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Direito Bancário

(resumos do programa da professora


Joana Farrajota com base nas aulas,
no PW e no manual do professor
Menezes Cordeiro)
Fabiano Saccone

1. Enquadramento do Direito Bancário

O direito bancário é direito privado (enquanto subsistema coerente), assenta em


contratos comerciais, em cláusulas contratuais gerais e, mais latamente, na autonomia
das partes. Os intervenientes na relação bancária apresentam-se em igualdade formal.
Finalmente, um direito bancário privado é o pressuposto de uma sociedade de tipo
liberal, assente na propriedade privada e na livre circulação. Destaca-se também o
caráter privado das suas instituições, na maioria, sociedades anónimas (14/1/b) RGIC),
titulares de deveres de natureza estritamente privada (competência técnica 73), o dever
de informação (75) e o dever de segredo (78 a 84). Os conceitos bancários são
elaborados pelo direito civil, sendo que a maioria das regras, esquemas e soluções
advêm do código civil ou de normas materialmente civis e comerciais. No plano
institucional surge no âmbito da supervisão, com o exercício de poderes discricionários,
regulados por normas de direito público, embora não seja este o nosso foco, mas sim o
direito bancário material, ou seja, as normas de direito privado que regulam a atividade
desenvolvida por estas instituições com os seus clientes, nomeadamente os contratos
que estas instituições (maioritariamente os bancos) celebram com os seus clientes.
A situação típica a partir do qual se estruturam as realidades jurídico-bancárias é a
de um relacionamento duradouro entre o banqueiro e o seu cliente, em cujo decurso se
inscrevem os mais diversos atos: abertura de conta, emissão de cheques, depósitos em
dinheiro, emissões de cartões bancários, etc. É a relação bancária geral.
O relacionamento bancário inicia-se em regra com o contrato de abertura de conta
(contrato bancário geral), sendo que se as partes já concluíram este negócio, uma
relação duradoura dele subsequente e com a vontade comum de completar essa relação
com outros negócios, há uma clara fenomenologia contratual. É certo que desta relação
bancária, não resulta, para nenhuma das partes, o dever de celebrar novos contratos:
qualquer uma das partes pode, a todo o tempo, pôr termo à relação; o novo negócio que
uma das partes propunha à outra, pode ser objeto de livre rejeição.
Os contratos bancários, são um suporte típico, abrange figuras heterogéneas,
embora a mais relevante seja o contrato de abertura de conta que deriva da adesão a
determinadas cláusulas “condições” contratuais gerais preconizadas ou utilizadas pelo
banqueiro, sendo que, estas definições gerais, definem-se como aplicáveis à abertura, à
movimentação, à manutenção e ao encerramento das contas depósito junto do banco;
não obstante elas reportam-se a um contrato que denominam “contrato de abertura de
conta”: do ponto de vista dogmático enquadre-se na figura do contrato-quadro (contrato
mãe), em regra são contratos de adesão e reais quanto à constituição (em regra, a
própria celebração do contrato de abertura de conta pode depender de um depósito
inicial) – cabe, por fim, sublinhar que a primazia do contrato de abertura de conta como
fone da relação bancária geral subjacente foi acolhida no ordenamento português no
aviso do BdP n.º11/2005 (preambulo).

i. Direito fragmentário e dependência científica


No direito bancário, encontramos alguns (poucos) institutos que dispõe, no seu
nível, de regimes bastante complexos: serão os casos da abertura de conta. Do desconto
ou de outras garantias. Em regra, porém, isto não sucede: o direito bancário recorre a
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institutos preexistentes civis ou comerciais, cuja regulação acolhe quase na íntegra,


introduzindo, depois, alguns traços especificamente “bancários”. O mútuo bancário é no
fundamental, um mútuo civil: apenas haverá que, neste, introduzir algumas adaptações.
O direito bancário nunca deve descurar o direito civil e o direito comercial:
 O direito bancário é uma simples especialização de institutos civis e
comerciais, cuja regra, no essencial, utiliza.
 Temos uma delimitação vertical entre o direito bancário e comercial
 Uma delimitação horizontal com os seguros e com os valores mobiliários.
 O direito comercial adquire uma natureza geral relativamente ao direito
bancário material – artigos 362 e 365 CSC
o 362 CSC – considera comerciais todas as operações de bancos
tendentes a realizar lucros (...) nº3 refere uma integração entre os
contratos bancários e os contratos comerciais.
 Ainda que em medidas diferentes, quer o direito bancário, quer o direito
comercial são marcados ontologicamente por notas de fragmentação do
respetivo tecido normativo, situação que acaba por desembocar numa
dependência científica de ambos relativamente ao Direito civil.

ii. Situação jurídica bancária: Operações bancárias 362 CCom. e 4


RGIC
Uma situação jurídica é bancária sempre que releve enquanto regulada pelo direito
bancário material.
Em regra, é possível afirmar que as situações jurídicas bancárias são
patrimoniais, contratuais e onerosas. Perante o disposto no 362 CCom. as situações
bancárias – já de si subjetivamente comerciais, são ainda, objetivamente comerciais- daí
resulta a aplicação às situações bancárias, do regime geral dos atos comerciais. São
operações bancárias as celebradas através de contratos (operação mais comum) entre
banco e cliente. O 362 parece chamar à solução um critério estritamente subjetivo:
operação bancária é qualquer contrato celebrado por bancos, porém isto está claramente
incompleto, pois um banco pode por exemplo celebrar um contrato de trabalho, um
contrato de cathering, um contrato de arrendamento, etc. que embora celebrado por um
banco não é um contrato bancário. Teremos que juntar-lhe um critério de natureza
objetiva, ou seja, não só pela intervenção do banco como também no âmbito das
funções da atividade bancária - atividade estas que se encontram definidas RGIC:
As operações bancárias classificam-se como:
 Fundamentais/acessórias
o Fundamentais: são as que estão elencadas no 4 RGIC - especifica as
atividades que os bancos podem desenvolver - o nº2 deste artigo
menciona as restantes operações de crédito, numa definição pela negativa
- numa cláusula aberta – al. s) “outras operações que a lei não proíba” –
como se vê, está e uma lista exemplificativa.
o Acessórias: estas não são definidoras da instituição de crédito enquanto
tal, são acessórias a esta atividade, estão meramente conexas com a
atividade desenvolvida pelo banco, não se relaciona nem com a receção

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de poupança nem com a emissão de crédito - será um exemplo típico os


cofres que os bancos disponibilizam.
 Ativas/passivas/neutras
o São passivas: quando o banco se encontra na posição de devedor (ou
seja, no momento em que o banco recebe o dinheiro do cliente)
o São ativas: quando o banco empresta o dinheiro, emite crédito. O banco
encontra-se na posição de credor.
o São neutras: não há um contrato de mútuo celebrado entre o banco e o
cliente, os serviços prestados não passam pela concessão de crédito.

Igualmente importante será referir que a operação bancária (ou qualquer ato
bancário), deve ser física e legalmente possível 280/1 CC. A determinabilidade do
ato também é fulcral, obrigando a recordar a distinção entre atos indeterminados e atos
indetermináveis. No primeiro caso, encontramos uma atuação desconhecida, aquando da
celebração do negócio, mas dotada de elementos que podem proporcionar a sua
determinação, antes do cumprimento; é o que sucede nas hipóteses do 400
“determinação da prestação” e 883 “determinação do preço” CC. No segundo, o ato é
indeterminável, porquanto, na celebração, não é, de todo, configurável a feição que ele
irá assumir no final (trata-se de um ato aleatório), pode facultar largas margens de
arbítrio e que pode ser inclusive configurado como uma doação de bens futuros, vedada
pelo 942/1 CC. A jurisprudência portuguesa tem vindo a invalidar negócios bancários
de conteúdo indeterminável.
O 281 CC configura a hipótese de apenas o fim do negócio jurídico ser
contrário à lei ou à ordem pública ou ofensiva dos bons costumes. Nessa
eventualidade, o negócio apenas seria nulo quando o fim fosse comum a ambas as
partes (a doutrina e a jurisprudência apontam numa lógica de não ingerência, por parte
do banqueiro, nos negócios do seu cliente, o que beneficia tanto o cliente como o
banqueiro que não se vê responsabilizado por finalidades que devia desconhecer).

iii. Sujeitos da atividade bancária

Hoje em dia, segundo o RGIC, temos uma divisão tripartida dos sujeitos:
instituições de crédito; sociedades financeiras; e “empresas de investimento” – já o
Ccom. no art. º362 refere-se simplesmente os “bancos”.
1. Instituição de crédito 2/w RGIC “noção”: “a empresa cuja atividade consiste em
receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder
crédito por conta própria;”
a. 3 RGIC Tipos de instituições de crédito: os bancos; as caixas
económicas; a caixa central de crédito agrícola mútuo e as caixas de
crédito agrícola mútuo; outras empresas que, correspondendo à definição
do artigo anterior, como tal sejam qualificadas pela lei;
b. 4/a) RGIC atividade que é exclusiva das instituições financeiras. Al. b) a
i), p), g), r) podem ser realizadas pelas instituições de crédito e pelas
sociedades financeiras.
i. A caixa geral de depósitos possui algumas especificidades
relativamente ao exercício da sua função (social e de interesse
público) – art. º3 do DL 287/93

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ii. As caixas económicas e as caixas de crédito agrícola mútuo


também têm escopos muito próprios regulados no DL 190/2015 e
DL 24/91, respetivamente.
2. Sociedades financeiras 2/kk RGIC “noção”: as empresas, com exceção das
instituições de crédito, cuja atividade principal consista em exercer pelo menos
uma das atividades permitidas aos bancos, com exceção da receção de depósitos
ou outros fundos reembolsáveis ao público, incluindo as empresas de
investimento e as instituições financeiras referidas na subalínea ii) da alínea z).
a. 6 RGIC “tipos de sociedades financeiras”
3. Empresas de investimento 2/r RGIC: as empresas cuja atividade habitual se
inclua na prestação de um ou mais serviços de investimento a terceiros ou o
exercício de uma ou mais atividades de investimento e que estejam sujeitos aos
requisitos previstos na Diretiva n.º 2004/39/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 21 de abril de 2004, com exceção das instituições de crédito e das
pessoas ou entidades previstas no n.º 1 do artigo 2.º da mesma diretiva.
a. 4A RGIC “tipos de empresas de investimento”
A pessoa que contacte com o banqueiro é, tradicionalmente, designada “cliente
do banqueiro” ou “cliente bancário”. A atividade bancária pelo prisma do cliente é,
hoje, pura e simplesmente instrumental. Pode ser cliente qualquer pessoa, singular ou
coletiva, que tenha capacidade patrimonial privada (observando os respetivos estatutos
internos). Enquanto atividade instrumental, a contratação bancária é sempre idónea para
a prossecução de fins societários (abrangida pelo 6/1 Ccom.). A distinção essencial
prende-se com o cliente consumidor e cliente não consumidor.

iv. Deveres gerais: deveres de competência, de adequação e de


eficiência.
Estes deveres abrangem tanto a fase pré-contratual, contratual e pós-contratual,
decorrente do princípio da boa-fé que também é transversal a qualquer fase do contrato,
principalmente por estarmos perante contrato(s) de execução duradoura, intensificando
os deveres de conduta que vinculam as partes. Para que estes deveres se possam
considerar verdadeiras normas de conduta, fontes de direitos para os clientes terão de
ser completados por outras regras, de natureza legal ou contratual, de modo a dar azo a
verdadeiros direitos subjetivos ou, pelo menos, a regras precisas de conduta, suscetíveis
de, quando violadas, induzirem responsabilidade bancária.
 Dever de competência técnica 73 RGIC: dá azo aos deveres de qualidade e
eficiência. Esta norma é importante pois a atividade bancária é dominada por
parâmetros tecnológicos e culturais em permanente ascensão. Podemos apontar:
exigências físicas; exigência de serviço; exigências bancário-culturais; entre
outras.
 Outros deveres de conduta 74 RGIC
 Critério de diligência 75 RGIC: segundo a doutrina recai sobre a instituição no
seu todo e não só aos cargos de chefia e direção, são normas que carecem de
concretização, de forma a gerar verdadeiros direitos do cliente sobre o banco:
aponta para a bitola do banqueiro criterioso e ordenado.
 Dever de informação e assistência 77 RGIC: no direito bancário, a informação
requerida aos bancos é, no essencial, de tipo técnico-jurídico. Esta informação
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contempla, em geral, a situação de especial carência, em que se encontre o


cliente bancário. Além do atinente, principalmente, a questões jurídicas, ela deve
ater-se ao essencial de modo a poder ser útil. Podemos entender que o banqueiro
deve desenvolver uma certa atuação pedagógica, junto dos clientes: uma postura
reforçada pela crise 2009/2014. Esta atuação poderá determinar conflitos de
interesse, no limite, há produtos que o banqueiro coloca junto do cliente, que
nunca encontrariam contraparte se tudo fosse informado.
o Ónus de prova do dever de informação: pelas regras gerais, quem
invoque o direito à informação deve provar os respetivos factos
constitutivos 341 CC (a ignorância do próprio cliente e o conhecimento
do banqueiro).
o Fontes do dever de informar
 227/1 CC quanto à culpa in contrahendo
 573 CC sobre a obrigação legal de informação.
 5 e 6 LCCG sempre que o negócio projetado se conclua por
adesão a CCG.
 9/1/a) e b) DL 57/2008 que proíbe a omissão ou a insuficiência
de informação como prática comercial enganosa, e como tal,
vedada.
 Especificamente sobre preceitos bancários temos o 77 RGIC
 Relativamente à publicidade temos em particular o aviso 10/2008
e 8/2009 do BdP.
 Dever de segredo 78 e seguintes RGIC: diz-se obrigação de sigilo ou segredo o
dever de não revelar determinados conhecimentos ou informações. Trata-se de um
dever de non facere embora o seu cumprimento pode exigir atuações positivas. No
campo contratual, o dever de segredo, é, à partida, um dever acessório, cominado
pela boa-fé. O dever de segredo visa proteger reserva da intimidade da vida
privada (26 CRP). O direito bancário acompanha quase todas as operações
patrimoniais da pessoa, ou seja, a conta bancária espelha a vida patrimonial
privada do cliente, sendo por isso, tutelada pela reserva da vida privada. O acórdão
do TC 442/2007 entende por exemplo que uma pessoa coletiva não tem vida
privada não se consagrando um dever de segredo no âmbito da reserva da vida
privada para as PC. O segredo também estabeleceria uma vantagem para o
desenvolvimento e estabilidade do sistema financeiro, pois estabeleceria uma
confiança entre o banco e cliente STJ Nº2/2008.
 Responsabilidade por violação do segredo: previsto no 84 RGIC e 195,
196 CP
 O afastamento do dever de segredo bancário é muito relevante no
combate ao branqueamento de capitais, financiamento ao terrorismo e
evasão fiscal sendo que, será sempre, à luz do 335 CC “colisão de
direitos” que teremos que ponderar em concreto quando e como afastar
o o dever de segredo
 Exceções ao dever de segredo 79 RGIC
 Nº1 “Os factos ou elementos das relações do cliente com a
instituição podem ser revelados mediante autorização do cliente,
transmitida à instituição.” – Não se trata de uma exceção, mas
sim de uma questão de consentimento, “cada pessoa é senhora do

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seu segredo”. Este é um direito disponível sendo que não há


dúvida sobre a admissibilidade do consentimento.
 Nº2 Fora do caso previsto no número anterior, os factos e
elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser
revelados:
 A) ao BdP, no âmbito das suas atribuições: remetemos
para o 93, 80, 120 RGIC
 B) à CMVM no âmbito das suas atribuições: remetemos
para o 353 e 354 CVM
 C) ao fundo de garantia de depósitos no âmbito das
respetivas atribuições: 155 RGIC
 C)) (…) ao sistema de indemnização de investidores:
remetemos para o DL 222/99.
 C) (…) ao fundo de resolução: 153 RGIC
 E) à autoridade tributária: 63/2/3 e 63C LGT
 Quando exista outra disposição legal que expressamente
limite o dever de segredo: 780 CPC, 145 RGIC.
 D) autoridades judiciárias: durante muito tempo não
houve dever de segredo perante o segredo penal,
finalmente foi positivado pela lei 36/2010, de 2 setembro,
lei esclarecida pela jurisprudência para entender a
extensão deste alcance (Acórdãos TRG 10.3.2011 e
14.11.2011 e TRL 14.9.2011)
 O Incidente jurisdicional de quebra do segredo
417 CPC - toda a gente tem de colaborar exceto no
caso de recusa devido a segredo profissional (onde
se inclui o sigilo bancário), sendo que o nº4 porém
remete para o 135 CPP. O acórdão STJ 2/2008 de
fixação da jurisprudência vem explicitar o âmbito
de aplicação do 135.
 Exemplos de decisões de quebra do segredo por
tribunais superiores:
 TRL 20.11.2014; 19.6.2014; 12.5.2009;
13.9.2012; 9.7.2014; TRC 28.4.2015; TRP
29.11.95

O conteúdo bancário deve ser conforme com os bons costumes e a ordem


pública 280/2 CC, abrangendo duas áreas: a das regras de comportamento pessoal,
sexual e familiar; a dos códigos de conduta deontológicos, a observar em determinadas
profissões. Os códigos de conduta exprimem uma deontologia bancário que autolimita
o banqueiro. A inobservância de regras deontológicas significativas é indutora de
nulidade, por via da violação da regra dos bons costumes 280/1 CC.

v. As cláusulas contratuais gerais


Historicamente, as primeiras cláusulas contratuais gerais utilizadas no tráfego
jurídico filiam-se, precisamente, na atividade dos banqueiros, com especial relevância
na banca alemã, a primeira que incorporou um sistema de cláusulas contratuais gerais
comuns em 1937. Hoje a generalidade dos contratos bancários são contratos de adesão
no qual se inserem cláusulas contratuais gerais. Com base nesta experiência, cabe
analisar a sua concreta dogmática básica- as cláusulas contratuais gerais são um
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conjunto de proposições pré-elaboradas que proponentes ou destinatários


indeterminados se limitam a propor ou aceitar.
Caracterizam-se por dois elementos essenciais:
a. A generalidade: as cláusulas contratuais gerais destinam-se ou a ser
propostas a destinatários indeterminados ou a ser subscritas por
proponentes indeterminados.
b. A rigidez: as cláusulas contratuais devem ser recebidas em bloco por
quem as subscreva ou aceite; os intervenientes não têm a possibilidade
de modelar o seu conteúdo.
MENEZES CORDEIRO aponta outras características que não sendo essenciais,
surgem, contudo, com frequência nas cláusulas contratuais gerais:
c. A desigualdade entre as partes: o proponente goza em regra de larga
superioridade económica e jurídico-científica em relação ao aderente.
d. A complexidade
e. A natureza formulária: as cláusulas constam, com frequência, de
documentos escritos extensos onde o aderente se limita a especificar
escassos elementos de identificação.
As cláusulas contratuais gerais constituem um modo específico de formação dos
contratos pelo que subentende que a mera aplicação das regras que funcionam para a
comum negociação é injusta e inconveniente: equivale a tratar de modo igual o que tem
diferenças.1 Foi a partir deste entendimento que primeiramente a doutrina e depois a
jurisprudência foram conquistando aspetos cruciais, como a exclusão de cláusulas não-
cognoscíveis ou a condenação de cláusulas despropositadas. Entendeu-se desde cedo
que a mera consciencialização do aderente, aquando da adoção de cláusulas contratuais
gerias, é importante, mas surge insuficiente. Mesmo quando desconhecedor das
desvantagens em que, eventualmente, possa incorrer, o aderente, tende a ser levado a
subscrever ou a aceitar cláusulas contratuais gerais que se lhe apresentem, seja por
necessidade, seja na esperança de não se deparar com quaisquer problemas que o
obriguem a procurar apoio no texto do contrato – certas cláusulas são intrinsecamente
injustas ou inconvenientes (pela sua elaboração ou apresentação).
A consequência da inclusão de uma cláusula com conteúdo proibido é a sua
nulidade 12 LCCG. Todavia o contrato permanece (princípio da conservação do
negócio jurídico): A lei permite que o contrato permaneça ou não, mas com uma
novidade: o aderente pode optar pela manutenção do contrato, apesar da nulidade de
algumas das cláusulas – art. 13.º. Note-se que a opção do aderente é entre a subsistência
do contrato integrado nos termos do art. 239.º do Código Civil e o regime geral da
redução do negócio jurídico, previsto no art. 292.º; isto é, o aderente não tem a
liberdade de escolha entre a manutenção ou não do contrato, pois se a faculdade do art.
13.º não for exercida vigora o regime da redução dos negócios jurídicos – art. 14.º. No
entanto, a doutrina 2tem entendido que não se deve proceder à redução de cláusulas

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Doutrina de Coimbra – Retirado das aulas de Direito das obrigações I - Calvão da Silva

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parcialmente inválidas: uma coisa é a redução do contrato, art. 14.º, outra é a redução
das cláusulas. Se fosse possível a redução das cláusulas, estaríamos a premiar o infrator.

2. O contrato de abertura de conta (relação bancária geral,


continuação…)
A abertura de conta é um contrato celebrado entre o banqueiro e o seu cliente, pelo
qual ambos assumem deveres recíprocos relativos a diversas práticas bancárias. Trata-se
do contrato que marca o início de uma relação bancária complexa e duradoura, fixando
as margens fundamentais em que ela se irá desenrolar: ele opera como um ato nuclear
cujo conteúdo constitui, na prática, o tronco comum dos atos bancários subsequentes
(nas palavras da professora trata-se de um contrato quadro que conforma a relação
geral). Como por vezes sucede com os elementos mais básicos, o papel da abertura de
conta passa despercebido: muitas vezes era confundido com o uma vulgar conta
corrente, ou com o depósito bancário.

Hoje o reconhecimento da aberta de conta corresponde a um claro tipo social,


obtendo o seu reconhecimento oficial pelo Aviso n.º11/2005, de 21 de julho, do BdP,
hoje substituído pelo Aviso n.º5/2003, de 11 de dezembro.

A abertura de conta não dispõe de qualquer regime legal explícito: assenta, no


essencial, nas cláusulas contratuais gerais dos bancos e dos usos bancários.
Tratando-se de um contrato de adesão possui um conteúdo mínimo necessário e um
conteúdo eventual.

 Conteúdo necessário
o Depósitos bancários (contrato de depósito à ordem3)
o Regulação da conta-corrente bancária: ficam assentes os termos em
que a conta, em termos de crédito e débito, é movimentada.
o Regulação do giro bancário: prevêem-se as regras sobre os seus
movimentos
 Conteúdo eventual
o Convenção de cheque
o A emissão de cartões
o A concessão de crédito por descobertos em conta

Quanto à titularidade, a conta pode ser individual ou coletiva, consoante seja


aberta em nome de uma única ou de várias pessoas (contitularidade de conta):

 Conta solidária: qualquer um dos titulares pode movimentar sozinho e


livremente a conta;

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Sobre a natureza deste contrato prenunciar-me-ei mais para a frente. Fica só a nota que para MENEZES
Cordeiro este pode ser um negócio consensual que só produza efeitos obrigacionais.

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 Conta conjunta: só pode ser movimentada por todos os seus titulares, em


simultâneo (com autorização de todos os contitulares)
 Conta mista: alguns dos titulares só podem movimentar a conta em conjunto
com outros (comum nas contas para menores).

Relativamente à natureza jurídica, trata-se de um contrato misto socialmente


atípico e com uma função nuclearmente bancária. Para MENEZES CORDEIRO, o seu
“centro de gravidade” deverá ser localizado na prestação de serviços (prestação, ao
cliente, de um serviço bancário muito especializado e que apenas pode ser
disponibilizado pelo banqueiro), já para FERREIRA DE ALMEIDA estabelece o
núcleo no contrato de conta corrente comercial. O regime do mandato será sempre a
última instância a que podemos aqui, pedir normas supletivas. A partir daí: ou há lacuna
no contrato; ou há lacuna na lei – seguir-se-ão, conforme os casos, os regimes dos
artigos 239º CC “integração” dos negócios jurídicos.

Quanto ao Direito à conta (serviços mínimos bancários), é hoje ponto assente


não existe obrigatoriedade de conceder crédito. Já no que toca ao direito à abertura de
conta estamos perante um conflito entre um meio insubstituível de conseguir
determinados serviços e a liberdade do banqueiro. Movido por preocupações de tutela
do consumidor, está hoje em vigor a Lei n. º266/2015 de 6 de julho relativa aos serviços
mínimos bancários.

I. A conta corrente bancária


A conta-corrente bancária é uma espécie de conta-corrente comum, que se integra,
com outros elementos, num contrato de abertura de conta. Do ponto de vista legislativo
não existe a conta-corrente bancária, mas existe sim, a conta-corrente comercial 344
Ccom. sendo que podemos, de forma restrita, dizer que a conta-corrente bancária é
uma conta-corrente comercial, mas celebrada entre o banqueiro e o seu cliente e
incluída num negócio mais vasto: a abertura de conta.
A conta-corrente comercial é o contrato pelo qual as partes se obrigam em
inscrever num registo contabilístico os débitos e os créditos que surgem em negócios
futuros que venham a celebrar, de forma a que só o saldo final seja exigível (na
liquidação). Caracteriza-se pela simplificação das relações entre as partes,
principalmente porque o credor da conta corrente vai ser satisfeito preferencialmente
(sem concurso) sobre os demais credores.
A recondução da conta-corrente bancária à conta-corrente comercial é, porém,
discutida: enquanto na cc comercial só se pode exigir o saldo no termo da conta
corrente (na liquidação) na cc bancária há uma exigibilidade contínua – este elemento
essencial, defende a maioria da doutrina, extingue a conexão com a cc comercial. Para
JOANA FARRAJOTA e FERREIRA DE ALMEIDA esta conexão não se extingue,
defendem que o cerne da conta corrente ser sim a compensação e a instrumentalidade do
contrato, elementos que se continuam a reconduzir para a cc comercial.
Os principais efeitos são por isso:
 A transferência da propriedade do crédito para a pessoa a que se debita

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 A compensação recíproca: até à concorrência dos respetivos créditos e


débitos até ao encerramento da conta corrente – é este mecanismo que
permite a extinção dos créditos.
 Vencimento de juros das quantias creditadas: o juro do saldo só começa a
vencer a partir do momento do encerramento da conta e da liquidação.

II. O giro bancário


O giro bancário é o conjunto das operações escriturais de transferência de fundos
(movimentação do dinheiro em torno do banco), realizados por um banqueiro, a pedido
do seu cliente ou a favor dele. *É o contrato pelo qual o cliente regula a sua situação
com o banco relativamente a estes movimentos de dinheiro. O contrato de giro bancário
deriva de um contrato abertura de conta, cujo conteúdo integra, como elemento
necessário, sendo que, também lhe está inerente uma conta-corrente bancária. A partir
daí, ele faculta, ou pode facultar, as operações seguintes:
 Transferências bancárias simples: deslocação de fundos de uma conta
bancária para uma conta diferente, dentro do país. Normalmente não há
indicação de causa.
 Transferências internacionais
 Pagamentos por conta bancária
 Outras operações de transferência de fundos
As vantagens do giro bancário focam-se principalmente: na segurança (dinheiro
escritural não pode ser furtado); ajuda os clientes (suporte informático); prova infalível
dos fundos efetivamente deslocados e da data em que isso tenha ocorrido; num conjunto
de suportes técnicos chamado de sistemas de pagamento.
Relativamente ao regime jurídico, o giro bancário não decorre automaticamente
da abertura de conta, há uma “convenção de giro”, implícita na abertura de conta, pela
qual o banqueiro põe à disposição dos seus clientes os produtos derivantes do giro
bancário. A convenção implícita resulta das CCG, que embora pouco explícitas,
referem, de todo o modo, a ocorrência de débitos e créditos nas contas, sendo que a
convenção, em qualquer caso, resulta dos diversos atos que depois a executem.
 O regime jurídico de cada operação, nas relações com o banqueiro, é
marcado pela abstração: não releva a fonte ou a causa da operação.
 A unilateralidade das ordens do banco.
 A sua natureza de mandato sem representação.
 A legislação aplicável - DL 317/2009 e DL 18/2007: Art.º 75 e seguintes,
definem qual é o tempo que vai mediar entre a ordem de cumprimento da
obrigação e a data de liquidação dos fundos; Art. º85 e seguintes, a
responsabilidade do banco em caso de erro nas operações, etc.

III. O depósito
i. O depósito comum 1185
Vem definido como “o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma
coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde e restitua quando for exigida”. O nosso
código entendeu adotar a definição do código italiano, introduzindo-se na nossa

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argumentação doutrinal, nomeadamente PIRES DE LIMA A ANTUNES VARELA, a


natureza real quanto à constituição do contrato de depósito. Alguns autores Italianos
admitem, porém, a possibilidade de se poder celebrar um depósito consensual (contrato
atípico), solução que temos vindo a preconizar, de resto, em relação aos diversos
contratos reais quanto à constituição. Salienta-se que outra parte da doutrina aceita a
celebração do negócio consensual, entendendo, porém, que aí, se trate de um contrato
promessa de depósito.
Os elementos caracterizadores do depósito comum são:
 A guarda/custódia da coisa depositada 1190: o depósito é um contrato
intuito personae (assente na confiança), sendo que a obrigação de
custódia assume um dever de resultados e não de meios – caso o
resultado não seja alcançado presume-se a culpa do depositário.
 A obrigação da restituição da coisa com os seus frutos: temos aqui uma
restituição por equivalente pela coisa depositada ser fungível.
o 1192/1 a restituição opera ex contractu (o depositário não pode
recusar a restituição da coisa com o fundamento de que o
depositante não é o verdadeiro titular.
o 1194 o prazo presume-se a favor do depositante, podendo a todo
o tempo – e mesmo havendo prazo – pedir a imediata restituição
da coisa (com as devidas exigências do 1195 e 1196)
 A avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo
ameaça a coisa ou que terceiro se arroga em direitos em relação a ela,
desde que o facto seja desconhecido do depositante.
 O depositário não pode usar a coisa nem subdepositá-la, sem autorização
do depositante 1189.

Relativamente aos efeitos, ao contrário do contrato de mútuo, o contrato de


depósito só produz efeitos obrigacionais, não há transmissão da propriedade - com a
exceção do depósito irregular.
Quanto à titularidade, a conta pode ser individual ou coletiva, consoante seja
aberta em nome de uma única ou de várias pessoas (contitularidade de conta):

 Conta solidária: qualquer um dos titulares pode movimentar sozinho e


livremente a conta;
 Conta conjunta: só pode ser movimentada por todos os seus titulares, em
simultâneo (com autorização de todos os contitulares)
 Conta mista: alguns dos titulares só podem movimentar a conta em conjunto
com outros (comum nas contas para menores).

ii. O depósito irregular 1205 e seguintes


O Contrato de depósito irregular é definido no 1205 como o “…que tem como
objeto coisas fungíveis”. Trata-se de uma definição deficiente: as partes podem
perfeitamente celebrar um depósito comum relativo a coisas fungíveis (como será o
exemplo de uma quantia em dinheiro) – trata-se aqui sim, de uma fungibilidade

12
Fabiano Saccone

subjetiva relativa à obrigação de restituição, ou seja, no depósito irregular não tenho que
devolver a mesma coisa, poderei devolver outra do mesmo género e qualidade.
Os elementos caracterizadores são os seguintes:
 O 1206 manda aplicar, ao depósito irregular, na medida do possível, as
regras do mútuo, ou seja:
o Quanto aos efeitos, ao contrário do depósito comum, este
produz efeitos reais, havendo a transferência da propriedade
para o depositário 1149. A razão de ser da entrega da propriedade
é o facto da obrigação de restituição ser fungível – há uma
impossibilidade prática da destrinça da coisa depositada no
património do depositário.
o Aplicam-se as regras da forma 1143
o O 1147 do prazo no mútuo oneroso, presumindo-se
estabelecido a favor de ambas as partes (e não a favor do
depositante), sendo que o mutuário pode “antecipar o pagamento,
desde que satisfaça os juros por inteiro”.
o Da falta de fixação de prazo 1148
o 1149 da falta de género não se tratando de dinheiro
o São inaplicáveis as regras relativas ao mútuo oneroso 1145 e
seguintes.
 Mantém a presunção de gratuidade do contrato de depósito.
 É um contrato misto: Não é um verdadeiro depósito (não se aplicam as
regras relativas ao dever de custódia) mas também não é um verdadeiro
mútuo (o mútuo visa o interesse do mutuário, que pretende gastar a coisa
e, eventualmente do mutuante, através da receção de juros; já o depósito
irregular visa o interesse do depositante para a conservação daquele
valor).
iii. Depósito mercantil 403 e seguintes Ccom.
O depósito é considerado mercantil quando “…seja de géneros ou de mercadorias
destinadas a qualquer ato de comércio” – trata-se de um ato objetivamente comercial.
Ao contrário do depósito comum, dá, como regra, azo à remuneração 404. No omisso
aplicam-se, ao depósito mercantil, as regras relativas ao depósito comum.
iv. Depósito bancário 408 Ccom. e Decreto-Lei n. º430/91 de 2 de
novembro; entre outras legislações avulsas
O 408 refere os depósitos feitos em bancos ou sociedades os quais “…reger-se-
ão pelos respetivos estatutos em tudo quanto não se achar prevenido neste capítulo e
mais disposições legais aplicáveis” – a menção aos “estatutos” deve ser convolada para
uma referência aos usos bancários. De todo o modo, definiremos depósito bancário
como: o depósito feito, em dinheiro, por um cliente – o depositante – junto de um
banqueiro – o depositário (MENEZES CORDEIRO); ou, o contrato pelo qual o
depositante entrega ao banco – o depositário – uma soma de dinheiro ou bens móveis de
valor, para que este os guarde e restitua quando o depositante solicitar (PAULA
CAMANHO).

13
Fabiano Saccone

O DL 430/91 de 2 de novembro, apresenta-se como aprovando o “regime geral


das contas de depósito” – distingue “depósitos de disponibilidades monetárias nas
instituições de crédito”, referindo as seguintes modalidades:
 Depósitos à ordem: exigíveis, a todo o tempo, pelo cliente;
 Depósitos com pré-aviso: são exigíveis apenas após um pré-aviso escrito,
feito com antecedência no contrato;
 Depósitos a prazo não reembolsável antecipadamente: são exigíveis no
fim do prazo para que foram acordados, as IC podem conceder uma
mobilização antecipada, nas condições acordadas: nada impede que o
banco possa acionar uma mobilização antecipada 1147 (aplicável ao
mútuo e consequentemente ao depósito irregular)
 Depósitos em regime especial:
o Depósitos em valor de cofre-forte
o Depósitos cerrados
o Depósitos de coisa controvertida
o Depósito Escrow (depósito com função de garantia)
o *depósito em processo executivo: não é um negócio jurídico
o *Consignação em depósito: não é um negócio jurídico.
 Diversa legislação especial fixa, ainda, outros tipos de depósito bancário.
Os diplomas falam em “contas”:
o Contas poupança-habitação DL 27/2001
o Contas poupança reformados DL 138/86
o Contas de emigrantes DL 169/2006
o Contras poupança-condomínio DL 269/94.
Já relativamente ao seu regime e natureza, trata-se de uma operação que
surge sempre associada a uma abertura de conta – perante depósitos à ordem podemos
falar numa única convenção de depósito (daí se confundirem).
 O depósito bancário à ordem tem sido considerado, entre nós, na
doutrina e sobretudo na jurisprudência, como um depósito irregular: o
banqueiro adquire a titularidade do dinheiro que lhe é entregue
(transferência da propriedade 1149 CC), sendo o cliente um simples
credor – a pedra de toque está na disponibilidade permanente de
saldo (como sucede no depósito comum). A corroborar este facto são as
decisões jurisprudenciais que fazem correr o risco a favor do banqueiro,
proprietário das importâncias. Para o professor FERREIRA DE
ALMEIDA (ente outra doutrina minoritária) estamos perante um mútuo.
 Já os depósitos a prazo distinguir-se-iam - teriam a natureza de mútuos
e não de depósitos irregulares. Na verdade, aí já falta a ideia de
restituição/disponibilidade, embora, qualquer banco admite a sua
mobilização antecipada ou o seu resgate, ainda que com a perda de juros
para o cliente (1147). Pois bem: nessa ocasião, um mútuo transformar-se-
ia em depósito irregular?
o Enquanto do ponto de vista formal parece-se descurar a finalidade
de guarda do depósito;

14
Fabiano Saccone

o Do ponto de vista material não parece haver problema algum. Na


prática mesmo que haja um vencimento antecipado nada impede
que o cliente bancário se dirija a outro banco para realizar o
depósito. Saliente-se que hoje em dia a função de guarda está
subvertida, sendo que o cliente bancário procura o depósito a
prazo com um objetivo de rentabilizar o seu dinheiro, vendo a sua
necessidade satisfeita com o reembolso antecipado dos juros.
v. Depósito de Escrow (com base na aula suplementar de 29 de
novembro)
Regulado pelo regime do depósito comum 1185, terá também como função
nuclear a obrigação de guarda e custódia, embora este, também exerça, uma função de
garantia, igualmente típica (ao contrário do que se podia pensar), basta ver os tipos
consagrados: depósito caução 623 e seguintes CC; 1193 “terceiro interessado no
depósito”; depósito de coisa controvertida; depósito com coisa a favor de terceiro
(modalidade do contrato a favor de terceiro).
Este é um contrato que nasce com base no modelo da common law do contrato a
favor de terceiro sujeito alternativamente determinado, ou seja, um terceiro que recebe
por parte das partes do contrato determinadas prestações que não iriam ser simultâneas,
mas deferidas no tempo. Esta falta de simultaneidade das prestações cria um impasse
pela falta de confiança entre as partes, fazendo com que se recorra a um depositário que
garanta a realização das prestações por ambas as partes, que desbloqueie o negócio,
responsável por só entregar as prestações convencionadas quando cada uma das partes
cumprisse a sua prestação (isto para contratos sinalagmáticos) – porém, as questões que
se levantam são: quem é responsável pelo incumprimento do depositário; que tipo
de garantia é prestada pelo depositário?
Como vimos, a função de garantia é típica em variados casos, isso significa que
o tipo de garantia de prestada dependerá do tipo de contrato celebrado entre as partes,
pelo que:
 No contato de caução a própria lei estabelece que o depósito caução pode
revestir a natureza de penhor, hipoteca ou fiança bancária.
 No depósito com interesse de terceiro, em regra, o depósito revestirá um
direito de retenção.
 No depósito em Escrow o tipo de garantia depende do caso concreto: no
exemplo do incumprimento do depositário que, por exemplo, recebida a
prestação de uma das partes, não a entrega quando é devido, à
contraparte, como contratualmente estabelecido, incumpre na sua
obrigação. Pergunta-se a quem é que o credor poderá recorrer para ver a
sua prestação satisfeita: ao depositário? Ao devedor “originário”? a
ambos em solidariedade? Depende.
o Se no momento de entrega da coisa ao depositário já existia o
vínculo obrigacional que obrigava o devedor à realização da
prestação (porque por exemplo a contraparte também já tinha
realizado a contraprestação correspondente, tornando-se esta
outra, exigível e sendo exigida) – não há aqui uma função de

15
Fabiano Saccone

garantia, pois aqui o ato de entrega da coisa correspondeu a uma


modalidade de cumprimento das obrigações. Neste caso o credor
só poderá ver satisfeito o seu crédito recorrendo ao depositário.
o Se no momento da entrega da coisa ao depositário não existia
algum vínculo obrigacional que obrigava o depositante (possível
devedor futuro) a entregar a coisa ao depositário, trata-se aqui de
uma assunção de dívida (595 CC) pelo beneficiário de uma
obrigação ainda não exigível. Estabelece o regime da assunção de
dívida que “a transmissão só exonera o antigo devedor havendo
declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor
responde solidariamente com o novo obrigado” – existe aqui
uma função de garantia, o credor poderá satisfazer o seu crédito
exigindo o cumprimento a ambos os devedores, que respondem
solidariamente.

IV. A compensação de créditos 847 CC

É um instituto geral do código civil cuja função é definida na doutrina: quando duas
pessoas sejam, reciprocamente, credor e devedor, qualquer uma delas pode livrar-se da
sua obrigação, através da compensação com a obrigação do seu credor, verificados que
estejam os pressupostos legais. O crédito da pessoa que invoca a compensação é o
crédito compensatório ou ativo; o da pessoa contra a qual ele seja invocado diz
compensado ou passivo. Efetivamente, os diversos mecanismos de contas-correntes,
dos pagamentos e das transferências, funcionam por via da compensação.
A compensação reveste 3 modalidades:
 Legal: opera automaticamente verificados os pressupostos legais da
compensação, porém esta modalidade não existe de forma pura no OJ
português, pois exige-se sempre declaração expressa do compensante pela
vontade de compensação 848/1. A declaração é um meio de eficácia, mas
não de validade, daí desencadear eficácia retroativa uma vez realizada – a
compensação vê-se como válida uma vez preenchidos os pressupostos
legais, operando a partir desse momento.
 Convencional: opera por contrato entre as partes (podem convencionar
efeitos automáticos, não se sendo necessária posterior declaração). Note-se
que o banqueiro pode, livremente, ajustar com o seu cliente a realização de
operações de compensação, fora de quaisquer requisitos legais: com
ressalva, todavia, das regras imperativas que, porventura, possam ocorrer –
A LCCG no artigo 18ºh) impede o afastamento da compensação legal. Não
veda a sua facilitação (ou seja, a modalidade convencional).
 Judicial: por decisão judicial.
Os pressupostos fixados no 847 e seguintes são:
 Exigência de dois (ou mais) créditos recíprocos da titularidade do declarante
e do declaratário 847 e 851:

16
Fabiano Saccone

o 851/1 - A compensação de créditos não opera perante terceiros


(fiadores, por exemplo), esta ressalva é importante porque poderia
levantar dúvidas pela possibilidade legalmente admitida destes
satisfazerem dívidas de terceiro (751, lógica de proteção do interesse
do credor).
o Todavia o 851/1 parte final, estabelece uma exceção “salvo se o
declarante estiver em risco de perder o que é seu em consequência da
execução por dívida de terceiro”.
 Exigibilidade do crédito (ativo) do compensante 847/1/a): refere-se a uma
exigibilidade judicial, ou seja, os créditos têm que estar vencidos, o seu
objeto delimitado, e não podem correr contra o crédito exceções (no sentido
que o facto de existirem não é suficiente, devem ser invocadas em tribunal:
um crédito prescrito é exigível se a prescrição não for invocada, por
exemplo).
 Fungibilidade e homogeneidade das prestações 847/1/b): terem as duas
obrigações por objeto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade
(obrigações homogéneas). Não é necessário que sejam iguais em termos
quantitativos.
 Não exclusão da compensação por lei 853.
 Declaração do compensante pela vontade da compensação 848/1: como
vimos esta norma é supletiva por se poder convencionar que opere
automaticamente. Opera retroativamente e reporta-se ao momento em que os
pressupostos legais fiquem preenchidos.
Outros reparos
 A pluralidade de créditos 855
 Compensação em casos de solidariedade
o Solidariedade entre devedores 523: qualquer devedor satisfaz
integralmente o crédito do devedor, sem prejuízo do direito de
regresso nas relações internas.
o Solidariedade dos credores 532: a satisfação dos créditos de um
devedor satisfaz o crédito dos restantes credores, sem prejuízo do
direito de regresso nas relações internas.

i. A compensação bancária
A compensação bancária reveste diversas modalidades:
 Convencional: estipulada contratualmente pelas partes com respeito pelas
regras imperativas. É frequente encontrarmos cláusulas no qual se diz que o
banco pode compensar uma conta com outra conta no qual a mesma pessoa
seja titular única ou solidária com outra.
 Compensação imprópria/anómala ou em conta-corrente: Um dos elementos
básicos da conta corrente é, precisamente, o fluxo contínuo de compensações
anómalas que permite, em cada momento, disponibilizar um saldo (o próprio
346/3 Ccom. refere este aspeto). Enquanto efeito natural (e legal) da conta-
corrente e, daí, da própria abertura de conta, não tem restrições: tudo o que
seja levado à conta pode ser compensado. Vigora aqui o princípio da

17
Fabiano Saccone

abstração do negócio subjacente à operação (as visccitudes do negócio


subjacente não influenciam na operação) – note-se a implicação de tal
abstração é o banco se tornar a titular de quantias monetárias mediante
transações que poderiam ser, caso não vigorasse a abstração, derivadamente
nulas.
 Compensação do código civil: aplica-se sempre que os pressupostos legais
da compensação previstos no código se encontrem preenchidos.
Pergunta-se agora em que medida um banco pode compensar um crédito com outra
conta?
1. Existência junto de um mesmo banqueiro e um mesmo titular, de contas
diferentes. A tem conta x e y do banco z. A passa cheque sobre a conta x
que não tem provisão.
a. O cliente do banqueiro pode dispor, em permanência, do saldo.
Assim sendo, ele estará sempre em condições de efetuar as
compensações que entender desde que dê as ordens correspondentes
à declaração de compensação.
b. O banqueiro só poderá operar as compensações próprias da conta-
corrente desde que efetue movimentos de uma conta para a outra
dependendo do que consta do contrato de abertura de conta:
i. Se esta nada disser o banqueiro não pode compreender a
miscigenação de contas bancárias: uma vez que aceitou
contas separadas, tem de respeitar essa separação. Logo, não
pode operar a compensação bancária de conta corrente.
ii. Se existir provisão contratual neste sentido (normalmente no
contrato de abertura de conta), pode operar a compensação de
conta-corrente.
iii. Esta compensação anómala não se confunde, e não exclui, a
operação de compensação civil 847 ocorrer desde que se
reúnam os pressupostos legais (e claro, haja uma declaração
expressa do banqueiro neste sentido 848/1). Uma abertura de
conta, só por si, não envolve qualquer renúncia à
compensação comum. Tal renúncia seria, de resto, nula, por
via do 18/h) LCCG. E pela mesma ordem de ideias: não é
necessária convenção suplementar para tornar aplicável o que
já resulta da lei geral. Posição de MENEZES CORDEIRO E
PAULA CAMANHO.
2. Quanto à compensação entre saldo do cliente (débito do banqueiro) e um
crédito avulso do banqueiro sobre esse mesmo cliente, isto é, um crédito que
não se inserisse, ab initio, numa conta-corrente bancária. A cliente do banco
z, parte cadeira de uma agência do banco z. Pode z compensar o valor
da indemnização com o saldo que deve ao cliente?
a. Se existir provisão contratual neste sentido pode.
b. No silêncio do contrato, o banqueiro pode debitar na conta-corrente o
crédito que quer compensar procedendo primeiro (ou em simultâneo)
à declaração do 848 CC uma vez reunidos os pressupostos da

18
Fabiano Saccone

compensação civil. O cliente do banqueiro deve, aliás, ser informado


da existência do seu débito, da sua origem e do calculo que foi
utilizado.
i. Saliente-se que reunidas as condições da compensação civil
não se aplica a ideia que o depósito envolveria o afastamento
da compensação caso o depósito for irregular – aqui o
banqueiro não é guardião do dinheiro, ele é proprietário do
dinheiro e devedor do saldo. Posição maioritária da doutrina,
inclui-se MENEZES CORDEIRO E PAULA CAMANHO.
3. Compensação em contas com regimes diferenciados
a. Depósitos a prazo: banco z, com crédito sobre cliente A, pretende
compensar o débito através de conta de poupança-habitação, de
poupança-reformados e/ou depósitos a prazo.
i. MENEZES CORDEIRO: estando face a um depósito sujeito a
regime diferenciado, faltará, em regra, o requisito da
homogeneidade de créditos 4previsto no 847/1/b) CC
(compensação civil, requisitos), não sendo a compensação
possível por esta via. Já assim não será necessariamente,
quando o banqueiro possa “modificar” unilateralmente a
natureza do depósito a prazo, tornando-o mobilizável – 1147
CC, ou seja, faça vencimento antecipando pagando os
respetivos juros (este é um direito potestativo do banco).
ii. PAULA CAMANHO defende constata que não verifica o
pressuposto da exigibilidade do crédito porque ele não se
venceu 847/1/a) CC. Tratando-se de um depósito a prazo não
se aplicara a regra do 1147 (vencimento antecipado) por não
se tratar de um depósito irregular (1205) mas sim, de um
depósito comum 1185 CC, no qual a função nuclear é a
guarda da coisa, não se considerando possível a mobilização
do 11475.
b. Contas solidárias: teremos que deixar já claro que a “solidariedade”
aqui em jogo é uma categoria tipicamente bancária: não corresponde
de modo linear, à solidariedade das obrigações, antes caracterizando-
se pela total liberdade na movimentação da conta sem autorização
dos demais, acordada no contrato de abertura de conta. Se z banco é

4
Professora sobre a homogeneidade: (i) Segundo MC, o facto de dois depósitos terem natureza diversa - à
ordem e a prazo - reflete-se na homogeneidade do direito de crédito (ao saldo) que daí resulta para o
depositante: não são dois direitos de crédito homogéneos, substituíveis perfeitamente entre si e, por isso,
não são passíveis de compensação nos termos do art. 847.º. A ausência de homogeneidade resultará de um
poder ser exercível a todo o tempo (não tem prazo, nunca teve - não se esgotou porque nunca existiu) e
outro não. Para a PC a questão é meramente de exigibilidade.
5
A professora Joana Farrajota não concorda com a posição de PAULA CAMANHO por razões práticas
do comércio bancário. É supérfluo cingir o depósito bancário (a prazo) de hoje com uma função simples
de guarda: em primeiro lugar porque a função primordial será mesmo de razão económica (receber os
juros); em segundo lugar, o setor bancário tem uma oferta de soluções tão vasta que o vencimento
antecipado do depósito não impede que o cliente deposite aquele dinheiro noutro banco cumprindo a
função de guarda que se pretende tutelar – Isto não é uma citação.

19
Fabiano Saccone

credor de A, contitular (em conta solidária), com B, poderá z


operar a compensação com o saldo de uma conta coletiva?
i. Jurisprudência que responde pela negativa: A compensação
não seria, de todo, possível, na falta de autorização de todos
os contitulares: RL 27/6/1995; RC 3/12/96; STJ 11/3/1999.
Em todos estes casos a óbice à compensação reside, todavia,
no facto de estarmos perante crédito não homogéneos ou não
fungíveis (847/1/B): não na natureza solidária do depósito.6
ii. Jurisprudência com uma posição intermédia: a compensação
seria possível, mas apenas nos limites do depósito que
couberem ao devedor banqueiro
1. Mediante autorização de todos os contitulares STJ
5/6/2008
2. Ao fazer depender a compensação de iniciativa de
reembolso pelos depositantes (ou por algum deles) –
PAULA CAMANHO, ALBERTO LUÍS, RP
16.4.2012.
3. Uma compensação apenas na medida do direito do
credor adstrito ao débito: STJ 1.10.96 e ANTUNES
VARELA – discordamos completamente porque em
primeiro lugar o Professor Varela refere esta solução
escrevendo sobre a solidariedade das obrigações em
geral e, principalmente, não respeita o princípio da
abstração do negócio causal (o banco, numa conta
solidária, não deve e não tem que saber, qual é o
credor adstrito ao crédito).
iii. Jurisprudência que aceita sem condições
1. A RL de 11.5.2004 e o STJ 9.6.2009 7vêm admitir a
compensação sem restrições – posição adotada pelo

6
A Professora na aula não refere esta inclinação jurisprudencial.
7
Sumário do acórdão (muito bem resumido)
II. As contas à ordem podem ser singulares e coletivas; as coletivas, por sua vez, podem ser solidárias ou
conjuntas. Há ainda a possibilidade de qualquer das contas coletivas ser mista, sendo solidária quanto a
alguns dos titulares e conjunta quanto a outros. As contas bancárias solidárias têm um regime que resulta
das respetivas aberturas de conta. No omisso, caberá recorrer às regras gerais sobre obrigações solidárias,
verificando, caso a caso, as adaptações que se mostrem necessárias.
Cada depositante tem a vantagem de poder movimentar sozinho, o saldo; tem a desvantagem de poder ser
despojado do seu valor, por acto unilateral do seu parceiro.
III. Perante uma conta solidária, pode o banqueiro compensar o crédito que tenha sobre algum dos seus
contitulares, até à totalidade do saldo. O único aspeto restritivo poderia advir das condições de
movimentação acordadas. Assim, se estas não facultarem débitos em conta por despesas e créditos do
banqueiro em geral, o banqueiro terá de ter o cuidado de proceder a uma declaração avulsa de
compensação, compensando com o saldo disponível.”
IV. Um facto só é notório quando é do conhecimento geral – art. 514.º-1 do CPC.
Ora só se pode afirmar que é do conhecimento geral aquilo que toda a gente conhece.
Estando o contrato de abertura de conta sujeito a cláusulas contratuais gerais e/ou especiais negociadas
entre banqueiro e cliente, só quem conhece os termos em que foi negociado o contrato é que
verdadeiramente pode estar dentro dele.
Pelo que é absolutamente insustentável dizer ser um facto notório (ou seja, do conhecimento geral) que a

20
Fabiano Saccone

curso. As contas bancárias solidárias têm um regime


que resulta das respetivas aberturas de conta, não se
trata de uma verdadeira solidariedade civil, o regime
de solidariedade do regime geral deve ser aplicado na
medida do possível. Importa refutar a ideia que a
solidariedade, nos depósitos bancários, tenha sido
estabelecida no interesse dos depositantes – a
solidariedade, tal como qualquer outra cláusula
contratual, é sempre estabelecida no interesse de
ambos os contratantes: paralelamente tem
desvantagens para todos eles, cada depositante tem a
vantagem de poder movimentar, sozinho, o saldo e
tem a desvantagem de poder ser despojado do seu
valor, por ato unilateral do seu parceiro; o banqueiro
tem a vantagem de poder exonerar-se 8perante um
único depositante (com simplicidade jurídica
acrescida) e tem a desvantagem de poder ver aumentar
a “volatilidade” dos depósitos9. Ora se um titular
pode, sozinho, esgotar o saldo, também poderá,
sozinho, constituir débitos juntos do banqueiro que
impliquem por via da compensação, esse mesmo
esgotamento. A lei geral não conduz a outra solução: o
banqueiro (enquanto devedor) pode escolher o cliente
solidário a quem satisfaça a prestação 528/1 CC. O
banqueiro, perante uma conta solidária, pode
compensar o crédito que tenha sobre algum dos seus
contitulares, até à totalidade do saldo. O único aspeto
restritivo poderia advir das condições de
movimentação acordadas.
c. Contas conjuntas: nestes casos só se torna viável movimentar a conta
com a assinatura de todos os seus titulares. Admitir uma
compensação pelo débito de apenas um deles iria forçar a vontade
das partes, quando foi concluída a abertura de conta. Além disso,
estaria aberta a porta para defraudar os próprios termos da abertura de
conta: o particular que pretendesse movimentar sozinho uma conta
conjunta mais não teria do que constituir débitos laterais junto do

forma de movimentação de contas solidárias à ordem só pode fazer-se através de documento escrito.
(autorização ou ordem dada por todos os titulares da conta).

8
O banqueiro não pode, de facto, escolher perante qual dos depositantes solidários se pode exonerar
porque, em regra, ele não pode exonerar-se pura e simplesmente. Ligado por um contrato de abertura de
conta, fonte de uma situação essencialmente duradoura, o banqueiro deve tolerar (porque a isso se
obrigou contratualmente) todos os depósitos que os seus clientes queiram fazer nas respetivas contas.
Agora: nos casos, contratualmente previstos, em que o banqueiro possa pôr termo ao contrato de abertura
de conta (…) dando por terminada a relação bancária complexa (…) o banqueiro pode prevalecer-se do
528/1 CC para entregar o saldo a algum dos depositantes solidários, deste modo se exonerando.
9
Argumento da merda.

21
Fabiano Saccone

banqueiro. Na falta de autorização a conta conjunta não se torna


inatingível, nesta hipótese funcionará a presunção da igualdade das
participações (534, 1403/2 e 1404 CC), o banqueiro poderá operar as
compensações mas apenas na parte (presumida) que cabe ao
contitular devedor.

V. Crédito bancário – Mútuo Civil 1142 CC

A intervenção bancária é vista essencialmente como intermediação creditícia –


recolha de depósitos e concessão de crédito. O Banco irá servir de intermediador entre
depósito e o crédito, está é a mais importante função bancária. O presente estudo
debruçar-se-á sobre o núcleo central do contrato de crédito, o empréstimo bancário ou
mútuo bancário (construído em torno da figura do mútuo civil).
O 1142 CC define o mútuo como o contrato “pelo qual uma das partes empresta à
outra, dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro
tanto do mesmo género ou qualidade”. As características do contrato de mútuo são as
seguintes:
 Ser um contrato real quanto à constituição ou real quod constitutionem: só
produzira os seus efeitos pela entrega da coisa mutuada10. Com a entrega da
coisa há a transferência do risco (1228 CC)11. Trata-se de uma conceção em
regressão; de todo o modo, não haverá dificuldades – tal como vimos
suceder com o depósito – em admitir, ao lado do mútuo típico real, mútuos
meramente consensuais (mútuo atípico) – importantíssimo será salientar que
celebrado o contrato e entrega a coisa ao mutuário, torna-se este
proprietário da mesma 1144 – é o principal efeito do mútuo.
 A presunção de onerosidade 1145, esta presunção faria sentido nas relações
comerciais, mas não nas relações civis. O mútuo civil poderá ser gratuito em
muitos casos da vida normal. Esta presunção surge por inspiração do código
civil italiano que prevê esta presunção, só que, regula-a em conjunto com as
relações comerciais, facto que, não se aplica ao nosso código no qual o
chamado empréstimo mercantil é regulado no Ccom.
 As obrigações (2) que emergem do contrato são, essencialmente, adstritas
a: pagar a retribuição – os juros – quando, a ela, haja lugar; restituir a coisa
do mesmo género, quantidade e qualidade. Os juros, no 1145, são referidos
como a “…retribuição do mútuo”, porém, podem as partes, convencionar a
remuneração como livremente entenderem, a falta de qualquer retribuição
convencionada, conduzirá, à mora e possível incumprimento definitivo ou à
resolução do contrato.12 (o regime da resolução do mútuo bancário será

10
Relembre-se que este não é um elemento de eficácia contratual ou uma obrigação do mutuante, mas
sim uma condição de validade do contrato, um elemento constituinte.
11
Embora, denota a professora, tratando-se de dinheiro, o género não se extingue com a transferência do
risco (como dita a regra), pois esta é uma prestação extremamente fungível
12
Relembrando o regime geral do incumprimento das obrigações:
- A mora do devedor 842/2 define-se por: atraso na prestação; imputável ao devedor; prestação ainda
possível; obrigação de facere. Os efeitos da mora: obriga o devedor a reparar os danos do credor pelo
atraso culposo; lança o risco da impossibilidade da prestação – direito a indemnização pelos danos

22
Fabiano Saccone

abordado mais tarde devido às suas particularidades relativamente ao


reembolso do juro não vencido).
 O mútuo é celebrado pelo prazo acordado pelas partes, porém, sendo o
mútuo oneroso o prazo presume-se estipulado a favor de ambas as
partes: o mutuário pode, todavia, antecipar o pagamento desde que satisfaça
os juros por inteiro 114713. Veremos que para os mútuos bancários
realizados por IC vigora o desvio inscrito no DL 51/2007.
 O mútuo é um negócio consensual ou formal, consoante o seu valor 1143.
Algumas notas importantes deste aspeto:
o O contrato-promessa de mútuo unilateral só necessita da assinatura
do promitente.
o Relativamente ao mútuo bancário estabelecem-se exceções ao 1143
no DL 263A/2007

VI. Crédito bancário - O mútuo bancário

Na dimensão normativa do direito comercial surge o empréstimo mercantil – o


código comercial consagra três artigos – 394º, 395º, 396º - ao que denomina
empréstimo comercial, o estudo destas normas aparenta uma prefiguração de um mútuo
de escopo, figura fundamental (porém com relevo cada vez mais escasso) do direito
bancário, difere quanto à natureza por não se presumir, ao contrário do que acontece no
art.º 1145 do código civil, a onerosidade do contrato e por não estar sujeito às
formalidades do mútuo civil - Os contratos de crédito bancário são por força do art.º 362
contratos comerciais.
O mútuo bancário distingue-se de quaisquer outros por ser celebrado por um
banqueiro, como mutuante, agindo no exercício da sua profissão. Segue-se que o mútuo
bancário tem uma forma aligeirada: nos termos do artigo único do DL n. º32/765 de 43
– pode provar-se por escrito particular (sem escritura pública, salvo se existirem
garantias de natureza real); já relativamente à taxa de juros, ela deveria sempre ser
fixada por escrito, visto o 102/1 Ccom.
Em regra, é um mútuo de escopo: um mútuo onde contratualmente o mutuário fica
adstrito a dar um determinado destino à importância recebida. Com a liberalização do
crédito (década de 90), o mútuo de escopo perdeu o relevo, mantendo-se na hipótese de

moratórios (presunção de danos moratórios em obrigações pecuniárias 806/1) – a mora inverte o


risco 807.
- A mora converte-se em incumprimento definitivo (2 formas) 808: perda de interesse do credor na
prestação devida (apreciada de forma objetiva); interpelação admonitória (poder de fixar um prazo para o
até se tornar incumprimento definitivo.
- Direito à resolução 801/2 com cumulação de pedido indemnizatório – sim pelo interesse contratual
negativo (doutrina maioritária): visando colocar o credor na situação em que estaria se não tivesse sido
celebrado o contrato (e não na situação em que estaria se este tivesse sido cumprido) – O mútuo prevê
no 1150 o direito à resolução do mutuante caso o mutuário não pague os juros no seu vencimento
13
Norma que, como vimos, é particularmente relevante quando se aplica ao depósito irregular

23
Fabiano Saccone

créditos bonificados: crédito à habitação, investimentos com fundos europeus, caixas


económicas (DL 190/2015, parece um ressurgimento do mútuo de escopo) etc.14
Relativamente à classificação/tipologias segundo o prazo DL 58/2013 artigo 5º.
temos15:
 Créditos a curto prazo, quando não exceda um ano;
 Créditos a médio prazo, quando for superior a um e inferior a cinco;
 Crédito a longo prazo quando exceda os cinco anos;

a. Os Juros (a obrigação de juros) 559 a 561 CC


Os Juros estão no cerne do mútuo e, mais largamente, de todo o comércio
bancário – são considerados pelo 559 CC uma espécie de obrigações. A prestação de
juros não tem de ser pecuniária; é-o, porém, e em regra.
Os juros classificam-se em função da finalidade
 Remuneratórios 1145 CC: visam a retribuição do capital mutuado.
 Moratórios: ressarcimento dos danos criado pela mora na restituição.
Em função dos intervenientes na operação
 Civis: A taxa de juros legal é fixada em portaria conjunta dos ministros da
justiça e das finanças e do plano pela Portaria n. º291/2003, hoje em 4%. O
1146 “usura” estabelece como usurário o contrato de mútuo em que estejam
estipulados juros anuais que excedam os juros legais, acrescidos de 3% ou
5%, conforme exista ou não garantia real.
 Comerciais: o 102 Ccom. estipula que a taxa de juros comerciais só pode ser
fixada por escrito, sendo que se aplica aos juros comerciais o disposto no
559/A e 1146 CC. Os juros moratórios e os estabelecidos sem determinação
de taxa (ou quantitativo), são fixados em Portaria conjunta dos ministros das
finanças e da justiça (não podendo ser inferior ao valor da taxa de juro
aplicada pelo BcE, das condições descritas no artigo).
o Moratórios legais 102/3 Ccom: prevê a possibilidade de em portaria
conjunta do ministro das finanças e da justiça fixarem uma taxa
supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam
titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas. Estão fixas a
7% e 8%, conforme existe ou não garantia real16.
o Remuneratórios STJ 6.6.2000: “I- Se, na escritura de mútuo com
hipoteca, se remete expressamente para o DL nº 344/78, na redação
do DL nº 83/86, fica por isso, em princípio, afastada a aplicação do
art. 102º do Ccom. II- Mas, não tendo a instituição bancária mutuante
especificado as taxas de juros que praticou ao longo da vida do
mútuo, ela não pode peticionar uma taxa superior ao que é permitido

14
Os falsos mútuos de escopo, como o crédito pessoal e o crédito ao consumo, são na realidade mútuos
classificados (para fins comerciais) mas não existe alguma vinculação contratualmente estabelecida.
15
A data conta-se a partir do momento em que os fundos são postos à disponibilidade até à data da última
prestação. Os prazos podem ser alterados devido a visccitudes, pode dar-se a renovação do prazo e a
prorrogação (artigo 3 e 5/2).
16
AVISO 8671/2016, 30.06 (2º sem. 2016)

24
Fabiano Saccone

às empresas comerciais em geral, pelo § 3º do dito art. 102º, do


Ccom.”
 Bancários
Relativamente aos limites às taxas de juro temos: a usura; e os limites às taxas
de juro bancário.
A usura 282 CC, consiste (1) na exploração da situação de
necessidade/vulnerabilidade de outrem, (2) com o intuito de obtenção para si ou terceiro
a promessa ou concessão de benefícios e (3) caráter excessivo/injustificado dos
benefícios. Preenchidos os seus pressupostos conduz à anulabilidade/modificação do
negócio por juízos de equidade.
 O nosso código civil prevê no artigo 559/A sob a epígrafe “juros usurários” a
aplicação do 1146 “usura” (no contrato de mútuo) a “toda a estipulação de juros ou
quaisquer outras vantagens em negócios ou atos de concessão, outorga, renovação,
desconto ou prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros
análogos” - O 1146 “usura” estabelece como usurário o contrato de mútuo em
que estejam estipulados juros anuais que excedam os juros legais (fixados hoje a
4%), acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou não garantia real – ou seja,
no máximo 7% ou 9%.
o O nº3 manda reduzir aos máximos caso estes não sejam respeitados “(…)
ainda que seja outra a vontade dos contraentes”
o Pela aplicação do nº3 não se afasta o 282 – estes dois regimes existem em
paralelo.
Já relativamente aos limites às taxas de juros praticados por instituições de
crédito teremos que distinguir entre juros remuneratórios ou moratórios:
 Os juros remuneratórios, não têm limite, veja-se o Aviso 3/93 BdP que indica que
“são livremente estabelecidas pelas IC e SF as taxas de juro das suas operações,
salvo nos casos em que sejam fixadas por diploma legal” (estas são regras
específicas para alguns contratos de crédito em especial). A evolução da indicação
do BdP mostra-nos que passamos de um regime controlado para um regime
completamente liberalizado para as taxas de juro remuneratórias. Esta proeminência
dada ao aviso do BdP derroga em absoluto o estabelecido pelo 1146 “usura” nos
contratos de mútuo, não respeitando a hierarquia legal imposta pela supremacia de
um diploma legal sobre um mero aviso - o aviso prevalece até na jurisprudência: RC
13.9.2011; RL 6.11.2001 (que fundamenta que o 1146 se aplica apenas aos mútuos
civis); RP 9.11.1992
o Existem casos pontuais sujeitos às regras especiais fixadas em diplomas
legais próprios
 DL 133/2009 “Regime de crédito ao consumo” – artigo 28 “usura” –
o contrato cuja TAEG exceda (…) em um quarto a TAEG média
praticada pelas IC no trimestre anterior.
 Lei orgânica do BdP – artigo 28 – fixa competências do BdP para
este identificar a taxa média aplicável a cada um destes tipos de
contratos; determinar as respetivas taxas máximas, em função da

25
Fabiano Saccone

média praticada, proceder à respetiva divulgação trimestral (ver


instrução 8/2006, 3º trim. 2016)
 Os juros moratórios, estão regulados no DL 58/2013: criado em 2013 para
proteção do consumidor no pós-crise veio fixar uma sobretaxa máxima de 3%
acrescida à taxa de juros remuneratória (caso se supere este limite opera a redução
do 1146/3 CC).
Por fim, temos a capitalização de juros ou anatocismo 560 CC, é a prática que
consiste em fazer vencer juros de juros, ou, por outras palavras, é uma operação pela
qual se integram juros já vencidos e não pagos, no capital, com a finalidade de os fazer
produzir juros (estes juros poderão ser moratórios ou remuneratórios)*. Consagra-se, ao
longo da doutrina e da jurisprudência, uma proibição geral do anatocismo, isto pela
preocupação em não agravar a situação do devedor em incumprimento, porém,
legislação avulsa (DL 58/2013) e especificamente o 560 CC permitem o anatocismo.
O 560 permite o anatocismo por duas vias (3 requisitos)
 Ou por convenção entre as partes, posterior ao vencimento – já na execução
do contrato, verificada a condição de existirem juros já vencidos e existir
incumprimento do mutuário;
 Ou mediante notificação judicial feita ao devedor para capitalizar os juros
vencidos ou proceder ao seu pagamento, sob pena de capitalização.
 (o 560/2 estipula que só podem ser capitalizados juros vencidos pelo menos
há 1 ano). – A proibição de anatocismo é absoluta “relativamente aos juros
devidos por um prazo inferior a um ano; para os juros correspondentes a um
ano ou mais, essa proibição é, porém, meramente relativa” RL 17-2-2011.
 *RL 28-2-2013 O 560 não permite a capitalização de juros moratórios sobre
juros moratórios, permite sim, a capitalização de juros moratórios sobre
juros remuneratórios.
O 560/3 vem dispor que “não são aplicáveis as restrições dos números
anteriores, se forem contrárias a regras ou usos particulares do comércio”. Parece
termos por aqui, uma porta aberta ao anatocismo bancário: este número deve, hoje,
considerar-se revogado pelo artigo 7º do DL 58/2013 – este permite a capitalização
de juros por convenção escrita entre as partes, não podendo ocorrer por períodos
inferiores a um mês (artigo 7).
Relativamente ao 7 e 8 do decreto, há merdas a referir:
 Os juros remuneratórios vencidos e não pagos consubstanciam prestações em
falta relativamente à obrigação de capital, logo a capitalização aqui ocorre
mediante a integração destas prestações não pagas com a totalidade do
capital (prestação principal).
 O artigo 7º/2 estabelece que a eficácia do anatocismo depende de acordo
escrito entre as partes que, ao contrário do 560, não é necessária que seja
posterior e não depende da notificação ao devedor.
 O Juro deve-se encontrar vencido há 1 mês e não há 1 ano (como acontecia
no 560). Para contratos em que tenha sido estipulada carência de pagamento
de juros (mútuos que não pagam juros durante x meses para incentivar o

26
Fabiano Saccone

recurso ao crédito, tipo spotify grátis durante 3 meses, e partir daí por apenas
6,99€)
 Relativamente aos juros de mora só é admissível a capitalização mediante
acordo das partes, reduzido a escrito, e no âmbito de reestruturação ou
consolidação de contratos de crédito (fica no ar o que é que isto significa).
o Relembrar! O DL 58/2013 vem introduzir um novo regime da
mora: juros moratórios vêm fixar-se numa sobretaxa máxima de 3%
relativamente aos remuneratórios (8/3); para a cobrança de outros
montantes com fundamento em mora (artigo 9º), no nº1 estabelece-se
uma proibição geral de cobrança de comissões e imputação de
despesas e os números seguintes vêm enumerar exceções ao nº1
(praticamente uma chulice pura no qual tudo é exceção, atenção à
contradição entre o nº2 e nº8, abraços.)

VII. Contratos especiais de crédito – abertura de crédito


O mútuo constitui o grande tronco comum a vários outros tipos de contrato de
crédito, a abertura de crédito é um destes. A lei portuguesa não regula, de modo
expresso, a abertura de crédito, não obstante, ela vem referida no 362 Ccom. como uma
operação do banco.
Existem várias noções jurisprudenciais, a mais relevante provém do STJ
4.12.2007: “O contrato de mútuo bancário na modalidade de abertura de crédito em
conta corrente é aquele por via do qual a instituição de crédito se vincula a colocar à
disposição do seu cliente determinada quantia em dinheiro e este se obriga a restituir-
lha, em montante idêntico, com juros remuneratórios, podendo o último operar, por
aquela forma, uma pluralidade de levantamentos de depósitos de parcelas do crédito.” O
crédito surge aqui por via potestativa dando-se na execução do contrato de concessão de
crédito mutuado, é neste quadro que a abertura de crédito não é um mútuo, não há
entrega de qualquer montante: fica perfeito com o acordo entre as partes 17(ao
contrário do que sucede com o mútuo clássico) STJ 15.1.2001
As características principais são: a disponibilização facilitada de crédito; a
consensualidade; a insuficiência como título executivo (sem os extratos que provam as
movimentações); legalmente atípico e socialmente típico (existem contratos de adesão
de abertura de crédito); é nominado (como vimos o próprio Ccom. fala dele e o próprio
STJ 10.12.1997); é um contrato tipo preliminar, de contrahendo (STJ 10.12.1997
Reveste a natureza jurídica de um contrato promessa de mútuo (STJ
17.5.88) e aplicam-se as regras do mútuo bancário, designadamente da forma: exige-
se a forma escrita (embora o STJ 6.5.97 discorde, vai contra a maioria da doutrina).
Reveste várias modalidades
 Simples: aquela em que o mutuário pode apenas exercer um saque, ou seja, só
pode exercer uma vez o direito potestativo.

17
RELEMBRAR! Pode ser requerida forma especial se a abertura de crédito incluir negócios que exijam
garantia real.

27
Fabiano Saccone

 Conta Corrente/Vários saques: podem ou não ter um montante definido o limite


dos saques e a forma como estes são realizados. É preciso em ter em atenção as
regras do CSC relativamente à conta corrente (CSC 344 e seguintes) - montante
disponível; prazo; modalidades de saque; preço do contrato.
 A descoberto ou garantido: conforme o montante mutuado esteja ou não sujeito
a garantia.
O banqueiro funcionará aqui como uma caixa, o dinheiro ficará mobilizado e não
produtivo, daí ser cobrada a chamada “comissão de imobilização”, relativa às parcelas
não usadas, de crédito, não se pagando, por isso, juros sobre créditos não utilizados.
Assegura-se claramente, desta forma, uma relação bancária complexa e um cliente,
virtual adquirente de numerosos produtos bancários.

VIII. Contratos especiais de crédito 18– descoberto em conta ou


facilidades de caixa

MC define o descoberto em conta como a situação em que se gera quando, numa


conta-corrente subjacente a uma abertura de conta, o banqueiro admita um saldo a seu
favor, isto é: um saldo negativo para o cliente. Já o STJ 3.2.2000 refere-se ao mesmo
como uma operação, pela qual o banco consente que o seu cliente saque para além do
saldo existente na conta do seu titular. É uma operação de clara relevância jurídica das
relações contratuais de facto (STJ 3.2.2000), na sua forma mais típica (não acordada), o
descoberto é tolerado pelo banqueiro, por um curto período, como modo de facilitar,
momentaneamente, a tesouraria de certos clientes. Não estando contratado o banco pode
cortar com a prática, embora a boa-fé obrigue sempre a notificação ao cliente.
O descoberto pode advir de um negócio prévio com o banqueiro, no qual revestirá a
natureza de mútuo bancário – abertura de crédito ou crédito pessoal; por outro lado
pode nunca ter sido acordado (situação regra), pergunta-se qual é o regime jurídico
aplicável a esta situação de facto, nomeadamente quanto à natureza e consequentes
juros?
 STJ 3.2.2000 entende que se trata de um contrato de mútuo, dada a sua natureza
semelhante à do contrato de depósito bancário (irregular) no âmbito 1205 e
1142. Porém sem formalismo subjacente, podendo ser aplicadas todas as normas
relativas ao mútuo bancário, à exceção desta. É exigível a qualquer momento por
se tratar de uma obrigação pura (sem prazo).

18
Retirado da aula, temos ainda:
Antecipação bancária - É uma antecipação pelo banco ao cliente de um montante correspondente a um
crédito titulado, antes do respetivo vencimento, com prévia de dedução dos juros até ao vencimento do
crédito cedido + encargos do banco; Desconto - Figura em declínio. Trata-se também de uma antecipação
de um montante pelo banco ao cliente, que diz respeito a crédito titulado, antes do respetivo vencimento,
com a prévia dedução dos juros até ao vencimento do crédito cedido + encargos do banco. O desconto
pode ser realizado com recurso, ou seja, pode-se voltar para o cedente e dizer que não conseguiu reaver o
crédito. Tem taxa livre, não está regulado, é inútil.

28
Fabiano Saccone

 STJ 28.5.2015, vai ao encontro de uma maior proteção do cliente. Não sendo
celebrado por escrito não é um contrato de mútuo, é apenas uma relação de
facto: sucede que o banco pode exigir a qualquer momento o pagamento do
saldo, vencendo-se desde logo juros moratórios. Para que se exijam juros
remuneratórios, a IC tem o ónus de alegar (5 NCPC) que o descoberto em conta
constitui a concretização de um mútuo bancário em que foram estipulados juros
remuneratórios, caso contrário, não há juros remuneratórios para ninguém. Caso
se prova, não havendo juros convencionados, abre-se apenas a possibilidade de
juros remuneratórios legais 7% ou 9% (no máximo, acrescida a sobretaxa,
conforme seja ou não garantido). A professora comenta que a fundamentação é
pouco sólida por não explicar como é que vamos ao regime dos juros supletivos
se não se reconhece a existência de um contrato de mútuo sem os formalismos
legais estarem prescritos (pois a prova da sua existência não significa que a
forma esteja lá)

IX. Contratos especiais de crédito – o leasing ou locação


financeira DL 149/95 e DL 72/95 (para as SLF)
Locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes – o locador financeiro – se
obriga, mediante retribuição, a ceder a outra – o locatário financeiro – o gozo
temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta,
e que o locatário poderá comprar, decorrido o prazo acordado, por um preço nele
determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.

1º momento. Possui um esquema creditício – traduz um crédito de escopo


delimitado: o financiador paga diretamente o bem ao fornecedor – sendo que existe uma
facilidade de concessão: o financiador ficará a dispor da própria titularidade do bem: é
a garantia por excelência. Não surge formalmente como um débito: as instituições de
crédito (locadores financeiros) que recorrem à locação não vêm aumentar o seu
endividamento ao contrário do que sucederia com um mútuo tradicional – a locação
financeira permite diluir contabilisticamente os custos de aquisições com múltiplas
vantagens de ordem fiscal.
2º momento. O contrato de locação financeira entre o locador e o locatário – o
locador financeiro dispõe do domínio sobre a coisa locada: a garantia máxima. O
locador não poderá dar ao bem, que adquiriu para ceder ao locatário, qualquer destino

29
Fabiano Saccone

produtivo ou, sequer, útil. Devido a todas estas limitações, os locadores encarecem o
produto, onerando o locatário com encargos – haverá, pois, que procurar um equilíbrio,
assente numa repartição razoável e equitativa de riscos. O 15 do DL 149/95 estipula que
salvo “convenção em contrário, o risco de perda ou deterioração do bem corre por
conta do locatário”.
3º momento. A própria locação financeira consigna depois, em regra, uma opção de
compra, a favor do locatário, por um preço residual correspondente a uma percentagem
do valor da coisa locada. Surge por vezes a obrigação de celebração de outros contratos:
seguros e garantias – a locação torna-se um núcleo apto a suportar contratos mistos.
A locação financeira reveste diversas modalidades
 Net leasing e gros leasing: consoante as despesas corram pelo locatário ou pelo
locador
 Short leasing e long leasing: conforme dure menos ou mais de 10 anos
 First ou secondhand leasing: quando se reporte a bens novos ou usados
 Sale lease back leasing: quando o interessado venda o bem ao financiador o qual lhe
devolve em locação financeira
 Terme leasing e revolving leasing: respetivamente para os contratos de duração pré-
definida ou de duração indeterminada, à vontade do locatário
 Kommunal leasing: constituídos por autarquias, para equipamentos públicos
 Leasing mobiliário e imobiliário: consoante a natureza dos bens locados.
Relativamente ao regime vigente, tomando-o na sua globalidade a locação
financeira é um contrato oneroso, sinalagmático, bivinculante, temporário, mas
originando relações duradouras e de feição financeira. Na Alemanha está regulado por
cláusulas contratuais gerais, já aqui em Portugal, dispõe de completas regulamentações
– aspeto que não impede os contatos de locação financeira contenham, sendo contratos
de adesão, cláusulas contratuais gerais. Este contrato é essencialmente um negócio de
crédito ainda que vertido nos moldes da velha locação: o locador deve assegurar a
entrega da coisa; o locador é o possuidor da coisa em termos de propriedade, exercendo
a sua posse através do locatário; transmitida a propriedade do bem locado para o locador
aplica-se o 1057 CC; entre outras (ver página 740 MC para mais informação):
Nos PW destacamos, quanto ao DL 149/95:
 Objeto: bens suscetíveis de locação 2/1
 Forma: simples documento escrito 3
 Prazo máximo: (1) não pode ultrapassar o prazo que “corresponde ao período
presumível de utilização económica da coisa” 6/1; (2) 30 anos (6/2)
 Obrigações do locador 9: a) adquirir/constituir bem a locar; b) conceder o gozo do
bem; c) vender o bem ao locatário.
 Obrigações do locatário 10/1
 Direitos do locatário 10/2
 Transmissão da posição do locatário 11: porém é necessário distinguir
o Casos de bens de equipamento: a posição do locatário é transmissível sem
necessidade de consentimento do locador, se ocorrer no quadro do trespasse
de um estabelecimento comercial (115 do DL 321B/90
30
Fabiano Saccone

o Demais casos: está sujeito ao regime da locação, sendo necessário o


consentimento do locador 1059/2 CC

o Em qualquer um dos casos, o locador pode opor-se à transmissão da posição


do locatário, se o cessionário não oferecer garantias bastantes de que o
contrato será cumprido.
Relativamente à restituição do bem locado (seja por incumprimento, seja pelo
decurso do prazo sem ter sido exercido o direito de compra do locatário), somos
obrigados a fazer uma análise maias detalhada. Sendo o locador uma instituição de
crédito, pouco proveito poderá tirar do objeto locado, além disso, haverá dificuldades
em coloca-lo no mercado, visto tratar-se de um bem usado e, normalmente, em mau
estado de conservação – o locador tende assim a rodear-se de garantias pesadas, gizando
ainda, cláusulas penais de grande extensão. O 17 estabelece o contrato pode ser
resolvido por qualquer uma das partes nos termos gerais, não sendo aplicáveis as
normas especiais, constantes na lei civil, relativas à locação. Após o cancelamento do
registo de locação financeira (nos termos do 17/2), o 21 admite o requerimento de
providência cautelar ao tribunal para que o bem seja entregue novamente ao locador –
21/6 estabelece que decretada a providência e independentemente da interposição de
recurso pelo locatário, o locador pode dispor do bem, nos termos previstos no 7. Porém,
boa parte do contencioso relativo à locação financeira tem ocorrido no momento da
restituição do bem locado, temos aqui um exemplo típico:

31
Fabiano Saccone

 STJ 28.4.2009: vem estabelecer que caso exista uma situação de impossibilidade
da prestação ou de incumprimento definitivo, carece o autor (locador) de base
legal para proceder à resolução do contrato.
 STJ 1.7.1999: para que o procedimento cautelar de entrega judicial e de
cancelamento de registo seja procedente, o requisito a cumprir à priori é a
resolução do contrato e não a restituição do bem locado.
 RL 1.2.1996: o reconhecimento do direito de propriedade do locador, carece da
“eficácia extintiva do contrato de locação financeira à declaração de resolução
emitida pelo locador, impõe-se que esta alegue e prove, pelo menos com
probabilidade série quando se pretende providência cautelar não especificada
tendente à restituição, a causa concreta do incumprimento, a factualidade
constitutiva da violação das obrigações assumidas pelo locatário.
 RL 3.2.2005: “o tribunal deverá ordenar a providência requerida se a prova
produzida revelar probabilidade séria da verificação dos requisitos enunciados
no (…) no 21 (…)”.
 STJ 10.7.2012: 2. Pode aceitar-se como possível, em caso de incumprimento do
contrato de locação financeira, por banda do locatário, e em alternativa à
resolução do mesmo, sem violação das regras da boa fé ou de quaisquer outras
exigíveis, a perda do benefício do prazo para o locatário, podendo o locador
exigir o pagamento das rendas vencidas e não pagas (acrescido dos
correspondentes juros de mora) assim como o das rendas antecipadamente
vencidas (sem juros), mantendo o locatário, neste último caso, o direito a utilizar
e gozar o equipamento locado até final, assim se vencendo antecipadamente a
sua obrigação pecuniária resultante de um contrato com uma duração definida e
certa. 3. É nula a cláusula contratual geral do contrato de locação financeira que
estabelece, para o caso de incumprimento do locatário, e em alternativa ao
direito de resolução do locador, a título de cláusula penal, a obrigação, por banda
daquele, do pagamento do valor residual do equipamento locado.
 STJ 7.3.1991: I - A faculdade de comprar ou não comprar a coisa locada, no fim
do contrato, constitui um dos elementos essenciais do contrato de locação
financeira imobiliária. II - E absolutamente proibida (artigo 18 e 21 do DL
446/85, de 25 de outubro) e nula a opção clausulada que conceda a parte
economicamente mais forte a vantagem de receber todas as quantias devidas e
obrigar a parte faltosa a adquirir a coisa locada, pois e contra a natureza do
contrato e contra o seu elemento mais importante (o direito a não adquirir).
 RL 26.6.1993: I - Por ofensiva da boa fé e das normas sobre resolução dos
contratos a constituir uma execução forçada do contrato, é nula a cláusula que,
na locação financeira, permite ao locador, em caso de incumprimento do
locatário, pedir as rendas vincendas acrescidas do valor residual. II - Nos
contratos de locação financeira os riscos dos locadores - repartidos pelos
locatários são cobertos pelas rendas. III - As rendas destinam-se a cobrir não só a
amortização financeira global do custo ou investimento como também a
remuneração dos tais riscos.
Assente em todas estas dificuldades, a jurisprudência encaminhou-se para admitir
a inclusão de cláusulas penais – estabelecendo-se como limite indemnizatório que o
locador ganhe mais, com o incumprimento, do que com a comum execução do contrato.
32
Fabiano Saccone

X. Contratos especiais de crédito – o contrato de factoring ou


cessão financeira DL 171/95
O contrato de cessão financeira é o contrato pelo qual uma entidade – o cliente ou
aderente – cede a outra – o cessionário financeiro ou factor – os seus créditos sobre um
terceiro – o devedor ou debitor – mediante retribuição. Portanto, factor é aquele que faz
factoring. O artigo 2º do diploma define a atividade de factoring ou cessão financeira
como aquela que “consiste na aquisição de créditos a curto prazo, derivados da venda de
produtos ou da prestação de serviços, nos mercados interno e externo”. Portanto é, antes
de mais, uma forma de “financiamento”19 a curto prazo, do aderente ou cedente
financeiro (A com um conjunto de créditos sobre x, y, z; vende estes mesmos créditos
ao factor ou sociedade de factoring B).
Aplicam-se os artigos 577 e seguintes do CC que estabelecem os requisitos de
admissibilidade de cessão (ver principalmente o 577 e 578). A cessão de créditos
constitui, assim, um modo de transmitir obrigações; mediante uma transmissão de
crédito20, com um contrato entre o antigo credor e o novo credor, isto é, mediante um
contrato-base (de um contrato-quadro) – num primeiro momento, as partes celebram
entre si, o denominado, “contrato de factoring”, e este, vai então, estabelecer as diversas
funções que em concreto, irão operar e designadamente: a venda de créditos (com ou
sem financiamento); o regime do risco (a finalidade de garantia); os serviços a prestar
pelo factor. Ainda relativamente ao CC: produção de efeitos da cessão de créditos
regulados no 577 e seguintes; cessão a várias pessoas 584 CC; garantias e meios de
defesa do crédito 582, 585, 587 CC.
O factoring é, ainda, um contrato oneroso, sinalagmático, consensual, duradouro e
de conteúdo atípico misto – verifica-se que tem os seguintes elementos: promessa de
venda de créditos futuros (como é que é feita, existe ou não adiantamento de crédito?)21;
assunção do risco (transfere-se ou não o risco?); a prestação de diversos serviços (há
serviços complementares prestados pelo factor?)
As principais finalidades são:
 A cobrança de crédito/cessão dos créditos: numa modalidade em que exista apenas
cobrança não existe a cessão dos mesmos (depende da modalidade), a cobrança é
muito útil sempre que existem problemas de cobrança (principalmente quando, por
exemplo, os créditos se situam no estrangeiro) – favorece o balanço pois desta forma
diminui-se/suprimisse o passivo.
 Função creditícia (cobrança + antecipação de parte do valor do crédito): seja no caso
de cobrança, seja no caso de cessão, o factor paga uma retribuição (que varia
conforme as modalidades) possibilitando um adiantamento (parcial) sobre os
créditos – confere maior liquidez à empresa; limita o endividamento (a empresa
“fatorizada” não recorre a empréstimos de longo prazo)

19
Embora isto não resulte do DL.
20
RELEMBRAR! Distingue-se da sub-rogação, ligada ao pado passivo da relação obrigacional, trata-se
de um cumprimento da assunção de dívidas no qual só se assumem as obrigações (e não os direitos, como
ocorre na cessão).
21
Embora seja duvidoso falar aqui de um contrato-promessa do 410/1 CC, pois o contrato-quadro de
factoring não individualiza nenhum contrato, pois implica uma atividade ulterior jurígena (existe aqui a
(teoria) da absorção, combinação e a analogia (típica dos contratos mistos).

33
Fabiano Saccone

 Garantia – o factor, por exemplo num full factoring, assume todos os riscos de
incumprimento de crédito. Tecnicamente só se o risco de incumprimento do terceiro
se transferir para o factor há cessão.

Outras funções complementares serão:


 Proceder à avaliação do risco dos clientes atuais ou potenciais, elemento que fará
variar o preço da retribuição recebida pelo factor.
 Consultor de mercados – função implícita
O contrato de factoring é suscetível de se estruturar em termos duais (com um
contrato quadro que obrigue à celebração de diversas cessões financeiras) ou unitário
(um único contrato de cessão de créditos futuros) – tudo depende da vontade das partes,
parece, porém, que a solução dualista é que melhor assegura a sua tutela.
Posto tudo isto, o factoring, não obstante a componente de serviços que, segundo a
doutrina, crescentemente o enriquece, surge, perante os operadores e antes de mais,
como uma compra de venda de créditos: no seu núcleo central, típico, mais
frequente, desempenhando funções de mútuo bancário.
Relacionando as várias finalidades temos várias modalidades22:
 Full factoring/Factoring “tout court”: tem o núcleo centrado na cessão de créditos
com escopo financeiro; normalmente, agregará a transferência do risco e a prestação
de diversos serviços.
 Factoring próprio e impróprio: conforme o risco de incumprimento do terceiro
devedor se transfere ou não para o factor. Por isso, na cessão imprópria, o factor só
pagará ao aderente após boa cobrança do crédito – tecnicamente o factoring
impróprio não traduz, afinal, uma verdadeira cessão de créditos, de todo o modo, ela
segue boa parte do regime da cessão própria (sendo celebrado por sociedades de
factoring).
 Maturity factoring/factoring de serviços: postula a eliminação das funções
financeira e seguradora. O factor limita-se a assegurar a cobrança de faturas do
aderente e a prestar-lhe os serviços de contabilidade – em rigor também não há aqui
uma verdadeira cessão de créditos.
 Factoring sem serviços: passa-se para o outro extremo, aqui o factor desempenha
exclusivamente um papel financeiro.
 Factoring total/parcial: consoante seja abranja todas as faturas do cliente ou,
apenas, certo tipo.
 Factoring em branco/seletivo: o factoring em branco obriga o factor a aceitar e
pagar ao aderente todas as faturas que este lhe envie; o factoring seletivo confere ao
factor a faculdade de aprovar faturas que pague, remetendo as demais para boa
cobrança – neste último caso o factor atuará como simples mandatário do aderente
enão como cessionário.
 Factoring interno/internacional: consoante apresente conexões apenas com a ordem
interna ou, pelo contrário, também com outros espaços. Aqui facilita-se o contacto

22
Estes são os nomes mais utilizados, dada a liberdade contratual podem surgir novas modalidades ou
outras que distorçam estas.

34
Fabiano Saccone

com outros mercados, favorecendo a expansão do comércio internacional, pelo


factor ter, em regra, facilidade de cobrança de créditos situados noutras jurisdições.
 Factoring aberto/fechado: consoante postule, ou não, a notificação ao devedor. A
cessão financeira fechada não é dada a conhecer a terceiros, não produzindo ao
abrigo do 583/1 CC efeitos perante o devedor. Funcionará, pois, como um esquema
financeiro interno factor/cliente – a doutrina tem apresentado dificuldades em
admitir a cessão fechada.
Resta por fim, analisar os efeitos do contrato de factoring: a factorização é
celebrada em regime exclusivo; a título principal (Full factoring), o aderente fica
adstrito a oferecer todos os seus créditos ao factor (princípio da globalidade); a título
principal o cliente deve pagar todas as retribuições (comissões) a que o factor tem
direito; a título principal (factoring aberto), o factor deve notificar deve notificar todos
os terceiros devedores da cedência dos respetivos créditos; uma vez consumada a cessão
não pode ser revogada – o credor será o factor; acessoriamente, o aderente, fica adstrito
a manter a gestão sã e prudente, de modo a não prejudicar o factor; o aderente, ao abrigo
do 587/2 não garante a solvência do terceiro devedor, daí no factoring seletivo o factor
poder escolher os devedores (de acordo com critérios de normalidade e razoabilidade); o
factor deve prestar com toda a diligência os serviços incluídos no contrato; por fim,
deixa-se claro que a cessão financeira admite pagamentos antecipados, mas por
conta de créditos cedidos (ainda que não vencidos); não por conta de créditos
inexistentes (isto seria um mútuo puro e simples e não uma cessão financeira).

XI. Contratos de financiamento e cláusulas acessórias (ver 12ª


aula – 21/9/2016)

XII. Os créditos documentários


Diz-se crédito documentário a situação jurídica pela qual um banqueiro se
compromete, perante um seu cliente (ordenante), a pagar uma certa quantia a um
terceiro (beneficiário) mediante a entrega, por este, de determinados documentos.
O crédito documentário assume funções de pagamento, de garantia e de
financiamento. Na sua feição mais simples, o crédito documentário oferece ao
ordenante um meio direto e fácil de pagamento, após verificação da causa da dívida. O
comprador-importador dispõe de um instrumento para pagar o preço, sem especiais
riscos nem ameaças de mora ou de extravio de espécies monetárias – o banqueiro
antecipa os fundos que irá conceder ao beneficiário, concedendo, por essa via,
crédito ao ordenante (A quer comprar a mercadoria x a B que se encontra no Camboja,
porém só pagará a mercadoria x a B quando este comprovar que a mercadoria x foi
embalada e se encontra enviada. Uma vez apresentados os documentos acordados que
comprovem o requerido, o banco E paga (concedendo crédito a A) o valor da
mercadoria a B).
As partes da situação jurídica variam, temos:
 O banqueiro obrigado chama-se banco emitente/emissor ou issuing bank;
 O cliente que contrata com o banqueiro é o ordenante, o mandante ou applicant

35
Fabiano Saccone

 O terceiro que, mediante documentos, irá receber o dinheiro é o beneficiário ou


beneficiary
 Os documentos que o beneficiário deverá entregar para receber o crédito dizem -
se, ainda, a apresentação ou presentation.
 Poderá existir um banco notificador/confirmador que notifica o beneficiário
Podemos ter também várias classificações
 De acordo com o conteúdo do crédito assumido pelo banco emitente: crédito à
vista (assume efetuar um pagamento imediato, mediante a apresentação dos
documentos); crédito diferido (pagamento ocorre na data constante da
promissória elaborada a pedido do ordenante); crédito por aceitação (carece da
aceitação pelo banqueiro de uma letra de câmbio); crédito por negociação (no
qual existe uma carta de crédito que pode ser sacada por qualquer pessoa
designada na carta de crédito, incluindo o próprio ordenante).
 De acordo com a função dos banqueiros intervenientes: crédito simples (o
banqueiro emitente procede aos pagamentos a que haja lugar);
o Crédito com banqueiro intermediário: uma eventualidade do comércio
internacional, onde o banqueiro emitente pertence à praça do comprador
e não conhece o beneficiário nem, por ele, é conhecido – o banqueiro
incumbe então um banqueiro da praça do vendedor de proceder às
operações subsequentes. Abrem-se três sub-hipóteses relativas ao
banqueiro intermediário
 Um banco notificador: age como mandatário do banco emitente,
devendo apenas verificar, com um cuidado razoável, a
autenticidade do crédito transmitido e transmiti-lo ao
beneficiário.
 Um banco designado: para além de notificar o beneficiário deve
ainda realizá-lo por conta do banco emitente.
 Um banco confirmador ou confirmante: assume um
compromisso com o beneficiário: em tudo semelhante a do banco
emitente. O beneficiário disporá, então, de uma dupla garantia,
falando em crédito confirmado.

36
Fabiano Saccone

O contrato de emissão e o negócio base, ou seja, o contrato que estabelece um


direito a favor do beneficiário (terceiro) rege-se pelas regras e usos uniformes relativos
aos créditos documentários da câmara de comércio internacional. O contrato de
emissão contém:
 Uma dupla promessa - em relação ao mandante e em relação ao beneficiário,
perante um e perante outro, o banco assume a obrigação de executar o pagamento ou
a negociação prevista no contrato.
 Estipulam-se as comissões: de abertura de crédito, de pagamento, de transferência,
etc.
 Havendo antecipação dos fundos, haverá lugar ao estabelecimento dos juros e
possíveis garantias a favor do banqueiro emitente (um depósito em garantia será o
mais frequente)
 A carta de crédito: documento do qual constam os direitos do beneficiário e os
condicionalismos que rejam o crédito documento em causa. O crédito funciona
mediante a apresentação dos documentos previstos na respetiva carta. Tais
documentos irão ser examinados pelo banqueiro: ou pelo banco nomeado ou, ainda,
confirmante. Haverá depois que seguir as diversas regras do 14 RUU. Havendo
conformidade dos documentos apresentados o banco deve honrar a carta 15
RUU23
Subjacente ao contrato de emissão, temos o contrato base, o contrato entre o
ordenante e o beneficiário que em regra será um contrato de compra e venda – o crédito
documentário será totalmente independente do negocio base (artigo 4 RUU/2007) –
esta é uma manifestação da abstração do crédito documentário.

XIII. As garantias bancárias (garanta bancária Francisco Cortez e


cópia da 13ª (22.9.2016) aula)
O património do devedor como garantia, art.º 601 e 817 CC. Esta garantia geral não
é muitas vezes suficiente, os credores querem garantias adicionais que aumentam a
possibilidade de ver o seu crédito satisfeito, neste quadro surgem as garantias especiais.
A passagem do centro de gravidade das garantias reais para as garantias pessoais deve-
se a erosão do valor dos imóveis (relativamente à hipoteca), às retenções, aos privilégios
imobiliários, dobrada pela morosidade dos processos executivos, etc.
Temos Garantias especiais: de natureza pessoal:
 Garantia acessória - fiança: ao contrário da garantia autónoma depende da
obrigação principal. Aqui temos um terceiro que reforça o património de uma
dívida do devedor perante o credor, fortalece o crédito e a expetativa do credor ver a
satisfação do seu crédito.
o Acessoridade genérica - quando ao momento da constituição da fiança, a
acessoridade revela desde o momento da constituição, a validade desta
depende da validade da obrigação garantida 632/1.

23
O banqueiro não é responsável pelas situações de força maior 36 (catástrofes naturais, tumultos,
comoções civis, guerras) não ficando obrigado a transferir o crédito documentário (exceto se assim o tiver
previsto 38/a).

37
Fabiano Saccone

o Acessoridade funcional: a dependência manifesta-se na possibilidade de o


fiador opor ao credor que pretende executar a fiança todos os meios de
defesa que possuía o devedor 637. Manifesta-se também na forma 628/1,
com a divergência que a fiança deve surgir através de uma declaração
expressa. No âmbito da obrigação do fiador 631/1, a fiança não pode exceder
a dívida principal; âmbito de aplicação das fianças
 Fianças genéricas: cujo amplitude varia. Casos em que o fiador
declara que assume todas as dívidas de um devedor x, por exemplo.
A determinabilidade ou indeterminabilidade deste objeto tem vindo a
ser discutido por ser suscetível o 280. A jurisprudência tem vindo a
considerar uma violação do 280 a assunção de toda e qualquer dívida
sem caracterização da sua qualidade e natureza.
 A interdependência manifesta-se também pela extinção da fiança
garantida por cumprimento do devedor.
 É um instrumento particularmente relevante quando prestada por uma prestação
bancária - tem um grande inconveniente, o benefício de excussão prévia, em
princípio para poder executar a fiança junto do fiador tenho que excutir o património
do devedor ou de terceiro (se existir garantia real sobre bem deste). Tornou-se
necessária a garantia bancária.
Relativamente às garantias autónomas, no qual se inclui a garantia bancária,
temos uma “figura triangular” – assente em 3 relações jurídicas:
 Uma primeira, o contrato-base (compra e venda, empreitada, etc.) celebrado entre
duas partes (A e B), que constitui a relação jurídica principal ou subjacente que se
pretende garantir;
 Uma segunda, um contrato, classificado com dúvidas pela doutrina como sendo um
mandato, celebrado entre o devedor da relação principal (A) e um garante,
normalmente um banco, (C), pelo qual este se obriga, mediante uma determinada
retribuição, a prestar uma garantia ao credor – beneficiário (B), salvaguardando o
seu direito de regresso imediato contra o devedor-dador da ordem (A).
 E finalmente uma terceira, o contrato autónomo de garantia (abstrato e com total
independência sobre a obrigação garantia, “visto que o garante assume uma
obrigação própria, independente do contrato base”), propriamente dito, entre o
garante (C) e o credor – beneficiário (B), pelo qual o primeiro se obriga, a entregar
uma soma pecuniária determinada ao segundo, logo que este prove o incumprimento
da relação jurídica subjacente (contrato autónomo de garantia simples) ou de
imediato, quando este simplesmente o interpele para realizar essa prestação
(contrato autónomo de garantia automática ou “à primeira solicitação”) mas
renunciando desde logo o garante (C), em qualquer caso, a opor ao beneficiário (A)
as exceções relativas quer à relação jurídica principal, quer ao contrato celebrado
com o dador da ordem (A). Após ter satisfeito o pagamento ao beneficiário o banco
garante (C) tem direito a ser reembolsado pelo dado da ordem (A) da quantia
entregue ao beneficiário da garanta (B), beneficiando normalmente por sua vez o
banco (C) de garantias (hipotecas, depósitos, etc.) prestadas pelo dado da ordem (A),
destinadas a assegurar o seu direito de reembolso.

38
Fabiano Saccone

Índice
1. Enquadramento do Direito Bancário ........................................................................ 2
i. Direito fragmentário e dependência científica....................................................... 2
ii. Situação jurídica bancária: Operações bancárias 362 CCom. e 4 RGIC ............... 3
iii. Sujeitos da atividade bancária ............................................................................ 4
iv. Deveres gerais: deveres de competência, de adequação e de eficiência. ........... 5
v. As cláusulas contratuais gerais .............................................................................. 7
2. O contrato de abertura de conta (relação bancária geral, continuação…) ................ 9
I. A conta corrente bancária .................................................................................... 10
II. O giro bancário ................................................................................................ 11
III. O depósito ........................................................................................................ 11
i. O depósito comum 1185 .................................................................................. 11
ii. O depósito irregular 1205 e seguintes .......................................................... 12
iii. Depósito mercantil 403 e seguintes Ccom. .................................................. 13
iv. Depósito bancário 408 Ccom. e Decreto-Lei n. º430/91 de 2 de novembro;
entre outras legislações avulsas .............................................................................. 13
v. Depósito de Escrow (com base na aula suplementar de 29 de novembro) .. 15
IV. A compensação de créditos 847 CC .................................................................... 16
i. A compensação bancária ..................................................................................... 17
V. Crédito bancário – Mútuo Civil 1142 CC .............................................................. 22
VI. Crédito bancário - O mútuo bancário .................................................................. 23
a. Os Juros (a obrigação de juros) 559 a 561 CC .................................................... 24
VII. Contratos especiais de crédito – abertura de crédito ........................................... 27
VIII. Contratos especiais de crédito – descoberto em conta ou facilidades de caixa 28
IX. Contratos especiais de crédito – o leasing ou locação financeira DL 149/95 e DL
72/95 (para as SLF) ........................................................................................................ 29
X. Contratos especiais de crédito – o contrato de factoring ou cessão financeira DL
171/95 ............................................................................................................................. 33
XI. Contratos de financiamento e cláusulas acessórias (ver 12ª aula – 21/9/2016)... 35
XII. Os créditos documentários .................................................................................. 35
XIII. As garantias bancárias (garanta bancária Francisco Cortez e cópia da 13ª
(22.9.2016) aula) ............................................................................................................ 37

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