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Centro Universitário de Patos de Minas – UNIPAM

Disciplina: Sociologia Geral

O positivismo de Auguste Comte

1 - AUGUSTE COMTE (1798-1857)

Comte, cujo nome completo era Isidore-Auguste-Marie-François-Xavier Comte, nasceu em 19


de janeiro de 1798, em Montpellier - Paris, de família modesta, católica e monárquica. Filósofo
e auto-proclamado líder religioso, deu à ciência da Sociologia seu nome, estabelecendo a nova
disciplina em uma forma sistemática. Ele mesmo escreve sobre seu itinerário intelectual e
moral: "Nem bem completara catorze anos, já experimentava a necessidade fundamental de
regeneração universal, ao mesmo tempo política e filosófica, sob o impulso ativo da crise
revolucionária salutar cuja fase principal precedera meu nascimento. A luminosa influência de
uma iniciação matemática que tive em família, felizmente desenvolvida na École Polytechnique
fez-me pressentir instintivamente o único caminho intelectual que podia realmente conduzir a
essa grande renovação".

Discípulo de Saint-Simon, rompe com seu mestre, e passa a se preocupar em elaborar sua
filosofia positiva. Não possuindo cadeira acadêmica oficial na qual pudesse expor suas teorias,
decide oferecer um curso particular onde divulgaria sua Summa do conhecimento positivo. O
curso teve início em abril/1826, porém, devido a um colapso nervoso, deu apenas três aulas,
sendo obrigado a interromper o curso. Caiu, então, em um estado melancólico profundo, e
tentou o suicídio jogando-se no rio Sena. Somente em agosto/1828 saiu de sua letargia,
recomeçando o curso das conferências em 1829.

Durante os anos 1830-1842, quando escreveu sua obra prima Cours de philosophie positive,
Comte vivia miseravelmente, à margem do mundo acadêmico. Todas as tentativas de ser
apontado para uma cadeira acadêmica foram infrutíferas. Neste período, além das dificuldades
financeiras e de colocação profissional, sofreu críticas do mundo científico, por parte de
importantes figuras que o ridicularizavam pela sua pretensão de submeter ao seu sistema todas
as ciências. A mágoa agravou seu estado psicológico. Por razões "de higiene cerebral", decidiu-
se, em 1838, a não ler mais uma linha de qualquer trabalho científico, limitando-se à leitura de
ficção e poesia. Em seus últimos anos o único livro que haveria de ler repetidamente seria o
"Imitação de Cristo". Sua vida matrimonial, que sempre fora tempestuosa, também se desfez. Só
e isolado, continuou a atacar os cientistas que se recusaram a reconhecê-lo. Queixou-se de seus
inimigos aos ministros do Rei, escreveu cartas delirantes à imprensa e atormentou a paciência
de seus poucos restantes amigos.

Contudo apesar de todas as adversidades, Auguste Comte começou lentamente a adquirir


discípulos. Sua doutrina positiva atravessa o Canal e recebe considerável atenção na Inglaterra.

Em 1844, conhece Clotilde de Vaux, por quem se apaixonou. Entusiasmado com a própria
paixão, Comte afirma que nada pode ser mais eficaz para o bem pensar que o bem querer, e se
torna um abrasado feminista. Afirma que a mulher encarna o sentimento e portanto, em última
análise, a própria Humanidade. Busca então seriamente associar o sexo feminino à obra de
renovação social e moral que se impôs completar. Clotilde tenta colaborar, através de um
romance filosófico, Wilhelmine, que ela se põe febrilmente a escrever. Mas adoece de
tuberculose e vem a falecer em 1846. O filósofo devota o resto de sua vida à memória do "seu
anjo". Em 1851 publica seu Système de politique positive, dedicando-a a Clotilde, e dizendo
esperar que a humanidade, reconhecida, haveria de lembrar sempre seu nome junto ao dela.

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Nesta obra, defende a primazia da emoção sobre o intelecto, do sentimento sobre a
racionalidade e proclama repetidamente o poder curativo do calor feminino para a humanidade,
dominada por tempo demasiado pela aspereza do intelecto masculino. Desta forma, ele
escandaliza e perde a maioria dos seguidores racionalistas que havia conquistado com tanta
dificuldade nos últimos quinze anos.

Auguste Comte cria a Religião da Humanidade, da qual se proclama sumo sacerdote. A


observação dos rituais múltiplos segundo o calendário anual, os detalhes da elaborada liturgia
indicavam que o antigo profeta do estágio positivo havia regressado às trevas do estágio
teológico. Ganha novos discípulos e funda a Societé Positiviste, que se transformou no centro
principal de seu ensino. Nesta sociedade, os membros se cotizavam para assegurar a
subsistência do mestre, fazendo votos de espalhar sua mensagem. As missões se instalaram na
Espanha, Inglaterra, Estados Unidos, e Holanda.

Toda noite, exceto nas quartas-feiras quando a Societé Positiviste tinha sua reunião regular,
Comte recebia seus discípulos: políticos, intelectuais e operários, que lhe votavam grande
respeito e veneração. Porém, estava longe do entusiasmo republicano e libertário de sua
juventude. O motor que o impulsiona agora é o de sua Igreja Positiva: amor, ordem e progresso.
O jovem estudante de passeata passa a pregar as virtudes do amor, da submissão e a necessidade
da ordem para o progresso social. Após alguns meses de enfermidade, falece a cinco de
setembro de 1857. Um grupo pequeno de discípulos, amigos e vizinhos seguiu seu esquife ao
cemitério de Pere Lachaise. Seu túmulo transformou-se no centro de um pequeno cemitério
positivista onde estão sepultados, perto do mestre, seus discípulos mais fiéis.

Auguste Comte é o iniciador do positivismo francês, o pai oficial da sociologia e, em certos


aspectos, o expoente mais representativo da orientação positivista do pensamento. Também
inspirou uma renovação do pensamento jurídico, devido à sua concepção de socialização do
direito.

2 - CONTEXTO HISTÓRICO

No século XVIII, as transformações econômicas, políticas e culturais se aceleram, fazendo


surgir problemas inéditos para os homens que experimentavam as mudanças que ocorriam no
ocidente europeu. A dupla revolução, industrial e francesa, constituía os dois lados de um
mesmo processo, qual seja a, a instalação definitiva da sociedade capitalista. A palavra
sociologia apareceria somente um século depois, por volta de 1830, mas são os acontecimentos
desencadeados pela dupla revolução que a precipitam e a tornam possível.

A revolução industrial significou algo mais do que a introdução da máquina a vapor e dos
sucessivos aperfeiçoamentos dos métodos produtivos. Ela representou o triunfo da indústria
capitalista, capitaneada pelo empresário capitalista que foi pouco a pouco concentrando as
máquinas, as terras e as ferramentas sob o seu controle, convertendo grandes massas humanas
em simples trabalhadores despossuídos. Cada avanço com relação à consolidação da sociedade
capitalista representava a desintegração, o solapamento de costumes e instituições até então
existentes e a introdução de novas formas de organizar a vida social. A utilização da máquina na
produção, não apenas destruiu o artesão independente, que possuía um pequeno pedaço de terra,
cultivado nos seu momentos livres. Este foi também submetido a uma severa disciplina, a novas
formas de conduta e de relações de trabalho, completamente diferentes das vividas
anteriormente por ele.

Um dos fatos de maior importância relacionados com a revolução industrial é o aparecimento


do proletariado e o papel histórico que ele desempenharia na sociedade capitalista. Os efeitos
catastróficos que esta revolução acarretava para a classe trabalhadora levaram-na a negar suas
condições de vida. As manifestações de revolta dos trabalhadores atravessaram diversas fases,

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como a destruição de máquinas, atos de sabotagem e explosão de algumas oficinas, roubos e
crimes, evoluindo para a criação de associações livres, formação de sindicatos, etc. A
conseqüência desta crescente organização foi a de que os pobres deixaram de se confrontar com
os ricos; mas uma classe específica, a classe operária com consciência de seus interesses,
começava a organizar-se para enfrentar os proprietários dos instrumentos de trabalho. Nesta
trajetória, iam produzindo seus jornais, sua própria literatura, procedendo a uma crítica da
sociedade capitalista e inclinando-se para o socialismo como alternativa de mudança.

A profundidade das transformações em curso colocava a sociedade num plano de análise, ou


seja, esta passava a se constituir em "problema", em "objeto" que deveria ser investigado. Os
pensadores ingleses que testemunhavam estas transformações eram antes de tudo, homens que
desejavam introduzir determinadas modificações na sociedade. Não desejavam produzir um
mero conhecimento sobre as novas condições de vida geradas pela revolução industrial, mas
procuravam extrair dele orientações para a ação, tanto para manter, como para reformar ou
modificar radicalmente a sociedade de seu tempo.

A burguesia, ao tomar poder em 1789, investiu decididamente contra os fundamentos da


sociedade feudal, procurando construir um Estado que assegurasse sua autonomia, face à Igreja,
e que protegesse e incentivasse a empresa capitalista. Para a destruição do antigo regime, foram
mobilizadas as massas, especialmente os trabalhadores pobres das cidades (que, alguns meses
mais tarde, foram "presenteados", pela nova classe dominante, com a interdição dos seus
sindicatos). O objetivo desta revolução, não era apenas mudar a estrutura do Estado, mas abolir
radicalmente a antiga forma de sociedade, com suas instituições tradicionais, seus costumes e
hábitos arraigados, e ao mesmo tempo promover profundas inovações na economia, na política,
na vida cultural, etc. A revolução desferiu também seus golpes contra a Igreja, confiscando suas
propriedades, suprimindo os votos monásticos e transferindo para o Estado as funções da
educação, tradicionalmente controladas pela Igreja. Investiu contra e destruiu os antigos
privilégios de classe, amparou e incentivou o empresário.

A tarefa a que esses pensadores se propõem é a de racionalizar a nova ordem, encontrando


soluções para o estado de "desorganização" então existente. Mas para restabelecer a "ordem e a
paz", pois é a esta missão que esses pensadores se entregam, para encontrar um estado de
equilíbrio na nova sociedade, seria necessário conhecer as leis que regem os fatos sociais,
instituindo, portanto, uma ciência da sociedade.

A burguesia, uma vez instalada no poder, se assusta com a própria revolução. Uma das facções
revolucionárias, por exemplo, os jacobinos, estava disposta a aprofundá-la, radicalizando-a e
levando-a até o fim, situando-a além do projeto e dos interesses da burguesia. Para contornar a
propagação de novos surtos revolucionários, enquanto estratégia para modificação das
sociedades, seria necessário, de acordo com os interesses da classe emergente, controlar e
neutralizar novos levantes revolucionários. Nesse sentido, era de fundamental importância
proceder a modificações substanciais em sua teoria da sociedade.

Preocupados em reconstruir a sociedade, os contemporâneos de Comte intentavam consagrar-se


à solução da imensa crise que assolava a Europa. A Revolução acabara com o Antigo Regime:
era preciso, pois, ou restaurá-lo ou construir, sobre novas bases, um regime novo, "não se
comprazendo a humanidade em habitar ruínas", na observação de Saint-Simon. Dividiam-se
então as cabeças pensantes da Europa em dois campos: umas voltadas para o passado, na
esperança de fazerem reviver as antigas instituições; e outras dirigidas para o futuro, em busca
de novos sistemas políticos.

Os economistas do século XVIII, embora divergissem quanto a certos aspectos do problema


econômico, concordavam a cerca do princípio básico da existência de leis naturais, reguladoras
do progresso material das sociedades humanas; leis que, além de inelutáveis, seriam sempre as

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melhores que a natureza comporta, devendo-se escrupulosamente evitar qualquer interferência
no sentido de corrigir as imperfeições espontâneas da ordem natural (fisiocracia). É o célebre
princípio do laisser faire, laisser passer, atinente à economia dirigida, sobre a licitude, ou não,
dos governantes intervirem nos acontecimentos econômicos. Perguntava-se: qual a melhor
maneira de encorajar o comércio? Respondia-se: Laisser faire, laisser passer ; laisser fair
aludia à liberdade da indústria, então asfixiada por toda sorte de entraves, e laisser passer
referia-se à liberdade de comércio, mediante abolição das alfândegas.

Segundo a escola liberal, a intervenção dos governos no campo econômico, deveria ser nula,
restringindo-se a sua missão ao ofício de manter a ordem pública. Resultou desta concepção o
conceito de "estado úlcera", que resumia os ensinos dos liberais ortodoxos, para os quais, sendo
os fenômenos econômicos regidos por leis imprescritíveis, tendem estas espontaneamente a
estabelecer-lhes a ordem e o equilíbrio, desde que o Estado, tido como um mal necessário, lhes
não perturbe a marcha autônoma. Chegavam a um abstencionismo absoluto, negando a
legitimidade da interferência do Estado não só no estímulo a produção, mas até em
empreendimentos públicos decisivos como estradas, pontes, canais, portos, esgotos, limpeza
pública.

Aos fisiocratas filiou-se a chamada escola liberal ou individualista. A seu ver a tarefa do
legislador tem de limitar-se a descobrir as leis naturais e evitar tudo quanto possa entravar-lhes
o livre jogo. Segundo Jean B. Say, "Os princípios da Economia Política não são obra dos
homens, decorrem da natureza das coisas. Ninguém os estabelece. São encontrados". Adotava,
assim, a opinião de Quesnay quanto à sabedoria da formação da palavra legislador, que significa
o que traz as leis depois de descobri-las, e não o que as faz.

Conduzia a economia política liberal ou ortodoxa, na observação de Augusto Comte, a abolir


qualquer governo, demonstrando que bem governar consiste em não governar de modo algum,
sendo o governo ideal a anarquia, isto é, a ausência de qualquer governo. Contra a inércia
governamental, decorrente dos ensinos dos economistas clássicos e resumida na máxima
"laisser faire, laisser passer", já em 1826 protestava Comte, nas Considerações Sobre o Poder
Espiritual, voltando ao assunto, em 1838, no "Curso de Filosofia Positiva", onde mostra que o
espírito geral da economia política levava, em sua época, a erigir em dogma a ausência de
qualquer intervenção reguladora, como sendo o meio mais adequado a secundar o surto
espontâneo de sociedade. E, assim, em cada situação grave que sucessivamente se apresentava,
não sabia a economia política responder às exigências da prática senão com uma abstenção
sistemática. Essa pseudociência, após uma imperfeita verificação de casos particulares e
considerando a tendência das sociedades humanas para uma certa ordem, conclui que era inútil
qualquer instituição especialmente destinada a regularizar a coordenação espontânea de
acontecimentos econômicos, em vez de vislumbrar aí apenas a primeira fonte da possibilidade
de se lhes dar uma direção mais consentânea com os interesses sociais.

Para Augusto Comte era a economia política de seu tempo uma das criações mais peculiares da
idade crítica ou metafísica. Visavam essas criações a demolir no ocidente, o sistema católico-
feudal, facilitando a ascensão da burguesia que, desde muito, aspirava substituir-se à nobreza.
Ninguém ignora que a Idade Média transmitiu às monarquias européias minuciosa
regulamentação quer da produção, quer do comércio. Até a Revolução Francesa, as profissões
possuíam regras tradicionais, os ofícios obedeciam a velhos costumes, a movimentação do trigo
e demais mercadorias de um ponto para outro de cada país, assim como a saída de numerário era
meticulosamente fiscalizada pelos poderes públicos. Passou a economia política a pregar em
nome da ciência, a abolição de todas essas instituições dos séculos idos. Suprimiu, na
Revolução Francesa, as corporações de ofício, instaurou a liberdade ilimitada do comércio e
proclamou os benefícios do individualismo. Foi, pois, a sua obra – assinalava Comte – antes de
mais nada, uma obra destrutiva ou crítica, isto é, de desorganização e anarquia no sentido
preciso e rigoroso do termo. Tanto mais cabalmente preencheu a velha economia política o

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papel histórico que lhe atribui o filósofo quanto reduzia como vimos, a quase nada as
atribuições do Estado, convencendo os próprios governantes de sua radical inaptidão para
dirigirem o surto industrial, proclamando serem os governos tanto melhores quanto menos
governam. E, assim, o governo que em toda situação normal é a cabeça da sociedade, o guia e o
agente de ação geral, foi sistematicamente despojado de todo princípio de atividade e privado de
qualquer participação importante no conjunto do organismo social.

A interpretação crítica e negadora da realidade, que constituiu um dos traços marcantes do


pensamento iluminista e alimentou o projeto revolucionário da burguesia, deveria de agora em
diante ser "superada" por uma outra que conduzisse não mais à revolução, mas à "organização",
ao "aperfeiçoamento" da sociedade. Saint-Simon, de uma maneira muito explícita, afirmaria a
este respeito que "a filosofia do último século foi revolucionária; a do século XX deve ser
reorganizadora".

A partir da terceira década do século XIX, intensificam-se na sociedade francesa as crises


econômicas e as lutas de classes. A contestação da ordem capitalista, levada a cabo pela classe
trabalhadora, passa a ser reprimida com violência. Cada vez mais ficava claro para a burguesia e
seus representantes intelectuais que a filosofia iluminista, que passava a ser designada por eles
como "metafísica", "atividade crítica inconseqüente", não seria capaz de interromper aquilo que
denominavam estado de "desorganização", de "anarquia política" e criar uma ordem social
estável.

Respeitando as leis fundamentais que regem a existência do homem, o fundador da sociologia


provou que a solução gradativa do problema social depende de um conjunto de circunstâncias,
entre as quais a mudança da mentalidade, principalmente quanto ao modo de conceber a
propriedade.

O progresso não é mais do que o desenvolvimento da ordem, isto é, toda reforma social, para
frutificar, tem de haurir seus elementos no próprio estado de coisas que pretende mudar.

A crença no poder exclusivo e absoluto da razão humana para conhecer a realidade, traduzindo-
a sob a forma de leis naturais, deu origem ao positivismo. Essas leis seriam a base da
regulamentação da vida do homem, da natureza como um todo e do próprio universo. Comte
contrapunha aos sistemas arbitrários puramente fantasiosos, uma física ou ciência social,
fundada na observação do evolver histórico e dos fatos sociais do presente, e, por isto,
suscetível de explicar o passado e prever o futuro. Para dotar a nova ciência de bases sólidas, ele
empreendeu, preliminarmente, um balanço de todos os conhecimentos científicos acumulados
até então, a fim de depurá-los dos elementos metafísicos e torná-los homogêneos e coerentes,
coordenando-os exclusivamente através do método científico ou positivo.

A preocupação com a reorganização social e a descoberta das leis que regem os fenômenos
correspondentes, levaram Augusto Comte a efetuar um exame completo dos métodos, isto é,
dos instrumentos através dos quais o entendimento humano consegue elaborar os
conhecimentos de que necessita. Sua primeira tarefa foi rever os métodos lógicos e o conteúdo
de todas as ciências do seu tempo, desde a matemática até à biologia. Em seguida uma vez
fundada a sociologia, esforçou-se por tirar dela todos os resultados filosóficos, políticos e
morais.

Suas idéias políticas expostas no Sistema de Política Positiva, obtiveram a adesão de vários
chefes do partido republicano. Notáveis nesse tratado e de grande atualidade, são as
considerações do filósofo sobre a política colonial das nações ocidentais, pregando a urgência
de ser Gibraltar espontaneamente restituído pela Inglaterra à Espanha, e definitivamente
emancipadas a Índia, Argélia, Marrocos e demais colônias européias.

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3 - FUNDAMENTOS DA SOCIOLOGIA POSITIVISTA

A Sociologia, tal como foi por Comte constituída, é uma ciência abstrata. Ele expõe o objeto, os
métodos, as divisões fundamentais, as leis aplicadas a todas as sociedades possíveis, fazendo
abstração de todos os modificadores decorrentes do meio, do clima, da raça e das condições
políticas. Desde Comte, os métodos indutivos apoderaram-se definitivamente do estudo
sistemático das sociedades humanas. A pesquisa das leis faz-se pela observação direta dos fatos
sociais: elas não se deduzem mais de dados apriorísticos hauridos na metafísica, ou mesmo em
ciências mais simples (a Biologia ou a Psicologia).

Todos os primeiros estudiosos da realidade social tentaram derivar as ciências sociais das
ciências físicas. O próprio Comte deu inicialmente o nome de "física social" às suas análises da
sociedade, antes de criar o termo Sociologia. Esta corrente filosófica social positivista se
baseava no método de investigação das ciências naturais, procurando identificar na sociedade as
mesmas relações e princípios da vida natural, concebendo-a como um organismo constituído de
partes integradas e coesas que funcionavam harmonicamente. Por isso o positivismo foi
chamado também de organicismo. Daí advém os conceitos da Física social, ou Sociologia,
como os de hierarquia, consenso, órgão, função, estática, dinâmica, ou seja a idéia de
fenômenos interdependentes dentro de um sistema funcional, organicamente composto.

Esta identificação da sociologia com a natureza elimina o papel da prática social como elemento
gerador de mudanças na sociedade que passa a ser concebida como um modelo de ordem
natural, imutável, e à qual o homem deve resignar-se ("o espírito positivo tende a consolidar a
ordem pelo desenvolvimento racional de uma sábia resignação diante dos males políticos
incuráveis"). Esta linha de pensamento facilita a aceitação das normas (leis naturais) que
consolidam a ordem vigente, justificadoras da autoridade reinante e facilitadoras da proteção
dos interesses – riqueza e poder. Desta forma, e para tal, utiliza como instrumento ordenador a
coesão social, a autoridade, a hierarquia e os valores morais.

Os fenômenos econômicos são apontados por Comte como expressão dessas leis sociais
naturais invariáveis, referindo-se, principalmente, ao caso da concentração de capital.

Enquanto resposta intelectual à "crise social" de seu tempo, os primeiros sociólogos revalorizam
determinadas instituições que segundo eles desempenham papéis na integração e na coesão da
vida social. A recém criada sociologia assumia como tarefa intelectual, repensar o problema da
ordem social, enfatizando a importância de instituições como a autoridade, a família, a
hierarquia social, destacando a sua importância teórica para o estudo da sociedade. Procedendo
dessa forma, ou seja, tentando instaurar um estado de equilíbrio numa sociedade em constantes
conflitos de classe, esta sociologia inicial revestiu-se de um indisfarçável conteúdo
estabilizador, ligando-se aos movimentos de reforma conservadora da sociedade.

Na concepção de Comte, a sociologia deveria orientar-se no sentido de conhecer e estabelecer


aquilo que ele denominava leis imutáveis da vida social, abstendo-se de qualquer consideração
crítica, eliminando também qualquer discussão sobre a realidade existente, deixando de abordar,
por exemplo, a questão da igualdade, da justiça, da liberdade.

A oficialização da sociologia foi portanto em larga medida uma criação do positivismo, e uma
vez assim constituída procura realizar a legitimação intelectual do novo regime. É entre os
autores positivistas, de modo destacado Saint-Simon, Auguste Comte e Émile Durkheim, que as
idéias dos conservadores exerceriam uma grande influência. Alguns deles chegavam a afirmar
que a "escola retrógrada", por eles considerada imortal, seria sempre merecedora da admiração e
da gratidão dos positivistas. São estes autores que, de modo destacado, iniciaram o trabalho de
rever uma série de idéias dos conservadores, procurando dar a elas uma nova roupagem, com o
propósito de defender os interesses dominantes da sociedade capitalista.

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A união dos industriais com os homens de ciência, formando a elite da sociedade e conduzindo
seus rumos era a força capaz de trazer a ordem e harmonia à emergente sociedade industrial.

Vários historiadores do pensamento social têm observado que Comte, em boa medida, deve suas
principais idéias a Saint-Simon. Ao contrário desse pensador, que possuía uma faceta
progressista, posteriormente incorporada ao pensamento socialista, Comte é um pensador
inteiramente conservador, um defensor sem ambigüidades da nova sociedade.

A motivação da obra de Comte repousa no estado de "anarquia" e de "desordem" de sua época


histórica. Segundo ele, as sociedades européias se encontravam em profundo estado de caos
social. Em sua visão, as idéias religiosas haviam há muito perdido sua força na conduta dos
homens e não seria a partir delas que se daria a reorganização da nova sociedade. Muito menos
das idéias dos iluministas. Para ele, a propagação das idéias iluministas em plena sociedade
industrial somente poderia levar à desunião entre os homens. Para haver coesão e equilíbrio na
sociedade seria necessário restabelecer a ordem nas idéias e nos conhecimentos, criando um
conjunto de crenças comuns a todos os homens.

Convicto de que a reorganização da sociedade exigiria a elaboração de uma nova maneira de


conhecer a realidade, Comte procurou estabelecer os princípios que deveriam nortear os
conhecimentos humanos. Seu ponto de partida era a ciência e o avanço que ela vinha obtendo
em todos os campos de investigação. O espírito positivo, em oposição à filosofia iluminista, que
em sua visão apenas criticava, não possuía caráter destrutivo, mas estava exatamente
preocupado em organizar a realidade.

Comte considerava como um dos pontos altos de sua sociologia, a reconciliação entre a "ordem"
e o "progresso", pregando a necessidade mútua destes dois elementos para a nova sociedade.
Para ele, o equívoco dos conservadores ao desejarem a restauração do velho regime feudal era
postular a ordem em detrimento do progresso. Inversamente, argumentava, os revolucionários
preocupavam-se tão somente com o progresso, menosprezando a necessidade de ordem na
sociedade. A sociologia positiva considerava que a ordem existente era o ponto de partida para a
construção da nova sociedade. Admitia Comte que algumas reformas poderiam ser introduzidas
na sociedade (mudanças que seriam comandadas pelos cientistas e industriais) de tal modo que
o progresso constituiria uma seqüência suave e gradual da ordem.

Com o objetivo de fortalecer a ordem social, combate-se qualquer doutrina revolucionária,


concentrando-se todas as forças numa renovação moral da sociedade, através de um refazer dos
costumes e de uma reforma intelectual do homem. A sociedade se modifica através da visão de
progresso como resultante da ordem, sem destruição da ordenação vigente, num processo
evolutivo.

A visão de ordem origina-se na noção de estática, onde só se pode compreender a existência


naquilo que ela oferece de fixo, de estrutural ("família, religião, propriedade, linguagem, direito,
etc., seriam responsáveis pelo movimento estático da sociedade"). A Sociologia dinâmica se
preocupa com o entendimento do movimento, do desenvolvimento, da atividade da vida
coletiva, correspondendo á noção de progresso. É necessário melhorar as condições de vida das
classes menos favorecidas, sem incomodar a ordem econômico-política da sociedade. Desta
forma, o desenvolvimento histórico ocorre pela evolução organizada, regida por leis naturais, ou
seja, progresso histórico é ordem.

A lei dos três estados de Comte demonstra essa visão do desenvolvimento histórico da
sociedade. Para ele, a humanidade evolui da mesma forma que o psiquismo dos indivíduos. No
estado teológico, os fenômenos são frutos do sobrenatural, imperando a monarquia, os teólogos
e militares. No estado metafísico, fenômenos são explicados em função das essências, idéias ou
forças abstratas, imperando os juristas e filósofos. No estado positivo (ou científico), reconhece-

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se a impossibilidade do conhecimento absoluto, e passa-se a buscar descobrir as relações
invariáveis de sucessão e semelhança, com o uso bem combinado do raciocínio e da observação.
O primeiro é o ponto de partida necessário da inteligência humana; o último é o estado fixo e
definitivo; o segundo serve apenas como etapa de transição.

O estado positivo seria a base da sociedade moderna, sendo o ponto final da escala de
conhecimento e grau superior de formação definitiva da ciência, correspondendo à industria, ou
seja, à exploração da natureza pelo homem. Nele, o poder espiritual passa para as mãos dos
sábios e cientistas, e o poder material para o controle dos industriais. Estabelece-se o tecnicismo
ou tecnocracia.

A tese darwinista de evolução dos seres (que afirmava que as diversas espécies de seres vivos
se transformam continuamente com a finalidade de se aperfeiçoar e garantir a sobrevivência,
resultando na tendência dos organismos se adaptarem cada vez melhor ao ambiente, criando
formas mais complexas e avançadas de existência e sobrevivência dos seres mais aptos e
evoluídos, possibilitada pela competição natural, a sobrevivência dos seres mais aptos e
evoluídos) transpostas para a análise da sociedade, resultaram no Darwinismo Social. Surge aí
o princípio de que as sociedades se modificam e se desenvolvem num mesmo sentido e que tais
transformações representariam sempre a passagem de um estágio inferior para outro superior,
em que o organismo social se mostraria mais evoluído, mais adaptado e mais complexo,
garantindo a sobrevivência dos organismos – sociedades e indivíduos – mais fortes e mais
evoluídos. Desta forma, justificava-se, no século XIX, o domínio colonialista de nações
européias sobre povos da América, África, Oceania e Ásia.

Os cientistas sociais positivistas, inspirados nas concepções organicistas e evolucionistas,


entendiam que as sociedades tradicionais encontradas nos continentes supracitados não eram
senão "fósseis vivos", exemplares de estágios anteriores, "primitivos", do passado da
humanidade. Assim, as sociedades mais simples e de tecnologia menos avançada deveriam
evoluir em direção a níveis de maior complexidade e progresso na escala da evolução social, até
atingir o "topo": a sociedade industrial européia.

Essa explicação "científica", além de legitimar intelectualmente o estabelecimento da república,


justificava a intervenção européia nos continentes já citados, mas não explicava o porque dos
frutos do progresso não serem igualmente distribuídos na Europa, nem a não participação
igualitária de todos nas conquistas da civilização.

4 - O POSITIVISMO NO BRASIL

Hoje, a Filosofia Positiva de Comte está superada no Ocidente, especialmente quanto à


pretensão de reduzir a Filosofia a uma reflexão sobre a Ciência, na medida em que o conceito de
ciência que lhe servia de suporte também foi reformulado. Mas, se a epistemologia comteana
está devidamente superada, existe ainda uma herança positivista disseminada em diversos
setores da atividade humana ocidental, em geral, e brasileira em particular.

Foi durante o Segundo Império (por volta de 1850) que as idéias positivistas chegaram ao
Brasil, trazidas por brasileiros que foram estudar na França, e aqui foram muito bem aceitas e
divulgadas.

No período monárquico havia sido gerada a insatisfação entre os políticos e intelectuais. A


política de D. Pedro II fazia com que, mesmo sendo o Brasil uma monarquia constitucional
representativa e hereditária, isto é, existindo uma Constituição e um regime parlamentar, o
Imperador fosse sempre o juiz de partidos e de estadistas, podendo fazer e desfazer ministérios e
ministros. Opor-se ao poder da coroa condenava o opositor ao ostracismo político. O Imperador
neutralizava a oposição, pois a política realizava-se apenas entre dois partidos, o Conservador e

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o Liberal, que se revezavam no poder. Os membros do Parlamento Imperial representavam a
classe ruralista e eram eleitos por ela (a única aristocracia que o Brasil conheceu). O veículo de
ascensão social era o exército e os antigos amantes da farda eram substituídos por jovens que
amavam as letras e as matemáticas em detrimento do antigo sentimento da velha classe militar.
O clero não exercia influência nas classes dirigentes, pois era submetido ao Estado pelo
regalismo, estando desacreditado junto às classes menos favorecidas e ignorado pelos
indivíduos voltados para o pensamento racionalista; era inativo e chegando a reconhecer que o
espírito do catolicismo estava a definhar no país. A Constituição estabelecia as relações entre a
Igreja e o Estado, prendendo a primeira aos interesses deste último.

A questão política crucial era a da escravatura, combatida pelos positivistas, mas defendida
pelos conservadores que viam no trabalho escravo um dos suportes da nossa economia
essencialmente agrícola. O Imperador adotava medidas paliativas, preparando uma "abolição
progressiva", mediante sanção de leis regulamentadoras (inicialmente quanto ao tráfico escravo,
depois quanto aos escravos de idade avançada e a famosa Lei do Ventre Livre, o que,
fatalmente, a longo prazo, levaria à não existência de mais escravos no país).

Além do problema da escravidão, havia a existência dos bacharéis (filhos, representantes ou


herdeiros dos senhores de engenho ou das fazendas de café). Cada bacharel era o "doutor" de
um setor da realidade que era visto como um corpo autônomo. Esta "cultura intelectual" era
mais literária. Somente os militares, os engenheiros e médicos, dedicavam-se a estudos
científicos.

Neste contexto, o país ansiava por idéias que lhe desse uma nova concepção de valores,
orientando seus atos. O Positivismo preenche esta aspiração, trazendo respostas válidas para a
época cientificista e materialista do século XIX.

Desde 1850 as doutrinas comteanas começaram a surgir na Escola Militar do Rio de Janeiro,
firmando-se, posteriormente, no meio estudantil. Mas, a difusão do Positivismo, em caráter
especulativo e enquadrado na nossa realidade social, somente se efetivou com a obra de Luís
Pereira Barreto, "As Três Filosofias", cujo primeiro volume foi publicado em 1874. Em 1876,
funda-se a Sociedade Positivista Brasileira, que se transformou na Igreja Positivista do Brasil.

Os positivistas apresentam-se em dois grupos: os ortodoxos (onde se incluem oficiais do


Exército e da Marinha e professores) e os dissidentes (incluídos os políticos que buscaram no
comtismo os elementos fundamentadores da República).

No republicanismo brasileiro, formado no seio do regime monárquico, existiam duas correntes:


a liberal-democrática (fundamentada na obra de John Locke - democrata) e a autoritária
(basicamente inspirada no positivismo de Auguste Comte).

No início da República, a maior preocupação era com a crítica aos remanescentes da monarquia,
surgindo a necessidade de se fazer uma obra afirmativa da prática republicana. A doutrinação
que Comte dirigia ao proletariado europeu, no Brasil, voltou-se para a burguesia, uma vez que o
nosso proletariado era inculto, constituído principalmente pelo escravo e pelo imigrante.

Em conseqüência das atividades doutrinárias positivistas, surgiu, entre alguns brasileiros, um


ideal de república similar à ditadura sociocrática positivista (filosofia política que considera que
a sociedade caminha necessariamente para uma estruturação racional, ou científica). Como em
outros aspectos da doutrina positivista, aqui também o mecanicismo atribuído à natureza é
transposto para a História.

Inspirados na Teoria dos Três Estados de Augusto Comte, os republicanistas defendiam uma
república provisória como meio para alcançarmos a ordem e o progresso; para atingirmos esse

9
objetivo tornava-se necessária a instauração de um regime ditatorial que, ao combater a
monarquia, defendia o republicanismo. Com uma campanha republicana acalorada, a polêmica
se travava não só entre anti-monarquistas e conservadores, mas também dentro do próprio
Partido Republicano. Tal polêmica era reforçada pelas atividades da Igreja Positivista que
publicava opúsculos e circulares anuais.

Entretanto, o crédito da Proclamação da República deve ser dirigido não aos ortodoxos,
seguidores da Igreja Positivista, mas aos chamados dissidentes, os militares políticos que
realizaram uma tarefa doutrinária. O "apogeu do positivismo" no Brasil deu-se no período
imediato ao 15 de novembro.

Sob a influência do positivismo, podemos destacar as seguintes medidas republicanas: a


bandeira com o dístico ORDEM E PROGRESSO; a separação da Igreja e do Estado; o decreto
dos feriados e o casamento civil. Com a formação da Assembléia Constituinte, reunida um ano
após a proclamação da República, os positivistas conseguiram alcançar: liberdade religiosa e
profissional; proibição do anonimato na imprensa; abolição de medidas anticlericais e, mais
tarde, com a reforma educacional de Benjamin Constant, alcançaram um elemento precioso para
a divulgação e expansão das idéias positivistas.

Rapidamente esfriou o entusiasmo com as idéias positivistas. A propaganda em favor da


República Ditatorial não inspirava simpatia aos políticos liberais, de tradição monarquista, que
se haviam apoderado da jovem república e que constituíam-se em oposição aos políticos
positivistas.

Desde a monarquia, o sistema político brasileiro baseava-se na idéia de representação elaborada


por John Locke. Porém, a filosofia política positivista considera o direito de voto um dogma
metafísico. O comtismo serve então de fundamentação doutrinária a uma facção política
conservadora e antidemocrática que, do Rio Grande do Sul, se irradia para todo o país. Os
pontos básicos positivistas adotados por Júlio de Castilhos, evidenciam-se na Constituição
Estadual do Rio Grande do Sul de 1891, elaborada quase que exclusivamente por ele, inspirado
no Sistema de Política Positiva de Comte e que sustenta: o combate à democracia e ao voto
popular como medida legítima para a implantação de um mandato governamental; a
centralização do poder nas mãos do Chefe do Executivo, inclusive as tarefas legislativas; a
continuidade administrativa garantida pela reeleição do governante; incorporação do
proletariado e das forças econômicas ao Estado.

Desta forma, a idéia de representação é substituída pelas idéias de tutela e hegemonia, numa
autocracia. A concentração da força política nas mãos do governante, permitiria a existência de
um regime capaz de promover o bem estar social, garantido pela responsabilidade moral dos
depositários do poder. A sociedade passa a ser racionalmente estruturada, de maneira
"científica", o que permitirá a instalação da ordem moral que resultará, necessariamente, em
progresso.

A detenção do poder legislativo pelo executivo perde a sua temporalidade e tem sua
continuidade assegurada. O ditador, segundo este pensamento, nada tem de déspota. Após Júlio
de Castilhos, Getúlio Vargas procura, no plano nacional, implantar tais idéias (Castilhismo).

A evolução da elite política brasileira, abertamente fascista no Estado Novo, ocorreu ao longo
de várias décadas, fruto do castilhismo, no meio político, e do positivismo, no meio militar.

5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• COSTA, Cristina. Sociologia: Introdução à ciência da sociedade. São Paulo: Moderna,


1997. p.46-47.

10
• HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. 367p.
Cap. I: A crise da crítica do conhecimento: a idéia de uma teoria do conhecimento como
teoria da sociedade. p.60-78. Cap. II: Positivismo, Pragmatismo e Historicismo. p.89-
101.
• MARCUSE. Razão e Revolução. Rio de Janeiro: Saga, 1969. p.310-312.
• MARTINS, Carlos Benedito. O que é sociologia. 24ed. São Paulo: Brasiliense, 1989.
Pp.11-46.
• MORAIS FILHO. Auguste Comte: sociologia. São Paulo: Ática, 1983.
• QUIROGA, Consuelo. Invasão Positivista no Marxismo: manifestações no ensino da
Metodologia no Serviço Social. São Paulo: Cortez, 1991. p.49-52.
• SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. Porto: Afrontamento,
1988. 58p. p.17-23.

POSITIVISMO: UMA PRIMEIRA FORMA DE PENSAMENTO SOCIAL

Auguste Comte (1798-1857) - Vida e obras

Estudante da Politécnica aos 16 anos, Comte é nomeado em 1832 explicador de análise e de


mecânica nessa mesma escola e, depois, em 1837, examinador de vestibular. Ver-se-á retirado
desta última função em 1844 e de seu posto de explicador em 1851. Apesar de seus reiterados
pedidos, não obterá o desejado cargo de professor da Politécnica, nem mesmo a cátedra de
história geral das ciências positivas no Collège de France, que quisera criar em benefício
próprio. A obra de Comte guarda estreitas relações com os acontecimentos de sua vida. Dois
encontros capitais presidem as duas grandes etapas desta obra. Em 1817, ele conhece H. de
Saint-Simon: O Organizador, o Sistema Industrial, e concebe, a partir daí, a criação de uma
ciência social e de uma política científica. Já de posse, desde 1826, das grandes linhas de seu
sistema, Comte abre em sua casa, rua do Faubourg Montmartre, um Curso de filosofia positiva -
rapidamente interrompido por uma depressão nervosa - (que lhe vale ser internado durante
algum tempo no serviço de Esquirol). Retoma o ensino em 1829. A publicação do Curso inicia-
se em 1830 e se distribui em 6 volumes até 1842. Desde 1831 Comte abrirá, numa sala da
prefeitura do 3.° distrito, um curso público e gratuito de astronomia elementar destinado aos
"operários de Paris", curso este que ele levaria avante por sete anos consecutivos. Em 1844
publica o prefácio do curso sob o título: Discurso sobre o espírito positivo.

É em outubro de 1844 que se situa o segundo encontro capital que vai marcar uma reviravolta
na filosofia de Augusto Comte. Trata-se da irmã de um de seus alunos, Clotilde de Vaux,
esposa abandonada de um cobrador de impostos (que fugira para a Bélgica após algumas
irregularidades financeiras). Na primavera de 1845, o filósofo de 47 anos declara a esta mulher
de 30 seu amor fervoroso. "Eu a considero como minha única e verdadeira esposa não apenas
futura, mas atual e eterna". Clotilde oferece-lhe sua amizade. É o "ano sem par" que termina
com a morte de Clotilde a 6 de abril de 1846. Comte sente então sua razão vacilar, mas entrega-
se corajosamente ao trabalho. Entre 1851 e 1854 aparecem os enormes volumes do Sistema de
política positiva ou Tratado de sociologia que institui a religião da humanidade. O último
volume sobre o Futuro humano prevê uma reformulação total da obra sob o título de Síntese
Subjetiva. Desde 1847 Comte proclamou-se grande sacerdote da Religião da Humanidade.
Institui o "Calendário positivista" (cujos santos são os grandes pensadores da história), forja
divisas "Ordem e Progresso", "Viver para o próximo"; "O amor por princípio, a ordem por
base, o progresso por fim", funda numerosas igrejas positivistas (ainda existem algumas como
exemplo no Brasil). Ele morre em 1857 após ter anunciado que "antes do ano de 1860" pregaria
"o positivismo em Notre-Dame como a única religião real e completa".

Comte partiu de uma crítica científica da teologia para terminar como profeta. Compreende-se
que alguns tenham contestado a unidade de sua doutrina, notadamente seu discípulo Littré, que
em 1851 abandona a sociedade positivista. Littré - autor do célebre Dicionário, divulgador do

11
positivismo nos artigos do Nacional - aceita o que ele chama a primeira filosofia de Augusto
Comte e vê na segunda uma espécie de delírio político-religioso, inspirado pelo amor platônico
do filósofo por Clotilde.

Todavia, mesmo se o encontro com Clotilde deu à obra do filósofo um novo tom, é certo que
Comte, já antes do Curso de filosofia positiva (e principalmente em seu "opúsculo fundamental"
de 1822), sempre pensou que a filosofia positivista deveria terminar finalmente em aplicações
políticas e na fundação de uma nova religião. Littré podia sem dúvida, em nome de suas
próprias concepções, "separar Comte dele mesmo". Mas o historiador, que não deve considerar
a obra com um julgamento pessoal, pode considerar-se autorizado a afirmar a unidade essencial
e profunda da doutrina de Comte.

Introdução: cientificismo e organicismo

A primeira corrente teórica sistematizada de pensamento sociológico foi o positivismo,


a primeira a definir precisamente o objeto, a estabelecer conceitos e uma metodologia de
investigação. Além disso, o positivismo, ao definir a especificidade do estudo científico da
sociedade, conseguiu distinguir-se de outras ciências estabelecendo um espaço próprio à ciência
da sociedade. Seu primeiro e principal sistematizador foi o pensador francês Auguste Comte
(1798-1857).
Comte defendia o ponto de vista de somente serem válidas as análises das sociedades
quando feitas com verdadeiro espírito científico, com objetividade e ausência de metas
preconcebidas. Os estudos das relações humanas, assim, deveriam constituir uma nova ciência,
a Sociologia. Esta não deveria limitar-se apenas à análise, mas propor normas de
comportamento, seguindo a orientação na famosa fórmula positivista: “saber para prever, a fim
de prover”.
O positivismo derivou do “cientificismo”, isto é, da crença no poder exclusivo e
absoluto da razão humana em conhecer a realidade e traduzi-la sob a forma de leis naturais.
Essas leis seriam a base da regulamentação da vida do homem, da natureza como um todo e do
próprio universo. Seu conhecimento pretendia substituir as explicações teológicas, filosóficas e
de senso comum por meio das quais – até então – o homem explicava a realidade.
A rápida evolução dos conhecimentos das ciências naturais – física, química, biologia –
e o visível sucesso de suas descobertas no incremento da produção material e no controle das
forças da natureza atraíram os primeiros cientistas sociais para o seu método de investigação.
Essa tentativa de derivar as ciências sociais das ciências físicas é patente nas obras dos
primeiros estudiosos da realidade social. O próprio Comte deu inicialmente o nome de “física
social” às suas análises da sociedade, antes de criar o termo sociologia.
Essa filosofia social positivista se inspirava no método de investigação das ciências da
natureza, assim como procurava identificar na vida social as mesmas relações e princípios com
os quais os cientistas explicavam a vida natural. A própria sociedade foi concebida como um
organismo constituído de partes integradas e coesas que funcionavam harmonicamente, segundo
um modelo físico ou mecânico. Por isso o positivismo foi chamado também de organicismo.

O darwinismo social

É importante situar o desenvolvimento do pensamento positivista no contexto histórico


do século XIX.
A expansão da Revolução Industrial pela Europa, obtida pelas revoluções burguesas que
atingiram todos os países europeus até 1870, trouxe consigo a destruição da velha ordem feudal
e a consolidação da nova sociedade – a capitalista, estruturada sobre a indústria. Já no final do
século, a livre concorrência, que era a regra geral de funcionamento da sociedade capitalista
européia, passa por profundas transformações com a crescente substituição da concorrência
entre inúmeros produtores de cada ramo industrial por uma concorrência limitada a um pequeno
número de produtores de cada ramo. Surgia a época dos monopólios e dos oligopólios, que,

12
associados ao capital dos grandes brancos, dão origem ao capital financeiro. Crescer para fora
dos limites da Europa era, portanto, a única saída para garantir a continuidade dessas indústrias.
Da mesma forma, o capital financeiro necessitava de novos mercados para poder
crescer, pois era perigoso continuar investindo na indústria européia sem causar novas e mais
profundas crises de superprodução. Desencadeava-se, assim, a corrida para a conquista de
impérios além-mar; os alvos eram a África e a Ásia. Nesses continentes podia-se obter matéria-
prima bruta a baixíssimo custo, bem como mão-de-obra barata; eram também pequenos
mercados consumidores, bem como locais ideais para investimentos em obras de infra-estrutura.
Porém, a exploração eficaz dessas novas colônias encontrava resistência nas estruturas sociais e
produtivas vigentes nesses continentes que, de forma alguma, atendiam às necessidades do
capitalismo europeu.
A Europa deparou com civilizações organizadas sob princípios tais como o politeísmo,
a poligamia, formas de poder tradicionais, castas sociais sem qualquer tipo de mobilidade,
economia agrária de subsistência, em sua grande maioria, ou voltada pra um pequeno comércio
local e artesanato doméstico. Assim, o europeu teve primeiro de organizar, sob novos moldes,
as nações que conquistava, estruturando-as segundo os princípios que regiam o capitalismo. De
outra forma seria impossível racionalizar a exploração da matéria-prima e da mão-de-obra, de
modo a permitir o consumo de produtos industrializados europeus e a aplicação rentável dos
capitais excedentes na Europa, nesses territórios.
Transformar esse modo conquistado em colônias que se submetessem aos valores
capitalistas requeria uma empresa de grande envergadura, pois dessa transformação dependiam
a expansão e a sobrevivência do capitalismo industrial. Assim a conquista, a dominação e a
transformação da África e da Ásia pela Europa precisavam apresentar uma justificativa que
ultrapassasse os interesses econômicos imediatos. Isso explica o fato de a conquista européia
estar revestida de um manto humanitário que ocultava a violência da ação colonizadora. Assim,
a conquista e a dominação foram transformadas em “missão civilizadora”. Países como
Inglaterra, França, Holanda, Alemanha, Itália se apoderavam de regiões do mundo cujo modo
de vida era totalmente diferente do capitalismo europeu. A “civilização” era oferecida, mesmo
contra a vontade dos dominados, como forma de “elevar” essas nações do seu estado primitivo a
um nível mais desenvolvido.
A atuação dos europeus sobre os demais continentes foi intensa, no sentido de
transformar suas formas tradicionais de vida e neles introduzir os valores do colonizador. Como
foi dito, essa nova forma de colonialismo se assentava na justificativa de que a Europa tinha,
diante dessas sociedades, a obrigação moral de civilizá-las, de retirá-las do atraso em que
viviam. Nesse sentido, entendia-se que o ápice da humanidade – o mais alto grau de civilização
a que o homem poderia chegar – seria a sociedade industrial européia do século XIX.
Em consonância com essa forma de pensar desenvolveram-se as idéias do cientista
inglês Charles Darwin a respeito da evolução biológica das espécies animais. Para Darwin, as
diversas espécies de seres vivos se transformam continuamente com a finalidade de se
aperfeiçoar e garantir a sobrevivência. Em conseqüência, os organismos tendem a se adaptar
cada vez melhor ao ambiente, criando formas mais complexas e avançadas de existência, que
possibilitam, pela competição natural, a sobrevivência dos seres mais aptos e evoluídos.
Tais idéias, transpostas para a análise da sociedade, resultaram no darwinismo social,
isto é, o princípio de que as sociedades se modificam e se desenvolvem num mesmo sentido e
que tais transformações representariam sempre a passagem de um estágio inferior para outro
superior, em que o organismo social se mostraria mais evoluído, mais adaptado e mais
complexo. Esse tipo de mudança garantiria a sobrevivência dos organismos – sociedades e
indivíduos – mais fortes e mais evoluídos.
Os principais cientistas sociais positivistas, combinando as concepções organicistas e
evolucionistas inspiradas na perspectiva de Darwin, entendiam que as sociedades tradicionais
encontradas na África e na Ásia, na América e na Oceania não eram senão “fósseis vivos”,
exemplares de estágios anteriores, “primitivos”, do passado da humanidade. Assim, as
sociedades mais simples e de tecnologia menos avançada deveriam evoluir em direção a níveis
de maior complexidade e progresso na escala da evolução social, até atingir o “topo”: a
sociedade industrial européia. Porém essa explicação aparentemente “científica” para justificar a

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intervenção européia nesses continentes era, por sua vez, incapaz de explicar o que ocorria na
própria Europa. Lá, os frutos do progresso não eram igualmente distribuídos, nem todos
participavam igualmente das conquistas da civilização.

Uma visão crítica do darwinismo social – ontem e hoje

Essa transposição de conceitos físicos e biológicos para o estudo das sociedades e das
relações entre essas trouxe, ao darwinismo social, desvios importantes. O fundamento do
conceito de espécie em Darwin dificilmente pode ser transposto para o estudo das diferentes
sociedades e etnias.
Se o homem constitui sociologicamente uma espécie, o mesmo não se pode dizer das
diferentes culturas que ele desenvolveu. Os princípios da seleção natural são aplicáveis às
espécies cujo comportamento é expressão das leis imperativas da natureza.
Hoje, sente-se que a complexidade da cultura humana tem concorrido para limitar a
ação da lei de seleção natural. A adaptabilidade do homem e a sua dependência cada vez menor
em relação ao meio têm transformado o ser humano numa espécie à qual a seleção natural se
aplica de maneira especial e relativa.
Essa transposição serviu, entretanto, como justificativa de uma ação política e
econômica que nem sequer avaliava efetivamente aquilo que representaria o “mais forte” ou
mais evoluído.
Ainda hoje se tenta essa transposição para justificar determinadas realidades sociais. A
regra darwinista da competição e da sobrevivência do mais forte é aplicada às leis de mercado,
principalmente pela doutrina do neoliberalismo.
Pressupõe-se que a competitividade seja o princípio natural – e portanto universal e
exterior ao homem – que assegura a sobrevivência do melhor, do mais forte e do mais adaptado.
É preciso lembrar que o mercado, como outros elementos da cultura humana, obedece a leis de
organização social essencialmente humanas – e portanto, resultantes do desenvolvimento das
relações entre os homens e entre as sociedades.

Duas formas de avaliar as mudanças sociais

O darwinismo social, além de justificar o colonialismo da Europa no resto do mundo,


refletia o grande otimismo com que o progresso material da industrialização era recebido pelo
europeu.
O desenvolvimento industrial gerava a todo momento novos conflitos sociais. Os
empobrecidos e explorados – camponeses e operários – organizavam-se exigindo mudanças
políticas e econômicas. Os primeiros pensadores sociais positivistas responderam com as idéias
de ordem e progresso.
Haveria, então, dois tipos característicos de movimento na sociedade. Um levaria à
evolução transformando as sociedades, segundo a lei universal, da mais simples à mais
complexa, da menos avançada à mais evoluída. Outro procuraria ajustar todos os indivíduos às
condições estabelecidas, garantindo o melhor funcionamento da sociedade, o bem comum e os
anseios da maioria da população. Esses dois movimentos revelariam ser a ordem o princípio
que rege as transformações sociais, princípio necessário para a evolução social ou o progresso.
Essa ordem implicaria o ajustamento e a integração dos componentes da sociedade a um
objetivo comum.
Os movimentos reivindicatórios, os conflitos, as revoltas deveriam ser contidos sempre
que pusessem em risco a ordem estabelecida ou o funcionamento da sociedade, ou ainda quando
inibissem o progresso.
Auguste Comte identificou na sociedade esses dois movimentos vitais: chamou de
dinâmico o que representava a passagem para formas mais complexas de existência, como a
industrialização; e de estático o responsável pela preservação dos elementos permanentes de
toda organização social. As instituições que mantém a coesão e garantem o funcionamento da
sociedade, por exemplo, família, religião, propriedade, linguagem, direito etc seriam
responsáveis pelo movimento estático da sociedade. Comte relacionava os dois movimentos

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vitais de modo a privilegiar o estático sobre o dinâmico, a conservação sobre a mudança. Isso
significava que, para ele, o progresso deveria aperfeiçoar os elementos da ordem e não destruí-
los.
Assim se justificava a intervenção na sociedade sempre que fosse necessário assegurar a
ordem ou promover o progresso. A existência da sociedade burguesa industrial era defendida
tanto em face dos movimentos reivindicativos que aconteciam em seu próprio interior quanto
em face da resistência das sociedades agrárias e pré-mercantis em aceitar o modelo industrial e
urbano.
(COSTA, Cristina. Introdução à ciência da sociedade. São Paulo: Moderna, 2000)

Ordem e Progresso

As palavras que ficam no centro da bandeira do Brasil, são conhecidas de todos. Mas
nem sempre se sabe de onde elas vêm. “Ordem e progresso” é o lema do positivismo, escola
sociológica fundada por Auguste Comte, na França. O positivismo teve seus adeptos entre os
republicanos brasileiros, sobretudo militares, que conseguiram deixar seu lema bordado na
bandeira verde, amarela, azul e branca. Desde então, algumas ideias positivistas tornaram-se
dominantes no Brasil, presentes não apenas nos cérebros e nas ações dos donos do poder, mas
também aceitas e praticadas inconscientemente pela maioria da população, a ponto de
integrarem o senso comum – entendido como idéias gerais incorporadas por quase todos, de
modo que quem delas diverge aparece como exceção, destoa do conjunto.

O modelo biológico de sociedade

Na visão positivista, a sociedade contemporânea é analisada como um todo orgânico,


regulado por leis naturais. A sociedade seria um organismo composto por partes diferentes, mas
mutuamente dependentes, da mesma forma que o organismo de um ser vivo é composto por
vários órgãos interdependentes.
O modelo desse tipo de pensamento está na biologia. Por exemplo, o corpo de um
animal, enquanto um todo, só sobrevive a partir do bom funcionamento de cada um dos seus
órgãos (coração, fígado, cérebro etc). sua existência saudável dependerá de leis naturais, que
existem objetivamente, independentemente de quaisquer vontades individuais, consagrando
uma harmonia biológica natural. Essa harmonia só se quebra por exceção, em caso de doença. A
integração, a interdependência entre os diversos órgãos do animal é a regra,que prevalece
enquanto ele tem saúde. Se não houver integração entre os órgãos, é sinal de que o animal está
doente, podendo até morrer.
Por analogia, aconteceria algo parecido com o organismo social, isto é, com a
sociedade. Ela também seria regida por leis naturais, invariáveis, independentes da ação e da
vontade dos indivíduos. Uma harmonia natural reinaria no organismo social: cada um dos
órgãos (segmentos, partes da sociedade) teria uma função específica, diferente das demais, mas
funcionando integradamente para o bom desenvolvimento da totalidade do corpo social. Da
mesma forma que cérebro, rins e pulmões têm funções específicas e distintas, mas agem
integrados para o bom desempenho do organismo animal. A regra seria a integração entre as
partes que compõem o organismo social (por isso a sociologia positivista também é chamada de
“sociologia da integração”). Cada parcela da sociedade teria sua função específica (daí essa
corrente ser conhecida como “funcionalista”, indispensável ao funcionamento integrado,
harmônico, pacífico do corpo social. Portanto, a regra, o padrão de normalidade da vida em
sociedade seria integração, o consenso, a conciliação, o funcionamento harmônico das várias
partes que a compõem. Só com a harmonia entre as partes, dentro da ordem natural das coisas, é
que se torna possível a sociedade crescer como um todo, desenvolver-se, atingir o progresso.
Uma sociedade saudável e progressista seria aquela em que todos trabalhassem em
ordem e com afinco para o desenvolvimento do corpo social, que traria a todos o fruto do
progresso. A regra normal seria a integração entre os membros da sociedade. Já os conflitos
seriam vistos como exceção, sintoma de doença no organismo social.

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A persistência dos conflitos, do estado de anomia (ausência de regras, leis), seria um
risco para a continuidade da vida em sociedade, pois instalaria o caos e a desordem que
impedem o progresso. Daí a necessidade de surgir uma ciência específica, a sociologia, para
estudar o funcionamento das instituições ou fatos sociais. A sociologia seria uma espécie de
biologia social, estudaria o desenvolvimento natural do organismo social, da mesma maneira
que os biólogos estudam o funcionamento dos organismos vivos. O sociólogo observaria a
sociedade como um olho pairando sobre ela, com a mesma neutralidade e ausência de juízos de
valor com que um biólogo, um físico se posicionam diante de uma matéria desconhecida nos
seus campos de trabalho.

A política positivista

O cientista social (sociólogo) pode lançar mão de seu instrumental de análise para
detectar a normalidade e a doença da sociedade, mas não tem condições de atuar no sentido de
por em prática as suas descobertas. Só os políticos podem fazê-lo, como integrantes do Estado,
que, na visão positivista, encarna o bem comum. O Estado seria uma entidade acima dos
indivíduos e dos grupos sociais em particular, tendo por função coordenar as funções da
sociedade em seu conjunto. Ele tem a responsabilidade de coordenar as funções de todos os
órgãos para que o corpo se mantenha saudável. O Estado seria o cérebro social, o lugar da
política que zela pelo bem comum.
E o discurso oficial dos políticos é o de que eles defendem os interesses da sociedade
em seu conjunto, o bem comum. Quase todos os cidadãos concordam que o Estado é uma
entidade acima dos indivíduos, dos grupos e das classes, capaz de pensar o destino e os
interesses do conjunto da sociedade. Essa idéia, difundida por todo lado e que parece uma
verdade banal, é parte do ideário positivista, estando longe de ser consensual entre os estudiosos
do Estado e da política.
(RIDENTI, Marcelo. Política pra quê? São Paulo: Atual, 1997)

Críticas à doutrina positivista

Para o sociólogo Michael Lowy , em seu livro “Método dialético e teoria política”, a
ideia central da corrente positivista é de uma simplicidade evangélica: nas ciências sociais,
como nas ciências da natureza é necessário afastar os preconceitos, separar os julgamentos de
fato dos julgamentos de valor, a ciência da ideologia. A finalidade do sociólogo ou historiador
deve ser a de atingir a mesma neutralidade serena, imparcial e objetiva do físico, do químico e
do biólogo. Deixemos a palavra com Comte: “eu entendo por física social a ciência que tem por
objetivo próprio o estudo dos fenômenos sociais, considerados dentro do mesmo espírito que o
dos fenômenos astronômicos, físicos, químicos e fisiológicos, quer dizer, sujeitos a leis naturais
invariáveis, cuja descoberta é a finalidade especial dessas pesquisas.”
O positivismo comteano está, portanto, fundamentado sobre duas premissas
essenciais, estreitamente ligadas:
A – a sociedade pode ser epistemologicamente (estudo crítico do conhecimento científico)
assimilada à natureza (o que nós chamaremos de “naturalismo positivista”); na vida social
reina uma harmonia natural.
B – a sociedade é regida por leis naturais, quer dizer, leis invariáveis, independentes da vontade
e da ação humana..
Por estas premissas, se conclui que o método nas ciências sociais pode e deve ser o
mesmo que o das ciências da natureza, com os mesmos métodos de pesquisa e sobretudo, com
o mesmo caráter de observação “neutra”, objetiva e desligada dos fenômenos.
As implicações ideológicas conservadoras, reacionárias e contra-revolucionárias
dessa concepção são evidentes e aliás explicitamente formuladas por Comte, cuja franqueza não
é um dos méritos menores: posto que as leis sociais são leis naturais, a sociedade não pode ser
transformada; contra os sonhos revolucionários utópicos e negativos, o positivismo enaltece a
aceitação passiva do “status quo” social: “o positivismo tende profundamente por sua
natureza, a consolidar a ordem pública, pelo desenvolvimento de uma sábia resignação (...)

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Evidentemente, não pode existir verdadeira resignação, quer dizer, disposição permanente para
suportar com constância e sem nenhuma esperança de compensação, quais males inevitáveis a
não ser como conseqüência de um profundo sentimento das leis invariáveis que regem todos os
diversos gêneros dos fenômenos naturais.” (Comte)
Baseado neste trecho, podemos apreender melhor o sentido verdadeiro da palavra
“positivo”, empregada por Comte para distinguir, ou melhor, opor sua doutrina às perigosas
teorias negativas, críticas, destrutivas, dissolventes, subversivas, em uma palavra,
revolucionárias da filosofia das luzes, da Revolução Francesa e do socialismo.
A socióloga Lelita Benoit em seu livro Sociologia Comteana diz “ Para Marcuse, a
sociologia de Comte, voltando-se contra as tendências negativas do Iluminismo, erige-se não só
em defesa ideológica da sociedade burguesa, como ademais contém “as sementes de uma
justificação ideológica do autoritarismo.” A idéia central de Marcuse é que a sociologia de
Comte foi construída com o objetivo de preparar os homens para a disciplina e a obediência à
ordem estabelecida,levando-os à resignação; sua idéia de progresso exclui a revolução, pois o
desenvolvimento histórico era tão-somente “a evolução harmoniosa da ordem social sob leis
naturais perenes.” Ainda segundo Marcuse, o Estado concebido por Comte tem traços em
comum o “moderno Estado autoritário” , uma vez que as relações sociais, em particular aquelas
entre trabalhadores e empresários, não podiam ocorrer livremente mas deviam ser
regulamentadas a fim de se obter uma “harmonia indispensável”. O que não implicava eliminar
a posição de inferioridade dos operários, determinada por uma hierarquia social rígida.

Características gerais do Positivismo

• a sociedade é regida por leis naturais, espontâneas, isto é, leis invariáveis,


independentes da vontade e da ação humana.
• Na sociedade reina uma harmonia natural e qualquer perturbação é sintoma de “doenças
sociais”.
• A sociedade deve ser estudada pelos mesmos métodos, técnicas e processos aplicados
ao estudo da natureza.
• A ciência da sociedade deve limitar-se à observação e á explicação causal dos
fenômenos, de forma a objetiva, neutra, livre de julgamento de valores, descartando as
prenoções (idéias pré-concebidas de determino fenômeno)

Fundamentos do Positivismo:

Teoria dos Três estados ou estágios

Registra a passagem que conduziria os conhecimentos e as instituições humanas da idade


teológica à positiva, passando pela transição metafísica. A humanidade, no seu envolver
espiritual, passa por três estados em sua evolução intelectual, de concepção do mundo e da vida:
Estado teológico deve ser sempre concebido como provisório e preparatório; metafísico, que do
1º constitui apenas uma modificação dissolvente, é transitório, a fim de conduzir ao terceiro:
positivo – único normal e constitui o regime da razão humana.

A – Estado Teológico: (explicação religiosa – Idade Antiga). Corresponderia a uma fase da


sociedade num período distante (os homens não dispunham de Razão para explicar o mundo). É
o estágio da sociedade em que os homens não se valem da Razão, pois acreditam em forças
sobrenaturais, deuses).
Explica os diversos fenômenos através de causas primeiras, em geral, personificadas aos
deuses. É um conhecimento absoluto e o saber assenta no poder e produção da imaginação.
O homem só consegue explicar a natureza mediante a crença na intervenção de seres
pessoais e sobrenaturais. A sociedade vai evoluindo e possui três fases:

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• Fetichismo: o homem confere vida, ação e poder sobrenatural a seres inanimados e a
animais. Todos os fenômenos da natureza são divinos; a adoração dos astros caracteriza
a fase.
• Politeísmo: atribui-se a diversos deuses certos traços da natureza humana: vícios,
virtudes, etc. Cada classe de fenômenos possui seu deus distinto.
• Monoteísmo: quando se desenvolve a crença num deus único.

B – Estado metafísico (Idade Média; explicação filosófica). Fase que corresponde ao


desenvolvimento da filosofia, como método de argumentação. Busca-se na Razão, o conjunto
de explicações, ou seja, tenta-se explicar a natureza dos seres, a origem e o destino de todas as
coisas e como se produzem os fenômenos. Predomina o pensamento especulativo, entretanto, o
homem não consegue fazer ciência.

C – Estado Positivo (Idade Moderna; explicação científica). Fase dominada pela Ciência ,
baseada na experimentação e nas provas, que vai construir uma sociedade ideal, ou seja, o
homem tenta compreender as relações entre as coisas e os acontecimentos através da observação
científica e do raciocínio, formulando leis. Por que? Para fazer previsões e eliminar os
problemas. Fórmula: “saber para prever, a fim de prover”.
É o estado dominado pela ciência, que vai construir uma sociedade ideal. Tem por objetivo
estabelecer leis (relações constantes que existem entre os fenômenos observados), naturais
invariáveis, as “constantes”.

Teoria da ordem e progresso

Desenvolvimento industrial: gera conflitos de camponeses e proletários. Exigiam?


Mudanças políticas, econômicas. Resposta do Estado? Ordem e progresso

Ordem: ajustar todos os indivíduos às condições estabelecidas, garantindo o bem comum.


Progresso: transformações das sociedades, da mais simples a mais complexa.

Dois movimentos vitais:

Estático

• teoria da ordem social (busca as condições de equilíbrio na sociedade)


• instituições que mantém a coesão social: família, religião, propriedade, tradição,
comportamentos sócio-culturais
• estuda as leis de harmonia social e hierarquia social
• divisão do trabalho social leva à solidariedade social
• noção central: consenso entre todos os fenômenos sociais

Dinâmico

• teoria do progresso (busca as leis de sucessão)


• evolução natural: ela é geral, universal
• mobilidade (indivíduos e classes)
• estuda o desenvolvimento contínuo e gradual da humanidade

Em síntese: teoria da ordem/progresso – controle sobre a evolução natural, o progresso destina-


se a aperfeiçoar os elementos da ordem, não destruí-la.

Positivismo e a Política

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• Comte defende a forma de governo republicana
• Adversário do sufrágio universal
• Defendia a supressão do Parlamento
• Defendia um Executivo forte e o único responsável pela elaboração das leis
• Contrário aos sonhos revolucionários
• Enaltece a aceitação passiva do “status quo” social
• Antiliberal, pregava a intervenção do Estado na vida econômica e na organização social.
A desordem e anarquia originam-se da ausência de regulação positiva. É preciso haver
plano e controle.
• A doutrina positivista seria a única capaz de, mantendo a ordem, enfrentar os
subversivos, impedindo a revolução violenta e permitindo a melhoria pacífica da
sociedade.

Divisão do trabalho

• positividade do trabalho : leva à coesão e solidariedade social


• combate aos conflitos sociais
• consenso, conciliação ou parceria entre o capital e o trabalho
• otimista diante da ciência e da indústria.

Papel do cientista social

Neutralidade científica, de forma objetiva e imparcial

Moral positivista

• família: célula-mater da sociedade


• valores a serem preservados: virgindade, casamento indissolúvel, viuvez eterna

Positivismo: filosofia social conservadora


Antiliberal e antiindividualista, pregava Comte a intervenção do Estado na vida
econômica e na organização social. A desordem e anarquia originam-se da ausência de
regulação positiva. É preciso haver plano, controle, que se inicia pela formação de uma sólida e
forte opinião pública, através de ampla liberdade de pensamento e de discussão. A educação
deve ser universal, abrangendo todas as classes da sociedade e todos os ramos do conhecimento
humano, desde a Matemática à Moral. Assim, teriam todos as mesmas oportunidades, ricos e
pobres, burgueses e proletários.
Contudo, não admitia saltos na evolução da natureza nem da sociedade, um estado
nascia do anterior. O homem somente é livre na medida em que compreende e consegue colocar
as leis naturais a seu serviço; caso contrário, nada mais lhe resta senão se resignar. A mudança
social, sem saltos, processa-se dentro da ordem, condição indispensável para o progresso; sem
ordem, não há progresso, e vice-versa. A doutrina positiva, segundo Comte vê na liberdade o
instrumento do progresso.
Apresenta-se defensora da ordem e garantidora do progresso. Na prática, revela-se o
sistema positivista como conservador, tal a ojeriza que tinha Comte pela anarquia. Comte
apresentava a doutrina positivista como a única capaz de, mantendo a ordem, enfrentar os
subversivos, impedindo a revolução violenta e permitindo a melhoria pacífica da sociedade
francesa.
Adversário do sufrágio universal, da monarquia absoluta ou constitucional, das
assembléias, via na república, o estado normal da humanidade, com supressão do parlamento,
unicamente necessário para a elaboração do orçamento. As leis deveriam ser de competência do
executivo, com o desaparecimento da hipócrita distinção entre leis e decretos.

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Via no proletariado e na mulher os dois agentes mais capacitados para compreender e
aceitar o advento do positivismo, pelo seu não comprometimento com os interesses constituídos
da burguesia e por não terem recebido a educação oficial.
O exército permanente, transformado, poderia ser utilizado nessa manutenção da ordem.
Mas a questão social e toda a crise social eram mais de natureza espiritual e moral,
do que propriamente de natureza material “ sem perturbar a economia geral, a reorganização
mental, interpondo habitualmente uma comum autoridade moral entre os operários e seus
chefes, oferecerá a única base regular de uma conciliação equitativa e pacífica de seus
conflitos.”
A favor do casamento indissolúvel e da viuvez eterna, da herança e da propriedade, via
nesta uma “instituição fundamental”, embora devendo sofrer sérias e profundas limitações no
seu uso em proveito da coletividade.
Sempre em busca da unanimidade e da completa unidade espiritual, já havia Comte
criado a Religião da Humanidade em 1847. Para constituir o seu poder espiritual, criou o
sacerdócio positivista, como classe especulativa, sendo ele próprio o Grande-Sacerdote. Para
expor a nova religião, com culto, regime e dogma, escreveu o Catecismo Positivista. Inaugurou
um novo calendário, com novas festas comemorativas em homenagem aos grandes cultos do
passado. Religião positiva, demonstrável, não-sobrenatural, viria em breve a substituir todas as
religiões teológicas, anteriormente existentes.

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

As três etapas do pensamento de Comte

A evolução filosófica de August Comte se dá pelas três obras principais: Opúsculos de


Filosofia Social (entre 1820 e 1826); Curso de Filosofia Positiva (1830-1842) e Sistema de
Política Positiva (1851-1854).
O jovem Comte reflete sobre a sociedade de seu tempo, a sociedade européia no
princípio do século XIX. A sociedade que nasce é científica, no sentido em que a sociedade que
morre era teológica. Os cientistas substituem os sacerdotes e teólogos como a categoria social
que dá a base intelectual e moral da ordem social. Os empreendedores, diretores de fábricas,
banqueiros estão assumindo o lugar dos militares.
Desde essa época, Comte conclui que a reforma social tem como condição a reforma
intelectual. Para isso é preciso uma síntese das ciências e a criação de uma política positiva.
Comte considera que a sociedade moderna está em crise e a contradição entre uma
ordem histórica e a contradição entre uma ordem histórica teológico-militar em vias de
desaparecer e uma ordem social científico-industrial que nasce.
.
CARVALHO, José Murilo de. Os positivistas e a manipulação do imaginário. In: A
formação das Almas. São Paulo: Companhia das Letras, 1990 p. 129-142

O imaginário Comtista

Antes do encontro com Clotilde de Vaux, em 1844, responsável por sua “regeneração
moral”, o pensamento de Comte já exibia elementos que não provinham de fontes científicas ou
positivistas. A partir do encontro com Clotilde, Comte desenvolveu os elementos utópicos e
religiosos de seu pensamento. O sentimento foi colocado em primeiro plano, deslocando a
razão, base de sua obra anterior, para uma posição subordinada. O positivismo comtiano
evoluiu na direção de uma religião da humanidade, com sua teologia, seus rituais; fundia o
religioso com o cívico. Os santos da nova religião eram os grandes homens da humanidade, os
rituais eram festas cívicas, a teologia era sua filosofia e sua política, os novos sacerdotes eram
os positivistas. Na base, ficava a família, seguida da pátria e, como culminação do processo, a
humanidade.

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A guinada clotideana foi indiscutível na elaborada visão da mulher e de seu papel na
evolução social. No Cours de philosophie, sua posição em relação à mulher não discrepava da
visão tradicional de inferioridade em relação ao homem. Agora, ele terminou por afirmar a
superioridade social e moral da mulher sobre o homem. Tal superioridade se basearia no fato
de a mulher representar o lado afetivo e altruístico da natureza humana. A mulher, seria o
principal responsável pela reprodução da espécie, mas o seu papel não se limitaria à reprodução,
mas se daria na família, em que, como mãe, ela teria a responsabilidade da formação moral do
futuro cidadão.
O dogma da superioridade do sentimento e do amor sobre a razão e a atividade
aplicava-se também às raças e às culturas. A raça negra seria superior à branca por se
caracterizar, como as mulheres, pelo predomínio do sentimento, ao passo que a raça branca era
marcada pela razão.
Os ortodoxos brasileiros basearam-se principalmente nos ensinamentos finais de
Comte, salientando os aspectos religiosos e ritualísticos. Por essa razão, foram acusados pelos
adversários de excesso de ortodoxia, de fanatismo religioso, até mesmo de lunatismo.
Ridicularizava-se sua clotildolatria.
Com efeito, Miguel Lemos e Teixeira Mendes, os dois reconhecidos chefes da ortodoxia
positivista, efetuaram uma reorientação do movimento no Brasil. Anteriormente a seu ingresso,
dominava a corrente mais próxima de Littré, o discípulo de Comte que não aceitava a fase pós-
clotilde do mestre. Ao regressar ao Brasil, em 1881, Lemos buscou assumir a direção da
Sociedade Positivista.

Manipuladores de símbolos

A junção da doutrina comtista com a visão estratégica dos ortodoxos fez desses
positivistas os principais manipuladores de símbolos da República.
Se a ação tinha de se basear no convencimento, impunha-se o uso dos símbolos. Em
primeiro lugar, a palavra escrita e falada. Dela fizeram uso abundante em livros, jornais,
publicações da Igreja, conferências públicas. Era sua arma principal de convencimento dos
setores médios. Mas empregaram também o simbolismo das imagens e dos rituais,
especialmente tendo em vista dois públicos estratégicos: as mulheres e os proletários, menos
afetos, ao menos no Brasil, à palavra escrita. Atingir esses dois públicos, convencê-los da
verdade da doutrina. A briga pelas imagens adquiria importância central.
Daí a luta incansável dos ortodoxos pelo coração e pela cabeça dos cidadãos, por meio
da batalha dos símbolos. Daí sua luta pelos monumentos, pelo mito de Tiradentes, pela
bandeira republicana, pela figura feminina.

O Positivismo no Jornal ‘O TRABALHO’(1º jornal de Patos de Minas, editado em 1905)

Na edição nº 4, um artigo escrito e assinado por P.M. (positivista) , sob o título “A instrução
da mocidade”, foi dedicado aos amigos Dr. Eufrásio Rodrigues e Agenor Maciel. Não nos foi
possível identificá-lo, mas percebe-se que conhece a fundo a doutrina filosófica positivista de
Comte. Diz ele: “A civilização é o aperfeiçoamento progressista dos homens na sociedade. O
desenvolvimento da moral, da ciência, da literatura, das artes, da legislação, do comércio e da
indústria indica o grau de civilização ao qual pode cada povo chegar. A época contemporânea
nos oferece o espetáculo de um desenvolvimento extraordinário, devido ao progresso das
ciências matemática, física ou naturais à feliz aplicação dessas ciências à industria e ao
comércio.
O progresso científico, causa principal do progresso material e econômico, data do dia
em que foram abandonadas os velhos erros do método a priori, para seguir os ensinamentos da
experiência, as regras de uma restrita indução, os processos de análise, de síntese, de
classificação natural que criaram.
Como observar as regras do honesto, do bem e cumprir os seus deveres para com Deus,
para com seus semelhantes? Jamais poderá ser bom cidadão, jamais poderá amar a sua pátria o
homem ignorante, razão por que afirmo que sem a instrução não pode haver civilização, não

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pode haver progresso. E no entanto a nossa mocidade é descuidada, dela não se pensa.
Infelizmente ainda não temos no nosso vasto e esperançoso município um só estabelecimento
onde os jovens filhos do sertão possam receber a luz da instrução civilizada e religiosa. Crescem
embebidos nos vícios e na mais depravada corrupção.
Façamos justiça, sejamos civilizados e instruamos a mocidade, esperança do porvir.”
No jornal de edição nº 6, P.M. voltou ao assunto “A instrução da mocidade”, dizendo
que um velhote havia lido o artigo, mas que era bobagem, pois os meninos e a nossa mocidade
já não está tão adiantada? O articulista respondeu: “poderão eles conhecer os seus deveres e
praticá-los se ignoram até mesmo os princípios rudimentares da verdadeira civilização, o que
seja a sociedade e a família? Não, meu bom velho, a mocidade é o futuro da pátria e sua
instrução é o manancial da ordem e do progresso. A religião, a pátria e a família reclamam a
instrução de nossa mocidade que, uma vez instruída, é como uma nau embandeirada prestes a
fazer vela em mar , onde encontraremos as bases do direito social, o princípio da autoridade, a
constituição da família e o amor da pátria, tendo por guia o sopro benefício e indispensável da
religião.”

Bibliografia

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 1993 p.
69-115
BENOIT, Lelita. Sociologia Comteana. São Paulo: Discurso Editorial, 1999.
COMTE, Auguste. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1986.
LOWY, Michael. Método dialético e teoria Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
MORAES FILHO, Evaristo (org) Comte. São Paulo: Ática, 1982.
RIBEIRO, João. O que é Positivismo. São Paulo: Brasiliense, 1982.

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