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Por outro lado, a sociedade, no seu colectivo e em relação a cada indivíduo, tem o
direito de defender a sua saúde, por todos os meios ao seu alcance.
Ser contagiado e poder adoecer já não é agradável, mas a situação pode tornar-se
dramática se se é infectado por uma bactéria multirresistente, isto é, contra a qual os
antibióticos perderam a sua capacidade de actuação. É o que acontece na tuberculose
multirresistente. Felizmente, é uma situação ainda rara mas que a OMS considera como
uma verdadeira ameaça à escala global, uma vez que existem formas contra as quais não
há, literalmente, nenhum tratamento.
Felizmente que as infecções são tratáveis na maioria dos casos, mesmo a tuberculose,
sem necessidade de internamento e que os eventuais contagiados também se curam com
relativa facilidade. Restará um pequeno número de casos, sobretudo se houver evidência
de infecção por bactéria resistente aos antibióticos, em que, em minha opinião, o direito
colectivo se deve sobrepor ao individual.
Assim, considero que deve haver alteração legislativa que preveja o internamento e o
tratamento compulsivos dos doentes com formas de tuberculose multirresistente que
recusem tratamento voluntário, ou com outras situações infecciosas que façam perigar a
saúde pública, por recusa de tratamento e cumprimento doutras medidas adequadas de
protecção dos que com eles contactam. Serão sempre situações excepcionais, as quais
deverão ser analisadas caso a caso.
A Constituição prevê várias excepções ao direito à liberdade e segurança, uma das quais
se refere ao "Internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento
terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente"
(artigo 27º, n.º 3, al. h).
A Lei de Saúde Mental regula este preceito constitucional de modo a garantir que não
possam existir internamentos que não tenham por base problemas psiquiátricos
relevantes. Da minha experiência de muitos anos, não tenho conhecimento de casos em
que se mantenham indevidamente internados cidadãos que não necessitem desta medida
de privação de liberdade. O processo de garantias, apesar de excessivamente pesado na
minha opinião, garante, pelos múltiplos intervenientes, uma isenção de análise e a
correcção rápida de eventuais erros.
Estes preceitos legais têm-se mostrado úteis à defesa "de bens jurídicos de valor
relevante, próprios ou alheios, de natureza pessoal ou patrimonial" (artigo 12.º) que os
portadores de anomalia psíquica põem em perigo, mostrando-se, por isso, o preceito
constitucional útil à harmonia das comunidades. Não me consta que tenha, até agora,
sido posto em causa por alguém como excessivo.
Por outro lado, as autoridades de saúde debatem-se frequentemente com outro tipo de
problemas para os quais dificilmente encontram soluções, pois na sua tarefa de defesa
da saúde das comunidades se deparam com dificuldades imensas para conseguirem
colocar uma barreira entre um perigo eminente e a população. Naturalmente que a
defesa da liberdade dos cidadãos não pode ser posta em causa, mas um cidadão que
recusa tratar-se e aceitar medidas de isolamento e que, pelo tipo de doença de que é
portador, pode causar danos na saúde e na segurança dos outros, muitas vezes
irreversíveis, não pode continuar sem que a comunidade tome medidas de defesa.
Parece que a medida mais acertada será legislar para as doenças infecto-contagiosas de
acordo com a experiência da Lei de Saúde Mental, que permite a condução de urgência
por iniciativa da Autoridade de Saúde, com posterior confirmação de juiz.
In DN, 14.2.2011