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DE OÃDA
UMA NARRATIVA
POÉTICA SOBRE A
BUSCA POR IDENTIDADE
ESCRITO E ILUSTRADO
POR GIOTTO VASSOA
Mais eu do que eu mesmo
Marcas da Ignorância
Assobio sobre o Mar
Labaredas Intrânquilas
Chuva, Ondas e Vinho
Pedras e Flores
Pequeno Gigante, Enorme Anão
Os Enviados
O Lago da Morte
Eu contra mim mesmo
Oãda: O Segundo Adão
“A LENDA DE OÃDA” é um
conto que retrata a história de
uma menina que está a
procura de identidade num
mundo de simbologias. Sua
preocupação inicia com
questões como “por quê é que
em casa eu sou filha e na
escola eu sou aluna?”.
Insatisfeita com as respostas
que seu povo dá, ela se
aventura numa jornada para
encontrar alguém que todos
têm como uma ignorada lenda:
Oãda, o dador de Identidade.
AS CITAÇÕES NA INTRODUÇÃO DE
CADA CAPÍTULO SÃO DE LUÍS LIFANIÇA.
“Ninguém não é.”
- Vá brincar lá fora, Omena!
es t á a
suspiro. Se até para a morte serve o tiro,
retiro?
Assentada na pedra, Omena pensou. Não conseguiria sossegar sem uma
com quem ela tinha feito uma aposta. Levantou-se e voltou a correr
contra o vento, indo pela rua com toda sua força. “Quero ir o mais rápido
que puder, para que o que minha mãe me disse minha decisão não
distorça”. Quando chegou ao seu destino, percebeu que usou todo fogo
“Eu não sei...”, - respondeu Omena. Já não era apenas curiosidade. Era
sua essência.
Reza a lenda que existe um que sabe todos os mistérios. Alguém que os
Na terra da Omena, nada disto faz sentido. Todos ignoram e alguns ousam
buscar.
“Estiveste com Ele?”
sobre Oãda, o dador de Identidade. Eram histórias que a sua mãe não
queria nem ouvir falar. Sempre que Omena falasse que Oãda oferecia
liberdade, num poderoso rugido, sua mãe a mandava calar. Então, seus
sua amiga Kerkrina tinha um brilho nos olhos que ninguém mais na aldeia
possuia. Diferente das almas ocas do seu não tão humilde povo, Kerkrina
se abrirá”
andar. Encontraria sua identidade, por mais que fosse a esmo. Queria
do que Oãda, sua mãe a viesse encontrar. Queria estar segura e não
temer a solidão nem o frio. Queria dormir, comer e banhar: queria sim
esse trio.
Enquanto chorava, com o olhar fito na terra, escutou passos e vozes vindo
apenas para descobrir que quem vinha era um guardião. Não. Eram dois.
agachando para vê-la de perto. Quando Omena olhou nos olhos dos
guardiões, lembrou-se do motivo pelo qual sentia que buscar Oãda seria o
sucrilho. Então, ergue-se, limpou suas vestes e com a voz pouco branda,
Com os olhos fitos nela, disseram “vá para casa. Corra na direção oposta”.
respondeu, tentando não apejar, dizendo “eu sei da consequência. Sei que
não recebem esta resposta com frequência. Não me impeçam, pois este é
força para soltar-se e livrar-se dali. De repente, ouviu-se uma voz que
olhar de quem tinha tudo a temer. Foi quando Omena viu um vulto
mundo, relevância.
“Longe de Deus somos tudo, menos
familiares...nada distantes.
Em seu caminho, sentiam uma calma brisa que por trás os seguia e servia
por causa da noite e do seu cansaço. Mas rapidamente entendeu que era
Durante o jantar e uma conversa sobre Oãda, Vleuela diz que já se tinha
encontrado com Ele e que o encontro foi algo surreal que não podia
explicar. Shofil, desconfiado, diz que estavam cansados e que não tinham
desaparecem. Sua pele fica cinza e nela tatuagens nascem. Shofil põe-se
porém, diz que não é problema e torna ao normal. Após fazer as pazes,
temerosos a palpitar. Mas quando ouviu o Seu comando, não pôde mais
nada se não se acalmar. À força, mas em paz. Paz que só Oãda traz.
No dia seguinte, Omena e Shofil voltaram
Olhando para as chamas, Shofil e Omena decidiram que melhor era dali se
forma como as chamas se moviam pelo chão era peculiar, o que fazia
Omena e Shofil acreditarem que não era uma chama da qual pudessem
voltaram a ser uma só e delas surgiu um rapaz. Sua pele era dura como a
crosta terrestre e dava para ver seu interior em chamas. Uma vista que à
ninguém apraz.
distinto povo. Explicou que já presenciou alegria e aflição mas raras vezes,
os reinos que o sabem utilizar, mas que, no final, ele é quem os consome
até ao tempo que não se pode consumar. Bateu em seu peito, dizendo
que sabia quem era e que sem dúvidas e com muita clareza conhecia sua
egocêntrico do que antes, narrou sobre como ele enchia fornalhas com
seu manto escarlate. A angústia de quem era para lá lançado era, para ele,
arte. Até que um dia um certo rei mandou três jovens ao fogo ardente da
falha. Não os conseguia consumir. Foi então que viu um quarto homem
que olhou para Oond nos olhos e tirou-lhe o poder. À força, mas em paz.
Paz que só Oãda traz. Nesse momento Oond entendeu que maior era Ele
que mudou sua natureza para salvar quem conhecia sua identidade. Nem
a chuva lhe trazia tanta vulnerabilidade. Muito menos a Paz. Sim, Paz.
Nós não somos de
nós mesmos.
Portanto, não temos
legitimidade para
decidir o que
queremos ser.
Oond criou uma trilha de chamas que
sem que alguém lhes apresente algo diferente. Para ser liberto,
Ao aproximar, Omena viu seus olhos azúis refletirem sua própria imagem.
para as mãos dele. Cerrando as mãos, ele disse “não chores”. Omena sorri
e diz “o que for que queiras fazer com as lágrimas, não demores”. O
admirou-se e perguntou como é que ele sabia da sua busca mesmo antes
respondeu que saberia quando a hora chegar, mas garantiu que eram o
oposto de nocivas.
conheço a Ele? Bem, mais do que isso, Ele conhece a mim...melhor do que
eu mesmo”.
Shofil, que mostrava interesse por Oãda pela primeira vez, pergunta a
certamente ter sido transformado para vinho foi o mais marcante que ele
água para o vinho e ter tido paz me fez entender que eu não sou sem Ele,
ter com ela. Sua aparência estava intácta, mesmo depois de ter descido a
“Esta tatuagem, te digo, é muito especial. Porque ela fala tanto do bem e
do mal”.
rosto, Berge defende todos os golpes que Shofil se pôs a lançar. Pelo
quando ela percebe que Shofil está apenas a magoar-se, Omena tenta
violência estraguem.
era algo que ela chamou de obras da carne. Que o que Shofil viu em sua
tatuagem era seu próprio sangue e a dificuldade que ele tem sobre seu
vida e de morte. Que Oãda podia transformá-las em pão e não o fez, mas
os ignorantes não tem a mesma sorte. Vão contra as rochas com tudo que
Já em pé, Omena perguntou porquê é que ela não via nenhuma tatuagem
Explicou que sua rosa era o seu próprio desejo - dar vida. Mas as pedras
sufocavam e não entrava a luz devida. Mas se Omena nada via, realmente
continuar a caminhar.
O vale ia ficando cada vez mais escuro e frio. Já não se ouvia mais os
“Omena”, - diz Shofil, escutando passos vindo em sua direção, pela frente.
O vale era estreito e dos dois lados haviam rochas gigantes; se fosse
caminhar ela não estava esgotada. Ele ofereceu ajuda, pois tinha tudo que
eles viriam precisar. Comida, bebida e até uma cama para poderem
descansar. Shofil ainda não se tinha recuperado dos seus ferimentos, por
isso pediu à Omena para que pudessem com o pequeno homem por um
convite mas diz que em nada que é seu ela iria tocar. Só precisava de uma
sentar. Ela disse que não, sentando nas rochas, atentamente ao homem
pequeno a controlar. Deitou-se e adormeceu, enquanto Omena olhava
pelo seu nome, o homem respondia “ele não leu nenhum til”. Passado
homem olhava para o seu amigo. “Shofil, acorda. Vamos embora.” - disse
Shofil não acordava do seu sono mas respondia: “Estou com preguiça.
Os passos ficavam cada vez mais estrondosos e Omena não parecia ter
poder para o parar. Foi quando uma enorme luz, atrás dela, começou a
tirou da cama. O homem gigante, pequeno mais uma vez, pôs-se a correr
o salário do seu contracto é a morte, seu nome não foi por ele revelado.
Temos a tendência de procurar
nossa identidade em coisas ou
pessoas que assemelham se a nós.
Pois achamos que se encontrarmos
algo parecido a nós é porque está
relacionado a nós. O resultado
disso acaba sendo perdidos se
identificando com outros perdidos.
O moço que salvara Shofil apresentou-se
coração.
Partilhou que era obsecado por poder e era tudo que ele queria. Ficou tão
focado em sua missão que a razão não mais via. Até que seu encontro
realmente esteve com Ele e sabe como o encontrar. Mas Shofil estava
ainda muito para baixo, evitando a todo custo sobre a conversa comentar.
sua cabeça e surpreso olhou para Leoneu que não apresentava mais
porque na altura Oãda já era seu seguro porto. Ele tinha apenas o
Existia uma nação cujo apelido era “Os Enviados” e faziam parte destes as
Não queria mais escutar o que Oãda tinha a dizer. Queria ter liberdade.
Mal sabia que ele já era livre e, não menos importante, tinha em Oãda sua
identidade. Daí, Omena comentara que era exactamente isso que ela
exactamente é; sim, era o que ela mais almejava. Via pessoas vivendo
frente, onde do outro lado tinha um enorme templo. “Eis que só vos resta
passar por este lago para Oãda encontrar”, - exclama Leoneu, andando em
Omena correu para o pequeno barco que parecia estar a sua espera para
chegar à sua meta. Mas não tinham lá remos, apenas uma caneca. Leoneu
MORTE
Shofil junta-se à Omena no barco que está
dizer?”
“Omena.”
olhou para o lado e viu que não tinha nada a movimentar o barco. Olhou
para Shofil que estava com a aparência de quem estava a espera que
em levar a Omena até Oãda, como se tivesse feito uma promessa. Depois
de um tempo de silêncio, Omena começou a falar. Mas sua voz estava tão
pequena que ao Shofil estava a assustar. Seu discurso era de alguém que
não estava mais convicta de que Oãda era a melhor opção. Que todos em
sua vila viviam do mesmo jeito há séculos e talvez a sua mãe tivesse
razão. Mas não podia mais voltar porque já estava longe demais. E
provavelmente para sua mãe a ideia de ter uma filha fujona mesmo
voltando não a apraz. Mesmo que encontre Oãda, para onde iria ela?
terra. Talvez fosse melhor encontrar o fim da vida dela ali naquele lugar. O
pegar-lhe a tempo. Segurando Omena, fazia força para que ela seu corpo
para a água não atirasse. Mas ela dizia ouvir vozes no fundo do lago que
senso. Mas ela voltou a levantar e com mais força quase se jogava para
barco. Pegou a caneca que ainda tinha água e deu um gole. Omena
sentou e aos seus sentidos voltou, seu corpo ainda mole. Do lago subiu
Shofil o quis atacar, seu corpo não se podia mexer. Dood olhou em seus
olhos e disse “...não. Ainda não é tua hora de perecer”. Shofil voltou ao
disse a Omena que a vida e a morte estava em sua própria mão. “Como
podem ver, eu não sou o fim”, - disse a Dood, apontando para o templo.
“Há um com poder maior do que eu posso sustentar. Oãda vos espera.
Quanto mais os dois corriam e mais perto do templo ficavam, mais claras
buscar a ti mas olhou em meu olhos e disse, antes de tua vida poupar, que
Shofil estava a falar. Até que, olhando em seus olhos, parou de andar.
“Como pode ser?” - perguntou Omena, que já sabia a resposta mas não
respondeu Shofil, olhando para a torre que, a medida que o sol subia, mais
bela vinha a ficar. “Eu já vinha sabendo há algum tempo, mas o Leoneu
acreditar. Esta era a sua última batalha: o seu “eu” renunciar. Shofil pedira
que ela estava com dificuldades em sua morte aceitar. Mas não podia
deixar com que isso deitasse abaixo tudo que eles se aventuraram para
conquistar.
tinha de acontecer. Shofil olhou para Omena, sorriu e sua mão ofereceu.
“Adeus, Omena”.
Lentamente olhou para trás e viu Omena, sem contacto físico, resistindo a
renúncia com um olhar agonizado. Shofil disse que ela já tinha ido longe
demais e que não podia se deixar vencer pela apego. Omena começou por
dar lentos e forçosos passos para trás, fazendo com que o corpo de Shofil
identidade que ela teria com ele era incompleta e sem forma. Que era
finalmente cedeu e Shofil subiu até o assento com paz em seu semblante.
certa.
“Kerkrina!”
como ela livrou-se dos guardiões até a sua chegada no templo. Conta que
a parte mais difícil foi a renúncia do seu “eu” porque já estava muito
apegada. Mas ela estava muito feliz porque entendia que graça sem par a
Igreja. Ela conta que foi ela quem enviou o Leoneu para ajudar Shofil e
da sua peregrinação.
que era uma pergunta de bem. Convicta, afirmou que sim. Kerkrina conta
Omena a partir daquele momento, selando ela nEle e encontrando ela sua
Identidade. O brilho de Omena mudou. Uma nova era, uma nova idade.
Ainda com muito por aprender, mas com entusiasmo e cheia de vontade.
ESCRITO E ILUSTRADO
POR GIOTTO VASSOA
AS CITAÇÕES NA INTRODUÇÃO DE
CADA CAPÍTULO SÃO DE LUÍS LIFANIÇA.