica-se à observação das relações vivenciadas
pelo partilhante. Relações com: ele mesmo, outras pessoas, coisas, instituições, animais
de estimação, atividades, etc. Quais são as relações, com quem ou o que, qual a
qualidade destas relações, em cada endereço da Categoria Circunstância. Isso é o que
pesquisa o filósofo clínico nessa Categoria.

A pertinência dos Exames Categoriais consiste no conhecimento do universo no qual está


inserido o partilhante e nas relações estabelecidas entre ele e esse universo. Há casos em
que a problemática apresentada encontra-se nesse universo: circunstâncias adversas,
relações conflituosas, dificuldades para lidar com o tempo ou com o ambiente. Noutros
casos as respostas para o Assunto Último necessitam alterações, modificações nas
Circunstâncias: quais as possibilidades concretas existentes para isso? Que possibilidades
poderiam ser construídas de acordo com o universo do partilhante? Há casos em que as
Circunstâncias não precisam ser modificadas, não é esse o objetivo, pode tratar-se de
ausência de Submodos para lidar com as questões, ou ainda choque na Estrutura de
Pensamento, que precisam ser trabalhados. Ainda assim, o conhecimento dos Exames
Categoriais nos fornecerá as possibilidades circunstanciais para o encaminhamento do
trabalho clínico.
Metodologicamente, durante os Exames Categoriais, o filósofo clínico assume a postura
Fenomenológica: atém-se à descrição do partilhante, relata literalmente cada Categoria,
sem pretensões a explicações ou interpretações. A necessidade de compreensão do
processo de construção histórico das categorias leva à utilização do método histórico.
Acompanhar a história do partilhante, considerando que este processo permitirá
compreender seus modos de ser. O ser humano constrói-se, torna-se o que é através de
sua história. Considerando não apenas o subjetivo, mas o mundo no qual este sujeito está
inserido, dados observados empiricamente fundamentam o trabalho clínico, o Empirismo
faz-se presente. Mas por considerar que “Os problemas são resolvidos não pelo acúmulo
de novas experiências, mas pela combinação do que é já há muito tempo conhecido. A
filosofia é uma luta contra o enfeitiçamento do nosso entendimento pelos meios de nossa
linguagem.”, e que “a linguagem é um jogo e o significado das palavras se encontra no
uso” (Wittgenstein, 1945), os Exames Categoriais também possibilitam o conhecimento
do jogo de linguagem do partilhante, jogo este que será utilizado para a continuidade e
elaboração dos procedimentos clínicos.

Somando essas indicações metodológicas ao fato de serem as categorias não apenas


tipos, mas formas lógicas que possibilitam e limitam o conhecimento, os Exames
Categoriais têm fundamentação metodológica na Lógica, na Fenomenologia, no
Historicismo, no Empirismo, na Analítica da Linguagem... enfim, a grande “colcha de
retalhos” teórica que permite um recorte epistemológico acordante com as necessidades
clínicas. Desta forma, os sistemas filosóficos são colocados à disposição das
necessidades do partilhante, sem orientarem uma interpretação prévia. Ou seja, o
conhecimento produzido por todos esses anos de construção filosófica pode ser útil para
nos auxiliar a lidar com as questões cotidianas, desde que não seja compreendido de
maneira dogmática – o que o faria, imediatamente, deixar de ser filosofia.

O que propõe a Filosofia Clínica? Exercer a atitude filosófica diante dos problemas
apresentados pela realidade. Fundamentar-se nos sistemas filosóficos, mediante recortes
epistemológicos com justificativa na prática clínica. Re-pensar, re-elaborar tais sistemas
com o intuito de adaptá-los às questões suscitadas por um universo em devir.Essa tarefa é
diferente do que sempre foi a tarefa do filosofar? Proposta como tarefa de ajuda-ao-outro,
considerando objetivos e métodos clínicos, pode ser considerada uma terapia?

A presente abordagem enfatizou apenas o início da clínica, as primeiras aproximações


entre filósofo clínico e partilhante,dos três eixos fundamentais, apenas os Exames
Categoriais, sequer foram abordados os procedimentos clínicos seguintes – Estrutura de
Pensamento e Submodos. Seria possível já esboçar uma resposta àqueles que
questionam como pode a filosofia ser clínica?

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