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A LENDA

DE OÃDA
UMA NARRATIVA
POÉTICA SOBRE A
BUSCA POR IDENTIDADE

ESCRITO E ILUSTRADO
POR GIOTTO VASSOA
Mais eu do que eu mesmo
Marcas da Ignorância
Assobio sobre o Mar
Labaredas Intrânquilas
Chuva, Ondas e Vinho
Pedras e Flores
Pequeno Gigante, Enorme Anão
Os Enviados
O Lago da Morte
Eu contra mim mesmo
Oãda: O Segundo Adão
“A LENDA DE OÃDA” é um
conto que retrata a história de
uma menina que está a
procura de identidade num
mundo de simbologias. Sua
preocupação inicia com
questões como “por quê é que
em casa eu sou filha e na
escola eu sou aluna?”.
Insatisfeita com as respostas
que seu povo dá, ela se
aventura numa jornada para
encontrar alguém que todos
têm como uma ignorada lenda:
Oãda, o dador de Identidade.

AS CITAÇÕES NA INTRODUÇÃO DE
CADA CAPÍTULO SÃO DE LUÍS LIFANIÇA.
“Ninguém não é.”
- Vá brincar lá fora, Omena!

A voz da sua mãe não tinha um tom de

sugestão: era um comando. Omena saiu de

casa correndo; quase tropeçando. Seu

vigor muito jovem escorria pela sua pele. O

vento que sopra na direção oposta, sua

pressa repele. Assenta-se em uma pedra

perto do lago. Recorda-se das palavras de

sua mãe: “A vida é um palco. Tu és o

teatro”. Era tudo muito confuso para a

pequena, principalmente porque não

encontrava motivos para ser “Omena”.

Numa terra onde todos espíritos

conheciam sua função, menos a nação da

qual todo horizonte era o coração:

Humanos. Os únicos que pareciam menos

que panos de chão e à ninguém parecia

fazer comichão o facto de que descartável

Q í? u e m eram seus desígnios e esgotável o seu

es t á a
suspiro. Se até para a morte serve o tiro,

qual é o fim do homem? Apenas da vida o

retiro?
Assentada na pedra, Omena pensou. Não conseguiria sossegar sem uma

resposta. Até que, em seu pensamento, ela se recordou: havia alguém

com quem ela tinha feito uma aposta. Levantou-se e voltou a correr

contra o vento, indo pela rua com toda sua força. “Quero ir o mais rápido

que puder, para que o que minha mãe me disse minha decisão não

distorça”. Quando chegou ao seu destino, percebeu que usou todo fogo

da sua alma para abeirar ali. Ao entrar no grande edifiício, ouviu-se um

indagar trânquilo: “Quem está aí?”

“Eu não sei...”, - respondeu Omena. Já não era apenas curiosidade. Era

sobrevivência. Era mais do que necessidade. Daquilo dependia a sua

subsistência. Talvez até a sua existência. Mas definitivamente a noção de

sua essência.

Reza a lenda que existe um que sabe todos os mistérios. Alguém que os

sábios ignoraram e de quem os reis buscaram sabedoria para construir

seus impérios. Um que conhece a distância entre o este e o oeste; que

ensina as estrelas o brilho do povoado celeste. Que não é egoísta: é justo

e vive em alteridade. Conhece as estações dos espíritos e de cada um a

sua real identidade.

Na terra da Omena, nada disto faz sentido. Todos ignoram e alguns ousam

desprezar. Ninguém o procura, mas a lenda é expressa: achará quem O

buscar.
“Estiveste com Ele?”

“Sim, todos os dias”

Omena se fascinava com as histórias que a sua amiga Kerkrina contava

sobre Oãda, o dador de Identidade. Eram histórias que a sua mãe não

queria nem ouvir falar. Sempre que Omena falasse que Oãda oferecia

liberdade, num poderoso rugido, sua mãe a mandava calar. Então, seus

pensamentos eram sempre divididos pelo que sua mãe chamava de

frívolo desejo e o violento impulso de honrar a ela e toda sua

ascendência. Mesmo sendo muito nova, já conhecia os horrores da

marginalização; sabia que quem se opusesse entraria em decadência. Mas

sua amiga Kerkrina tinha um brilho nos olhos que ninguém mais na aldeia

possuia. Diferente das almas ocas do seu não tão humilde povo, Kerkrina

era radiante; isso a Omena queria.

Quando Omena perguntou como encontraria Oãda, a resposta de sua

amiga foi novamente simples, mas formidanda:

“Existe um caminho: buscando-o se achará. Existe uma porta: batendo-a

se abrirá”

Omena estava absolutamente convicta que valeria a pena arriscar.

Levantou-se, despediu-se e, em direção ao longíquo horizonte, pôs-se a

andar. Encontraria sua identidade, por mais que fosse a esmo. Queria

encontrar aquele que conhece o íntimo “mais do que eu mesmo”.


“Jesus Cristo é a nossa identidade a frente e

atrás. Sendo Ele o grande "Eu sou", quem eu

sou depende inteiramente dEle.

Não precisamos ser alguma coisa à mais, só

precisamos de estar acoplados a Ele.

É tão simples quanto: EU SOU Luis.”


Omena seguiu andando, ficando cada vez

mais longe da vila. Já começava a

escurecer e pensava que talvez fôsse

melhor voltar para casa para pegar sua

mochila. “Mas isso seria idiota!”, - pensou.

A mãe nunca deixaria ela voltar a sair para

tal aventura. Pronto, aquele pensamento

descartou. Só que já escurecera e sentia o

frio do cair da noite. Ela temia que o vento

começasse a soprar num turbulento açoite.

Quanto mais caminhava, mais duvidosa

ficava acerca do rumo que escolhera.

Virou-se e viu o longo caminho que já

tinha deixado para trás, coberto de

primavera. Seria Kerkrina uma lunática? E

por quê dar-lhe ouvidos? Oãda e suas

histórias...não seriam apenas mitos? Sua

expectação se abalava a cada passo.

“Desculpa, mãe. Me perdoa com teu terno

abraço”, imaginava-se a dizer, correndo

para a seguraça de seu quintal.


Sentou-se no chão e começou a chorar. Desejava secretamente que, mais

do que Oãda, sua mãe a viesse encontrar. Queria estar segura e não

temer a solidão nem o frio. Queria dormir, comer e banhar: queria sim

esse trio.

Enquanto chorava, com o olhar fito na terra, escutou passos e vozes vindo

em sua direção. Rapidamente, olhou a sua volta limpando as lágrimas

apenas para descobrir que quem vinha era um guardião. Não. Eram dois.

Ao avistarem Omena com suas tochas, aproximaram-se pois.

“Por quê estás tão longe da vila?”, - perguntou um dos guardiões,

agachando para vê-la de perto. Quando Omena olhou nos olhos dos

guardiões, lembrou-se do motivo pelo qual sentia que buscar Oãda seria o

correcto: o olhar vazio e sem brilho; confuso, mesmo com aparência de

sucrilho. Então, ergue-se, limpou suas vestes e com a voz pouco branda,

respondeu: estou a procura de Oãda.

Os guardiões olharam para ela, claramente desapontados com a resposta.

Com os olhos fitos nela, disseram “vá para casa. Corra na direção oposta”.

Omena sentia-se intimidada, mas não queria fraquejar. Respirou fundo e

respondeu, tentando não apejar, dizendo “eu sei da consequência. Sei que

não recebem esta resposta com frequência. Não me impeçam, pois este é

meu desejo. Por favor, abram os portões e deixem-me sair. Eu almejo!”

Os guardiões daí seguraram Omena pelo braço e a arrastavam pelo


caminho que ela tinha utilizado para chegar até ali. Ela gritava e fazia

força para soltar-se e livrar-se dali. De repente, ouviu-se uma voz que

ecoava pelo espaço e enchia o ar. Os guardiões pararam, ainda segurando

Omena, atentos à voz e a procurar. Um dos guardiões subitamente

desapareceu, sem que o outro guardião e Omena pudessem ver. O outro

guardião deixou o braço da Omena e via-se claramente em seu rosto o

olhar de quem tinha tudo a temer. Foi quando Omena viu um vulto

que levou o guardião remanescente num piscar de

olhos. Omena caiu e sentou-se nos assoalhos. O vulto

apareceu. Saudou e ajuda e companhia ofecereu. As

marcas em seu corpo eram para Omena familiares por

algum motivo. Após explicar que queria encontrar-se

com Oãda, Shofil (que era como se tinha apresentado)

entrou em profundo exercício cognitivo. No fim,

aceitou ser sua companhia, pois também queria do

povoado da vila distância. Enquanto caminhavam,

Omena perguntara sobre suas tatuagens e ele

respondeu que eram marcas da ignorância. Que ele

sabia que era um conciliábulo vazio e que precisava

achar sua alma vivente para ter, finalmente, neste

mundo, relevância.
“Longe de Deus somos tudo, menos

ser. Ele é o grande "Eu sou". Sem Ele,

não é possível nem não ser.

Todos precisam dEle. Temos todos

tanto dEle, até aqueles que dizem

"EU SOU ateu"


Shofil e Omena seguiam pelo caminho,

conversando acerca de como eles achavam

que Oãda seria e como o encontrariam.

Eles especulavam acerca de quão longe do

seu povoado, no fim da jornada, eles

estariam. Omena guardava para si o

sentimento de insegurança. Mas Shofil lhe

parecia muito seguro de si, o que lhe dava

esperança. Na verdade, ela nunca se tinha

sentido tão a vontade com um estranho

antes. Para além do facto de que para ela,

Shofil e suas marcas lhe eram muito

familiares...nada distantes.

Enquanto caminhavam, ficavam evidentes

suas diferenças. Omena era meiga e Shofil

apresentava malquerenças. Ainda assim,

Shofil parecia se importar e concordar em

ajudar Omena a encontrar Oãda. Esse não

era seu objectivo: ele queria ficar longe da

vila e toda sua demanda.


Quando interrogado acerca de como teria achado Omena, Shofil explica

que teria dormido em sua casa e acordado perto de onde estava a

pequena. Quando ele escutou os gritos da menina e a violência do

comando da dupla de guardiões e o seu dizer, ele simplesmente sabia que

era a coisa certa a se fazer.

Em seu caminho, sentiam uma calma brisa que por trás os seguia e servia

de guia. Estavam ambos gratos por não se tratar de um vento impetuoso

ou de uma corrente fria. Era trânquilo e de forças suaves. Dava um campo

saudável até para o vôo das aves. Porém...

Shofil começou a abrandar o passo. A princípio, Omena pensava que era

por causa da noite e do seu cansaço. Mas rapidamente entendeu que era

algo mais pouco relasso.

“Fica atrás de mim, Omena”, - disse Shofil, virando-se para trás e

protegendo-a com o braço. Formou-se um redemoinho de diferentes

pétalas: o vento trânquilo que os seguia se tornara escasso. No meio do

redemoinho surgiu uma jovem, vestindo roupas coloridas e preenchidas

de padrões e formas geométricas. Fez o redemoinho cessar e saudou

Shofil e Omena cordialmente, enquanto as pétalas formavam um jardim e

davam vida à flores murchas só por as tocar.

“Prazer em conhecê-la, Vleuela”, - respondeu, Omena enquanto Shofil

analisava em desconfiança. Vleuela era, assim como se tinha apresentado,


o espírito do Vento: essa era, pois, a sua aliança. Perguntou porquê ambos

caminhavam tão tarde pelo caminho e Omena respondeu que iam a

procura de Oãda. Vleuela, interessada em saber mais sobre a jornada,

convidou os dois a passarem a noite em seu castelo, à norte daquela

banda. Shofil negara o convite, mas Omena insistia e já se sentia cansada.

Convencido, Shofil aceita o convite e caminham até o castelo, carregando

Omena nas costas, sentido-a um pouco pesada.

Durante o jantar e uma conversa sobre Oãda, Vleuela diz que já se tinha

encontrado com Ele e que o encontro foi algo surreal que não podia

explicar. Shofil, desconfiado, diz que estavam cansados e que não tinham

interesse em escutar. Ofendida, Vleuela levanta-se e suas cores

desaparecem. Sua pele fica cinza e nela tatuagens nascem. Shofil põe-se

na frente de Omena e seus caninos alongam-se. Uma tempestade dentro

do castelo: as portas e as janelas arrombam-se. Em convicção, Omena

grita imperiosamente para que Shofil voltasse a sentar. Escutando, volta a

si, com dificuldades de um pedido de desculpas deixar soltar. Vleuela

porém, diz que não é problema e torna ao normal. Após fazer as pazes,

conta acerca do seu encontro sobrenatural. Onde ela se transformara

num violento assobio bem no meio do mar. Um barco à vista, corações

temerosos a palpitar. Mas quando ouviu o Seu comando, não pôde mais

nada se não se acalmar. À força, mas em paz. Paz que só Oãda traz.
No dia seguinte, Omena e Shofil voltaram

à estrada para continuar com a sua jorna-

da. Voltaram seguindo a trilha que com

flores Vleuela havia ornamentada. Após o

encontro com Vleuela, Omena estava mais

convicta de que ela realmente queria en-

contrar-se com Oãda. Mas havia algo que

em sua mente ainda era ciranda.

“Não sei explicar”, - disse Shofil, caminhan-

do alguns passos em frente de Omena. “É

como se houvesse alguma conexão entre

tu e eu, mas não tenho certeza plena”.

Omena queria entender porque motivo é

que Shofil facilmente trocava a sua vonta-

de pela vontade dela, sendo que ele já

tinha mostrado ser independente e dono

de si. Por enquanto era um mistério. Talvez

algo que não precisasse levar a sério.

Em seu caminho, encontraram a entrada

para uma floresta que não parecia ter uma

trilha visível para se seguir. Porém, o único

caminho e solução era prosseguir.


Quanto mais adentravam a floresta, mais densa ela parecia ficar. Olhando

para trás, a entrada não mais conseguiam avistar. Continuaram

caminhando, procurando ser cautelosos a cada passo. Shofil ia na frente

para que a Omena pudesse seguir suas pegadas e a proteger de eventual

armadilha ou cimbronaço. Até que, ao longe, começaram a ouvir sons de

estilhaços quebrando o ar. “Fica perto de mim”, disse Shofil, atentando

para os sons que pareciam estar a os alcançar. Foi então que se

depararam com uma enorme fogueira, no meio da floresta. A fogueira se

transformara em milhares de labaredas menores que dançavam

intrânquilas como se estivesem numa festa.

Olhando para as chamas, Shofil e Omena decidiram que melhor era dali se

retirar. Porém, quando já estavam dando seus passos, as chamas

fecharam o caminho de volta para que não mais pudessem passar. A

forma como as chamas se moviam pelo chão era peculiar, o que fazia

Omena e Shofil acreditarem que não era uma chama da qual pudessem

escapar. “Revela-te, espírito!”, - exclamou Omena, olhando para as

labaredas e tentando não se deixar intimidar. Como solicitado, as chamas

voltaram a ser uma só e delas surgiu um rapaz. Sua pele era dura como a

crosta terrestre e dava para ver seu interior em chamas. Uma vista que à

ninguém apraz.

O rapaz se apresentou como sendo Oond, o espírito do Fogo.


Sua intenção não era machucar nem assustar aos filhos dos humanos, o

distinto povo. Explicou que já presenciou alegria e aflição mas raras vezes,

no que tange à identidade, convicção. Contou sobre quão poderosos são

os reinos que o sabem utilizar, mas que, no final, ele é quem os consome

até ao tempo que não se pode consumar. Bateu em seu peito, dizendo

que sabia quem era e que sem dúvidas e com muita clareza conhecia sua

missão. Oond era seu nome e as chamas eram seu coração.

Omena olhou para ele em admiração, enquanto Shofil analisava cada

movimento seu. Enfim, Omena perguntou se o espírito de Fogo conhecia

Oãda e que se não, de nada este encontro lhe valeu.

Oond olhou fixamente nos olhos de Omena e, com um tom menos

egocêntrico do que antes, narrou sobre como ele enchia fornalhas com

seu manto escarlate. A angústia de quem era para lá lançado era, para ele,

arte. Até que um dia um certo rei mandou três jovens ao fogo ardente da

fornalha. Quando eles entraram, não conseguia entender o porquê da

falha. Não os conseguia consumir. Foi então que viu um quarto homem

que olhou para Oond nos olhos e tirou-lhe o poder. À força, mas em paz.

Paz que só Oãda traz. Nesse momento Oond entendeu que maior era Ele

que mudou sua natureza para salvar quem conhecia sua identidade. Nem

a chuva lhe trazia tanta vulnerabilidade. Muito menos a Paz. Sim, Paz.
Nós não somos de
nós mesmos.
Portanto, não temos
legitimidade para
decidir o que
queremos ser.
Oond criou uma trilha de chamas que

levou Omena e Shofil até a saída da

floresta. Continuaram a andar, rumo ao

que já parecia para os dois o melhor que

eles podiam procurar; nesse momento,

nada mais presta. Os dois caminharam

juntos, contando um ao outro seus sonhos

e anseios. Omena gostava de poder

encontrar e partilhar Oãda com sua mãe

sem receios. Shofil, que sempre se sentia

descartável, queria poder reconhecer o

rapaz que ele via quando olhava em

espelhos. Partilhara com Omena que teria

crescido numa zona onde todos Homens

tinham marcas de ignonância. Para alguns

as marcas surgiam na fase adulta, mas para

outros, surgiam na infância. As marcas

eram símbolo de questionamentos que

surgiam em seus corações. Principalmente

questões existenciais como para quê fim

existem as nações? Lógico que enquanto as


perguntas não perturbarem a sociedade, ninguém atenta. Mas para seres

como Shofil que precisam verdadeiramente de respostas, existem sempre

vozes que gritam “aguenta”. É doloroso -- ele explica -- o facto de nunca

sentir que encontrará as respostas. Alguns acabam desistindo e outros

entram em maléficas propostas. Mas existem alguns que conseguem

satisfazer as suas indagações e encontram a felicidade. Alguns o fazem

temporariamente e outros para toda a eternidade. Mas a maioria nunca

consegue se livrar das marcas e nunca saberão o quê é viver plenamente

sem que alguém lhes apresente algo diferente. Para ser liberto,

precisamos de ter um encontro com a verdade, frente-a-frente.

Omena e Shofil chegaram à um local com uma enorme cascata. Viam, ao

longe, um homem alto e de cabelos longos, observando a água corrente

parecendo não se preocupar com a hora ou a data.

Ao aproximar, Omena viu seus olhos azúis refletirem sua própria imagem.

Lembrou-se, então, de sua mãe e de quão importante era para ela

preservar sua linhagem. Lágrimas escorreram de seus olhos.

O homem estendeu a sua mão e as lágrimas vieram até ele. Omena,

surpresa e pasmada, olhou para as lágrimas que flutuavam de seus olhos

para as mãos dele. Cerrando as mãos, ele disse “não chores”. Omena sorri

e diz “o que for que queiras fazer com as lágrimas, não demores”. O

senhor virou-se para as cascatas abriu a mão e as lágrimas juntaram-se à


água corrente. Depois virou-se de novo para Omena e Shofil, que

olhavam para ele atentamente.

“Vocês procuram por Oãda?”, perguntou o homem calmamente. Omena

admirou-se e perguntou como é que ele sabia da sua busca mesmo antes

deles se apresentarem devidamente. Ele, então, disse que daqueles que o

encontrassem, fluiriam rios de águas vivas. Shofil perguntou o que aquilo

significava, mas após apresentar-se como Matroos, o espírito da Água,

respondeu que saberia quando a hora chegar, mas garantiu que eram o

oposto de nocivas.

Omena usou da ocasião para perguntar se Matroos conhecia Oãda. Mas

ela teve, primeiro, silêncio como resposta. Matross fechou os olhos e

respondeu que todas as coisas diante dEle estão expostas. “Se eu

conheço a Ele? Bem, mais do que isso, Ele conhece a mim...melhor do que

eu mesmo”.

Shofil, que mostrava interesse por Oãda pela primeira vez, pergunta a

Matroos se tivera se encontrado com ele ao esmo. Matroos, então, conta

grandiosas histórias sobre um dilúvio e vezes em que o mar se abriu...mas

certamente ter sido transformado para vinho foi o mais marcante que ele

viu. “Oãda segura em suas mãos a natureza e a identidade. Ter saído da

água para o vinho e ter tido paz me fez entender que eu não sou sem Ele,

a excelsa Entidade. Ele é quem define”.


O engraçado dos que dizem ser donos de si
próprios é que eles sempre se vêem como
donos, nunca se vêem como servos. Se você
se visse como servo de você mesmo, notaria
muito cedo que as ordens a que obedece na
verdade não estão vindo de você.
Matroos abriu uma das cascatas, revelando

uma passagem rochosa para o outro lado

do caminho. Omena e Shofil se

despediram e continuaram, desta vez com

objectivos não mais em desalinho.

Enquanto caminhavam, o entusiasmo de

ambos aumentava. Todos os espíritos que

eles encontraram davam cada vez mais

esperança e a euforia dominava.

Quando saíram do túnel, perceberam que

o terreno todo em frente deles era cercado

por uma zona montanhosa. De ponta à

ponta, tudo que se via eram montanhas e a

vista delas era frondosa. Por um tempo

Omena e Shofil olharam a sua volta para

tentar decifrar como é que passariam por


aquela região. Mas, depois de horas a pensar e analisar, não conseguiam

chegar à uma conclusão. Até que ouviram um som vindo do alto da

montanha mais alta. Era uma moça descendo, escorrengando do alto à

baixo, aparentemente sem lesão e evidentemente domínio não lhe falta.

Quando chegou no fim da montanha, Omena e Shofil correram e foram

ter com ela. Sua aparência estava intácta, mesmo depois de ter descido a

montanha e sua pele, como uma pedra preciosa, era bela.

“Meu nome é Berge! O espírito da Montanha”, - exclamou a moça com um

ar de superioridade. Seu rosto tinha uma tatuagem de um conjunto de

flores, o que despertou na Omena curiosidade.

“Esta tatuagem, te digo, é muito especial. Porque ela fala tanto do bem e

do mal”.

Berge explica que a sua tatuagem é um espelho para o desejo. Cada

pessoa que olha para ela, vê exactamente o seu “almejo”.

Omena olhou atentamente para a flor e ela desaparecera. Shofil olhou

para a flor e logo reconhecera: via sangue escorrendo pelo rosto de

Berge, exactamente onde a tatuagem estivera.

Repentinamente, Shofil à Berge começou a atacar. Com um sorriso no

rosto, Berge defende todos os golpes que Shofil se pôs a lançar. Pelo

sorriso da Berge e pelo ataque repentino de Shofil, Omena fica sem

entender o que está a acontecer.


Omena assiste ao longe, pensando se é uma boa ideia se meter. Mas

quando ela percebe que Shofil está apenas a magoar-se, Omena tenta

impedir que os ataques continuem. Quando ela se aproxima, Shofil, por

reflexo, lança um golpe sobre ela e é lançada para longe...Shofil

imediatamente pára antes que a cumplicidade entre os dois ele e sua

violência estraguem.

Shofil vai ao encontro da Omena para a ajudar a levantar. Não tinha

nenhum ferimento, mas aparentava estar fraca e precisava de ajuda para

em pé ficar. Berge então explica que no fundo, o desejo do coração Shofil

era algo que ela chamou de obras da carne. Que o que Shofil viu em sua

tatuagem era seu próprio sangue e a dificuldade que ele tem sobre seu

descarne. Berge procedeu dizendo que nas pedras estão as propostas de

vida e de morte. Que Oãda podia transformá-las em pão e não o fez, mas

os ignorantes não tem a mesma sorte. Vão contra as rochas com tudo que

possuem e quando menos esperam, seus corações ficam tão duros

quanto pedras. Secos, vazios e inadras.

Já em pé, Omena perguntou porquê é que ela não via nenhuma tatuagem

em seu rosto. Berge, surpresa, ficou em silêncio, procurando encosto.

Explicou que sua rosa era o seu próprio desejo - dar vida. Mas as pedras

sufocavam e não entrava a luz devida. Mas se Omena nada via, realmente

seu coração procurava Oãda. Disso nenhuma dúvida havia.


Muitos dizem ser donos de si
mesmos, "sou o meu próprio chefe".
Você conhece o seu chefe?
Quando foi a última vez que você
recebeu uma ordem sua e obedeceu?
Berge mostrou-lhes um vale secreto entre

as montanhas, para que eles pudessem

continuar com a sua jornada. Mas ela os

alertou que no vale muitos se perdem

porque a sua mente fica alterada. Dese-

jou-os sorte e os deixou à entrada, voltan-

do para os montes, sua rochosa morada.

Enquanto caminhavam, Omena seguia

cabisbaixa e calada. Desde que saíram das

montanhas, não tinha dito nenhuma pala-

vra. Shofil procedia, também, sem saber

como interagir. Ele não conseguia um

pedido de desculpas deixar fluir.

As marcas da ignorância eram mais do que

um sinal de fome por conhecimento satis-

fatório. Eram também a manifestação do

ego digerido à semelhança de um ban-

quete no refeitório. Não lhe era fácil en-

contrar as palavras que pudessem a

Omena confortar. Talvez o mais sensato no

momento era deixar sua amiga quieta e

continuar a caminhar.
O vale ia ficando cada vez mais escuro e frio. Já não se ouvia mais os

pássaros nem seu cantarolar e assobio.

“Omena”, - diz Shofil, escutando passos vindo em sua direção, pela frente.

O vale era estreito e dos dois lados haviam rochas gigantes; se fosse

perigo, voltar atrás era, de salvação, o único oferente.

Enfim se revela um pequeno homem. De terno e gravata, seus dentes

afiados com aparência de que até pedregulhos exprimem. O homem

parou e saudou com uma voz amansada. Perguntou à Omena se de

caminhar ela não estava esgotada. Ele ofereceu ajuda, pois tinha tudo que

eles viriam precisar. Comida, bebida e até uma cama para poderem

descansar. Shofil ainda não se tinha recuperado dos seus ferimentos, por

isso pediu à Omena para que pudessem com o pequeno homem por um

pouco ficar. Omena, intrânquila pela aparência do homem, aceita o

convite mas diz que em nada que é seu ela iria tocar. Só precisava de uma

cama para Shofil poder repousar.

O homem, porém, de seu bolso tirou um contracto. Explicou que

precisava da assinatura do Shofil, mas que era apenas um simbólico acto.

Shofil, cansado e necessitando de descanso, não hesitou e assinou o

contracto e o devolveu. Imediatamente, uma cama no meio do vale

apareceu. Shofil perguntou a Omena se ela não queria ao menos na cama

sentar. Ela disse que não, sentando nas rochas, atentamente ao homem
pequeno a controlar. Deitou-se e adormeceu, enquanto Omena olhava

para o pequeno homem que olhava para o Shofil. Quando questionado

pelo seu nome, o homem respondia “ele não leu nenhum til”. Passado

algum tempo, Omena começava a ficar impaciente pela forma como o

homem olhava para o seu amigo. “Shofil, acorda. Vamos embora.” - disse

Omena, tentando acordar o Shofil, sentido que ele estava em perigo.

Shofil não acordava do seu sono mas respondia: “Estou com preguiça.

Continua tu”. Dizendo isso, o pequeno homem crescia. Omena sacudia o

seu companheiro de viagem mas ele não acordava; o homem continuava

crescendo e não era uma miragem. Tendo ficado um enorme gigante, o

homem aproximava-se para a Shofil devorar. Omena correu e colocou-se

entre os dois, de braços abertos, pela vida do seu companheiro a exorar.

Os passos ficavam cada vez mais estrondosos e Omena não parecia ter

poder para o parar. Foi quando uma enorme luz, atrás dela, começou a

brilhar. O homem gigante caiu de costas quando a luz ao seu rostou

começou a iluminar. Omena virou-se e viu um moço descendo de uma luz

flutuante, forte o suficiente para a Shofil acordar. Estendeu sua mão e o

tirou da cama. O homem gigante, pequeno mais uma vez, pôs-se a correr

pelas sombras, maldizendo o final de sua trama.

Aquele homem, segundo o moço, era Sonde, o espírito do Pecado. Porque

o salário do seu contracto é a morte, seu nome não foi por ele revelado.
Temos a tendência de procurar
nossa identidade em coisas ou
pessoas que assemelham se a nós.
Pois achamos que se encontrarmos
algo parecido a nós é porque está
relacionado a nós. O resultado
disso acaba sendo perdidos se
identificando com outros perdidos.
O moço que salvara Shofil apresentou-se

pelo nome de Leoneu. Ele contou que uma

vez também tivera passado por aquele vale

para chegar até Oãda e temeu. Mas que

também tinha sido ajudado por um amigo

que não tinha desistido dele. Explicou que

quando chegou à Oãda, tudo passou a

fazer sentido para ele.

Shofil estava triste e desapontado consigo

mesmo por quase ter caído nas garras do

espírito do Pecado. Estava mais triste

ainda por ter sido pelo seu próprio desejo

que havia sido engodado. Encostou-se nas

paredes do vale e sentou-se lentamente no

chão. Olhou para o lado e viu Omena

olhando para ele, com um sorriso no rosto

que muito sinceramente refletia seu

coração.

“Anima-te, Shofil! Estamos quase a chegar!

Foi muita sorte a nossa ter aparecido o

Leoneu para nos salvar. Anima-te!”


Leoneu aproximou-se e o trio propôs-se a andar enquanto conversavam.

Leoneu contou um pouco do seu passado, enquanto caminhavam.

Partilhou que era obsecado por poder e era tudo que ele queria. Ficou tão

focado em sua missão que a razão não mais via. Até que seu encontro

com Oãda aconteceu e ele dos seus caminhos se converteu. Omena

escutava, fascinada com a ideia de estar a caminhar com alguém que

realmente esteve com Ele e sabe como o encontrar. Mas Shofil estava

ainda muito para baixo, evitando a todo custo sobre a conversa comentar.

Leoneu, percebendo que Shofil estava a evitar a conversa, revela que

também, no passado, carregava as marcas da ignorância. Shofil levantou

sua cabeça e surpreso olhou para Leoneu que não apresentava mais

nenhuma marca em seu corpo. Finalmente Shofil quebra o silêncio e

pergunta se as marcas dele apareceram na infância. Leoneu diz que não,

porque na altura Oãda já era seu seguro porto. Ele tinha apenas o

abandonado. No rosto do Shofil havia uma expressão de quem se

encontrava interrogado. Percebendo isto, Leoneu começou a explicar.

Existia uma nação cujo apelido era “Os Enviados” e faziam parte destes as

pessoas que moravam em seu lar. O ensinaram desde pequeno quem

Oãda era e ele cresceu com aquele conhecimento. Enquanto crescia,

tomou um rumo do qual não se orgulha: fez da rebeldia o seu alimento.

Não queria mais escutar o que Oãda tinha a dizer. Queria ter liberdade.
Mal sabia que ele já era livre e, não menos importante, tinha em Oãda sua

identidade. Daí, Omena comentara que era exactamente isso que ela

procurava. Para isso deixou o conforto de seu povoado: saber quem

exactamente é; sim, era o que ela mais almejava. Via pessoas vivendo

como se de um teatro se tratasse. Onde o objectivo era vestir inúmeras

máscaras e esperar que doenças, acidentes ou a idade a matasse. Não

havia brilho no olhar de seus moradores. Apenas Kerkrina, sua amiga, se

dispunha a contar histórias sobre Oãda para aliviar as dores.

Leoneu perguntou como é que Shofil e Omena se conheceram. Omena

contou a história e como os guardiões desapareceram. Leoneu, pensativo,

fica em silêncio durante um tempo. Depois aponta para um lago em sua

frente, onde do outro lado tinha um enorme templo. “Eis que só vos resta

passar por este lago para Oãda encontrar”, - exclama Leoneu, andando em

direção à beira da água, um vento ligeiro a soprar.

Omena correu para o pequeno barco que parecia estar a sua espera para

chegar à sua meta. Mas não tinham lá remos, apenas uma caneca. Leoneu

explicou que o barco se moveria sozinho até ao outro lado. Ela

simplesmente tinha de encher a caneca e dar um gole da água e resistir ao

seu fardo. Chamando ao Shofil para o lado, o semblante de Leoneu

mudou. Calmamente revelou: “Quando chegar a hora, não deves temer.

Porém, para que Omena encontre Oãda, tu precisarás morrer”.


Precisamos continuar sendo dEle
porque ELE É!

MORTE
Shofil junta-se à Omena no barco que está

pronto para a partida. Omena agradece,

acena adeus para Leoneu que responde

que aquela não era uma despedida.

Leoneu desaparece na mesma luz

flutuante que o fez chegar a tempo para ao

Shofil salvar. Omena senta-se no barco,

pega a caneca e começa a analisar.

“Por quê é que o barco só se move se um

gole eu der? E fardo? O quê o Leoneu quis

dizer?”

Shofil estava a olhar para o templo que

tocava nas núvens do outro lado. Era a

última etapa: o lago. As palavras do Leoneu

ecoavam em sua mente. O quê é que lhe

esperava pela frente?

“Omena.”

“Sim, eu sei. Um gole” - colocou na água


a caneca que era tudo menos pequena. Omena levantou a caneca e a

olhou atentamente. Sorriu e disse “à Oãda” dando um gole, deixando a

caneca no chão e esperando acontecer algo surpreendente.

“Então? Como te sentes?” - perguntou Shofil, não querendo o processo

apressar. De imediato, o barco começou lentamente a navegar. Omena

olhou para o lado e viu que não tinha nada a movimentar o barco. Olhou

para Shofil que estava com a aparência de quem estava a espera que

alguma criatura subisse à superficie à salto.

Os dois foram conversando, Shofil não inteiramente se abrindo para a

conversa. Mesmo depois do que o Leoneu falou, sentia-se comprometido

em levar a Omena até Oãda, como se tivesse feito uma promessa. Depois

de um tempo de silêncio, Omena começou a falar. Mas sua voz estava tão

pequena que ao Shofil estava a assustar. Seu discurso era de alguém que

não estava mais convicta de que Oãda era a melhor opção. Que todos em

sua vila viviam do mesmo jeito há séculos e talvez a sua mãe tivesse

razão. Mas não podia mais voltar porque já estava longe demais. E

provavelmente para sua mãe a ideia de ter uma filha fujona mesmo

voltando não a apraz. Mesmo que encontre Oãda, para onde iria ela?

Todos deixavam claro que não eram bem-vindos os enviados naquela

terra. Talvez fosse melhor encontrar o fim da vida dela ali naquele lugar. O

barco já estava à meio caminho: um bom lugar para se afogar.


Shofil então, reparou que Omena estava a andar para a berma do barco

em movimento. Levantou-se e correu, na esperança de conseguir

pegar-lhe a tempo. Segurando Omena, fazia força para que ela seu corpo

para a água não atirasse. Mas ela dizia ouvir vozes no fundo do lago que

diziam que sua identidade estava lá em baixo, ao seu alcance. Shofil

jogou-a de volta para o barco e tentou chamar-lhe de volta ao seu bom

senso. Mas ela voltou a levantar e com mais força quase se jogava para

fora do barco; o momento era tenso.

Então Shofil lembrou-se que o Leoneu falou acerca de resistir ao fardo.

Ainda segurando a Omena, caminhou puxando ela para o outro lado do

barco. Pegou a caneca que ainda tinha água e deu um gole. Omena

sentou e aos seus sentidos voltou, seu corpo ainda mole. Do lago subiu

um vulto negro de uma presença esmagadora e terrível. Apresentou-se,

sem cerimónias, com Dood. O espírito da Morte. O temível. Quando

Shofil o quis atacar, seu corpo não se podia mexer. Dood olhou em seus

olhos e disse “...não. Ainda não é tua hora de perecer”. Shofil voltou ao

normal. Omena acusava o espírito da Morte de ser o vilão. Dood, porém

disse a Omena que a vida e a morte estava em sua própria mão. “Como

podem ver, eu não sou o fim”, - disse a Dood, apontando para o templo.

“Há um com poder maior do que eu posso sustentar. Oãda vos espera.

Sim, Aquele que meu poder não foi capaz de segurar.”


Você foi chamado para ser
aquilo que não quer
renunciar.
Dood deixou Omena e Shofil e eles

seguiram com o barco em

movimento. Shofil, sentado no chão,

ouvia a voz de Omena a

agradecer-lhe por lhe ter salvado. O

barco chegou finalmente à outra

margem; não levou muito tempo.

Finalmente tinham seus pés na terra

de quem o povo chamava de Mito

Ignorado. Shofil ajudou Omena a sair

do barco para a terra firme. O sol já

nascia ao horizonte, fazendo parecer

uma cena de filme. O templo,

majestoso à distância, estabelecia o

seu esplendor. Era tudo que Omena

queria, mas Shofil estava cheio de

tremor. Os dois caminhavam até ao

longíquo edifício. Mas se quisessem

chegar até ele tão já, naquele passo,

seria muito difícil. Decidiram

aumentar o passo. E começaram a


correr.

Quanto mais os dois corriam e mais perto do templo ficavam, mais claras

ficavam algumas questões. Shofil olhou para a Omena, que corria

cantarolando a sua alegria e as suas razões.

“Há um motivo pelo qual eu apareci à ti quando eras arrastada pelos

guardiões. É o mesmo motivo que te faz entender as minhas marcas e

sentir que as conheces, mesmo se me escondesse em mil multidões. No

castelo da Vleuela, a tua voz foi o suficiente para me parar. Os momentos

em que tu sabias como interverir para eu não me machucar. No barco

onde eu tomei da caneca e tu voltaste ao normal. A Morte que vinha

buscar a ti mas olhou em meu olhos e disse, antes de tua vida poupar, que

não me faria mal.”

Omena começou a reduzir o seu passo, começando a entender o que o

Shofil estava a falar. Até que, olhando em seus olhos, parou de andar.

“Como pode ser?” - perguntou Omena, que já sabia a resposta mas não

queria aceitar. “Tu és a minha alma vivente e eu a tua renúncia”, -

respondeu Shofil, olhando para a torre que, a medida que o sol subia, mais

bela vinha a ficar. “Eu já vinha sabendo há algum tempo, mas o Leoneu

confirmou. Para te encontrares com Oãda, não devo temer: o teu

encontro com ele significa que meu fôlego expirou”.


Omena também já imaginava que esse seria o caso, mas não quis

acreditar. Esta era a sua última batalha: o seu “eu” renunciar. Shofil pedira

para que continuassem a caminhar sem que tocassem no assunto. Omena

concordou e em cada passo que dava respirava fundo. Shofil percebeu

que ela estava com dificuldades em sua morte aceitar. Mas não podia

deixar com que isso deitasse abaixo tudo que eles se aventuraram para

conquistar.

Finalmente chegaram à frente do templo. Mas não tinha nenhuma porta.

Apenas uma plataforma de madeira com um assento. Eles já sabiam o que

tinha de acontecer. Shofil olhou para Omena, sorriu e sua mão ofereceu.

“Adeus, Omena”.

Quando Shofil ia subir na plataforma, seu corpo ficou paralizado.

Lentamente olhou para trás e viu Omena, sem contacto físico, resistindo a

renúncia com um olhar agonizado. Shofil disse que ela já tinha ido longe

demais e que não podia se deixar vencer pela apego. Omena começou por

dar lentos e forçosos passos para trás, fazendo com que o corpo de Shofil

também se afastasse da plataforma. Mas Shofil lembrou-lhe que a

identidade que ela teria com ele era incompleta e sem forma. Que era

pela identidade genuina que tinham chegado tão distante. Omena

finalmente cedeu e Shofil subiu até o assento com paz em seu semblante.

Num jacto de luz, desapareceu no ar e a porta surgiu no mesmo instante.


Nós queremos ser dEle. E ser dEle
significa ser um com Ele. Precisamos
de nos achegar à Ele até descobrirmos
que ser algo depende daquele que É.
“Existe um caminho: buscando-o se achará.

Existe uma porta: batendo-a se abrirá”

Aproximando-se à porta, Omena

lembrou-se de tudo que passou para ali

chegar. Todos os diferentes espíritos que

conheciam suas identidades. Queria que

sua mãe estivesse com ela para ver as

maravilhas e com seus próprios olhos

contemplar. Porém estava convicta que ela

teria o seu próprio conjunto de

oportunidades. Olhando para a plataforma

de pedra, sorriu sabendo que a renúncia

do quebrado vale a pena para ganhar o

inteiro. Finalmente chegou à Oãda.

Presenciaria tudo em primeira mão, não

mais contado por um terceiro.

Bateu a porta. Imediatamente ela é aberta.

Não era Oãda, mas sabia que era a pessoa

certa.

“Kerkrina!”

Depois de um longo abraço, Omena conta,


com muito entusiasmo, toda a sua aventura até aquele momento. Desde

como ela livrou-se dos guardiões até a sua chegada no templo. Conta que

a parte mais difícil foi a renúncia do seu “eu” porque já estava muito

apegada. Mas ela estava muito feliz porque entendia que graça sem par a

tinha sido dada.

Kerkrina finalmente apresenta-se devidamente como sendo o espírito da

Igreja. Ela conta que foi ela quem enviou o Leoneu para ajudar Shofil e

Omena contra o espírito do Pecado na peleja. Enquanto elas conversam,

Omena repara na beleza do templo e toda sua grandiosa dimensão.

Estava alegre por ter chegado cá e ter encontrado a Kerkrina: o “motivo”

da sua peregrinação.

“Onde está Oãda?” - perguntou Omena, olhando a sua volta e procurando

ver se estava ali mais alguém.

“O segundo adão. Crês tu nEle?” - Kerkrina indagou e Omena percebeu

que era uma pergunta de bem. Convicta, afirmou que sim. Kerkrina conta

sobre todos os feitos de Oãda e como Ele passaria a fazer morada em

Omena a partir daquele momento, selando ela nEle e encontrando ela sua

Identidade. O brilho de Omena mudou. Uma nova era, uma nova idade.

Ainda com muito por aprender, mas com entusiasmo e cheia de vontade.

Havia alguém, porém, que Kerkrina a queria apresentar. Alguém que

estaria com ela para nessa nova jornada acompanhar.


“Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação; as coisas
antigas já passaram, eis que tudo se fez novo!
- 2 Coríntios 5:17
A LENDA
DE OÃDA
UMA NARRATIVA
POÉTICA SOBRE A
BUSCA POR IDENTIDADE

ESCRITO E ILUSTRADO
POR GIOTTO VASSOA
AS CITAÇÕES NA INTRODUÇÃO DE
CADA CAPÍTULO SÃO DE LUÍS LIFANIÇA.

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