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INOVAÇÃO, TECNOLOGIA E ALGUNS ASPECTOS DA ANÁLISE

NEO-SCHUMPETERIANA

Fred Leite Siqueira Campos


Doutor em Economia - UFRGS
Professor e pesquisador da UNIVEL e da FACEMED
E-mail: fred@medianeira.com.br

Palavras-chave: Inovação, tecnologia, análise neo-schumpeteriana.

1 INTRODUÇÃO

Entre o pouco consenso estabelecido no intenso debate que tenta entender o atual
processo de “globalização”, encontra-se o fato de que a inovação e o conhecimento são
os principais fatores que definem a competitividade e o desenvolvimento de nações,
regiões, estados, setores, empresas e até indivíduos. Conforme discutido em Cassiolato
e Lastres (1999), a crescente competição internacional e a necessidade de introduzir
eficientemente, nos processos produtivos, os avanços das tecnologias de informação e
comunicações têm levado as empresas a centrar suas estratégias no desenvolvimento de
capacidades inovativas. Tal capacitação é vista como essencial, até para permitir a elas a
participação nos fluxos de informação e conhecimentos que marcam o presente estágio
(fim do século XX e início do século XXI) do capitalismo mundial.
Os países latino-americanos se defrontam com as atuais transformações a partir
de sistemas nacionais de inovação formados ao longo do período de substituição de
importações, que, além de intensa importação de tecnologia, apresentavam as seguintes
características:
a) Níveis extremamente reduzidos de gastos em ciência e tecnologia (C&T)
e P&D, particularmente se comparados com os países da OCDE1;
b) Mais de 90% das atividades de P&D realizadas por institutos de pesquisa
e universidade públicas e por laboratórios de P&D de empresas públicas, com
participação extremamente reduzida de empresas privadas;
c) As universidades públicas desempenhando papel fundamental no
treinamento de recursos-humanos especializados.
Portanto, de maneira geral, o setor público detinha (e ainda detém) o papel mais
importante no desenvolvimento dos sistemas nacionais de inovação desses países (como
o Brasil).
Aponta-se, ainda, que, durante o período de substituição de importações, a maior
parte das tecnologias adquiridas pelos países latino-americanos era relativamente
madura. Considerava-se que a maior parte da capacitação necessária para usar e operar
as tecnologias de produto e de processo poderia ser adquirida de uma maneira
relativamente fácil, via treinamento em rotinas básicas. Por outro lado, não se requeria
ou estimulava, de forma efetiva, a acumulação da capacitação necessária para gerar

1
No Brasil, por exemplo, os gastos em C&T apresentam forte conotação estatal. O governo brasileiro
investiu 95% do total nacional em ciência e tecnologia, na década de 1990. Com investimentos médios
inferiores a 0,5% do PIB interno, para o período. Já nos Estados Unidos, os gastos com P&D e C&T,
além de se apresentarem com uma influência menor do governo (com participação de 50%), nos anos
1990, representaram cerca de 3,5% do PNB americano.

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novas tecnologias, sendo tais requisitos ainda mais limitados em setores onde a proteção
isolava as empresas dos efeitos das mudanças geradas na economia internacional.
Tais considerações são consistentes com a caracterização das empresas latino-
americanas em geral, dadas às maneiras como foram construídas, a partir das políticas
de substituição de importações e/ou promoção de exportações.

A maior parte das empresas [latino-americanas] não foi construída para evoluir. A maioria o foi
para operar tecnologias maduras, supostamente já otimizadas. Não se esperava que as empresas
alcançassem competitividade por elas próprias. A lucratividade era determinada por fatores
exógenos, como a proteção tarifária, subsídio à exportação e numerosas formas de auxílio
governamental, em vez da capacidade de a própria empresa aumentar a produtividade ou [a]
qualidade [de seus produtos e processos de produção]. As empresas não são conectadas
[tecnicamente... E tem sido] difícil a geração de sinergias nas redes e complexos industriais.
(Perez, apud Cassiolato; Lastres, op. cit. , p. 14).

Em nível nacional, o pequeno esforço quanto ao desenvolvimento de atividades


inovadoras e as conseqüentes fragilidades e deficiências tecnológicas da indústria local
foram, por muito tempo, considerados como não tendo representado empecilho
significativo ao crescimento econômico brasileiro. A partir da década de 1990, todavia,
estes fatores foram identificados como constituindo importantes gargalos. De fato, um
contraste significativo entre a tendência dos países mais avançados e o caso brasileiro se
refere, por exemplo, ao engajamento diferenciado do setor empresarial nos esforços de
P&D.
A liberalização, desregulamentação e privatização dos anos 1990 realizada na
América Latina em geral (e no Brasil, em particular) sem a preocupação de priorizar a
capacidade inovativa das empresas locais, trouxeram importantes impactos aos sistemas
nacionais de inovação dos países que compõem o continente. Na falta de uma
participação mais efetiva das empresas locais de esforços inovativos, a maior parte das
estratégias tecnológicas adotadas se apoiavam na crença de que a tecnologia se
“globalizou” e o investimento estrangeiro seria condição necessária e suficiente para
modernizar o parque produtivo local e para conectar a economia ao processo de
“globalização”.
Porém, umas séries de trabalhos têm argumentado que, longe de ter se tornado
“global”, a tecnologia, a inovação e o conhecimento têm se caracterizado como
componentes crescentemente estratégicos e de cunho localizado.
Ainda, uma série de contribuições adicionais vem colocando ênfase à análise da
conformação de tipos de relações que têm, também, na proximidade geográfica um
elemento de relevância entre os “agentes”. Tais relações – denominadas de arranjos
locais – podem se dar de diferentes formas e são analisadas em diferentes enfoques2.
No que se refere à construção da idéia dos sistemas de inovação, de maneira
geral, aponta-se para a contribuição de um conjunto de autores (principalmente
preocupados com a área de economia da inovação), os quais, ao proporem a adoção do
conceito de sistemas nacionais de inovação, argumentam que desempenhos nacionais,
no que tange à inovação, derivam-se claramente de uma confluência social e
institucional particular e de características histórico-culturais próprias (Freeman, 1987 e
1995; Lundvall, 1992; Nelson, 1992). Freeman e Lundvall, por exemplo, definem o
sistema nacional de inovação como sendo um sistema constituído por elementos e
relações que determinam, em grande medida, a capacidade de aprendizado de um país e,

2
Para uma visão ampla sobre as contribuições para o entendimento da dimensão local da inovação, ver
Lastres et al. (1999), em especial as partes constantes entre as páginas 54 e 58.

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portanto, aquela capacidade de inovar e de se adaptar às mudanças do ambiente (e tal
análise vale para a realidade local e regional).
Estes e outros autores, ao discutirem os elementos que constituem os sistemas
nacionais de inovação, enfatizam que as diferenças relacionadas à experiência histórica,
lingüística e cultural (dentre outras) explicam as características idiossincráticas que se
refletem na configuração institucional geral dos países. E assim, portanto, são
reproduzidos na organização interna das firmas e dos mercados produtor e consumidor,
no papel do setor público e do setor financeiro, na intensidade e organização das
atividades educacionais e inovativas, etc.
Alerta-se, no entanto, para a existência de diferenças importantes nos enfoques
atualmente utilizados, por exemplo, pelos autores acima relacionados. Alguns autores,
como Smith (1997), argumentam que os diferentes enfoques de sistemas nacionais de
inovação se estruturam em três pilares conceituais básicos, os quais permitem distingui-
los e diferenciá-los de acordo com a ênfase colocada em cada um destes. Tais pilares se
baseiam no entendimento de que:
a) As vantagens competitivas resultam da variedade e da especialização e
que tal fato, realmente, apresenta efeitos indutores path-dependents. Isto é,
especializações que apresentam sucesso econômico – com a criação de sistemas
(desenvolvidos e cinegéticos) como resultado – ocorrem, particularmente, ao redor de
estruturas industriais específicas;
b) O conhecimento tecnológico é gerado por intermédio de um aprendizado
interativo, tomando, em geral, a forma de capacitações distribuídas entre os diferentes
tipos de agentes econômicos que devem interagir, de alguma maneira, para que o
mesmo possa ser utilizado;
c) O comportamento econômico repousa em instituições e “regras”
estabelecidas legalmente ou por meio de costumes que evoluem, tendo em vista as
vantagens que elas oferecem na redução da incerteza. Assim, diferentes modos de
organização institucional levam a diferentes comportamentos e resultados econômicos.
No caso das análises sobre os sistemas nacionais de inovação, a história é
considerada como uma fonte importante de tal diversidade. Nesta ótica, o
desenvolvimento institucional e as diferentes trajetórias tecnológicas nacionais
contribuem para a criação de sistemas de inovação com características muito diversas.
Assim, a diversidade entre os sistemas nacionais de inovação é entendida como o
produto de diferentes combinações das suas características. Uma implicação dessa idéia
é que a ênfase na diversidade e no caráter localizado dos processos de aprendizado e,
portanto, na dimensão local da inovação, possibilita a conceituação dos sistemas locais
de inovação como a definição algo próxima, por exemplo, dos “sistemas tecnológicos
regionais ou locais”.
Na seqüência deste trabalho serão tratados tópicos relativos à inovação (a
seguir); à noção de sistemas de inovação (em suas várias dimensões: nacional, local,
multinacional, etc.); e às trajetórias tecnológicas (existentes no interior do
desenvolvimento dos paradigmas técnico-econômicos).

2 A INOVAÇÃO

Para os propósitos deste trabalho, as inovações aqui tratadas englobam não só as


novas tecnologias de produção, mas também os modos de produzir. Em outras palavras,
as inovações podem ser tecnológicas e organizacionais.

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O mainstream da teoria econômica sempre apresentou dificuldades em analisar o
processo inovativo. Da mesma forma que para esta corrente a tecnologia é considerada
como fator exógeno à economia e o processo inovativo como igual para os agentes, não
se reconhece o ambiente onde se localizam as empresas como um elemento capaz de
influenciar sua capacidade de inovação e o desenvolvimento econômico. Assim,
considera-se, nesta que é a vertente ainda dominante em várias esferas do debate
econômico, que a inovação pode ser gerada independentemente do local em questão,
sendo esta dimensão geralmente desconsiderada pela literatura econômica (ver, por
exemplo, Varian, 2000 – em especial o capítulo XVII –; ou também, Mas-Colell;
Whinston; Green, 1995).
No entanto, do ponto de vista neo-schumpeteriano ou evolucionista, as
inovações introduzidas, embora sejam geradas em um núcleo ou conjunto de setores
produtivos, costumam ter uso bastante difundido. Este caráter genérico das tecnologias
se refere às possibilidades de sua aplicação não só nos ramos ou setores em que foram
desenvolvidas, mas também em um amplo leque de atividades com repercussões em
todo o tecido econômico e social.
Assim, conforme colocado em Costa (1993), as inovações ocorridas na
microeletrônica, por exemplo, têm dado origem a um conjunto de novos produtos e
serviços nas áreas de informática, telecomunicações, dentre outros. A miniaturização
dos equipamentos e produtos, bem como o aumento na capacidade e na velocidade de
processar informações tem proporcionado reduções de custos e aumento de
produtividade, fazendo com que essas tecnologias se difundam rapidamente por
diferentes setores da atividade econômica.
Acredita-se que as inovações ora em curso podem ser tratadas como um novo
paradigma tecnológico e serem consideradas revolucionárias. Carlota Perez (1986)
afirma que a expressão “paradigma técnico-econômico” definiria melhor as
transformações ocasionadas por essas novas tecnologias, na medida em que elas alteram
não só as áreas de produtos e processos, mas também a estrutura de custos dos insumos,
as condições de produção e a gestão das firmas. Ainda segundo aquela autora, em um
paradigma técnico-econômico há sempre um insumo que desempenha papel central –
que ela denomina de fator-chave – como foi o caso, por exemplo, do carvão, do aço e
do petróleo (fatores-chave dos paradigmas técnico-econômicos anteriores ao
microeletrônico). No caso das atuais tecnologias, essas considerações são preenchidas
pela microeletrônica (através do uso, por exemplo, do microprocessador). A autora
lembra que de um novo paradigma e do seu fator-chave só ocorrerá à emergência
quando a produtividade, proporcionada pelo antigo paradigma, mostrar problemas
persistentes de crescimento.
Costa (1993) afirma que há uma convicção por parte dos economistas de que, em
função da reestruturação empreendida nas duas últimas décadas, as economias dos
países industrializados estão se encaminhando em direção a uma best practice
produtiva, diferente daquelas do paradigma da produção em massa. É importante
salientar que a busca da inovação não decorre de uma questão técnica em si, mas está
vinculada às dificuldades de valorização do capital. Nesse sentido, a introdução do
progresso técnico está vinculada à necessidade de recuperar o aumento da
produtividade. Os fatores determinantes do declínio da taxa de produtividade se
relacionam com a organização do processo de trabalho (fragmentação das tarefas,
fadiga, desperdícios, etc.) e a rigidez do processo produtivo, que torna extremamente
oneroso sua adaptação às variações da demanda.
Por outro lado, o caráter dessa reestruturação é sua natureza competitiva, pois, é
dessa maneira que se retoma o crescimento econômico. A pressão competitiva sobre as

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empresas ocorre no sentido de torná-las mais flexíveis, a fim de se diferenciarem no
atendimento às necessidades individualizadas dos consumidores, com uma ênfase maior
na qualidade e na redução dos prazos de entrega.
Conforme salientado em Costa (1993), a principal característica dessa nova best
practice produtiva é a integração e a flexibilidade. Por integração do processo produtivo
se entende àquela situação em que as fases do mesmo, que antes estavam separadas,
agora podem ser agrupadas ou integradas. As atividades na produção de mercadorias se
constituem, basicamente, de informações. Estas, por sua vez, referem-se desde aos
pedidos recebidos pelo departamento de vendas, às ordens ao setor produtivo, às
requisições ao almoxarifado, etc. O que está ocorrendo em termos de novidade no ato de
produzir é que as operações produtivas e as informações sobre as mesmas podem ser
tratadas conjuntamente e não como fases separadas.
Há aqui uma mudança qualitativa na obtenção de aumentos de produtividade, ou
do excedente. Em vez de aumentar a intensidade do trabalho vivo, como nos processos
tayloristas, a nova prática produtiva permitida pela automação – ao integrar as fases
produtivas – reduz os tempos de produção e de circulação, além de permitir uma
ocupação mais efetiva das máquinas e equipamentos, reduzindo o seu tempo ocioso.
Dessa maneira, os custos de produção não são mais concebidos como dependentes,
basicamente, da produtividade da mão-de-obra em sua atividade direta na produção,
mas também da ocupação das máquinas.
Uma outra característica da nova prática produtiva é a flexibilidade. A junção
das diferentes fases na elaboração de um produto permite maior eficiência, mas, em si,
não é o suficiente para aumentar a flexibilidade, ou a agilidade da empresa na produção
e de responder às incertezas do ambiente econômico.
Em todos os processos de produção são necessários: o material a ser
transformado, a energia que será posta em ação, e a informação sobre todos os passos no
processo de transformação. Costa (1993) coloca que as trajetórias tecnológicas ao longo
do tempo têm levado, de maneira crescente, à substituição da energia humana e animal
pela energia mecânica como, por exemplo, na invenção da máquina a vapor. A
transformação que está ocorrendo atualmente tem um componente qualitativo diferente:
ela procura, também, substituir a inteligência humana pela “inteligência artificial”.
A possibilidade de modificar as informações armazenadas na máquina, sem
alterar a sua estrutura física é que dá flexibilidade ao processo produtivo (propriedade
esta garantida pelo computador que está presente no processo de produção).
Portanto, a flexibilidade no processo de produção se refere à capacidade das
máquinas em serem redirecionadas para a produção de outros bens ou peças, sem a
necessidade de alterar o seu hardware. Há, assim, ganhos de produtividade no processo
de produção das mercadorias.
No entanto, as tecnologias de automação flexível não se restringem apenas aos
ganhos de produtividade, elas permitem, também, que as empresas se adaptem mais
rapidamente às incertezas do mercado (possibilitando, assim, maior agilidade na
fabricação dos bens).
A flexibilidade vem resolver um outro problema apresentado pela produção em
massa e que se refere à possibilidade de a qualquer momento o processo produtivo ser
interrompido. O bloqueio de uma estação de trabalho poderia paralisar toda a fábrica,
seja por uma pane mecânica, seja devido a um conflito com os trabalhadores na questão
do ritmo de trabalho ou a disputas salariais. A flexibilidade permite uma continuidade
do fluxo de produção na medida em que a empresa não está dedicada a um único
produto.

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Uma outra maneira de se conseguir flexibilidade no processo produtivo é através
da subcontratação. As empresas contratam fora parte da produção dos pequenos
produtores. Nas fases ascendentes do ciclo dos negócios os contratos podem ser
assinados, nas fases descendentes eles são cancelados ou não-renovados.
No entanto, toda a análise dos determinantes da tecnologia e suas formas de
influenciar o processo produtivo são, em grande parte, resultantes dos estudos neo-
schumpeterianos sobre os Sistemas de Inovação.

3 OS SISTEMAS NACIONAIS DE INOVAÇÃO

Como resultado da moderna análise neo-schumpeteriana foi desenvolvido o


conceito de Sistema Nacional de Inovação. Nele, no entanto, cada um dos seus termos é
passível de várias interpretações. Por esse motivo, será discutido, a seguir, cada “parte”
do conceito separadamente.
Inicialmente, tem-se a inovação. Esse termo congrega as etapas nas quais a firma
domina a prática de um produto ou processo industrial que é novo para ela, ou para o
setor industrial no qual ela faz parte, ou então para a nação. Também as adaptações e
mudanças organizacionais fazem parte das inovações. Essa interpretação bastante ampla
é feita por várias razões. Primeiro, porque as atividades de investimento associadas com
a introdução de um novo produto ou processo são de difícil distinção com as associadas
a outras finalidades. Além disso, o inovador schumpeteriano (o primeiro a trazer um
novo produto para comercializar), freqüentemente não é o mesmo agente que, em última
instância, captura a maioria dos ganhos econômicos associados com a inovação.
Segundo, porque muito do interesse inovador é ligado ao desempenho econômico geral.
Isto significa que a orientação aqui adotada não está centrada na capacidade da firma de
vanguarda tecnológica, ou nas instituições que fazem a pesquisa científica mais
avançada (embora essas sejam importantes), mas está baseada nos fatores que
influenciam a capacidade tecnológica nacional.
Em seguida, tem-se o termo sistema. Embora para alguns a palavra conote algo
que é projetado ou construído conscientemente, o conceito utilizado aqui é o de um
conjunto de instituições cujas interações determinam o desempenho inovador das firmas
nacionais. Não há nenhuma presunção a priori de que o sistema seja, de alguma forma,
conscientemente projetado, ou até mesmo que o conjunto de instituições envolva
articulações coerentes. Aqui, o conceito de sistema é o de um conjunto de atores
institucionais que, juntos, influenciam o desempenho inovador. Esse conceito amplo de
inovação força a uma consideração institucional muito maior do que a centrada só nos
agentes ligados à P&D.
Finalmente, chega-se ao conceito de sistema nacional. Por um lado, o conceito
pode ser muito amplo. O sistema de instituições que apóiam as inovações técnicas em
um campo, por exemplo, na farmacêutica, pode ter pequeno contato com o sistema de
instituições que apóiam as inovações em outro campo, digamos: aeronáutica. Por outro
lado, em muitos campos tecnológicos, incluindo farmacêutica e aeronáutica, muitos
agentes são multinacionais. Desse modo, será que o conceito de um sistema nacional
faz algum sentido?
A resposta é sim, pois ocorre que, no interior das nações tem-se, por um lado, as
inovações tecnológicas acontecendo dentro das firmas privadas; e de outro lado, outras
instituições como: universidades, laboratórios do governo, empresas estatais e privadas
e agências governamentais de coordenação e financiamento também têm um papel

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crucial no processo de criação das novas tecnologias. Esses fatos fazem surgir, assim, os
elementos tecnológicos sistêmicos dentro das economias nacionais.
Esses elementos de coesão sistêmica são continuamente reforçados no interior
das economias nacionais, pois, em primeiro lugar, existe um mercado próprio além de
recursos naturais determinados, com características que englobam gosto dos
consumidores e recursos básicos, fazendo com que cada país tenda a desenvolver seu
sistema de maneira própria, com prioridade para suas características. Segundo, o fato de
que colaborações formais (e mesmo informais – do tipo produtor-usuário) dentro das
economias nacionais são maiores e mais freqüentes do que as interações internacionais
(Lundvall, 1988). Terceiro, as interdependências da base tecnológica são mais
profundas dentro das economias nacionais, pelo menos no primeiro período de difusão
(Metcalfe, 1981). Quarto, existem políticas direcionadas e determinadas, como as
políticas de ciência e tecnologia, que são basicamente de escopo nacional. E finalmente,
o fato de os governos nacionais tenderem a direcionar o ritmo das inovações
tecnológicas3. Assim, como colocado por Nelson:

Os modernos Sistemas Nacionais de Inovação [sem grifo no original] são complexos


organizacionais que envolvem atores institucionais e firmas privadas e públicas. Eles incluem
instituições como universidades, dedicadas ao conhecimento tecnológico público, além de
fundos e programas governamentais. As firmas privadas que buscam maximizar o lucro são o
coração de todo esse sistema (opinião expressa por Nelson, apud Niosi, et. al., 1993, p. 210).

O conceito de Sistema Nacional de Inovação está alicerçado em uma


compreensão comum do modo como o avanço técnico ocorre. De certo modo, esta
compreensão provém de uma construção analítica distinta e inovadora, não ampla o
bastante para conter todas as variáveis importantes na análise, não precisa o bastante
para guiar trabalhos econométricos, mas completa o suficiente para prover uma
estrutura comum e confiável de análise.
Para se entender os Sistemas Nacionais de Inovação, é essencial compreender
como os avanços técnicos ocorrem no mundo moderno e os principais processos e
instituições envolvidos. Na atualidade, a maioria das tecnologias é associada a vários
campos da ciência, que lhes servem de base. Por outro lado, e ao mesmo tempo,
esforços vinculados à inovação quase sempre envolvem elementos de tentativa e erro. E
finalmente, tais sistemas são determinantes da competitividade das economias
nacionais.
As diferenças de produtividade entre os vários agentes econômicos e a evidência
empírica do acelerado progresso das inovações tecnológicas em produtos e processos,
que baseiam e sustentam a competitividade e a sobrevivência das firmas dentro da
dinâmica capitalista, têm sido a preocupação básica de muitos economistas.
Dentro da abordagem neo-schumpeteriana ou da teoria evolucionária do
desenvolvimento tecnológico, há evidências empíricas que sugerem que a dinâmica da
inovação, base do processo de transformação econômica4, depende não só dos recursos

3
Isso se dá, primeiro, porque eles financiam, e muitas vezes executam, uma parte importante da pesquisa
nacional. Segundo, porque os alvos governamentais englobam as áreas civil e militar (de segurança
nacional), não só por programas de financiamento e execução, mas também por importação e exportação
de tecnologia (através de políticas de comércio). Terceiro, porque o governo é responsável pela rede
nacional de trabalho, coordenando, assim, políticas de educação e informação.
4
“O capitalismo, então, é, pela própria natureza, uma forma ou método de mudança econômica, e não
apenas nunca está, mas nunca pode estar estacionário. E tal caráter evolutivo do processo capitalista não
se deve meramente ao fato de a vida econômica acontecer num ambiente social que muda e, por sua
mudança, altera os dados da ação econômica; isto é importante e tais mudanças (guerras, revoluções e
assim por diante) freqüentemente condicionam a mudança industrial, mas não são seus motores

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destinados para esse fim, mas, sobretudo, do processo de aprendizagem (que é
cumulativo, sistêmico e idiossincrático) e da difusão da tecnologia. A base da
aprendizagem está no conhecimento que, por esse enfoque, pode ser classificado como:
universal ou específico, articulado ou tácito e público ou privado (Dosi, 1988a)5. Já o
processo de difusão tecnológica, acelera-se e se difunde com maior rapidez e eficiência
quando o desenvolvimento tecnológico se realiza nas empresas. Sem barreiras, a
natureza da tecnologia (incorporada nas pessoas e nas firmas) configura um peso
importante à participação de outras instituições (como agências públicas, universidades
e instituições financeiras) que por sua vez, também, garantem a dinâmica do processo
inovativo.
Portanto, o caráter central adquirido pelo conhecimento, pela aprendizagem e
pela difusão para a dinâmica da inovação está diretamente vinculado ao desempenho
das instituições presentes nas economias nacionais modernas. De fato, as instituições
reproduzem, regulam e coordenam as condições para a interação dos agentes e
organizações nas quais é possível desenvolver processos de aprendizagem e transformá-
los em atividades inovadoras.
Historicamente, organizaram-se fluxos de informação e conhecimento que se
tornaram mais amplos, mais sofisticados e mais complexos. Atualmente, pressupõem
um desenvolvimento institucional específico para dar conta de uma ampliação
expressiva desses fluxos e canais de informação, que não são realizados apenas pelos
mecanismos de mercado.
Nos últimos 50 anos, a teoria da inovação industrial vem se movendo da
descrição simples das empresas e das firmas isoladas, como unidades inovadoras, para
incluírem outros elementos dentro do conjunto da inovação. A idéia de Sistema
Nacional de Inovação é um dos últimos passos nessa tendência que envolve a concepção
de elementos mais complexos.
Portanto, o Sistema Nacional de Inovação é um conjunto de agentes e
instituições (grandes e pequenas firmas, públicas e privadas; universidades e agências
governamentais), articuladas com base em práticas sociais, vinculadas à atividade
inovadora no interior das nações, sendo as firmas privadas o coração de todo o sistema
(as inter-relações dos agentes e instituições determinam o poder e a eficiência da
produção, assim como a difusão e o uso do novo conhecimento, útil economicamente,
marca o estado de desenvolvimento tecnológico da nação).
As ligações entre essas unidades são feitas através de:
a) Fluxos financeiros provenientes de fundos públicos e privados;
b) Ligações legais e políticas como as regras de propriedade intelectual,
determinação de padrões técnicos e políticas nacionais de promoção,
geralmente coordenadas pelas unidades estatais;

principais. Tampouco se deve esse caráter evolutivo a um aumento quase automático da população e do
capital ou aos caprichos dos sistemas monetários, para os quais são verdadeiras as mesmas coisas. O
impulso fundamental que inicia e mantém o movimento da máquina capitalista decorre dos novos bens de
consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados, das novas formas de
organização industrial que a empresa capitalista cria. [...] o mesmo processo de mutação industrial – se
me permitem o uso do termo biológico – que incessantemente revoluciona a estrutura econômica a partir
de dentro, incessantemente destruindo a velha, incessantemente criando uma nova. Esse processo de
Destruição Criativa é o fato essencial acerca do capitalismo. É nisso que consiste o capitalismo e é aí que
têm de viver todas as empresas capitalistas” (Schumpeter, 1984. p. 112-113).
5
Obviamente, não é apenas pela ótica neo-schumpeteriana que pode ser observado o processo de geração
e difusão do conhecimento. Pela ótica da escola marxista, ver, por exemplo: Kuenzer (1997), em especial
o capítulo II.

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c) Fluxos tecnológicos, científicos e de informação que direcionam o mercado
doméstico;
d) E, finalmente, fluxos sociais como o deslocamento de pessoal, que ocorre
não só das universidades para as indústrias como também de firmas para
firmas.
O desenvolvimento do conceito de Sistema Nacional de Inovação pressupõe,
ainda, uma abordagem teórica distinta da neoclássica. A unidade de análise é a firma
inovadora, definida como uma organização ativa, bastante distinta da firma
representativa dos modelos de equilíbrio geral neoclássico. A firma inovadora,
buscando a realização de lucros, atua com racionalidade restrita (ou limitada),
utilizando-se de rotinas e mecanismos de busca, adotando estratégias e tecnologias que
serão (ou não) sancionadas por mecanismos de seleção tanto mercantis quanto sócio-
institucionais6.
O conceito de Sistema Nacional de Inovação foi explicitamente formulado por
Freeman (1987), quando pesquisava o processo de desenvolvimento do Japão no pós-
Segunda Guerra Mundial. No entanto, o autor que usou a expressão “Sistema Nacional
de Inovação” pela primeira vez foi Bengt-Ake Lundvall (1992). Todavia, como ele
mesmo colocou em seus escritos, essa idéia foi baseada na concepção de “Sistema
Nacional de Economia Política” ou mais especificamente de “Sistema Nacional de
Produção” de Friedrich List (Apud Freeman, 1995).
A preocupação principal de List em seus escritos derivava do problemático
atraso econômico da Alemanha com relação à Inglaterra no século XIX. Ele não só
defendeu a proteção às indústrias nascentes alemãs da época, mas também incentivou
políticas que acelerassem, ou tornassem possível, a industrialização e o crescimento
econômico. A maioria dessas políticas se preocupou com a compreensão e utilização da
nova tecnologia existente. As implicações nacionalistas (e também colonialistas) de suas
idéias contrastavam fortemente com o internacionalismo cosmopolita dos economistas
de então, defensores do livre comércio7.
O reconhecimento claro de List da interdependência dos investimentos tangível e
intangível, e também o fato de ter notado que as indústrias deveriam se unir às
instituições formais de ciência e de educação, foram idéias decisivas para a elaboração
de sua análise desenvolvimentista 8.
Graças às proposições de List, a Alemanha desenvolveu um dos melhores
sistemas de educação técnica e de treinamento do mundo. Este sistema não só foi um
dos fatores principais que fez a Alemanha se aproximar do nível de desenvolvimento
inglês, mas também foi o embrião dos centros industriais que atualmente apresentam
uma mão-de-obra de elevada produtividade. Inclusive, políticas britânicas (posteriores à
busca de competitividade da Alemanha) para educação e treinamento da mão-de-obra,
basearam-se no sistema alemão.
Conforme salientado por Freeman (1995), além de antecipar a importância
essencial da produtividade do trabalho para os atuais Sistemas Nacionais de Inovação,

6
“De fato, o mundo do tecnicamente possível é muito mais amplo do que o do economicamente rentável
e maior do que o do socialmente aceito. E esses dois últimos, tampouco, coincidem. [...] Existem linhas
de forças sócio-econômicas que interagem com o desenvolvimento tecnológico determinando de maneira
recíproca, em última análise, as trajetórias percorridas” (Perez, 1986, p. 43).
7
Tais como o economista inglês D. Ricardo (1772-1823).
8
Depois de uma longa pesquisa sobre o desenvolvimento econômico, o Banco Mundial concluiu, em
1991, que é o investimento intangível em acumulação de conhecimento o fator decisivo na dinâmica e no
crescimento das economias e não o investimento físico, como se acreditava. A despeito da incorporação
(mesmo que tardia) dessa concepção nas teorias de crescimento da escola neoclássica, essa suposição
(realista) sempre esteve presente na análise dos economistas históricos e nos neo-schumpeterianos.

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List também reconheceu a interdependência da importação da tecnologia estrangeira e o
seu desenvolvimento técnico doméstico. Segundo ele, os países deveriam adquirir as
realizações de outras nações mais avançadas, mas não só isso, deveriam também
desenvolvê-las com a experiência própria. A Alemanha (então Prússia) criou um
mecanismo de “aprendizagem tecnológica”: a aquisição de tecnologia de ferramentas.
Historicamente, foram os mecânicos e engenheiros ingleses os responsáveis
pelas inovações-chaves na técnica de ferramentas, desenvolvidas no início do século
XIX. Essa tecnologia foi a gênese e a impulsionadora das modernas máquinas-
ferramenta da construção mecânica de superprecisão, bem como de outros ramos
industriais. Apesar do segredo e da posição contrária à divulgação e exportação dessas
novas tecnologias mantidas pelo governo inglês, o governo prussiano empenhou-se
decididamente na sua aquisição.
Para tal, a Prússia montou o Instituto de Treinamento Técnico (Gewerbe-Institut)
e assegurou o recebimento das ferramentas britânicas importadas para engenharia
reversa e para treinar os artesãos alemães que, subseqüentemente, disseminaram a
tecnologia na indústria local. Esse aprendizado exigia, igualmente, a presença no país de
técnicos britânicos, pois, o domínio da tecnologia dependia também de conhecimento
tácito. A transferência de tecnologia promovida e coordenada pelo Estado prussiano
teve elevado êxito: as indústrias de ferramentas elétricas e de máquinas-ferramenta
alemãs provaram ser capazes de projetar e fabricar a maquinaria necessária para fazer
locomotivas a vapor já nas décadas de 1840 e 1850. Esse fato tornou a Prússia (que
mais tarde viria a liderar a formação da Alemanha Imperial) numa forte concorrente da
Inglaterra.
Assim, embora não tenha citado exemplos em particular, List não estava se
referindo a um modo puramente abstrato de industrialização e transferência de
tecnologia, mas a um processo concreto que estava se desdobrando ante seus olhos.
A análise de List não só antecipou muitas das características que estão no centro
do estudo contemporâneo dos Sistemas Nacionais de Inovação (por exemplo, a
importância de instituições de educação e treinamento, da ciência, dos institutos
técnicos, da aprendizagem interativa entre usuário e produtor, da acumulação de
conhecimento, da adaptação da tecnologia importada, da promoção de estratégias
industriais, etc.), mas ele também enfatizou o papel do Estado na coordenação e na
implementação de políticas de longo prazo para a indústria e à economia9.
No entanto, os Estados Unidos foram muito mais eficientes que a Alemanha e
até mesmo a Inglaterra, destacadamente a partir da segunda metade do século XIX. A
difusão da educação (e não de treinamento industrial) foi mais notável nos Estados
Unidos do que na Alemanha (Freeman, 1995). Por outro lado, a abundância de materiais
baratos e acessíveis, de energia e a chegada sucessiva da imigração européia, deu ao
sistema nacional dos Estados Unidos algumas características específicas e que não
tinham paralelo na Europa. Enquanto o papel ativo do Estado era maior na Alemanha,
os investimentos estrangeiros tiveram um maior papel nos Estados Unidos.
Embora List tenha antevisto muitos elementos do debate contemporâneo sobre
Sistemas Nacionais de Inovação, seria descabido imaginar que ele pudesse ter previsto
todas as mudanças na economia mundial e nas economias nacionais no século e meio
que se seguiram à sua obra (e nem era essa sua pretensão). Em particular, ele não previu
a importância crescente da pesquisa local em P&D nas indústrias, nem tampouco o
crescimento das corporações multinacionais, que estabeleceram bases operacionais em
muitos países diferentes, inclusive com montagem de laboratórios de P&D fora de suas
9
Nesse ponto, em particular, foram freqüentes as polêmicas entre List e os economistas de então,
defensores de um Estado mínimo. Aqui, mais uma vez, pode-se citar as polêmicas entre List e D. Ricardo.

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matrizes. Estes foram os principais fatores que estavam (e estão) na base da elaboração
do conceito de Sistema Nacional de Inovação.
Nesse ponto, inclusive, a despeito da visão simplista dos autores neoclássicos de
que as instituições são fatores de inércia; está claro que as inovações institucionais
também podem dar ímpeto à mudança técnica e econômica10.
Na Alemanha, o departamento de P&D industrial foi introduzido,
institucionalmente, em 1870. Inovações em produtos e processos promovidas por firmas
ocorreram, no entanto, mais de um século antes disso; mas, à época, não havia se
difundido a percepção entre os diferentes ramos industriais de que P&D realizado de
maneira regular, sistemática e profissional, poderia se constituir em um negócio
lucrativo. Hoechst, Bayer e BASF implementaram e fortaleceram esta direção até a
atualidade. Seus laboratórios de P&D empregam milhares de cientistas e engenheiros.
Quando as três companhias fundiram-se em 1926 para formar a gigante IG Farben
Trust, elas reforçaram seu P&D e fizeram importantes inovações em materiais
sintéticos, fibras e borrachas.
Freeman (1995) coloca que o sucesso da indústria química alemã conduziu à
imitação da inovação do departamento de P&D pelas firmas químicas de outros países
(por exemplo, a CIBA, na Suíça). Os laboratórios internos de P&D também emergiram
em outras indústrias que igualmente necessitavam ter acesso aos resultados da pesquisa
básica de universidades e de outras instituições, ou então que tinham o intuito de
desenvolver os seus próprios produtos. Nas indústrias elétricas dos EUA e da
Alemanha, os laboratórios de P&D apareceram em 1880.
De sua origem nas indústrias química e elétrica durante a segunda metade do
século XIX e o início do século XX, gradualmente, os laboratórios de P&D
especializados se tornaram características da maioria das grandes firmas em vários
ramos industriais (embora não da maioria das firmas pequenas ou no ramo dos
serviços). Esta mudança no comportamento industrial e o crescimento do número de
laboratórios governamentais, de institutos de pesquisa independentes e de pesquisa
universitária foram impressionantes11.
Certamente que um grande número de invenções tinham sido constituídas
séculos antes de 1870, mas os novos laboratórios de P&D profissionais pareciam como
um gigantesco passo adiante. Esta percepção foi reforçada poderosamente na Segunda
Guerra Mundial. A ciência já era importante na Primeira Guerra Mundial, mas os
resultados da Segunda Guerra e a conseqüência da explosão atômica em Hiroshima
impressionaram o mundo, demonstrando o “poder da ciência”. Muitas outras invenções
(em ambos os lados dos combatentes da guerra), como o radar, os computadores, os
foguetes e os explosivos, foram o resultado de grandes projetos de P&D, mobilizando
governos, indústrias e o meio acadêmico.
Uma expansão rápida dos laboratórios de pesquisa ocorreu em todos os países
industriais nos anos 1950 e 1960. Até mesmo nos países do terceiro mundo havia uma
tendência para se estabelecer conselhos de pesquisa, laboratórios de P&D nacionais,
outras instituições científicas e, em alguns casos, até mesmo tentar construir artefatos
nucleares (como são os exemplos da Argentina, Índia, Brasil, Israel e Iugoslávia).
O sistema de P&D foi considerado como a fonte das inovações (uma impressão
que foi reforçada pelas medidas adotadas, nos anos 1950, de estímulo ao
desenvolvimento dos laboratórios de pesquisa dentro e fora das firmas, primeiro pela

10
O Japão do século XX, com suas novas formas de organizar a produção (just in time, círculos de
controle de qualidade, etc.) é apenas um dos muitos exemplos que podem ser dados para enfatizar essa
afirmação.
11
Ver dados quantitativos em: Hobsbawn (1997), especialmente no capítulo XVIII.

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Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos e depois por todos os outros países
da OCDE). Essa prática ficou conhecida pelo “Manual Frascati” e, apesar do fato de
seus autores terem mostrado que as mudanças técnicas dependeram, não só de P&D,
mas também de outras atividades relacionadas, tais como a educação, o treinamento, o
controle de qualidade, etc., não obstante, medidas de P&D foram freqüentemente usadas
como um substituto para todas estas atividades que ajudariam a promover os novos
produtos e processos. Além disso, a importância de toda a realimentação do mercado e
da produção (como as relações do tipo produtor-usuário), no sistema de P&D, foi
negligenciada ou simplesmente esquecida.
Os resultados da pesquisa acadêmica em invenção e inovação tinham
demonstrado, amplamente, que muitos fatores foram importantes para o sucesso
inovador. Porém, as dificuldades práticas de os incorporar nas comparações
internacionais foram significativas, o que levou a que se restringissem apenas aos dados
de P&D. É certo que as instalações de pesquisa e desenvolvimento treinam os cientistas
e engenheiros das firmas e das agências governamentais e funcionam como o principal
veículo do avanço tecnológico em muitas áreas, tais como equipamentos e sistemas
elétricos, produtos e processos químicos, na aviação, etc. A maioria dos estudos
modernos sobre as capacidades nacionais enfoca como determinante da tecnologia esse
tipo de instituição.
No entanto, a realidade se impôs, e durante os anos 1950 e 1960, acumulou-se a
evidência de que as taxas de mudança técnica e de crescimento econômico dependeram
mais da difusão eficiente das inovações do que qualquer outra coisa. Isto se refletiu na
mudança de ênfase de vários documentos da OCDE (Freeman, 1987).
Uma característica importante do avanço técnico em todas as áreas é que são
apoiados, fortemente, por vários campos da ciência. Porém, as conexões entre a ciência
e a tecnologia são complexas e variam em certa medida de área para área.
Existe uma crença amplamente difundida de que uma nova ciência dá lugar a
uma nova tecnologia. Embora essa afirmação seja por demais simplista, ela é bastante
verdadeira quando se estuda o desenvolvimento das indústrias de equipamentos
elétricos, onde há uma coincidência entre a história dessas indústrias e a história das
teorias e experimentos físicos no século XIX. O aparecimento da eletricidade foi uma
fonte de dinamismo e criatividade na economia, de amplo alcance e poder, permitindo o
aparecimento de novos produtos que, atualmente, fazem parte do dia-a-dia de todos: a
luz incandescente, o telefone, os aparelhos de rádio e TV, dentre outros. Esses aparelhos
são as descendências legítimas de um empreendimento da pesquisa científica que
começou com a demonstração de Faraday da indução eletromagnética em 1831.
Décadas depois, a pesquisa de Maxwell conduziu à confirmação de Hertz, em 1887, da
existência das ondas de rádio que, por sua vez, permitiram a utilização dos rádios
modernos e da televisão. No entanto, a descoberta das ondas de rádio não aconteceu
porque os cientistas estavam procurando aplicações úteis para suas pesquisas. Hertz, por
exemplo, estava procurando confirmar a lógica interna da disciplina que ele ministrava,
e tentou fazer isso explorando as implicações da teoria através da evidência empírica.
Ao descobrir as ondas de rádio (que eram preditas por uma teoria científica elaborada
em anos anteriores à sua procura), Hertz deu base a muitas pesquisas posteriores.
Em contraste às indústrias de equipamentos elétricos, as indústrias de produtos
químicos, ou as que utilizam reações químicas na fabricação de outros produtos,
anteciparam e conduziram muito do desenvolvimento posterior da ciência química.
Porém, nas últimas cinco décadas do século XIX, um corpo sistemático de
conhecimento científico sobre a química cresceu e serviu de base para a inovação das
substâncias químicas. A química se tornou uma disciplina de laboratório na qual a

Revista Eletrônica Administradores sem Fronteiras - Número 01 - 2004 12


pesquisa passou a ser levada a cabo por profissionais treinados que faziam (e fazem) uso
de métodos científicos e procedimentos experimentais. Nos anos 1860, Kekule conduziu
pesquisas a fim de analisar a estrutura molecular do benzeno, que terminaram por tornar
possível a fabricação de milhares de aromáticos, inclusive tinturas e drogas em toda a
química orgânica. Estas novas compreensões foram inestimáveis, permitindo aos
cientistas das indústrias a procura de novas combinações de substâncias químicas
construtivamente e a invenção de melhores processos de produção.
Essas histórias sobre os avanços na física e na química como disciplinas
científicas parecem mostrar que seus desenvolvimentos foram autônomos e evoluíram
de acordo com uma lógica interna própria. Mas, as aparências são enganosas. Faraday,
por exemplo, seguiu a tradição do seu mentor, Humphrey Davy, tendo um forte
interesse em dispositivos práticos e uma convicção no valor da ciência inventiva. Já a
química moderna cresceu fora da alquimia antiga que se preocupava em achar modos
para transformar materiais básicos em pedras valiosas.
Freeman (1995) coloca que o advento das novas tecnologias levou,
freqüentemente, aos trabalhos científicos. A pesquisa de Sadi Carnot, no início do
século XIX, conduziu ao novo campo da física denominado termodinâmica. Esse
campo foi largamente motivado pelo interesse teórico no funcionamento das máquinas a
vapor. A química de polímeros emergiu no século XX e foi o resultado, em grande
parte, das pesquisas executadas dentro dos laboratórios industriais, que desenvolveram
materiais que poderiam cumprir melhor as exigências variáveis da indústria.
Por outro lado, o desenvolvimento da indústria química moderna levou ao
surgimento de um novo campo: a engenharia química. Essa, não só envolveu a
aplicação prática da ciência química, mas foi a resultante, também, da fusão da química
com a engenharia mecânica. Portanto, a engenharia química integra a aplicação das
habilidades da engenharia mecânica com os métodos para a tarefa especializada de
fabricação de produtos químicos (resultando no desenvolvimento, dentre outros, dos
polímeros e dos vidros).
A história da aeronáutica (com o desenvolvimento do avião), é bastante
semelhante ao desenvolvimento da química moderna. Novamente a tecnologia, ou uma
versão primitiva dela, surgiu primeiro, e a “ciência” foi desenvolvida a posteriori para
basear essas novas descobertas.
No entanto, dizer que novas tecnologias fazem surgir novas ciências é pelo
menos tão verdadeiro quanto se dizer o contrário. A percepção de que o
desenvolvimento das modernas tecnologias de base científica uniu a ciência à técnica,
talvez seja mais verdadeira. Esta é a razão principal do porquê, na atualidade, a
tecnologia está, em grande parte, sendo desenvolvida pelo trabalho de pesquisadores
que têm treinamento universitário em ciência ou em engenharia. Esse entrelaçamento
entre a ciência e a tecnologia, também é a razão principal do porquê, em muitos campos,
a pesquisa universitária se apresenta como uma contribuinte importante para o avanço
técnico, e tanto as universidades quanto os laboratórios de pesquisa incorporam partes
essenciais do sistema de inovação.
Assim, os problemas ou observações que se originam nas indústrias, não são
explorados só por cientistas industriais. Eles alimentam e estimulam toda comunidade
científica. As tentativas de Edison, em 1883, para melhorar a luminária incandescente o
conduziram a observar o fluxo da eletricidade dentro de lâmpadas por um orifício que
separava um filamento quente de um arame de metal. Edison tinha observado a
existência de elétrons antes mesmo de sua existência ter sido postulada. Embora Edison
não tenha apreciado o significado das suas observações, ele terminou por formar a base

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para muitos avanços científicos do século XX que incluem a físicas atômicas e as
numerosas tecnologias eletrônicas.
Atualmente, um montante expressivo da despesa em P&D industrial está
aplicada em produtos tais como: aeronaves, automóveis e máquinas fotográficas – que
não existiam há 150 anos. São estes produtos que servem para definir a linha dentro da
qual podem ser identificadas e empreendidas melhorias. O transistor, que transformou
tão drasticamente o mundo desde a segunda metade do século XX, foi introduzido nos
anos 1940 e pôs a base para a revolução da microeletrônica. O transistor original era um
objeto frágil, incerto e caro, que só as melhorias subseqüentes tornaram possível sua
utilização.
Nesse como em outros casos, o avanço da tecnologia entrou de mãos dadas com
o avanço da ciência. A invenção do transistor em 1948 transformou rapidamente a física
de sólidos de um pequeno subgrupo para uma área importante da física moderna. Isto
aconteceu tanto dentro da comunidade científica universitária como também no setor
produtivo privado. De forma semelhante, o advento do laser nos anos 1960, junto com a
viabilidade do uso de fibras óticas para propósitos de transmissão de dados, conduziram
a uma grande expansão da ciência ótica (onde os ganhos econômicos foram nitidamente
aumentados).
O desenvolvimento da ciência de base tecnológica conduziu a uma mudança
dramática no perfil das pessoas e instituições envolvidas no avanço técnico. Na maior
parte do século XIX não houve relação forte entre os inventores e os cientistas. No
entanto, em 1900, o treinamento formal em química estava se tornando uma exigência
para o próspero esforço inventivo nas indústrias de produtos químicos. Atualmente essa
relação é indispensável12.
Além das firmas (e de seus departamentos de P&D) e dos agentes já citados,
várias outras instituições participam diretamente do processo de geração e difusão das
novas tecnologias e do novo conhecimento, dentre elas podem ser destacadas: as
agências governamentais, as instituições financeiras e os órgãos públicos de fomento à
pesquisa.

4 OUTROS SISTEMAS DE INOVAÇÃO

Seguindo a tradição neo-schumpeteriana, concebe-se os processos de inovação –


entre os quais incluímos, também, os processos organizacionais – como fortemente:
tácitos, cumulativos e localizados.
Por um lado, isto implica que, em geral, a probabilidade de realizar avanços
tecnológicos em firmas, instituições e em nações ou regiões, é função do nível
tecnológico alcançado previamente por elas. Por outro lado, tem-se que o conhecimento
tecnológico é difícil de transferir em sua totalidade; boa parte do mesmo se acumula nas
firmas em forma de trabalhadores especializados, tecnologia própria e know how
difíceis de serem reproduzidos em manuais e também em suas interações, muitas vezes
“locais”, com pesquisadores e institutos de P&D. As assimetrias ou brechas em
performances tecnológicas entre firmas, nações e regiões surgem como uma
conseqüência natural destas tendências.
Por sua vez, as diferenças entre as capacidades de aprendizagem e inovação são
uma fonte maior de divergências entre as trajetórias de crescimento de firmas, nações, e

12
No entanto, é importante não confundir a autonomia altamente estimada do cientista individual,
amoldando o seu próprio programa de trabalho e pesquisa, com a determinação de agências de P&D
privadas em busca de lucros futuros mais atraentes.

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regiões. Estas capacidades estarão, em alguns casos, referidas a novos processos,
produtos ou técnicas organizacionais “de fronteira”. Entretanto, em outros casos – e este
é, em geral, o caso dos países de desenvolvimento intermediário, como o Brasil – tratar-
se-á de absorver, adaptar e/ou melhorar inovações desenvolvidas em outros países. As
atividades inovativas se desenvolveram, tanto através de processo “formais”
(laboratórios de P&D, etc.), como “informais” (learning by doing, learning by using,
etc.).
López e Lugones (1999) colocam que os epicentros destes processos inovativos
são as firmas produtivas. Porém, as firmas não inovam em isolamento, a não ser que
estabeleçam diferentes classes de relações com outros agentes (competidores,
pesquisadores, institutos de pesquisa e universidades), sem os quais os processos
inovativos seriam mais lentos e de menor alcance.
Entre o mercado e a hierarquia, existe uma grande variedade de relações e
interações entre firmas, que podem tomar diferentes formas, desde relações informais
entre firmas pequenas que dependem mutuamente das capacidades de cada uma delas, a
redes com centro em uma empresa que se vincula com seus pesquisadores e
subcontratados, até alianças estratégicas entre firmas líderes que tenham capacidades
tecnológicas mais ou menos similares. Vê-se, então, que as interações entre firmas
podem variar em seu grau de formalidade, na maior ou menor “igualdade” que existe
entre seus participantes – que podem ser mais ou menos numerosos – e o grau de
centralização/descentralização com o qual operam. Ao mesmo tempo, essas interações
podem se dar no plano da inovação – sem as etapas competitivas ou pré-competitivas –
como a produção e a comercialização.
Isto nos abre um leque de possibilidades, que torna muito difícil estabelecer
tipos analíticos “ideais” ou formular uma taxonomia abrangente dos casos encontrados
através da evidência empírica. Em todo caso, há um crescente consenso em torno do
eixo de que a participação em redes e/ou vínculos com outras firmas (assim, também,
com outros tipos de instituições, tais como: universidades, centros de pesquisa e
assistência tecnológica, etc.), são casa vez mais importantes para determinar o
desempenho e a competitividade das unidades econômicas.
No plano da inovação tecnológica, o grau de cooperação e o grau de vínculos
com outros agentes podem ser importantes. Os trabalhos reunidos em Lundvall (1992)
enfatizam a natureza interativa dos processos de inovação e aprendizagem. As redes
formais e informais de que participam as firmas podem compensar, ao menos
parcialmente, as limitações individuais de cada uma. Assim mesmo, a geração e a
difusão de tecnologia se assentam, fortemente, na redução de custos de transação via
internalização dos intercâmbios em redes. A troca de fluxos de informação pode resultar
em uma “mescla” de diferentes visões de futuro, se, por esta via, distintos atores
compartilham de uma expectativa similar, o rasgo percebido diante de qualquer
mudança tecnológica pode ser reduzido, gerando-se uma quase-coordenação de
investimentos entre os “atores” formalmente independentes.
Assim, por exemplo, as inovações de produto têm lugar em “mercados
organizados”, graças à interação entre usuários e produtores. Este tipo de inovação seria
escasso se os mercados se basearem em relações anônimas entre agentes autônomos (tal
como se concebe no marco neoclássico). Os produtores teriam dificuldades para
observar novas necessidades e os usuários careceriam de informações qualitativas sobre
as características dos novos produtos. Por outro lado, a presença de custos de transação
e oportunismo no comportamento dos agentes, fará com que todas as inovações dos
produtos se transformem, via integração vertical, em inovações de processo. Se as
inovações de produtos são habituais no capitalismo, isso é assim por que ocorrem em

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“mercados organizados”, nos quais se produz intercâmbio de informações qualitativas, e
existem relações (durável e seletivas) de cooperação, hierarquia e confiança13.
Segundo López e Lugones (1999), a natureza interativa dos processos de
mudança tecnológica parece se reforçar no avanço da chamada “economia baseada no
conhecimento”, onde as firmas desenvolvem vínculos para promover o aprendizado
iterativo e buscam sócios e redes que lhes dêem ativos complementares. Estas relações
ajudam as firmas: a repartirem os custos e riscos associados com os processos de
inovações; a ganharem acesso a novos conhecimentos; a adquirirem componentes
tecnológicos chaves; e a repartirem ativos na manufatura, na comercialização e na
distribuição.
No mesmo sentido, argumenta-se que as mudanças recentes no plano
tecnológico e organizacional, associadas à difusão da microeletrônica e do chamado
sistema toyotista de produção, assim como as pressões emergentes da “globalização”,
também incrementam a importância da cooperação interfirma, pois:

[Pode-se dizer que neste caso] os custos crescentes da inovação, a necessidade de um rápido
ajuste ante as mudanças tecnológicas e o fato de que as tecnologias se fazem crescentemente
sistêmicas ou genéricas [sem grifo no original], implicam que as firmas necessitam dividir os
custos e riscos de suas atividades de P&D (opinião expressa por Dunning, apud López; Lugones,
1999. p. 77. Ver, também, parte I do texto).

No caso das pequenas e médias empresas, as interações e vínculos adquirem,


freqüentemente, papel chave para a própria sobrevivência das firmas. Existem três
maneiras básicas através das quais as empresas menores podem se manter e prosperar
em um ambiente “globalizado”:

[...] Podem fortalecer suas intenções de se converterem em fornecedoras preferenciais de grandes


corporações melhorando seus padrões de qualidade e prazos de entrega; podem tratar de
competir ‘individualmente’ em mercados finais, provavelmente em nichos específicos; ou podem
tentar fortalecerem-se, coletivamente, associando-se com outras firmas pequenas, através de, por
exemplo, distritos industriais, para cooperar, produzir e vender através de alianças, instituições
coletivas e consórcios (Pyke, apud López, et al. p. 78).

Mesmo que a primeira possibilidade corresponda, por exemplo, aos padrões de


vinculação característicos do toyotismo, a última maneira se refere, centralmente, às
experiências dos chamados distritos industriais14 italianos. O rápido crescimento da
“Terceira Itália”, e particularmente das pequenas e médias empresas, está associado à
concentração de firmas em setores e localidades específicas. Estes clusters foram
capazes de estabelecer uma forte posição nos mercados mundiais em uma série de
produtos tradicionais, tais como: sapatos, tecidos, dentre outros; e também em indústrias
fornecedoras de máquinas.
A capacidade de inovação e aprendizagem está fortemente enraizada nas
estruturas sociais, institucionais e produtivas de cada região ou nação. Estas estruturas
possuem, então, em papel chave em relação às divergências nacionais – e também,
locais e regionais – e aos padrões de crescimento e desenvolvimento.

13
Um mercado organizado é, então, um compromisso entre o mercado e a hierarquia (a firma
verticalmente integrada).
14
O distrito industrial é uma entidade sócio-territorial caracterizada pela presença ativa de uma
comunidade de “atores” e um conjunto de empresas em um espaço geográfico e histórico determinado.
Nos distritos, ao contrário do que acontece em outros tipos de arranjos, como por exemplo, nas cidades
industriais, tem-se conseguido uma relação extremamente positiva com a comunidade local e com as
empresas.

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Ao mesmo tempo, alguns trabalhos, por exemplo, Jaffe, et al. (1993), enfatizam
a importância das externalidades locais para o desenvolvimento tecnológico. Assim, por
exemplo, a pesquisa e o desenvolvimento se realizam com mais eficiência quando
firmas ou instituições possuem atividades geograficamente próximas, isto permite às
firmas unirem recursos qualificados, assim como interagirem entre si.
Da combinação da idéia de spilllovers tecnológicos delimitados espacialmente,
com o caráter cumulativo das capacidades inovadoras das firmas, surge a possibilidade
de processos auto-reforçantes de convergência/divergência entre diferentes nações e
regiões. Assim, uma vantagem inicial (mesmo pequena) de uma região ou nação em
termos de capacidade inovadora, pode gerar altas taxas de crescimento, atraindo novas
firmas inovadoras à região ou nação que, por sua vez, reforçariam a capacidade de
crescimento de forma similar.
A ênfase na importância da “dimensão espacial” tem se derivado de trabalhos
diferentes, porém, potencialmente convergentes. Estes estudos, também, tentam incluir
(em suas análises) múltiplas dimensões sociais que agem sobre as capacidades de
inovações destacando a sua influencia sobre os setores de crescimento e
desenvolvimento econômico. Em particular, os limites nacionais servem para identificar
“atores” que compartilhem uma cultura, uma história, uma linguagem, instituições
sociais e políticas comuns, que estão imersos em estruturas produtivas específicas.
Essas idéias teóricas fizeram surgir os conceitos de Sistema Regional de
Inovação (SRI) e de Sistema Setorial de Inovação (SSI). O conceito de Sistema
Regional de Inovação se encontra na tradição dos estudos de Cooke (1996) sobre as
experiências bem sucedidas no desenvolvimento econômico local, cujos exemplos mais
célebres estão nas áreas high-tech do Vale do Silício e da Rota 128 nos Estados Unidos,
ou a Zona de Cambridge na Grã-Bretanha15.
Um Sistema Setorial de Inovação, por sua vez, define-se como um grupo de
firmas que participam dos processos de desenho e fabricação dos produtos de um
determinado setor, assim como na geração e na difusão das tecnologias dominantes
neste setor. Essas firmas podem se relacionar de dois modos diferentes: através de
processos de interação e cooperação no desenvolvimento tecnológico; e mediante
processos de competência e seleção, a partir de seus aportes inovativos, produtivos e
comerciais.
Uma implicação interessante do conceito de Sistema Setorial de Inovação é que
os limites geográficos dos sistemas inovativos são, desde o ponto de vista setorial,
endógeno, já que emergem das condições especificas do desenvolvimento e dos regimes
tecnológicos dominantes em cada atividade. Assim, diferentes indústrias podem ter
distintos limites competitivos, interativos e organizacionais. As firmas, em certas
indústrias, podem competir “globalmente”, porém, possuem uma base organizativa e
interativa “local”. No entanto, em outros ramos a competência pode ser regional, porém,
com firmas baseadas em equipes e insumos vindos do estrangeiro. Assim mesmo, a
quantidade de inovadores (assim como seu grau de concentração e de dispersão
geográfica) depende, também, das características dos Sistemas Setoriais de Inovação.
Outro elemento importante que surge deste enfoque é que existem diferentes
limites espaciais em relação às atividades inovativas das firmas. Primeiro, em sistemas
com base no conhecimento predominantemente tácito, que formam partes de sistemas
complexos e extensos e nos quais as fontes de novos conhecimentos provêm de
interações usuário-produtor; depois, na proximidade geográfica que será relevante para

15
Os distritos industriais italianos, que podem ser outro exemplo de Sistemas Regionais de Inovação,
exemplificam casos de desenvolvimento baseado, geralmente, em industriais “tradicionais”, tais como: a
têxtil, a cerâmicas, etc.

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facilitar as transações de conhecimento entre os agentes. Portanto, os limites espaciais
dos processos inovativos terão uma natureza predominantemente “local”.
O contrário ocorre quando a base do conhecimento é mais codificável, simples e
independente, e quando as fontes de novos conhecimentos se associam com avanços
científicos (e predominantemente) genéricos. Aqui, a proximidade geográfica não será
tão importante e os limites espaciais dos processos inovativos tenderão a ter uma
natureza nacional, internacional ou global.
Um conceito análogo ao de Sistema Setorial de Inovação é o de Sistema
Tecnológico o qual é definido como “uma network de agentes que interatuam em uma
área tecnológica específica, sob uma infra-estrutura institucional determinada, com o
propósito de gerar, difundir e utilizar tecnologia”, López e Lugones (1999).
Esta vinculação entre o “espacial” e o “setorial” tem um forte embasamento na
evidência empírica que surge de uma grande quantidade de livros e trabalhos que
mostram que as inovações tendem a “agrupar-se” espacialmente, e que as regiões
geográficas se especializam em certas áreas tecnológicas ou industriais, especializações
que se sustentam, persistentemente, ao longo do tempo.
Ainda de maneira incipiente, estão surgindo, também, Sistemas Supranacionais
de Inovação (SSNI); um exemplo neste sentido é o da União Européia, onde surgiu (ou
melhor, está surgindo) um “Sistema Pós-Nacional de Inovação”.
No entanto, o conceito de Sistema Nacional de Inovação e também, os de
Sistema Setorial de Inovação, Sistema Regional de Inovação e Sistema Supranacional
de Inovação não possuem a dimensão de teorias claramente estabelecidas, com
mecanismos causais bem definidos e suficientes testes empíricos. Tampouco, existem
modelos “ideais” que indiquem uma ou mais tipologia de Sistemas “Padrões”, os quais,
na prática, deveriam ajustar-se, tendencialmente, às regiões ou nações em processo de
desenvolvimento. Contudo, está se desenvolvendo um “marco conceitual”, o qual
permite, de todos os modos, “sugerir” algumas idéias e argumentos em torno de
problemas que nos cercam e assinalam as “diferenças” mais relevantes entre os casos
empíricos.
Este enfoque tem mais probabilidade de êxito no plano “explicativo” que no
“normativo”, já que as recomendações de política que se pode derivar deste enfoque são
muito difusas.
Como parte de uma tradição de estudos nascidos anteriormente à introdução do
conceito de Sistema Nacional de Inovação e seus derivados nos planos regionais,
setoriais e supranacionais, existe uma grande quantidade de trabalhos sobre os distritos
industriais, os clusters, etc. (ricos em observações sobre externalidades locais,
economias externas e de aglomeração, atmosferas industriais e aprendizagem coletiva.
Porém, no interior dos quais existem muitas impressões e ambigüidades). Nesse sentido:

[...] desde os anos 1980 surgiram muitos estudos sobre “sistemas locais [de inovação]” [sem
grifo no original] sendo as regiões – ou distritos industriais – italianas o objeto de estudo mais
recorrido na literatura em questão; o direcionamento de estudos similares em países em
desenvolvimento [como, por exemplo, o Brasil] é uma tendência mais recente, porém,
igualmente em expansão (López, et al., 1999. p. 82).

Assim, Lawson (1997) apresenta uma classificação de algumas das perspectivas


teóricas com as quais foi abordada esta problemática. Por um lado, distingue o que
chama escola “californiana” (cujos representantes mais importante são Scott e Storper),
na qual detecta uma evolução do enfoque sobre o tema desde a região como um nexo de
traded interdependences – onde as aglomerações têm o objetivo de reduzir os custos de
transação – a outras onde se enfatizam as untraded interdependences, que não podem

Revista Eletrônica Administradores sem Fronteiras - Número 01 - 2004 18


ser reduzidas a relações de insumo-produto ou de contrato, e que incluem spillovers
tecnológicos e convenções, regras e formas para desenvolver, comunicar e interpretar o
conhecimento.
Uma segunda perspectiva se associa com a idéia de “distritos industriais”. Os
autores dessa corrente enfatizam que a sobrevivência de uma firma depende,
crescentemente, de suas possibilidades de diferenciação, assim como a sua presença em
ambientes onde prevaleçam mecanismos de coordenação complexos e sofisticados.
Um terceiro enfoque vem do chamado Grupo de Pesquisa Européia sobre
Inovação (GPEI). O interesse principal dessa corrente é discutir quais são as condições
sobre as quais o “meio” ou o “ambiente” podem estimular as atividades inovativas das
firmas a que pertencem. Esta perspectiva está embasada nas relações sócio-culturais,
principalmente àquelas de caráter informal. Os autores deste grupo distinguem entre
“estáticas” e “dinâmicas” as interpretações do espaço econômico. Nas primeiras, estão
incluídas as teorias do custo de transação e a análise marshalliana. As análises
dinâmicas, por sua vez, enfatizam a importância do ambiente para facilitar o
aprendizado coletivo e para reduzir as incertezas dinâmicas. O ambiente pode tornar
possível, sob certas condições, o desenvolvimento do aprendizado coletivo, que é o
aspecto mais importante dos sistemas locais, podendo estabelecer um sistema de
relações no qual o conhecimento comum (que resulta das tradições e línguas comuns)
juntamente com os mecanismos coletivos e culturais monitore e decodifique as
informações.
Este conjunto de trabalhos conseguiu chamar a atenção sobre as várias
experiências que tiveram êxito no desenvolvimento local ou regional. Além da
“Terceira Itália”, foram difundidos experiências que tiveram êxito na Alemanha (Baden
Würtenberg), na Espanha (Valência), na França (Grenoble), dentre outras.
Existem discrepâncias sobre as formas em que elas se desenvolveram –
espontaneamente (distritos industriais italianos) ou com menor ou maior apoio de
políticas públicas (Vale do Silício) –. Existem, ainda, casos com desenvolvimento
baseado em “low road” (salários baixos) e “high-road” (acumulação de aprendizagem
coletiva do conhecimento)16.
A literatura sobre distritos e ambientes enfatiza que existe um mix de
competências e cooperações entre as firmas que as moldam. Nesse sentido, a
experiência mostra diversas combinações de convergências e cooperação, distintos
modelos de cooperação (mais ou menos hierárquicos), diferentes ambientes, áreas e
modalidades cooperativas. É preciso, também, deixar claro as relações e interações
intrafirmas e extrafirmas, assim como contrastar experiências de sistemas mais ou
menos abertos e a competência “externa”.
As condições institucionais, sociais, históricas, culturais, etc., que dão o plafond
para o desenvolvimento de relações de cooperação não estão totalmente determinadas.
As mesmas dúvidas emergem com relação aos comportamentos heterogêneos que se
detectam no interior dos distintos ambientes. Em resumo, pode-se afirmar que não estão
determinadas as formas, os mecanismos e os processos que promovem a atividade
inovadora com mais êxito em certas regiões que em outras.
Também falta elaborar, mais pormenorizadamente, os detalhes sobre as
capacidades de adaptação aos ambientes locais ante as mudanças nas condições
externas, já que em alguns casos o ambiente pode ser positivo para o desenvolvimento
das firmas locais; já em outros casos, pode constituir um obstáculo. Assim, muitas vezes

16
Para uma comparação dos estudos sobre desenvolvimento baseado em baixos salários e
desenvolvimento baseado na acumulação de aprendizagem coletiva do conhecimento, ver Humphrey;
Schmitz (1996).

Revista Eletrônica Administradores sem Fronteiras - Número 01 - 2004 19


surge a sensação de que “ambientes inovativos” se distinguem ex post facto, López e
Lugones (1999).
Outro tema importante é o em que medida – e em quais condições – a
proximidade geográfica é condição para o desenvolvimento de padrões de “eficiências
coletivas” estáticas e dinâmicas? Neste sentido, uma classificação aponta na direção de
que o aprendizado mútuo e a inovação coletiva podem existir em clusters definidos
como concentrações setoriais ou geográficas de empresas, ou pela networking de
pequenas e médias empresas que não se encontram, necessariamente, no mesmo setor
ou localidade. Um cluster é definido pela concentração industrial e geográfica de
firmas, as quais deverão estimular a geração de economias externas, porém, não implica
em desenvolver relações de especialização e cooperação entre agentes locais. Um
distrito industrial emerge quando um cluster desenvolve não só padrões de
especialização interfirma, mas também formas implícitas e explícitas de colaboração
entre agentes econômicos locais e fortes associações setoriais.
Finalmente, uma network não implica, necessariamente, na proximidade
geográfica das pequenas e médias empresas, já que a cooperação entre as firmas e o
aprendizado coletivo pode existir, também, entre empresas que não estão na mesma
localidade.
Na seqüência da discussão, será colocada, a seguir, a definição do conceito de
Sistema Local de Inovação.

5 OS SISTEMAS LOCAIS DE INOVAÇÃO

Nas últimas décadas do século XX, diversas foram as contribuições da literatura


que se propuseram a discutir o caráter localizado do desenvolvimento econômico e da
inovação, assim como sua relevância. Tal literatura, que pode ser identificada,
principalmente, a partir do início da década de 1980, vem buscando compreender o
papel relativo do “local” para a compreensão do processo inovativo nas empresas,
regiões e países (Lastres et al., 1999).
Salienta-se, em particular, a atenção que passou a ser dada ao caráter localizado
da inovação e do conhecimento, ao constatarem-se as grandes assimetrias em termos da
distribuição espacial da capacidade de geração e difusão de inovações. Conforme se
pode notar, o motivo central de muitas das análises realizadas se refere à tentativa de
explicar as razões dos significativos níveis de concentração, em nível mundial, da taxa
de introdução de inovação, com algumas regiões, setores e empresas tendendo a
desempenhar o papel de principais indutores das inovações, enquanto outras são
relegadas ao papel de “adotantes”.
É importante enfatizar que a discussão sobre o caráter local da inovação
antecede, cronologicamente, as questões que vêm se colocando mais recentemente sobre
o processo de “globalização”. Contudo, com a emergência de tais questões, o enfoque
sobre o caráter localizado da inovação passa a ganhar maior evidência, tendo em vista
os vários esforços de equacionamento sobre como se estabeleceram às relações entre o
“local” e o “global” e sobre o papel que cada uma destas dimensões irá desempenhar em
níveis econômicos e políticos.
De forma geral, pode-se observar que as contribuições sobre a questão da
dimensão local da inovação partem de diferentes grupos de autores que adotam variadas
linhas de pensamentos, não só econômico, mas também geopolítico, sociológico,
histórico e filosófico, dentre outros. Como decorrência, verifica-se um variado número

Revista Eletrônica Administradores sem Fronteiras - Número 01 - 2004 20


de enfoques, terminologias e formas de analisar a capacidade de arranjos locais gerarem
desenvolvimento econômico e inovativo.
A profusão e diversidade de estudos ampliam o ângulo da análise proposta.
Porém, a falta de maior uniformidade e a insuficiência de argumentos em vários
enfoques, por vezes, dificultam a compreensão das diferentes experiências e a
compreensão completa deste fenômeno, bem como a proposição de políticas. Assim,
permanecem argumentos de que cada caso particular traz em si especialidades do
processo de capacitação inovativa e de desenvolvimento econômico, que tornam difícil
o estabelecimento de modelos a serem seguidos (Lastres et al., 1999).
Apesar desta ressalva, análises que privilegiam o papel do ambiente e da
interação que se dá entre diferentes agentes como elemento de promoção da inovação
passaram a confrontar as abordagens mais tradicionais. O foco de contribuições mais
recentes neste sentido, em particular na economia da inovação reside,
fundamentalmente, na noção de que os processos de geração de conhecimento e de
inovação são interativos e localizados. Isto é, argumenta-se que a interação criada entre
“agentes” localizados em um mesmo espaço favorece o processo de geração e difusão
de inovações. Em particular:

[...] No âmbito da abordagem evolucionista [ou neo-schumpeteriano], buscou-se destacar o papel


do local enquanto elemento ativo no processo de criação e difusão de inovação. [...] Ressalta[-se]
que a interação entre tecnologia e contextos locais possui papel fundamental na geração das
inovações, por meio de mecanismos específicos e aprendizado formados por um quadro
institucional local específico. Assim, aponta-se que diferentes contextos locais com diferentes
estruturas institucionais terão processos inovativos qualitativamente diversos (Lastres et al., op.
cit., p. 53-54).

Geralmente, argumenta-se que o conhecimento e a mudança tecnológica são


localizados, tendo em vista que decisões técnicas das firmas são path-dependents, isto é,
em cada firma, em qualquer momento, a geração, implementação, seleção e adoção de
novas tecnologias são influenciadas pelas características das tecnologias que estão
sendo utilizadas e pela experiência acumulada no passado. A geração do conhecimento
é vista como resultado de um processo conjunto que envolve tanto a atividade formal de
ensino e P&D como os fluxos correntes das atividades da empresa e de sua interação
com o ambiente que a cerca.
Destaca-se, também, que tal dimensão localizada no processo inovativo confere
um papel primordial às especialidades locacionais, particularmente aos diferentes
mercados e instituições (firmas, instituições de P&D, governo, etc.) delimitados em um
espaço econômico e suas formas de interação no processo de geração e difusão de
inovações.
No entanto, um último fator importante na análise endógena dos Sistemas de
Inovação é o papel das suas trajetórias tecnológicas.

6 AS TRAJETÓRIAS TECNOLÓGICAS

As oportunidades tecnológicas com as quais se defrontam as firmas estão


intrinsecamente ligadas à dinâmica de estabelecimento e superação de paradigmas e
trajetórias. Existe um inter-relacionamento dinâmico da ciência com a tecnologia
utilizável pela produção, um processo mais complexo e multifacetado do que a visão
tradicional de uma seleção pelos produtos, em função dos movimentos da demanda ou
de um estoque livremente disponível de conhecimentos tecnológicos.

Revista Eletrônica Administradores sem Fronteiras - Número 01 - 2004 21


Inicialmente, a seleção de determinado paradigma (o início da seqüência
dinâmica do processo de mudança técnica) é realizada de forma tal que a ação dos
mecanismos de mercado é fraca. As inovações radicais, que estão na origem de um
novo paradigma, dependem muito das novas oportunidades abertas pelos avanços
científicos ou por fortes obstáculos encontrados no desenvolvimento de determinadas
trajetórias tecnológicas17. Essas trajetórias oferecem caminhos mais ou menos
delimitados para a operação dos mecanismos de seleção. A ação das forças econômicas
encontraria seu espaço delimitado pelas trajetórias possíveis. Há aí uma formulação
onde se configura um espaço para atuação das forças econômicas, mas, sobre um leque
de opções de certa forma limitado pelas possibilidades tecnológicas. As trajetórias
tecnológicas, nesse contexto, se confundiriam com a opção dos processos, não
totalmente aleatórios, de busca e seleção, pois, as firmas devem buscar determinadas
estratégias definidas dentro dos contornos de um paradigma estável.
Em nível macroeconômico, o principal fator de estabilidade apresentado pelas
trajetórias tecnológicas encontra-se na relativa inflexibilidade do aparato institucional,
que configura os Sistemas Nacionais de Inovação, em adaptar-se às modificações no
paradigma técnico-econômico (Perez, 1986). Deve-se lembrar, também, que as
características próprias do processo de geração e difusão de tecnologia impõem aos
agentes um comportamento racional (mas não no sentido neoclássico) no processo de
introdução de inovações. Assim, nos mecanismos de seleção via mercado, os ganhos de
produtividade advindos da aprendizagem derivada do uso contínuo de uma certa
tecnologia (learning by doing) e as condições de apropriabilidade de lucros
extraordinários gerados pelas inovações, definidas principalmente pela estrutura de
mercado do qual a firma participa, definem uma certa taxa de inovação bruta que flutua
dentro de uma faixa que gera padrões globais ordenados.
Ao mesmo tempo, está presente a incerteza inerente aos processos de seleção,
através do veredicto positivo ou negativo do mercado às estratégias escolhidas e
implementadas pelas empresas. Os problemas encontrados pela pressão das forças
econômicas sobre as trajetórias podem atuar apresentando novos problemas e, talvez,
forçando mudanças de trajetórias18.

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17
Trajetória tecnológica é um conceito que sugere que as mudanças nas inovações tecnológicas possuem
uma lógica própria (Perez, 1986).
18
A essência da dinâmica das trajetórias tecnológicas, no interior dos Sistemas Nacionais de Inovação,
pode ser capturada pela análise metodológica dos modelos não-lineares ou “complexos”. Tal como
desordem organizada, auto-organização ou caos, a complexidade constitui um termo que expressa um
novo instrumento conceitual na elaboração epistemológica que se está produzindo na atualidade com o
objetivo centrado no desenvolvimento de teorias científicas que se destinam a encontrar um maior grau de
integrabilidade do universo (Nicolis; Prigogine, 1989). É importante observar que esta teoria não se
encontra limitada ao âmbito das ciências tradicionais, tais como a Física, a Química ou a Biologia,
estendendo-se por muitos outros campos, tais como o das Ciências Sociais e da Economia. Engloba,
também, as contribuições da teoria dos sistemas, da cibernética, dos estudos sobre inteligência artificial e
dos fractais, (Díaz, 1994).

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