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Introdução ao Jainísmo

História, Fundamentos e Filosofia.

Por Gilson Valejo


Copyright © 2003
gilvalejo@yahoo.com
Índice

Prefácio.................................................................................................. 03

1. Parte I – História, Senhor Mahavir e a Filosofia Jainísta................ 04

• Os 24 Tirthankaras
• Senhor Mahavir
• A Renúncia
• Ascetismo e sabedoria
• Os Livros Sagrados
• Símbolos
• As duas escolas
• Práticas diárias
• As seis observações
• Saudações e Orações
• A Filosofia
• Jainísmo e Deus

2. Parte II – A Doutrina Jainísta e o Caminho da Libertação............. 14

• Princípios éticos – As Três Jóias da Sabedoria


• A Realidade
• A Teoria do Karma – Os Nove Tattvas

3. Parte III – Comparações entre Hinduísmo, Jainísmo e Budismo.. 21

• Jainismo e Budismo
• Conceitos comuns
• Ahimsa, ou Não-Violência
• Religião cientifica, ética e moralidade
• Mahavir e Buda
• As diferenças
• Austeridades e penitências

4. Parte IV – Resumo do conceito geral: “Manifesto Jainista”.......... 25

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Prefácio

Nos últimos anos a antiga civilização da Índia e suas filosofias vêm cativando o
interesse de milhões de pessoas ao redor do mundo, especialmente no
ocidente, por tratar-se de uma cultura extremamente antiga e paradoxalmente
extremamente atual. Yoga, Tantra, Medicina Ayurvédica e Budismo estão entre
os assuntos que despertam grande interesse devido a suas qualidades
espirituais, morais e práticas, ajudando na evolução da humanidade em
conceitos tão atuais e importantes como saúde, ecologia e paz. Curiosamente o
Jainísmo acabou não se tornando tão conhecido ou popular como as outras
filosofias e religiões citadas, talvez por falta de uma maior divulgação.
Curiosamente sim, porque a religião Jainista é tão ou mais antiga do que suas
outras “irmãs” e possui um refinamento espiritual tão atual que seus conceitos
poderiam estar estampados em qualquer livro contemporâneo do séc. XXI. Há
mais de três mil anos atrás os monges Jains já falavam em paz, preservação da
natureza, proteção aos animais, além de ser provavelmente a primeira grande
religião a adotar o vegetarianismo como regra de alimentação para seus
adeptos. Enquanto egípcios e gregos realizavam sacrifícios rituais e adoravam
deuses distantes, os jainistas já falavam em controle mental do estress e
degradação do meio-ambiente! Seus ensinamentos sobre como podemos
melhorar nossas vidas através de uma perspectiva mais psicológica e menos
mística, onde nós somos os responsáveis por tudo o que nos acontece, podem
facilmente ser encontrado nos livros de auto-ajuda que inundam as prateleiras
das livrarias atualmente.

No Brasil o jainísmo é praticamente desconhecido. Até o fechamento desta


pequena apostila introdutória ainda não existe uma única publicação sequer
sobre esta religião em língua portuguesa, salvo algumas matérias em revistas
especializadas. Para escrevê-la tive de recorrer a inúmeras fontes de
informação disponíveis na Internet, quase todas em inglês, traduzindo e
interpretando de maneira a escrever sua história como uma “apresentação ao
público brasileiro” sobre esta religião. Eu mesmo não conhecia o jainísmo e só
fui descobri-lo quando comecei a procurar uma religião que não se preocupasse
apenas com o ser humano, mas que levasse em conta o respeito e o amor pela
natureza e por todos os seres vivos. Como vegetariano convicto e membro de
sociedades protetoras dos animais procurei estas respostas no Budismo e no
Movimento Hare Krishna, mas ambas não me satisfizeram plenamente. Foi
somente na filosofia jainista que encontrei a harmonia perfeita entre estes
temas, amplamente discutidos por seus seguidores.

É uma apostila introdutória, simples e básica, mas que possui certamente seus
principais conceitos e ensinamentos. Há muito mais coisa a ser escrita, afinal
uma religião com mais de três mil anos de historia não pode ser resumida em
um único livro. Espero despertar o interesse de outras pessoas, assim como o
meu foi despertado, e escrever novo e mais completo material sobre uma das
mais antigas e evoluídas filosofias da humanidade.

Jai Jinendra!

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Parte I – História, Senhor Mahavir e a Filosofia Jainísta.

A Índia é o berço do Jainísmo, considerada uma das mais antigas e tradicionais


religiões do mundo. A data exata de seu surgimento, segundo os estudiosos,
esta relacionada ao nascimento do Senhor Bhagwan Rishabdev Swami, o
primeiro Tirthankar Jainista, que teria aparecido neste mundo há cerca de
5.000 anos atrás segundo antigas escrituras hindus. De fato, esta filosofia
tornou-se mais conhecida após o surgimento do Senhor Bhagwan Mahavir
Swami, em 599 a.C., considerado como o 24º e último dos Tirthankaras da era
atual.

De acordo com a filosofia Jainista os Tirthankara, também conhecidos como


Arihants ou Jinas, nasceram como seres-humanos normais, mas atingiram o
estado de iluminação através de meditação e auto-realização, vencendo a ira,
cobiça, desejo e ego, tornado-se então seres perfeitos. Mahavir (variando a
grafia para Mahaveer ou Mahavira) foi o mais conhecido reformador e
propagador do movimento, que além de seguir e estabelecer os preceitos de
seu antecessor Bhagwan Parshvanath Swami, reorganizou e atualizou seus
conceitos à luz de seu tempo.

Os 24 Tirthankaras

O Jainísmo reconhece 24 Mestres ou Gurus que, como almas libertas pela


meditação e auto-realização, formam a base da religião.

Esta é a ordem adotada oficialmente pelo Jainísmo:

1º - Bhagwan Rishabdev Swami 13º - Bhagwan Vimalnath Swami


2º - Bhagwan Ajitnath Swami 14º - Bhagwan Anantnath Swami
3º - Bhagwan Sambhavnath Swami 15º - Bhagwan Dharmnath Swami
4º - Bhagwan Abhinandan Swami 16º - Bhagwan Shantinath Swami
5º - Bhagwan Sumatinath Swami 17º - Bhagwan Kuthunath Swami
6º - Bhagwan Padamprabhu Swami 18º - Bhagwan Arnath Swami
7º - Bhagwan Suparshwanath Swami 19º - Bhagwan Mallinath Swami
8º - Bhagwan Chandraprabhu Swami 20º - Bhagwan Munisuvrat Swami
9º - Bhagwan Suvidhinath Swami 21º - Bhagwan Naminath Swami
10º - Bhagwan Sheetalnath Swami 22º - Bhagwan Neminath Swami
11º - Bhagwan Shreyansnath Swami 23º - Bhagwan Parshwanath Swami
12º - Bhagwan Vasupujya Swami 24º - Bhagwan Mahavir Swami

Em Sânscrito, língua falada na Índia remota e considerada uma das mais


antigas, importantes e influentes da humanidade, Swami significa mestre, guru
ou professor e Bhagwan (também encontrado como Bhagavan ou Bhagavad)
significa algo como “venerável”.

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Senhor Mahavir

Mahavir nasceu em 599 a.C. no estado de


Bihar, norte da Índia. Conta-se que sua mãe, a
Rainha Trishala, teve uma série de sonhos
simbólicos durante a gravidez e a pedido de
seu marido, o Rei Sidharth, os sábios do
palácio interpretaram estes sonhos, concluindo
então que a Rainha havia tido visões
premonitórias sobre seu futuro filho, que se
tornaria um grande sábio e seus ensinamentos
seriam capazes de levar os homens à
iluminação. O jovem príncipe foi batizado com
o nome de Vardhaman e segundo a tradição
era uma criança destemida e extremamente
inteligente, chegando até mesmo a desafiar
intelectualmente seus tutores e os Brâmanes
(mestres espirituais) do reino. Como todo príncipe da época, viveu sua infância
e juventude cercado de posses e mordomias palacianas.

A Renúncia

Certa vez, quando tinha por volta de trinta anos de idade, conta-se que
Vardhaman observava o ritual de renúncia de um monge asceta chamado
Chandraprabhu. O príncipe seguia toda a cerimônia de um canto escondido, de
modo que não pudesse ser visto ou reconhecido pelos presentes.
Inesperadamente, Vardhaman saiu e apareceu no meio da multidão que
imediatamente virou-se para ele, sendo logo reconhecido pelas roupas e
adornos cintilantes que carregava junto ao corpo. Neste momento o príncipe
começou a se desfazer de suas vestes e ornamentos, ficando apenas com um
manto sobre o corpo. Também terminou por raspar seu cabelo, ficando com a
aparência de um monge errante. Logo após este ato, Vardhaman repetiu em
voz alta: “Namo Siddhanam”, que significa “Eu reverencio os Siddhas, as almas
liberadas”, e novamente disse: “Eu aceito a pratica da humildade por toda a
minha vida e abandono todas as atividades pecaminosas intencionais”. Deste
momento em diante, renunciando á vida material, tornou-se então conhecido
Mahavir que significa “O mais corajoso entre todos”. Outras freqüentes
denominações encontradas são: Shraman Mahavir, Bhagwan Mahavir Swami ou
Senhor Mahavir.

Segundo as escritura Jainistas, o ato de renúncia de Mahavir foi o ápice de sua


evolução espiritual e fruto de sucessivas encarnações. Sua alma foi
gradualmente se purificando ate chegar em sua ultima existência como o
príncipe Vardhaman, o Tirthankar correspondente à era atual. Apesar de toda a
riqueza e fama que o circundava, ele sempre olhou além do conforto material e
questionava os porquês da dor e do sofrimento de todos os seres vivos.

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Ascetismo e sabedoria

Logo após sua renúncia, Mahavir começou a caminhar como um monge errante
pelas florestas da Índia praticando diariamente exercícios de ascetismo yogi
como jejum, meditação e se alimentando apenas de sementes, vivendo dias e
dias em profundo silêncio e evitando fazer mal a todo e qualquer tipo de ser
vivo, incluindo animais, insetos e plantas.

Conta-se que certa vez um vaqueiro conduzia seu gado próximo a árvore onde,
logo abaixo dela e protegido por suas folhas, Mahavir estava meditando. As
vacas imediatamente desviaram de seu caminho e foram para perto dele, como
que atraídas pela sua presença. Suspeitando que o asceta pudesse ser um
ladrão, o vaqueiro dirigiu-se ate ele e começou a golpeá-lo com uma grossa
corda. Mesmo sendo duramente atacado e tendo seu corpo marcado por
vergões, Mahavir continuava imóvel em posição de meditação e em profunda
concentração. Foi neste momento que surgiu Indra, o Rei dos Deuses, que
imediatamente voltou-se para o vaqueiro e, repreendendo-o fortemente,
exclamou: “Pare, seu ignorante estúpido! Você esta cometendo um grave
crime! Esta pessoa não é um ladrão e sim Shraman Mahavir, filho do Rei
Siddharth! Eis o mais auspicioso de todos os yogis!” O vaqueiro então caiu em
si arrependido e prostrou-se aos pés de Mahavir, implorando-lhe perdão pela
terrível ofensa cometida. Indra, sentindo-se perturbado pelas marcas
inflamadas no corpo do yogi, pediu permissão para que fosse seu protetor
perante os perigos e as dores que os homens ignorantes pudessem lhe causar.
O Senhor Mahavir, em profunda atitude de humildade, respondeu: “Oh, Rei dos
Deuses! Você deveria saber que uma pessoa no caminho espiritual alcança a
purificação com sua própria ajuda, através de sua própria pratica, disciplina e
coragem. Não é com a ajuda de deuses ou demônios que uma alma anula seu
carma e fica liberta, tornando-se um Arahant”. O Rei dos Deuses então
reverenciou Mahavir em profundo respeito e finalmente partiu.

O período ascético de Mahavir durou cerca de doze anos, após os quais ele
alcançou o estado de iluminação. Passou as próximas três décadas de sua vida
viajando a pé por toda a Índia, pregando ás pessoas a verdade espiritual que
alcançara. Pregou para homens, mulheres, jovens, idosos, pobres, ricos,
monges, reis e guerreiros. Seus adeptos seriam conhecidos então como os
seguidores dos Jinas, ou Jains. Sua forma de conduta, meditação e
austeridades tornaram-se um belo e importante exemplo. Aos 72 anos de
idade, Bhagwan Mahavir Swami realizou seu Parinirvana, ou sua passagem
definitiva deste mundo, tornando-se uma alma perfeita (Siddha). Nesta data
comemora-se o “Festival das Luzes”, conhecido como Dipavali ou Diwali.

Nos séculos seguintes após a morte de Mahavir, a comunidade religiosa Jainista


começou a crescer em tamanho e complexidade. Houve novas interpretações
de alguns conceitos, mas nada que afetasse a doutrina original pregada pelos
Tirthankaras. Entretanto, gerações seguintes assistiram à introdução de rituais
e cultos que quase colocaram Mahavir e os outros Tirthankaras na posição de
deuses do Hinduísmo, o que seria um erro.

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Na verdade os Jainistas cultuam os 24 Tirthankaras na forma de qualidades e
virtudes a serem seguidas e não como seres supremos. São colocados símbolos
abaixo da imagem de cada um apenas para diferenciá-los. Mahavir tem como
símbolo um Leão, que representa sua força e coragem, pois foi o principal e
mais conhecido propagador da doutrina jainista, reforçando seus ensinamentos
espirituais e morais que acabaram por inspirar milhões de pessoas.

Ele fez desta religião algo simples e natural, livre de complicações e rituais
elaborados. Suas palavras refletiram uma vontade comum em seguir a beleza,
bondade e harmonia interior da alma. Suas mensagens apontam um caminho
para a liberdade e a felicidade espiritual de cada ser vivo, pregando o amor
universal e enfatizando que todos os seres, independentemente de espécie,
raça, tamanho, forma e avanço intelectual são iguais, merecendo o mesmo
amor e respeito.

Os Livros Sagrados

Os Jains são conhecidos como grandes leitores. Existem cerca de 45 livros em


forma de compilações de ensinamentos verbais, chamados de Cânones que
fazem parte da filosofia Jainista. Estes livros canônicos são conhecidos como
Agams. Cada capitulo dos cânones é chamado de Sutra em sânscrito. Um dos
mais conhecidos e importantes sutras de estudo Jain é o “Tatvartha”, escrito
por Umaswami. Existem igualmente um sem numero de outros bons livros
escritos por adeptos da filosofia que podem ser utilizados como fonte de
estudo.

Os ensinamentos do Senhor Mahavir em específico foram compilados oralmente


em muitos textos e escrituras ou Agams, como mencionado acima. Da mesma
maneira que ocorreu com o Buda, os ensinamentos de Mahavir não foram
originalmente documentados, mas memorizados por monges ascetas da época
e apenas tempos após sua passagem é que foram escritos e editados. Estes
textos pregam o respeito a todas as formas de vida, nos ensinam sobre a
verdadeira compaixão, não-violência, paz e ascetismo e estabelecem códigos
alimentares restritivos, pregando o vegetarianismo absoluto.

Estes Agam Sutras estão divididos em dois grandes grupos:

Ang – Contêm os ensinamentos diretos do Senhor Mahavir. Foram compilados


por seus discípulos mais próximos imediatamente após seu Nirvana e possuem
ao total doze textos. O décimo segundo e último Agam foi perdido e
infelizmente nenhum monge conseguiu memorizá-lo posteriormente.

Angbahya – Foram compilados posteriormente por monges que possuíam


grande conhecimento dos Agams Ang. Fornecem maiores e mais detalhadas
explicações dos mesmos.

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Símbolos

O Jainísmo é uma das religiões mais antigas a adotar o símbolo da swasthica,


que ficou conhecida de maneira bastante negativa no ocidente como suástica.
Seu significado foi amplamente adulterado e distorcido pelas infelizes idéias de
Adolf Hitler e o nazismo, que adotaram-na sob perspectivas místicas e
supersticiosas totalmente nebulosas e ignorantes.

A suástica é um símbolo antiqüíssimo encontrado em varias civilizações do


passado, tanto no oriente quanto no ocidente. A falsa suástica nazista era
desenhada de forma invertida e girando para a esquerda, em provável
referência ao caminho da mão esquerda, ou o caminho do mal.

A verdadeira swasthica é originalmente desenhada de forma reta e vertical, não


pendendo para nenhum dos lados, e representa a perfeita harmonia entre os
principais elementos do universo (em especial no jainísmo, representa também
os quatro estados da alma).

A suástica jainista e seus significados:

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As duas escolas

Como é comum em praticamente todas as religiões, com o passar dos anos os


adeptos vão se convergindo ou se divergindo em opiniões sobre os
ensinamentos originais e o rumo futuro da doutrina, acabando por estabelecer
então divisões ou ramificações de uma mesma filosofia. Com o jainismo não foi
diferente e duas grandes correntes de pensamento com alguns pontos
divergentes acabaram por formar duas escolas. Pode-se dizer que ambas as
escolas tem mais pontos em comum do que diferenças, de maneira que a
essência básica dos ensinamentos do Senhor Mahavir não foi distorcida e seus
praticantes, quer pertençam a uma ou a outra escola, tem praticamente a
mesma doutrina fundamental. Estas duas tradições são conhecidas como escola
Digambar e escola Shwetambar. São diferenças sutis nas praticas e rituais e na
aceitação da autenticidade de um ou mais Agams que caracterizam-nas, sem
entretanto comprometer os ensinamentos principais.

Os monges Digambar por exemplo não usam roupas ou uniformes, enquanto os


monges Shwetambar utilizam roupas monásticas brancas, comuns a outras
filosofias hindus. Em relação aos sutras Agams citados anteriormente, os
monges Shwetambar aceitam como verdadeiros todos os onze Ang (lembrando
que o décimo segundo foi perdido) com sendo ensinamentos autênticos do
Senhor Mahavir. Já os monges Digambar não aceitam estes Agams como
totalmente autênticos, argumentando que quase mil anos após a morte de
Mahavir nenhum monge poderia se lembrar das escrituras originais, mesmo
sendo preservadas por gerações. Desta forma os monges Digambar incluem um
Agam específico chamado Agam Shatkhand, escritos por monges de grande
conhecimento na doutrina jainista original.

Práticas diárias

Os adeptos do jainismo observam em seu dia-a-dia uma série de praticas para


que exercitem-se no estudo da filosofia e no caminho para alcançar a
iluminação. Estas atividades incluem reverenciar e cultuar os 24 Thirthankaras,
estudo e recitação de textos e escrituras, participação em discursos e palestras
religiosas, práticas de austeridades e penitências físicas e espirituais, longos
períodos de meditação e a realização de atos de caridade tanto para seres-
humanos como também para animais. O calendário anual jainista é observado
de acordo com o calendário anual lunar (354 dias).

Mahavir Jayanti (Janma Kalyanak): celebração do nascimento do Senhor


Mahavir, entre março e abril.

Paryushan: celebração anual de oito dias realizada especialmente na tradição


Shwetambar, entre agosto e setembro.

Das Lakshan: celebração anual de dez dias realizada especialmente na tradição


Digambar, entre agosto e setembro.

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As seis observações

O jainismo estabelece seis atividades diárias consideradas as mais importantes,


que são diferenciadas entre as principais tradições.

Seis observações diárias essenciais pela tradição Shwetambar


Samayik Procurar manter-se o mais calmo e imperturbável possível por um
período de 48 minutos
Chauvisattho Orar, apreciar e pregar as qualidades dos 24 Tirthankaras
Vandana Devoção e serviço aos monges do templo
Pratikraman Reflexão sobre pensamentos e ações erradas do passado
Kayotsarg Desapego ao corpo (manter-se sentado ou em pé, totalmente
imóvel durante um certo período)
Pratyakhyan ou Abster-se de certas atividades e de certos alimentos durante um
Pachchhakhan determinado período.

Seis observações diárias essenciais pela tradição Digambar


Devapuja Orar, apreciar e pregar as qualidades dos 24 Tirthankaars
Gurupasti Devoção e serviço aos monges do templo
Swadhyay Estudo das escrituras
Samyam Abstenção de atividades e alimentos
Tap Práticas de austeridades
Dana Caridade

Saudações e Orações

A principal saudação do jainismo é Jai Jinendra (pronuncia-se djái djinendrá)


que significa “Glória ao Jin Supremo”, em reverência aos seres que atingiram o
estado perfeito da alma. O principal mantra ou oração da religião jainista é o
Mantra Navkar ou Namaskar, sendo considerado um Maha-Mantra, ou mantra
supremo. Trata-se de uma oração composta por nove versos que reverenciam
as principais formas de gurus e personalidades e é comumente cantada
acompanhada de instrumentos típicos, podendo também ser simplesmente
recitada sozinha.

Navkar ou Namaskar Mantra:

Namo Arihantanam – “Eu reverencio os Arithantas (seres humanos iluminados)”


Namo Siddhanam – “Eu reverencio os Siddhas (almas liberadas)”
Namo Ayariyanam – “Eu reverencio os Acharyas (líderes da congregação Jain)”
Namo Uvajjayanam – “Eu reverencio os Upadhyayas (professores ou gurus)”
Namo Loe Savva Sahunam – “Eu reverencio os Saddhus (monges ascetas)”
Eso Panch Namukkaro – “A estas cinco almas liberadas eu presto reverências”
Savva PavapPanasano – “E este louvor destrói a todos os pecados”
Mangalanam Cha Savvesin – “E sobre tudo o que é mais auspicioso”
Padhamam Havai Mangalam – “Esta é a maior de todas as bênçãos”

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A Filosofia

Na Índia antiga, o Jainísmo era conhecido também como a Tradição Saman,


Religião de Nirgantha e ainda como a Religião dos Jin. O Jin é aquele que
conquistou seus inimigos interiores como desejo, ira, cobiça, ego e ignorância.
Por definição, Jin é um ser humano como qualquer um de nós e não um ser
sobrenatural com poderes divinos. Jins são vistos como deuses e há um
numero infinito deles que viveram no passado. Todo e qualquer ser vivo tem o
potencial de se tornar um Jin. Entretanto, estes não são deuses no sentido de
criadores do universo, mas aqueles que atingiram o objetivo último da vida que
é a libertação do ciclo de sofrimentos através do verdadeiro entendimento da
realidade.

Esta é a essência básica da doutrina Jainista: como uma pessoa pode


interromper o ciclo de nascimento – vida – sofrimento – morte, e alcançar um
estado perfeito de iluminação e libertação, também conhecido como Nirvana ou
Moksha. Neste ponto, e em vários outros, o Jainísmo de assemelha muito ao
Budismo (original). Estarei detalhando as semelhanças e diferenças destas duas
religiões em um capitulo mais á frente.

Em essência, o Jainísmo tem como foco a natureza da realidade. Mahavir dizia


que todas as almas são iguais em seu potencial pelo conhecimento perfeito,
visão perfeita, conduta perfeita e energia ilimitada. Entretanto, devido á sua
própria condição de imortalidade, a alma esta atrelada às partículas cármicas da
matéria e pela ignorância de sua natureza. É devido ao carma que a alma migra
de um ciclo de vida para outro, procurando satisfazer desejos materiais e
conseqüentemente acumulando novo carma, alimentando uma roda sem fim de
paixões, que a prendem ainda mais a este mundo.

Um conceito básico da filosofia Jainísta é de que todo e qualquer ser vivo


possui uma alma e, portanto, um acumulo de karma derivado de seus atos –
bons ou ruins. Desta forma existe uma completa interdependência entre as
ações cármicas de todos os seres existentes no Universo de onde nasce uma
característica muito particular desta religião: não fazer mal a nenhum tipo de
ser vivo, seja um micróbio ou um mamífero gigante.

Os praticantes do Jainísmo são estritamente vegetarianos e procuram em todas


as ações do dia-a-dia o bem estar e a convivência pacifica e harmoniosa com
todos os seres vivos, já que mesmo a matança de uma simples célula pode
acarretar em reações cármicas desfavoráveis.

Todos os seres vivos são considerados sagrados para os Jainistas e possuem o


mesmo direito à vida. Praticar o mal contra qualquer entidade viva é
considerado altamente pecaminoso e prejudicial à evolução. Esta conduta é
conhecida como Ahimsa, ou Não-violência.

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Os monges Jainistas são conhecidos em toda a Índia por uma característica
muito particular e especial: o uso de uma espécie de bandana ou mascara,
semelhante às usadas por médicos cirurgiões, para cobrir a boca e proteger as
narinas. O motivo deste uso costuma parecer algo exagerado para outras
religiões e filosofias, mas é necessário dentro do ponto de vista do jainísmo.
Trata-se de uma proteção contra a ingestão ou inalação acidental de algum
pequeno inseto ou bicho.

Isto representa o enorme respeito que os monges Jains tem por qualquer
forma de vida. A morte, mesmo que acidental, de qualquer ser vivo representa
sofrimento e reação cármica para ambas as partes.

Imagens de dois importantes Munis (monges) Jainistas. Observe a máscara em suas bocas.

Outra característica do Jainísmo é a adoção do vegetarianismo como prática


fundamental de sua doutrina. O grande respeito por todos os seres vivos
também se dá, segunda esta filosofia, através da alimentação. O consumo de
carne, bem como o de qualquer outro produto cuja origem seja da matança de
um animal, representa ato extremamente pecaminoso e ofensivo e gera mais
sobrecarga de carma negativo, além do sofrimento imposto a ao ser vivo
assassinado.

Uma vez que a doutrina jainista crê que qualquer entidade viva (Jiva) tem
condições de se tornar uma alma liberta, matar um animal é como matar a um
deus em potencial. O cuidado em evitar reações cármicas e o sofrimento de
outros seres é tanto que o jainísmo prevê como meta o consumo apenas de
grãos, sementes e frutas, evitando ate mesmo a morte de plantas e vegetais. A
cadeia ou ciclo advindo desta matança é vista por seus adeptos como quase
infinita.

Quando matamos um ser vivo, matamos também outros seres vivos que estão
ligados a ele direta e indiretamente, por exemplo: a morte de um boi
condenará também pequenos insetos que vivem sob sua pelagem. O que é
considerado por muitos como um exagero ideológico é visto pelos jainistas com
a naturalidade de quem pratica a Ahimsa (não-violência) em toda a sua
extensão; até quando andam os monges procuram tomar cuidado para não
pisarem em pequenos insetos ou bichos.

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Jainísmo e Deus

O Jainísmo é uma religião humanista, que acredita no auto-aperfeiçoamento e


na auto-realização do próprio homem para alcançar a perfeição. Desta forma a
concepção jainista de Deus, assim como ocorreu com o Budismo, acabou
criando ao longo do tempo uma série de dúvidas e falsas interpretações, sendo
estes sistemas filosóficos erroneamente considerados como ateístas.

O Jainísmo não é um sistema ateu, mas chamado de “impersonalista”: Deus


não é visto como uma entidade única representando uma figura com traços
humanos e personalidade própria. Os jainistas não descartam a idéia de um
Deus, porém não o vêem como um Ser onipotente, criador, protetor e
destruidor de toda a vida. O universo, segundo esta concepção, é auto-
regulado e independe de um ser supremo para dirigi-lo.

Mahavir sempre procurou questionar a fé e a adoração cega a deuses e deusas


como salvadores, ensinando a verdadeira importância do ser humano e
enfatizando uma atitude mais positiva perante a vida. O Jainísmo foi uma das
primeiras religiões conhecidas a colocar homens e mulheres em igualdade,
atraindo um grande numero de adeptas para sua filosofia.

Para os Jains, tanto o universo como tudo o que há nele é eterno. Não houve
inicio nem haverá fim na concepção de tempo. O universo é regido por uma lei
cósmica própria, sem a intervenção direta de nenhum “administrador”, uma vez
que o Jainismo não crê em um criador e destruidor supremo do universo. A
existência de Deus não é descartada na filosofia Jainista, mas vista de uma
maneira diferente das concepções personalistas, características das religiões
cristã, judaica e islâmica. Trata-se portanto de uma doutrina de cunho
intelectual e voltada para o racionalismo muito mais do que para o misticismo,
questionando sempre a velha máxima: “se Deus criou o universo, quem criou
Deus?”.

Se Deus criou o universo foi porque houve volição (vontade) de sua parte e o
desejo é um traço de imperfeição do ser humano. Estaríamos então colocando
traços humanos e aceitando um Criador imperfeito. Uma vez que para o
Jainismo todas as Jivas (almas) são iguais, Deus não poderia privilegiar alguns
seres em detrimento de outros, e o que ocorre desde o inicio do mundo são os
seres humanos se auto-proclamando mantenedores da vida e da morte, tirando
cruelmente a vida de milhares de outras Jivas inocentes.

A filosofia Jain vê um deus em potencial em cada ser vivo. Quando esta alma
rompe e anula seu carma adquire o conhecimento perfeito e o verdadeiro
poder, tornando-se onisciente e onipotente. Esta criatura então se torna um
Deus para o Jainismo. Nesta concepção Deus é inumerável e cresce
continuamente enquanto mais e mais seres vivos alcançam a libertação.
Qualquer criatura viva tem a perspectiva real de se tornar um deus para a
religião Jain, daí é possível entender o extremo respeito por qualquer forma de
vida adotado por seus seguidores.

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Parte II – A Doutrina Jainísta e o Caminho da Libertação

Para o Jainísmo o propósito final da vida significa alcançar o estado perfeito,


removendo toda a ação e influencia do karma num processo de purificação da
alma. A filosofia Jainista considera a religião como uma ciência que deve ser
praticada de forma ética. O corpo humano é como um veículo cuja alma se
utiliza para alcançar a libertação. A conduta desta vida deve objetivar o estado
de “suprema liberdade”, onde não haverá mais retorno ao ciclo de nascimentos
e mortes, numa espécie de “morte definitiva”. Para o Jainísmo, todas as almas
podem alcançar esta condição, sendo uma realização espiritual individual de
cada ser. O caminho para a libertação deve ser inspirado e seguido conforme o
exemplo das cinco classes de indivíduos:

1. Siddhas – (Almas Perfeitas)


2. Arihants – (Seres Supremos)
3. Acharyas – (Mestres)
4. Upadhyayas – (Monges)
5. Sadhus – (Ascetas)

Tanto os Siddhas como os Arihants formam o conceito básico Jainista de


“Deuses”. São seres que através de suas praticas e condutas de vida atingiram
o Keval-Jnana, ou a perfeita visão da vida. Acharyas, Upadhyayas e Sadhus são
seres humanos á caminho da auto-realização e libertação, também servindo
como mestres ou guias espirituais. O primeiro passo no processo da auto-
realização consiste em descartar toda e qualquer crença supersticiosa,
adotando uma atitude mais racional para com a vida. O Jainísmo estipula um
estudo definitivo na prática da moral, disciplina, contemplação da verdade
maior e reorientação da vida, à luz da verdadeira realidade.

Princípios éticos – As Três Jóias da Sabedoria

Formam a base dos princípios morais do Jainísmo:

• Tolerância religiosa
• Pureza ética
• Harmonia entre o eu e o meio-ambiente que o cerca
• Realização espiritual

Semelhante a outras religiões e sistemas filosóficos da Índia, o Jainísmo


prescreve o caminho da libertação (Moksha), conforme “As Três Jóias da
Sabedoria”:

1. Percepção Perfeita – (Samyak Darsana)

2. Conhecimento Perfeito – (Samyak Jnana)

3. Conduta Perfeita – (Samyak Charitrya)

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Percepção Perfeita:
Cria a consciência da realidade ou verdade. Consiste em ver de forma clara
cada substancia que existe no universo. O Jainísmo defende que devemos
tentar conhecer a verdade, compreender e entender a natureza da realidade
seja de seu próprio ser, religião ou qualquer outro caminho. Uma vez analisado,
experimentado e satisfeito, só então devemos ficar convencidos de sua eficácia.
Do ponto de vista pratico, esta percepção consiste em seguir os ensinamentos
e as escrituras sagradas dos Tirthankaras (Agams).

Conhecimento Perfeito:
É o caminho que nos faz conhecer o propósito real da vida. È a fé no
conhecimento relevante sobre a vida. Destacam-se os Nove Princípios ou
Tattvas (Jiva, Ajiva, Asrava, Bandh, Punya, Papa, Samvara, Nirjara e Moksha).
Estes princípios serão detalhados e explicados mais à frente.

Filosoficamente, estes conceitos são conhecidos como a teoria do Não-


Absolutismo (Anekantvada) e da Relatividade, que contribuem para a abertura
da mente humana rumo à libertação. O conhecimento perfeito faz-nos analisar
qualquer coisa trazida à mente pela convicção correta. Trata-se de um processo
mental que, para ser realmente perfeito, deve estar livre dos três erros mais
comuns: dúvida, desilusão e indefinição.

Conduta Perfeita:
È a conduta apropriada e natural do ser vivo (alma). O propósito básico é que o
ser humano deve se libertar do apego e da aversão, que levam a atividades
impuras do pensamento, palavra e ação. È o estado de perfeita equanimidade.
Na prática, a conduta perfeita baseia-se em cinco regras de comportamento
ético e moral, constituindo assim uma disciplina para que o praticante possa
atingir a libertação. São elas:

1. Ahimsa – (Não violência)


2. Satya – (Verdade)
3. Achaurya – (Não roubar)
4. Brahmacharya – (Castidade)
5. Aparigraha – (Desapego material)

As Três Práticas se complementam formando a Fé Verdadeira e devem coexistir


de forma equilibrada dentro de cada ser humano para que o mesmo alcance o
caminho da libertação.

As Três Jóias devem ser cultivadas coletivamente entre todos os seres para que
também a libertação seja um beneficio à todos. Individualmente elas ficam
incompletas e insuficientes, já que são dependentes umas das outras. Em
isolamento, a percepção, conhecimento e conduta podem causar conflitos e
tensões entre o aspirante e seu meio. Coletivamente, elas criam a harmonia
necessária para a humanidade elevar-se em seu plano espiritual.

15
A Realidade

Para o Jainísmo o universo é indestrutível e eterno, não possuindo princípio


nem fim e existem seis entidades fundamentais que residem nele e que são
conhecidas como Dravya. Apesar de serem entidades eternas, elas passam por
constantes transformações, onde nada é destruído. Segundo os ensinamentos
de Mahavir a realidade da existência é uma combinação de três fenômenos
distintos, porém inter-relacionados: Aparência (Utpada), Não-Aparência (Vyaya)
e Persistência (Dhrauvya). Elas representam consecutivamente a origem de um
estado da entidade, a cessação ou fim de um estado da entidade e a
permanência de um estado da entidade. A grosso modo, esta seria a “trindade
sagrada” do jainísmo. As Seis Entidades ou Substâncias Fundamentais do
Universo são:

Nome Significado Característica


1 Jiva Alma ou Consciência Entidade viva
2 Pudgal Matéria Entidade não-viva
3 Dharma Ação Entidade não-viva
4 Adharma Inércia ou Intervalo Entidade não-viva
5 Akash Espaço Entidade não-viva
6 Kal Tempo Entidade não-viva

A Alma é a única substancia viva. Invisível como a energia, possui consciência,


inteligência e existe em número ilimitado no universo. Em sua forma pura (livre
de karma) a alma possui sabedoria infinita, visão perfeita, conduta correta e
energia ilimitada. Já em sua forma impura (com influência do karma) a alma
possui sabedoria, visão, conduta e energia limitadas.

A Matéria é uma substancia não-viva e possui características como toque, tato,


odor e cor. O karma é considerado no jainísmo como matéria e constitui-se de
partículas tão minúsculas que não podem ser vistas nem mesmo pelo mais
possante microscópio eletrônico. O universo esta cheio destas partículas.

A Ação auxilia a alma e a matéria a migrarem de um lugar a outro pelo


universo. Já A Inércia ou O Intervalo ajudam ambas a parar ou “descansar”.

O Espaço é dividido em duas partes: o espaço que abriga todas as substancias,


chamado de Lokakash e o espaço restante infinito, conhecido como Alokakash,
que é o vazio ou vácuo.

O Tempo mede as mudanças na alma e na matéria. A roda do tempo gira


incessantemente e no seu primeiro meio-ciclo circula do estagio descendente
para o ascendente (meio-ciclo progressivo), onde a prosperidade e felicidade
aumentam. Em seu segundo meio-ciclo, a roda do tempo procede de maneira
inversa e circula do estagio ascendente para o descendente (meio-ciclo
regressivo), onde a prosperidade e a felicidade regridem.

16
A Teoria do Karma – Os Nove Tattvas

A teoria do karma ocupa posição importante na doutrina jainista. De modo


semelhante a outras filosofias e religiões, o karma para ao jainistas também
procura explicar de forma racional o aparentemente inexplicável fenômeno de
nascimentos e mortes, riqueza e miséria, injustiças individuais e sociais e a
existência de diversas formas de vida. Resumidamente, o karma é a
explicação para o principio que governa as sucessões de vida.

O karma que influencia nossa alma é devido não apenas às ações do corpo,
mente, palavra e ação, mas fundamentalmente das intenções por detrás
delas. O jainísmo busca pela realização da perfeição maior da alma, que em
seu estado original é pura e livre de toda a dor, sofrimento e da corrente que
a prende ao ciclo de nascimentos e mortes.

Os Nove Tattvas estão entre os conceitos fundamentais mais importantes da


filosofia jainista. Eles tratam da teoria do karma mencionada acima, que é a
base para o caminho da libertação da alma. Segundo os ensinamentos, sem o
conhecimento apropriado destes tattvas não é possível progredir
espiritualmente.

Diagrama dos Nove Tattvas:


Nome Significado
1 Jiva Ser vivo ou alma (consciência)
2 Ajiva Ser não-vivo (sem consciência)
3 Asrava Causa do karma
4 Bandha Expiação do karma
5 Punya* Virtude
6 Papa* Pecado
7 Samvara Fim de fluxo do karma
8 Nirjara Extinção parcial do karma acumulado
9 Moksha Liberação total do karma

* Algumas escrituras definem apenas 7 (sete) tattvas, considerando Punya


(virtude) e Papa (pecado) como tattvas separados ou incluindo-os no tattva
Asrava. Na verdade, Punya e Papa são resultados de Asrava, de modo que na
pratica existem realmente apenas sete tattvas.

Jivas e Ajivas – Compreendem a realidade física do universo. As Jivas são as


entidades vivas do universo; aquelas dotadas de consciência e que se
referem à alma. Ajivas são as entidades não-vivas ou sem consciência,
grosseiramente chamadas de materiais.

Asrava – Ignorância, fraqueza espiritual e paixões como ódio, egoísmo e


cobiça, além das atividades do corpo, mente (pensamento) e palavra são as
causas primárias do fluxo de karma. Coletivamente são chamadas de Asrava.

17
Bandha – É a união da matéria cármica com a alma. Esta matéria cármica é
um tipo de partícula que é atraída pela alma devido à sua desilusão,
ignorância, paixões e atividades do corpo, mente (pensamento) e palavra. A
alma coberta por esta matéria cármica continua adquirindo karma “novo”
através das ações mencionadas na Asrava. Devido a este processo continuo
de aquisição de partículas cármicas a alma tem que passar pelo ciclo de
nascimentos e mortes, experimentando dor e prazer. De outro modo a alma
jamais poderia alcançar a libertação do karma e sua conseqüente iluminação.

Quando o karma se incorpora na alma, ele se manifesta nas quatro seguintes


formas:

Prakriti bandha Tipo de karma


Sthiti bandha Duração do karma
Anubhava bandha Intensidade do karma
Pradesa bandha Quantidade de karma

Prakriti bandha (tipo de karma) – Quando a matéria cármica de incorpora à


alma, ela obscurece a natureza essencial do conhecimento perfeito, visão
perfeita, conduta correta, emergia ilimitada, existência eterna e equanimidade.
Os diferentes tipos de karma obscurecem diferentes tipos ou atributos da alma.

Karma Ghati e Aghati – Prakriti bandha é classificada em oito categorias de


acordo com o atributo da alma que é obscurecido. Estas oito categorias são
classificadas em dois grupos maiores, conhecidos como Ghati karma,
correspondentes às qualidades intelectuais da alma e Aghati karma, que
corresponde às qualidades físicas (corpo) dos seres vivos.

Karma Ghati

Jnanavaraniya karma Obscurece o Conhecimento Perfeito


Darasnavaraniya karma Obscurece a Visao Pefeita
Mohniya karma Obscurece a Fé Correta e a Conduta Correta
Antaraya karma Obscurece energias naturais da alma, como benevolência e força-
de-vontade

Karma Aghati

Vedniya karma Obscurece o estado iluminado original da alma, criando dor e prazer
Nama karma Obscurece a existência não-corporal da alma, produzindo as qualidades e
as limitações do corpo
Gotra karma Obscurece a equanimidade da alma e determina a origem social, familiar
e a personalidade
Ayushya karma Obscurece a existência eterna da alma, determinando a forma de vida na
existência atual

18
Quando uma pessoa destrói todo o seu karma Ghati, ela alcança o que é
conhecido no jainísmo como Keval-jnana, ou o Conhecimento Absoluto. É neste
momento que esta pessoa se torna um Arihant. Entretanto ela continuara a
viver sua vida humana ate que todo o seu karma Aghati seja destruído.
Somente após o fim do karma Aghati é que se pode alcançar a iluminação
completa ou o Nirvana.

São os Arihant, também conhecidos como os Thirtankars, que estabelecem a


ordem religiosa para monges e monjas. Esta ordem religiosa é chamada de
Sangha ou Jain. No fim de suas vidas, Thirtankars alcançam a iluminação ou
Nirvana e tornam-se Siddhas, ou Almas Perfeitas.

Sthiti Bandha (duração do karma) – Quando a matéria cármica se incorpora á


alma, ela se mantém por um tempo até que produza resultado. Esta duração
estará de acordo com a intensidade das paixões desta alma.

Anubhava bandha (intensidade do karma) – Quais frutos a matéria cármica irá


produzir dependerá da profundidade e intensidade das paixões da alma, tais
como ira, cobiça, egoísmo, etc.

Pradesa bandha (quantidade de karma) – A intensidade das ações da alma irão


determinar a quantidade de matéria cármica que é enviada.

Voltando a descrição dos nove tattvas, encontramos Punya (virtude) e Papa


(pecado), que conforme mencionado, são consideradas em algumas escrituras
como tattvas separados ou incluindo-os no tattva Asrava.

Punya (virtude) e Papa (pecado) – O influxo de matéria cármica devido às


boas ações do corpo, mente e palavra que são capazes de produzir sensações
de prazer são chamadas de Punya, ou virtudes. Atividades como
benevolência, caridade, pensamentos positivos, saúde física e mental
resultam na produção de karma Punya.

Já o influxo de matéria cármica devido ás más ações do corpo, mente e palavra


que tragam sensações desagradáveis são chamados de Papa, ou pecados.
Atividades como violência, mentira, roubo, cobiça, apego e luxúria resultam na
produção de karma Papa.

Tanto Punya quanto Papa se manifestam em longo prazo, e são sentidas no


que a alma chama de prazer ou sofrimento; recompensa ou punição.

Samvara – Trata-se do fim ou da ação de parar o influxo de nova matéria


cármica, ou karma “fresco”. È o processo inverso ao Asrava e pode ser
alcançado com a pratica constante de: crença correta, atenção á conduta
correta, consciência (atenção na espiritualidade) e não-violência.

19
Nirjara – È a extinção parcial do karma acumulado. Trata-se de uma maneira
mais “rápida” de “queimar” uma determinada porção de matéria cármica
acumulada. Justamente por ser uma forma de se conseguir apagar mais
rapidamente o karma, trata-se de uma fórmula mais radical que inclui
austeridades severas como jejuns, rituais de mortificação e longas sessões de
meditação. È necessária muita disciplina para alcançar Nirjara.

O Jainismo prevê em suas escrituras doze tipos de austeridades, separadas por


praticas externas (corpo) e internas (mente) que servem para fortalecer a alma
contra as paixões e os desejos mundanos. Estas doze práticas, seis externas e
seis internas, são chamadas de Tapaa.

Tapaa externo
Anasan Jejum total. Abstinência completa de qualquer tipo de alimento durante
certo período de tempo, sendo permitida apenas a ingestão de água
morna.
Alpahara ou Unodary Jejum parcial. Redução significativa na quantidade de alimento.
Ichhanirodha ou Vritti- Jejum material. Redução na quantidade de objetos de uso no dia-a-dia
sankshep como roupas, cosméticos e também a vaidade, como raspar o cabelo.
Rasatyaga Jejum de paladar. Abstinência do consumo de alimentos de sabor mais
acentuado e temperado como frutas, sucos, chás e doces. Ingestão
apenas de água e comida insossa (sem sabor).
Kayaklesa Atividades como andar descalço em terreno irregular sob chuva, calor
ou frio intenso e tomar banhos frios na madrugada.
Samlinata Abstinência das sensações dos cinco sentidos (visão, audição, olfato,
tato e paladar) e da mente (pensamentos).

Tapaa interno
Prayaschita Arrependimento de possíveis quebras nos votos de humildade
Vinaya Humilhação (comportamento apropriado ou obediência extrema) aos
mestres, professores e mais velhos. Inclui também a mendicância (pedir
esmolas para sobreviver)
Vaiyqvrata Servir de maneira incondicional (benevolência extrema), aos
necessitados.
Svqdhyqya Estudar e ouvir ás escrituras, ensinamentos e discursos religiosos
Dhyqna Meditação e contemplação
Kayotsarg ou A última e mais profunda austeridade interna, capaz de destruir o karma
Vyutsarga Ghati. Todas as atividades do corpo, mente e palavra são interrompidos.
Corpo sem qualquer movimento, silêncio absoluto da palavra e a mente
em estado meditativo profundo.

Finalizando os nove tattvas, temos Moksha, que conhecido também como


Nirvana, significa a liberação total da alma.

Moksha – Remoção do karma acumulado do passado. A alma em Moksha volta


a possuir as qualidades originais como conhecimento perfeito, visão perfeita,
conduta perfeita e energia ilimitada. Alcança o “céu” supremo e não mais
retorna ao ciclo de nascimentos e mortes.

20
Parte III – Comparações entre Hinduísmo, Jainísmo e Budismo

Jainismo e Budismo

As semelhanças entre o Jainísmo e o Budismo são muito grandes, assim


também como existem muitos conceitos diferentes e até divergentes. Ambas
compartilham de muitas idéias comuns à maioria das filosofias hinduístas,
porém tiveram como característica básica o confronto e a reformulação de
muitos conceitos da doutrina Védica (originária dos Vedas, o livro sagrado do
hinduísmo). A condenação de muitas praticas dos brâmanes, como a divisão da
sociedade em castas e o sacrifício ritual de animais, sempre foi muito
combatida tanto por Sidharta Gautama quanto por Mahavir. Da mesma forma,
existem diferenças importantes entre a doutrina budista e a jainista, mesmo em
relação à interpretação de ensinamentos védicos.

Para entender melhor, imaginemos um estudante indiano que viesse ao Brasil


para estudar as duas principais religiões cristãs praticadas no país, o catolicismo
e o evangelismo. Ele identificaria muitas semelhanças, como a crença num
mesmo Deus único e em Jesus Cristo como seu filho e salvador da humanidade.
Veria os adeptos de ambas as religiões abrirem a mesma Bíblia e
compartilharem de muitas interpretações.

Ao estudar mais profundamente estas duas crenças entretanto, nosso


estudante indiano encontraria diversas diferenças fundamentais, muitas delas
bastante divergentes entre si. Ele descobriria que católicos cultuam imagens e
diversos santos, já os evangélicos não prestam adoração a nenhum tipo de
imagem ou ídolo, tendo com símbolo sagrado comum entre ambos apenas a
cruz. O livro sagrado utilizado nos cultos de ambas as religiões é
fundamentalmente o mesmo, porem a bíblia católica possui capítulos a mais
que foram descartados ou desconsiderados pelos evangélicos. O culto
evangélico é conhecido como louvor e caracteriza-se pela forte participação de
seus adeptos, com muita musica e orações em voz alta. Para os católicos
entretanto, os cultos são chamados de missas e caracterizam-se por um
monólogo, conhecido como sermão, com orações silenciosas.

Resumidamente, concluímos que nosso amigo estudante indiano encontraria


diversas semelhanças e diferenças, sendo a maioria delas somente perceptível
depois de uma análise mais aprofundada. Da mesma forma, quando nos
deparamos com o jainísmo e o budismo num primeiro momento, podemos
facilmente confundi-los, quer seja pela historia e trajetória de vida muito
parecida entre seus fundadores, ou por diversos ensinamentos compartilhados.
Num estudo mais específico entretanto, encontraremos muitos pontos distintos,
tanto na teoria quanto na pratica cotidiana destas filosofias.

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Conceitos comuns

Analisando de forma abrangente, jainistas e budistas pregam o mesmo


ensinamento básico e têm exatamente o mesmo objetivo de vida: alcançar a
iluminação e a conseqüente libertação da alma de todo o sofrimento que as
cerca, através do desapego aos desejos materiais e da correta conduta de vida.
No campo pratico, também dividem igualmente as atividades de meditação e
benevolência como formas de alcançar esta iluminação.

Ambas as doutrinas compartilham de maneira quase idêntica a teoria do karma,


onde cada ser vivo possui “armazenada” sua historia de vidas passadas,
carregando suas atitudes positivas e negativas e tendo este karma enorme
influência na vida atual de cada ser. Tanto para um como para outro a
anulação do karma é condição fundamental para alcançar a iluminação e a
libertação da alma, aprisionada pelo eterno ciclo de nascimentos e mortes. Para
jainistas e budistas, após a iluminação - nirvana ou moksha para ambos – a
alma finalmente liberta-se da roda-da-vida e alcança seu estado supremo onde
não mais reencarna, alcançando o que é conhecido como Parinirvana.

Com relação ao conceito de Deus, jainísmo e budismo pensam de maneira


semelhante enquanto suas doutrinas não cultuam a idéia de um Deus supremo
único e salvador, acreditando que cada ser-humano é o único e total
responsável por sua existência. Entretanto o jainísmo vai mais além e define de
maneira mais clara sua concepção, acreditando que todas as entidades vivas
(jivas) são sagradas e tem o potencial de se tornarem um deus. Já o budismo
não define claramente sua concepção de um Deus, preferindo deixar implícita a
idéia de que possa existir uma força superior no universo. Não existem relatos
concretos sobre a visão de Buda em relação a esta matéria, já que em seus
ensinamentos há pouca referencia quanto a sua posição. Buda preferia dizer,
quando perguntado sobre a existência de Deus, que o homem deve se
preocupar em livrar-se do sofrimento e não ficar em intermináveis devaneios
sobre a existência de um criador.

Ahimsa, ou Não-Violência

Jainísmo e budismo compartilham quase que igualmente a teoria do Ahimsa,


que em sânscrito significa “não-violência”. Muito difundida por Mahatma Gandhi
e mais atualmente pelo Dalai Lama, esta filosofia ensina que devemos procurar
extinguir de nossas vidas todo e qualquer ato violento, seja no pensamento, na
palavra ou na ação. A prática de ahimsa condena igualmente tanto um ato
violento quanto um pensamento violento. Num nível profundo, até mesmo um
simples pensamento negativo que ronde nossa mente pode ser considerado
como violência. Ahimsa é considerada por muitos mestres quase que como uma
arte; a arte de lutar sem lutar, de guerrear sem fazer guerra. Viver sem que
nada o que nos rodeie seja direta ou indiretamente ligado a algum ato violento
contra qualquer ser vivo. Ahimsa é a arte de impor idéias, conceitos e de
libertar o mundo do sofrimento sem que qualquer forma de vida seja
prejudicada.

22
Religião cientifica, ética e moralidade

O forte embasamento moral e ético que o jainísmo e o budismo possuem as


coloca na categoria conhecida como “religião cientifica”. Uma religião cientifica
é aquela que estuda em profundidade a existência humana dentro de uma
perspectiva intelectual e humanista, fugindo de conceitos místicos e evitando ao
maximo especulações metafísicas. Deste modo, as religiões cientificas também
são conhecidas como religiões psicológicas, pois estão mais interessadas no
que se passa dentro do universo mental. Tanto Buda quanto Mahavir eram
contra questionamentos esotéricos e teorias ocultistas sobre o universo, a vida
e o ser humano.

Para ambas as religiões, todos os problemas do homem se encerram nele


mesmo e a busca pela iluminação e a conseqüente liberdade da alma não passa
por rituais secretos nem sobre a invocação de deuses, mas sim através da
própria e natural experiência de cada um. Em nenhum momento estas filosofias
incentivaram a fé cega, acreditando que cada um deva descobrir por si só o
caminho para ultrapassar o sofrimento. Não existem salvadores para redimir os
pecados e cada um deve, através da correta conduta de vida, encontrar sua
própria salvação. Esta idéia fica bastante clara no conceito que estas filosofias
dão aos chamados “pecados”. Ao contrario dos ensinamentos judaico-cristãos
de que o pecado deve-se a desobediência de leis divinas e seu resultado é a
punição de deus, segundo jainismo e budismo o pecado deve-se
exclusivamente a atividades prejudiciais que o homem faz para com ele
mesmo, sendo desta forma o único responsável por seus atos. Não existe o
“pecado original”, nem ações que descontentam a deus e sim unicamente
comportamentos e ações que nos fazem mal, sendo a punição apenas parte da
lei de “ação e reação”.

Mahavir e Buda

Muitas semelhanças são encontradas também na própria historia de vida dos


dois principais lideres destas religiões. Tanto Mahavir quanto Buda nasceram
príncipes, filhos de importantes e poderosos reis, e viveram boa parte de sua
juventude cercados de luxo, cuidados e mordomias. Suas vidas basicamente já
estavam predestinadas: seriam tutelados pelos mais sábios mestres do palácio
na arte das línguas, diplomacia, filosofia e guerra, casando-se com as mais
belas donzelas do reino e sendo sucessores naturais ao trono de seus pais.
Detalhes muito semelhantes e particularmente interessantes ocorreram durante
o período de gravidez de suas mães-rainha: ambas tiveram sonhos simbólicos
na gestação, que foram interpretados como bons presságios da vinda de seus
filhos. Nos dois casos, os sábios do palácio consultados deram a mesma e
importante previsão: os futuros príncipes seriam grandes reis e governariam
com poder e sabedoria seus reinos, mas se entrassem em contato com as
mazelas do mundo tornar-se-iam monges ascetas e chegariam à iluminação,
criando uma nova religião que poderia libertar a humanidade do sofrimento.

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A coincidência histórica também se dá na idade, pois foi exatamente aos 29
anos que ambos entraram em contato com as mazelas e o verdadeiro
sofrimento humano. Para a sorte de toda a humanidade, prevaleceu a segunda
previsão e a iluminação de ambos deu origem a duas das mais antigas e
importantes religiões em prática no mundo. Em mais de 2.500 anos de história,
nenhuma gota de sangue sequer foi derramada em nome da conversão de
qualquer povo ao Jainísmo ou ao Budismo. Algo bem diferente do que ocorreu
com o “trio de ferro” Cristão-Judaico-Muçulmano.

As diferenças

A interpretação e a visão do que cada ser representa no universo é um dos


pontos mais divergentes entre o jainísmo e o budismo. Para o jainísmo toda e
qualquer Jiva (ser vivo) é sagrado e tem condições de atingir a iluminação. O
budismo por sua vez respeita e pratica a benevolência para com todas as Jivas,
mas considera apenas o ser humano como capaz de alcançar a iluminação e a
libertação da alma.

Esta posição é mais visível na alimentação, por exemplo. O budismo não prevê
claramente em sua doutrina uma base sobre o não-consumo de carne. Com
exceção talvez da escola tradicional Theravada, outras escolas e ramificações
budistas não fazem qualquer menção ao vegetarianismo e seus adeptos
consomem carne normalmente. Para os jainistas entretanto, o vegetarianismo é
visto como ponto fundamental da religião. Uma vez que todas as Jivas são
sagradas, não há como matar e consumir-se delas sem que isto inflija em
sofrimento e karma para ambas as partes. Não há ahimsa sem vegetarianismo.
Existem varias passagens nos cânones budistas que demonstram o respeito que
Buda tinha para com os animais, inclusive no que se refere à condenação
absoluta às praticas de sacrifícios com animais realizadas pelos brâmanes, mas
não há uma posição clara de Buda em relação ao não-consumo de carne e
outros produtos de origem animal.

Cartaz de palestra sobre jainísmo, onde se lê “Alimentação


Vegetariana e a Conduta Jain”, mostrando a importância
deste tipo de dieta para o avanço espiritual.

24
Austeridades e penitências

Outra importante e marcante diferença entre jainismo e budismo trata das


atividades necessárias para se atingir a iluminação. Enquanto Buda era a favor
de um meio-termo, onde tanto as austeridades extremas quanto os prazeres
mundanos em excesso eram desencorajados, para o jainismo as práticas que
incluem jejuns radicais, banhos gelados e autopunições são formas da alma,
através do corpo e da mente, se disciplinarem em busca da libertação. A
filosofia budista de evitar os extremos, conhecida como “o caminho do meio”,
prega que não se deve forçar nem para um lado nem para outro e surgiu da
experiência pessoal do próprio Buda, que chegou a praticar durante muitos
anos estes rituais de austeridades, porém não chegando a nenhum resultado
pratico resolveu abandoná-los e seguir uma forma mais equilibrada.

Para o Mahavir e o jainismo entretanto, praticas de austeridades físicas e


espirituais como jejuns, longos períodos de meditação em locais ermos, banhos
gelados durante a madrugada, longas caminhadas em terrenos e condições
inóspitas e até mesmo se auto-infligir, eram praticas necessárias para que o
discípulo pudesse disciplinar o corpo, a mente e o espírito no combate às
ilusões deste mundo material. Para o jainismo, é necessário “calejar” o espírito
para que o mesmo possa suportar as fortes investidas das paixões e tentações
deste mundo. No entanto, tais práticas e rituais eram apenas ensinados e
encorajados aos adeptos iniciados e monges celibatos, sempre sob a supervisão
de gurus.

Resumidamente falando, jainismo e budismo compartilham de inúmeras


semelhanças e diferenças advindas de traços comuns que ambas adquiriram de
outras filosofias hinduístas/védicas, além de conceitos próprios incorporados
pela grande sabedoria e compaixão de seus fundadores e precursores.

Parte IV – Resumo do conceito geral: “Manifesto Jainista”

Eis os pontos mais importantes do jainismo, nos ensinamentos de sua principal


personalidade:

Mahavir fez da religião algo simples e natural, longe de conceitos complexos,


rituais elaborados e misticismo exagerado. Seus ensinamentos refletem a
beleza interna e a harmonia da alma.

Mahavir ensinou a idéia da supremacia da vida e a importância de uma atitude


positiva perante ela.

As mensagens de Mahavir acerca da Não-violência (Ahimsa), Verdade (Satya),


Não-roubar (Achaurya), celibato e castidade (Brahma-charya) e desapego
(Aparigraha) estão cheias de grande compaixão universal por todos os seres
vivos.

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Mahavir disse que "O corpo não é meramente um amontoado de carne e ossos,
mas o ápice do espírito que tem o potencial da percepção infinita
(Anant-darshana), sabedoria infinita (Anant-jnäna), poder ilimitado
(Anant-virya) e benção suprema (Anant-sukha).” A mensagem de Mahavir
reflete a liberdade e o gozo espiritual de todos os seres vivos.

Mahavir enfatizou que todos os seres vivos, independentemente de seu


tamanho, forma, espécie ou quão espiritualmente evoluídos estejam, são
igualmente importantes e merecem todo o amor e respeito. Este é o verdadeiro
amor universal.

Mahavir ensinou que a verdadeira natureza da realidade é atemporal, sem inicio


nem fim, e rejeitou o conceito de Deus como o criador, protetor e destruidor de
todo o universo. Também pregou que a adoração a um deus ou deusa para a
obtenção de posses materiais e benefícios pessoais é contrária ao verdadeiro
caminho da libertação.

Certa vez Mahavir foi questionado sobre o que seria uma religião realista. O
Senhor disse - “uma religião realista consiste de quatro partes:

1) igualdade para todos os seres vivos

2) toda e qualquer alma viva deve ter o direito de realizar-se espiritualmente


através de seu esforço próprio, e jamais ser privada disto

3) ninguém deve jamais se considerar dono do destino de qualquer outra forma


de vida, e finalmente

4) todas as situações devem ser vistas com equanimidade e harmonia, sem


gosto nem desgosto.

Se qualquer um adotar pelo menos uma destas quatro virtudes, todas as outras
estarão incorporadas automaticamente”.

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