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REVISÃO REVIEW 737

Evolução histórica das bulas de medicamentos


no Brasil

Historical evolution of package inserts in Brazil

Telma Rodrigues Caldeira 1


Eugênio Rodrigo Zimmer Neves 1

Edson Perini 2

Abstract Introdução

1 Agência Nacional de In Brazil, package inserts provide key informa- As primeiras bulas eram marcas arredondadas
Vigilância Sanitária, Brasília,
Brasil.
tion on pharmaceuticals. The current study an- feitas com anel para autenticar documentos ofi-
2 Faculdade de Farmácia, alyzes the evolution of package inserts and the ciais, o termo bula vem do latim bulla (bola) 1. A
Universidade Federal de impact on this process by scientific research and partir do século XV, o termo passou a designar
Minas Gerais, Belo Horizonte,
Brasil. development, globalization of information, and um escrito solene ou carta aberta provida de tal
various health policies. The study began with a selo, expedida em nome do papa, com instru-
Correspondência
retrospective review of Brazilian health legisla- ções, indulgências, ordens, concessão de bene-
T. R. Caldeira
Núcleo de Assessoramento tion until 1920, the year when the National Pub- fícios 2. Posteriormente, passou a ser indicador
Econômico e Regulação, lic Health Department was created. The analysis de autenticidade para medicamentos oficiais,
Agência Nacional de
of documents on the evolution of health regula- pendurada por um cordão e atestando não ser
Vigilância Sanitária.
SEPN 515, Bloco B, Brasília, DF tion in Brazil began with the Brazilian Pharma- uma garrafada 1. No Brasil, a partir do século XX,
70770-502, Brasil. ceutical Collection – Health Rulings. The second passou a designar um impresso que acompanha
telma.caldeira@anvisa.gov.br
stage of the study involved a search of standards os medicamentos, contendo informações so-
and norms in VISALEGIS: Health Surveillance bre composição, utilidade, posologias e contra-
Legislation, Portal for Legislation from the Na- indicações 3.
tional Congressional Information System and A Constituição Federal de 1988 inseriu o con-
the Health Legislation System. Package inserts ceito de saúde como direito social, estabelecen-
became an important vehicle for information in do como dever do Estado a garantia deste direito
the country and underwent important regula- mediante políticas sociais e econômicas. A vigi-
tory changes in the latter half of the 20th century. lância sanitária, um dos meios para cumprir esse
From 1946 to 2006, the number of mandatory dever, é a responsável pelo registro de medica-
items increased, with more in-depth description. mentos, tarefa exclusiva do Estado que intervém
However, the standardization of information for na relação produção-consumo ao estabelecer
medicines with the same active ingredient failed normas legais para concessão deste registro, in-
to materialize, despite its importance and the cluindo aí o conteúdo das bulas.
various legal initiatives in this direction. A bula tem representado em nosso país o
principal material informativo fornecido aos
Medicine Package Inserts; Health Legislation; usuários de medicamentos 4. A Agência Nacio-
Health Surveillance nal de Vigilância Sanitária (ANVISA) tem como
atribuição analisar e aprovar o material informa-

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tivo produzido pela indústria farmacêutica antes dicamentos, que tratavam de diversos assuntos
de sua comercialização. Esse processo se baseia (classificação terapêutica, restrição de venda e
tanto em informações presentes nos registros de uso etc.) relacionados a medicamentos e que
medicamentos como naquelas encontradas em afetavam as informações disponíveis nas bulas;
bancos de informações. O ponto chave é a aná- rotulagem e bulas, com normas que citavam re-
lise da informação apresentada pelo detentor do gras gerais para rotulagem e bulas; bulas, que
registro e o confronto dessa informação com a reuniu a legislação específica de bulas de medi-
literatura científica. camentos; e farmácia de manipulação, incluin-
A forma e o conteúdo das bulas de medica- do normas sobre bulas para medicamentos ma-
mentos são legalmente determinados e acom- nipulados.
panham a evolução da normatização do setor
farmacêutico. Este artigo tem como objetivo ana-
lisar a evolução histórica dessa regulamentação Resultados
legal das bulas de medicamentos no Brasil.
De 1953 a 2006, destacam-se quatro atos norma-
tivos sobre a estrutura e o conteúdo das bulas:
Métodos a Portaria n°. 49, de 10 de agosto de 1959 5, do
Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e
As normas foram coletadas retrospectivamente a Farmácia (SNFMF); a Portaria nº. 65, de 28 de
partir de 2005, período marcado pela publicação dezembro de 1984 6, da Secretaria Nacional de
do Bulário Eletrônico da ANVISA (http://bulario. Vigilância Sanitária (SNVS); a Portaria nº. 110, de
anvisa.gov.br, acessado em 08/Set/2007) e do 1o 10 de março de 1997 7, da Secretaria de Vigilância
Compêndio de Bula de Medicamentos (CBM), até Sanitária (SVS); e a Resolução da Diretoria Cole-
a criação do Departamento Nacional de Saúde giada (RDC) n°. 140, de 29 de maio de 2003 8, da
Pública (DNSP) em 1920. Seguiu-se a lógica de ANVISA.
que a cada norma publicada, outro dispositivo As normas específicas sobre os princípios
era revogado. ativos, do período de 1950 a 1973, continham as
A fonte inicial de coleta dos dados foi a Co- instruções que deveriam constar no ato do licen-
leção Farmácia Brasileira – Portarias Sanitárias, ciamento do produto (antigo registro do medi-
editada pelo Ministério do Trabalho e Conselho camento). Observou-se que indicações terapêu-
Federal de Farmácia. Complementações foram ticas, esquema posológico, restrição de venda,
feitas nos portais de pesquisa de legislação da efeitos colaterais eram definidos para algumas
ANVISA (VISALEGIS – Legislação em Vigilância substâncias, o que refletia em alterações nas bu-
Sanitária; http://e-legis.anvisa.gov.br, acessado las e rótulos daqueles medicamentos licenciados
em 08/Set/2007), do Ministério da Saúde (Saú- antes da publicação da norma. Além disso, nota-
de Legis; http://portal.saude.gov.br/saudelegis, ram-se a padronização e a inclusão de frases de
acessado em 08/Set/2007) e do Senado Federal advertência.
(Portal Legislação; http://portal.saude.gov.br/ Notou-se que, antes da criação do Ministé-
saudelegis, acessado em 08/Set/2007). rio da Saúde, em 1953, a bula foi tratada em le-
Todos os resultados das buscas apresentavam gislação não específica, a destacar o Decreto n°.
o número e a data da norma, o órgão que a editou 20.377, de 8 de setembro de 1931 9, que regula-
e o resumo do assunto ou ementa. Para aque- mentou o exercício da profissão farmacêutica no
les que não apresentavam endereço eletrônico Brasil. No capítulo sobre a Indústria Química e
foram solicitadas cópias originais das edições Farmacêutica, ao tratar da licença de especiali-
do Diário Oficial da União à procuradoria da dade farmacêutica, a bula é considerada pela pri-
ANVISA, à biblioteca do Ministério da Saúde e, meira vez como um documento necessário para
em último caso, ao Arquivo Nacional da Impren- avaliação do pedido de licença. Em janeiro de
sa Nacional. 1946, o Decreto n°. 20.397 10 aprovou o Regula-
A legislação foi listada em ordem cronológi- mento da Indústria Farmacêutica no Brasil, a ser
ca, em tabela classificando período de governo, aplicado pelo SNFMF. O capítulo Dos Produtos
estrutura institucional, tipo e número da norma Químico-Farmacêuticos trata da licença de es-
legal, data da assinatura e da publicação oficial, pecialidades farmacêuticas e dos itens a constar
área e assunto. Foi também classificada por áre- nos rótulos e bulas.
as: organização de serviços, reunindo normas O primeiro regulamento específico para as
que tratam da estrutura institucional (ministé- bulas, em que se define a ordem dos itens, ocor-
rios, serviços, departamentos etc.) e das regras reu em 1959 com a Portaria n°. 49 5. Essa norma
para indústria farmacêutica; registro, relativas regulamentou a apresentação e o exame de rótu-
à licença ou ao registro de medicamentos; me- los e textos de bulas, entretanto dispensou a sua

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS BULAS DE MEDICAMENTOS NO BRASIL 739

obrigatoriedade quando as informações constas- mos essenciais foram efetivadas apenas para os
sem na rotulagem. Além disso, determinou que a medicamentos bromocriptina e terfenadina.
mesma não poderia conter informações diferen- A ANVISA, criada como uma autarquia espe-
tes daquelas apresentadas no ato da licença da cial com independência administrativa, estabi-
especialidade farmacêutica. lidade de seus dirigentes e autonomia financei-
Posteriormente, em 1977, o Decreto n°. 79.094 ra 12, substituiu a SVS após a publicação do Regi-
11, regulamentou a Lei n°. 6.360/1976, e subme- mento Interno, pela Diretoria Colegiada. A Porta-
teu medicamentos e outros produtos e serviços ria n°. 593, de 25 de agosto de 2000, definiu a sua
à vigilância sanitária; ambas as normas estão em estrutura organizacional 13, marcando o fim da
vigor. No Título X, Da Rotulagem e Publicidade SVS. Com a tarefa de revisar o arcabouço legal, a
desse Decreto, descrevem-se regras para bulas, ANVISA editou em 2003 o conjunto de normas de
rótulos, etiquetas e materiais impressos dos registro de medicamentos.
produtos de interesse sanitário. A bula, além de Nesse contexto a legislação específica de bu-
outros materiais impressos, deveriam ter dimen- las foi reformulada e publicada como Resolução
sões necessárias à fácil leitura visual, observado RDC n°. 140, de 29 de maio de 2003 8, que dividiu
o limite mínimo de 1mm de tamanho de letra. as bulas em duas: bula para o paciente (identifi-
Além disso, as contra-indicações, precauções cação do medicamento, informações ao pacien-
e efeitos colaterais deveriam ser impressos em te, dizeres legais) e bula para o profissional de
tipos maiores dos que os utilizados nas demais saúde (identificação do medicamento, informa-
indicações e em linguagem acessível ao público. ções técnicas aos profissionais de saúde, dizeres
Foi a primeira a tratar do tamanho mínimo de legais). Na informação ao paciente observa-se o
letra e da necessidade de linguagem acessível ao reforço para a utilização de linguagem acessível
leigo. ao organizar o texto em forma de perguntas e
A Portaria n°. 65 6, da SNVS, instituiu o rotei- respostas, o que estabelece um “diálogo” entre
ro para texto de bula (modelo padrão de bula). a bula e o leitor. Outros pontos a serem destaca-
A Divisão de Medicamentos (DIMED) ficou res- dos, ao comparar com a legislação anterior são:
ponsável pelos estudos dos textos, inicialmente criação da lista de medicamentos padrão para
por classe terapêutica e posteriormente produto texto de bula (para harmonizar o conteúdo das
a produto, determinando quais itens de infor- bulas nacionais, a partir da criação de um texto
mação obrigatória e, quando fosse o caso, quais padrão para cada princípio ativo); aumento do
textos padrões deveriam ser reproduzidos, o que tamanho mínimo de letra de 1mm para 1,5mm;
na prática não ocorreu. Além disso, a portaria di- adoção da classificação de risco para gestantes;
vidiu as informações em identificação do produ- utilização da Classificação Internacional de Do-
to, informação ao paciente, informação técnica e enças (CID-10) ao se referir a sinais, sintomas e
dizeres legais. doenças; atualização das informações compa-
Em 1997, a SVS publicou a Portaria n°. 110 7 rando com bulas internacionais; apresentação
mantendo essa estrutura, com a inclusão de ou- dos resultados dos estudos de eficácia; inclusão
tros itens obrigatórios. Seguindo a tendência da da descrição das características organolépticas
Portaria nº. 65 6, de 1984, a SVS se comprometeu do medicamento (para auxiliar na detecção de
a elaborar dizeres de bula para cada princípio medicamentos falsificados ou com alterações);
ativo ou associação, de acordo com a respecti- envio da bula eletronicamente pelo Sistema de
va classe terapêutica. A inovação foi a classifica- Gerenciamento Eletrônico de Bulas (E-bulas;
ção das informações em mínimos essenciais e http://e-bulas.anvisa.gov.br) e publicação oficial
máximos essenciais. Nos primeiros, os itens não dos textos no Bulário Eletrônico da ANVISA e no
poderiam ser omitidos e as novas informações CBM. A Tabela 1 compara os itens exigidos ao
deveriam ser baseadas cientificamente. Os míni- longo da publicação de normas sanitárias consi-
mos essenciais compreendiam toda informação deradas impactantes.
ao paciente e os subitens da informação técnica: Em 2004, a Resolução RDC n°. 68 14 prorro-
contra-indicações, advertências, interações me- gou o prazo final de envio das primeiras bulas
dicamentosas, reações adversas, superdosagem, padrões para 23 de abril, justificado pelo con-
pacientes idosos. Os máximos essenciais se refe- gestionamento de envio de bulas eletrônicas ao
riam às indicações e posologia, e não poderiam E-bulas. Durante a avaliação dos textos, a equipe
ser acrescentadas informações além daquela do Projeto Bulas encontrou uma série de erros
padronizada. Ficou a cargo da SVS publicar em na configuração eletrônica das bulas, explicadas
Diário Oficial da União os mínimos e máximos pela inexperiência das indústrias com a tecno-
essenciais. Os demais itens, que dependiam das logia adotada para o envio de arquivos. Assim,
especificações do produto, caberiam à empresa determinou-se em 2 de julho o reenvio de 90%
elaborá-los. Publicações dos mínimos e máxi- das bulas encontradas na base de dados. Encer-

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Tabela 1

Comparação entre os itens obrigatórios exigidos pelas normas impactantes na estrutura e conteúdo das bulas de medicamentos no Brasil, 1946 a 2003.

Itens obrigatórios Decreto nº. Portaria nº. Decreto nº. Portaria nº. Portaria nº. Resolução
20.397/1946 * 49/1959 ** 70.094/ 65/1984 # 110/1997 ## RDC nº.
1977 *** 140/2003 ###

Características específicas do medicamento


Nome comercial X X X X X X
Nome técnico do componente ativo ou
denominação genérica do princípio ativo X X X X X X
Nomenclatura oficial botânica X
Fórmula X X X X X X
Peso, volume líquido ou quantidade de unidades X X X X
Via de administração X X X X
Formas farmacêuticas e apresentações X X X
Uso pediátrico ou adulto X X X

Ação e indicação do medicamento


Indicações terapêuticas X X X X X X
Ação do medicamento X X X
Características químicas e farmacológicas X X
Resultados de eficácia X

Riscos do uso do medicamento


Contra-indicações X X X X
Precauções e advertências X X X
Interações medicamentosas X X X
Reações adversas X X X
Uso na gravidez e lactação X X X
Categoria de risco de fármacos destinados às
mulheres grávidas (frase de alerta) X
Riscos da automedicação X X
Uso em pacientes idosos X X
Restrição por faixa etária (frase de alerta) X

Orientações quanto ao uso do medicamento


Modo de usar ou cuidados de administração X X X X X X
Modo de preparo X X X X
Dose ou posologia X X X X X
Prazo de validade X X X X
Prazo de validade após abertura da embalagem X X X
Cuidados de armazenamento antes e depois
da abertura X X X
Condutas em caso de superdosagem X X X
Conduta em caso de dose omitida X
Aspecto físico e características organolépticas
do medicamento X

(continua)

rada a análise da linguagem, a Consulta Pública bula padrão uma lista de medicamentos gené-
n°. 51, de 11 de agosto de 2004 15, disponibilizou ricos e uma lista de outros medicamentos com o
as bulas padrões para contribuições da socieda- mesmo princípio ativo (similares). Os detentores
de científica, empresas farmacêuticas, centros de de registro de medicamentos genéricos e/ou si-
informação sobre medicamentos e profissionais milares deveriam conferir se seus medicamentos
de saúde. Além disso, foi publicada para cada estavam devidamente relacionados aos padrões

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS BULAS DE MEDICAMENTOS NO BRASIL 741

Tabela 1 (continuação)
Itens obrigatórios Decreto nº. Portaria nº. Decreto nº. Portaria nº. Portaria nº. Resolução
20.397/1946 * 49/1959 ** 70.094/ 65/1984 # 110/1997 ## RDC nº.
1977 *** 140/2003 ###

Dizeres legais
Restrição de venda (sob prescrição médica) X X X X X
Número da licença ou registro X X X X X
Nome do farmacêutico responsável X X X X X
Dados do farmacêutico responsável X X X X
Local de fabricação X X X X X
Dados do fabricante X X X X
Telefone de atendimento ao consumidor X

* Brasil 10;
** Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia 5;
*** Brasil 11;
# Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária 6;
## Secretaria de Vigilância Sanitária 7;
### Agência Nacional de Vigilância Sanitária 8.

para texto de bula. Devido ao grande número de notícias relacionadas à atualização das bulas, a
contribuições, a Resolução RDC n°. 209, de 31 de legislação em vigor sobre o assunto, perguntas
agosto de 2004 16, prorrogou por mais trinta dias freqüentes e também outros endereços eletrôni-
o prazo para envio das críticas e sugestões. Assim, cos de interesse na área de saúde.
as bulas padrões ficaram durante cinqüenta dias
disponíveis no E-bulas para Consulta Pública.
Em 17 de maio de 2005, com a publicação da Discussão
Resolução RDC n°. 126 17, o Bulário Eletrônico
da ANVISA e o CBM foram publicados. A partir Desde 1931, a bula é exigida como documento
dessa data as empresas com as bulas divulgadas sanitário no pedido de licença e considerada um
nessas publicações liberariam no mercado as item obrigatório na concessão do registro. Há
bulas atualizadas em dois formatos: bula para muito é reconhecida por ter se tornado um meio
pacientes e bula para profissionais de saúde. A de informação importante sobre os medicamen-
resolução reafirma que as bulas padrões deve- tos, bem como por sua influência no consumo 18.
riam estar contidas nas embalagens dos lotes a As informações no texto não poderiam, e não po-
serem fabricados até o máximo de 180 dias. Além dem, diferir daquelas que a empresa comprovou
disso, a Resolução RDC n°. 126 17 aprovou as Nor- no ato do registro. Devido à intrínseca relação
mas Relativas ao Livre Licenciamento do CBM e entre o registro e a bula, a normatização de am-
do Bulário Eletrônico da ANVISA. Assim, estabe- bas era alterada praticamente ao mesmo tempo.
leceram-se regras para aqueles que quisessem Assim, à medida que as exigências para garantir
formular CBM. eficácia, segurança e qualidade dos medicamen-
Na 1a edição do CBM, de 2 mil exemplares, tos aumentavam, os itens obrigatórios das bulas
constam 572 bulas de medicamentos, que cor- cresciam, sejam na melhor descrição e definição
respondem a 288 princípios-ativos alopáticos como na criação de novos itens de informação.
e aproximadamente 270 de imunobiológicos A linguagem utilizada sempre representou
distribuídos em dois volumes, em um total de 4 grande dificuldade para o leigo. O leitor se depara
mil páginas impressas. O Bulário Eletrônico da com uma escrita técnica que pouco ou nada lhe
ANVISA foi concebido para ser um banco de da- “comunica”, sendo considerada esta uma falha
dos acessível via Internet aos profissionais de histórica na normatização e fiscalização dos ór-
saúde e à população, inclusive portadores de gãos governamentais responsáveis 3. No entanto,
deficiência visual, contendo as informações dos apenas em 1977, a necessidade de utilizar uma
textos de bula dos medicamentos registrados e linguagem acessível nas bulas veio a ser men-
comercializados no Brasil. Ao visar ao uso e à cionada na regulamentação, e somente em 2004
prescrição racional de medicamentos, o portal foram realizadas análises da linguagem utilizada
traz ainda matérias sobre educação em saúde, nas bulas ao paciente. Mesmo assim, permane-

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cem muitos vícios de linguagem e costumes a o lançamento do CBM e do Bulário Eletrônico


serem ultrapassados. da ANVISA em 2005, pouco movimento efetivo
Considerada como a principal fonte de in- foi observado para implementar a nova estrutura
formação aos pacientes 4, a bula assume um pa- de bula em todos os medicamentos comerciali-
pel fundamental na promoção do uso racional zados no Brasil. Até o momento não foram en-
de medicamentos. Ao alertar sobre os riscos da viadas eletronicamente as bulas de medicamen-
automedicação, da interrupção do tratamento, tos genéricos e similares. Conseqüentemente,
bem como quanto à necessidade da prescrição, o trabalho de padronização da informação fica
no tocante à dispensação de medicamentos prejudicado e o impacto sobre a informação de
tarjados, está consoante ao processo educativo medicamentos, reduzido. Assim, a legislação,
dos usuários, um dos pontos que merece ênfase o E-bulas, o Bulário Eletrônico da ANVISA e o
segundo os propósitos da Política Nacional de CBM precisam ser revisados, pois representam
Medicamentos 19. um poderoso instrumento de disseminação de
A bula pode e deve ser um instrumento pa- informação sobre medicamentos.
ra a cidadania, pois empodera o indivíduo ao Outros pontos a considerar, o Bulário Ele-
informá-lo sobre o uso do medicamento e, ao trônico da ANVISA disponibiliza apenas a últi-
fazê-lo, contribui como instrumento para que a ma bula atualizada no E-bulas e aprovada pela
relação entre médico-paciente seja alterada pela equipe do Projeto Bulas, permitindo um vácuo
capacidade de questionamento do paciente 20. entre a publicação da bula e da comercialização
Por sua vez, o profissional deverá conhecer mais do medicamento com o novo modelo. O CBM,
profundamente o medicamento, de tal forma a por ser volumoso e apresentar bulas de apenas
convencer que o tratamento farmacológico trará alguns medicamentos, não foi distribuído em
naquele caso mais benefícios que riscos. Entre- grande escala; foram editados 2 mil exemplares.
tanto, deve-se mencionar que o número de bulas Sendo assim, o conceito de livro impresso deve
publicadas no Bulário Eletrônico da ANVISA e no ser revisto se o objetivo é aumentar o alcance da
CBM ainda é pequeno. informação.
No campo da vigilância sanitária, desde a Finalmente, é inegável a evolução no cuida-
criação do SNFMF se observam tentativas na pa- do com que a legislação trata as bulas de medi-
dronização das informações contidas em medi- camentos nesse período analisado. Entretanto,
camentos com os mesmos princípios ativos. Os desde maio de 2005, após a publicação das bulas
instrumentos normativos específicos para clas- padrões, não foram eleitos novos “medicamen-
ses terapêuticas ou substâncias ativas publicados tos padrão para texto de bula” nem foram publi-
entre 1950 e 1972, demonstram essa tendência. cadas as bulas de medicamentos genéricos e si-
Entretanto, é importante destacar que a lista de milares. Isso pode prejudicar consideravelmente
medicamentos padrão para texto de bula não é a implantação do novo paradigma, sendo alto o
atualizada desde 2003, apesar do Ministério da risco o Projeto Bulas ser desacreditado e a Re-
Saúde determinar como meta, no Plano Nacional solução RDC n°. 140 ser considerada mais uma
de Saúde 21, disponibilizar pela Internet 11 mil tentativa de padronização, com roupagem con-
apresentações de medicamentos até 2007. Após temporânea, mas sem continuidade.

Resumo

No Brasil, a bula é usada como fonte de informação nal e Sistema de Legislação da Saúde – Saúde Legis. A
sobre medicamentos. O estudo desenvolveu uma aná- bula tornou-se um importante veículo informativo no
lise de sua evolução histórica, procurando observar a Brasil, passou por profundas transformações regula-
influência do desenvolvimento científico, da globa- mentares na segunda metade do século XX. Entre 1946
lização da informação e das diferentes políticas de e 2006 o número de itens obrigatórios aumentou e sua
saúde. Procedeu-se uma revisão retrospectiva da legis- descrição aprofundou. Entretanto, a padronização da
lação sanitária brasileira até 1920, ano da instituição informação para os medicamentos com o mesmo prin-
do Departamento Nacional de Saúde Pública. A aná- cípio ativo não se efetivou, não obstante sua impor-
lise documental sobre a evolução da regulamentação tância e apesar das diferentes iniciativas observadas
sanitária no Brasil se iniciou pela Coleção Farmácia nas normas legais.
Brasileira – Portarias Sanitárias. Na segunda etapa as
normas foram pesquisadas nos portais: VISALEGIS – Bulas de Medicamentos; Legislação Sanitária; Vigilân-
Legislação em Vigilância Sanitária, Portal de Legisla- cia Sanitária
ção do Sistema de Informações do Congresso Nacio-

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 24(4):737-743, abr, 2008


EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS BULAS DE MEDICAMENTOS NO BRASIL 743

Colaboradores

T. R. Caldeira, E. Perini e E. R. Z. Neves contribuíram


substancialmente para a concepção e planejamento, ou
análise e interpretação dos dados, e significativamente
na elaboração do rascunho e na revisão crítica do con-
teúdo, além de participarem da aprovação da versão
final do manuscrito.

Referências

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me de rótulos e bulas de produtos farmacêuticos, ciamento do Compêndio de Bulas de Medicamen-
produtos oficinais, dietéticos, cosméticos, de higie- tos e do Bulário Eletrônico. Diário Oficial da União
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dos quanto à ordem e conteúdo. Diário Oficial da camentos (CBM) e a disponibilização do Bulário
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