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BREAK THE DAY

Um romance Midnight Breed

A número 1 do New York Times, Lara Adrian e a série de romance


de vampiros Midnight Breed, continua com Break the Day, um novo
romance apaixonante e repleto de adrenalina de aventura paranormal.
Depois que uma traição chocante quase o matou e as pessoas com
quem ele mais se importa, o que o guerreiro Raça, Rafe, quer mais do que
qualquer coisa é vingança contra a insidiosa irmandade chamada Opus
Nostrum. Mas para atingir esse objetivo, ele deve virar as costas para a
Ordem e se infiltrar em uma gangue perigosa com vínculos com a Opus.
Arriscando tudo para se redimir e levar a cabo a sua missão secreta, Rafe
não deixará que nada se interponha no seu caminho – muito menos seu
desejo por uma das seguidoras que ele deveria desprezar, uma beldade
misteriosa e de cabelos escuros chamada Devony Winters.
Mas Devony tem seus próprios segredos para proteger, bem como
um dever pessoal que fará qualquer coisa para cumprir. E como uma
daywalker se passando por humana para a gangue que faz parte há
meses, a última coisa que precisa é de um perigoso ex-membro da Ordem
desvendando todo seu trabalho duro. Seus planos dependem de manter
Rafe à distância, mas se ela se render à necessidade sombria que ele
desperta dentro dela, será seu coração quem pagará o preço final.

“Uma série bem escrita e repleta de ação que está melhorando com a idade”.
- Fiction Vixen
CAPÍTULO 1
Rafe acariciou a pele tenra da fêmea, o seu polegar permanecendo
na carótida, onde o pulso da humana batia com tanta força e rapidez
quanto a sua respiração ofegante.
Como Anfitriã de Sangue, esta estava mais do que disposta a lhe
dar sua veia. Ela não percebeu ou não se importava que eles estivessem
sentados no bar à vista dos outros clientes no Asylum esta noite.
O que era adequado para Rafe.
Abaixando a cabeça para o lado da garganta descoberta da mulher,
ele demorou um longo tempo para saborear o cheiro e o som dos glóbulos
vermelhos acobreados correndo abaixo da superfície da pele tão frágil.
Suas presas se alongaram em reflexo, saindo de suas gengivas em
antecipação da primeira mordida.
— O toque de recolher de alimentação começou à meia-noite,
guerreiro.
Com um grunhido, Rafe fez uma pausa e deu um olhar sombrio
para o barman que emitiu o aviso. O homem era Raça, como ele. Um
macho grande de cabeça raspada e tatuada e ombros tão largos quanto
um tanque.
O Asylum atendia principalmente uma clientela humana, uma vez
que a Raça tinha apenas uma bebida de escolha: o sangue retirado de
uma veia recém-aberta. Ainda assim, nos vinte anos desde que a raça de
Rafe foi revelada aos seres humanos, a taverna no antigo extremo norte
de Boston se tornou um popular ponto de encontro para os membros de
ambas as raças.
Nessa hora tardia, o lugar ficara reduzido a algumas dúzias de
seguidores e ao costumeiro punhado de novatos embriagados que
evidentemente se cansaram das boates e simuladores nas áreas
turísticas e vagaram mais profundamente pela cidade para provar o
colorido local.
De tempos em tempos, Rafe e seus colegas da equipe da Ordem
também vinham aqui, compartilhando algumas risadas após suas
patrulhas.
Porra, quanto tempo fazia? Alguns meses. Desde o verão, quando
ele foi retirado de todas as missões da Ordem.
Não, desde o seu erro épico em Montreal.
Pior do que um erro, uma quase catástrofe que quase o matou. E
poderia também ter custado a vida de todos os que lhe eram próximos,
se a bonita, mas traiçoeira, espiã da Opus Nostrum não tivesse sido
impedida pelo melhor amigo e camarada de Rafe, Aric Chase.
Rafe foi manipulado como o pior tipo de tolo, ofuscado por um rosto
bonito e uma boca sedutora que só havia cuspido nada além de mentiras.
Nunca mais.
Ele afastou a amarga lembrança com uma maldição pronunciada
em voz baixa. A raiva autodirigida colocou uma borda ainda mais afiada
em sua voz enquanto olhava para o grande barman. — Por que não nos
faz um favor e sai de cima do meu pau? Não ouço a senhora reclamando
sobre o toque de recolher de alimentação.
O homem franziu o cenho. — Ouça, cara, eu não faço as leis.
Rafe grunhiu. — Nem eu.
— Sim, mas não é a Ordem que deveria aplicá-las?
— Ele não é da Ordem. Não mais. Dizem que eles chutaram o
traseiro dele.
O comentário veio de um grupo de civis Raça de Darkhavens da
área ocupando uma das mesas atrás dele. Ricos e inúteis em suas
camisas polo e calças cáqui, eles eram a versão vampírica de garotos ricos
de fraternidade. Rafe ganhou o desprezo dos cinco jovens machos no
minuto em que chegou e a anfitriã de sangue humana, que eles estavam
enchendo de álcool durante a maior parte da noite, decidiu que preferia
passar o seu tempo no colo de Rafe.
Ele virou a cabeça para olhar de relance para eles, sentindo o
desprezo fervendo em suas costas. Um par de idiotas cheios de ego que
realmente pareciam estúpidos o suficiente para querer enfrentá-lo.
Rafe teve que conter o seu sorriso. Ele estava pronto para uma
briga esta noite.
Inferno, esta era a razão pela qual ele estava aqui em primeiro
lugar.
— Meu pai trabalha na polícia — acrescentou solicitamente o
porta-voz dos homens do Darkhaven. — Ele diz que toda a JUSTIS está
comentando há semanas que o Garoto de Ouro foi chutado em sua bunda
por Lucan Thorne, e eles o dispensaram. Evidentemente, insubordinação
grave e conduta imprópria não é uma boa ideia, mesmo para os membros
da Ordem.
— Isso é verdade? Você não é mais um dos guerreiros da Ordem?
Rafe voltou-se para o barman carrancudo. — Eu pareço ser?
Ele sabia muito bem que não. Seus cabelos loiros escuros
cresceram em cachos soltos que se enroscavam em seus ombros,
soprados pelo vento de sua motocicleta, a qual ele estacionou do lado de
fora do bar. Uma barba grossa sombreava seu rosto e mandíbula. Ele não
vestia o uniforme preto e o cinto de armas da Ordem há meses.
Esta noite ele vestia jeans e uma camiseta escura por debaixo da
jaqueta de couro preta. Ele se parecia mais com um dos membros de
gangue de aparência ameaçadora jogando sinuca e entornando doses do
outro lado da sala do que com um membro do grupo de guerreiros de elite
da Ordem.
Os humanos vestindo couro preto cravejado o observavam desde
que entrou, desconfiados e cautelosos. Rafe sentiu os seus olhos nele
agora, em particular do homem musculoso e de cavanhaque dominando
o grupo, e da única fêmea do bando, uma morena alta e esbelta com o
rosto de um anjo e curvas de dar água na boca sob o couro de motociclista
e suéter preto de gola alta.
Quanto a Rafe, a sua aparência rude era tão deliberada quanto a
sua presença no bar esta noite.
Tudo parte do plano. Assim como a sua remoção das patrulhas da
sua equipe após retornar de Montreal, e o mais recente rumor,
cuidadosamente construído, que foi permitido a se espalhar como fogo
pelas comunidades policiais humanas e Raça de que foi expulso
desonrosamente do serviço.
Apenas alguns na Ordem conheciam a verdade. Ou seja, os
arquitetos da atual missão secreta de Rafe: Lucan Thorne, na sede no
D.C., Gideon, o gênio de tecnologia da Ordem; e Sterling Chase, o
comandante do centro de operações de Boston.
Lucan fizera apenas uma concessão por insistência de Rafe – seus
pais, Dante e Tess. Embora Dante comandasse o centro de operações de
Seattle para a Ordem, não havia como mantê-lo longe de Boston se ele
realmente acreditasse que seu filho havia se afastado tanto do caminho.
Permitir que seus pais pensassem o pior dele teria sido difícil, mas
quase matou Rafe ser obrigado a esconder a verdade de seus
companheiros de equipe e amigos, Nathan, Elijah e Jax. Ele só podia
imaginar o que pensavam dele agora.
Deixar Aric Chase acreditar que ele era um fiasco e um fracasso
era ainda pior. Especialmente quando ele devia a vida ao seu melhor
amigo. Felizmente, o macho ainda estava em Montreal com sua nova
companheira, Kaya. O casal estava ocupado recrutando uma nova equipe
para a Ordem, uma composta de daywalkers, aqueles poucos e muito
raros Raça, como Aric e sua irmã gêmea, Carys, e sua mãe, Tavia.
Rafe só esperava que uma vez que a poeira se assentasse após a
operação solo que iniciava esta noite, ele fosse capaz de se redimir aos
olhos de todos.
Não apenas por sua derrocada secretamente orquestrada pela
Ordem, mas pela muito real que a precedeu.
Ironicamente, foi a vergonha que ele causou a si mesmo em
Montreal que o tornou o único candidato adequado para esta missão
agora.
E não falharia.
Não dessa vez.
Mesmo que isso significasse dar o seu último suspiro por aquele
voto.
Atrás dele, o Boca Grande do Darkhaven só parecia encorajado pelo
fato de não provocar uma reação de Rafe. — Não sei, meninos, ele não
parece tão duro para mim. Acho que não é tão valente sem os outros
bandidos da Ordem para apoiá-lo.
Rafe exalou um forte suspiro, mesmo que apenas para mascarar
sua satisfação pela previsibilidade do seu alvo esta noite.
Calmamente, ele moveu a mulher agarrada nele do seu colo para o
banquinho ao seu lado. Então, ele jogou um sorriso de desprezo para a
mesa dos vampiros civis. — Sabe a melhor coisa sobre ser expulso da
Ordem? Não ter que tratar direito os fodidos do Darkhaven como você,
como se você fosse importante.
Alguns deles zombaram do insulto. Rafe ouviu o abrupto arrastar
de uma cadeira no instante em que desviou a atenção deles. Ele sabia
que o ataque estava chegando antes mesmo de sentir a mudança no ar
quando um dos machos Raça se lançou sobre ele por trás.
Nenhuma surpresa, foi o Boca Grande. E merda – o idiota tinha
uma faca. Teria sido enterrada nas costas de Rafe se ele não tivesse
esquivado do golpe no mesmo momento em que seu atacante atacou. Rafe
agarrou o pulso do macho e o torceu com força.
O macho gritou e soltou a arma.
Rafe pegou a lâmina com a mão livre, usando a outra para puxar o
braço do agressor para suas costas. Poderia ter quebrado o membro com
uma flexão de seu pulso ou virado a faca em seu dono, mas não queria
causar dano real ao imbecil do Darkhaven ou aos seus amigos, não
importando o quão satisfatório isso pudesse ser.
Ele havia intensificado a situação para a audiência de apenas um.
E também tinha a atenção total do cara.
Enquanto a metade do bar saía às pressas, alguns turistas em
pânico gritando enquanto fugiam para a rua, os membros da gangue
permaneceram. Pela sua visão periférica, ele viu o líder deles de
cavanhaque observando enquanto calmamente continuava seu jogo na
mesa de sinuca.
Rafe aumentou a pressão na articulação do cotovelo do Boca
Grande, fazendo-o grasnar para compor o cenário. E sim, porque o
bastardo merecia um pouco de dor.
Ele estava prestes a jogar o macho para seus companheiros quando
a porta da frente do bar se abriu. Outra dupla de machos Raça entrou,
sem dúvida alertados sobre o problema pela multidão saindo do lugar
momentos atrás.
Rafe gemeu internamente.
Ah, porra. Apenas o que ele não precisava.
Jax e Elijah.
Os seus dois companheiros de equipe – ex-companheiros de equipe,
até onde eles sabiam – estavam vestidos com equipamento de patrulha e
armados até os dentes. O que quer que eles pensassem dele agora,
claramente estavam chocados ao encontrar Rafe em pé no meio do
Asylum, segurando um civil Raça choramingando numa mão e uma
adaga na outra.
— Que porra está acontecendo aqui? — O tom baixo e soturno de
Eli era praticamente um grunhido.
As sobrancelhas de ébano de Jax estavam juntas sobre os olhos
escuros e amendoados. — Este é o último lugar que esperávamos ver
você, Rafe.
— Não me diga. — O último lugar onde esperava vê-los também.
Ele não perdeu o fato de que uma das hira-shuriken1 afiadas de
Jax brilhava na mão do guerreiro, pronta para ser arremessada. O
movimento para acertar uma estrela ninja era puro reflexo para o macho
letal, mas essa era a primeira vez que Rafe já esteve na mira das
habilidades frias de seu camarada.
Felizmente, a dupla foi sem Nathan, o capitão da equipe. Por mais
que Rafe temesse a ideia de um confronto com Eli ou Jax, suas chances
de se afastar inteiro diminuiriam drasticamente se o ex-Hunter estivesse
ali com eles.
— Que bom que vocês apareceram — murmurou o barman por trás
do balcão. — Este está ansioso para brigar com alguém desde que chegou
aqui.
Rafe não podia negar isso. O plano era causar um tumulto na frente
da gangue, tornar conhecido de uma forma muito pública, até mesmo
violenta, de que ele não estava mais do lado certo da lei.
Ele manteve seu controle sobre o Boca Grande, apenas porque sua
mente estava ocupada formulando a melhor maneira de desarmar a
situação sem desvendar seu único propósito de estar lá esta noite.
Enquanto isso, ficou preso num impasse indesejado com os dois
guerreiros que ainda considerava seus irmãos.
— Solte-o, idiota!
O comando gritado não partiu de Eli ou Jax, mas sim de um dos
amigos do Boca Grande.
E o idiota teve o péssimo julgamento de tirar uma arma de algum
lugar de sua pessoa. A brilhante pistola semiautomática de aço inoxidável
balançou em suas mãos quando o civil saltou de sua cadeira e apertou o
gatilho na direção de Rafe.
Ou tentou.
Naquele mesmo momento, a hira-shuriken de Jax voou pelo ar. Ela
rasgou o antebraço do fodido idiota, desviando a sua mira. A arma

1 É uma arma de arremesso de origem japonesa. São conhecidas como “estrelas ninja”,
normalmente com três até oito pontas.
disparou em direção ao teto, os ricochetes soando sobre a batida da
música tocando no sistema de som.
Os dois guerreiros da Ordem avançaram rapidamente sobre a mesa
dos machos Darkhaven. Em segundos, os cercaram e procuraram por
outras armas.
Eli caminhou até Rafe e tirou o Boca Grande do seu aperto,
empurrando o macho para seus amigos. Então pegou a adaga de Rafe.
— Você já está andando numa linha fina, cara. Não faça algo que
não pode consertar.
Sua voz profunda estava nivelada, mas não havia dúvidas sobre o
aviso que carregava. Ele se voltou para os machos Darkhaven. — Quanto
ao resto de vocês, senhoras, levem suas bundas para casa antes que
algum idiota como aquele ali acabe com vocês apenas por serem idiotas.
Rafe observou o Boca Grande e seus amigos saírem do Asylum. Jax
os seguiu, mas Eli permaneceu por mais um momento. Ele prendeu Rafe
com um olhar grave.
— Sabe que se vier a ordem de Lucan para lidar com você, vamos
ter que cumpri-la.
Rafe manteve o olhar sóbrio do seu camarada. Ele sabia como
deveria agir neste momento, o que precisava dizer. Mas saber e empurrar
as palavras de sua língua eram duas coisas diferentes.
— Acha que eu realmente me importo? — Sua boca torceu pelo
gosto amargo da mentira.
— Não, cara. Acho que não. — Eli franziu a testa, então balançou
a cabeça lentamente com uma maldição. — Então é melhor você
fodidamente se cuidar.
Ele se virou e saiu do bar sem olhar para trás.
Alguns segundos após a Ordem sair, um gemido de dor chamou a
atenção de Rafe para a área perto da mesa de sinuca. Um dos membros
da gangue bateu em sua barriga num frenesi, seu rosto pálido pelo
choque.
— Oh, foda-se! Cruz, acho que fui atingido. Filho da puta, estou
sangrando!
O soco olfativo de hemoglobina fresca atingiu as narinas de Rafe ao
mesmo tempo em que o homem magricela rasgou a jaqueta de couro para
revelar uma mancha vermelha no estômago.
Simplesmente fodidamente ótimo.
As presas de Rafe explodiram em resposta. Era quase impossível
para um vampiro Raça não reagir à explosão sensorial do sangue
derramado. Seus olhos ardiam em âmbar, sua visão ficando mais nítida
com o estreitamento vertical de suas pupilas, quando tudo que era Raça
nele veio a vida perigosamente.
O choro do membro da gangue se intensificou. Alguns de seus
companheiros se reuniram em torno dele, incluindo o que estava no
comando. Outros se afastaram, incluindo a linda morena que desviou o
olhar do companheiro ferido e afastou-se dos outros como se estivesse
prestes a vomitar.
Atrás dele, o barman Raça rosnou através de suas presas. —
Maldito inferno. Aquele filho da puta vai se esvair em sangue em mais
um minuto.
Rafe não podia fingir que realmente se importava. Olhou de relance
para o humano com um provável ferimento mortal no intestino e as
feições graves de seus companheiros. Mais alguns segundos eram o que
provavelmente restavam ao amigo deles.
Rafe estudava o grupo de festeiros da pesada por semanas,
procurando uma maneira de ganhar a atenção deles – e a confiança. O
plano que montou com Lucan e Sterling Chase exigia a paciência que ele
realmente não tinha. Talvez essa oportunidade inesperada pudesse ser
sua melhor chance de fazer a engrenagem funcionar em sua missão.
Rafe olhou para suas mãos. Ele nasceu com o dom de cura da sua
mãe. Por mais que odiasse usar sua habilidade pessoal em vermes como
estes, tudo valeria a pena se isso o aproximasse de seu objetivo final: a
destruição da Opus Nostrum e de todos os fiéis à sua causa.
O barman proferiu uma dura maldição. — Se esse humano morrer
no meu bar, eu vou responsabilizar diretamente você e a Ordem por isso,
idiota.
Rafe sacudiu a cabeça. — Ele não vai morrer.
Com as mãos ao lado do corpo, ele atravessou o bar.
CAPÍTULO 2
Seu estômago se contorceu como se tivesse levado um soco.
Puta merda. Devony Winters se afastou do resto do grupo com um
gemido. Mal conseguiu resistir ao impulso de fugir da visão da lesão da
bala que jorrava do intestino de Fish.
Não porque ela era sensível com relação ao sangue.
Longe disso.
A reação que se esforçou para esconder era algo muito diferente, e
muito mais condenável do que medo ou enjoo. Suas presas surgiram
atrás de seus lábios firmemente fechados. Sua visão se afiou, tudo tingido
com um brilho âmbar.
Ela era Raça – uma daywalker, a mais rara de sua espécie. Era uma
verdade que estava escondendo de Cruz e sua gangue desde que ela se
juntou a eles, cinco semanas atrás.
Até onde sabia, o grupo de desordeiros estava mais interessado em
roubar e festejar como reis do que com o ódio indiscriminado dos Raça.
Isso não significava que queria testar a teoria, ou perder a confiança que
cultivou desde que a aceitaram como uma deles. Agora, toda sua cautela
meticulosa estava à beira de ser desfeita por uma bala errante e uma
briga de bar sem sentido.
Tudo isso causado pelo gigante arrogante e de cabelo loiro escuro
do outro lado da sala.
Fodidamente brilhante.
Pena que a dupla de guerreiros da Ordem não o expulsou do
Asylum ao mesmo tempo em que expulsaram os idiotas do Darkhaven
que estavam tão ansiosos para incitá-lo a uma briga.
Devony lutou para conter a resposta automática de seu corpo ao
som da batida do coração de Fish e do aroma do sangue vital se
acumulando debaixo dele no chão. Ousando um rápido olhar por cima
do ombro, viu que a fonte de todos os seus problemas esta noite estava
agora atravessando a taverna. Não indo embora, mas caminhando em
direção a Cruz e Fish e os outros com uma arrogância de pernas
compridas, suas grandes mãos em punhos ao lado do corpo.
Merda.
O macho Raça – Rafe, como os seus companheiros da Ordem o
chamaram – não estava menos afetado pelo rápido derramamento de
sangue de Fish do que ela. Mas não fez nenhum esforço para esconder
isso.
Suas íris transformadas soltavam calor ardente, suas pupilas se
estreitaram de seu estado normal para fendas felinas. As pontas de suas
presas brilhavam como diamantes por trás do corte generoso de seus
lábios entreabertos. E seus dermaglifos, as marcas da pele Raça que
envolviam seus antebraços e subiam em sua garganta por baixo do
colarinho de sua camiseta preta, agora pulsavam vivas com cores
escuras.
Os próprios dermaglifos de Devony coçavam sob sua blusa de gola
alta de manga comprida. Em público, ela sempre tinha o cuidado de
mantê-los cobertos, particularmente na frente de Cruz e dos outros.
Agora, eram suas presas e olhos brilhantes que seriam expostas para a
gangue caso não se controlasse.
Claro, havia uma chance de que não prestassem atenção a ela.
Especialmente se o macho Raça se aproximando com tal propósito
significasse acabar com o sofrimento de Fish abrindo sua carótida bem
na frente deles agora.
Devony afastou-se de Cruz e dos outros enquanto eles se
amontoavam ao redor de Fish, que uivava e se contorcia no chão de
tábuas de madeira desgastado. Ela sentou-se numa mesa vazia,
segurando a cabeça entre as mãos, apenas para proteger o rosto de vista.
Melhor se julgassem que ela estava nauseada do que descobrissem a
verdade. Ela se manteve em um estado de calma forçada, mas não foi
fácil. O sangue ainda estava bombeando fresco e quente atrás dela, um
canto de sereia para seus sentidos Raça.
— Afaste-se dele. — O comando de Rafe foi um profundo grunhido
sobrenatural.
Devony levantou o olhar a tempo de vê-lo pisando entre dois caras.
Ocho e Axel não eram os tipos de homens para serem empurrados por
ninguém, mas nenhum deles parecia disposto a enfrentar esse macho
Raça raivoso e suas presas expostas. Nem mesmo Cruz fez um
movimento para desafiá-lo, embora sua mão descansasse na pistola
escondida sob a jaqueta de couro.
Fish irrompeu em pânico. — Ah, merda! Me tire daqui, pessoal.
Esse sanguessuga vai me matar!
— Ele não tem muito tempo. — Numa voz desinteressada e
desapaixonada, o homem Raça dirigiu-se apenas a Cruz, como se
entendesse que todos na gangue respondiam a ele. — Eu posso ajudá-lo.
Cruz não disse nada, mas deu um passo atrás, abrindo espaço para
o macho na frente de Fish.
—F-fique longe de mim! — choramingou Fish. Ele tentou se sentar,
mas só escorregou na poça de glóbulos vermelhos embaixo dele. — Não
me drene, cara. Estou te implorando!
Rafe ajoelhou no chão e colocou as mãos no abdômen de Fish. —
Acalme-se. Seu pânico só está fazendo você sangrar mais rápido.
Devony prendeu a respiração e observou, confusa e curiosa. Tentou
se inclinar para ter uma visão melhor, mas tudo que conseguiu distinguir
foi o grande homem Raça inclinado sobre Fish, as mãos segurando firme
sobre a ferida.
Após um momento, ela ouviu um barulho suave de um projétil cair
chão. Então o cheiro pungente de sangue fresco e fluido começou a
desvanecer-se. A respiração ofegante de Fish abrandou, sua dor e medo
se dissiparam num gemido abafado.
— Puta merda. — Foi Cruz quem falou primeiro, espanto em seus
olhos enquanto olhava para os dois homens. — Você o curou.
Agora que o fluxo de glóbulos vermelhos secou, a sede de Devony
diminuiu. Suas presas não enchiam mais sua boca. Sua visão, ainda
estava desumanamente aguçada, não mais queimando como brasas. Ela
se levantou da mesa e foi até o resto do grupo.
— Estou bem — ofegou Fish. Ele passou as mãos sobre o tronco
manchado e pegajoso, procurando pela ferida. Havia desaparecido. Nem
um traço disso em sua pele branca pálida. Ele soltou um grito. — Filho
da puta, estou muito bem!
O macho Raça levantou enquanto Ocho e Axel ajudavam Fish a se
levantar, todos maravilhados pelo que acabaram de testemunhar.
Cruz assentiu com a cabeça, claramente impressionado com o que
viu. — Aquilo foi... impressionante.
— Eu não posso acreditar — murmurou Fish, ainda em estado de
choque. Olhou para o macho Raça como se olhasse para o rosto de um
santo. — Eu estava morrendo, eu sei que estava. Mais um minuto e... —
ele balançou a cabeça numa maldição silenciosa. — O que você fez foi um
milagre. Salvou minha vida. Por quê?
— Porque eu podia, eu acho.
Fish soltou um suspiro. — Bem, não me importo porque você fez
isso, cara. Te devo uma. E pago as minhas dívidas. Vou te recompensar
por isso de alguma forma, você tem a minha palavra.
— Não se preocupe com isso. — Rafe ignorou a promessa como se
tirar alguém das garras da morte fosse algo que ele fazia todos os dias.
Com Fish recuperado, Ocho e Axel pediram uma nova rodada de
bebidas para seu companheiro ressuscitado. Enquanto os homens
continuavam um com o outro, o olhar do macho Raça se afastou deles
para se fixar em Devony.
Olhos astutos de água-marinha a estudaram sob os cachos
desgrenhados de seu cabelo loiro mel escuro. Ela nunca foi inspirada a
chamar um homem de bonito. Especialmente não um macho Raça de
aparência perigosa, de dois metros de altura e cujo imenso corpo estava
envolto em músculos fortes e uma vibração de ameaça.
Mas esse macho era lindo. Seu belo rosto esculpido em ângulos
esguios, sua mandíbula quadrada eriçada com a grossa sombra de uma
barba. Seus lábios eram decadentemente exuberantes, quase com um
aspecto muito terno num homem. Mas era aí que a suavidade de seu
rosto terminava.
Aqueles questionadores olhos azuis seguravam um traço de
desdém. Era a mesma borda de desprezo que ela sentia irradiando dele
desde o momento em que ele entrou no Asylum esta noite e viu Cruz e os
outros na parte de trás da taverna.
Talvez não fosse a única com algo a esconder.
— Sentindo-se melhor? — Sua voz profunda rolou sobre seus
sentidos como uma carícia. — Ainda parece um pouco verde, se me
perguntar.
A observação não convidada chamou a atenção de Cruz e dos
outros. Todos olhavam para ela agora. Na expectativa, esperando para
ver como ela responderia.
Alarme disparou em suas veias. Por um instante, ela se preocupou
que o macho Raça pudesse ver através dela. Que ele podia dizer que ela
não era exatamente o que parecia.
Mas um movimento discreto de sua língua ao longo da borda dos
dentes lhe assegurou que suas presas recuaram completamente. E sua
visão não tinha mais nenhum traço de âmbar.
Para ele e os outros homens olhando para ela não havia nada para
entregá-la.
— Não perguntei — murmurou ela com força. — E como eu me
sinto não é da sua conta.
Ela virou as costas para ele por um momento e terminou a dose de
uísque que esteve bebericando durante toda a noite. Sendo uma
daywalker, sua genética incomum permitia que ela consumisse comida e
bebida humanas. Agora, ainda sentindo o calor de seus olhos cravados
nela por trás, ela estava ansiosa para parecer tão humana quanto
possível.
O que realmente queria era sair do Asylum e ficar tão longe desse
macho quanto pudesse.
Pelo canto do olho, ela observava com crescente preocupação
enquanto a troca entre os homens continuava, tornando-se mais íntima
e mais relaxada a cada minuto. Não era bom. Passar-se por humana com
Cruz e sua gangue requeria um pouco de esforço, mas seria quase
impossível esconder por muito tempo o que era de outro membro Raça.
O fato de ter sido treinado como guerreiro da Ordem só fazia seu
medo e sua suspeita se intensificarem.
A última coisa que precisava era que ele rondasse com o grupo mais
do que já fizera esta noite. Ela queria que ele fosse embora, e quanto mais
cedo melhor.
Colocando o copo sobre a mesa, ela cruzou os braços sobre os seios
e olhou para o macho Raça com uma desconfiança que esperava que
fosse captada por seus companheiros. — A cura parece ser uma
habilidade irônica para alguém do seu tipo.
Seu comentário interrompeu a conversa tão eficazmente quanto
outra rodada de tiros.
— Um do meu tipo? — perguntou ele, aqueles olhos aguçados se
estreitaram quase imperceptivelmente. — Você quer dizer Raça?
Ela arqueou uma sobrancelha. — Eu quis dizer um guerreiro da
Ordem, mas agora que mencionou isso...
Ele olhou para ela. — Bem, notícia de última hora, caso tenha
perdido, querida. Não sou mais um guerreiro. Quanto à minha genética,
suponho que você não aprova.
Ela levantou o ombro. — Suas palavras, não minhas.
— Claro. — Um sorriso puxou a borda de sua boca bonita. — Não
critique antes de experimentar.
Os homens riram. O rosto de Devony queimou, e por um instante
ela não queria nada mais que dar a todos um lampejo de suas presas,
antes de saltar sobre o macho Raça para humilhá-lo.
Fish gargalhou e deu uma palmada no ombro de seu novo melhor
amigo. — Ei, cara, um conselho. Não irrite a Brinks, ou quando você
perceber ela estará te servindo as suas bolas na ponta da adaga.
Brinks era o apelido que deram a ela, o que teve que trabalhar duro
para ganhar, a fim de fazer parte deles. E agora aqui estava esse vampiro
sorridente – esse ex-guerreiro da Ordem – fazendo piadas às suas custas
e se integrando com a gangue em questão de minutos.
Ela não gostou disso.
E também não gostava dele.
Ignorando o divertimento deles, ela encontrou o olhar de Cruz. —
Pensei que tivéssemos um lugar para ir esta noite. Nós vamos ou o quê?
Ele assentiu. — Ela está certa. Vamos arrumar tudo e sair daqui.
Devony fechou a jaqueta de couro, dando ao intruso um olhar de
satisfação enquanto passava por ele e pela poça de sangue que coagulava
por perto. — Esperarei do lado de fora.
O ar fresco do outono e o céu noturno aberto do estacionamento
eram um alívio bem-vindo dos confins úmidos e manchados de sangue
da taverna. Ela caminhou até sua motocicleta e passou a perna sobre o
assento preto da Triumph. Por um momento, ela simplesmente ficou
sentada ali, respirando profundamente, limpando a cabeça inclinada
para a lua e as estrelas.
Quando pegou o seu capacete pendurado no guidão, ouviu Cruz e
os outros saírem pela porta dos fundos do Asylum.
E caramba, eles não estavam sozinhos.
Rafe saiu com eles. Fish bateu no bíceps do ex-guerreiro antes de
seguir Ocho até sua Ferrari vermelha e subir no banco do passageiro.
— Te encontro lá — disse Cruz a Devony enquanto ele e Axel
caminhavam até a novíssima Lamborghini cinza metálica do líder da
gangue e aceleraram. Os dois veículos saíram do estacionamento e
subiram a rua.
Devony sempre preferiu andar sozinha, mas lamentou
profundamente essa escolha enquanto o macho Raça caminhava até um
monstro elegante de moto BMW estacionada no espaço ao lado dela.
— Onde diabos pensa que vai?
— O mesmo lugar que você. — Ele subiu na moto e levantou o
descanso com a bota. — Cruz me convidou para ficar por um tempo. Acho
que isso significa que vou te seguir.
Não se ela tivesse alguma coisa a dizer sobre isso.
Sem responder, ela enfiou o capacete na cabeça e ligou o motor.
Então acelerou e saiu do estacionamento, deixando-o na poeira
atrás dela.
CAPÍTULO 3
Rafe passara muitas noites correndo por telhados de Boston
enquanto patrulhava para a Ordem, quer em busca de vampiros
Renegados ou de outros bandidos que fugiram da lei e pensaram que
poderiam escapar da captura no labirinto de ruas em zigue-zague e becos
sinuosos.
Mas nunca viu a cidade da perspectiva de uma cobertura
multimilionária do sexagésimo andar, onde ele estava agora.
Não foi informado do nome do fodido rico que possuía o lugar. Não
conhecia nenhuma das mais de cem pessoas que estavam se divertindo
e dançando lá dentro ou se espalhando pelo terraço ao ar livre com ele.
Pelo o que Rafe poderia dizer, era o único membro Raça lá. A aglomeração
de seres humanos – bêbados, suados e barulhentos – fez com que saísse
pouco depois da sua chegada.
Quanto aos seus novos companheiros, Cruz estava numa reunião
a portas fechadas com alguns outros homens da festa enquanto Fish e
seus dois amigos estavam ocupados continuando a comemoração que
começaram no Asylum. Todos os três estavam bem chapados e cercados
por um grupo de mulheres atraentes e igualmente debilitadas.
Ocho2 ergueu a mão direita, a que provavelmente lhe valeu o
apelido devido ao fato de faltar os dois últimos dígitos. Ele gesticulou para
que Rafe entrasse e se juntasse a eles, mas o convite tinha pouco
interesse ou valor. Apesar da necessidade de fortalecer a confiança e a
amizade dos homens, a atenção de Rafe seria mais bem aproveitada em
outro lugar neste momento.
Ele desviou o olhar como se tivesse perdido o sinal de Ocho, depois
caminhou mais para o terraço.
Ainda havia outro membro da gangue de Cruz que ele precisava
conquistar.
No Asylum, a morena chamada Brinks havia olhado para ele com
desconfiança do outro lado da taverna, antes mesmo de ter curado Fish.
Depois, sua animosidade em relação a ele só parecia aumentar. Ele
estava acostumado a irritar algumas pessoas do lado errado da lei como
membro da Ordem, mas essa mulher pareceu odiá-lo à primeira vista.
Aparentemente, deixá-lo no estacionamento foi apenas o começo
de sua evasão. Desde que chegou à festa de cobertura, Rafe não foi capaz
de captar mais do que um rápido vislumbre dela.
Ele podia jurar que a viu sair não mais de dois minutos atrás.
Atravessando os grupos de homens e mulheres conversando com
suas bebidas perto da piscina iluminada e nos lounges ao redor, Rafe
avistou a mais breve sugestão de couro preto e cabelos negros reluzindo
na escuridão. Ele não confundiria aquele corpo alto e extraordinário com
o de qualquer outra pessoa. Ela desapareceu nas sombras na
extremidade do longo terraço.
Ele se concentrou nela com um propósito decidido.
A encontrou sentada num banco de pedra escondido num canto
sombrio. Com os braços em volta dos joelhos dobrados e as botas de
combate plantadas diante dela no banco, ela olhou para cima quando
Rafe se aproximou. — Você simplesmente não entende uma maldita dica,
não é, vampiro?

2 Ocho se originou da palavra espanhola para oito


Ela enfatizou a palavra, como se para lembrá-lo de suas diferenças.
Sem mencionar o seu desdém.
Rafe sorriu e levantou o ombro. — Só estou tentando ser amigável.
No caso de ninguém ter dito a você, o objetivo de uma festa é socializar.
— Então, vá socializar. No caso de ninguém ter dito a você, o motivo
de fazer isso é encontrar alguém que esteja realmente interessado em
falar com você.
— Ah. E você não está.
Uma delicada sobrancelha arqueou, ela tocou o dedo na ponta do
nariz. — Olhe para você, aprendendo a pegar uma dica depois de tudo.
Ele riu. — Por que não está dentro com todo mundo?
— Vim aqui para ficar sozinha — disse ela, encarando-o quando ele
não fez nenhum movimento para sair. — Além disso, estou apenas
esperando que Cruz termine para que possamos sair daqui.
Rafe grunhiu. — Onde ele foi, afinal? Parecia que tinha assuntos
sérios para tratar com alguém.
— É mesmo?
Quando ela não respondeu mais do que isso, ele decidiu adotar
outra tática. Expirando um suspiro, ele virou a cabeça para olhar as luzes
da cidade competindo com as estrelas e a lua. — Esta vista deve custar
muita grana, né? Fish disse o nome do cara que é dono deste lugar?
Ninguém mencionou o nome do dono da cobertura para ele, e
infelizmente a morena cautelosa, que o encarava fazendo buracos em seu
crânio não estava nem tentada a morder a isca. Ele olhou para ela e foi
recebido com um olhar desconfiado.
— Você faz muitas perguntas.
— O que posso dizer? Sou naturalmente curioso.
E se ele tivesse que usar seus poderes Raça para colocar a mulher
em transe a fim de obter essas respostas, não estava acima de se rebaixar
a fazer isso aqui e agora.
No início desta noite na taverna ele a considerou atraente. Agora,
com apenas alguns metros os separando no canto isolado do terraço
iluminado pela lua, ele percebeu quão inadequado o termo era para
descrevê-la.
Seu rosto era lindo, a pele cremosa acentuando uma delicada
estrutura óssea e lábios da cor de uma rosa escura. Seus olhos da cor de
uísque eram grandes demais para seu rosto, e infinitamente expressivos
– mesmo quando Rafe estava certo que ela estava fazendo o possível para
excluí-lo.
Toda aquela beleza estava emoldurada por uma juba de grossos e
ricos cachos castanhos que caíam sobre os ombros e desciam por sua
rígida coluna. Os brilhantes fios brilhavam como seda sob a luz das
estrelas, um contraste fascinante contra o couro preto cravejado de seu
casaco de motoqueiro.
A mulher em si era um estudo em contraste, até a voz dela, que era
marcada e sofisticada, um ronronar sexy que acariciava seus sentidos
mais do que ele queria admitir.
Quando ela deixou o silêncio se alongar entre eles, ele se aproximou
e sentou-se no banco. — Eu sou Rafe, a propósito.
— Eu sei quem você é. — Ela inclinou a cabeça e estudou-o. —
Ouvi um dos guerreiros da Ordem te chamar no Asylum.
Ele deu um aceno sombrio. — E você? Brinks é seu sobrenome ou
algo assim?
— Apenas um nome.
Não era exatamente uma resposta, e ela obviamente não estava
disposta a compartilhar.
Ele não sabia o que havia feito para provocar a sua animosidade –
além de ter nascido Raça. Os comentários dela no Asylum não deixaram
dúvidas de que ela não facilitaria qualquer tipo de participação sua na
gangue de Cruz.
Se ele achava que a conquistaria com alguns sorrisos e alguma
conversa fiada, aparentemente ele havia superestimado o seu charme.
Ou subestimou sua aversão instantânea por ele.
Ele estava em território desconhecido agora. Abençoado com uma
combinação da aparência dourada de sua mãe e do volume e elegância
de seu pai, Rafe estava acostumado a ter a atenção de qualquer mulher
que quisesse.
Não essa.
E, maldição, se isso não o deixava mais determinado para descobrir
a razão.
— Então, você e Cruz. Vocês estão juntos?
— Como um casal? Não. — Ela negou tão rápido que poderia muito
bem ser uma zombaria. — Por quê? Acha que por ser mulher eu devo
estar dormindo com ele? Ou talvez pense que todos estão me
compartilhando?
Uma imagem instantânea e sem ser convidada dela sendo passada
entre aqueles quatro homens rudes preencheu sua mente antes que ele
pudesse impedir. Não tinha o direito de sentir o pico de agressão, de
proteção, que o atravessou logo depois daquela possibilidade indesejada.
Ele balançou a cabeça, apenas para desalojar a visão. — Só
tentando entender a situação.
E sim, ele queria saber por que uma mulher bonita e claramente
inteligente estava perdendo tempo em torno de elementos criminosos
como Cruz e seus amigos. Se não era envolvimento pessoal, então o que
a levou até eles?
O que a fazia proteger Cruz e seus atos criminosos quando Rafe
não estava certo se ela gostava do homem?
Ou eram seus próprios segredos que ela estava tentando proteger?
A razão pela qual ele estava lá era descobrir se a gangue tinha uma
conexão com a Opus Nostrum e, em caso afirmativo, quem estava do
outro lado da ponta. Isso significava que ninguém podia estar acima de
qualquer suspeita. Por tudo que sabia, ele podia estar olhando para essa
conexão agora mesmo.
Como se sentisse seu crescente escrutínio, ela desviou o olhar. —
Não estou com Cruz ou qualquer outra pessoa. Não misturo negócios com
prazer.
Rafe grunhiu. — Política inteligente. Então, de que tipo de negócio
estamos falando?
— Não estamos. Você é quem continua falando.
— Deve ser lucrativo — pressionou ele. — Talvez haja espaço para
mim em algum lugar.
— Não há.
Algo parecido com medo brilhou em seu rosto no instante em que
ela virou a cabeça para olhar para ele. Mas ela o escondeu rapidamente,
fechando sua expressão.
Rafe acreditava que ela não estava envolvida com Cruz ou qualquer
outro homem em sua gangue, mas não acreditava nem por um segundo
que sua atitude defensiva tinha algo a ver com lealdade a eles. A reação
dela neste momento foi pessoal.
Assim como o desespero para se afastar dele e de suas perguntas.
Porque ela escondia alguma coisa.
Mentia sobre alguma coisa.
Inferno, agora ele não sabia se podia acreditar em qualquer coisa
que saísse de sua linda boca.
Isso não significa que estava pronto para aceitar esse fato e ir
embora. Longe disso.
Sentir a sua dissimulação só o fez querer abri-la, camada por
camada, até que estivesse satisfeito de que tinha as respostas de que
precisava. Se ele fizesse isso por meio de charme, força ou qualquer outro
meio a seu favor, ele malditamente não se importava. Tudo o que
importava era a sua missão.
Até que tivesse um nome ou um rosto que o levaria ao círculo
íntimo da Opus Nostrum, todo o resto era apenas uma questão de
ultrapassar os obstáculos.
Mesmo que fossem lindos como ela.
Inferno, especialmente então.
Ela tirou as pernas do banco e levantou-se abruptamente. — Essa
conversa acabou. Quer saber alguma coisa sobre Cruz ou seu negócio,
pergunte a ele mesmo.
Ela começou a se afastar. Usando uma velocidade sobrenatural,
Rafe se afastou do banco e se plantou na frente dela antes que desse seu
próximo suspiro.
Ela sugou o ar num arfada, seus grandes olhos ficando ainda
maiores quando ele bloqueou o caminho dela. Ele precisava de respostas
honestas e não tinha paciência para correr o risco de esperar por elas.
O que significava que teria que colocá-la em transe e tirar a verdade
dela.
Ele pegou o braço dela e ela se desvencilhou de seu aperto com
uma maldição. — Saia do meu caminho.
Sua voz era um grunhido baixo e perigoso. E ela era forte. Os dedos
dele não seguraram nada além de músculo puro e magro naquele breve
momento de contato. Havia mais poder nela do que ele jamais imaginaria
ser possível num humano.
A não ser que...
Rafe recuou, franzindo o cenho. — Que porra é essa?
— Ei, cara! — A saudação bêbada de Fish o anunciou conforme ele
se aproximava do canto no terraço cheio de tensão. — Aí estão vocês.
Estive procurando por você, Rafe.
Ele tinha um par de mulheres rindo sob seus braços e uma garrafa
de cerveja batendo precariamente em sua mão. Sua camisa ainda estava
rasgada e manchada por causa do tiro que ele sobrevivera, mas suas
companheiras não pareciam se importar.
— Aqui, eu trouxe algo para você. — Fish empurrou uma das
mulheres para ele.
Assim que a atenção de Rafe foi desviada, Brinks se afastou, tão
escorregadia quanto um fantasma.
Falando uma maldição em voz baixa, a viu desaparecer na
multidão.
Ele não a encontraria novamente esta noite. Ela se certificaria disso
agora.
Mas ela não podia evitá-lo para sempre.
Ele não ia a lugar nenhum. Não até que desvendasse todos os
segredos de Cruz... e os dela.
— Vamos, cara. — Fish deu um tapinha nas costas dele. — Essas
garotas nunca fizeram uma festa com um Raça.
— É verdade? — Rafe sorriu, totalmente desinteressado. — Então
vamos entrar para que eu possa mostrar a elas o que estão perdendo.
CAPÍTULO 4
O nascer do sol chegou cedo, especialmente considerando que ele
só conseguiu chegar em sua casa de merda alugada em Southie alguns
minutos antes que os primeiros raios começassem a romper a escuridão.
Rafe abriu a porta do apartamento atarracado e entrou. — Casa,
porcaria de casa.
A unidade no térreo do velho edifício de três andares ostentava
poucas janelas, todas cobertas por películas de bloqueio de raios
ultravioleta de última geração. Foi uma das primeiras melhorias que fez
na sua primeira noite no local.
A outra melhoria adicionada era essencial.
Contornando a cama dobrável de parede na sala de estar, Rafe
entrou na cozinha, onde um armário com uma fachada falsa ocultava
uma estação de trabalho com computadores. Ele encarou o scanner de
retina, depois esperou por um momento enquanto o dispositivo lançava
uma conexão criptografada e altamente segura para a sede da Ordem em
Washington, D.C.
O rosto de Gideon encheu a tela. Penetrantes olhos azuis,
sombreados por óculos redondos e azulados, encaravam Rafe sob a coroa
espetada do cabelo loiro curto do Raça macho. — Cristo, já era hora de
você se reportar. A propósito, você parece um animal atropelado.
Rafe grunhiu para o guerreiro que também era seu padrinho. —
Bom dia para você também.
Enquanto os dedos de Gideon batiam sobre um teclado do outro
lado, a tela de Rafe se dividiu para acomodar os outros dois anciãos da
Ordem que estavam conectados à chamada.
A expressão de Lucan Thorne era sombria, o cabelo preto
acentuando os ângulos duros do rosto do Gen Um. Na outra janela de
vídeo, Sterling Chase parecia igualmente sóbrio. Tanto o líder da Ordem
quanto o comandante de Boston olharam para Rafe como pais em
desaprovação.
— Onde diabos esteve? — exigiu Chase.
Lucan parecia igualmente chateado. — Esta reunião supostamente
deveria ter acontecido há mais de quatro horas, filho.
Rafe retrucou as indevidas reprimendas. — Se eu ainda não
estivesse no campo e disfarçado até agora, teria sido. Senhores.
Que diabos? Nenhum dos chefes da Ordem recriminava um
guerreiro por simplesmente fazer seu trabalho. Rafe sabia que tinha
algum terreno para compensar após estragar tudo em Montreal, mas esse
tipo de microgerenciamento era ridículo.
— Com todo o respeito, mas se algum de vocês acha que não pode
confiar em mim para realizar esta missão, deveria ter dito isso antes.
Chase mordeu uma maldição. — Não é isso, Rafe.
— Tem certeza? Então, que porra é essa.. senhor?
Lucan baixou o queixo, um brilho irônico penetrando em seu
tempestuoso olhar cinzento. — Você tem o sangue do seu pai correndo
em suas veias, não há dúvidas sobre isso.
Mas sua voz profunda estava estranhamente sóbria.
E Rafe ainda não sabia do que se tratava.
— Estamos lidando com uma... situação do nosso lado — disse
Lucan. — Não tem nada a ver com você ou sua missão e, francamente,
até conseguirmos resolvê-la, quero mantê-la limitada.
Rafe não ia pressionar. A julgar pelo olhar de seriedade nos olhos
do líder da Ordem, o que quer que fosse, não só o preocupava, mas
também aos outros dois machos.
Chase limpou a garganta. — Agora que está aqui, Rafe, conte-nos
como foram as coisas na noite passada. Eu soube que Eli e Jax agiram
friamente na operação no Asylum. Momento de merda. Me desculpe por
isso.
Rafe deu de ombros. — Dadas as circunstâncias, não posso dizer
que fiquei feliz em vê-los. Mas na verdade não podia ter funcionado
melhor.
Ele explicou o que aconteceu e como ganhou credibilidade crucial
com o líder, Cruz, e os outros, curando o membro ferido da gangue.
— Eles me convidaram para ir com eles neste lugar. — Ele digitou
o endereço do prédio onde a festa foi realizada, e um mapa da área
apareceu em seus displays com o arranha-céu em destaque.
Um momento depois, Gideon havia vasculhado na internet e
reunido um dossiê completo sobre o dono, que foi exibido na tela. —
Judah LaSalle. Trinta e dois anos. Solteiro. Único herdeiro de um
industrial bilionário francês. Pelo menos uma dúzia de residências ao
redor do mundo, sem contar um mega iate que comprou no ano passado
de um príncipe saudita por uns duzentos milhões de dólares.
Lucan franziu a testa. — Esse cara, Cruz, tem um gosto
interessante para amigos.
— Ou é ao contrário? — perguntou Chase.
Essas eram perguntas que Rafe fez a si mesmo a noite toda. — Cruz
e os outros gostam de brinquedos caros também. Eles têm algumas
centenas de dólares empatados em seus veículos e isso é só o começo,
com base no que consegui tirar de alguns deles na noite passada, após
as bebidas fluírem por algumas horas. Espero que eu tenha a chance de
espremer algo mais substancial em breve. Disse a Fish, o cara que curei,
que o dinheiro está apertado desde que a Ordem me chutou e estou
procurando algo para fazer. Vamos ver se eles mordem a isca.
— E LaSalle? — perguntou Lucan. — Alguma razão para pensar
que possa fazer parte do bando de festeiros de Cruz?
— Eles têm negócios juntos, não há dúvida sobre isso — disse Rafe.
— Cruz desapareceu numa reunião a portas fechadas com ele assim que
chegamos. Ficou lá por algumas horas antes de LaSalle deixar a festa
com seus guarda-costas.
— Alguma ideia do que foi discutido?
— Ainda não.
— Bem, descubra. E se precisarmos focar a atenção em Judah
LaSalle, faremos isso acontecer. — Lucan parou, olhando para Rafe por
um momento. — Curar aquele delinquente no bar foi um raciocínio
rápido. E agora nós temos essa nova pista para investigar também. Se
esta missão criar uma pista adicional em nossa busca pelo círculo íntimo
da Opus Nostrum, será mais do que conseguimos em meses. Bom
trabalho. Não poderíamos fazer nada disso sem você.
Rafe não esperava elogios. Tampouco estava preparado para o
quanto o afetou ouvir Lucan Thorne expressar sua gratidão, sua
confiança.
Ele não era digno disso.
Mas seria um dia.
Ele se certificaria de se redimir aos olhos de todos, mesmo que isso
lhe custasse o último suspiro.
— Não vou descansar até conseguirmos desmascarar todos os
bastardos da Opus — prometeu aos três anciãos da Ordem.
E não deixaria nada – nem ninguém – ficar em seu caminho.
Seus pensamentos se voltaram para a morena de pernas longas e
com o rosto de um anjo. A mulher que tinha tanto poder enrolado nela
quanto tinha atitude. E isso era dizer muito.
Na verdade, ela não havia ficado longe de sua mente a noite toda.
— Eles têm uma mulher andando com eles — disse Rafe. — Eles a
chamam de Brinks.
Gideon franziu a testa. — Não sabíamos que uma mulher fazia
parte da gangue.
— Bem, há. E certamente ela não me quer por perto. Tentei obter
informações dela, mas me bloqueou em cada movimento. Ela deixou claro
que não me quer por perto.
Os olhos de Chase se estreitaram. — Acha que ela está desconfiada
de você?
Rafe deu de ombros. — Acho que não. Acho que é algo pessoal.
Ele ainda não estava pronto para expressar todos os seus
pensamentos sobre ela, muito menos o que o assombrava desde que
entrou em conflito com ela no telhado.
Todos os seus instintos de guerreiro diziam que ela não era o que
parecia.
Todos os seus instintos Raça lhe diziam algo ainda mais
perturbador.
Ela era uma imortal. Provavelmente não Atlante, já que os
membros daquela raça não reagiam ao sangue derramado do jeito que
ela reagiu no Asylum. O que só deixava outra possibilidade.
E essa possibilidade não só levantava um inferno de muitas
perguntas, mas o colocava em uma perigosa desvantagem caso quisesse
se incorporar como um dos membros da gangue de Cruz.
Durante o sombrio silêncio de Rafe, Lucan estudou-o. — Descubra
quem é a mulher, descubra a história dela. Relate o que descobrir da
próxima vez que conversarmos.
— Sim, senhor.
Era um comando que Rafe pretendia seguir com determinação
implacável.
E se ela continuasse dificultando as coisas para ele ou impedisse
sua missão, tomaria as medidas necessárias para removê-la de seu
caminho.

~~~
A chaleira assobiou, o apito agudo penetrando o devaneio de
Devony enquanto estava na cozinha da sua casa de arenito3 no abastado
bairro de Back Bay, em Boston.
Embora chamar seus pensamentos sombrios de um devaneio
estivesse longe de ser apropriado.
Ela não dormiu mais do que algumas horas após voltar para casa
na noite passada. Toda vez que fechava os olhos, sua mente se inundava
com imagens do guerreiro Raça, Rafe. Não conseguia se livrar da
lembrança de todas as perguntas, ou do golpe de medo que sentiu
quando ele a agarrou no terraço e ela viu o lampejo de confusão em seus
olhos cor de água-marinha.
Aquele instante de suspeita... e compreensão.
Ele sabia.
Sabia que ela não era humana. Se ele adivinhou ou não que ela era
Raça ou algo parecido, ela não podia ter certeza.
Devony não ficou por perto para descobrir. Não conseguiu se
afastar dele rápido o suficiente. Ela fugiu da festa na cobertura para casa
e, pelo resto da noite, preocupou-se com o que ele poderia dizer a Fish ou
aos outros.
Ainda estava preocupada agora, porque se ele tivesse dado a Cruz
ou a qualquer outra pessoa uma razão para duvidar dela, isso iria
desfazer tudo.
Todo o seu trabalho árduo e planejamento. Todos os sacrifícios que
fez para chegar até aqui.
Todas as promessas que fez através de lágrimas amargas e uma
dor aparentemente sem fim.
Devony se preparou para a angústia que ainda tinha um firme
controle sobre ela. Tirando a chaleira do fogo, ela preparou uma xícara
de chá forte e levou-a pelo espaçoso primeiro andar do Darkhaven.

3
A casa de arenito era dela agora, mas estava em sua família há
décadas. Ela vivera sozinha enquanto frequentava a universidade em
Boston nos últimos dois anos. Seus planos para uma carreira na música
terminaram, embora isso fosse a coisa menos importante que sentia falta.
Não pisou em suas aulas por meses, mas ficou na casa antiga porque
não suportava voltar para Londres.
Não depois do que aconteceu.
Não até que tivesse cumprido a sua promessa de fazer o certo, de
fazer alguém pagar.
Talvez nem voltasse então.
No grandioso escritório revestido de estantes, a escrivaninha de
carvalho esculpida de seu pai parecia uma sentinela imensa e
inquebrável. Adequada, considerando que ela sempre pensou nele da
mesma maneira. Seu protetor, seu campeão, seu cavaleiro brilhante.
Ela sorriu melancolicamente, imaginando-o no cômodo que estava
cheio de tantos dos seus tesouros queridos. Seus livros e colecionáveis,
seu tabuleiro de xadrez onde costumava ensinar pacientemente a ela e
seu irmão sobre lógica e estratégia, e a paciência necessária para vencer
uma guerra. Do outro lado da grande escrivaninha pendia um retrato
pintado de sua linda mãe de cabelos escuros, uma peça que ele havia
encomendado especialmente para aquele mesmo local na parede do seu
escritório, para que pudesse ver sua amada companheira mesmo quando
seu trabalho os mantinha separados.
O olhar de Devony procurou outra foto, a foto da família
emoldurada na beira da velha escrivaninha do pai. Cumprimentava-a
neste quarto todas as manhãs, uma lembrança daqueles bons tempos.
Devony pressionou a ponta do dedo nos lábios, depois tocou cada
um dos três sorridentes rostos Raça que a rodeavam na foto. Seu lindo e
ruivo pai, Roland Winters. Sua mãe daywalker, Camilla. E seu irmão mais
velho, Harrison, que também nasceu daywalker, assim como Devony.
Eles eram toda a família que ela tinha. Ela deixou os dedos
repousarem no vidro frio que os cobria.
— Eu te amo — sussurrou no vazio do cômodo.
Então deslizou a mão por baixo da borda da escrivaninha e apertou
o botão que estava escondido na parte de baixo.
Uma das enormes estantes embutidas se abriu silenciosamente.
Atrás dela havia uma sala que seu pai projetou como um recurso de
segurança na grande casa. O espaço oculto foi construído não muito
depois da existência dos Raça ser revelada à humanidade. Quando as
guerras entre as raças era uma nova realidade aterrorizante.
Os ataques diurnos aos domicílios Raças por humanos com medo
de seus vizinhos noturnos foram epidêmicos. As retaliações foram brutais
e encharcadas de sangue.
As guerras que seguiram o Primeiro Amanhecer foram
praticamente extintas nos vinte anos que se passaram desde então,
graças em grande parte ao trabalho da Ordem. Os agentes da lei da
JUSTIS em todo o mundo ajudaram também.
Mas o ódio era uma doença difícil de erradicar completamente.
Apodrecia em silêncio, invadindo onde quer que encontrasse a menor
abertura.
Ele esperava a oportunidade de se espalhar.
Esperava que um novo portador aparecesse e lhe desse vida nova.
E agora ele encontrou um no grupo terrorista chamado Opus
Nostrum.
Devony entrou no antigo quarto do pânico e deixou que seu olhar
viajasse pelos mapas, fotos e dossiês que cobriam cada uma das quatro
paredes. Cordas vermelhas presas a pinos conectavam alguns desses
indivíduos a outros na parede. Traficantes de drogas, gangsteres,
pequenos criminosos. Presidentes de corporações, políticos, líderes
comunitários. Algumas semanas atrás, ela havia adicionado fotos de
Ricardo Cruz, Wayne Fishbaugh, Vincent Axelrod e Eugene Ocho Snyder.
Muitos dos rostos que ela adicionou às paredes agora tinham um
grande X desenhado sobre eles.
Antes que isso terminasse, ela esperava eliminar muitos outros.
Porque esta sala servia a um novo propósito agora.
Não mais um lugar para o pânico, mas um lugar para a justiça fria
e contínua.
Ajudava em uma nova guerra – uma muito pessoal.
Devony tomou um gole de seu chá enquanto seu olhar se movia ao
longo das imagens e linhas de conexão que estabeleceu entre grupos e
indivíduos. Eventualmente, ela encontraria o link que a levaria a Opus.
Um dia, retribuiria pelo o que tiraram dela.
Até então, ela precisava ter paciência.
E não estava prestes a deixar que o ex-guerreiro da Ordem a
desviasse daquele caminho.
CAPÍTULO 5
Devony conduziu a sua Triumph até o estacionamento atrás do
Snyder’s Exotic Auto em Roxbury.
Às dez da noite num final de semana, a garagem de Ocho estava
fechada há várias horas, mas uma luz fraca brilhava nas pequenas
janelas acima das duas baias na frente. A Lambo cinza metálica de Cruz
estava estacionada no terreno quase vazio ao lado do resto dos veículos
do grupo.
Todos chegaram antes dela. Isso não aliviou exatamente a irritação
que a incomodava desde o momento em que recebeu a mensagem de
Cruz, instruindo-a a ir a uma reunião na sede não oficial da gangue.
Durante todo o dia, foi atormentada pela paranoia sobre a sua
presença no grupo.
Já era ruim o suficiente que ela quase se revelou para eles no
Asylum. Então, na festa de Judah LaSalle, ela praticamente fugiu do local
após seu confronto inquietante com Rafe no terraço.
Alguém notou seu extremo desconforto em torno do macho Raça?
Ela deu a eles algum motivo para suspeitar por que ele a deixava
tão nervosa?
Ou, pior, ele expressou as suas suspeitas sobre ela para Fish ou os
outros depois que ela saiu?
— Se controle — murmurou baixinho. Se ela tivesse sido
descoberta, teria que lidar com isso rapidamente e em seus próprios
termos.
Ainda não havia encontrado evidências sólidas de que Cruz e seus
amigos estavam ligados com a Opus Nostrum, mas estavam longe de
serem meninos de coro. Se as coisas fossem para o inferno com eles aqui
esta noite, ela não teria nenhum problema em contá-los como danos
colaterais em sua busca por respostas... e por vingança.
Devony desligou o motor da Triumph e saiu do assento. Com o seu
capacete preso na parte de trás da motocicleta, ela dirigiu-se para a
entrada dos fundos da garagem e entrou.
A porta estava destrancada, o barulho baixo de conversas e risadas
intermitentes a levaram ao escritório do gerente, onde Cruz, Ocho, Axel e
Fish estavam sentados.
Ela encontrou seus olhares inquisitivos com confiança fria e
medida. — Parece que estou atrasada.
Fish cuidadosamente sacudiu a cabeça desgrenhada. Ele usava
óculos escuros e parecia cuidar de uma ressaca prolongada. — Acabei de
chegar há cinco minutos. O que aconteceu com você ontem à noite,
Brinks? Num segundo você estava conversando com Rafe, no seguinte
você foi embora.
— Embora? — Devony encolheu os ombros como se mal se
lembrasse. — Não, fiquei por um tempo. Não que alguns de vocês
pudessem ter notado enquanto sugavam as bebidas e babavam nas
mulheres.
Axel deu uma gargalhada. — Está com ciúmes, Brinks?
— Desculpe?
De trás de sua mesa de metal, Ocho sorriu. — Se você prefere
garotas, está tudo bem. Seria ainda mais legal se você nos deixasse
assistir algum dia.
— De que diabos você está falando?
Ele ergueu as mãos fingindo uma rendição e levou tudo o que ela
não tinha para estender a mão e tirar os três dedos que restavam em sua
mão direita.
Fish riu. — Rafe nos contou o que aconteceu entre vocês na noite
passada.
Ah, merda. A declaração fez com que parte do seu sangue fosse
drenado de seu rosto. Ela não tinha medo desses homens humanos, mas
a confusão e o pavor fizeram o seu pulso martelar em suas têmporas. —
Ele lhe disse exatamente o quê?
— Disse que fez um movimento em você — disse Axel. — Ele nos
disse que lhe deu um fora.
Fish sorriu. — Na verdade, o que ele disse foi que achava que você
ia tentar chutar a bunda dele na hora que cheguei. Vi que você estava
chateada com ele, mas droga, garota. Você é suicida também? Não
poderia tocá-lo se tentasse. Ele é um maldito Raça.
Então, eles não sabiam de nada. Graças a Deus.
Eles não sabiam por que Rafe manteve a conversa para ele.
Ela não sabia se estava aliviada ou ainda mais preocupada. Por que
ele mentiria por ela? E o que ele achava que poderia exigir em troca? Tudo
que ela sabia era que não queria descobrir.
Devony manteve seu silêncio enquanto os três homens
continuavam fazendo piadas e rindo.
Cruz não parecia compartilhar a diversão deles. Sua mensagem
para ela parecia ser só para negócios, e sua atitude sóbria agora apenas
confirmava isso. — O que os três idiotas estão fazendo? Não trouxe todos
vocês aqui para merdas e risos.
— O que está acontecendo? — perguntou Devony a ele.
— Nós temos um show para esta noite. Um grande show. — Ele
puxou uma brochura do bolso de sua jaqueta de couro e estendeu para
ela.
Ela olhou para o anúncio da próxima exposição de arte
impressionista, a que foi emprestada a um dos museus da cidade. Quase
uma dúzia de obras de arte logo estaria em exibição pública, cada uma
facilmente valendo milhões. Mas não nas mãos de um bando de ladrões
como Cruz e sua gangue.
Ela olhou para ele. — Não pode estar falando sério. Mesmo se
colocar as mãos nelas, elas não valerão nada para você. Você nunca
conseguirá vendê-las.
Sua boca se curvou no centro de seu cavanhaque. — Não se
preocupe com isso. Tenho isso sob controle.
— E a segurança? Nunca conseguiremos entrar, e muito menos nos
aproximar da arte. — Ela balançou a cabeça, não querendo se envolver
nisso. — Haverá guardas posicionados vinte e quatro horas por dia.
Alarmes nas portas e janelas, até mesmo nos expositores.
— Sim, eu sei — disse ele. — Tenho tudo isso coberto também.
— Coberto como?
— Rafe — disse Fish, olhando para ela por cima dos óculos escuros.
— Acontece que ele está procurando trabalho. Sorte a nossa.
— Sorte? — Ela ficou boquiaberta com Fish, então balançou a
descrença na direção de Cruz. — Diga-me que está brincando.
Mas ele não estava. Seu rosto era pura resolução. — Você mesma
disse, nunca entraremos, a menos que possamos cuidar dos guardas e
dos sistemas de segurança. Precisamos que o vampiro faça isso.
Não, não, não. Isso não podia estar acontecendo.
Seu estômago afundou, frio e pesado. Todas as suas esperanças de
manter Rafe a uma distância segura – não apenas para seus objetivos
pessoais, mas para seu estado de espírito – se evaporavam a cada
segundo.
— Ele é um guerreiro Raça, Cruz. Está esquecendo que até
recentemente ele fazia parte da Ordem?
— Eu não esqueci isso por um minuto.
Ela empurrou a brochura para ele. — Não gosto de nada disso.
Algum de vocês parou para se perguntar por que ele está por perto? Ele
simplesmente aparece no lugar certo na hora certa, e agora você abre a
porta e o convida para entrar?
— Não foi isso que fizemos com você, Brinks? — perguntou Ocho,
uma nota de desafio em sua voz.
Ela afundou os dentes em sua língua para não deixar que ele a
provocasse. Isso era tudo que precisava agora, perder o controle de suas
emoções e mostrar suas presas ou o calor de suas íris Raça.
Cruz se levantou da cadeira para encará-la. — Você não faz as
regras por aqui. Eu faço. E antes de pensar que sou idiota, pense
novamente. Não confiarei num maldito vampiro sem testá-lo primeiro.
Havia uma ameaça em sua voz, na maneira como ele praticamente
cuspiu a palavra vampiro. Devony sabia que Cruz era perigoso. Agora, a
ameaça saindo dele era letal.
— O que quer dizer com você vai testá-lo?
Ele apenas sorriu. — Vá buscar sua caixa de ferramentas, Brinks.
Você vai precisar. Estou colocando você para trabalhar hoje à noite
também.
Foi uma dispensa sem tantas palavras. Um lembrete de que ela
ainda não fazia parte deles, apenas um ativo que pretendiam usar o
tempo que lhes conviesse. Quando não fosse mais necessária, estaria
fora. Ela sabia disso antes, mas esta noite a mensagem foi alta e clara. O
que significava que precisava aumentar seus esforços para descobrir
qual, se houvesse, era a conexão deles com a Opus.
Ela não seria capaz de fazer isso uma vez que Rafe estivesse em
cena.
Uma parte egoísta dela esperava que ele falhasse em qualquer teste
que Cruz tivesse em mente para ele. Era a única maneira que podia
continuar seu trabalho internamente sem ser descoberta.
Devony deixou Cruz e os outros no escritório de Ocho e foi até o
estacionamento para pegar suas ferramentas de arrombamento de cofres
em sua motocicleta.
Sendo Raça, ela não precisava de brocas, ímãs ou outros
implementos para arrombar um cofre. Tudo que precisava era do poder
de sua mente. Mas eles nunca poderiam saber disso, então ela fingiu em
seu primeiro trabalho com a gangue há algumas semanas e nunca olhou
para trás.
Acima, no estacionamento iluminado pela lua, nuvens de
tempestade se agrupavam contra o negro céu noturno. Ao longe, ouviu o
baixo estrondo do trovão. Exceto que não era o tempo vibrando até as
suas botas agora.
Era ele.
Rafe, rugindo em sua BMW como uma sombra na escuridão.
Ele era a última coisa que precisava lidar agora.
Tentou se apressar coletando seu kit na motocicleta, mas não havia
como evitá-lo. Quando ele entrou no estacionamento de cascalho, ela
sentiu seus olhos intensos sobre ela como mãos quentes se movendo
sobre seu corpo. Um arrepio, que não tinha nada a ver com o beliscão do
outono no ar, passou por ela quando olhou para ele e seus olhares
colidiram.
O calor passou por ela sem ser convidado.
Ocho e os caras achavam que ela não gostava de homens. Ela só
queria que isso fosse verdade enquanto observava Rafe se aproximando
dela agora.
Não ajudava que fosse tão bonito quanto Adônis. Seu cabelo loiro
escuro estava um emaranhado selvagem, a ausência de capacete só
fazendo sua juba espessa parecer ainda mais indomável e luxuosa
enquanto dançava em torno de seus ombros impossivelmente largos.
Irracionalmente, seus dedos coçaram com o desejo de descobrir se as
ondas despenteadas eram tão suaves quanto pareciam.
O cabelo dele não era sequer a melhor característica dele. Cada
centímetro dele era poderoso e imenso, pura perfeição masculina que mal
estava contida sob sua camisa preta e jaqueta de couro. O jeans escuro
se agarrava em suas pernas musculosas, que estavam bem abertas para
acomodar o volumoso corpo de sua motocicleta. Desejo se enrolou dentro
dela e uma súbita visão dele, nu e magnífico, invadiu seus sentidos antes
que pudesse impedir.
Puta merda. O que deu nela?
Devony se afastou dele quando ele diminuiu a velocidade até parar
ao lado dela. Seus dedos eram geralmente ágeis e infalíveis. Com a
percepção de que ele enviava uma excitação perigosa através de seus
sentidos, ela estava muito desajeitada, se esforçando para pegar o pacote
compacto que continha suas ferramentas.
Atrás dela, o motor da BMW se aquietou, depois parou. O assento
de couro rangeu suavemente quando Rafe desceu e suas botas pesadas
atingiram o cascalho tão leve quanto um gato.
— Parece que uma tempestade está a caminho.
Ela quase gemeu em concordância. Fazendo o possível para conter
a reação do seu corpo a esse macho, estava determinada a continuar de
costas para ele enquanto continuava lutando para soltar os ganchos e as
cordas em volta do seu estojo de ferramentas.
— Precisa de ajuda com isso?
Ele estendeu a mão ao redor dela e o calor do contato próximo
pareceu uma chama aberta para seus sentidos aguçados. — Solte —
soltou sem olhar para ele. — Não pedi sua ajuda.
Âmbar faiscou em sua visão. Não era bom. O pico da sua irritação
era muito forte. Ela precisava se conter perto dele.
Ela já dera a ele motivos suficientes para suspeitar que escondia
sua verdadeira natureza. Não podia se dar ao luxo de confirmar isso
agora. Não quando Cruz estava praticamente estendendo o tapete
vermelho para ele fazer parte da gangue.
— Vejo que ainda está chateada comigo pela noite passada —
murmurou ele. — Quero que saiba, não contei a eles o seu segredo.
Mesmo que ela já soubesse disso, ouvi-lo dizer essas palavras a
estava sacudindo. Ela continuou trabalhando furiosamente em seu
equipamento. — Não tenho ideia do que está falando.
— Sério? — zombou ele em voz baixa. — É assim que quer fazer
isso?
Ele estava muito perto, encostando-a contra a motocicleta dela.
Finalmente, sua impaciência atingiu seu limite. Com um pulso de poder
mental, ela soltou a última corda segurando seu estojo de ferramentas e
o pegou. Ela segurou-o contra ela como um escudo enquanto girava para
encarar Rafe.
— Nós terminamos aqui?
— Não — disse ele severamente —, acho que você e eu estamos
apenas começando.
— Com o inferno que estamos. — Ela passou por ele, mas não
chegou longe. A mão dele envolveu firmemente seu braço, da mesma
forma que a segurou na festa na noite passada. — Solte-me. Agora.
Ele balançou a cabeça. — Não até conversarmos. Podemos fazer
isso aqui, ou dentro, na frente dos outros.
Ela o encarou. — Está tentando me ameaçar?
— Apenas tentando chegar à verdade. Você não é o que finge ser.
— Eu também não acho que você seja.
Seu rosto bonito permaneceu impassível, mas ele não negou sua
acusação. E o aperto dele no braço dela ficou um pouco mais forte. Ela
testou seu domínio, confiante de que podia se libertar se realmente
quisesse, mas não sem provar a teoria dele.
Os olhos dele examinaram o seu rosto antes de se moverem para
baixo. — O que você está escondendo sob sua gola alta, mangas
compridas e atitude de arame farpado?
O pulso de Devony disparou. Ela se preparou para fúria ou
violência, mas em vez disso a sua voz profunda estava gentil, quase
reconfortante. Assim como o olhar de cílios escuros que se ergueu para o
rosto dela.
— Sei que você não é humana, não importa o quanto você queira
fingir que é. Aposto qualquer coisa que embaixo de todas essas roupas
sufocantes, sua pele macia está coberta de dermaglifos Raça. Estou
certo?
Um som estrangulado escapou de sua garganta. — Você é louco.
Se ele tivesse rosnado para ela ou a tratado com um traço de
brutalidade, ela teria lutado contra ele com tudo o que tinha. Em vez
disso, seu tom baixo e calmo e os olhos penetrantes chamaram algo
profundo dentro dela.
Uma conexão sobrenatural.
Um desejo de ter alguém em quem pudesse confiar.
Um desejo de sentir que não estava sozinha no mundo.
As coisas que ela sempre sonhou que poderiam ser dela um dia...
antes que tudo o que tinha fosse arrancado dela.
Ela balançou a cabeça, lembrou-se de onde veio e até onde ainda
precisava ir.
— Tire as mãos de mim.
Ele segurou o olhar dela. — Diga-me que estou errado.
— Ok. Você está errado.
Um escárnio franziu seu lábio e aqueles incríveis olhos de água-
marinha brilharam com um crepitar de calor âmbar. Ele se aproximou,
deixando menos de uma polegada os separando. As pontas de suas
presas brilhavam ao luar. — Agora, tente me dizer que estou errado sem
mentir sobre isso.
— Maldito seja, vampiro. Eu disse que você está er...
A boca dele desceu sobre a dela sem qualquer aviso. Firme, forte,
um choque total para o seu sistema. Mas os lábios eram infinitamente
macios, o beijo passando do poder para a posse.
Devony derreteu sob o ataque tenro. Ela queria se afastar. Queria
lutar contra ele.
Deus sabia, ela queria negar tudo que o estava sentindo.
Desejo.
Fome.
Uma profunda necessidade que a abalou profundamente.
Essa necessidade inflamou seu sangue como uma chama em
combustível. Ela não conseguiu segurar. Cada célula de seu corpo se
iluminou, enviando fogo em suas veias. Suas presas irromperam das
gengivas. Sob suas roupas, seus glifos ganharam vida, pulsando como
tatuagens vivas em sua pele.
E quando Rafe recuou do beijo com uma maldição sibilada, seus
olhos brilhantes o banharam no brilho quente de suas íris
transformadas.
— Puta merda — proferiu em voz baixa, suas próprias presas
brilhando na escuridão. — Eu sabia. Você é Raça, uma daywalker.
Seu domínio sobre ela ficou frouxo agora. Devony se soltou com
um grunhido baixo.
Tudo que ele fez foi beijá-la, e ainda assim cada fibra dela se sentia
eletrificada e crua. Se ela pensou que tê-lo por perto era perigoso antes,
agora entendia que era algo muito pior.
Porque agora ele sabia inequivocamente o que ela era.
E ela o queria apesar do que esse conhecimento poderia lhe custar.
Ele levou a mão ao rosto dela, a sua expressão de descrença... e
desejo intenso.
Antes que os dedos dele tivessem a chance de roçar sua bochecha,
a porta da garagem se abriu e a gangue saiu vestida de preto da cabeça
aos pés e armada com pesadas armas de fogo.
Cruz saudou Rafe do outro lado do terreno. — Boa. Chegou na hora
certa. Estamos saindo agora.
Devony podia sentir o grande corpo de Rafe tenso na frente dela.
Estava posicionado para proteger seu rosto da visão deles, dando a ela
os segundos que precisava para retomar sua transformação.
— O que está acontecendo? — perguntou ele aos homens. — Temos
planos ou algo assim?
Cruz riu quando Ocho apertou um controle de partida remota e
uma van de entregas estacionada, com um logotipo da empresa de roupas
de cama em seu lado, ligou. — Entrem, vocês dois. Podemos tratar da
logística no caminho.
Com os outros homens subindo no veículo, Rafe lançou um olhar
discreto para Devony. — O que está acontecendo?
Ela não respondeu, principalmente porque não conseguia
encontrar sua voz para falar. Toda sua energia e foco estavam no esforço
de fazer com que seus traços voltassem a um estado de calma antes que
tivesse que fazer a caminhada até a van que estava esperando.
Aquele beijo a chocou. Não só por causa da audácia de Rafe em
fazê-lo. Sua própria resposta foi igualmente chocante.
As sobrancelhas dele se franziram enquanto esperava por sua
resposta. — O que Cruz planejou para esta noite?
— Acho que vamos descobrir — disse ela firmemente.
Parte dela queria dar-lhe uma pista. Afinal de contas, ele a protegeu
de ser descoberta pela segunda vez, quando podia facilmente tê-la
abandonado à sua própria sorte. Mas como ela poderia ajudá-lo a fazer
incursões com a gangue quando seus objetivos dependiam de mantê-lo
fora?
Depois daquele beijo, não eram apenas seus objetivos que queria
proteger.
Ela segurava o kit de arrombamento de cofres contra o seu coração
martelando, mesmo sabendo que a audição aguda dele não podia ser
enganada.
Enquanto passava por ele, parou para nivelar um olhar no rosto
extremamente bonito do macho Raça.
— Se você alguma vez tentar algo assim comigo novamente,
vampiro, eu vou acabar com você.
CAPÍTULO 6
Rafe tentou se assegurar de que o beijo que deu em Brinks não
significava nada. Ele com certeza não tinha intenção de que isso
significasse alguma coisa. Apenas uma tática para pegá-la desprevenida,
forçá-la a soltar o controle feroz que parecia manter em sua natureza
Raça.
Ele precisava de uma arma para combater a negação teimosa dela
e tentou a primeira que lhe veio à mente.
Agora, tudo o que podia fazer era sentar-se ao lado dela na parte
de trás da van de entregas e fingir que o beijo não dera um curto-circuito
em seu cérebro junto com o resto da sua anatomia.
Ele a queria.
Porra, ele a quis no momento em que entrou no Asylum na outra
noite e a viu circulando a mesa de sinuca com Cruz e os outros. Aquelas
curvas deliciosas e longas pernas tonificadas. Aquela cascata de cabelos
escuros e sedosos emoldurando aqueles grandes olhos cor de Bourbon
que o deixavam duro, não importava se ela o olhasse com fúria ou com
desejo atormentado.
Merda. Pensar no que ela fazia com ele só piorava o problema.
E seria amaldiçoado antes de se deixar entrar na armadilha de uma
sedutora.
Apesar de que, para ser justo, Brinks – ou seja lá o seu nome
verdadeiro – se comportava menos como uma sedutora do que como uma
combatente. Ele não duvidou por um segundo de que ela falava sério
quando ameaçou acabar com ele.
Ele confiaria mais nisso do que em doçura e carinho em qualquer
dia.
Especialmente depois que mal sobreviveu à armadilha que a cadela
da Opus armou para ele em Montreal.
No entanto, quando o van saiu de Roxbury rumando para o norte,
na direção da Columbus Avenue, Rafe não pôde deixar de se perguntar
se estava sendo levado para um tipo diferente de armadilha esta noite.
Ele se inclinou para ver melhor Cruz no banco do passageiro. —
Você mencionou algo sobre logística lá na garagem. O que está
acontecendo?
Alguns momentos de um silêncio estranho caíram sobre todos na
esteira de sua pergunta. Rafe deu uma olhada em Brinks, mas ela virou
a cabeça para olhar para o nada.
— Gosta de arte, vampiro? — perguntou Cruz, indiferente.
Rafe grunhiu. — Claro. Depende de que tipo.
— Belas artes — disse Fish na frente dele. — Monet, Renoir. Merda
clássica como essa.
Atrás do volante, Ocho riu e balançou a cabeça. — Você não saberia
a diferença de um maldito Monet ou um Renoir de um Elvis em veludo
preto.
— Quem se importa, imbecil? — Fish fez uma careta. — Não
planejo pendurar um na minha parede.
Os instintos de Rafe já estavam arrepiados, de modo que a merda
da conversa fiada deles só aumentava sua impaciência. — Você me disse
que íamos discutir negócios hoje à noite, Cruz. Negócios lucrativos, você
disse. Então, o que se passa?
Em vez de responder, ele se virou e lhe entregou um panfleto de
uma exposição do museu de arte que seria inaugurada em alguns dias
em Boston.
Filho da puta. As veias de Rafe se apertaram quando percebeu o
que estava vendo. — Isto é do Museu de Belas Artes.
Cruz olhou para ele. — Então, está familiarizado com o lugar? Isso
é bom.
Ele sabia muito bem que Rafe estava familiarizado. Sem dúvida,
esse era o objetivo da conversa. O propósito de todo este exercício.
Ah, Cristo. Isso explicava a rota que Ocho estava. O MBA não
estava a mais de cinco minutos do outro lado cidade.
— Sim, imagino que você pode ter estado lá uma vez ou duas —
comentou Cruz, dificilmente mascarando a sua presunção. — Não li em
algum lugar que a cadela de um de seus velhos amigos da Ordem é a
curadora daquele lugar? Poderia jurar que também ouvi dizer que a filha
do comandante de Boston trabalha lá de vez em quando. Aquele pedaço
quente de daywalker, estou certo?
Rafe balançou a cabeça firmemente, com seus dentes apertados
por causa do desrespeito que esse desgraçado estava demostrando não
apenas com a companheira de sangue de Nathan, Jordana, mas também
com a irmã gêmea de Aric Chase, Carys.
Ao lado dele, ele notou que Brinks ficara imóvel com a menção de
daywalkers e membros da Ordem. No entanto, ela não pareceu nem um
pouco chocada com o assunto do museu e sua exposição de arte de valor
inestimável.
Se Rafe estava sendo testado – e ele estava certo que estava – então,
aparentemente, ele era o único no veículo que não tinha conhecimento
desse fato até agora.
Ele grunhiu, sem saber por que a participação de Brinks o afetou
tanto.
— Por que não chega ao ponto, Cruz?.
O sorriso do humano dividiu o centro de seu cavanhaque escuro.
— Alguém que eu conheço quer adicionar essas pinturas à sua coleção
particular. E está disposto a pagar caro por elas. Então, vamos pegá-las
para ele. Agora mesmo.
Rafe não precisava adivinhar de onde viria o dinheiro.
Evidentemente, esse foi o negócio que Cruz e Judah LaSalle discutiram
na festa da noite anterior.
— Quer andar com a gente? — desafiou Cruz. — Você nos leva para
dentro, passando guardas e pelos sistemas de segurança. Temos
informação de que a arte está sendo guardada em um cofre no porão do
prédio. Você limpa o caminho para Brinks, e depois se certifica de que
conseguiremos sair com a arte e que não atirem em nossas bundas ou
que sejamos presos.
Rafe zombou. — Parece que sou eu quem fará todo o trabalho
pesado.
— Você quer entrar? Este é o preço.
Ele segurou o olhar de escrutínio do criminoso. Por mais que o
ofendesse desempenhar esse papel, se não o fizesse, sua missão acabaria
aqui e agora. Cruz e os outros estavam pedindo que ele provasse sua
lealdade, então era isso o que ele ia fazer.
Quanto à arte, ele estava certo de que as peças estavam seguradas.
Independentemente disso, colocaria a Ordem em sua recuperação o mais
rápido possível.
— Eles mantêm cinco guardas armados em vigia durante o horário
comercial — disse ele. — Após o fechamento, essa contagem cai para três.
Mas com uma exposição dessa magnitude no local, eu esperaria que
todos os guardas estivessem em serviço o tempo todo.
Cruz assentiu em reconhecimento. — Você pode eliminar tantos ao
mesmo tempo?
— Por favor — sorriu Rafe. Não estava prestes a matar ninguém,
mas podia deixar um humano inconsciente e em transe em menos de um
segundo. Ele se certificaria de que todos os guardas ficassem desmaiados
o tempo que fosse necessário. — Cuidarei dos guardas e desligarei o
sistema de segurança. Tudo está conectado. Há sensores de movimento
e calor por toda parte, todos acionando alarmes silenciosos. Isso inclui a
sala do cofre.
Enquanto falava, o museu surgiu à frente, suas instalações
iluminadas por luzes de segurança no estacionamento e no exterior do
prédio. Ocho dirigiu para as docas de recebimento e recuou a van numa
das baias.
— Agarrem os adereços — disse Cruz a Axel e Fish, apontando para
as caixas de roupas de cama dobradas e lavadas em carrinhos de mão
que estavam na parte de trás da van. Ele se levantou do banco do
passageiro e foi para a traseira da van com eles. — Eles vão chamar a
atenção do guarda na porta dos fundos. Então é o seu show.
Ele entregou a Rafe uma pistola semiautomática, uma arma que
ele não tinha intenção de usar. Colocando a arma na parte de trás de seu
jeans escuro, ele lançou um olhar frio para Brinks, em seguida, deu um
aceno de cabeça para Cruz.
— Tudo bem. Vamos fazer isso.
A gangue se movimentou em sincronia, como se tivessem feito esse
tipo de trabalho centenas de vezes. Talvez já tivessem. Fish e Axel abriram
a traseira da van e saíram, cada um carregando uma grande quantidade
de roupa de cama. Rafe seguiu logo atrás, e quando o vigia noturno abriu
a porta para lhes dizer que deviam estar no endereço errado, Rafe
derrubou o homem e o colocou num sono pesado no chão.
Ele agiu rapidamente então, usando o poder de sua mente Raça
para desativar o sistema de alarme da doca e desligar as câmeras da área
de recebimento. — Fique aqui até eu dizer que está tudo limpo.
Movendo-se com uma velocidade sobrenatural, ele levou dois
minutos para desativar o resto dos alarmes, monitores e sensores do
museu.
Ele tinha razão sobre os guardas. Outros quatro seguranças
estavam posicionados lá dentro. Ele os desabilitou, deixando-os num
sono pesado que duraria até muito tempo depois que ele e a gangue
fossem embora esta noite.
Voltando para a doca de recebimento, ele fez sinal para que Cruz e
sua equipe avançassem. — Vamos. A sala do cofre é por aqui.
Eles foram atrás dele. Ele os conduziu até o elevador de carga e
para o porão. O imenso cofre ficava nos fundos, um depósito trancado,
com temperatura controlada, para todo tipo de peças de valor inestimável
que não estavam atualmente em exibição no museu.
Rafe poderia ter colocado a gangue dentro do cofre fortemente
seguro tão facilmente quanto os levou para dentro do prédio. Sendo Raça,
tudo o que precisaria era um comando mental silencioso e as fechaduras
se abririam.
Isso era tudo que seria necessário para Brinks violar a porta
reforçada de aço polido também, mas apenas se ela quisesse se delatar
para os seus companheiros. Em vez disso, ela se moveu na frente de Rafe
e se agachou para abrir o conjunto de ferramentas que retirou da traseira
de sua motocicleta alguns momentos antes do beijo que ele roubou dela.
Um beijo que ainda estava causando estragos nos sentidos de Rafe
enquanto a observava trabalhar.
Ele tinha que dar crédito a ela por fazer um esforço convincente
para parecer autêntico na frente da gangue. Ela cuidadosamente colocou
um conjunto de implementos delicados, imãs compactos, eletrônicos e
dispositivos de escuta. O kit parecia algo de um set de filmagem, que
provavelmente não estava tão longe da realidade.
— Coleção impressionante. Acho que não preciso mais me
perguntar por que te chamam de Brinks, hein?
Ela deu-lhe um olhar fulminante e ele mal conseguiu segurar sua
risada.
Fish bateu a mão no ombro de Rafe. — Está olhando para a melhor
arrombadora de cofres que já conheceu, cara.
Ele sorriu. — Não duvido disso.
— Calem-se e deixem-na trabalhar, os dois. — Cruz fez uma careta,
a mão inquieta, onde ela repousava sobre sua arma no coldre. — Isso já
está demorando demais. Acelera, Brinks.
Ela fingiu lutar com a fechadura por alguns minutos tensos antes
de anunciar que estava dentro. Assim que a porta foi aberta, Cruz e os
outros homens correram para dentro do cofre e começaram a atacar as
obras-primas armazenadas. Com as roupas de cama retiradas dos
carrinhos de mão, Fish e Axel começaram a carregar parte da arte.
Trabalhavam em silêncio, mas mesmo que estivessem gritando um
com o outro, a audição aguçada de Rafe não teria perdido a mudança
repentina no ar.
O elevador estava se movendo.
Não o elevador de carga em que eles desceram. O elevador
principal, o que era usado exclusivamente pela equipe do museu.
Brinks pegou a vibração também. Sua cabeça girou em sua
direção, um olhar severo no rosto.
Ele assentiu. — Porra. Temos companhia. Todos fora. Agora.
— Do que está falando? — Cruz sacou sua pistola. — Quem vem?
Pensei que você havia dito que tirou todos os agentes de segurança?
— Eu tirei. Esta é outra pessoa.
Assim que as palavras saíram de sua boca, uma voz feminina soou
do outro lado do porão. — Olá? Quem está aqui embaixo? É você, Arnie?
Só queria que você soubesse que estou finalmente encerrando esta noite
e indo para casa.
Ah, merda.
Jordana
Não era incomum que a companheira de Nathan passasse longas
horas no museu. Arte era sua paixão, junto com sua devoção ao ex-
assassino que era capitão da equipe de patrulha da Ordem em Boston.
— Não consigo encontrar Louis ou Max em lugar nenhum — disse
Jordana enquanto se aproximava da área do cofre. — Onde está todo...
oh, meu Deus.
Ela parou com uma arfada. Seu lindo rosto ficou frouxo com o
choque quando seus olhos azuis oceano observaram a cena com um
rápido olhar. — Rafe. O que está fazendo?
— Saia daqui. — Ele não sabia se falava com ela, ou com Cruz e o
resto dos ladrões que o cercavam. Tudo que sabia era que este era o pior
cenário que podia ter imaginado esta noite.
Ele era amigo de Jordana. Para ele, ela era família, a companheira
de sangue de um de seus melhores amigos. E agora ela olhava para ele
com descrença, em completo desprezo.
Ele desviou o olhar para encarar a gangue. — Eu disse, saiam
daqui agora mesmo!
Fish e Axel entraram em movimento. Passando por uma Jordana
atordoada com os carrinhos de mão, e correram em direção ao elevador
de carga.
Ela os observou, e depois atirou a sua indignação em Rafe. — Isso
é o quão baixo você afundou? Não posso acreditar nisso. O que aconteceu
com você, Rafe?
— Jordana, apenas vá. Por favor.
Em vez de obedecer, ela deu um passo dentro do cofre. Sua
respiração acelerou quando a raiva começou a substituir sua confusão e
medo.
— Ela é mais bonita do que eu esperava, vampiro. — Cruz a comeu
com os olhos, avançando na direção dela com a arma na mão. — Talvez
devêssemos levá-la conosco também.
Jordana levantou a mão e a arma voou do alcance dele. Ela caiu
no chão a vários metros de distância.
Ocho fez o próximo movimento estúpido. O homenzarrão atacou
Jordana, mas outro movimento de sua mão fez com que os quase cem
quilos dele saíssem do cofre como se ele tivesse asas. Assim que se
levantou do chão, saiu correndo atrás de seus companheiros.
Cruz foi apenas um instante atrás dele.
— Você também — resmungou Rafe para Brinks, quando restaram
apenas os dois. — Pelo amor de Deus. Vai.
Ela não se mexeu. E ele não teve tempo para discutir com ela.
Como a fúria de Jordana estava aumentando, ele teria um
problema muito maior em breve. Não só dessa fêmea que era uma Atlante
pura, mas do assassino que estava ligado a ela pelo sangue.
Porque por esta altura, Nathan já teria sentido cada pico do estado
emocional de sua companheira. E não haveria como impedi-lo de vir em
seu socorro, não importando onde estivesse.
— Jordana, acalme-se.
Era uma coisa idiota para se dizer, mas era tudo que ele tinha. Ele
queria explicar tudo, mas ainda estava no jogo e não podia quebrar a fé
dos seus comandantes nele. E enquanto ele e a fêmea Raça ao seu lado
tivessem chegado a algum tipo de dependência mútua dentro da gangue
de Cruz esta noite, isso não significava que estava pronto para dar a ela
alguma vantagem sobre ele.
Não que isso importasse.
Jordana olhava para ele como um estranho agora, um inimigo.
— Nathan me disse que você se envolveu com alguns criminosos.
Eu não queria acreditar nisso.
Rafe praguejou em voz baixa, sua resposta parecendo ácido amargo
em sua língua. — Sim, bem, me desculpe por desapontar. — Ele olhou
para Brinks. — Precisamos ir agora.
Ele deu um passo à frente e foi parado por um pulso de energia
poderosa. Isso o desequilibrou.
As mãos de Jordana estavam caídas ao lado do seu corpo, os dedos
enrolados em punhos soltos. A luz emanava de dentro de suas palmas,
tornando-se mais forte. Não meramente luz, mas poder Atlante.
Rafe agarrou Brinks pelo pulso e tentou fazer com que ela passasse
por Jordana.
Uma explosão maior o atingiu, sacudindo seu sistema nervoso e
derrubando-o.
— Rafe! — O som do grito de preocupação de Brinks penetrou na
névoa de seu crânio sacudido.
Ele levantou a cabeça e viu que as mãos de Jordana estavam
brilhando agora, com as palmas das mãos e os dedos engolfados em
brilhantes halos de luz sobrenatural.
Rafe tentou se levantar, mas correntes invisíveis o seguraram. Ele
amaldiçoou, lutando para libertar-se do poder dela. Não adiantou. Ela
era muito mais forte do que ele imaginava. Sem dúvida, seu vínculo de
sangue com Nathan havia aumentado as suas habilidades.
Ele ficaria muito impressionado se não estivesse colado ao chão do
cofre.
— Solte-o. — A demanda fria de Brinks o chocou. Seu rosto estava
tudo, menos calmo. Enquanto olhava para Jordana, seus olhos de
Bourbon jogavam faíscas de âmbar como uma fogueira. As pontas de
suas presas brilharam como diamantes quando seu lábio se curvou num
grunhido.
Jordana olhou para a outra fêmea, mas a força da sua energia não
abrandou. Nem um pouco.
Brinks não deu a ela uma segunda chance.
Ela se lançou em Jordana com uma velocidade que superava
qualquer coisa que Rafe fosse capaz de fazer. Num instante ela estava ao
lado dele no cofre, no outro, estava plantada na frente de Jordana,
agarrando-a pelos ombros.
Jordana fez um barulho estrangulado quando as mãos de Brinks
travaram nela e não soltaram.
— Não a machuque — gritou Rafe, mas ele não sabia se Brinks
estava ouvindo. E por mais que tentasse, não conseguia se soltar da força
telecinética que o segurava.
Porra, isso não era bom. Ele não achava que isso poderia ficar
muito pior.
Então, no andar de cima do museu, veio o estrondo de vidro
quebrado.
Um rugido profundo e sobrenatural sacudiu o edifício.
Inconfundivelmente Raça.
Nathan.
O Gen Um, gigantesco e de cabelos pretos, pareceu se materializar
do nada.
E Rafe nunca o viu tão enfurecido.
Nem mais aterrorizado como quando sua companheira começou a
ceder contra a fêmea Raça desconhecida. — Afaste-se dela.
A luz nas palmas das mãos de Jordana se extinguiu. À medida que
ela se desvaneceu, o poder que segurava Rafe diminuiu. Ele se levantou.
— Nathan, isso não é o que parece.
Olhos fumegantes e assassinos o espetavam. — Então, o que
diabos essa puta está fazendo com as mãos na minha companheira?
Com um grito, Nathan investiu contra Brinks com raiva homicida.
Ela afastou a mão de Jordana e o enorme macho voou para trás,
dando cambalhotas antes de bater na parede oposta. Ele gemeu, mas não
se levantou – ou não conseguiu se levantar.
— Que porra é essa? — Rafe olhou para ela.
As palmas de Brinks agora brilhavam com a mesma luz que
iluminaram as de Jordana.
Rafe pegou a mão dela e virou-a, tentando entender o que estava
vendo.
Ele podia sentir o poder circulando através dela; quente, brilhante
e todo-poderoso. Poder Atlante.
Exceto que não pertencia a essa fêmea Raça. Ela o extraiu de
Jordana.
— Ambos ficarão bem — disse ela, abaixando suavemente o corpo
inconsciente e mole de Jordana no chão. — Mas devemos ir agora.
CAPÍTULO 7
A tempestade que ameaçava cair mais cedo estava em pleno
andamento quando Devony e Rafe saíram do museu a pé. A van de
entregas havia desaparecido da doca de recebimento, Cruz e o resto da
gangue abandonaram Rafe e ela para fugirem sozinhos.
Grossos pingos de chuva os encharcavam enquanto corriam,
cortinas de água fluindo pelo estacionamento do tamanho de um estádio
de futebol e transformando poças em piscinas no asfalto quase na altura
do tornozelo.
Devony não conseguia parar de tremer.
Suas pernas pareciam cada vez mais emborrachadas embaixo dela,
suas botas pretas parecendo ganhar um quilo extra de peso a cada passo
que dava enquanto corria para acompanhar os passos largos de Rafe.
Suas mãos não estavam mais brilhando. O poder que ela tirou da
mulher que Rafe chamou de Jordana começou a deixá-la antes mesmo
de chegarem ao estacionamento. Agora, ela pagava o preço por usar sua
habilidade.
Em poucos minutos, ela estaria completamente esgotada.
Rafe olhou para ela e franziu a testa. — Você está bem?
— Estou bem — gritou através da chuva. Pelo menos, pensou ter
gritado. Sua voz soou fraca, pouco mais do que um grasnido. — Continue.
Estou bem... atrás... de você.
— Com o inferno que você está bem.
Ela deu um passo lento e tropeçou. As mãos de Rafe estavam
debaixo dela antes que tivesse a chance de cair na calçada. Pegando-a,
ele olhou para ela, seu belo rosto tenso com preocupação.
— Você precisa de ajuda. Primeiro, preciso tirar você desta chuva.
Ela queria argumentar contra a necessidade de algo dele, mas sua
boca ficou seca enquanto toda sua energia se desvanecia. Sua cabeça
estava pesada demais para se sustentar agora, embora parecesse estar
recheada de algodão. Descansando contra o peito musculoso de Rafe, ela
não teve escolha a não ser ceder ao conforto da força dele.
O calor dele aqueceu o frio que a dominava. O corpo dele era firme
e sólido enquanto a carregava, seus braços segurando-a como se não
pesasse nada. E Deus, ele cheirava bem também. Mesmo em seu estado
enfraquecido, seus sentidos respondiam a tudo que era masculino nele.
— Há um parque do outro lado da rua — disse ele, sua voz
profunda vibrando contra o ouvido dela. — Vou encontrar algum abrigo
para esperar que a tempestade passe. Então você vai me dizer o que
diabos acabei de testemunhar lá no museu.
Em instantes, estavam embaixo do telhado de madeira de um
abrigo coberto de piquenique num canto isolado do parque vazio. A chuva
tamborilava nas árvores ao redor e nas telhas no alto enquanto o céu
escuro retumbava com trovões.
Rafe a colocou no banco de madeira ao lado dele. Sua cabeça ainda
estava tonta, o crânio latejando com uma dor que aumentava
rapidamente agora que estava sentada. Ou tentando, quer dizer. O
colapso pós-habilidade estava chegando rápido agora, minando a pouca
força que ainda lhe restava.
— Merda — assobiou Rafe quando ela escorregou na direção dele.
— Venha aqui.
Ela não podia lutar contra ele quando a puxou para perto,
acomodando-a em seu colo no banco. Há anos que não usava sua
habilidade psíquica, principalmente por causa do preço que pagava
depois. Mas nunca experimentou dor e esgotamento assim.
Nunca experimentou o tipo de poder incrível que ela tirou de
Jordana também.
Devony gemeu, estremecendo de frio enquanto o restante daquele
poder se dissipava, deixando-a tão desamparada quanto uma criança.
Ela odiava essa fraqueza. Odiava ainda mais por Rafe a ver dessa
maneira.
— Cristo, você está gelada. — Tirando o seu casaco de couro, ele o
colocou sobre ela. O calor adicional era bom, mas não tão bom quanto o
calor intenso e penetrante do corpo dele debaixo dela, ou o conforto
calmante das mãos dele movendo-se ternamente sobre o seu rosto. —
Está melhor?
Sim, ela percebeu. O martelar selvagem dentro de seu crânio estava
diminuindo sob o toque dele. Ela assentiu, ainda incapaz de formar
palavras coerentes. Suas pálpebras se levantaram e ela olhou para o
rosto de um anjo dourado. Um anjo carrancudo, cuja preocupação
sombria estava concentrada inteiramente nela.
E ainda a tocava. Os dedos dele acariciavam sua testa e suas
têmporas, enquanto o olhar se agarrava ao dela.
A sensação era mais do que boa. Isso a fez desejar a sensação em
muitos outros lugares em seu corpo.
Um fraco gemido escapou dela enquanto lutava para se levantar do
colo dele.
— Relaxe, Brinks. Você não está em condições de sequer pensar
em se mover ainda. — Ele balançou a cabeça e exalou uma maldição. —
Me diga seu nome. Seu nome verdadeiro desta vez.
Saiu dela num sussurro. — Devony.
Ele acenou com a cabeça, a borda da boca se curvando em
resposta. — Devony. Isso é um grande avanço em relação a Brinks. Agora,
fique parada, Devony. Deixe-me ajudá-la.
Aceitar a ajuda dele era a última coisa que ela queria, mas não
tinha forças para recusar. Ele enfiou as mãos sob o casaco com o qual a
cobriu, movendo as palmas das mãos ao longo de seus braços, em
seguida, ao longo de seu corpo.
— O que você fez com Jordana?
— Não a machuquei, juro. Apenas peguei emprestada a habilidade
dela... temporariamente.
— Emprestada. — Ele franziu a testa. — Quer dizer que você a
absorveu? Explique.
Ela hesitou, sem saber como ele reagiria. — Eu posso sugar a
habilidade de outra pessoa. Posso usá-la como se fosse minha. Não por
muito tempo, no entanto. Só posso segurar por alguns minutos.
— Foi o que usou em Nathan quando ele se atirou em você? O poder
de Jordana. — Ele balançou a cabeça, sua expressão séria. — Não é de
se admirar. Essa é a única coisa que poderia parar um ex-Hunter como
ele. Não cometa o erro de pensar que ele te dará uma chance de fazer isso
novamente.
Devony não ficou surpresa ao saber que o companheiro de Jordana
fosse um daqueles formidáveis assassinos. Quando ele se atirou contra
ela, de forma explosiva em sua fúria, ela quase resignou-se ao fato de que
sua próxima respiração poderia ser a última.
Mas o poder de Jordana a protegeu.
Nem mesmo um macho enorme e claramente letal como Nathan
era páreo para a luz que se manifestou nas mãos de Devony.
— O que ela é, Rafe? Jordana... ela não é Raça como você ou
Nathan. Também não é uma daywalker como eu.
— Não.
— Mas ela é uma imortal?
Seu longo silêncio não confirmou nem negou. Mas obviamente ele
não daria mais que isso. A mensagem em sua expressão de pedra era
clara o suficiente.
Ele não confiava nela. Não com informações sobre pessoas de quem
ele já se importou. Ele provavelmente não confiava nela com nada.
Não que pudesse culpá-lo, considerando o modo como Cruz armou
para ele esta noite. A escolha do MBA foi o teste de Rafe. Ela duvidava
que Cruz pudesse ter previsto que eles poderiam encontrar alguém que
ele conhecesse. O líder da gangue era cruel às vezes, mas ela não estava
pronta para dar muito crédito ao homem.
E embora Devony não tivesse a obrigação de dar uma dica a Rafe
sobre as intenções de Cruz, ela não podia negar que sua culpa a esteve
atormentando o tempo todo.
— Sinto muito por não ter dito a você para onde íamos hoje à noite.
Rafe grunhiu. — Não se preocupe com isso.
Sua resposta foi seca, sem tom. Ela não conseguia decidir se era
porque ele esperava que todos o traíssem, ou apenas ela.
— Bem, estou dizendo mesmo assim, Rafe. Sinto muito. Cruz me
disse que iria testá-lo de alguma forma, mas não sabia os detalhes. E eu
não sabia que havia uma chance de encontrarmos amigos seus.
Seu olhar colidiu com o dela. — Eu disse para esquecer. E eles não
são meus amigos. Não mais.
— Mas foram uma vez?
Ele soltou um suspiro severo. — Sim, eles foram. Nathan é o
capitão da minha antiga equipe de patrulha. Ele era um dos meus
melhores amigos.
— Então, por que ainda não está com eles? Como a Ordem pôde
simplesmente te cortar?
— Eu estraguei tudo, certo? — Seus olhos brilharam, quentes e
ardentes. — Isso é tudo o que você precisa saber.
Sua resposta curta e defensiva a abalou. O que quer que ele tenha
feito, o incomodava profundamente. Ele podia não confiar nela com
informações sobre seus antigos amigos ou qualquer outra coisa, mas não
havia como negar a honestidade em sua voz agora. Nem em seu rosto
bonito e atormentado.
No entanto, apesar de toda sua irritação com ela, suas mãos
permaneciam quentes e reconfortantes nela.
Ela suspirou e deixou seus olhos se fecharem por um momento,
odiando como era fácil se derreter no calor agradável do toque de Rafe. A
energia fluía para dentro dela no momento, afastando a sua dor. Com o
poder de suas próprias mãos, ele estava revertendo o preço físico que ela
pagou por usar sua habilidade.
Curando-a, como fez com Fish na outra noite.
— Você salvou minha vida lá atrás — murmurou ele. — Inferno,
você nos salvou esta noite. Deveria estar te agradecendo por isso, não
rosnando para você.
— Está tudo bem. — Ela levantou as pálpebras e encontrou-o
olhando para ela. A intensidade de seu olhar a inquietou, mesmo quando
isso mexeu em algo profundo dentro dela. Algo mais do que apenas a
energia extraordinária de suas mãos curativas.
Seus olhos procuraram os dela enquanto ele continuava
restaurando seu corpo esgotado. — Nunca vi uma habilidade como a sua.
Jesus, Devony. Percebe o que poderia fazer com um dom assim? Nenhum
inimigo pode ficar contra você. Você pode ser imbatível.
Ela nunca teve inimigos, não até alguns meses atrás. Quanto a
usar seu dom? Desde quando era criança, foi alertada para tomar
cuidado com a sua singular habilidade Raça. Seu irmão também. Ambos
daywalkers, ambos filhos de sua mãe geneticamente melhorada, Camilla,
ela e Harrison compartilhavam esse incrível dom herdado. Foram criados
para respeitar o poder que podiam exercer à sua vontade.
— Não me sinto muito imbatível agora — disse ela, mortificada por
ainda estar deitada indefesa no colo dele. — Como pode ver, uma vez que
o efeito desaparece, eu fico inútil por um tempo. Uma situação de total
colapso e desgaste.
— Então, isso sempre acontece com você depois?
— Sim. Mais ou menos. — No caso desta noite, definitivamente foi
mais. Seus membros pareciam tensos e torcidos. O resto de seu corpo
parecia esgotado e vazio, uma casca que só agora começava a voltar à
vida. Sua vitalidade estava voltando rapidamente agora, a energia se
movendo através de suas veias e ossos.
Tudo graças a Rafe.
E enquanto não havia nada sexual em seu toque, era impossível
ignorar a piscina de calor que começou a florescer em seu núcleo
enquanto as palmas dele patinavam sobre seu corpo vestido. Ela se
moveu no colo dele, inquieta pela aceleração de seu sangue e a excitação
que lambia seus sentidos.
Um gemido baixo escapou dela antes que pudesse contê-lo. Rafe
respondeu com um grunhido baixo e estrangulado. A mão dele ainda
estava em sua barriga, e ela sentiu o contorno da palma larga e cada dedo
forte como se o toque dele estivesse marcando-a.
— Rafe... — Ela não sabia o que ia dizer.
Seus olhos encontraram os dela, algo ilegível cintilando através
deles agora. Sua garganta ficou entupida com uma centena de
pensamentos inquietantes, palavras que mal ousava falar em voz alta.
Especialmente para ele.
O olhar dele se desviou para os seus lábios entreabertos e hesitou
ali. Ele estava pensando sobre a sensação da sua boca contra a dele no
estacionamento do lado de fora da garagem de Ocho?
Deus sabia que ela não foi capaz de tirar aquele beijo da sua cabeça
nem por um segundo desde que aconteceu.
E apesar de sua indignação no momento, apesar da ameaça de
aniquilá-lo por causa disso, no momento ela não conseguia pensar em
nada que quisesse mais do que sentir os lábios dele pressionados contra
os dela novamente.
Agora que seus membros eram dela para comandar mais uma vez,
ela deslizou a mão timidamente sobre a dele.
A expressão de Rafe escureceu numa carranca. Mas em seus olhos,
brasas ardiam. Um tendão pulsava em sua mandíbula rígida, como se a
ternura dela o confundisse.
Ou pior, despertasse a desconfiança dele.
Com uma maldição profunda e baixa, ele tirou a mão de baixo da
dela.
Claramente, ele não pretendia que o beijo deles fosse algo mais do
que um meio para atingir um fim. Apenas sua maneira de forçá-la a se
revelar como Raça para que ele pudesse usar o conhecimento contra ela.
Se ela entendeu algo mais a respeito disso, o erro era todo dela.
— Como você se sente? — perguntou ele quando seu toque a deixou
completamente.
— Melhor. — Ela se sentia tola, honestamente. Ingênua por
imaginar que o cuidado dele com ela esta noite foi inspirado por outra
coisa senão gratidão. Levantando-se do colo dele, estendeu o casaco na
direção dele. — Obrigada pela ajuda. É melhor voltarmos para a casa do
Ocho. Cruz deve estar se perguntando o que aconteceu com a gente.
Ele deu a ela um olhar sombrio e limpou a garganta. — Antes de
fazermos isso, precisamos conversar.
— Sobre o quê?
— Pode começar me dizendo o que está fazendo com homens como
eles. Você é leal a Cruz. Se fosse realmente da gangue deles, não estaria
enganando-os sobre o fato de ser Raça.
— Tenho meus motivos.
— Que são?
— Pessoais.
Ele balançou a cabeça. — Talvez antes, mas não agora. Não quando
eu tenho que decidir se vou manter seu segredo de Cruz e proteger seus
interesses, ou contar a ele e cuidar dos meus.
Então, lá estava. Ele jogou sua melhor carta. Aquela que ela lhe
entregou pessoalmente mais cedo esta noite.
— Sabia que não demoraria muito antes de ameaçar me expor para
eles — disse ela, sentindo-se irritada e encurralada. — E pensar que
apenas alguns minutos atrás você estava me agradecendo por salvar sua
bunda. Acho que é bom saber quanto vale a sua gratidão.
Ela se levantou do banco, mas Rafe se levantou com ela. Cara a
cara, com apenas alguns centímetros entre eles, não havia como evitar o
seu olhar penetrante.
— Você não sabe no que se envolveu, Devony. O que aconteceu
aqui hoje só aumentou as chances de você se machucar. Ou pior. Você
precisa saber que está lidando com algumas pessoas muito perigosas.
— Isso inclui você?
Ele não precisava confirmar. A pura nitidez de sua expressão a
surpreendeu. Havia uma verdade sombria em seus olhos, uma que a
gelou.
— Você diz que tem suas razões para estar aqui. Eu também —
disse ele, falando com a suavidade calma de um diplomata ao invés do
macho letal que havia acabado de lembrá-la do que ele era. — Não estou
aqui para fazer amigos... ou qualquer outra coisa. Mas também não quero
que sejamos inimigos.
Ela zombou. — Que alívio. De qualquer maneira, parece que
estamos num impasse.
— Talvez não tenha que ser assim.
Ela olhou para ele cautelosamente. — Então o que você sugere?
— Uma trégua, por enquanto. Uma mutuamente benéfica.
Mantenho seu segredo, desde que você guarde minhas costas dentro da
gangue. Isso significa que me mantém informado de todas as atividades,
e me alerta se Cruz tem planos de me trair ou me testar como ele fez esta
noite. Em troca, vou dar cobertura quando você não puder mostrar sua
verdadeira natureza diante dos homens.
Ela queria recusar a proposta, mas que outra escolha ele deixava?
E, embora também não estivesse procurando fazer amigos, a ideia de ter
alguém em quem confiar, se apoiar, era muito tentadora.
Especialmente quando a alternativa era perder meses de esforço
tentando encontrar um elo com seu verdadeiro inimigo, a Opus Nostrum.
Rafe estendeu a mão. — Temos um acordo?
Devony deslizou os dedos em suas mãos, esperando que não
estivesse cometendo o erro de sua vida em se aliar a ele, mesmo sob os
limites de sua cautelosa trégua.
— Tudo bem, Rafe. Temos um acordo.
CAPÍTULO 8
A van de entregas estacionada ainda estava quente no
estacionamento atrás da garagem de Ocho quando Rafe e Devony
chegaram lá a pé, cerca de quarenta e cinco minutos depois.
Ensopado pela chuva, o humor de Rafe após o quase desastre no
museu e sua conversa com Devony depois não melhorou com a
caminhada de cinco quilômetros na chuva fria. Ele vibrava de raiva
quando entraram na garagem e encontraram Cruz e o resto da gangue
entornando doses de bebidas e celebrando como se toda a operação quase
não tivesse ido para o inferno como havia acontecido.
Rafe geralmente não perdia a cabeça, mas pensar em como Nathan
e Jordana deveriam se sentir sobre ele agora provocava uma raiva volátil
dentro dele. Essa fúria só aumentou quando considerou que, ao testar
sua lealdade, Cruz também arriscou a vida de cinco inocentes guardas
do museu e Jordana.
Sem mencionar Devony.
E a vida dela ainda estava em risco, porque depois do que
aconteceu com Jordana no museu, seria um inferno a pagar com Nathan.
Rafe não estava preocupado com seu próprio pescoço, mas não queria
considerar o que poderia acontecer com Devony agora que ela se tornou
sua cúmplice numa missão que deveria ser secreta e solo. Ele não sabia
como poderia reverter esse problema muito letal sem abrir um buraco em
toda a operação.
Ele entrou na garagem com as presas à mostra e assassinato
irradiando de seus olhos.
— Cruz. Seu idiota de merda. — Ele tirou o líder da gangue da
cadeira e empurrou-o com força, jogando o humano contra a parede do
escritório de Ocho. — Na próxima vez que você pensar em me ferrar, é
melhor pensar novamente.
Bebida espirrou do copo caído de Cruz. Ele parecia assustado, o
que significava que ele não era tão idiota quanto Rafe pensava. — Espera,
cara. Espera!
A súplica mal foi registrada através da névoa de hostilidade de Rafe.
— Você poderia ter matado muitas pessoas esta noite. Dê-me uma boa
razão pela qual não devo retribuir o favor agora mesmo.
— Não foi pessoal — proferiu Cruz, suas palavras estranguladas.
— Eu só... precisava saber se podia contar com você.
Rafe rosnou. — Você sabia que alguém estaria trabalhando no
museu hoje à noite?
— Não! Jesus, eu juro. Não.
Rafe queria que o idiota mentisse para ele. Não seria preciso muito
mais do que isso para empurrá-lo ao limite. Um membro de gangue morto
não inviabilizaria a sua busca por uma pista sobre a Opus Nostrum.
E agora, esmagar a garganta de Cruz com o seu punho seria muito
bom.
— Rafe. — A voz de Devony rompeu sua névoa de raiva.
Ele disse a ela no caminho de volta para deixá-lo lidar com a
situação e confiar que ele sabia o que estava fazendo. No momento, ele
não sabia se poderia cumprir essa promessa.
— Rafe.
A mão dela pousou no ombro dele. Ele olhou para ela, os olhos
ainda em chamas de fogo âmbar e as presas enormes em sua boca. Ela
sacudiu levemente a cabeça, os olhos calorosos, arregalados e
suplicantes.
Assim que soltou Cruz, o líder da gangue se endireitou, puxando
seu casaco de couro. Cuspiu no chão, depois olhou ao redor de Rafe e fez
sinal para Ocho. O outro homem veio carregando duas pilhas grossas de
notas de cem dólares. Cruz gesticulou para que Rafe as pegasse.
Ele franziu o cenho. — O que é isso?
— Sua parte dos lucros desta noite.
Droga. Aparentemente, eles não perderam tempo entregando as
artes roubadas ao contato deles. Rafe imaginou que eles deviam ter feito
a entrega para Judah LaSalle não muito tempo após fugirem e
abandonarem Devony e ele no museu.
Agora que foi libertado do aperto punitivo de Rafe, um pouco da
sua bravata retornou. — Eu te disse que seria um teste esta noite.
Parabéns, filho da puta doido, você passou. — Cruz sorriu, satisfeito
consigo mesmo, enquanto Rafe pegava o dinheiro e o colocava em seu
casaco. — Precisa de uma razão pela qual sou a última pessoa que quer
matar, vampiro? Existem cinquenta mil delas. Continue provando o seu
valor como fez hoje à noite, e isso será apenas o começo.
Ele passou por ele sem outra palavra para aceitar uma nova bebida
de Axel.
Devony também se afastou, caminhando até onde os homens
dividiram o lucro da noite em pilhas semelhantes. Ela enfiou a sua no
bolso interno do casaco de couro, depois com um adeus murmurado para
a gangue, começou a se dirigir para a porta dos fundos.
Rafe se aproximou dela antes que chegasse à saída. — Onde você
vai?
— O que você acha? Vou para casa.
Ele não deveria se surpreender com a resposta rude dela. Embora
tivessem chegado a algum tipo de entendimento esta noite, isso não
aconteceu em termos mais amigáveis. Ele a encurralou contra a parede
e obviamente não era um lugar que Devony estava acostumada a ficar.
Ela era tenaz e ousada. Destemida, como ele testemunhou esta
noite.
Ele tinha que admirar isso sobre ela.
Admirava muito sobre ela, incluindo uma série de coisas que não
deveria. Não se quisesse manter a cabeça no jogo e o foco em sua missão.
Uma mulher bonita e teimosa como Devony só seria um risco para ele no
final.
Sabia disso mesmo antes de colocar as mãos nela para curá-la esta
noite.
Ele sequer tocou diretamente em sua pele, mas senti-la sob as
palmas das suas mãos levou a uma intimidade para a qual não estava
preparado. Seu calor, sua força, a suavidade de suas curvas combinadas
com o poder sobrenatural e único Raça que fervilhava sob a superfície de
tudo que era inconfundivelmente feminino sobre ela.
Ele ficou impressionado com sua habilidade psíquica única, mas
era a mulher que mais o intrigava. Muito mais do que deveria estar
disposto a permitir.
E quando Devony colocou a mão sobre a dele enquanto a curava
no parque, ele quase pegou fogo. Se não tivesse se afastado, seu desejo
por ela teria incinerado o último fragmento de seu controle.
Mesmo agora, as pontas dos dedos dele vibravam pela lembrança
sensorial indelével de como ela se sentia sob as mãos dele.
No seu interior, ele ardia com a necessidade de tocá-la novamente.
De fazer muito mais do que isso.
— Ei, Brinks. — Fish correu segurando uma dose de uísque. Ele
empurrou para ela. — Não pode sair sem um brinde.
— Claro. — Ela pegou o copo e tilintou vagamente contra o dele
antes de tomar um pequeno gole.
Fish olhou para Rafe. — E você, cara? Quer participar?
— Nunca toquei nessa merda.
O humano riu. — Não se preocupe, eu cuido de você. Estamos indo
para um dos bares de strip na rua. Tenho certeza que você encontrará
algo para molhar o seu bico por lá.
Com uma gargalhada, ele voltou para o resto da gangue.
Devony abaixou o copo sem tomar outro gole. — Aproveitem o
show. Estou indo embora.
Ela foi até o estacionamento sem olhar para trás. Um momento
depois, o ronco baixo de sua motocicleta soou quando ela se afastou.
Merda.
Rafe sabia que deveria deixá-la ir.
Seus interesses seriam melhor atendidos passando tempo com a
gangue, certificando-se de que todos ficassem bem bêbados para que
pudesse sondá-los por detalhes sobre Judah LaSalle ou qualquer outra
pessoa que estivesse orquestrando suas atividades. Inferno, esta poderia
ser sua primeira oportunidade real de chegar perto o suficiente para
colocar em transe cada um dos humanos e extrair a informação que
precisava diretamente de suas mentes.
Mas não enquanto Devony estava sozinha lá fora na cidade.
Ela podia ser uma fêmea Raça daywalker, mas isso não significava
que Rafe queria imaginá-la enfrentando a ira de seu velho amigo Nathan.
Se algo acontecesse com ela agora, ele nunca se perdoaria.
Esse sentimento também não tinha nada a ver com gratidão pelo
que ela fez por ele no museu. Era mais profundo do que isso, o que o
perturbava até a medula.
Devony não era dele para se preocupar ou proteger. Cuidar dela
não fazia parte de sua missão, e não havia lugar para compaixão quando
a sua missão para destruir a Opus Nostrum exigia apenas um foco frio e
letal.
Um passo em falso, um erro de cálculo descuidado, poderia custar-
lhe tudo.
Como deixar a sua preocupação por ela inflamar uma raiva
imprudente dentro dele esta noite com Cruz.
A ferocidade de sua raiva o chocou. Havia chocado Devony
também. Ele viu isso em sua expressão abalada quando ele pulou sobre
Cruz. Quando a voz dela foi a única coisa que o tirou da borda.
Porra.
Era óbvio para ele o que precisava fazer, antes de deixar as coisas
ficarem mais complicadas do que já estavam.
Ele não podia arriscar a sua missão trazendo-a para a equação. De
forma alguma
O que significava que precisava removê-la, quanto mais cedo
melhor.
Enquanto considerava a tarefa desagradável à sua frente, Cruz se
aproximou com o resto da gangue — Estamos nos preparando para sair
em poucos minutos. Você vai com a gente ou o quê?
— Outra hora.
Ele não deu mais desculpas antes de ir para a sua motocicleta. A
chuva finalmente parou e a tempestade diminuiu o tráfego noturno. Não
sabia onde Devony vivia, mas conhecia o distinto ronronar da sua
Triumph. Sua audição Raça era suficientemente aguçada para se
concentrar naquele som em meio ao resto dos veículos que se moviam
pelas ruas.
Ele seguiu seus ouvidos até que avistou sua luz traseira indo para
o norte em direção ao luxuoso bairro de Back Bay.
Rafe ficou cerca de um quilômetro atrás dela, observando com
curiosidade quando ela fez uma parada ao longo do caminho.
Estacionando do lado de fora de um dos abrigos da cidade, ela correu até
a caixa de doação e deixou os cinquenta mil dólares em dinheiro dentro
da caixa.
Que diabos?
Após arriscar sua vida para ganhar o dinheiro, ela simplesmente
doou toda a parte no roubo.
Rafe não imaginou que ela estivesse participando da gangue de
Cruz por ganância, mas isso era uma revelação por si só. Era um lado
inesperadamente terno da durona fêmea Raça.
E que ela também guardava outros segredos bem guardados, ele
não tinha dúvidas.
Esta noite, ele pretendia descobrir todos.
CAPÍTULO 9
Devony sentiu-se sendo observada.
O arrepio dessa sensação se instalou em sua nuca na viagem de
volta para a sua casa e não diminuiu durante os dez minutos desde que
ela havia chegado.
Era por isso que ainda não havia tirado as botas de cano longo, a
camisa de gola alta e a calça preta justa.
A pistola semiautomática que levou com ela para o trabalho no
museu naquela noite ainda estava no cinto em volta dos quadris, embora
duvidasse que a arma seria muito útil contra o intruso que ela sabia que
estava dentro da sua casa.
Raça.
Ela saiu do escritório do pai e encontrou Rafe em pé no saguão de
entrada.
Ele passou pelas trancas e pelo sistema de segurança em silêncio,
e agora tinha a audácia de lhe dar um sorriso irônico. — Eu estava no
bairro. Desculpe por não bater.
Raiva explodiu em suas veias. — O que diabos você pensa que está
fazendo? — Ela não podia acreditar que o macho arrogante havia
encontrado onde ela morava e entrado como se fosse o dono do lugar. —
Saia daqui agora mesmo. Ou vou te expulsar.
Não havia necessidade de fingir que ela não era totalmente capaz
de fazer exatamente isso. Ou pelo menos disposta a tentar.
— Precisamos conversar, Devony.
Ele falava sério? Ela olhou para ele, sua visão estalando com
faíscas de âmbar. — Já fizemos isso mais cedo esta noite, lembra?
Ele balançou a cabeça lentamente. — Não. Você ainda não me disse
nada. Preciso saber o que está fazendo na gangue de Cruz. Quero dizer o
que está realmente fazendo.
Então, ele a seguiu desde a garagem de Ocho. A seguiu. A espionou.
Logo antes de invadir a sua casa.
— Não acho que está realmente com eles. Está apenas
desempenhando um papel, usando-os por algum motivo. Então, o que
está atrás? Não é dinheiro. Vi você deixar o seu numa caixa de caridade
na cidade.
Ela engoliu quando ele deu um passo na direção dela. — Eu disse
que você precisa sair, Rafe. Não vou pedir de novo.
Ele não parecia ter qualquer intenção de obedecer. Ele examinou a
entrada opulenta do antigo prédio de arenito, observando as escuras
sancas e escadas de mogno, o candelabro brilhante no teto e o suntuoso
antigo tapete sob as botas pesadas.
— De quem é este Darkhaven?
— É meu. — Isso não era mentira, ainda que parecesse, já que ela
disse isso para evitar a real pergunta dele.
Ele olhou para a espaçosa sala de estar à sua esquerda, com seu
piano de cauda polido e os delicados móveis Luís XVI que sua mãe tanto
amava. Do outro lado do saguão estava a aconchegante biblioteca onde
ela e seu irmão passaram incontáveis horas enquanto eram crianças
devorando todas as histórias, biografias e textos filosóficos instigantes
que cobriam as prateleiras do chão ao teto.
Isso foi antes. Antes que seus pais mudassem a família para
Londres, para o trabalho deles com o governo.
E muito antes do hediondo e covarde ato terrorista que roubou
todos dela no início deste ano.
Em vez de ir embora como ela havia dito a ele, Rafe entrou ainda
mais em sua casa. — Você mora com alguém? — Ele franziu a testa. —
Está acasalada com alguém, Devony?
— Não. Não que isso seja da sua conta. Esta é a casa da minha
família.
— Sua família vive muito bem. Onde eles estão agora?
Ela balançou a cabeça. Ela não havia dito as palavras para
ninguém durante todo esse tempo. Ela nem sabia se poderia pronunciá-
las agora.
Não sem se desfazer diante dele – ou pior, revelar um pouco do ódio
ardente que vivia dentro dela desde os seus assassinatos pela Opus
Nostrum.
— Quero que você vá, Rafe. Por favor.
Parte dela estava preocupada que ele levasse seu conhecimento
sobre o Darkhaven, e suas perguntas sobre isso, imediatamente para
Cruz. Mas uma parte maior estava preocupada que a razão dele vir aqui
agora não tivesse nada a ver com a gangue.
Ele estava aqui por razões pessoais. Para o seu proveito próprio, de
alguma forma.
— Preciso que você me diga o que realmente está acontecendo,
Devony. Prometo, tudo ficará muito mais fácil para você se fizer isso.
Ele parecia tão razoável, até preocupado com ela. Mas havia uma
determinação sombria em seus olhos que era puro guerreiro. Ela cerrou
as mãos nos quadris, os pés plantados no chão. — Mais fácil para mim?
O que isso deveria significar?
— Tentei explicar isso para você mais cedo esta noite. Você não
sabe no que se envolveu. Está lidando com algumas pessoas muito
perigosas...
— Sim, eu me lembro. Pessoas perigosas como você e seus velhos
amigos na Ordem.
— E outros — acrescentou ele sombriamente. — Não me refiro
apenas ao Cruz e sua laia. Falo de pessoas que você nunca gostaria de
conhecer.
Ela encolheu os ombros. — Não tenho medo de nada que alguém
possa fazer comigo.
Ele deu a ela um olhar de dúvida. — Porque você é uma daywalker
que nasceu com um dom poderoso?
— Não. Porque não há mais nada que alguém possa tirar de mim
— respondeu ela calmamente. — Já perdi tudo o que me importava.
— O que você quer dizer?
Ela segurou o seu olhar interrogativo. — Você precisa sair agora.
Esta conversa acabou.
Para marcar seu ponto, ela mentalmente abriu a porta da frente
atrás dele. O ar da noite entrou, frio e úmido.
Sem sequer um piscar de olhos, Rafe fechou o pesado painel de
carvalho com o poder da sua própria mente.
— O que você perdeu, Devony? — Ele caminhou na direção dela,
estudando seu rosto. — Eu quero entender. Preciso entender antes de
poder ajudá-la.
— Me ajudar? — zombou ela. — Não preciso da ajuda de ninguém,
especialmente da sua. Trabalho sozinha. Estou sozinha, caramba.
Ele franziu a testa, processando a pequena admissão que ela
deixou escapar tão descuidadamente.
E ainda estava se aproximando dela, aproximando-se de onde ela
estava do lado de fora do escritório do seu pai. Seu pulso bateu num
ritmo mais forte enquanto ele diminuía o espaço entre eles. Ele estava
perto o suficiente para alcançá-la, mas manteve as mãos soltas ao lado
do seu corpo.
— Algo aconteceu com sua família — disse ele, não como uma
pergunta. — Eles estão mortos?
Ela engoliu em seco. Ouvi-lo dizer isso só reforçou a terrível
realidade da sua perda. — Rafe, por favor. Apenas vá. Me deixe em paz.
— Alguém os matou. Foi isso que aconteceu? — Quando ela apenas
olhou para ele, seu olhar se estreitou, se concentrando na dor que ela
não conseguia deixar de mostrar em seu rosto. — Cruz tem algo a ver
com as mortes deles? Ou foi outra pessoa, alguém com quem a gangue
está conectada?
Oh, Deus. Ele estava chegando muito perto da verdade.
Ela o viu atacar Cruz esta noite – parcialmente por sua causa –
mas isso não significava que ela pudesse confiar nele para manter esse
segredo também. Ela já lhe dera uma arma para usar contra ela. Não
podia entregar outra.
Certamente não esta.
— Eu disse que quero que vá embora. Agora. — Ela pontuou a
demanda com um empurrão mental contra o seu corpo musculoso. Ele
deslizou um passo para trás.
Com o dobro de seu tamanho e cingido em tendões masculinos,
Rafe era um formidável macho Raça. Mas como uma fêmea daywalker,
ela estava quase equilibrada com ele. Se ele achava que podia entrar aqui
e fazê-la se acovardar, ele encontraria uma luta.
Uma sobrancelha loira e escura se arqueou e ele se adiantou,
fechando ainda mais a distância entre eles. — Devony, tudo que tem a
fazer é conversar comigo. Confie em mim.
Ela o empurrou novamente, menos gentilmente desta vez.
Seu coração martelava, e não apenas pela raiva que corria por suas
veias. Tudo o que ela podia fazer para não lamber os lábios quando ele,
com ousadia e coragem, deu um passo mais perto, sem se abalar com o
ataque dela.
— Não tem que ser assim entre nós — disse ele, sua voz profunda
vibrando através dela e fazendo a batida rápida de seu pulso vibrar com
uma forte antecipação. — Não somos inimigos, lembra?
— Nós com certeza não somos amigos — retrucou.
Seu peito arfou quando o ar entre ela e esse perigoso macho Raça
pareceu se eletrificar. Essa tensão insuportável só aumentou quando ele
fechou a distância ainda mais.
— Também não somos qualquer outra coisa. Não foi isso que você
disse esta noite, Rafe? Não é isso que você quer?
Ele exalou um breve suspiro. Um olhar de arrependimento varreu
seu rosto bonito e algo ainda mais inquietante para ela.
Desejo.
Não havia dúvidas, mesmo com sua experiência limitada.
E o que a apavorava agora era o quão intensamente ele a excitava
também.
Numa onda de pânico, tentou empurrá-lo de novo, desta vez com
as mãos.
Ele as pegou, seus reflexos rápidos, infalíveis. Seu domínio sobre
ela era incrivelmente forte.
Infinitamente tenro.
Seu olhar a perfurou, intenso e ardente. Lentamente, ele abaixou
as mãos dela. Então estendeu a mão dele e acariciou a sua bochecha.
Antes que ela respirasse novamente, ele inclinou a cabeça na
direção da dela e a beijou. Não a rápida e agressiva reivindicação de seu
primeiro beijo na garagem de Ocho, mas uma gentil persuasão que
arrancou um gemido indefeso de algum lugar dentro dela. Ela não podia
lutar contra o doce ataque de excitação que se espalhou por ela. Ela não
queria lutar contra isso.
A língua dele deslizou ao longo da costura de sua boca e ela se
abriu para ele, inalando seu aroma de especiarias e couro, e derretendo
no calor que se acendia entre eles.
Ela queria mais.
Queria tanto que tremia de necessidade por ele.
Ele recuou com uma maldição murmurada. — Cristo. Você está
certa, eu não deveria estar aqui. Isso foi um erro. Eu deveria saber disso
e ainda assim...
Ele parou no meio da frase, seu olhar derretido atraído por algum
ponto sobre o ombro dela. Para algo dentro do antigo estúdio do seu pai.
Rafe franziu a testa. — Aquela foto da família na mesa. O homem
da foto com você... Esse é Roland Winters. — Ele deu um duro olhar para
ela agora, desconfiado. — Fui apresentado a ele numa cúpula de paz em
D.C. com a Ordem no início deste ano. Ele era diretor administrativo da
JUSTIS no escritório de Londres por duas décadas, se bem me lembro.
Devony se encolheu, deslocando-se para bloquear a entrada aberta
da sala. Mas era tarde demais para impedir que Rafe visse mais do que
deveria. Tarde demais para impedi-lo de entender sua dor e perda agora
também.
A carranca dele se aprofundou quando seu olhar voltou para ela.
— Roland Winters morreu naquela cidade há cinco meses. Ele, junto com
mais de cem outros agentes e funcionários da JUSTIS que estavam na
sede em Londres quando ela foi atacada. Jesus, Devony. Você perdeu seu
pai naquele atentado?
— Eu perdi todos. — Ela mal conseguia engolir a dor que mantinha
um estrangulamento sobre ela desde aquela noite horrível. — Meu pai.
Minha mãe. Meu irmão. Todos trabalhavam para a JUSTIS. Minha mãe
e Harrison eram do serviço secreto. Todos foram chamados para uma
reunião no escritório de Londres quando a explosão foi detonada.
Sua respiração o deixou num suspiro lento e pesado. — Merda. E
onde você estava? — perguntou ele gentilmente.
— Aqui em Boston. Eu estava estudando na universidade de artes
nos últimos dois anos. Quando a notícia foi divulgada, eu estava no meio
de um recital de piano na sala de concertos, fazendo um teste para um
lugar na orquestra. Esses planos acabaram num instante. Tudo o que
era normal na minha vida simplesmente... acabou naquela noite.
— Sinto muito. Falo sério, Devony. Infelizmente, não faz muito
tempo que eu quase perdi a minha família também. Não sei o que teria
feito se tivesse perdido. — A profundidade da dor em sua voz grave a
surpreendeu. Havia raiva também, e ela não pôde deixar de pensar que
parte disso poderia ser autodirigida. — O que você tem feito desde o
ataque?
— Ajustes.
Ele não sabia o quanto essa afirmação era verdadeira. Ainda assim,
ele a estudou com ceticismo. — Por que não voltou para Londres? Por
que ficar aqui neste Darkhaven vazio sozinha? Porra, por que não ficar o
mais longe possível daqui e recomeçar?
— Não posso voltar para Londres. Talvez nunca mais. E não posso
recomeçar em qualquer lugar até que eu saiba que os monstros
responsáveis pelos assassinatos da minha família pagarão por isso. Não
descansarei até que isso aconteça.
Rafe deu-lhe um olhar severo e questionador. — Um grupo
terrorista reivindicou publicamente o crédito por esse ataque, entre
outros. Está falando em ir atrás da Opus Nostrum?
— Isso mesmo.
— Diga-me que está brincando.
— Pareço estar brincando?
Ele xingou novamente, mais vividamente desta vez. — E acha que
Cruz ou alguém que ele conhece levará você até eles?
Ela não queria contar a ele sobre suas suspeitas, ou os passos que
tomou para persegui-los nos meses desde o assassinato da sua família.
Só porque ele alegou ter apertado as mãos de seu pai uma vez, não
significava que ela podia confiar nele.
Mas era óbvio que Rafe estava atento às suas segundas intenções
no que dizia respeito à gangue. Ele estivera de olho nela quase desde o
começo. — Se Cruz não me levar à Opus, então continuarei procurando.
Eventualmente, vou encontrar uma conexão.
— Você está louca, sabe disso? Tudo que fará é se matar, Devony.
Pode achar que é forte...
— Eu sou forte — respondeu sombriamente. — Já viu isso por si
mesmo.
— Sim — admitiu, parecendo não muito satisfeito com isso. — Você
seria impressionante mesmo sem a sua habilidade, mas não faz ideia do
que a Opus é capaz de fazer.
— Eu acho que faço. Vi as imagens de Londres. Vi a pira e os
escombros. Não tem nada muito mais claro do que isso.
— Acha que é o pior que podem fazer? — Ele deu uma gargalhada
cáustica. — Isso é apenas o aquecimento, querida. Nada é indigno para
essa seita. Eles estão em todos os lugares. Usarão qualquer um,
explorarão qualquer fraqueza que encontrem. E eles o fazem. Cristo, até
tentaram me usar.
— Usar você? Do que você está falando?
— Merda. — Ele passou a mão sobre a cabeça e se afastou dela. —
Por que não fiquei longe de você esta noite?
Não era uma pergunta para qual ela tivesse uma resposta. Neste
momento, havia apenas uma resposta que ela precisava ouvir.
— Diga-me — disse ela atrás das costas largas dele. — Rafe, por
favor... Preciso saber. O que a Opus fez com você? Eles também te
machucaram?
— Me machucaram? — Ele se virou e balançou a cabeça
sombriamente. — Fui apenas um peão que eles usaram para machucar
muitas outras pessoas. Enviaram uma espiã para ficar sob a proteção da
Ordem – uma linda e traiçoeira. Ela me enganou. Acha que seu dom é
poderoso? Essa cadela tinha uma habilidade de sereia. Ela me fez pensar
que eu estava apaixonado por ela. Todo o tempo ela esteve trabalhando
contra mim. Ela informou cada movimento da Ordem para a Opus,
esperando a chance de nos atacar por dentro. Também quase conseguiu
isso. Se não fosse por alguns dos meus colegas de equipe na Ordem,
estaríamos todos mortos.
— Oh, meu Deus. Rafe, eu sinto muito.
Ele encolheu os ombros. — Eu estraguei tudo. Decepcionei todos.
Me permiti ser manipulado e quase consegui matar todo mundo que me
importava. Meus amigos, meus pais. Sem mencionar Lucan Thorne e
vários outros anciãos da Ordem.
— É por isso que você não é mais um guerreiro? Se essa mulher
teve esse tipo de poder sobre você, como a Ordem pode culpá-lo? Não
parece justo que te expulsem por algo que estava fora de seu controle.
Ele não respondeu. Sua expressão sombria se fechou com as
perguntas, então desviou o olhar dela. — Acha que você tem um bom
motivo para ir atrás da Opus? Eu tenho mais de uma dúzia deles. E se
eu tiver que romper Cruz ou qualquer outra pessoa para colocar minhas
mãos num dos círculos internos da Opus, você pode ter certeza de que
eu farei isso.
Devony não podia deixar de se solidarizar com o que ele passou.
Suas vidas foram irrevogavelmente alteradas por causa do mal da Opus
Nostrum. Agora ela entendia que eles também compartilhavam um
objetivo similar.
Talvez ambos tivessem mais chances de concretizarem essas metas
se unissem forças.
— Preciso te mostrar uma coisa, Rafe.
Ela passou por ele e entrou no escritório.
Passando a mão por baixo da mesa do seu pai, ela encontrou o
botão oculto e apertou-o. A estante abriu silenciosamente, e Devony a
abriu mais, revelando todos os dossiês, fotografias, mapas e notas
rabiscadas da guerra particular que ela vinha travando sozinha nos
últimos cinco meses.
Rafe ficou olhando por um longo tempo. Quando finalmente virou
a cabeça para olhar para ela, seu belo rosto estava pálido, com
incredulidade e espanto.
— Puta merda — disse ele com um leve sorriso puxando seus
lábios.
Então ele entrou.
CAPÍTULO 10
Rafe não sabia se deveria se sentir impressionado ou um pouco
ameaçado profissionalmente pela profundidade e qualidade do trabalho
de Devony.
Passaram-se mais de duas horas desde que ela lhe mostrou sua
sala de guerra particular. A cada minuto que passava, ele ficava mais
fascinado com o que via. Não apenas as notas, fotografias e teorias
manuscritas que ela compartilhou com ele, mas com a própria mulher.
Especialmente ela.
— Ah. Aqui está — disse ela, tirando uma fotografia de uma pasta
cheia de outras fotografias e documentos. — Esta é a que eu queria te
mostrar. Eu a tirei durante uma festa no iate do LaSalle há algumas
semanas.
Rafe sentou-se no chão do grande escritório com ela, cercado por
outras pilhas de informações acumuladas por Devony nos poucos meses
desde que se lançou em sua busca por vingança da sua família, através
da queda da Opus Nostrum. Levaria dias para ele estudar tudo. Talvez
muito mais do que isso, se ele se permitisse distrair-se continuamente
com a incrível mulher responsável por juntar tudo isso.
Ela havia subido as escadas há algum tempo e mudado de roupa,
trocando o traje do museu por um suéter cinza de gola V solto e calça
preta de yoga. Seus longos cabelos castanhos estavam torcidos
casualmente num nó em cima da cabeça. Alguns fios escapavam
encaracolados em sua nuca, atraindo repetidamente o olhar dele para os
delicados dermaglifos que ficavam em seus ombros e pescoço.
Ele não podia deixar de imaginar como o resto das suas marcas de
pele Raça poderiam parecer sob as suas roupas. Rafe mal conseguia
sufocar a vontade de estender a mão e traçar os intrincados redemoinhos
e arcos de seus glifos com os dedos... Ou com a boca.
Como uma mulher daywalker, ela também teria a marca de
Companheira de Raça em algum lugar em seu corpo delicioso. Contra a
sua vontade, ele se imaginou retirando lentamente o seu macio suéter e
a calça até descobrir o esconderijo da pequena marca de nascença
escarlate.
Porra.
Beijá-la pela segunda vez foi a pior coisa que ele poderia ter feito,
porque agora tudo que conseguia pensar era em fazer isso novamente. A
maneira como se sentiu depois da primeira vez deveria ter sido um alerta
mais do que suficiente. Tudo que fizera foi derramar gasolina no fogo.
Devony não precisaria reduzi-lo a cinzas por ultrapassar seus
limites. Estava queimando muito bem sozinho.
Ele havia usado o tempo que ficou sozinho enquanto ela trocava de
roupa para enviar uma mensagem à Ordem, alertando-os para segurar
Nathan até que Rafe tivesse a chance de relatar e explicar a situação. Ele
não sabia como explicaria sobre Devony Winters aos seus comandantes.
Mas esse era um problema com o qual teria que lidar mais tarde.
Agora, tudo o que podia fazer era lidar com o problema mais
imediato – ou seja, a sua intensa e inconveniente atração por ela e seu
desejo de saber mais sobre ela. Ele queria saber tudo, e não apenas
porque sua missão poderia se beneficiar com isso.
Entregando a fotografia para ele, ela se encostou no ombro dele e
olhou para a imagem junto com ele.
— Está muito borrada para distinguir todos — disse ela,
aparentemente inconsciente do efeito que a sua proximidade provocava
nele. — Foi o melhor que consegui sem ser flagrada.
Dirigindo-se para o calor do corpo dela, ele examinou a fotografia
de dezenas de pessoas bem vestidas e obviamente ricas que se reuniram
no salão do enorme barco de LaSalle.
Quando falou, sua voz soou enferrujada e grossa. — Tem o arquivo
digital também?
— Claro.
— Bom. Gostaria de uma cópia, se estiver tudo bem. Tenho certeza
de que posso encontrar uma maneira de melhorar a qualidade.
Por encontrar uma maneira, ele quis dizer enviar a imagem para
Gideon em D.C.
A Ordem estaria interessada em todas as informações reunidas por
ela, embora duvidasse que ela as entregasse facilmente. E tentar
persuadi-la seria um problema por si só, já que ele não estava autorizado
a divulgar o fato de que ainda trabalhava para Lucan Thorne.
Ela o trouxe para a sua cruzada pessoal, principalmente porque ele
não lhe deu outra escolha. Mas ele ainda estava no jogo como um agente
solo. Ver sua sala de guerra particular não mudava os parâmetros da
missão dele. Nem tê-la beijado.
A culpa o dominou quando se recordou da confusão dela sobre o
motivo de sua expulsão da Ordem. Ela estava mais do que confusa.
Ela ficou indignada e furiosa... por ele.
— Acha que estou louca por fazer isso, Rafe?
— Louca? — zombou ele levemente e balançou a cabeça. — Acho
que você é incrível.
Ele não podia deixar de se maravilhar com o fato de que, até poucos
meses atrás, ela estava simplesmente vivendo como uma civil – uma
aluna de música estudando longe de casa, pelo amor de Deus. Agora,
ninguém poderia argumentar que não era uma formidável agente.
Ela reuniu uma série de informações que excediam até mesmo o
que a Ordem havia coletado até então sobre Cruz e seus associados.
Inferno, ela colocou Judah LaSalle em sua mira semanas atrás, enquanto
Rafe e seus companheiros só ouviram o nome dele pela primeira vez na
outra noite.
Ele balançou a cabeça enquanto abaixava a foto. — Como
conseguiu montar esse tipo de operação sozinha?
Ela deu-lhe um olhar cauteloso. — Alguém me deu um
empurrãozinho.
— O que você quer dizer? Alguém mais sabe alguma coisa sobre
isso?
Deus, ele esperava que não. Já era ruim o suficiente que ela
estivesse envolvida. Não queria ter que informar Lucan ou o Comandante
Chase que estaria trazendo mais um problema para eles conterem.
Devony se levantou e foi até a pintura de sua mãe pendurada na
parede. Ela removeu o retrato emoldurado, revelando a frente de aço de
um cofre embutido na parede.
— Aparentemente, meu pai estava trabalhando em muitas dessas
informações na última vez que esteve aqui em Boston. Descobri isso...
depois — disse ela, abrindo a porta e retirando mais arquivos. Ela voltou
e os entregou para Rafe. — Acho que ele não disse a ninguém sobre o que
estava trabalhando. Ele escreveu todas as notas à mão, o que significa
que ele não acreditava que ficariam seguras em nenhum lugar em meio
eletrônico.
— Nem mesmo nos computadores da JUSTIS?
— Talvez especialmente lá.
Rafe folheou as páginas de anotações fortemente rabiscadas e os
diagramas esboçados que Roland Winters deixou quando morreu. Entre
os documentos, havia registros manuscritos de carregamentos de
contêineres que chegavam e saíam de vários portos de Boston. Um
número de nomes novos e desconhecidos apareciam nas notas,
juntamente com o de Judah LaSalle.
E nos registros portuários havia mais de uma referência a uma
empresa chamada Crowe Industries.
O sangue de Rafe ferveu ao ver isso. Ele conhecia bem esse nome.
O magnata dos negócios que era dono da empresa, Reginald Crowe,
esteve onipresente em todo o mundo por décadas, seu nome estava em
tudo, desde luxuosos hotéis internacionais até grandes corporações.
No início deste ano, Crowe chocou o mundo ao planejar o que seria
um assassinato em massa de proporções épicas numa reunião de
inúmeras pessoas e dignitários humanos. Se Crowe tivesse conseguido o
que queria, a cúpula da paz teria sido o início de uma guerra terrível.
A Ordem matou Crowe naquela noite, mas não antes dele anunciar
ao público em geral que ele fazia parte de uma organização terrorista
chamada Opus Nostrum.
A Ordem vinha perseguindo a organização evasiva desde então.
Sem mencionar outro poderoso adversário que também surgiu nos
últimos meses.
— Algumas das anotações do seu pai estão datadas há quase dois
anos — disse Rafe quando Devony se sentou ao lado dele mais uma vez.
— Se estava de olho nas Indústrias Crowe naquela época, se percebeu ou
não, ele deveria estar se aproximando muito da Opus também.
Ela assentiu com a cabeça, mas havia uma tristeza em seus olhos.
— Tudo o que meu pai sempre quis foi uma paz duradoura no mundo.
Minha família inteira estava comprometida com essa causa. Eles
empenharam suas vidas quando se juntaram à JUSTIS.
Rafe franziu a testa, refletindo sobre o fato de que ela havia perdido
não apenas o pai no atentado à bomba na sede em Londres, mas também
a sua mãe e o seu irmão. Embora Devony tivesse obviamente um talento
nato para o trabalho secreto de campo e para coleta de informações, ele
sentiu uma sensação de profundo alívio por ela não ter seguido os passos
da família, ou também poderia estar entre as vítimas naquela noite.
— Presumo que você não compartilhava o interesse deles na
justiça?
Ela deu-lhe um olhar de discordância. — Sim, eu compartilhava.
Eu queria participar da JUSTIS mais do que qualquer outra coisa. Meus
pais se recusaram a considerar isso. Para fazê-los felizes, concordei em
seguir a música, em vez disso.
Rafe não conseguia parar de tocar a bochecha dela. — Estou muito
feliz que você o fez.
Ela piscou e mordeu o lábio. O olhar dele seguiu aquela doce e
inocente reação, excitação segurando-o num aperto ainda mais firme. Um
grunhido se formou no fundo de sua garganta, um aviso não só para si
mesmo, mas para ela.
Ele afastou a mão, seus molares apertados para combater o
inchaço das suas presas. — Não acho que seu pai ou qualquer outra
pessoa em sua família ficaria feliz em saber que você pegou a tocha que
ele deixou. Você deveria voltar para a música, Devony.
E ele devia voltar a se concentrar em sua missão pessoal de
derrubar a Opus e todos os que são leais à sua causa.
— Não posso voltar para minha antiga vida. Nunca realmente me
agradou para começar. Esta é minha vida agora.
Rafe exalou bruscamente. — Subterfúgio e assassinato? Arriscar a
sua vida e Deus sabe o que mais ao se envolver com a escória como Cruz?
— Se é isso que é preciso, então sim.
— O que fará se conseguir encontrar uma conexão com a Opus ou
algum de seus membros?
— Vou matá-los. — Nenhuma hesitação em sua voz clara. Apenas
fria e firme resolução. — Terminarei isto por meu pai. Por minha mãe e
Harrison também. Preciso terminar isso por mim.
Merda. Rafe olhou para ela, sabendo que não havia nada que ele
pudesse dizer para dissuadi-la. Por outro lado, ele não precisava
dissuadi-la. Tudo que precisaria seria uma ligação para a Ordem e ela
seria removida para algum lugar seguro até que isso terminasse.
E ela o desprezaria pelo resto de sua vida eterna.
Isso não deveria importar para ele. Até alguns dias atrás, ele não
tinha ideia de que ela existia.
Mas agora o fazia, e esse simples fato mudava tudo.
Nada poderia ser o mesmo depois de vir aqui esta noite. Agora ele
sabia o que ela sofreu por causa do mal da Opus. Entendia seu desejo de
fazer alguém pagar.
No entanto, saber disso e permitir que ela continuasse nesse
caminho eram duas coisas diferentes.
Ela estava interferindo nos objetivos da Ordem. Estava interferindo
com os dele também. Por mais justa que fosse sua necessidade de vingar
sua família, ele também tinha sua própria necessidade de vingança.
— Precisa desistir disso. — Ele balançou a cabeça. — Vai se
machucar, Devony. Não quero ver isso acontecer.
— Não estou preocupada comigo.
— Droga, deveria estar. — A resposta dele saiu mais dura do que o
pretendido.
Ela se encolheu, mas não recuou. Ela não perdeu uma centelha da
resolução teimosa em seus lindos olhos ou no seu queixo erguido. — Já
esteve sozinho, Rafe? Quero dizer realmente, verdadeiramente, sozinho?
— Não — admitiu ele sobriamente.
— Então não fale comigo sobre se machucar. Não me diga que
preciso desistir quando não tenho mais nada. Isso dói — disse ela,
cerrando o punho em seu peito enquanto sua voz sufocava. — Essa raiva
é a razão pela qual saio da cama todos os dias. Não posso parar até que
isso termine. Não consegue entender isso?
Ele conseguia. Por mais que quisesse negar isso a ela, não podia
fingir que não sabia como ela se sentia.
Sua família e amigos poderiam ter perecido se a Opus e sua espiã
tivessem conseguido.
Se ele tivesse perdido todo mundo naquele dia?
Apenas o pensamento daquele vazio esculpiu uma cavidade em seu
peito.
Devony estava vivendo essa dor a cada segundo de cada dia
durante cinco longos meses.
Ela se sentou ao lado dele num silêncio rígido que quase o quebrou.
Sua dor era profunda, mesmo depois de todo esse tempo. Quando ele a
viu pela primeira vez no Asylum, ela parecia tão fechada e fragilizada. Tão
zangada. Agora sabia o porquê.
Ele segurou o seu rosto adorável, acariciando sua pele aveludada
com a ponta do polegar. — Sinto muito pelo que você suportou. Ninguém
deveria ter que experimentar esse tipo de perda, Devony.
— Eu ainda estou sofrendo — murmurou. — E estou tão cansada
de ficar sozinha.
Sua vulnerabilidade crua naquele momento quase o matou. Ele a
puxou, mesmo que tudo lógico e razoável dentro dele implorasse para
manter distância. Ele não podia deixar que ela suportasse a dor sozinha.
Especialmente quando ele nasceu com a capacidade de curar,
restaurar.
Ele falou na seda perfumada de seu cabelo. — Quer que eu tire isso
por um tempo? Eu faço, se você quiser.
Ela engoliu em seco, depois devagar, com firmeza, sacudiu a
cabeça. — Não. Preciso carregá-la. Preciso mantê-los vivos dentro de
mim, mesmo que doa.
Cristo, ela era uma mulher incrível.
Por mais atraente que ele a achasse fisicamente, sua coragem o
excitava ainda mais.
Sua força e resiliência deixavam seu controle em frangalhos.
Se ela tivesse concordado em deixá-lo curar sua dor, ele o teria feito
de bom grado. E então teria saído imediatamente e feito uma chamada
para a Ordem para encontrar um santuário seguro para ela, em algum
lugar longe deste negócio com a Opus Nostrum e dele.
Mas ela não havia cedido à sua dor.
Não, Devony Winters era feita de coisas mais fortes do que isso.
E ele nunca conheceu nada mais sexy.
O que deveria fazer era partir.
Não apenas pela integridade de sua missão para a Ordem, mas
também por sua própria sanidade.
Inferno, pelo o que restou da sua honra, se nada mais. Não importa
quão tênue fosse essa afirmação agora.
— Está ficando tarde. — Sua voz estava muito grossa, sua boca
cheia com a presença das presas. — Eu devo ir.
— Não. — Ela encontrou o olhar dele, suas íris fervendo com
manchas brilhantes de âmbar. Enquanto ele bebia a beleza de seu rosto,
suas pupilas começaram a se estreitar, transformando-se com a
intensidade de sua excitação.
Ele sentiu a mesma necessidade entrando em erupção dentro dele.
Todo o desejo que esteve tentando afastar estava rapidamente
alcançando o ponto de ruptura. O calor lambia suas veias, seu pulso
tamborilando, todo seu sangue correndo em direção ao comprimento
rígido e dolorido de sua ereção.
— Devony...
Ela não deu a ele uma chance de dizer mais nada.
Sua boca esmagou a dele, seu beijo uma força da natureza.
Ele a pegou e caiu no tapete com ela.
CAPÍTULO 11
A noite toda ela esteve queimando para sentir o beijo dele
novamente.
Não sabia descrever o profundo sentimento de gratidão que sentiu
quando Rafe se ofereceu para tirar a sua dor com sua capacidade de cura.
Não esperava gentileza como essa do perigoso macho Raça. Ele a curou
depois do trabalho no museu, mas isso foi por obrigação para um
camarada.
A oferta para aliviar sua dor esta noite nasceu de algo diferente,
algo mais profundo. Algo que parecia uma preocupação verdadeira, até
mesmo afeição.
Deus a perdoasse, mas ela queria tanto se apoiar naquele
sentimento que teve que se forçar a negá-lo. Ansiava por sentir algum
tipo de conexão com alguém...
Não, não apenas alguém. Com ele. Seu desejo pelo carinho de Rafe
era quase esmagador, mas empalideceu em comparação com a fome que
ela tinha de sentir o calor de seus lábios nos dela.
A fome explodiu, e só se intensificou quando ele a levou ao chão
com ele. Ele segurou o rosto dela com mãos gentis, saqueando sua boca
com uma necessidade selvagem que parecia exceder a sua própria.
— Ah, porra — proferiu irregularmente contra os lábios dela. —
Isso não deveria acontecer. Você não deveria acontecer, Devony.
Ela não estava preparada para ele também.
Todo o vazio depositado no fundo dela se abriu com ele esta noite.
Aquela solidão desolada a engoliu por tanto tempo, mas nunca entendeu
o quão insondável e escuro isso cresceu até estar sentada neste cômodo
com Rafe, compartilhando os detalhes de sua dor e seus planos para
afastar a dor punindo os monstros que causaram isso.
Mas todas essas realidades sombrias não eram nada mais do que
cinzas agora, incineradas sob o calor da sua necessidade por este
homem.
Um gemido se soltou da sua garganta, soando animal e cru.
Ela não se importava se parecia desesperada por ele.
Ela não queria se importar.
— Não pare de me beijar, Rafe. — Sua respiração foi reduzida a
ofegante e irregular, suas presas saindo das gengivas. — Eu sofro — se
engasgou. — Oh, Deus, eu preciso...
Ele respondeu com um gemido baixo e um forte impulso da sua
pélvis embaixo dela. Mesmo separados pelas roupas, o comprimento
rígido de sua ereção queimava-a onde ela esfregava seu abdômen. Ela
pressionou, pensando que o atrito poderia aliviar um pouco daquele
calor, mas só se intensificou quando ela se encostou nele.
Os braços de Rafe a envolveram como algemas de ferro quente.
Então, num movimento fluido, a jogou de costas, prendendo-a sob ele
enquanto seu beijo se aprofundava em algo selvagem, quente e
descontrolado.
Cada veia e artéria em seu corpo latejavam enquanto ele a cobria
com seu corpo e se movia contra ela num ritmo erótico. A língua dele
invadiu sua boca, passando os dentes e presas para acariciar
profundamente enquanto seus quadris balançavam fortemente entre
suas coxas.
A palpitação forte de seu coração se converteu numa rápida batida
de tambor, fazendo o acúmulo de necessidade em seu núcleo se torcer e
enrolar, espiralando em um desejo que ela mal podia conter.
Sua pele estava muito tensa, muito quente. Por baixo do seu suéter
largo e da calça macia, seus dermaglifos pareciam mais vivos do que
nunca, como se as marcas sobrenaturais da pele estivessem iluminadas
e agitadas, lambendo-a com fogo.
Ela já havia sentido desejo, mas tão raramente que mal se lembrava
de quando. Nenhum dos atrapalhados beijos do colegial ou mãos
desajeitadas que por acaso a tocaram no passado poderiam se comparar
ao que sentia agora. O toque de Rafe obliterou tudo que veio antes. Seu
beijo acendeu um fogo que não podia ser contido.
Quando a mão dele escorregou sob a bainha de seu suéter para
deslizar sobre o seu estômago, ela se arqueou para ele com um suspiro
trêmulo. Ela se contorceu debaixo dele, o prazer a inundando enquanto
a palma da mão dele se movia mais alto, acariciando-a sobre a renda fina
do sutiã. O fecho da frente se abriu um segundo depois, e Devony gemeu
quando ele segurou seu seio despido em sua mão.
— Cristo, você é suave — murmurou ele. — E posso sentir seus
glifos ganhando vida sob meus dedos.
Ela também podia sentir isso. Cada roçar da mão dele enviava
prazer dançando através de sua pele, e transformava a dor em seu núcleo
num desejo ardente.
O beijo dele se moveu em sua garganta. — Eu preciso ver você.
Ele não esperou por permissão. Foi melhor assim. Ela mal podia
encontrar sua voz para dar a ele, enquanto a fome nela aumentava.
Levantando a blusa acima da cintura, as mãos dele patinaram ao longo
de seu torso, amontoando o tecido sob o queixo dela. Ele parou de beijá-
la por um momento e tirou a sua blusa e o seu sutiã. Então, ele inclinou
a cabeça para olhar para ela.
— Você é tão linda. — Sua voz profunda carregava uma borda
brusca, engrossada por seu desejo e pelas presas que enchiam a boca
dele. O calor de seu olhar âmbar a banhou com uma luz quente quando
ele se levantou e lentamente apreciou a visão dela. — Sabia que você seria
linda, Devony. Todos esses lindos glifos em sua pele macia e cremosa.
Mas você está além de qualquer coisa que imaginei.
Ele a tocou com a mesma reverência que ela viu em seus olhos.
Quando se inclinou e traçou a língua ao longo das curvas de uma de suas
marcas, ela estremeceu com a sensação. Ele deu beijos em cada
centímetro descoberto dela, movendo-se de um seio para o outro, depois
para o umbigo. Os glifos dela responderam como se ele os comandasse,
as cores surgindo e ondulando sob seus lábios, sob seus dedos, enquanto
ele explorava todos eles.
— Eu me pergunto onde este leva — murmurou ele, abaixando-se
sobre o corpo dela e lambendo um dos floreios que desaparecia abaixo do
cós da sua calça de yoga. Ele a puxou pelos quadris, tirando a calcinha
junto com ela. A respiração que ele inalou soou irregular enquanto o seu
olhar brilhante seguia o caminho de um glifo que corria através do osso
do seu quadril e para o monte de seu sexo. Seus olhos se moveram para
encontrar os dela, com uma inclinação perversa nos lábios. — Acho que
encontrei o meu favorito.
Abrindo as pernas dela para conseguir um melhor acesso, ele
afundou entre as coxas separadas e colocou uma linha de beijos de uma
extremidade do dermaglifo à outra. Sua barba curta produziu uma
deliciosa abrasão, fazendo a excitação de Devony incrivelmente mais
apertada. Senhor, ela pensou que poderia explodir de desejo por ele.
Ela quase fez isso no momento seguinte, quando ele pressionou a
boca na costura encharcada de seu corpo. A língua dele passou entre as
suas dobras e ela sugou um gole de ar. Isso a deixou com um suspiro
trêmulo quando ele sugou seu clitóris com uma reivindicação impiedosa.
Sua resposta pareceu estimular a dele. Ele gemeu e a arrastou para
mais perto, as palmas segurando seu traseiro, segurando-a firme quando
ela mal conseguia evitar se contorcer numa agonia ardente e prazerosa.
Ela não estava preparada para a súbita e esmagadora onda de
sensações que a invadiu.
A onda atingiu o ápice, depois caiu, inundando cada fibra de seu
ser com uma felicidade cintilante e imprevisível. Ela gritou, o nome dele
esfarrapado em sua língua enquanto sua liberação a deixava tremendo
nas mãos de Rafe, seu corpo convulsionando contra o rosto dele.
Quando finalmente abriu as pálpebras, encontrou-o olhando para
ela, estudando-a com pura apreciação masculina. Sua visão estava
encharcada de âmbar, suas presas parecendo tão longas e afiadas quanto
adagas enquanto ela ofegava pesadamente através dos lábios
entreabertos.
Rafe sorriu. — Santo inferno, Devony. Queria que você pudesse se
ver agora mesmo. Você é a mulher mais sexy que eu já vi.
Tudo que ela podia fazer era gemer em resposta. Até aquele som
sem palavras era áspero e não humano. Ela nunca fez um barulho como
esse. Nunca se sentiu tão viva.
E por mais emocionado que ele parecesse olhando para ela, Devony
não poderia começar a descrever o que a visão de Rafe fazia com ela
agora, com seu corpo vibrando pelo prazer que ele acabara de lhe dar.
Bonito e dourado, seu imenso corpo envolto em músculos, ele era
magnífico simplesmente por existir. Mas agora, com seus olhos de água-
marinha engolfados em fogo âmbar, seu rosto cheio de desejo, e as presas
afiadas brilhando, não era nada menos que impressionante.
Uma possessividade feroz tomou conta dela enquanto olhava para
ele. Veio de um lugar nela que já o reivindicara como seu, mesmo antes
desta noite. Era uma parte indomável dela, que estava dormindo até esta
noite. Até o beijo de Rafe naquele estacionamento a acordar.
Devony se levantou do chão, plantando uma palma no centro do
peito dele.
Ele pareceu surpreso a princípio, mas uma luz ansiosa e de
aprovação ardia em seus olhos âmbar enquanto ela o fazia se sentar e
ficava de joelhos na frente dele.
Ela tirou a camiseta preta dele e deixou o olhar vagar avidamente
sobre os emaranhados de glifos cobrindo seu peito e braços fortes. Ele
não tinha tantos quanto ela. Graças à genética manipulada em
laboratório de sua mãe, Devony nasceu com uma abundância de marcas
na pele, além da diminuta marca de lágrima e lua crescente de uma
companheira de Raça.
Para qualquer pessoa dentro ou fora da Raça, ela era única. Mas
para ela, Rafe era um fascínio singular.
Um que ela simplesmente não conseguia resistir.
Ela passou as mãos sobre a pele macia, observando as cores se
agitar e se contorcer ao longo de seus glifos. Vinho escuro, índigo e ouro.
Sua própria pele fervia com os mesmos tons profundos. Todas as cores
do desejo.
Rafe estremeceu sob suas mãos curiosas, seu olhar derretido.
Quando se inclinou e usou a língua para prová-lo do jeito que ele fez com
ela, os músculos dele flexionaram sob seus lábios. A enorme
protuberância que enchia a frente de seu jeans preto ficou ainda mais
pronunciada.
As mãos dele brincaram com o cabelo dela, soltando-o do coque
bagunçado. — Já esteve com um homem de sua própria espécie?
Ela lambeu os lábios. — Nunca estive com ninguém.
Ele recuou e agarrou as mãos dela, segurando-as com uma
maldição baixa. — Ninguém? — Quando ela balançou a cabeça, sua
expressão endureceu. — Ah, foda-se. Devony... você deveria ter me
contado.
— Por quê? Você me desejaria menos se soubesse?
Sua testa franzida escureceu ainda mais. Levou um longo momento
para responder. — Não. Não acho que qualquer coisa poderia me fazer te
querer menos. Agora não. Nem a qualquer momento.
— Bom. — Ela o beijou, sem um emaranhado gentil de seus lábios
e línguas, mas uma fusão, uma reivindicação.
Ela não queria o carinho dele agora. Ela não queria ternura.
Simplesmente o queria.
Sem soltá-lo de seu beijo, ela se abaixou para abrir o botão e o zíper
de seu jeans. Ela se atrapalhou um pouco, mas as mãos de Rafe também
estavam lá, tão impacientes e determinadas quanto as dela.
Quando ele foi libertado, ela não resistiu à vontade de tocá-lo... de
saboreá-lo.
Seu pênis estava grosso e orgulhoso, tão glorioso quanto o resto
dele.
Ela tomou seu comprimento com ambas as mãos, maravilhando-
se com sua circunferência e peso. Ele sibilou com força enquanto ela o
acariciava, em seguida, soltou um gemido estrangulado quando ela
abaixou a boca sobre ele e levou-o profundamente em sua garganta.
Parecia estar apenas encontrando seu ritmo quando ele segurou
seus ombros e a afastou numa maldição crua e vívida.
— Não deveria estar fazendo isso com você. — Seu olhar a queimou,
seu belo rosto cheio de um horrível tormento. — Você deveria me fazer ir
embora, Devony.
— Não é isso o que eu quero.
Ele zombou da resposta dela. — Isso já foi longe demais. — Suas
palavras foram proferidas como um aviso, embora se era para ela ou para
ele, ela não podia ter certeza. — A luz do dia estará logo aqui. Se eu não
voltar para minha casa, não vou a lugar nenhum por muito tempo.
— Eu sei — disse ela. — E ainda estou pedindo para você ficar.
Ela colocou a mão em torno de seu membro e o beijou novamente,
um acasalamento escaldante de suas bocas. Ele não resistiu. Não a
rejeitou.
Não, longe disso.
Num grunhido, ele enfiou os dedos em seus cabelos e devolveu o
beijo com uma selvagem reivindicação. A próxima coisa que ela percebeu
é que estava de costas embaixo dele, o grande corpo dele encaixado entre
as suas coxas.
O beijo dele deixou sua boca e viajou ao longo de seu corpo. Ele a
abriu e devorou seu sexo, penetrando-a com um dedo até que ela pensou
que iria enlouquecer com a excitação. Ele continuou, acrescentando um
segundo dedo quando o seu corpo se acostumou com o primeiro.
Não era o suficiente. Ela ansiava por algo mais do que isso. Mais
dele. Ainda assim, ele não parou, não até que ela estava gritando com o
ataque de um clímax devastador.
Ele se moveu sobre ela, e então seu comprimento duro era uma
exigência rígida contra suas dobras lisas. Ele balançou lá por um
momento, provocando seu corpo com a promessa do que estava por vir.
Ela achou que estava pronta.
Pensou já ter sentido todo o espectro do êxtase.
Oh, Deus, estava errada.
A boca de Rafe encontrou a dela novamente, e então ele empurrou
os seus quadris e a cabeça romba de seu pênis a perfurou. Ela gritou
com a intensidade disso, com a sensação esmagadora dele enchendo-a,
esticando-a, deixando espaço apenas para a intensidade da união deles.
Ela não conseguiu segurar o seu grito quando a dor e o prazer se
fundiram, tornando-se algo selvagem e louco. Ela o montou, suas unhas
arranhando os ombros dele enquanto onda após onda colidia com ela.
— Você é muito gostosa — murmurou ele, olhando para ela
enquanto a observava gozar. — Você deveria ter me matado quando teve
a chance.

~~~

Ele queria ir devagar.


Queria tomar cuidado, ser gentil com ela, mas Devony não permitia
nada disso.
Ela era Raça e era destemida.
E inferno sagrado, ela era primorosa.
O aperto de sua bainha o agarrou, sua carne virgem cedendo sob
a força de sua invasão. Ele podia sentir a leve fragrância de sangue se
misturando com os sucos sedosos que banhavam seu pênis enquanto
empurrava dentro dela. Deveria ter sacudido o pouco senso de honra que
acreditava que ainda tinha. Em vez disso, a besta nele respondeu com
um rugido de pura posse.
Suas unhas marcaram os ombros dele, os músculos esguios das
suas coxas se envolveram ao redor dos quadris dele quando ela cavalgou
o comprimento e profundidade de cada forte colisão dos seus corpos. Seu
clímax se quebrou como uma tempestade embaixo dele. Ele nunca sentiu
nada tão poderoso e elétrico, tão gostoso.
E seu lindo rosto. Ah, Cristo. Seu rosto estava ainda mais bonito
transformado pela paixão e liberação.
Uma onda de autoaversão o atingiu enquanto se deleitava com a
sua resposta desinibida. Ele não tinha o direito de vê-la assim, nem de
ser o homem que ela permitiu que lhe desse prazer pela primeira vez.
Não tinha direito a nenhuma parte dela. Nenhuma reivindicação
sobre o seu corpo, e certamente não sobre o seu coração.
No entanto, a ideia de que qualquer outro macho pudesse tocar
Devony acendia um fogo frio em suas veias.
Ninguém seria bom o suficiente – muito menos ele.
Isso não o impediu de saborear cada gemido suave que saiu de seus
lábios enquanto bombeava dentro dela. Cada arco de boas-vindas de seus
quadris para encontrar os dele. Todos os estremecimentos poderosos que
varreram o seu corpo forte enquanto ele a conduzia impiedosamente de
um orgasmo ao seguinte.
Ele era o pior tipo de bastardo para ser o seu primeiro,
especialmente quando um campo minado de meias-verdades estava entre
eles.
Mas isso não era mentira – o desejo dele por ela. Ele não foi capaz
de esconder essa verdade dela. Não desde o começo, e certamente nunca
mais depois desta noite.
Não podia segurar essa necessidade enquanto se balançava dentro
dela com fúria intensificada, alimentando o punho quente e úmido de seu
núcleo.
Seus olhos permaneceram abertos e fixos nele, nenhuma timidez
em seu olhar febril enquanto ele se aprofundava a cada golpe. Um suspiro
cortado entre seus lábios entreabertos, as suas presas brilhando.
Rafe rosnou, caindo na beira de um abismo íngreme. Não se
contentaria em ir para lá sozinho. Inclinando-se, tomou sua boca num
beijo selvagem conforme afundava até o punho e começava a reivindicar
mais profundamente o seu corpo.
— Oh, Deus — gemeu ela em sua boca. — Rafe, eu não aguento.
Ele sabia que ela não falava de dor. Um grito estrangulado saiu
dela. Seu corpo se sacudiu embaixo dele, suas mãos ainda apertadas
como garras nos ombros dele.
Rafe continuou se movendo dentro dela, mesmo quando sua
garganta explodiu com um grito de liberação violenta. Ele estava perdido
pela pressão erótica do núcleo dela, envolvido com tanta força ao seu
redor que as contrações ondulantes o ordenharam. A sensação dela era
mais do que ele podia suportar também. Isso arrancou uma maldição
grosseira entre seus dentes e presas.
Agora, sua própria necessidade exigia ser saciada.
Apoiando-se num antebraço, ele entrou cada vez mais forte no calor
dela, hipnotizado pelo olhar de fome e êxtase queimando em seus olhos.
O pulso dela latejava na base da garganta, repetidamente atraindo
seu olhar para aquela batida forte. A fome o atacou junto com a onda do
orgasmo que ele estava lutando para prolongar.
Sua sede de sangue foi tratada há algumas noites na festa de
LaSalle, mas a visão da veia de Devony batendo tão perto de sua boca era
uma tentação que o abalou até a medula.
— Porra — rosnou ele, despreparado para o impulso subindo nele
como uma onda.
Ele disse a si mesmo que era apenas sexo. Estava há muito tempo
sem isso – nem uma vez desde que foi feito de tolo pela mulher da Opus
que o hipnotizou como uma sereia.
Ele se negou a sair da punição, mas esta noite estava pagando o
preço. Devony estava pagando um preço ainda maior. Porque por mais
intenso que fosse este desejo entre eles, Rafe não podia permitir que se
tornasse algo mais.
Sua missão era tudo o que importava para ele.
Sua vingança contra a Opus Nostrum e a redenção que esperava
finalmente conquistar, assim que a fumaça fosse dissipada e a batalha
vencida.
Até então, qualquer outra coisa era simplesmente um obstáculo
que precisava evitar. Incluindo Devony Winters.
Ele tentou convencer-se de que esta noite era um erro que
precisaria corrigir, e o que sentia por ela agora era apenas uma fraqueza
momentânea que se desvaneceria sob a luz do dia. Ele precisava acreditar
nisso, porque a alternativa era inaceitável.
Devony Winters era uma tentação para a qual ele não tinha tempo,
e nenhum direito de se entregar.
Mas ainda assim ele continuou se enterrando no êxtase perfeito do
seu corpo, incapaz de parar. Ele saboreou cada nuance da resposta dela
enquanto seu próprio corpo se acelerou e um rugido explodiu dele junto
com a corrida de sua liberação surpreendente.
Enquanto todo o macho nele – todo Raça – rugia com a necessidade
de possuí-la.
Reivindicá-la como dele.
CAPÍTULO 12
Passos suaves e o leve aroma floral do cabelo lavado de Devony
alertaram Rafe para sua presença momentos antes dela entrar na sala de
guerra do escritório do seu pai na manhã seguinte.
Rafe estava acordado há horas, já havia tomado banho e se vestido
enquanto ela dormia. Como Raça, não precisava de muito sono. Devony
certamente também não, mas quando ele deixou sua cama não muito
antes do amanhecer, ela não se mexeu.
Ele deveria ter deixado o Darkhaven assim que acordou.
Na verdade, o que deveria ter feito era pegar os arquivos do pai dela
e também as informações coletadas por ela, e levado tudo diretamente
para a Ordem. Ele ainda deveria, logo após fazer sua ligação tardia à sede
para aconselhá-los a vir e tirar Devony Winters do caminho perigoso que
estava e colocá-la imediatamente sob a proteção da Ordem.
Para não mencionar fora do seu alcance.
Especialmente após sua espetacular negligência do dever na noite
passada.
— Bom dia. — Ela caminhou até onde ele olhava a parede de fotos,
anotações e diagramas. Seus seios pressionaram contra a sua coluna
quando ela colocou os braços ao redor de sua cintura e apoiou o queixo
em seu ombro. — Há quanto tempo está aqui embaixo?
Ele encolheu levemente os ombros. — Não muito tempo.
Ele girou para encará-la, nem que fosse para se livrar do calor
sedutor de seu abraço. Grande erro. Era ainda mais tentadora agora que
estava olhando para ela. Evidentemente recém-saída do banho, ela usava
um short de pijama de seda rosa e uma camiseta branca de algodão.
A combinação inocente quase não escondia seus seios empinados
e os dermaglifos sensuais que decoravam tanto de seus lindos membros
e curvas. Ontem à noite ele provou quase cada centímetro quadrado
desses membros e curvas.
Hoje, em vez de se sentir saciado pelas horas que passou enterrado
dentro dela, ele estava tendo muita dificuldade em fingir que não queria
recomeçar tudo. Uma culpa fresca o atormentou por sua perturbadora
falta de controle, antes e agora.
Ele franziu o cenho. — Como se sente?
— Incrível. — Seu sorriso satisfeito deveria fazer ele sentir qualquer
coisa além de remorso. — E um pouco embaraçada, se quer saber a
verdade. Nunca me joguei num homem. Ainda bem que não percebi o que
estava perdendo até a noite passada.
Rafe grunhiu, um sorriso puxando sua boca contra sua vontade.
Por mais que quisesse se arrepender de ter feito amor com Devony, era
difícil chegar lá quando ela olhava para ele com um brilho sensual nos
olhos. Seu pênis se mexeu com interesse instantâneo e renovado, e seu
pulso acelerou num ritmo mais forte.
— Eu nunca fui a primeira vez de alguém — murmurou. — Tenho
certeza que poderia ter feito muito melhor por você.
— Isso parece intrigante. O que tem em mente?
Ele riu. — Não pergunte. Pode ficar chocada ao saber.
— Realmente? — Seus olhos cor de Bourbon se arregalaram de
interesse. — Me teste.
Porra. Como diabos foram de bom dia para falar sobre sexo de
novo?
Rafe deu um passo atrás e limpou a garganta. O documento que
segurava na mão quando ela entrou na sala estava agora esmagado em
seu punho.
Devony percebeu isso. — Esse é um dos meus registros de
atividades da gangue de Cruz?
— Sim. — Ele vasculhou os arquivos dela nas últimas duas horas,
absorvendo todos os detalhes que podia e tirando fotos dos itens que
eram muito extensos para guardar na memória.
Ele descobriu que ela estava envolvida com Ricardo Cruz e sua
gangue por quase dois meses. Antes disso, ela havia se infiltrado numa
gangue de outra área, e uma outra antes disso. Ela foi obstinada em sua
busca por informações e, durante esse tempo, conseguiu manter um
diário dos vários trabalhos criminosos de cada grupo, conversas
relevantes, até mesmo minúcias que, de outra forma, poderiam passar
despercebidas.
Dizer que ela era minuciosa era um eufemismo. E destemida.
Não queria considerar o quão grande seria a perda de sua missão,
uma vez que ele organizasse que a Ordem entrasse e a retirasse do
campo.
Rafe colocou o papel na mesa de trabalho na sala de guerra, depois
caminhou até as quatro paredes de informação que o lembravam do
plano geral de uma campanha de guerra. — Há quanto tempo acredita
que Cruz está associado com Judah LaSalle?
— Mais de um ano, eu diria. — Ela caminhou para o lado dele para
olhar os dossiês e as cordas vermelhas conectando um indivíduo ao outro
na parede. — Não muito tempo depois de conhecer Fish, ele me contou
sobre um dos primeiros trabalhos que LaSalle os contratou para fazer.
Foi uma invasão em algum laboratório de ciências da energia em
Berkshires.
Rafe assentiu sem comentar que provavelmente conhecia a
empresa em questão. Estaria disposto a apostar seu braço direito que o
produto sendo desenvolvido lá era uma das várias tecnologias
ultravioletas que caíram nas mãos da Opus Nostrum no início deste ano.
— Fish disse o que deveriam ter roubado para LaSalle?
— Não. E não foram bem-sucedidos, de qualquer maneira. A
segurança era muito apertada, então eles tiveram que abortar.
— Mas LaSalle continuou contratando-os para outros trabalhos?
— Ele precisa de pessoas como Cruz e seus homens.
— Homens descartáveis — disse Rafe.
— Certo. Homens que farão quase tudo – arriscar quase qualquer
coisa – desde que tenha um pagamento grande o suficiente. Pelo que
observei, eles são apenas homens no terreno para LaSalle, e ele é
intocável até agora. Além disso, ainda não há provas claras de que ele
esteja conectado à Opus.
Rafe não tinha tanta certeza disso. A invasão de Berkshires lhe deu
esperança de que estivesse no caminho certo. Já estava meses à frente
em termos de reconhecimento, tudo graças a ela.
Devony pegou outro dos papéis e entregou a ele. — Aqui está uma
lista dos trabalhos mais recentes para ele.
Rafe examinou o registro de coletas e retiradas aleatórias de
mercadorias não declaradas, roubos variados e até mesmo alguns casos
de lavagem de dinheiro.
Ela girou para encará-lo enquanto ele revisava o documento,
encostando-o contra a parede de informações. — Ouvi Ocho e Axel
falando sobre um grande trabalho que Cruz prometeu recentemente. Não
sei o que é ainda, mas Cruz não mencionou nada para mim.
Rafe olhou para ela, sua mente calculando a maneira mais rápida
de resolver o problema. — Preciso pegar um dos caras sozinho em algum
lugar. Só preciso de alguns minutos, apenas tempo suficiente para
interrogar o filho da puta sob transe.
Ela estava balançando a cabeça antes mesmo dele terminar de
falar. — Eu já fiz isso.
— Você fez? — Ele não podia fingir que não estava surpreso – e
impressionado. — Qual deles você questionou?
— Todos, incluindo Cruz. — Ela arqueou uma sobrancelha. — O
que você acha que eu tenho feito com eles todos esses meses, apenas
vencendo-os na sinuca e fingindo que não desprezo beber uísque barato
com eles?
Ele riu. — Você é incrível, sabe disso?
Ela sorriu. — Isso é o que você ficou me dizendo ontem à noite.
Sim, foi. E quis dizer todas as palavras também.
E deveria ser algum tipo de idiota pelo jeito que ainda a desejava,
mesmo considerando que amanhã, a esta hora, ela estaria sob custódia
da Ordem e desejando nunca tê-lo conhecido.
Ela era tão confiante e destemida em situações normais, que era
difícil para ele conciliar o fato de que estava intocada até algumas horas
atrás.
Até ele.
— Você é uma mulher incrível, Devony. — Ele se aproximou dela e
gentilmente segurou seu rosto. — A noite passada foi incrível.
Ela assentiu com a cabeça, e ele não podia se negar o prazer de
mais um beijo, mesmo que se amaldiçoasse por tirar isso dela com uma
cabeça mais clara do que algumas horas atrás. E ainda a sensação de
seus lábios roçando suavemente contra os dele enviou uma torrente de
desejo irregular em suas veias.
Ele gemeu e se afastou.
— Esta não é uma boa ideia. Prometi a mim mesmo que não faria
isso com você novamente.
— Faria isso comigo? Eu meio que pensei que havíamos feito isso
juntos, Rafe. Quer dizer, posso não ter muita experiência nessa área, mas
achei que fizemos isso muito bem juntos.
Ela veio em sua direção agora, seus olhos brilhando com faíscas de
âmbar e a determinação que estava rapidamente achando irresistível.
— Acho que você e eu fazemos muitas coisas muito bem. Muito
bem para continuarmos fazendo-as sozinhos.
— Do que está falando?
— Isso. — Ela gesticulou para as paredes ao seu redor, todo seu
trabalho dos últimos cinco meses. Toda a mágoa e perda que canalizou
em sua busca daqueles que a machucaram. — Queremos a mesma coisa,
não é? Ver o final da Opus Nostrum. Nenhum de nós descansará até que
esses bastardos não estejam mais aqui. Então, por que não fazemos isso
juntos?
Ele olhou entre eles, onde ela agora estendia a mão para ele. —
Juntos?
— Como um time. Como parceiros. O que diz, Rafe?
Ele sabia muito bem o que deveria dizer. Que sua lealdade já foi
dada. Ele tinha uma equipe de parceiros contando com ele em D.C.,
assim como os irmãos que esperava se juntar o mais cedo possível no
Centro de Comando de Boston. Até que sua missão estivesse completa,
não tinha espaço para nada, nem para ninguém.
Deveria ter dito tudo isso ontem à noite, antes de deixar a situação
com ela ficar tão fora de seu controle.
Por mais que ela merecesse saber a verdade, até ele falar com
Lucan Thorne e Sterling Chase, não podia quebrar a fé da Ordem nele,
divulgando seu papel contínuo como guerreiro.
E havia uma parte egoísta dele que não queria que Devony o
odiasse.
Nem na noite passada, e não agora, quando olhava para ele com
tanta confiança e afeto.
— Vou cuidar das suas costas e você das minhas — disse ela, ainda
à espera de sua resposta. — Temos um acordo?
Rafe olhou para ela, inundado pelo respeito e admiração, e algo
mais profundo que não queria nomear. De todas as coisas que ele lhe
devia no curto tempo desde que se conheceram, essa era a única
promessa que poderia lhe dar. Que, independentemente de sua obrigação
para com a Ordem, ele faria o que fosse necessário para mantê-la segura.
Isso ele podia se comprometer sem reservas e com total honestidade.
— Ok — disse ele, a palavra como uma lixa na garganta enquanto
segurava a mão dela. — Nós temos um acordo, Devony.
A Ordem não ia gostar disso.
Ele não estava convencido de que ele também.
CAPÍTULO 13
Eles passaram a maior parte do dia revisando cada informação que
Devony e seu pai coletaram. Ela adorava ver o modo como a mente afiada
de Rafe trabalhava, sua infatigável sede de conhecimento. Ele era focado
e metódico, e ela se maravilhou com sua capacidade de detectar padrões
e conexões até mesmo entre os dados mais obscuros.
Era um homem lindo, sem dúvida, mas o seu cérebro sexy estava
causando estragos em seus sentidos também.
Se ela pensou que estudar seu trabalho juntos ajudaria a afastar
sua mente de todas as outras coisas que queria fazer com ele, ela não
poderia estar mais errada.
Toda vez que ele passava por ela para pegar uma foto ou organizar
um conjunto de documentos na mesa de trabalho compartilhada, ela
lutava para resistir à vontade de lamber o emaranhado de glifos que
atravessavam o seu musculoso antebraço.
Quando ele fazia perguntas ou compartilhava suas teorias sobre a
Opus e os indivíduos que poderiam ter vínculos com a mesma, ela se
agarrava a cada palavra, cativada pelo corte sensual de seus lábios e suas
memórias muito vívidas de todas as coisas perversas que sua boca fizera
ao corpo dela.
Era quase impossível ignorar o ritmo constante de seu pulso
quando ele estava sentado tão perto dela. Os sentidos Raça dela estavam
focados naquela batida forte e na corrente líquida do sangue dele
pulsando em suas veias. As presas dela picavam em suas gengivas, e ela
não conseguia decidir o que queria mais, ter Rafe dentro dela novamente,
ou afundar seus caninos afiados na lateral do pescoço dele.
Esse último desejo era a última coisa que ela deveria pensar.
Laços de sangue eram sagrados. Eram eternos e não deviam ser
feitos por impulso. Ela podia se alimentar o quanto quisesse de
hospedeiros humanos, mas um gole do sangue de Rafe a ligaria
irrevogavelmente a ele enquanto vivessem.
Por que essa noção não a congelou, ela não queria saber.
Nunca foi uma garota de olhos brilhantes que sonhava com a ideia
de felizes para sempre. Deus, era isso o que estava fazendo agora com
Rafe? Não podia ser tão tola assim. Aparentemente, perder a sua
virgindade também lhe roubou algum bom senso.
— Onde colocamos o registro de tráfego de carga do seu pai para o
Terminal Conley? — perguntou Rafe, tirando-a de seus pensamentos
conturbados.
Franzindo a testa, ele vasculhou um arquivo aberto de anotações
manuscritas.
Como parecia que ela estava sozinha em sua distração em torno
dele, ela realmente precisava encontrar outra coisa para se concentrar.
Especialmente desde que ele parecia não ter problemas para manter uma
linha profissional traçada entre eles hoje.
— Este aqui? — Ela deslizou uma das dezenas de registros para
ele.
Ele olhou para ela apenas brevemente, depois balançou a cabeça.
— Estou procurando os registros de fevereiro.
— Aqui está. — Devony pegou o documento em questão e entregou
a ele, observando enquanto ele o estudava atentamente.
Seu fascínio por ele a inquietava, especialmente quando isso
parecia nitidamente unilateral hoje. Ela estava perdendo sua cabeça com
ele; percebeu isso. Não foi apenas o sexo incrível que fez seu estômago
dar cambalhotas e as suas veias parecerem ter absorvido um prolongado
choque de eletricidade.
Era simplesmente estar com Rafe que fazia isso com ela. Conversar
com ele. Planejar com ele. Estar perto o suficiente para sentir o calor e a
força de seu corpo, e ver as brasas em seus olhos cor de água-marinha
quando olhava para ela.
Ela não podia acreditar que se deixou enredar tão rápida e
profundamente com um macho que conhecia tão pouco. Ele era perigoso;
ela viu isso em primeira mão. Ele podia ser gentil e atencioso; ela
vivenciou isso no parque quando a curou, e novamente na noite passada,
quando a tratou com tanta gentileza – logo antes de ter mostrado a ela o
verdadeiro significado da paixão.
Mas Rafe também era um homem atormentado e enfurecido, fixado
em vingança contra a Opus.
Não que pudesse culpá-lo.
Quanto à Ordem expulsá-lo, a perda deles se tornou seu ganho.
Ela começou sua busca sozinha depois de perder sua família, nunca
imaginou que encontraria um aliado ao longo do caminho. Havia uma
parte dela que queria pensar que poderia ter encontrado algo ainda mais
do que isso em Rafe.
Enquanto o observava, percebeu que havia tanta coisa que queria
saber sobre ele, tanta coisa que queria entender. Ela nem sabia o
sobrenome dele.
Apoiando o cotovelo na mesa, o observou folhear os registros. —
Acabei de perceber que há algo muito importante que você ainda não me
disse.
Sua cabeça se levantou bruscamente e ele lançou um olhar suave,
mas estranhamente cauteloso, para ela. — O que?
— Rafe é seu nome completo, ou é abreviação de alguma coisa?
Ele exalou uma risada irônica. — Meu nome é Xander, na verdade.
— Aquela expressão peculiar em seu rosto relaxou num sorriso torto e
derretido. — Xander Raphael Malebranche.
— É lindo.
Ele riu. — Vou dizer aos meus pais que você disse isso da próxima
vez que os ver.
— Com que frequência isso acontece? — perguntou. — Não falou
muito sobre eles.
Além de sua confissão de que quase matou seus pais por conta de
seu envolvimento com a espiã da Opus Nostrum, Devony poderia ter
assumido que ele não tinha família em sua vida também.
Olhando para ele, parecia tão sozinho quanto ela. Se sua solidão
era autoimposta ou resultado da vergonha que obviamente carregava por
ter sido enganado por uma agente da Opus, ela não sabia.
Tudo que sabia era que ele estava sofrendo por baixo do rosto duro
que mostrava ao mundo.
— Já faz um tempo que não os vejo — disse ele. — Alguns meses,
talvez mais.
— Então, desde que deixou a Ordem?
Ele respirou fundo, afastando-se dela para folhear distraidamente
os arquivos à sua frente. — Sim, acho que sim. Por essa época.
— Seu sobrenome — disse ela, percebendo que era familiar para
ela. — Está me dizendo que é parente de Dante Malebranche?
— Ele é meu pai.
— Sério? — Devony sentou-se em sua cadeira, espantada. — Não
acho que haja alguém dentro ou próximo da JUSTIS que não conheça os
nomes de Lucan Thorne e seus comandantes guerreiros. Seu pai não foi
um dos membros fundadores do complexo original aqui em Boston?
— Não exatamente — disse Rafe, girando para olhá-la novamente.
— Há outros que estão há mais tempo com Lucan do que meu pai. Mas
sim, ele é um guerreiro da Ordem há muito tempo. É um dos
comandantes de distrito agora, liderando o centro de operações e a equipe
de patrulha em Seattle.
— Você parece muito orgulhoso dele.
Ele assentiu com a cabeça. — Sou. Meu pai é um homem
extraordinário, não apenas por causa de seu importante papel na Ordem.
É um dos meus melhores amigos. E um grande exemplo. Minha mãe,
Tess também.
Devony conhecia o sentimento de orgulho que ele descrevia. Sua
família não tinha os altos perfis que os pais de Rafe e alguns dos outros
membros fundadores da Ordem tinham, mas ela também tinha um
imenso orgulho de seus pais. Ela desejava se provar para eles de alguma
forma.
Em vez disso, a mimaram, presa a 7 chaves enquanto crescia
protegida. Quando teve idade suficiente, a empurraram para atividades
seguras como música e dança. Como se esperassem que ela os
desapontasse de alguma forma. Como se ela já o tivesse feito.
— O que seu pai pensa sobre você não fazer mais parte da Ordem,
Rafe?
Ele deu de ombros, desviando. — Não perguntei a ele.
— E sua mãe?
Ele cruzou os braços musculosos sobre o peito e a manteve sob um
olhar severo. — Por que está fazendo tantas perguntas sobre isso?
A postura defensiva dele a pegou de surpresa. Ela balançou a
cabeça. — Sinto muito. Só estava curiosa. Estou apenas tentando
entender.
— Entender o quê?
— Você.
— Por quê?
— Porque quero saber mais sobre você. Porque me importo... com
você.
Ela desviou o olhar e balançou a cabeça novamente. — E porque
não tenho mais pais para conversar, para perguntar o que eles pensam
sobre minhas escolhas ou qualquer outra coisa neste mundo. Só estou
curiosa para saber como é ter pais que são uma constante em sua vida.
Rafe estendeu a mão para ela, atraindo seu olhar para ele com os
dedos descansando suavemente sob o queixo. — Do que está falando?
Sei que está de luto por sua família nos últimos meses, mas parece que
eles se foram há muito mais tempo do que isso.
Ela não tinha a intenção de escavar as suas próprias feridas
psíquicas. O olhar solene e persuasivo de Rafe tirou as palavras dela com
a mesma facilidade que a carícia dele em seu rosto. — Eu estava sozinha
antes mesmo da minha família morrer no atentado de Londres. Meus pais
viviam para a JUSTIS. Assim como o meu irmão. O trabalho deles os
enviava por todo o mundo, o que significava que fui criada por estranhos
durante a maior parte da minha infância. Babás, governantas, internatos
aqui nos Estados Unidos. Me sentia tão só naquela época. Não sabia que
poderia ser possível me sentir ainda mais vazia como eu me sinto agora
que eles realmente se foram. Agora que realmente não tenho mais
ninguém.
— Não — disse Rafe —, isso não está certo. Está enganada sobre
não ter mais nenhuma família. Você é uma daywalker, Devony. Isso
significa que sua mãe também era.
— Sim. Ela nasceu Raça, uma Gen Um que também podia andar à
luz do dia. Seus primeiros anos foram medonhos. Brutais. Ela me contou
que um louco a criou como parte de um programa para fêmeas Raça
geneticamente modificadas.
Rafe assentiu como se soubesse. — Ela foi uma das experiências
de Dragos. Sua mãe, junto com as meias-irmãs que também faziam parte
desse programa antes que a Ordem terminasse com ele.
— Meias-irmãs? — murmurou Devony, seu coração palpitou com
o pensamento de que outras foram submetidas à mesma tortura terrível
que sua mãe sofreu.
— Não sabia que havia outras?
— Não. Nem considerei que poderia haver. Nem minha mãe, tenho
certeza disso. Ela raramente falava daquele período em sua vida, e nunca
que conhecesse outras como ela. — Devony engoliu em seco, um tipo
estranho de esperança ganhando vida em seu peito. — Quantas você
acha que podem existir?
— Eu conheço várias pessoalmente. E a Ordem está trabalhando
para encontrar o resto. Tavia Chase está liderando esse esforço, junto
com Brynne Kirkland. Até o momento do ataque em Londres, Brynne
trabalhava naquela cidade para a JUSTIS.
Devony ficou boquiaberta, mas não conseguiu evitar. — Minha mãe
tinha uma meia-irmã na JUSTIS? No escritório de Londres? Meu Deus.
— Ela sentou-se, sentindo como se um trem tivesse acabado de bater
nela. — Ela nunca soube. Minha mãe ficou encoberta toda sua carreira,
raramente em casa. Durante todo esse tempo, ela tinha uma irmã
morando na mesma cidade, trabalhando na mesma organização?
Rafe assentiu. — O que significa que você tem duas tias – uma
delas aqui em Boston. Também tem um par de primos daywalker, Carys
e Aric Chase. Trabalham com a Ordem agora.
— Meus primos. — Ela mal podia conter a bolha de excitação que
inchava nela. Ou a súbita inundação de incerteza. — Acha que... acha
que eles gostariam de me conhecer?
Ele riu. — Não tenho nenhuma dúvida sobre isso.
— Você vai ajudar? Sei que isso é pedir muito, especialmente
considerando o modo como as coisas estão entre você e a Ordem...
— Farei isso acontecer para você, Devony. O que for preciso, assim
que você estiver pronta.
Sua resposta foi tão sincera, tão resoluta, que não pôde resistir a
envolver seus braços ao redor dele num abraço feroz. — Obrigada.
— Não me agradeça ainda. Não fiz nada ainda.
Ela recuou e apreciou o seu rosto bonito e solene. — Obrigada por
me contar sobre eles. Isso é mais do que suficiente agora. É tudo.
Ele inclinou a cabeça e deu um beijo na boca dela. — Você não está
sozinha, Devony.
— Oh, Deus, quero tanto acreditar nisso. — Ela olhou em seus
olhos penetrantes, observando sua cor oceânica começar a arder com
fogo. Seu olhar parecia uma promessa, uma que ela temia confiar, não
importava o quão desesperadamente ela quisesse.
— Você não está mais sozinha — proferiu, sua voz profunda e crua
de ternura... e desejo.
— Me faça acreditar, Rafe.
Ela o beijou, deixando seus lábios se demorarem contra os dele.
Num grunhido, ele a arrastou do assento para o seu colo, capturando
sua boca num beijo profundo e febril.
No segundo seguinte, ele a ergueu, suas mãos deslizando sob o
traseiro dela enquanto girava e a colocava sobre a mesa de trabalho. Eles
se despiram com mãos impacientes, ansiosos para estarem pele com pele.
Alguns dos papéis e pilhas de arquivos caíram no chão,
instantaneamente ignorados.
Ela mal notou ou se importou.
Não havia espaço para pensamentos de vingança, perda ou dor
quando Rafe a tinha nos braços.
Havia apenas este momento. Apenas esse homem.
E o desejo por ele que parecia se tornar mais exigente, mais
insaciável a cada momento que eles permaneciam juntos.
CAPÍTULO 14
Rafe retornou ao seu apartamento em Southie assim que
anoiteceu.
Precisava de um banho e uma nova muda de roupa. Mais do que
isso, precisava de espaço para pensar e colocar a cabeça no lugar, porque
as horas que passou com Devony começavam a interferir em sua
capacidade de concentração.
Enquanto estava debaixo do chuveiro do banheiro de seu estúdio,
percebeu que não era apenas seu interesse físico em Devony que o
perturbava – embora isso fosse motivo mais do que suficiente para alarme
– era seu interesse pela felicidade dela que era o maior problema.
O que diabos foi aquilo de prometer que a apresentaria à Tavia
Chase e aos gêmeos? Já era ruim o suficiente se tivesse parado aí, mas
também arrastou a ex-agente da JUSTIS Brynne Kirkland, divulgando
seu relacionamento com a Ordem.
Tudo para quê? Para ver o sorriso de Devony? Para dar a ela
alguma ilusão de família depois de ouvi-la confessar que se sentia
invisível ou abandonada?
As cicatrizes da infância dela não eram dele para consertar. Ele não
precisava aliviar sua tristeza, especialmente com informações que não
eram dele para revelar, e promessas que não sabia como cumprir.
Não sem deixar cair o seu disfarce.
Já estava pisando muito perto dessa linha. Compartilhando seus
pensamentos sobre a gangue de Cruz e da Opus. Concordando em fazer
parceria com ela, pelo amor de Deus.
Devia estar fora de si.
Esse não era nem mesmo o pior dos problemas que ele estava se
metendo no que dizia respeito a linda daywalker.
Esteve dentro dela por horas hoje, e tudo que conseguia pensar era
quanto tempo antes que pudesse tê-la novamente.
Se não soubesse melhor, se perguntaria se Devony Winters
também não tinha um pouco do dom sedutor que a venenosa da Opus
usou nele em Montreal. Mas onde ele ficara cego pela hipnotizante Iona
Lynch, pela manipulação psíquica de seus sentimentos e da sua atração
por ela, o domínio que Devony tinha sobre ele era algo mais profundo.
Muito mais poderoso porque era real.
Ela era real.
Imperfeita. Não dócil e mansa, mas ousada, até mesmo combativa
às vezes. Devony não era a jovem indefesa que precisava ser mimada e
protegida como a sereia que o persuadiu a pensar que era o que ele
queria.
Ela era forte e capaz, o que tornava os raros vislumbres de sua
vulnerabilidade ainda mais autênticos. Suas confissões emocionais
foram ainda mais impactantes porque ela confiou nele o suficiente para
deixá-lo ver que havia rachaduras escondidas em sua armadura.
Isso o fez se sentir ainda mais protetor com ela, e esse era um
território perigoso quando seus sentimentos em relação a ela eram suaves
o suficiente.
Uma vergonha que seus sentimentos eram a única coisa suave
quando estava perto dela.
Ele tentou na maior parte do dia manter uma distância saudável.
Ficar preso dentro de seu Darkhaven durante as horas do dia foi uma
tortura quando também significava não escapar de sua excitação.
Sentado ao lado dela, agachado sobre anotações e arquivos de
reconhecimento, havia se provado um exercício de autocontrole, um que
mal havia passado.
Enquanto trabalhava diligentemente para estudar e analisar as
informações que o ajudariam em sua missão, seus sentidos estavam fixos
exclusivamente nela. O calor tentador de seu corpo ao lado dele. O aroma
inebriante de sua pele. A voz sexy e suave. A maneira curiosa e perspicaz
que o olhar cor de Bourbon parecia penetrar diretamente em sua alma.
Ela também o queria.
Ele sentiu a aceleração de seu pulso enquanto trabalhavam juntos
na sala de guerra. Ouviu o rápido pulsar de seu batimento cardíaco ao
lado dele na mesa, e fez tudo que podia para bloquear o som sedutor.
Cada vez que se aventurava a olhá-la, seu olhar era atraído para a
bonita depressão abaixo da garganta, onde aquele pulsar constante
assinalava tão perto da superfície de sua pele.
Suas presas responderam até mesmo agora, os pontos cavando em
sua língua.
Não fazia muito tempo desde que se alimentou pela última vez,
então sabia que não podia culpar sua sede pela simples falta de sustento.
Não podia culpar a biologia básica por nada do que sentia por ela.
Nem mesmo o modo como seu pênis despertava pelo pensamento dela
agora, apesar do fato de que mal se deu um descanso desde que entrou
na casa de Devony na noite anterior.
Com um gemido frustrado, girou a torneira até a zona fria e deixou
a água gelada encharcá-lo.
Não ajudou muito. Quando finalmente saiu para pegar a toalha,
tudo que fez foi adicionar congelamento e irritação ao seu mau humor.
Não esperava que seu check-in com a Ordem fosse uma melhoria
nessa frente, mas precisava atualizá-los. Só podia imaginar o que seus
comandantes pensavam agora que tiveram a chance de conversar com
Nathan e ouvir sobre o quase desastre no museu.
Colocando um par de jeans, Rafe foi até a estação de trabalho do
computador e iniciou o link do vídeo. Esperava encontrar Gideon do outro
extremo da ligação.
Em vez disso, era Lucan.
— Senhor — cumprimentou Rafe com um aceno de respeito.
— Espero que esteja ligando com boas notícias.
Não achava que ficar nu com Devony Winters se qualificaria como
tal para o líder da Ordem. Por outro lado, também não era exatamente
uma boa notícia que tenha participado de um assalto a um cofre com
obras de arte de valores incalculáveis.
Ele provavelmente devia começar com o aspecto menos fodido da
missão até agora.
— Estou com a gangue. Cruz e eu não seremos melhores amigos,
mas acho que ele confia em mim. Fala-se de algo grande em breve. Vou
me certificar de que participarei. Estou confiante de que encontramos
uma conexão sólida com LaSalle, que eventualmente nos levará a alguém
da Opus.
Lucan grunhiu. — Fico feliz em ouvir isso. Depois daquele show de
merda no MBA, tive as minhas dúvidas.
— Sim, sobre isso — disse Rafe. — Como está Jordana?
— Ela está bem. Um pouco abalada, mas isso é compreensível,
considerando as circunstâncias.
— E Nathan?
Lucan arqueou uma sobrancelha negra. — Fervendo, e falo quase
literalmente. Estava pronto para matá-lo, mesmo após Chase informá-lo
que você está disfarçado e opera com o apoio total da Ordem.
— Então, ele sabe agora — assentiu Rafe. — Como recebeu essa
notícia?
— Conhece o capitão de sua equipe, ele é uma máquina sem
emoção na maior parte do tempo. Nenhum choque, dada a maneira como
foi criado no programa Hunter. Nathan pode não ter dito muito, mas sei
que ficou aliviado. Isso não quer dizer que você não terá que responder a
ele sobre o que aconteceu naquele museu.
Rafe franziu a testa. — Não sabia que Jordana estaria lá. Inferno,
nem sabia sobre o assalto até que estava na van com Cruz e o resto da
gangue.
Lucan assentiu. — Eles tiveram que testar você.
— Isso mesmo. Se eu pensasse que havia alguma chance de que
Jordana ou Carys estivessem em perigo, eu abortaria a missão.
— Eu sei, filho. Quando tudo isso acabar, você terá que convencer
Nathan disso.
Rafe deu boas-vindas à chance. Tinha muitas pontes para
reconstruir do outro lado de sua missão. Agora, também precisava
adicionar o nome de Devony a essa lista.
— Vai me contar sobre a mulher? — O olhar cinzento de Lucan o
perfurou. — Nathan e Jordana contaram uma grande história no relatório
deles. Disseram que ela é Raça. Essa daywalker, ela é a mulher que você
relatou no outro dia, a que você disse que chamam de Brinks?
— O nome dela é Devony — disse Rafe. — Devony Winters. O pai
dela é...
— Ah, Cristo. Roland Winters — murmurou Lucan, sua carranca
se aprofundando. — Por que só agora estou ouvindo que a maldita filha
de um diretor da JUSTIS está envolvida nisso?
— Só descobri o nome dela ontem à noite, senhor.
— Ela está fodendo Cruz?
— Inferno, não. — A resposta de Rafe saiu mais afiada e mais
defensiva do que pretendia. — Devony não faz parte da gangue de Cruz.
Está trabalhando em sua própria missão, está infiltrada na gangue há
alguns meses.
— Infiltrada — disse ele, a suspeita franzindo a sua testa. — Quer
dizer como uma agente secreta da JUSTIS?
— Não. Ela é uma civil, Lucan. Na verdade, até o atentado em
Londres que matou seus pais e irmão, Devony era um estudante de
música aqui em Boston. Ela tem tentado localizar os responsáveis pelo
ataque ao escritório da JUSTIS. Está procurando pela Opus, assim como
nós. Ela quer vê-los destruídos por causa do que fizeram com sua família.
— Filha da puta. — Na outra extremidade do vídeo, o líder da
Ordem sentou-se em sua grande cadeira. Ele balançou a cabeça
lentamente. — Não podemos ter isso, Rafe. Ela entrará no nosso
caminho. Inferno, ela já está. Precisamos contê-la. Vou pedir ao Chase
para cuidar...
— Lucan. — Rafe não sabia o que podia dizer, como explicar que
Devony realmente provou ser uma ajuda, não um obstáculo, para a
missão dele. Não havia nada que pudesse dizer. Precisava mostrar a ele.
— Espere por um minuto. Vou carregar algumas informações.
Ele pegou o telefone e enviou algumas das fotos que tirou da sala
de guerra de Devony e as anotações manuscritas que o pai dela havia
deixado. Então esperou, observando enquanto Lucan revisava as
informações em ilegível silêncio.
— Esse é apenas o começo das informações que ela coletou nos
últimos meses. Os registros foram montados por Roland Winters há cerca
de um ano. Ele os manteve escondidos num cofre no Darkhaven da
família em Back Bay. Devony acha que ele não contou a ninguém sobre
eles, incluindo seus colegas da JUSTIS.
— Ela ofereceu toda esta informação para você?
— Sim, senhor.
— Isso foi antes ou depois que ela drenou o poder de Jordana e
bateu em um de nossos guerreiros mais letais e o deixou nocauteado por
mais de uma hora dentro daquele museu?
Rafe pigarreou. — Depois. Devony tem a capacidade de sugar a
habilidade de outra pessoa e usá-la. Mas isso custa a ela. Ela estava fraca
e com muitas dores depois. Eu a ajudei. Eu a segui até a casa dela mais
tarde e ela acabou me contando tudo.
No que diz respeito a relatórios de campo, o dele estava sutil nos
detalhes daquela noite. Ele não achava que a descrição detalhada faria
Lucan mais feliz. Não que o astuto Gen Um precisasse que ele colorisse
tudo. Pelo olhar sombrio em seu rosto, era óbvio que entendia exatamente
o que Rafe não estava dizendo.
— Ela sabe sobre sua missão para a Ordem?
— Não. Essa parte do meu disfarce está intacto. Até onde ela sabe,
quero acabar com a Opus por minhas próprias razões.
Lucan grunhiu. — Não acho que isso esteja muito longe da verdade.
— Não, senhor. Sabe que eu quero me redimir. Nunca fiz segredo
disso. Mas minha lealdade é com a Ordem. Não vou te decepcionar
novamente.
— Você não nos decepcionou em Montreal, Rafe. Isso é um fardo
que colocou em seus próprios ombros. — Lucan o estudou por um longo
momento, as sobrancelhas franzidas sobre o olhar atento. — Esta é sua
missão, Rafe. Contanto que não comprometa seu disfarce com ela, eu
deixarei você decidir o quanto essa fêmea será envolvida. Mas entenda,
isso significa que você viverá com os resultados.
— Sim, senhor.
— Então, o que você recomenda que façamos sobre Devony
Winters?
Rafe sabia que tudo que precisaria era uma palavra e Lucan
garantiria que ela fosse colocada sob proteção da Ordem em algum lugar
fora do alcance da Opus ou de qualquer um em seu círculo. Ela estaria
segura. Estaria fora do seu caminho, em algum lugar que não precisaria
pensar sobre a possibilidade dela se machucar ou distraí-lo de seu
objetivo.
Mas todas essas coisas teriam um preço.
E por mais que quisesse pensar que sua parceria não era real, o
guerreiro nele reconheceu que não encontraria um aliado mais forte
nessa busca.
— Devony fica. Ela é minha para cuidar.
Lucan deu-lhe um aceno grave. — Tudo bem, filho. Ela é sua.
Enquanto falava, um sinal sonoro disparou num dos aparelhos em
sua mesa. Ele olhou para ele e fez uma careta, um olhar de verdadeira
preocupação em seu rosto. Sua maldição baixa e sussurrada falava
muito.
— Há algo de errado, senhor?
Ele começou a sacudir a cabeça, então lentamente exalou e
encontrou o olhar de Rafe através do monitor. — Estamos lidando com
um problema na Europa nos últimos dias. Isso diz respeito à equipe que
está fazendo algumas operações secretas perto de Budapeste.
— A equipe de Micah — disse Rafe. Ele se recordou que outro dos
anciãos da Ordem, Tegan, havia acabado de voltar recentemente daquela
região onde seu filho foi destacado. — O que está acontecendo?
Lucan deu-lhe um olhar sóbrio. — A equipe de Micah desapareceu
dias atrás.
Santo inferno. Rafe sentiu uma pontada de preocupação, até
mesmo de pavor, por um de seus amigos mais íntimos. — Quer dizer que
eles estão MIA4?
— Não estamos prontos para chamar disso ainda.
Mas não precisava. Rafe podia ver a verdade na expressão sombria
de Lucan. Não era de admirar que ele, Chase e Gideon tivessem ladrado
para ele na outra noite por ter se reportado tarde. Não era sempre que a
Ordem precisava lidar com a perda de um de seus membros, quanto mais
uma equipe inteira que incluía um membro da família.
— Vá cuidar dos seus assuntos, filho. Assim que tiver algo sólido
para seguir em frente, me avise. Vamos cuidar desse assunto. Serei
amaldiçoado antes de aceitar a alternativa.

4 Missing in Action – Perdido em Missão


CAPÍTULO 15
Rafe entrou no Asylum por volta das nove horas da noite e foi para
as mesas de sinuca na parte de trás, onde a mensagem de Cruz o havia
orientado a ir.
A gangue parecia estar lá por um tempo, já instalada numa das
banquetas distantes com uma rodada de cervejas consumidas pela
metade e um jogo Bola Oito5 quase concluído na mesa de sinuca.
Devony também estava com eles, vestindo aquele casaco de
motoqueiro de couro preto e um jeans escuro e botas de salto alto que
faziam as pernas dela parecerem intermináveis. Agora, a visão dela com
sua blusa de gola alta e de mangas compridas o deixava tão duro quanto
se a visse ali de lingerie de renda. Principalmente porque ele não tinha
necessidade de imaginar o que ela escondia sob todas as roupas que
escondiam tudo
Ele havia tocado cada centímetro dela.
Provado todas as curvas doces e fendas.

5 O Bola Oito utiliza 16 bolas, sendo uma banca e as demais coloridas. A finalidade é
acertar com a bola branca as demais bolas coloridas e colocá-las na caçapa. Existem
dois grupos de bolas, sendo o primeiro numerado de 1 a 7 (bolas lisas) e o segundo de
9 a 15 (bolas listradas). Cada jogador fica com um grupo, sendo a bola de número 8
(bola preta) a última a ser encaçapada.
Ela encontrou seu olhar através da taverna e ele sentiu isso tão
poderosamente como se ela tivesse envolvido a mão em torno de seu
pênis.
Um sorriso discreto inclinou seus lábios antes de abruptamente
desviar o olhar – e não antes dele vislumbrar o leve brilho de faíscas
âmbar dançando em seus olhos.
Seu próprio olhar crepitou com calor também. Ele mascarou isto
com bravata, passando pelas mesas do bar e ignorando os olhares
sedutores e sussurros femininos que seguiram em sua esteira. Não dava
a mínima para nenhuma das candidatas a anfitriãs de sangue ou outras
mulheres que tentavam a chamar sua atenção.
Havia apenas uma mulher no local que despertava o seu interesse.
Aquela que fazia o possível para fingir que ele não existia quando se
aproximou e bateu os punhos com os caras ao redor da mesa de sinuca.
Fish ostentava um novo relógio chamativo em seu pulso. Ocho e
Axel estavam vestidos com camisas de grife espalhafatosas que Rafe
achava que deviam ter vindo da Coleção de Outono para idiotas. Cruz
optou por uma exibição menos evidente de seu recente ganho, mas Rafe
não perdeu o anel de diamante rosa cintilando em sua mão esquerda.
— Alguém esteve fazendo algumas compras, eu vejo.
Fish sorriu, estendendo o braço para mostrar o novo acessório. —
Custou vinte e cinco mil, mas não é elegante?
Rafe entrou no jogo, assentindo como se estivesse impressionado.
— Bonito.
— Já estou de olho em uma atualização assim que recebermos do
nosso próximo trabalho.
— Sim? — Sua curiosidade despertou, ele olhou para Cruz. — Soa
como algo grande.
— É — ainda ofereceu Fish, mantendo a voz num nível
conspiratório, apesar da música abafar a maior parte da conversa no
local. — Há semanas estamos aguardando esse trabalho, apenas
esperando o sinal para agir. Certo, Cruz?
Rafe esperava que não demorasse muito para ouvir algo sobre o
trabalho que Devony o alertara. Com base no olhar cauteloso do líder da
gangue quando se afastou de Fish, parecia que ele estava com sorte.
— Estou intrigado — disse ele à Cruz. — No entanto, se você puder
me usar nisso, conte comigo.
Um aceno de cabeça curto. — Vamos terminar este jogo, ou o quê?
Voltaram para seus lugares ao redor da mesa de sinuca. Rafe ficou
atrás, observando Axel dar a sua tacada. Ele encaçapou algumas bolas
listradas para Fish e para si mesmo antes de perder a sua vez para
Devony no time adversário com Ocho.
Agradecido ao fodido sistema de som alto e a audição humana
medíocre, porque não havia como conter o baixo e possessivo rosnado
animal que saía da garganta de Rafe enquanto a observava agarrar o
longo taco e se curvar sobre a borda da mesa na frente dele para dar a
sua tacada.
Ela estava envolvida com o jogo, não fazendo nada de propósito
para fazê-lo se contorcer, mas, porra, se ele conseguia se impedir de ficar
com uma ereção. Por trás da linha plana de seus lábios, ele apertou seus
molares e lutou para impedir que suas presas saíssem de suas gengivas.
Faíscas dançaram em seu campo de visão quando ela mudou a postura
sobre as botas de salto alto e bateu com o seu taco.
Bolas se chocaram uma contra a outra, seguidas pelo som da bola
vermelha caindo na caçapa que ela havia escolhido. Axel e Fish gemeram,
percebendo que estavam quase derrotados agora que ela tinha o controle
da mesa.
— Impressionante — murmurou Rafe quando ela passou por ele
em seu caminho para preparar a próxima tacada. E ele não falava sobre
a sua precisão.
Ela deu a ele um sorrisinho particular. — Está disposto a pôr-me
à prova? Assim que eu limpar aqui, ficarei feliz em jogar uma partida com
você também.
Ele arqueou uma sobrancelha. — Isso poderia ser interessante.
— Muito. — Ela continuou andando, indo suavemente para o outro
lado da mesa.
Com a ereção esticada atrás do zíper, Rafe puxou o seu casaco para
baixo e encostou as costas na parede para assistir às últimas rodadas do
jogo.
Cruz sinalizou para uma garçonete e pediu outra rodada de cerveja
para o grupo. Então passeou com sua caneca quase vazia na mão. Olhou
para a mesa de sinuca por um momento antes de se sentar ao lado de
Rafe.
— Parece que Brinks está começando a gostar de você.
— Pensa assim? — Rafe encolheu os ombros. Ele sabia que a
conversa deles havia ficado fora do alcance do homem, mas não podia
fingir indiferença quando se tratava de um nocaute como Devony e
esperava ser acreditado. — Ela não é difícil de olhar, né? Quero dizer,
apesar de toda a rudeza da sua atitude.
Cruz riu. — Quando uma cadela parece tão boa quanto ela, quem
se importa com a atitude? No final, todas fodem do mesmo jeito. Algumas
como ela só precisam ser esbofeteadas por algum tempo primeiro,
mostrar a elas quem está realmente no comando.
Rafe sentiu o lábio se curvar para trás, um sorriso que estava longe
de ser amigável.
Não que o líder da gangue tenha notado a diferença. Ele relaxou ao
lado dele e bebeu o resto da cerveja. — Então, você perguntou sobre o
show que estamos planejando.
Rafe deu um breve aceno de cabeça, ainda incapaz de responder,
quando o desprezo pelo homem fez as suas presas cortarem a sua língua.
Foi preciso um esforço hercúleo para conter sua natureza Raça e manter
os punhos afastados do rosto feio de Cruz enquanto o cara continuava
falando.
— Como Fish disse, sabíamos que estava no caminho por algum
tempo. Sei de fonte segura que tudo está quase no lugar.
— Fonte segura, significando LaSalle? — Dificilmente uma
necessidade de perguntar, e o olhar fixo de Cruz era confirmação
suficiente. — Que tipo de trabalho estamos falando?
— Coleta de mercadorias — disse ele. — As mercadorias estão em
movimento enquanto falamos, vindo do exterior para o Terminal Conley.
Devem chegar amanhã à noite. Os agentes alfandegários já foram pagos
e farão vista grossa, então tudo que precisamos fazer é estar lá para
interceptar as mercadorias e redirecioná-las para o nosso cliente.
— Interceptar e redirecionar. Significando que vamos roubá-las. —
Rafe franziu a testa. — Roubá-las de quem? Quais são as mercadorias
que vamos pegar?
— Você não precisa se preocupar com isso. Também não precisa se
preocupar sobre onde recebemos nossos pedidos. Você será pago pelos
seus músculos e suas outras habilidades Raça, isso é tudo.
Rafe grunhiu, estava a cerca de dois segundos de dar um soco no
seu rosto zombeteiro. — De quanto estamos falando sobre este trabalho?
— Três quartos de milhão. Dividido em cinco partes.
— Não quer dizer seis partes?
Ele balançou a cabeça. — Quero dizer cinco. Não precisamos dos
dons de Brinks neste trabalho. — Os lábios finos do líder da gangue se
achataram num sorriso frio dentro de seu cavanhaque. — Agora que
temos você para nos colocar em qualquer lugar que precisamos ir, não
precisamos mais dela.
Merda. Ele não gostava da ideia de Devony se misturando com
criminosos como estes, mas não estava pronto para perder sua única
aliada. Ela também não ia gostar de nada disso.
— Vamos nos encontrar no Ocho amanhã à noite e sair de lá —
disse Cruz. — Vou lhe enviar uma mensagem assim que souber que
estamos liberados.
Rafe assentiu, mas sua atenção estava em outro lugar. Ele olhou
sorrateiramente para Devony, bem a tempo de vê-la bater na bola oito e
colocá-la na caçapa do canto para a vitória. Com Ocho gritando por causa
da sua vitória, enquanto Fish e Axel se apressavam para montar outro
jogo para uma revanche, Devony murmurou que havia cansado de jogar
e ia ao bar pegar algo mais forte do que cerveja.
Rafe observou-a atravessar o bar. Seus passos estavam rápidos e
decididos, mas ele a conhecia bem o suficiente para perceber quando
estava chateada. Não, ela estava completamente furiosa. Ele não tinha
dúvidas de que ela ouviu cada palavra que Cruz disse.
Contornando o bar, ela se dirigiu para o curto corredor em direção
aos banheiros.
Outra rodada de cerveja chegou para a gangue quando Cruz foi até
a mesa de sinuca para se juntar a Ocho contra a outra dupla.
Rafe bateu no ombro de Cruz como se fossem velhos amigos. —
Voltarei em alguns minutos. Toda essa bebida está me deixando com
sede, e há uma loirinha gostosa naquela mesa lá atrás, que parece
ansiosa para me ajudar.
A gangue deu uma gargalhada. Rafe os deixou e se aproximou de
uma das fêmeas humanas que o despia com os olhos desde que ele
entrou. Ela não conseguiu sair da cadeira rápido o suficiente quando ele
enrolou o dedo para ela em convite.
Envolvendo o braço em torno de seus ombros ossudos, ele a
conduziu pelo bar até o corredor onde Devony havia desaparecido há
pouco tempo.
Um pequeno grupo de mulheres estava conversando e aplicando
maquiagem no apertado banheiro feminino quando Rafe entrou.
— Fora — ordenou ele num grunhido, suas presas à mostra. Elas
fugiram de uma vez. Mentalmente ele trancou a porta e a segurou lá.
Então se virou para a mulher olhando para ele com os olhos cheios
de luxúria debaixo do seu braço. Ele colocou a mão na testa dela. —
Durma.
Ela caiu num transe imediato que não passaria até que ele
quisesse.
Rafe a levou até a maior das três cabines vazias e sentou seu corpo
mole no vaso sanitário.
Apenas uma cabine estava com a porta fechada. Devony abriu a
porta. Ela ficou ali, completamente vestida e furiosa, com os pés
afastados, braços cruzados sobre os seios e os olhos em âmbar ardendo
com a sua indignação.
— Ele acha que pode me ferrar? — As pontas de suas presas
brilhavam a cada palavra. — Ele me chamou de cadela que pode precisar
ser um pouco esbofeteada? Não tem ideia do que eu poderia fazer com
ele. Quero matar aquele bastardo viscoso com minhas próprias mãos
agora.
Não era de se admirar que ela praticamente correu para o banheiro.
Estava tão chateada que não havia como esconder sua verdadeira
natureza em público.
E, maldição, se ela não era ainda mais bonita quando estava
rosnando como uma Valquíria.
Do lado de fora da porta do banheiro, ouviu-se o som de vozes
femininas. Alguém tentou abrir a porta, mas não conseguiu. Rafe ainda
a mantinha fechada com a sua mente.
— Fora de serviço — rosnou ele, e a interrupção indesejada foi
embora.
Ele voltou ao problema mais imediato da raiva justificada de
Devony. — Cruz é um idiota. Acha que não quero estacionar meu punho
em seu peito agora? Infelizmente, precisamos dele. Precisamos dele e de
Judah LaSalle vivos e bem até que possamos estabelecer se existe uma
ligação entre eles e a Opus. Estamos chegando perto. Esse grande
trabalho pode ser o que nos levará até lá.
Nada do que disse pareceu esfriar a fúria dela. Suas presas
encheram sua boca, pontas de navalhas tão brilhantes e afiadas como
diamantes. Suas pupilas eram finas fendas verticais, cercadas por luz
derretida. Rafe não podia ver seus dermaglifos, mas sabia que as marcas
na pele estariam nítidas sob a gola e a calça jeans.
Desde que ele era um macho Raça com sangue vermelho fluindo
em suas veias, era impossível não tirar um momento para apreciar a
glória sobrenatural da transformação de Devony. Como mulher, ela era
deslumbrante. Como fêmea Raça ultrajada e indomável, era magnífica.
Ah, Cristo. Ela estava malditamente sensual, e o que ele queria
fazer mais do que qualquer outra coisa agora era sentir o corpo dela
esmagado contra o dele. Queria esfriar a sua raiva alimentando um tipo
diferente de fogo nela.
Mas então ela estreitou seu olhar furioso sobre ele.
— Aposto que está feliz por Cruz me querer fora, não é? — Ela deu
um passo a frente, saindo da cabine e fechando a curta distância entre
eles. — Você me queria fora do seu caminho desde o minuto que
apareceu. Agora conseguiu. Parabéns.
— Isso não é verdade.
Por cima de seu olhar ardente, uma das sobrancelhas se ergueu
em desafio.
Rafe amaldiçoou e tentou novamente. — Tudo bem, era verdade.
Tudo é diferente agora. Somos uma equipe, Devony.
— Ok, então volte lá e diga a Cruz que você me quer nesse trabalho
amanhã à noite.
— Se eu fizer isso, isso só vai deixá-lo desconfiado. Você sabe disso.
Ele acha que você é humana. Precisamos que ele continue acreditando
nisso até que isso termine. Se dermos a ele qualquer motivo para ficar
nervoso, avisará o LaSalle e nós recomeçaremos tudo. — Rafe acariciou
o rosto dela. — O trabalho de amanhã não é tão importante quanto as
informações que podemos tirar dele. E prometo compartilhar com você.
Parceiros, lembra?
Sua respiração desacelerou de seu galope furioso de um momento
atrás. Ela segurou o olhar dele, a testa ainda franzida enquanto
considerava tudo o que ele dizia.
Rafe não pôde resistir a escovar os seus lábios nos dela. — Você
tem alguma ideia de como é linda? Estive de pé por aí com uma furiosa
ereção desde que entrei e vi você novamente. Mas agora? — Ele soltou
um suspiro baixo e balançou a cabeça. — Agora, não acho que poderia
manter minhas mãos longe de você mesmo se Cruz e todo mundo na
porra deste lugar tentassem derrubar aquela porta.
— Isso aguentaria?
Sua pergunta atrevida foi direto para a sua ereção. — Vou me
certificar de que isso aconteça.
Aproximando-se dele, Devony gesticulou para a cabine onde a loira
em transe roncava baixinho. — E quanto a ela?
— Os caras assumem que estou em algum lugar tomando da veia
dela. Ela ficará fora até eu acordá-la.
Devony fez um som de ronronar enquanto suas mãos entravam no
cabelo dele. — Quer ouvir um segredo? Estava esperando que você me
seguisse até aqui. Porque desde que você entrou neste bar esta noite,
tudo em que consigo pensar é quanto tempo eu teria que esperar para te
sentir dentro de mim novamente.
— Ah, foda-se. — A respiração de Rafe saiu dele, crua e áspera. —
Não deixarei nenhum de nós esperar outro maldito segundo.
Ele esmagou a boca contra a dela. Segurando-a, girou com ela,
puxando-a para longe das cabines e os movendo para o centro do
pequeno espaço em frente às pias. Suas mãos se moviam avidamente,
freneticamente. Os zíperes se abriram. Calças jeans esfolavam a pele
quando eram apressadamente empurradas para baixo dos quadris um
do outro.
Rafe estava duro como pedra no aperto febril de Devony. Num
gemido, ele deslizou os dedos na fenda do sexo dela. Seda líquida e quente
encharcava sua carne delicada, deixando suas dobras escorregadias. Os
quadris dele bombearam em reflexo pela sensação de toda aquela
umidade aveludada, sua ereção maciça e desenfreada em torno da mão
dela.
Ele deslizou um dedo dentro do aperto de seu corpo. — Você está
tão suave aqui, baby. Tão pronta para mim.
— Sim. — A palavra ferveu entre os seus lábios entreabertos. Ela
jogou a cabeça para trás com um silvo, os tendões em seu gracioso
pescoço estavam esticados enquanto se apoiava contra a mão dele.
Músculos minúsculos ondularam ao longo de seus dedos enquanto ele
acariciava dentro dela. — Oh Deus, Rafe. Preciso de você. Preciso disso.
Agora mesmo.
A resposta dele foi um rosnado feroz. Ele também precisava dela.
Ele precisava de tudo com ela.
— Vire-se — proferiu ele, sua voz áspera e crua.
Ele a girou na frente dele, inclinando-a com a palma da mão contra
as costas dela. Ela segurou a pia, sua bunda doce empurrada na direção
dele em convite. Ele acariciou as ondas redondas, usando as duas mãos
para espalhá-la. Seu corpo brilhava; corado, rosa escuro e tão bonito.
Ele provocou sua costura sedosa com a cabeça de seu pênis, em
seguida, afundou dentro dela com um impulso longo e lento que fez seus
molares cerrarem tão apertados que foi um milagre que não tivessem
quebrado.
Ela gemeu e se moveu contra ele, estimulando-o a um ritmo mais
selvagem. Eles se mexeram juntos, se renderam ao calor e à força do
desejo. Rafe precisava das suas mãos na pele dela, precisava ver o jogo
de cores nos glifos enquanto entrava nela. Ele passou as palmas das
mãos por debaixo da camisa de gola alta, expondo as lindas costas ao
seu olhar resplandecente. A pele dela ondulava com cores vivas. Ele
traçou os dedos sobre os floreios, seguindo até a diminuta marca de
nascença de lágrima e lua crescente que ficava no ombro direito.
Suas presas pulsaram pela necessidade de segurá-la enquanto ela
se balançava embaixo dele. Queria marcá-la, reivindicá-la, ligá-la a ele
como sua.
Porra.
Só o pensamento deveria tê-lo abalado. Isso malditamente não
deveria ter feito seu sangue correr mais rápido, com mais força em suas
veias. Não deveria ter intensificado seu desejo por ela. Não deveria tê-lo
feito ansiar por algo que não merecia – e não faria – enquanto sua vida
pertencesse à sua missão pela Ordem.
Rafe encontrou seu olhar em chamas no espelho desbotado. Que
Deus o ajude, mas ele viu a mesma fome proibida nos olhos dela. As
presas dela estavam longas e afiadas atrás dos lábios entreabertos, os
olhos passando rapidamente para onde o pulso dele martelava
visivelmente em sua garganta.
Ele mal reconheceu o grunhido possessivo que vibrou através dele
naquele momento. Não queria reconhecer o que estava sentindo.
Não era apenas luxúria e prazer esmagador, embora sentisse isso
até a medula. Não, o que ele sentia era ainda mais poderoso do que isso
enquanto observava o belo rosto de Devony e sentia o corpo dela se
despedaçar ao redor dele num orgasmo feroz.
Minha.
A palavra o acertou quando explodiu profundamente dentro dela.
Minha.
Era uma palavra perigosa. Uma que permaneceu com ele, tão
constante quanto seu próprio batimento cardíaco, mesmo após se
arrumarem apressadamente e ele mandar Devony sair antes dele.
Com a mulher que estava em transe agora acordada e sua maleável
mente humana preenchida com a sugestão de que ele acabava de mostrar
a ela o melhor momento da sua vida, Rafe voltou ao bar lotado e deixou
a loira na mesa com suas amigas sorridentes.
Então, ele se dirigiu para a parte de trás do Asylum, onde a gangue,
e a realidade de sua missão, esperavam.
CAPÍTULO 16
O armazém particular perto do Terminal Conley parecia ter sido
uma relíquia há cerca de vinte anos. Com marcas de ferrugem,
dilapidado, a estrutura de aço e tijolo poderia parecer abandonada para
os seus vizinhos se não fosse pela presença de segurança óbvia apenas
dentro da porta da frente.
Rafe e o resto da gangue se posicionaram a alguns quarteirões de
distância num caminhão de entregas sem identificação que Ocho
conseguiu com um dos seus muitos colegas questionáveis. Fish e Axel
estavam vestidos com uniformes de autoridade portuária roubados. Toda
a gangue estava armada com semiautomáticas, incluindo Rafe.
Cruz segurava um binóculo compacto diante do rosto enquanto
espiava o armazém. — Na mudança do turno da meia-noite. Todos sabem
o que fazer. Assim que os outros guardas se forem, vamos entrar.
Eles revisaram o plano esta noite mais cedo na garagem de Ocho.
Segundo Cruz, LaSalle garantiu que o trabalho deveria ser simples.
Conseguir acesso ao armazém. Pegar os caixotes de mercadorias recém-
chegados do exterior. Entregá-los no local combinado. Receber o gordo
pagamento.
Rafe executou muitas patrulhas de limpeza com seus colegas de
equipe da Ordem para saber que criminosos gananciosos como esses
tendiam a ficar desleixados quando alguém acenava com cifrões
suficientes na frente deles. Ele não esperava que o trabalho esta noite
fosse tão simples quanto Cruz afirmava. E apesar de Devony ainda estar
com raiva de ser excluída, ele estava feliz por não ter que temer que nada
acontecesse com ela durante este esquema descuidado.
Eles concordaram em manter distância depois do encontro no
Asylum na noite anterior. Rafe foi para sua casa em Southie e ficou lá até
se encontrar com a gangue. Ela concordou em ficar no Darkhaven e
aguardar notícias dele quando o trabalho terminasse.
Como prometido, enviou a ela os detalhes que conhecia, incluindo
o local do armazém e o local da entrega. Se as coisas acontecessem como
ele planejou, esperava chegar perto o suficiente de Judah LaSalle para
hipnotizar o bastardo e extrair tudo o que ele pudesse saber sobre a Opus
Nostrum.
Quanto mais cedo ele tivesse essa informação, mais cedo poderia
continuar com a tarefa de eliminar a organização do mapa.
Então teria tempo para refletir sobre o que Devony Winters estava
se tornando para ele, e se esses sentimentos tinham alguma chance de
serem retribuídos.
— Ok — anunciou Cruz. — Novos guardas estão dentro... e lá estão
os antigos virando a esquina. Hora de se mexer. Vamos, Ocho.
O caminhão entrou em movimento. Ocho o conduziu até a frente
do armazém e Rafe saltou atrás de Fish e Axel. Como fizeram no MBA, os
dois homens proporcionaram uma distração momentânea, enquanto
Rafe entrou em ação, deixando os guardas inconscientes.
Cruz e Ocho entraram logo atrás deles, com pés de cabra nas mãos.
Eles localizaram os caixotes selados que procuravam e os abriram
rapidamente. Um por um, os homens começaram a descarregar caixotes
menores num carrinho com rodas.
Rafe não estava encarregado de lidar com a mercadoria, não que se
importasse. Esta noite, ele estava relegado a vigia e solucionador de
problemas. Ficou olhando enquanto os homens alternavam entre
carregar o carrinho e levá-lo ao caminhão.
— Mais rápido — ordenou Cruz aos outros, patrulhando como um
general. — Vamos, vamos! Fiquem atentos.
Rafe conversou com Fish à parte. — Ei, fale comigo. De quem é a
merda que estamos roubando esta noite?
— Não sei, cara — respondeu Fish num sussurro baixo. — Algum
tipo de traficante de armas, de acordo com Ocho. O LaSalle tem amigos
que estão dispostos a pagar qualquer coisa para colocar as mãos no que
está nessas caixas.
Cruz olhou para Rafe com cautela, um olhar estranhamente
presunçoso em seus olhos quando Fish e Axel voltaram para outra carga.
Rafe não gostou do olhar que o líder da gangue tinha no rosto. Não gostou
da sensação de que era de alguma forma uma piada não dita.
— Algo engraçado, Cruz?
Ele encolheu os ombros. — Não estou rindo, cara.
— Nem eu — disse Rafe. — O que diabos está acontecendo? O que
estamos tirando da...
O som de um veículo se aproximando do lado de fora do armazém
chamou a sua atenção. Uma porta de carro se abriu. Um par de botas
bateu contra o concreto.
Os guardas que saíram há alguns minutos voltaram
inesperadamente. Um deles checou dentro do depósito. — Ei, Jansen.
Sou só eu. Esqueci aquele maldito cartão de aniversário para a minha
esposa.
Ele andou mais longe. — Ei, sabe que há um caminhão alugado
parado do lado de fora? Meeks e eu acabamos de enviar uma mensagem
para o chefe para ver se ele havia enviado alguém para aquele novo
carregamento... Jansen?
Rafe ficou na frente dele, movendo-se através do armazém num
piscar de olhos. Espalmando a testa careca do homem antes que ele
tivesse chance de expressar sua surpresa, Rafe colocou o guarda num
transe imediato.
Mas não foi o último dos seus problemas.
O parceiro do guarda circulou até a parte de trás do armazém para
um ataque furtivo. Seu comando para Cruz e os outros homens para que
ficassem parados foi respondido por uma chuva de tiros da gangue. Ele
uivou bruscamente e devolveu o fogo. O cheiro de sangue encheu o ar.
Filho da puta.
Rafe entrou na confusão e encontrou Axel morto no chão do
armazém, a parte de trás do crânio estourada. O guarda também estava
morto. Estava deitado numa crescente piscina de sangue a poucos
metros de onde Cruz continuava a latir ordens para os seus homens.
— Esqueça o carrinho. Não há tempo agora. — O líder da gangue
pegou um dos caixotes e começou a correr com ele. — Peguem o que
puderem e vamos dar o fora daqui!
Rafe girou sobre ele, bloqueando seu caminho. Seus olhos ardiam
como brasas, brilhando contra a palidez do rosto de Cruz. O sangue
derramado teria sido suficiente para forçar para fora as presas de Rafe,
mas foi a fúria e a suspeita por esse homem que fez as pontas afiadas
irromperem de suas gengivas.
— O que diabos você e LaSalle querem aqui? O que diabos está
nesses caixotes? Me diga antes que eu decida arrancar sua maldita
garganta.
Cruz não parecia assustado. Ele parecia... triunfante.
Ele soltou o caixote que segurava.
Ele atingiu o chão entre eles, o estrondo ecoando como um tiro de
canhão. Rafe sentiu um súbito calor se acumulando debaixo dele. Olhou
para baixo, chocado ao ver correntes azuis luminescentes e leitosas
vazando das ripas quebradas.
Santo inferno.
Luz ultravioleta liquidificada.
Sabia que a tecnologia avançada existia. Era um dos novos
desenvolvimentos favoritos da Opus – e algo que vinham tentando
fabricar em grande escala há algum tempo. Nos últimos meses, a Ordem
destruiu outros esconderijos de balas de luz UV, as quais matavam Raça.
Evidentemente, nem todos.
E Rafe nunca viu a merda de perto e pessoalmente assim.
Isso queimou seus olhos. Ele cambaleou para trás, protegendo o
rosto com o braço.
Não foi o suficiente para impedir a queimadura que se alastrou
sobre ele enquanto as correntes de pura luz o cercavam.
Ele estendeu a mão para pegar Cruz com um rugido estridente,
mas o líder da gangue saiu do seu alcance com uma risada baixa.
— Coloquem suas bundas em movimento — gritou ele para Fish e
Ocho. — LaSalle está nos esperando no local do encontro.
CAPÍTULO 17
Ela não aguentou a espera.
Após andar de um lado para o outro em seu Darkhaven pelas
últimas duas horas, Devony finalmente cedeu à sua impaciência e pulou
na motocicleta. A promessa de Rafe de atualizá-la assim que o trabalho
terminasse deveria ter sido tranquilizadora o suficiente, mas não
conseguia afastar a sensação de que algo estava errado.
Passou pelo local do encontro perto do Atlantic Wharf, mas não viu
nenhum sinal dos homens perto da marina. Estavam atrasados, o que só
aprofundou a sua sensação de pavor.
Dando uma volta com a sua motocicleta, ela se dirigiu ao parque
industrial perto do terminal de embarque. A sensação doentia no
estômago diminuiu um pouco quando viu o veículo da gangue
estacionado na frente, Ocho saindo correndo da traseira do veículo e
pulando no banco do motorista. Cruz e Fish carregavam caixotes
enormes para fora do armazém e os colocavam no caminhão.
Graças a Deus. Parecia se preparar para sair agora.
Talvez essa confirmação visual fosse suficiente para satisfazê-la.
Afinal, nem deveria saber sobre o trabalho esta noite, muito menos estar
lá.
Mas uma coisa que ela não viu foi Rafe.
O cheiro de tiros pairava no ar. E quanto mais perto ela chegava do
armazém, mais certa estava de que cheirava a sangue.
Sangue humano, não Raça.
No entanto, isso não fez nada para o alarme que crescia dentro de
seu peito.
Ela acelerou para o caminhão, praticamente pulando da
motocicleta quando chegou lá. Cruz ainda estava na parte traseira do
veículo com Fish. Ele abaixou a porta e fechou a fechadura com força
enquanto Devony corria até eles.
— Que porra você está fazendo aqui?
— Diga-me o que aconteceu — disse ela, com o pânico subindo pela
garganta. — Onde está Rafe? Ele está aqui com você?
Cruz não respondeu. Ele apontou o queixo com o cavanhaque para
Fish. — Entre na cabine. Agora!
Fish hesitou apenas por um segundo, seu rosto incerto quando
olhou para Devony. Então correu como ordenado.
Num grunhido, Devony pegou a camisa do líder da gangue. Ela não
tinha paciência para fingir que não estava preparada para lhe causar
sérios danos. — Maldito seja você, Cruz. Diga-me o que diabos está
acontecendo...
Ele a empurrou com força, saindo de seu alcance. Quando ela
cambaleou para trás, ele correu para o outro lado da cabine aberta. —
Ocho! Vamos lá!
O caminhão avançou com um guincho de pneus patinando e
borracha fumegante.
A visão de Devony inundou de fogo. Cada partícula de seu ser que
era do outro mundo, ferozmente Raça, explodiu para a vida dentro dela.
Ela deu um salto, aterrissando como um gato no teto do caminhão
em alta velocidade.
Outro salto e uma torção no ar levaram suas botas para o capô do
veículo, encarando as expressões atordoadas de Ocho e Cruz do outro
lado do para-brisa.
Ela quebrou o vidro com o seu punho e agarrou Cruz pela garganta.
— Onde. Porra. Está. Rafe?
Cruz cuspiu e se engasgou, agarrando os dedos dela. — Foda-se
vadia!
— Puta merda! — Os olhos de Ocho quase saltaram do crânio atrás
do volante. — Ela é uma maldita Raça!
O caminhão balançou, mas Devony permaneceu nele. Enquanto
segurava Cruz em seu aperto punitivo, notou algo estranho nas roupas
dele. Tinta azul brilhante e estranhamente iluminada salpicava a frente
de sua camisa e jeans. Ele também tinha um pouco em suas mãos.
Não, não tinta.
Que porra era essa?
Em meio ao tumulto e ao caos na frente, Fish saiu da traseira do
caminhão e foi para a frente. — Ele está no armazém, Brinks. — Ele
engoliu em seco, deu uma sacudida de cabeça. — O UV líquido das
caixas...
Ah. Merda.
Ah. Não.
Devony gritou sua fúria. Não queria nada além de desencadear o
inferno em Cruz, mas a preocupação por Rafe anulou todo o resto.
Ela saltou do veículo. O caminhão se afastou enquanto ela
praticamente voava até o armazém.
Um guarda de segurança inconsciente estava deitado numa
depressão dentro da entrada. Mais dois em transe nas proximidades.
Todos começando a despertar. O que significava que a influência de Rafe
em suas mentes estava começando a se esvair.
— Rafe!
Devony correu mais para dentro, seus sentidos se encheram com
o cheiro do sangue derramado. Tanto sangue. Morte também. O corpo de
Axel não estava longe do cadáver crivado de balas de outro guarda.
E então Rafe.
Contorcendo-se no chão ao lado de um caixote quebrado que ainda
estava escorrendo líquido azul brilhante e luminescente de dentro dele.
Rafe estava numa piscina crescente do material. Todos os lugares onde o
material ultravioleta concentrado tocava sua pele estavam hediondos
com queimaduras. Até o bonito rosto dele.
— Oh, meu Deus. Rafe.
O som de sua voz pareceu despertá-lo. Ele levantou a cabeça, mas
suas pálpebras inchadas não abriram, ou não podiam. — Devony —
murmurou. — Que diabos está fazendo? Vai. Cruz e os outros...
— Eles se foram — disse ela, já agachada ao lado dele. — Eles foram
embora no caminhão.
— UV líquido.
— Eu sei. Fish me contou. — Suas botas deslizaram nas poças
parecidas com mercúrio enquanto lutava para tirar Rafe do material
derramado. — Precisamos tirar você daqui.
Ele gemeu em agonia enquanto ela o levantava, colocando o ombro
sob o braço dele para apoiá-lo. Não sabia onde ele conseguiu forças para
se mover em sua horrível condição, mas ele cambaleou para fora do
armazém com ela para a noite fria.
— Não podemos usar minha motocicleta. Você não será capaz de
montá-la.
— O carro dos guardas. — Rafe apontou para o sedan sem
identificação estacionado na lateral.
Devony ligou o motor com a mente enquanto corriam para o
veículo. Cuidadosamente ajudou Rafe a se sentar no banco do
passageiro, estremecendo com a dor agonizante que ele claramente
sofria.
— Estou bem — disse ele. — Apenas dirija, querida.
— Tudo bem. — Ela pulou atrás do volante e acelerou.
Ela dirigiu mais para dentro da cidade, sem saber para onde ia.
Seu olhar desviou-se repetidamente para Rafe, seu coração apertando
com preocupação crescente. Ele estava em pior estado do que ela
percebeu. Seus pulmões ofegavam. As mãos estavam empoladas, massas
polpudas. Queimaduras de UV marcavam sua testa, pálpebras e
bochechas. Até os lábios estavam chamuscados. A pele branca e
descascada estalava e sangrava ao menor movimento de sua boca.
Ele precisava de ajuda desesperadamente.
O que precisava era de cura, e pela aparência dele não havia tempo
a perder.
Ela avistou um viaduto à frente. A rampa de saída abaixo dele
estava parcialmente bloqueada por cones de construção e barreiras, toda
a área estava isolada para reparos. Parecia calma e escura, o lugar mais
próximo que podia ver onde poderiam parar por um tempo e recuperar o
fôlego.
— O que está fazendo? — Ele raspou ao lado dela. — Estamos
desacelerando. Por quê?
— Está tudo bem. — Deus, ela odiava deixá-lo ouvir o som irregular
de sua voz. Ela queria ser forte, mas mal podia conter a emoção presa em
sua garganta desde o momento que o viu naquele armazém. — Estou
parando em um lugar seguro para que você possa descansar.
— Não. Não posso descansar. — Agitado, ele se mexeu
abruptamente. Suas mãos feridas se moviam sem rumo na frente dele
porque não podia ver. Ele gemeu, um som de frustração e agonia. —
Preciso parar o Cruz. Aqueles caixotes... deve estar roubando essa merda
para a Opus.
— Você não vai a lugar nenhum agora. Precisa descansar. Precisa
de cura.
Contra o seu protesto rosnado, ela estacionou o sedan embaixo do
toldo de plástico que descia do topo da ponte em reparos. Girando em
direção a ele, ela inspirou o ar de forma superficial e cheia de
preocupações. A dor dele a aterrorizava. Isso a despedaçava.
Se ela o perdesse agora, por causa de Cruz e LaSalle?
Se o perdesse por causa da Opus Nostrum...
Não. Ela se recusava a pensar nisso.
Ela se recusava a permitir até mesmo a possibilidade de que eles
também pudessem tirá-lo dela.
— Deixe-me ajudá-lo. — Ela estendeu a mão para ele, colocando as
mãos cuidadosamente em seu peito.
Mal começou a puxar sua habilidade de cura quando percebeu que
não funcionaria. O corpo dele estava esgotado, reunindo toda a energia
para combater o dano causado pela exposição à luz ultravioleta. Ele já
estava entrando e saindo da consciência. Ela poderia sugar sua
habilidade psíquica, mas isso significaria drená-lo de suas últimas
forças. Não estava certa de que poderia devolvê-la rápido o suficiente para
salvá-lo.
E o fracasso não era uma opção que estava disposta a arriscar.
Ela cortou a conexão, afastando as mãos.
— Você precisa de sangue, Rafe.
Ela olhou para fora das janelas, vendo nada além de uma estrada
deserta e obras à sua volta. Nenhum ser humano, e não havia tempo para
procurar por um anfitrião de sangue. Não que ela quisesse vê-lo se
alimentar de outra pessoa. Nem mesmo nessas circunstâncias.
Especialmente não assim.
O sangue humano era uma solução inferior, de qualquer maneira.
Seu corpo precisaria de algo muito mais poderoso para impulsionar sua
recuperação.
O sangue dela.
Não havia quase nada mais puro.
Não havia nada neste mundo que pudesse curá-lo mais rápido.
Mas se desse a ele, nunca poderia retroceder. O vínculo
permaneceria por muito tempo depois que ele curasse. Seria inquebrável.
Se o alimentasse com apenas um gole, ele se uniria a ela para sempre
através desse vínculo – um presente que ele poderia encarar como uma
maldição.
Ela não tomou essa decisão de ânimo leve.
Ele talvez passasse a odiá-la por isso, mas pelo menos ele estaria
vivo.
Devony levou o pulso até a boca e mordeu as veias que pulsavam
ali. O sangue pingou na pele chamuscada de Rafe e na barba enquanto
ela levava a mão aos lábios entreabertos e empolados.
Ele gemeu com a primeira gota que deslizou em sua língua. Seu
grande corpo se contraiu enquanto o ritmo constante continuava fluindo.
Ele lambeu, em seguida, sua boca se prendeu sobre os furos e ele se
afastou dela. Quando engoliu, um estrondo baixo cresceu em seu peito.
Abruptamente, seus olhos se abriram. O fogo ardia nas piscinas
atormentadas de água-marinha.
— Devony. — Seu nome era um grunhido ameaçador.
— Beba — sussurrou.
E ele bebeu.
CAPÍTULO 18
Ele estava queimando.
Relâmpago em suas veias. Nos seus músculos e ossos.
Em cada célula exaurida e sedenta em seu corpo.
E não conseguia o suficiente.
A agonia opressiva no corpo inteiro que o derrubou no chão do
depósito e quase queimou sua vida agora dava lugar a algo infinitamente
mais humilhante.
Devony Winters.
Sua essência correu para ele a cada gole faminto que tomou de
suas veias. Ousada, intensa e doce... intoxicante. Inesquecível.
Alterando sua vida.
Ela era todas essas coisas para ele, mesmo antes deste momento,
mas agora ela vivia dentro dele através de sua ligação com ela. Ele sentiu
a força e poder alimentando seu corpo devastado, restaurando o dano
que certamente o teria matado se ela não desafiasse suas instruções e
viesse procurá-lo esta noite.
Sua parceira extraordinária.
Ele lhe devia a vida.
Deus, devia muito mais a Devony do que isso.
E ainda lhe devia a verdade.
Ele levantou as pálpebras e encontrou-a olhando para ele com um
terno alívio enquanto se alimentava dela. — Está funcionando, Rafe.
Continue bebendo. Sua pele está se curando. As queimaduras... estão
começando a desaparecer.
Ele gemeu contra o pulso dela, sentindo-se como o pior tipo de
bastardo, enquanto todas as suas emoções o inundavam imediatamente.
O medo dela sobre a gravidade de seus ferimentos estava desaparecendo
agora, substituído por uma alegria brilhante e crescente ao vê-lo se
recuperando.
A profundidade surpreendente de seu carinho por ele.
Era demais. Ele tomou muito dela, não apenas de seu pulso esta
noite, mas desde o momento que a conheceu.
Agora isso. A conexão que teria com ela enquanto vivessem.
Porra.
Irado, forçou-se a libertá-la, passando a língua pelos furos gêmeos
e fechando-os.
Ele se sentou, fazendo um rápido inventário de si mesmo. Por baixo
do sangue curativo de Devony, ainda doía malditamente. Sua pele ainda
parecia estar sendo arrancada dele com uma faca quente, mas ele estava
respirando. Estava vivo.
Graças a Devony, ele estava vivo.
Remorso o arranhou. Não porque não queria o presente dela, mas
por causa do arrependimento que ela suportaria quando percebesse que
ele não merecia isso.
Fazendo uma careta, olhou para ela. — Não deveria ter feito isso.
A expressão dela vacilou um pouco. Um pouco da intensidade
brilhante de suas emoções diminuiu em face da reação ríspida dele.
Ele não podia evitar. A culpa afundava suas garras nele enquanto
ela olhava para ele no silêncio do veículo.
A melhor maneira que sabia para garantir que seu presente não
fosse desperdiçado com ele era fazer tudo que estivesse ao seu alcance
para ver a família dela vingada e a Opus Nostrum destruída. Não
descansaria até que isso fosse feito.
— Troque de assento — disse ele, já abrindo a porta do passageiro.
— Vou dirigir agora.
Ele caminhou para o outro lado e entrou no carro. Estavam a
alguns quilômetros do centro de Boston. Rafe dirigiu velozmente até o
local do encontro.
Estava quase certo de que o desvio de alguns minutos enquanto se
recuperava provavelmente daria a Cruz tempo suficiente para transferir
as caixas para LaSalle ou quem quer que estivesse na outra ponta da
cadeia de oferta e demanda. Então, ele não podia ter ficado mais satisfeito
em ver o caminhão de entregas ainda estacionado no Atlantic Wharf.
Exceto... algo não estava certo.
— Rafe — murmurou Devony ao lado dele.
— Sim. Eu sei. — Não havia atividade perto do caminhão. Quando
viu o enorme buraco perfurado no para-brisa, arqueou uma sobrancelha
para Devony.
Ela deu a ele um olhar plano. — Deveria ter matado Cruz enquanto
estava com a garganta dele no meu punho.
Rafe estacionou o sedan na frente do outro veículo. — Eu já volto
— disse ele. — Fique aqui.
— Inferno que eu vou.
Ela saltou com ele e juntos se aproximaram do caminhão. Ambos
sentiram o cheiro de sangue muito antes de verem os corpos de Cruz,
Fish e Ocho. Todos os três foram mortos em estilo de execução.
Os cadáveres estavam frios. Quem quer que tenha cometido os
assassinatos já havia desaparecido há algum tempo.
E todos os caixotes de UV líquido sumiram.
— Oh, meu Deus — murmurou Devony. — Acha que LaSalle os
traiu?
Rafe sacudiu a cabeça. — Não sei. Fish disse que os caixotes
pertenciam a um traficante de armas. Aparentemente, o contato de
LaSalle precisava de alguém para bancar o intermediário.
— Dispensáveis — adivinhou Devony.
Rafe assentiu. — Sim, mas isso parece mais profissional do que a
vingança de um traficante de armas local. Já vi esse tipo de carnificina.
Há alguns meses em Montreal, depois que um grupo de extermínio da
Opus eliminou um magnata farmacêutico e toda a sua propriedade.
— Lá está o iate de LaSalle — disse ela, apontando para a marina.
A luz brilhava das janelas da enorme embarcação branca ancorada no
final de um longo píer. — Ele ainda está aqui.
Rafe não gostou da aparência disso. Ou do cheiro. Se a área ao
redor do caminhão fedia a morte, o iate de LaSalle carregava o fedor de
um matadouro.
— Os assassinos da Opus estiveram aqui — murmurou ele.
Ele não gostou da ideia de Devony se aproximar do iate ao lado
dele, mas ela já havia demonstrado que não era o tipo de parceira que se
afastava quando enfrentava perigo.
E graças a Deus por isso esta noite.
Sua pele ainda parecia um inferno, mas isso não o atrasou
conforme se aproximavam do iate de LaSalle e cautelosamente
embarcavam nele.
O lugar estava em silêncio, exceto pela tagarelice de uma
transmissão esportiva estridente de algum lugar da cabine principal.
Guarda-costas armados foram baleados à queima-roupa na cabeça. Os
membros da tripulação sofreram destinos semelhantes, alguns com as
gargantas cortadas. Rafe moveu-se rapidamente pela cabine, com o
ouvido atento ao leve farfalhar de respirações desvanecidas e ritmo lento
de um coração agonizante.
— É LaSalle — disse Devony.
O homem estava no salão principal do iate com vários outros de
sua tripulação. O sangue pintava tudo, incluindo a TV de tela grande do
outro lado do espaço luxuoso.
Rafe se agachou ao lado de Judah LaSalle. — Diga-me para quem
está trabalhando.
Tudo que conseguiu foi um chiado molhado em resposta. O
humano estava longe demais para falar. Ele tinha segundos restantes,
talvez menos.
— O que há de errado, LaSalle? A Opus decidiu que você perdeu a
sua utilidade? — perguntou Rafe. Ele agarrou LaSalle, dando-lhe um
choque de cura, apenas o suficiente para extrair um pequeno som de
seus pulmões que se afogavam. — Porra, me diga quem é seu contato.
— Eu não... Não sei. — O sangue borbulhava nos cantos da boca
do moribundo. — Não tenho... não tenho qualquer contato. Eu só...
apenas faço o que me pedem. Então o dinheiro aparece na minha... na
minha conta bancária.
— Acha que ele está dizendo a verdade?
Rafe olhou para Devony. — Existe uma maneira de descobrir.
Colocando a palma da mão sobre a sobrancelha úmida do humano,
o deixou em transe e fez a pergunta novamente. LaSalle disse a mesma
coisa. Nunca teve contato direto com ninguém – pelo menos, até hoje à
noite.
— Quem fez isso? — perguntou Rafe.
LaSalle balançou a cabeça fracamente. — Eu juro... não sei. Eles
disseram que eu... disseram que estraguei tudo. Disseram... disseram
que você e a garota... disseram que vocês dois precisavam sair.
Rafe deu uma olhada em Devony. — Precisamos sair daqui.
Ela não estava mais prestando atenção nele. Seu olhar se fixou na
tela da TV salpicada de sangue. Rafe sentiu seu choque em sua própria
corrente sanguínea, tão frio quanto a água gelada.
O jogo foi interrompido por um boletim de notícias local – uma
reportagem sobre uma enorme explosão numa área residencial de Back
Bay. No fundo, atrás do repórter, um inferno rugia, cinzas e fumaça
subindo no céu noturno enquanto os bombeiros lutavam para contê-lo.
Rafe soltou LaSalle. O último suspiro do homem saiu dele enquanto
seu corpo caía no chão novamente.
Rafe se moveu para perto de Devony. — Puta merda.
Ela lentamente virou a cabeça para ele. — Aquele é o meu prédio,
Rafe. Aquele prédio... Aquela é minha casa.
CAPÍTULO 19
Devony ficou sentada em silêncio no sedan roubado dos guardas
do armazém enquanto ele dirigia.
Rafe olhou para o seu rosto chocado, iluminado pela luz fraca do
painel. — Você está bem?
Ela assentiu uma vez, mas foi apenas uma resposta por reflexo. Ela
não olhou para ele. Mal disse duas palavras desde que deixaram toda a
carnificina para trás na marina.
Era uma mulher forte e corajosa, mas nem mesmo um experiente
guerreiro da Ordem poderia testemunhar esse tipo de massacre e sair
dele sem ser afetado. E agora, de acordo com LaSalle, o esquadrão da
morte da Opus tinha ordens para vir atrás dos dois.
Rafe não estava muito preocupado que ele estivesse na mira deles.
Simplesmente por estar associado à Lucan Thorne e à Ordem havia
colocado um alvo da Opus Nostrum em suas costas. Vivia com essa
verdade todos os dias. Para Devony, essa ameaça era nova.
E esta noite isso se tornou evidente e perigosamente real.
— Eles incendiaram minha casa, Rafe.
— Sim. — Ele estremeceu interiormente com seu tom rude e
estendeu a mão para ela, colocando a mão sobre os dedos frios. — Mas
você está bem. Está segura. Isso é tudo que importa.
Ela silenciosamente balançou a cabeça. — Mas o resto... Todo o
meu trabalho, pesquisa e anotações do meu pai. Perdemos tudo agora.
Vamos ter que começar tudo de novo, Rafe.
Ele fechou a mandíbula, lutando para manter o segredo de que
passou quase todas as informações que ela tinha para a Ordem. Gideon
provavelmente já havia extraído os dados de todas as fotos e os
examinado uma dúzia de vezes por esta altura.
A Ordem não perdeu nada esta noite, mas não podia contar isso a
Devony sem a autorização de seus comandantes.
A resposta de Rafe saiu frágil. — Sinto muito por você ter se
envolvido nisso. Estou muito feliz por você não estar nem perto do seu
Darkhaven quando os assassinos da Opus chegaram lá.
Agora, não seria seguro para ela qualquer outro lugar da cidade
também.
Com exceção de um local.
Havia apenas um lugar que ele conhecia, onde poderia ficar
tranquilo, sabendo que nem a Opus nem ninguém leal a eles poderia
tocá-la.
Ele se dirigiu para lá agora, apesar do entendimento de que sua
chegada poderia explodir tudo em seu rosto. Sua missão secreta. A fé de
seus comandantes nele. Inferno, todo seu futuro como guerreiro poderia
ser perdido levando uma civil não autorizada – uma com laços com a
JUSTIS e um preço em sua cabeça – para o domínio da Ordem.
Mas todas essas coisas empalideciam em comparação com a
possibilidade de perder a confiança de Devony ao mesmo tempo.
O fato de não dizer a ela nada sobre isso – o fato de que não podia
dizer a ela sem violar o seu dever para com a Ordem – o consumia
enquanto o centro de comando altamente seguro e os terrenos adjacentes
surgiam à frente.
Quando entrou na propriedade, Devony finalmente saiu do seu
torpor. — Onde estamos?
— O único lugar onde podemos ir agora.
Ele tocou o painel de segurança, segurando a palma da mão na
frente do leitor enquanto esperava por uma resposta. Não demorou
muito.
— Que porra está fazendo aqui? — A voz baixa de Elijah através do
alto-falante era tudo menos acolhedora. Faltando apenas algumas horas
antes do amanhecer, a equipe de patrulha devia ter acabado de retornar
à base.
— Preciso ver o comandante.
— Então, ligue e marque uma reunião. — A atitude de seu
camarada era de se esperar, especialmente considerando a última
conversa deles no Asylum.
— É urgente, Eli. Não vou sair até falar com Chase.
O guerreiro bufou. — Então será seu funeral, cara.
Quando o portão se abriu, Rafe entrou. Sentiu a apreensão de
Devony quando se aproximaram da mansão. De acordo com os guerreiros
mais velhos, o complexo original da Ordem nessa cidade era
impressionante. Este novo era uma fortaleza, construída vinte anos
atrás, depois que o primeiro foi comprometido por um inimigo e teve que
ser destruído.
Devony olhou para ele com preocupação. — Rafe, tem certeza
disso?
— Tudo vai dar certo. — Ele desligou o motor e encarou-a. Não
pode resistir a acariciar seu rosto cauteloso. — Estará segura aqui,
prometo.
Para sua surpresa, enquanto caminhavam do veículo até a porta
da frente da imponente mansão, Devony segurou a mão dele. Ele não
sabia se o gesto era para tranquilizá-lo ou a si mesma. Ele não se
importava.
Depois da noite que acabaram de passar, ficou contente em segurá-
la. Estava mais do que feliz em senti-la ao seu lado; estava orgulhoso.
Ele nem estaria lá se não fosse pelo presente salvador do seu
sangue.
Através de seu vínculo com ela, sentiu o nó de preocupação apertar
dentro dela enquanto a porta se abria e Eli ficava na frente deles. Estava
flanqueado por Jax, ambos os guerreiros ainda com equipamentos de
patrulha, até as armas que estavam a postos em suas mãos.
— Serei amaldiçoado — murmurou Jax para Eli. — Pensei que você
estava brincando quando disse que ele esperava do lado de fora.
Pelo que não foi a primeira vez, Rafe desejou que seus
companheiros de equipe entendessem a verdade. Que ele não era o
perdedor vira-casaca que ainda precisava fingir que era. As suspeitas
deles o queimavam, mesmo tendo trabalhado duro nas últimas semanas
para ter certeza de que merecia isso.
Ver aquela desconfiança também dirigida a Devony colocou uma
ponta mais afiada em sua voz. — Preciso falar com o comandante.
Nenhum deles saiu do caminho.
O olhar de Elijah se estreitou em Devony por um momento antes
de deslizar para Rafe. Ele soltou uma risada cáustica. — Quem é a
perdida? Não a vi andando com aquela gangue de perdedores quando nos
deparamos com você no Asylum na outra noite?
Rafe abaixou a cabeça num grunhido de aviso. — Ela é minha. Isso
é tudo o que você precisa saber.
A parte protetora e possessiva dele levantou-se em defesa de
Devony. Sua resposta seria a mesma, não importando se estivesse
olhando para um amigo ou um verdadeiro inimigo.
Para seu crédito, Eli se afastou. Só um pouco.
Jax cruzou os braços, ainda em posição de batalha no limiar. —
Você tem um bocado de coragem, cara. O comandante não vai gostar
disso. Nem Nathan, assim que descobrir que está aqui e a trouxe com
você.
Rafe não tinha paciência para repreensões ou perguntas,
especialmente quando não podia dizer nada aos seus companheiros de
equipe. E não enquanto estava do lado de fora com Devony, sabendo que
o esquadrão da morte da Opus provavelmente estava vasculhando a
cidade atrás dela.
— Não estou aqui para falar com qualquer um de vocês, porra. —
Ele deu um passo à frente, pronto para entrar à força na mansão se fosse
necessário. — Só vou falar com o Chase.
— Deixe-o entrar.
Por detrás da dupla de guerreiros desmedidos, o comandante
Sterling Chase apareceu. Eli e Jax se separaram, abrindo caminho para
o imenso macho Raça. Chase sempre foi uma figura imponente, com seus
ombros largos, músculos volumosos e olhos azuis penetrantes sob a
coroa de cabelos dourados. Naquela noite, havia uma gravidade em seu
comportamento que Rafe raramente viu.
Seu olhar descontente mudou de Rafe para Devony, demorando-se
por um momento em suas mãos unidas. Ele se afastou deles sem
comentários. — Entrem, vocês dois. Rafe, meu escritório.
Rafe deu um passo à frente, levando Devony. Com a liberação de
Chase, Eli e Jax voltaram para o que quer que estivessem fazendo antes
da chegada de Rafe. E de dentro de outra sala no andar principal da
mansão, a companheira de Chase, Tavia, apareceu junto com Carys e
seu companheiro, Rune.
Carys ficou boquiaberta, um sorriso esperançoso se espalhando
por seu rosto bonito. — Rafe? Oh meu Deus!
Quando teria corrido para cumprimentá-lo, o gigante de cabelos
escuros que era seu companheiro de sangue a segurou, seu braço grosso
enrolado firmemente, ainda que ternamente, ao redor de sua barriga.
Embora Carys não soubesse, como qualquer outra pessoa, que seu
exílio não era permanente, era bom ver que ela não havia perdido a fé
nele. Ele só esperava que seu irmão Aric e o resto dos guerreiros fossem
igualmente compreensivos se e quando pudesse retornar ao grupo.
Daqueles na sala agora, apenas o Comandante Chase e sua
companheira Tavia estavam a par da verdade. Tavia caminhou até
Devony e ele.
— Olá, Rafe. — Seu olhar suave iluminou-se em Devony. — Oi. Sou
Tavia Chase.
— Esta é Devony Winters — disse Rafe quando ela parecia incapaz
de falar. — Seus pais e irmão trabalharam para a JUSTIS na sede em
Londres.
— Oh, sei — disse Tavia, um olhar de simpatia carinhosa nos olhos.
— Devony é Raça — acrescentou Rafe. — Ela é uma daywalker.
Os olhos de Carys se arregalaram. — Está falando sério? Isso
significa que somos parentes.
Tavia parecia menos surpresa, o que indicava que Lucan havia
compartilhado as informações fornecidas por Rafe em seu último
relatório. Chase obviamente informou a sua companheira sobre a meia-
irmã que ela perdeu no atentado a JUSTIS, e da sobrinha que
inesperadamente se envolveu no meio da missão de Rafe.
Através de seu vínculo com Devony, Rafe sentiu seu choque de
euforia ao olhar para a mulher mais velha que compartilhava sua
extraordinária linhagem sanguínea. Um pequeno suspiro escapou dela
quando soltou a mão dele para aceitar a de Tavia em saudação. — Estou
muito feliz em conhecer vocês duas.
— Igualmente, Devony.
Chase acenou para sua companheira. — Tavia, você e Carys
gostariam de conversar com Devony enquanto converso em particular
com Rafe?
— Claro. Será um prazer.
— Eu estarei bem aqui — disse Rafe a Devony quando ela olhou
para ele em dúvida. Embora a maneira como o olhar descontente de
Chase o encarava, não sabia se restaria algo, uma vez que o comandante
acabasse com ele.
Ele apontou para o escritório. Eles entraram e Rafe ficou de pé do
outro lado da mesa enquanto Chase se jogava em sua cadeira de couro
atrás dela.
— Vá em frente e sente-se, filho. Podemos ficar aqui por um tempo.
— Enquanto Rafe ocupava o assento oferecido, Chase olhou para ele por
cima dos seus dedos entrelaçados. — Vou assumir que você tem uma boa
razão para aparecer aqui sem ser anunciado esta noite, com uma mulher
civil debaixo do braço. Deixe-me ir até o fim e sugerir que pode ter algo a
ver com o fato de que você está aparentemente fodendo um recurso da
Ordem. Quando Lucan lhe deu permissão para manter a fêmea em jogo,
se precisasse, duvido que fosse isso o que ele tinha em mente.
Merda. A acusação o irritou, mas foi a avaliação grosseira do
comandante sobre Devony que realmente colocou uma borda no tom de
Rafe. — Ela não é apenas um recurso, senhor.
Chase grunhiu. — Acho que isso responde a primeira parte da
minha pergunta.
Rafe continuou, sabendo que não havia sentido em tentar esconder
que ele e Devony estavam envolvidos. — Ela está em perigo. Não a teria
trazido aqui por nada menos.
— Deveria estar aliviado ao ouvir isso? — Chase xingou baixinho.
— Pelo o que entendi, Lucan especificamente lhe disse para manter seu
disfarce com ela. Ele não vai querer ouvir que você desafiou uma ordem
se envolvendo com ela.
— Meu disfarce ainda está intacto — murmurou Rafe, sentindo-se
mal sobre isso agora. Isso o havia consumido quase desde o início, mas
especialmente agora. — Ela não sabe que ainda faço parte da Ordem. Vir
aqui esta noite e me bater de frente com Eli e Jax só confirmou meu
disfarce.
— Você se preocupa com essa fêmea.
Rafe não podia negar isso. O olhar de compreensão sóbria de Chase
dizia que não precisava da confirmação, de qualquer forma.
— Diga-me o que aconteceu esta noite.
Rafe deu-lhe um resumo da cadeia de desastres, dos caixotes
roubados de UV líquido – e agora desaparecidos – até o assassinato em
massa de Cruz e sua gangue, juntamente com Judah LaSalle, a melhor
atual pista da Ordem em sua busca por membros do círculo interno da
Opus Nostrum.
Chase ouviu todas as más notícias em silêncio sombrio, como se já
tivesse passado por milhares de catástrofes semelhantes em seu exercício
como guerreiro e, como Lucan, tivesse ombros largos para carregar todas.
Por pior que seus problemas tivessem ficado esta noite, Rafe
também podia lidar com eles.
Exceto aquele que colocava Devony na linha de fogo.
— Eles queimaram o prédio dela esta noite. — Bastou dizer as
palavras para ele sentir um frio em suas veias. Só de pensar no perigo
em que ela estava fez seu sangue ferver com intenção assassina. —
Coloquei LaSalle em transe antes dele morrer. Ele me disse que o
esquadrão da morte disse que estavam indo atrás de Devony e eu.
Enquanto eu o apertava para obter informações, vimos o boletim de
notícias na TV. Repórteres e caminhões de bombeiros estavam em todo o
quarteirão em Back Bay. Eu trouxe Devony direto para cá.
— Jesus, aquele inferno do outro lado cidade é o Darkhaven dela?
— Era — corrigiu Rafe. — Ela não tem outro lugar para ir, Chase.
— Isso não é bem verdade. Ela pode voltar para casa em Londres.
Mathias Rowan está aqui em Boston por outros negócios. Tenho certeza
de que estará disposto a levá-la para casa em segurança quando voltar
amanhã. Sua unidade em Londres pode fornecer proteção 24 horas por
dia enquanto lidamos com essa situação com a Opus.
— O quê? Não. De jeito nenhum. — Rafe queria pensar que sua
veemente rejeição a essa ideia tinha mais a ver com preocupações com o
bem-estar dela do que com sua vontade de mantê-la perto dele. Não era
o que seu coração estava dizendo, no entanto.
— Ela não tem mais uma casa em Londres. Não desde que sua
família foi morta. Não vai querer voltar para lá. Mesmo que queira, você
e eu sabemos que estará mais segura aqui conosco.
Com ele.
Só porque não disse as palavras em voz alta não significava que
elas não estavam vibrando em cada fibra do seu ser.
Ele a queria. Não apenas para garantir que estivesse segura e
protegida. Não apenas como uma parceira valiosa em seu objetivo de ver
a Opus destruída.
Ele simplesmente queria... ela.
Chase o examinou por um momento antes de exalar um longo
suspiro. Ele se inclinou, apoiando os cotovelos na mesa. — Ouça, Rafe,
Lucan me contou sobre a situação dela. É difícil o que ela passou. Perder
os pais e o irmão de uma só vez. Alguém iria querer um pouco de vingança
por isso. Mas esta é nossa luta com a Opus, não dela.
— Não. — Rafe balançou a cabeça. — Esta noite, ameaçando-a,
eles fizeram disso a minha luta.
Era verdade. Tanto quanto ansiava por vingança após ser feito de
tolo pela Opus em Montreal, essa decisão de destruir o grupo era algo
diferente. Era mais profunda, corria infinitamente mais fria.
Sua própria humilhação não era nada comparada à ameaça muito
real à vida de Devony.
— Ela fica comigo.
As sobrancelhas de Chase se levantaram em desafio. — Como
comandante deste centro de operações, posso ter algo a dizer sobre isso.
E posso garantir que Lucan vai...
— Eu bebi dela.
— Ah, foda-se. Me diga que está brincando.
Rafe manteve o olhar sombrio de seu comandante. — Esta noite
mais cedo, após Cruz esmagar um caixote de UV líquido na minha frente.
As queimaduras estavam... ruins. Devony não deveria participar do
roubo, mas foi me procurar de qualquer maneira. Se ela não tivesse me
encontrado – se não tivesse me dado seu sangue... — Rafe balançou a
cabeça lentamente. — Eu devo a ela a minha vida.
— Entendo. — Chase o estudou, então balançou a cabeça. — Vou
ligar para o D.C. Sei que Lucan vai querer ouvir tudo isso diretamente de
você. Ele vai querer decidir para onde isso vai a partir daqui. Enquanto
isso, preciso colocar as botas no chão para tentar conter o que restou
daquele suprimento de UV no depósito. Aric e sua nova equipe chegaram
mais cedo esta noite — acrescentou Chase. — Parece que acabaram de
receber sua primeira missão.
Droga. A equipe daywalker de seu melhor amigo já estava montada.
Estavam aqui em Boston, e Rafe nem saberia se não tivesse aparecido
esta noite.
Embora tivesse sido expulso da Ordem semanas atrás, ainda assim
ficou surpreso ao perceber como a vida mudou como se ele tivesse partido
para sempre. Até agora, não havia percebido o quanto realmente sentia
falta de estar no grupo, uma parte ativa das operações.
Chase se levantou da cadeira. — Não posso dizer que gostei do que
ouvi esta noite, Rafe, ou de como as coisas estão entre você e Devony
Winters. Mas não vou agir como se fosse o primeiro guerreiro a foder as
coisas de seis maneiras por causa de uma mulher.
O comentário sarcástico deu-lhe mais esperança do que
provavelmente deveria, mas agora ele aceitaria isso.
Rafe levantou-se também. — Obrigado, senhor.
— Vá em frente, saia daqui. — O ancião da Ordem olhou para ele
com uma carranca e acenou com desdém. — Vá se certificar de que sua
fêmea está bem. Esteja pronto para me encontrar na sala de guerra do
complexo em uma hora.
— Sim, senhor.
CAPÍTULO 20
Devony não conseguia parar de olhar.
Tavia Chase era incrivelmente linda. Alta e elegante com sua roupa
preta básica, uma calça feita sob medida e um fino suéter de tricô, ela
exalava uma confiança calma que imediatamente deixou Devony à
vontade. Seu rosto era um estudo de beleza clássica, maçãs do rosto
salientes, pele macia e uma boca generosa – tudo emoldurado por uma
luxuosa juba de cabelo castanho-caramelo.
Carys compartilhava muitas das características de sua mãe e sua
beleza era notável, mas onde Tavia transmitia uma força constante, a sua
filha praticamente vibrava com uma energia magnética selvagem.
Por muitas razões, Devony ficou impressionada com as duas
fêmeas daywalker, e não menos importante o fato de que elas eram suas
parentes.
Após as apresentações no hall de entrada, as duas mulheres a
levaram para uma adorável suíte de hóspedes numa parte tranquila da
mansão. Estavam sentadas juntas numa confortável sala de estar do
quarto, Devony numa cadeira estofada enorme, Tavia e Carys
empoleiradas em frente a ela num sofá revestido de seda.
— Tem certeza de que está bem? — perguntou Tavia gentilmente.
— Só posso imaginar como deve estar se sentindo depois de sua provação
esta noite.
Devony explicou a elas sobre seu prédio sendo atacado, mas
mesmo após assegurar as duas mulheres que estava bem, isso
aparentemente não diminuiu a preocupação delas. Elas se preocuparam
com ela, oferecendo comida e bebida e o pleno uso do suntuoso quarto
de hóspedes. Carys até levou roupa de dormir e uma muda de roupa do
próprio guarda-roupa. O roupão de seda e o pijama eram tão tentadores
quanto a enorme banheira no banheiro adjacente.
Mas era difícil pensar em seu próprio conforto sabendo que Rafe
estava em outro lugar da mansão sendo confrontado por outro dos
Chases, um dos membros mais formidáveis da Ordem.
Sterling Chase, o ex-comandante dele.
— Não posso acreditar que tenha estado bem debaixo de nossos
narizes aqui em Boston — disse Carys. Ela também estava estudando
avidamente Devony desde o momento que se sentaram. — Como você e
Rafe se conheceram?
— É, ah... uma longa história.
— E uma para outra hora — disse Tavia. — Tenho certeza de que
Devony gostaria de descansar.
A expressão de Carys caiu. — Tudo bem, até então. Desculpe, eu
apenas tenho muitas perguntas para você.
Devony mal podia esconder sua curiosidade também. Havia tanta
coisa que queria perguntar a essas duas mulheres, tanta coisa que queria
saber sobre suas vidas. Mas ela não foi lá em visita social. Não tinha nem
certeza se ela e Rafe teriam permissão para ficar.
— Eu gostaria disso, Carys.
— Bom. Terá a chance de conhecer meu irmão, Aric. Ele e sua
companheira, Kaya, chegaram agora de Montreal — disse ela, seus olhos
azuis brilhando. — Vieram com alguns outros daywalkers que se
juntaram à Ordem como parte de uma unidade especial. Você terá que
conhecê-los enquanto estiver aqui.
Tavia gentilmente limpou a garganta, mais do que provavelmente
para impedir que a sua filha divulgasse os negócios da Ordem para uma
estranha. Ela se levantou, indicando para Carys se juntar a ela. — Por
favor, sinta-se em casa, Devony. Como eu disse, vamos deixar você
descansar agora. Se precisar de alguma coisa, considere sua.
Ela seguiu a dupla até a porta. Carys saiu com um sorriso brilhante
e um aceno amigável, mas Tavia parou ali. Ela puxou Devony num breve
abraço.
— Sei que estas são circunstâncias terríveis para nosso primeiro
encontro, mas estou muito feliz que você esteja aqui. — Seus dedos
estavam frios e calmantes enquanto tirava alguns dos cabelos de Devony
do seu rosto. — Só lamento por não ter tido a oportunidade de conhecer
sua mãe... Minha irmã. Tenho certeza de que ela era uma mulher muito
especial.
— Ela era — disse Devony. — Era a mulher mais corajosa que eu
conhecia.
Tavia assentiu. — Tenho a sensação de que ela diria a mesma coisa
sobre você se estivesse aqui para vê-la agora.
Devony engoliu em seco, emoção ficou presa em sua garganta pelo
sentimento, por mais injustificado que fosse. Ela não era corajosa. Estava
com raiva. Estava sofrendo. Queria causar dor – não apenas como
vingança por sua família agora, mas pelo quão perto chegou de perder
Rafe.
E se a Opus pensava que poderia assustá-la queimando sua casa
esta noite, tudo que fizeram foi galvanizar sua necessidade de vingança
em algo mais forte, mais duro.
E agora ela tinha um parceiro naquela batalha.
Se tivesse que ser os dois contra o resto do mundo – mesmo contra
a Ordem, se chegasse a isso – estava pronta para essa luta. Estava pronta
para qualquer coisa, contanto que Rafe estivesse ao seu lado.
Quebrando seus pensamentos sombrios, Tavia se inclinou e beijou
sua bochecha. — Teremos tempo para conversar um pouco mais depois
que tiver a chance de se instalar.
Devony conseguiu dar um sorriso. — Espero que sim.
Ela fechou a porta atrás das mulheres, percebendo agora quão
exausta realmente estava. E também cheirava horrível. Toda a morte e
violência que ela e Rafe deixaram para trás na cidade ainda se agarravam
ao seu casaco, camisa de gola alta e jeans. Um banho e uma nova muda
de roupa eram mais do que uma tentação; eram uma necessidade.
Ela ligou a água na grande banheira e trocou suas roupas pelo robe
branco de seda que Carys lhe deu. O tecido frio e lustroso era pura
decadência contra sua pele nua. Com a água quente acumulando-se
lentamente na banheira, verificou os grandes frascos de óleo de banho,
fixando-se numa fragrância de baunilha com infusão de rosas que
cheirava quase boa o suficiente para comer.
Uma batida discreta soou na porta do quarto.
Ela saiu apressada, esperando encontrar Carys ou Tavia do outro
lado.
— Rafe.
Ela voou para ele. Não poderia ter ficado fora de seus braços se sua
vida dependesse disso. Ele entrou com ela embrulhada nos braços e
fechou a porta, virando a fechadura com sua mente.
Estavam separados há menos de uma hora desde que chegaram à
mansão da Ordem, mas para ela parecia uma eternidade. Depois da noite
que passaram, nunca mais queria se separar dele.
— Estive preocupada — sussurrou ela contra os lábios dele. —
Como foi?
— Estou lidando com isso. — Ele deu de ombros, desconsiderando
sua preocupação enquanto continuava a beijá-la. — Você está linda
nisso. Cheira a baunilha.
— Carys me emprestou algumas coisas. Estava prestes a tomar um
banho. — Suas palavras foram quase perdidas em meio ao roçar febril de
seus lábios sobre os dela.
— Sinto como se estivesse longe de você há dias. — Ele inclinou o
rosto dela para o seu, um olhar de tormento e admiração em seus olhos
brilhantes de água-marinha. — Tem alguma ideia do quanto preciso
sentir você em meus braços agora?
Sem fôlego com o desejo, ela balançou a cabeça. — Mostre-me.
Ele franziu a testa. — Estou coberto de areia e sujeira. Cristo, eu
cheiro a morte.
— Parece que eu me importo?
Ela o puxou para um beijo. Seus dedos emaranharam no cabelo
dele enquanto sua língua procurava a dele, suas respirações quentes se
misturando, corpos esmagados, mantidos ali por seus braços fortes.
Devony choramingou, vencida pela onda de emoções que se
apoderaram dela conforme Rafe a beijava loucamente. Não conseguia
explicar seu desespero por ele. De alguma forma, o momento em que o
viu na porta aberta agora parecia tão frágil – uma ilusão que poderia se
quebrar com um único suspiro.
Talvez tenha sido o caos das últimas horas que a fez se sentir tão
frágil. Toda a morte. Tanta fealdade e violência, encimados por uma
demonstração brutal do que significava ser um inimigo da Opus
Nostrum. E, então, a destruição de sua casa.
Mas o pior de tudo era o entendimento gritante de que naquela
noite ela provavelmente ficou a poucos minutos de perder Rafe para
sempre, caso o UV líquido tivesse conseguido fazer o seu pior com ele.
Deus a ajudasse, nunca esqueceria aquele terrível sentimento
enquanto vivesse.
A angústia inchou dentro dela, uma onda negra de pavor.
— Ei. — Rafe se afastou do beijo deles, suas sobrancelhas se
uniram. Ele balançou a cabeça. — Não pense no que aconteceu esta
noite.
Ele sabia quão sombrio seus pensamentos estavam. Claro que
sabia. Podia sentir suas emoções mais fortes através do sangue que ela
lhe dera. Agora, ele sempre o faria.
— Ei, olhe para mim. — Ele acariciou sua testa, sua bochecha,
seus lábios. Faíscas dançaram e arderam em seus olhos. — Estou aqui.
Você está segura, Devony. Enquanto eu respirar, estará segura. Eu te
prometo isso. Esta noite estamos juntos... por sua causa.
— Rafe. — Seu nome era um suspiro através de seus dentes e
presas emergentes. Aquele suspiro arrepiado se transformou num
gemido quando ele baixou a boca para a dela novamente.
Todo o trauma e preocupações foram incinerados sob o calor de
seu beijo. Mas onde a necessidade de um pelo outro era tão explosiva,
naquela noite havia tanta ternura sem pressa quanto desejo
insuportável.
Num gemido áspero, seus lábios se afastaram dos dela, arrastando-
se sobre a borda de sua mandíbula e sobre a coluna sensível de seu
pescoço. Devony respirou fundo, excitação em espiral através dela.
Entrelaçou-se com o poderoso desejo de sentir as presas dele se
afundando em sua carne.
Ele rosnou em resposta ao calor de sua necessidade. — Porra, você
está me matando. Posso sentir tudo.
Ela não podia evitar. Não conseguia conter todas as sensações que
ele alimentava dentro dela. Subiam mais alto a cada movimento de sua
língua e o arrastar das suas presas afiadas. Cada carícia de suas mãos
sobre a seda cobrindo o seu corpo nu a lambia como uma chama viva.
— Jesus, Devony... você é incrível. Linda pra caralho.
Ele abriu o roupão e deslizou a mão sobre o seio dela, amassando
e acariciando, beliscando o mamilo. A palma da mão dele deslizou pela
frente dela, até o abdômen, enquanto a língua dele varria a sua boca. Ela
se contorcia sob seu ataque sensual, o desejo a inundando, acumulando
calor e umidade em seu núcleo.
E então ele a tocou lá. Seus dedos mergulharam na fenda de seu
corpo, deslizando através de seus sucos, fazendo o batida forte de seu
pulso se tornar um rugido de percussão. Ela respirou fundo quando ele
provocou seu clitóris e a carne sensível ao redor. Quando se afastou dela,
ela não conseguiu segurar seu gemido de protesto.
— Gostaria que você pudesse se ver como eu a vejo agora — disse
ele asperamente. Ele lambeu os lábios enquanto o calor de seus olhos
brilhantes varria cada centímetro dela. Em todos os lugares que seu olhar
cheio de âmbar a tocava, ela queimava. Ele a olhou lentamente, como se
tivesse a noite toda para saborear cada centímetro dela.
Que Deus a ajudasse, ela nunca duraria.
Ela deu um passo em direção a ele e ele balançou a cabeça, uma
inclinação perversa em sua boca sexy. Ele tirou a camisa com as mãos
impacientes, jogando-a de lado. Nenhum vestígio das queimaduras de luz
UV permanecia em nenhum lugar agora. Através de seu peito musculoso
e os cumes de seu estômago, seus glifos agitavam-se, vivos com todas as
cores escuras do desejo.
Atrás do zíper de sua calça jeans preta, seu pênis esticado, grosso
e forte.
A visão de Devony ficou ainda mais quente quando o estudou.
Necessidade rolou por ela, junto com uma onda crescente de
possessividade. Meu.
Ela não sabia se falou a palavra em voz alta ou apenas pensou. De
qualquer forma, vivia em seu sangue. Bateu em suas veias e em todos os
seus sentidos quando ele se aproximou novamente e pegou seu rosto com
as mãos fortes.
— Sim — disse ele, seus olhos ardentes presos nos dela. — Minha.
Ele a beijou até que ela ficou sem fôlego e tremendo em suas mãos,
então lentamente se afundou diante ela. — Abra para mim, baby.
A mão dele separou suas coxas, o polegar passando sobre a crista
de seu sexo. Seu clitóris já estava inchado e dolorido por seu toque.
Quando acariciou seus dedos sobre ela, ela quase chegou ao clímax
instantaneamente.
Um baixo ronronar vibrou profundamente em sua garganta
enquanto pressionava seus lábios contra ela. — Eu poderia ficar bêbado
com seu cheiro — murmurou ele, sua respiração quente patinando sobre
sua carne sensível. — Já sei quão doce você é.
Sua cabeça mergulhou entre as pernas dela. Sua boca se fechou
sobre ela, sua língua mergulhando em suas dobras. Ela gritou quando
ele sugou o feixe apertado de nervos aninhados entre elas. O prazer foi
abrasador, intenso, arrancando um gemido irregular de algum lugar
dentro dela.
E a boca de Rafe era implacável, impiedosa. Ela não conseguiu
diminuir a crescente onda de liberação que se abateu sobre ela. Ela se
despedaçou contra a língua dele, um vendaval contra o outro enquanto
ele a segurava contra sua boca e arrancava até o último suspiro e arrepio
de seu corpo.
Ela caiu para a frente quando os tremores começaram lentamente
a diminuir.
— Deveria ter me avisado que ia fazer isso — murmurou ela, sem
fôlego quando ele se levantou. — Tenho uma banheira enchendo. Deveria
desligar a água antes que a banheira transborde.
Rafe sorriu. — Tenho uma ideia melhor.
Ele a pegou nos braços e a levou para o banheiro.
CAPÍTULO 21
A espuma perfumada envolvia o espaçoso banheiro, mas o óleo de
baunilha e rosas que Devony pôs na água não apagava o cheiro
inebriante de sua excitação. Ou o sabor da sua libertação.
As veias de Rafe martelaram em resposta ao prazer dela.
Cada célula em seu corpo ecoou com o clímax tão poderoso, como
se fosse o seu.
Porra. Ouviu que o vínculo de sangue era intenso, mas não estava
preparado. Não estava nem preparado para o prazer erótico, nem para o
sentimento de conexão, plenitude.
Não estava preparado para Devony Winters, mesmo antes do
sangue dela viver dentro dele.
Rafe pousou os pés descalços nos ladrilhos frios do banheiro.
Esperava tirar apressadamente a sua calça jeans e as botas para que
pudessem continuar de onde pararam, mas as mãos dela estavam ali com
ele, puxando seu zíper enquanto ele se livrava do resto de suas roupas.
Seu pênis estava a ponto de explodir quando ela o libertou de sua
calça e segurou o eixo rígido nas palmas das mãos. Suas próprias mãos
tremiam quando ele tirou a calça jeans e a cueca boxer.
A língua dela encontrou a sua carne e ele assobiou. — Ah, Cristo.
Ela o guiou até a banheira com ela, sua ereção nas mãos
carinhosas. Ela sentou na larga borda de mármore em frente a ele, o que
colocou sua boca no ângulo perfeito para levá-lo profundamente.
E ela o fez.
Santo inferno, ela o levou tão completamente na garganta que sua
visão girou atrás de suas pálpebras fechadas.
Num grunhido, ele agarrou seu cabelo escuro, enrolando a mão nas
cordas de seda. As presas dela arranharam sua pele macia – não o
suficiente para ferir a superfície, mas para deixá-lo louco com o arranhão
erótico das pontas afiadas e a umidade aveludada de sua língua o
acariciando.
Nesse ritmo, não seria capaz de aguentar por muito tempo.
E ele não queria que essa noite fosse sobre o prazer dele. Queria
que tudo pertencesse a ela.
Como um bálsamo para tudo que ela passou com ele esta noite.
Como uma garantia de todas as coisas melhores que ele queria dar
a ela.
Principalmente, como um pedido de desculpas pela honestidade
que ele deixou de dar a ela desde o início, sua devoção ao dever, mesmo
quando seu coração pertencia a ela.
— Venha aqui — rosnou, puxando-a para ele e levantando-a da
borda da grande banheira.
Ela deu-lhe um sorriso sexy. — A retribuição é justa.
— Não esta noite.
Ele a beijou profundamente, lentamente, o gosto dele em seus
lábios fazendo sua excitação aumentar como uma descarga de
eletricidade. A guiou até a banheira e a colocou em seu colo, de frente
para ele.
— Você é tão adorável, Devony. — Ele se inclinou e a beijou,
tomando seu tempo para explorar cada nuance de sua doce boca.
Segurou seu rosto com uma mão enquanto a outra acariciava sua
pele macia. Os glifos dela pareciam quentes e vivos sob as pontas dos
seus dedos, e ele se entregou a uma exploração sem pressa de cada arco
e floreio.
— Tão macia.
Seu seio encheu a mão dele, o mamilo encolheu e esticou entre
seus dedos enquanto o girava apenas o suficiente para arrancar um grito
quebrado dos lábios dela. A coluna dela se arqueou, empurrando-a para
a frente como uma oferenda. Ele se abaixou para poder beijar todos os
lugares em que sua mão esteve, provocando os picos rosados de cada seio
enquanto seus dedos deslizavam na água para acariciar entre suas
pernas.
Rafe não tinha restrições. Não com ela. Ela o fazia desejar muito.
Coisas que não merecia. Coisas que não se atrevia a considerar.
Como mais um gole quente do sangue dela.
O primeiro foi por necessidade. Agora ele ansiava mais. Deus o
ajudasse, ansiava por tudo dela.
Mas isso não se tratava de tomar agora. Ele queria dar.
Queria dar a ela tudo que ela pudesse querer, precisar ou desejar,
e não apenas por esta noite.
Embora devesse assustá-lo, isso não aconteceu.
Não, longe disso.
Deslizando as palmas das mãos por baixo do traseiro dela, ele a
puxou para o seu colo. Seu pênis se projetou para fora da água e da
espuma. Ele levantou-a e juntos colocaram o corpo dela sobre o dele.
— Ohh — suspirou ela, segurando em seus ombros enquanto ele a
perfurava. — Tão bom.
Rafe tinha menos palavras do que ela. Não conseguiu segurar seu
gemido quando ela afundou em seu comprimento, glorioso centímetro por
centímetro. Sua bainha o agarrou, as paredes sedosas ondulando com
pequenos tremores enquanto se ajustavam para acomodar seu tamanho.
As pálpebras de Devony levantaram-se lentamente, revelando as
brasas brilhantes de seus olhos. — Isso parece tão perfeito para você
também?
— Melhor. — Um rosnado enrolou-se na parte de trás da garganta
dele por causa do seu olhar faminto. Ele segurou com mais firmeza as
curvas de sua bunda, guiando seu ritmo quando ela começou a balançar
contra ele.
Ele sentiu seu prazer se enrolar e se soltar com cada longo e duro
deslizamento de seus corpos juntos.
Não conseguia se aproximar o suficiente dela. Nem mesmo quando
estava empalado dentro dela completamente, suas pélvis se esfregando
uma contra a outra.
Ela gemeu quando seu ritmo se intensificou. Rafe a segurou mais
para cima, seus braços fazendo a maior parte do trabalho para os dois
enquanto ela o montava. Seu clímax se elevou sobre ela, estimulando o
dele num galope mais intenso. Lava rugiu em suas veias. Não conseguiu
se segurar. A liberação de Devony bateu ao mesmo tempo que a dele, os
dois se chocando, depois se estilhaçando em uma onda quente.
Ele levantou a cabeça para vê-la gozar e encontrou-a olhando para
ele. Seus olhos ardentes estavam fixos na garganta dele, as presas
afiadas e brilhantes enquanto ela estremecia com a força de seu orgasmo.
Ele nunca poderia se cansar de vê-la assim, sua verdadeira natureza em
plena exibição para ele, sua paixão rendida a ele com completo abandono.
Mas o olhar febril em seu olhar encharcado de prazer era de outra
coisa. Fome. Sede de sangue.
Ele sentiu a extremidade disso. A intensidade perigosa da
necessidade dela.
Ele sentiu a profundidade surpreendente de seu amor... por ele.
Foi uma revelação, uma que o atingiu com a força de um trem de
carga. Olhou para ela, franzindo a testa por sentir a ternura de sua
afeição trançada inseparavelmente com a intensidade de seu desejo por
seu vínculo.
Ela assentiu com a cabeça, um sorriso triste puxando seus lábios.
— É verdade. Me apaixonei por você, Rafe. Não faz sentido tentar fingir
que não quando sei que você pode sentir isso.
Ele fechou os olhos por um momento, balançando a cabeça. — Você
não deveria.
A própria excitação dele se torceu mais forte, a vulnerabilidade dela
em relação a ele despojando as suas defesas. Não que ele tivesse muitas
no que dizia respeito a essa mulher extraordinária.
Devony Winters era dona dele. E tudo o que era macho nele – tudo
o que era Raça – respondeu com uma necessidade selvagem de possuí-la
em todos os sentidos.
Ele se lançou para frente e a levou num beijo forte.
— Foda-se. — Ele se afastou com um silvo. Seus dedos saíram de
sua boca manchados de sangue. — Ah, Cristo... Devony.
Ela mordeu o lábio dele. E agora olhava para ele, sem remorso.
Um aviso brilhou nos olhos dela. Ele sabia que deveria prestar
atenção.
Ele deveria parar com isso agora.
Deveria sair do banheiro antes de irem longe demais.
Tarde demais para isso. O que ardia entre eles não podia ser
desfeito, mesmo sem um laço de sangue para atá-los juntos pelo resto de
suas vidas.
Rafe sabia disso.
Ela entendeu isso também. Ele não podia fingir que não sentia a
certeza de Devony percorrer suas próprias veias a cada batida do seu
coração.
Sabia que deveria ser o mais forte.
Por ela, ainda que não por si mesmo e seu futuro com a Ordem.
Mas esta noite, ele queria que isso fosse sobre ela. Sobre dar-lhe
conforto e prazer. Queria dar a ela tudo que precisasse para superar uma
noite horrível e a feiura que esteve muito perto dela.
Ele veio aqui esta noite querendo dar tudo a ela.
O que ela mais parecia querer agora era a única coisa que ele queria
também. De forma egoísta. Inegavelmente.
— Venha aqui — disse ele, com a voz grave. Pegou seu lindo rosto
e a beijou novamente, incapaz de resistir. Incapaz de negar qualquer
coisa a ela.
E quando sua boca se afastou dele para descer em direção ao seu
pescoço, tudo o que conseguiu fazer foi dar um grunhido estrangulado
quando seus lábios se assentaram sobre a carótida dele e as pontas
afiadas das presas afundaram em sua pele.
Seu corpo se arqueou violentamente, uma maldição crua saindo de
seus lábios. O calor da boca dela em sua veia, a língua lambendo
avidamente dele, era o prazer mais erótico que já conheceu. Seu pênis
respondeu instantaneamente, voltando à vida dentro dela. Ele se moveu
embaixo dela, incapaz de impedir que seus quadris se empurrassem no
ritmo da gulosa sucção dela.
Ela gemeu contra ele, sua coluna ondulando. Seu sexo agarrou-o
como um punho. Ela empurrou com força nele, seu sangue alimentando
uma sede sexual ainda mais selvagem em ambos agora. Uma que exigia
ser saciada.
A excitação de Devony martelou através dele, através do recém-
criado vínculo de sangue deles, mais vívido do que nunca.
Seu amor se derramou nele também. Brilhante, feroz e poderoso.
Sua confiança nele queimava.
Por mais que quisesse uma vida com ela, isso não era dele para
prometer. Não quando a Ordem possuía seu futuro e a Opus Nostrum
ainda tinha o controle sobre o seu presente. Se seus inimigos soubessem
quão grande Devony poderia ser uma fraqueza para ele, não havia dúvida
de que usariam esse conhecimento contra ele. E se alguma coisa
acontecesse com ela por causa dele...
A culpa o esfaqueou com o pensamento.
Ah, Cristo. Isso foi um erro.
— Chega — proferiu. Quando ela não parou imediatamente, ele
soltou uma maldição apertada. — Suficiente.
Sua língua varreu os furos que ela fizera, selando-os. — Rafe, eu...
— ela respirou hesitante, ainda aninhada sob o queixo dele. — Eu sinto
muito...
Ele rosnou ao ouvir seu pedido de desculpas incerto. — Não —
disse ele, acariciando seus cabelos. — Merda. Não é... não é nada que
você fez de errado. Não pense isso.
— Então por que sinto que é? — Ela se afastou e olhou para ele,
confusão e dor nadando em seus olhos derretidos.
Ele mal podia encarar o olhar ferido dela. — Porra.
Alguma parte lamentável dele queria nada além do que sair da
banheira e fugir antes que a machucasse mais. Mas o desejo ainda
pulsava em suas veias, quente e incontido. Ele não podia acrescentar
rejeição em cima do arrependimento que já havia causado a ambos.
Ela não resistiu quando ele a puxou e cobriu a sua boca com a
dele.
O laço de sangue tinha suas amarras enroladas em ambos.
Rafe a beijou devagar e profundamente. A necessidade dela se
enroscou rapidamente, fora de seu controle. O som angustiado que ela
fez quase o matou. Com uma dura maldição, ele a virou e a colocou de
joelhos na água e a penetrou por trás.
Ele não conseguia olhar nos olhos dela enquanto seu remorso o
mantinha preso em garras frias.
Mas podia dar prazer a ela.
Ela balançou contra ele, vencida pela intensidade do vínculo. Essa
era a ironia disso agora. Não importa quão indigno ele sabia ser, a
conexão deles não podia ser negada.
Quando Devony soltou um grito e convulsionou com a explosão de
um orgasmo feroz alguns momentos depois, ele a segurou contra ele e a
seguiu até aquele fogo.
CAPÍTULO 22
Ele se sentiu como o pior tipo de covarde deixando Devony no
quarto de hóspedes com a cabeça cheia de dúvidas e um coração cheio
de dor.
A desculpa de que era esperado numa reunião com Sterling Chase
era a verdade, mas tinha um sabor tão horrível quanto uma mentira
quando ele fechou a porta do quarto e seguiu pela mansão a caminho da
área de operações do centro de comando. Ela não o pressionou para
explicar sua retirada abrupta depois que ela bebeu dele.
Foi assim que ele soube que a feriu profundamente. A mulher que
ele conheceu há alguns dias o teria confrontado. Ela não hesitaria em
discutir e exigir sem medo que ele se explicasse.
Esta noite, ela recuou sem uma palavra de confronto. Porque temia
o que ele poderia dizer.
Ela não precisava dizer isso a ele; ele sentiu o medo dela através do
vínculo.
Medo que ele causara ao manter o dever acima de seu próprio
coração.
Pior, ao manter o dever acima do dela.
Rafe seguiu pelo longo corredor da ala residencial da imensa
mansão, seus passos desacelerando por conta própria quando alcançou
a câmara que fora sua até as últimas semanas.
Não sabia por que se sentia compelido a entrar. Não seria dele
novamente até que sua missão estivesse oficialmente terminada. Talvez
nem mesmo então, porque pretendia terminar essa missão esta noite.
Ainda estava comprometido em derrubar a Opus Nostrum. Isso
nunca mudaria até que conseguisse ou desse seu último suspiro. Mas se
a Ordem quisesse que ele cumprisse esse objetivo como um deles, ele
contaria tudo a Devony. Com ou sem a bênção deles.
E ele ia informar Chase e Lucan sobre esse fato agora.
Preferiu não fazer isso usando roupas manchadas de sangue e
morte. Após o banho com Devony, parecia quase um sacrilégio colocá-las
novamente, por isso ele ficou feliz por encontrar seu armário ainda cheio
de roupas de rua e equipamentos de combate, assim como o deixara.
Vestiu um jeans básico e uma camiseta preta, depois colocou um
par de botas de couro preto. Enquanto amarrava o último nó e se
levantava para sair, encontrou Tavia Chase na porta aberta.
— Você manteve meus aposentos para mim.
A companheira de seu comandante sorriu. — Claro que sim.
Esperava que voltasse eventualmente. Agora, não tenho tanta certeza.
Tavia sabia desde o começo que seu exílio era parte da operação.
Mas não falava sobre ele voltar de sua missão. Ela falava para sempre.
E ele não conseguia dizer a ela nada diferente.
— Devony é uma jovem especial — disse ela. — Pude ver isso logo
de cara. Posso ver por que você a ama.
Rafe fez uma careta, mas não conseguiu negar. Tavia era muito
astuta para acreditar no contrário. Ele cresceu na Ordem desde que era
criança. Os guerreiros mais velhos e suas companheiras eram sua
família, seus companheiros eram mais próximos do que qualquer irmão
poderia ser.
Quanto à Tavia, era uma estrategista respeitada e um membro
valorizado da equipe da Ordem, muito parecida com o resto das
companheiras dos guerreiros. Agora, o que Rafe precisava era de uma
confidente.
— Bebi dela esta noite. Fui ferido e ela me ajudou. — Ele abaixou
a cabeça e xingou baixinho. Porque tomar o sangue dela num momento
de fraqueza seria egoísta o suficiente, mas depois ele foi e piorou as
coisas. — Há pouco tempo, deixei-a beber de mim. Estamos ligados por
sangue, Tavia.
— Parabéns.
— Não. — Ele balançou a cabeça. — Não, fiz tudo errado. Fodi tudo.
Estamos juntos por causa de uma mentira. Porque eu estava numa
missão e ela era uma vantagem que eu precisava conquistar. Então
descobri seus segredos e os explorei. A fiz pensar que ela podia confiar
em mim.
— Está dizendo que ela não pode?
— Não, não é isso. Faria qualquer coisa por ela. Daria minha vida
pela dela.
O olhar gentil de Tavia o segurou. — Espero que não chegue a isso.
— Depois do que aconteceu em Montreal, disse a mim mesmo
nunca mais. Nunca confiaria em mim mesmo para acreditar no que
estava sentindo, porque poderia não ser real. Nunca mais ficar cego
assim novamente.
— Você foi enganado, Rafe. — Tavia balançou a cabeça. — Essa
espiã da Opus poderia ter escolhido qualquer um. E pelo o que vi de
Devony esta noite, não acho que ela poderia ser mais diferente.
— Eu sei disso. Não é de Devony que eu duvido.
— Então o que?
— Isso. — Ele segurou seu punho no esterno, onde parecia que um
buraco estava se abrindo.
Isso só piorou depois que permitiu que Devony bebesse de sua veia
enquanto ela ainda tinha fé nele. Este sentimento impotente era amor?
— Devo estar louco, certo? Devo estar doido por me sentir assim
sobre Devony quando a conheço há apenas alguns dias.
Tavia sorriu. — Terá que perguntar a alguém que não seja eu. De
fato, terá que procurar além desta cidade. Não acho que exista ninguém
sob este teto ou em qualquer outro centro de comando de Ordem ao redor
do mundo, incluindo seus pais, que precisaram de mais tempo do que
você e Devony tiveram para saber em seus corações que haviam
encontrado seu companheiro.
Por mais que quisesse ter algum consolo nisso, o que significava
era que ele tinha muito o que explicar. E muito a compensar.
Só esperava que Devony lhe desse essa chance.
Primeiro, precisava informar seu comandante e Lucan que, a partir
de agora, teriam que confiar nela assim como ele.
Ao sair pela porta, Tavia estendeu a mão e deu em sua bochecha
barbada uma carícia reconfortante. — Sei que Sterling não está feliz com
você agora, mas não posso agradecer o suficiente por cuidar da minha
sobrinha. Por amá-la. O resto se encaixará como deveria, você vai ver.
Ele não tinha certeza disso, mas assentiu. Ela o acompanhou
enquanto ele seguia até a sala de guerra do centro de comando.
Estava esperando que a reunião fosse entre Chase e ele em Boston,
com Lucan e Gideon em vídeo da sede em D.C. Esse era o caso, mas além
disso, todos, exceto dois assentos na grande mesa de conferência,
estavam preenchidos. Tavia entrou e pegou o imediatamente ao lado do
comandante.
Elijah e Jax estavam sentados com Nathan e Jordana de um lado
de Chase, com uma cadeira vazia entre o comandante e o capitão de Rafe.
Do outro lado da mesa de Chase estava o comandante da equipe de
Londres, Mathias Rowan. Ele não trouxera a sua companheira grávida,
Nova, mas o irmão dela, Rune, estava sentado ao lado de sua
companheira de sangue, Carys Chase.
E exibidas nas grandes telas do painel ao redor da sala de guerra
todas as fotografias, anotações e arquivos de dados que Rafe coletou
enquanto estava na casa de Devony algumas noites atrás.
Considerando que os originais não eram nada além de cinzas entre
os escombros de sua casa, provavelmente deveria estar grato por ver a
informação agora. Em vez disso, a culpa que sentiu ao deixar Devony no
quarto de hóspedes, há alguns minutos, apenas se acomodou mais
friamente em seu estômago.
Todas as informações que ela compartilhou com ele em confiança
pareciam uma traição ao vê-las aqui agora.
Nauseado por causa desse sentimento, mal notou que todas as
conversas pararam agora que ele havia chegado. Olhares expectantes e
ilegíveis o observavam de todos os pontos da sala.
Chase indicou a cadeira vazia. — Entre e sente-se, Rafe.
Ele entrou, o silêncio à sua volta parecendo tão pesado quanto uma
mortalha.
Ao sentar-se, Nathan lançou um olhar sóbrio e de esguelha. Em
seguida, um sorriso raro torceu a sua boca severa. — Seu idiota. Tem
alguma ideia de como cheguei perto de matá-lo na outra noite?
Rafe exalou e olhou para o comandante em busca de confirmação.
— Eu disse a eles — disse Chase.
A sala de guerra entrou em erupção com algumas risadas e muita
balbúrdia. Rafe ouviu tudo, contente por cada insulto e soco bem-
humorado que lançaram nele. O peso das últimas semanas – os meses
que se seguiram à sua desonra em Montreal – se dissiparam no espaço
de alguns segundos.
Jax e Eli se levantaram de seus assentos na mesa e se
aproximaram dele, ambos sorrindo e balançando a cabeça.
Eli lhe deu um soco no ombro. — É um grande alívio saber que
você não é o maníaco que pensei que fosse.
— Não tenha tanta certeza sobre isso — brincou Rafe, sorrindo para
seu companheiro de equipe.
Jax estendeu a mão para ele. — Bem-vindo de volta, mano. Embora
eu ainda queira chutar sua bunda agora mesmo.
Rafe deu um sorriso. — Gostaria de ver você tentar.
Carys e Rune vieram agora também. O severo ex-lutador de gaiola
que era o companheiro dela apertou fortemente a mão de Rafe. — Não
passou um dia que ela não se preocupasse com você.
Ele olhou para Carys, que foi como uma irmã para ele toda a sua
vida. — Eu sinto muito. Não podia dizer nada para ninguém.
— Não me importo — disse ela, jogando os braços ao redor dele. —
Você está de volta onde pertence agora, e isso é tudo que importa para
mim.
Mathias Rowan também se aproximou. O comandante de Londres
fazia parte do círculo íntimo da Ordem por duas décadas, um aliado
estoico através de numerosas batalhas e catástrofes. Agora, havia um
olhar sóbrio e quase parental em seu olhar. Sem dúvida, o futuro pai
estava pensando em seu próprio filho a caminho, alguém que poderia
eventualmente querer seguir seus passos como guerreiro da Ordem.
Mathias agarrou o ombro de Rafe. — Chase me contou o que
aconteceu naquele depósito mais cedo esta noite. O UV líquido. — Ele
balançou a cabeça numa maldição baixa. — É muito bom ver você aqui
com a gente esta noite, Rafe.
Ele não estaria, se não fosse por Devony.
Ele não precisava dizer isso a Mathias. Desde que Chase contou a
seu bom amigo sobre os ferimentos de Rafe, ele também explicou ao
comandante de Londres que foi sangue Raça que o salvou.
Sangue de Devony.
O vínculo dela.
Ele queria dizer a todos na sala o que ela significava para ele, mas
o barulho de conversas concorrentes foi interrompido pelo zumbido da
unidade de comunicação de Chase. Ele atendeu à chamada, franzindo a
testa ao receber o relatório.
— Era Aric e sua equipe — anunciou ele depois de colocar o telefone
na mesa. Olhou para Rafe. — O armazém no Terminal Conley estava
limpo no momento que nossa equipe chegou. Nenhum cadáver. Nenhuma
caixa de UV líquido. Nenhum vestígio do vazamento também.
— A Opus se moveu rapidamente. Sabiam que íamos procurar
pegar o resto da carga.
Chase assentiu. — Eu chamei a equipe de volta. Estarão aqui
dentro de uma hora.
— Alguma ideia de quem é o dono do armazém? — perguntou
Mathias.
— Sim — disse Gideon através do feed de vídeo. — Cerca de cinco
camadas de corporações de fachada. Tenho hackeado através delas pela
última hora.
— Um dos caras da gangue de Cruz me disse que a merda que
roubávamos pertencia a algum tipo de traficante de armas — disse Rafe.
— E Cruz mencionou que a carga estava chegando do exterior.
— Ótimo. Isso ajuda. — A resposta de Gideon foi pontuada pelo
barulho do teclado do outro lado. — Não deve demorar muito para
encontrar o bastardo.
— Precisamos dessa pista — disse Lucan, seu rosto sombrio
enchendo outro dos monitores que estavam ligados na sala de guerra. —
Com Judah LaSalle morto, esse traficante pode ser nossa próxima melhor
pista. Qualquer um de posse de UV líquido está na cama com a Opus
Nostrum ou é concorrente deles. Não dou a mínima em qual dos lados
está esse filho da puta. Só o quero em nossas mãos para ontem.
— Vou colocar uma equipe nele assim que tivermos a sua
informação — disse Chase.
Lucan assentiu, olhando para Rafe. — Excelente trabalho em tudo
isso. Sei que não tem sido fácil para você, vivendo assim nas últimas
semanas. Ou mais recentemente.
— Não, senhor. — Rafe pigarreou. — Ah... sobre isso.
Quando ele veio para cá com a intenção de explicar ao seu
comandante e ao líder da Ordem o que Devony significava para ele, não
esperava uma audiência de toda sua equipe. Mas as palavras precisavam
ser ditas e não podia esperar mais um momento para colocá-las lá fora.
Ele estragou as coisas com ela, não só esta noite, mas desde o
começo. Só esperava que tivesse chance de corrigi-las.
— É sobre Devony — disse ele. — Cometi um erro terrível com ela...
Ele sentiu a presença dela através do vínculo de sangue... mesmo
antes de ouvir a sua arfada do lado de fora da sala.
Ele se virou e lá estava ela.
Toda a respiração deixou seus pulmões numa maldição.
Ela olhou para ele, mas apenas por um segundo. Seu olhar ferido
foi para os outros membros da Ordem reunidos ao redor da sala ao lado
dele. Seus amigos, obviamente. Companheiros de equipe que ele nunca
realmente perdeu.
Então ela olhou para as telas que continham todas as informações
que ela havia revelado para ele na privacidade de seu Darkhaven. Todas
as notas e teorias meticulosas do seu pai. Seus meses de trabalho em
sua busca para vingar sua família assassinada.
Todos os segredos que compartilhou com Rafe nos momentos antes
dele tirar sua virgindade no chão do escritório do seu pai.
Cristo.
Ele a sentiu atordoada como uma pancada no peito. Seu
sentimento agudo de traição o perfurou.
— Devony.
Ela se afastou em silêncio.
— Devony, espere.
Ela deu um passo para o corredor.
Então, num flash de movimento, ela se foi.
CAPÍTULO 23
Ela era uma idiota.
Ele disse a ela que era perigoso. Disse que ela não sabia no que
estava se envolvendo. Que não seriam amigos ou qualquer outra coisa.
Ela não acreditou nele.
Ainda não queria acreditar, e ainda assim acabara de ver a
evidência de sua duplicidade com seus próprios olhos. Ela sentiu isso. A
culpa dele penetrou nela pelo laço de sangue, parecendo tão espessa e
negra quanto o óleo.
Ele a traiu.
Mentiu para ela.
A usou.
Um soluço sufocado ficou preso em sua garganta enquanto se
movia pela mansão da Ordem como um flash. Ela voltou correndo para o
adorável quarto de hóspedes que Tavia Chase providenciou para ela,
sentindo-se à beira de um hediondo colapso emocional.
Não podia se deixar desmoronar. Aqui não. Não quando Rafe e o
resto de seus companheiros provavelmente estavam na sala de reuniões
do centro de comando, dando risadas sobre sua ingenuidade. Sua
estupidez cega.
Sua loucura por permitir-se apaixonar por ele. Por ligar-se a ele em
sangue.
Oh, Deus.
Precisava sair de lá.
Bateu a porta e a segurou com a mente enquanto rapidamente
trocava as roupas emprestadas de Carys e colocava novamente a camisa
de gola alta preta e calça jeans sujas com as quais ela havia chegado. Não
queria nada que foi oferecido aqui. Nem o conforto ou a roupa, nem a
gentileza também. Não se nunca foi real.
Especialmente não queria nada de Rafe.
— Devony. — Ele estava do outro lado da porta fechada.
Ela o ouviu tentar abrir a porta, ouviu-o xingar quando não
conseguiu romper o bloqueio mental que ela tinha na fechadura.
Só queria se afastar dele.
— Me deixe em paz.
— Não posso fazer isso. — Ele tentou a fechadura novamente.
Outra maldição vívida. — Droga, Devony. Preciso ver você. Preciso falar
com você, e não através desta porta.
Ela não respondeu. Principalmente porque não confiava em sua
voz. Podia sentir a sinceridade do pedido dele. Ele estava magoado
também. Se sentia tão terrível quanto ela. Talvez mais, embora como isso
pudesse ser possível, ela não sabia.
Bom. Deixe-o se sofrer também.
— Vá embora, Rafe. Volte para seus amigos. Eu estou indo em...
O grosso painel de madeira explodiu nas dobradiças, estourando
para dentro. Rafe estava na porta arruinada, um olhar de pura angústia
em seu rosto bonito.
— Devony, me desculpe.
— Por qual parte? Fingir que éramos algum tipo de equipe quando
ainda fazia parte da Ordem? Roubar semanas do meu trabalho e do meu
pai e depois entregá-lo aos seus companheiros pelas minhas costas? —
Ela balançou a cabeça. — Acho que você aprendeu alguns truques com
aquela espiã da Opus, não foi?
— Isso não é justo — disse ele calmamente. — Mesmo que eu
mereça cada pedaço de sua raiva.
Ela se recusou a ser ludibriada pela sua sinceridade agora. Não
quando ele a deixou neste quarto há apenas uma hora, sentindo a dor da
culpa dele esculpir um vazio em seu peito. Ele cometeu um erro com ela.
Foi o que ele disse a todos naquela sala agora mesmo.
Ela cometeu um ainda maior ao confiar nele.
Por se apaixonar por ele.
E agora ele sabia de tudo isso porque podia sentir suas emoções
mais fortes através do vínculo deles. O vínculo que ele lamentou quase
desde o instante que a deixou tomar o primeiro gole de sua veia.
— Até onde teria ido para conseguir o que queria de mim, Rafe?
Deus, nem sequer fiz você trabalhar tão duro. Não precisou me seduzir
pela informação. Estava muito feliz em me atirar para você.
Sua testa franziu numa profunda carranca. — Nunca foi sobre isso.
Nada que fizemos juntos teve qualquer coisa a ver com o fato de eu querer
suas informações. Não temos nada a ver com meu trabalho para a
Ordem. Cristo, não poderia estar mais longe da verdade.
— Você foi afastado da Ordem?
— Não. Isso fazia parte do meu disfarce. — Ele continuou sem ela
pedir mais explicações. — Comecei a me distanciar de meus colegas de
equipe pouco depois de voltar de Montreal. Então fabricamos algumas
exibições públicas da minha insubordinação, o suficiente para fazer com
que as línguas abanassem antes que Chase e Lucan fabricassem minha
expulsão da Ordem. Muito poucas pessoas sabiam da verdade. Meus
comandantes, meus pais. Precisava ser sólido. Precisávamos que Cruz e
seus associados acreditassem que eu havia sido expulso para que me
dessem uma chance. Então confiariam em mim o suficiente para me
deixar entrar.
— Eu precisava acreditar nisso também. Certo?
Ele assentiu, sua expressão grave.
— Poderia ter me dito, Rafe. Eu manteria seu segredo. Você poderia
ter confiado em mim. — Ele não tinha resposta para isso, nenhuma
resposta. Ela sabia que estava pedindo a ele para escolhê-la acima de seu
dever para com a Ordem, mas, caramba, ela queria pensar que ele podia
ter pelo menos considerado isso. Seu silêncio estava a matando. —
Quando deu meus arquivos e informações à Ordem?
— Na noite depois que fizemos amor pela primeira vez. — Ele exalou
um suspiro curto. — Não fiz isso para te machucar. Na verdade, eu queria
te ajudar.
— Me ajudar. — Ela zombou, sua garganta crua de emoção. — E
se tivéssemos chegado perto do nosso objetivo, se tivéssemos nos
aproximado da Opus, você teria me ajudado a destruir quem matou
minha família?
Ele não disse nada por um longo momento, então, finalmente, ele
balançou a cabeça. — Não, Devony. Não deixaria você chegar perto desse
tipo de perigo. E ainda não vou.
— Você não tem nada a dizer sobre isso.
— Sim, eu tenho. — Ele deu um passo na direção dela, com cautela,
como se ela fosse um animal selvagem prestes a fugir. — Eu tenho algo
a dizer sobre isso porque meu sangue vive em você agora, e o seu em
mim.
Ela gemeu, desesperada para se afastar dele agora. — Não fale
comigo sobre nosso vínculo. Senti seu arrependimento, Rafe. Senti o
quanto desejou que pudéssemos voltar atrás.
— Sim, eu fiz — disse ele, uma nitidez afiando sua voz profunda.
— Queria voltar atrás porque sabia que não fui honesto com você.
— Bem, agora temos honestidade — retrucou, à beira das lágrimas
que se recusava a derramar na frente dele. — E agora estamos presos
num vínculo de sangue, e nenhum de nós o quer mais.
A picada dessa afirmação cruzou os traços dele como um chicote.
— Maldita seja, Devony.
Ele estendeu a mão para ela e ela se esquivou de seu toque. Assim
que se esquivou, saiu do quarto de hóspedes e passou pela ala residencial
da mansão.
Mas Rafe também era Raça. Era mais rápido, e já estava parado na
frente dela quando diminuiu no hall de entrada e alcançou a maçaneta
de bronze polido da porta. Ele bloqueou sua saída, seus olhos queimando
com faíscas de âmbar.
Suas presas afiadas brilharam quando falou. — O que você está
fazendo?
— O que você acha? Estou indo embora.
— Para onde?
Ela não sabia. Descobriria mais tarde. Tudo o que sabia era que
precisava se afastar dele, ficar longe deste lugar. Não conseguia pensar
quando o seu coração estava se rachando em seu peito.
— Saia do meu caminho, Rafe.
Ele não vacilou. — Fale comigo, por favor.
— Não temos mais nada a dizer.
— Não é verdade — disse ele, balançando a cabeça. — Tenho muito
a dizer. E vou começar dizendo que eu te amo.
Deus, por que ele estava determinado a vê-la desmoronar? Ele já
não a machucou o suficiente?
Ela sentiu a sinceridade dele. Até sentiu o amor dele também. Mas
isso não aliviou a dor de sua traição.
Um soluço engatou em sua garganta. — Por favor, saia da frente,
Rafe.
— Não posso fazer isso.
Ele não a deixaria ir. Ele estendeu a mão para ela, e ao invés de
voar em seus braços do jeito que queria fazer tão desesperadamente, ela
estendeu as mãos. Pressionou as palmas das mãos no calor sólido do
peito dele e as manteve lá.
Viu o momento em que ele percebeu o que ela estava fazendo. Seus
olhos se arregalaram, mas já era tarde demais. Ela já havia estabelecido
a conexão.
Ela gritou enquanto colocava tudo que tinha em seu toque. Numa
explosão de fúria, ela desviou seu poder... e toda sua força.
Com um gemido atordoado, ele caiu de joelhos no tapete grosso.
Ela soltou então, suas mãos tremendo e seu coração se
despedaçando.
Ele ofegou seu nome quando a inconsciência o derrubou.
Devony se atrapalhou com o trinco da porta, mal se segurando
enquanto fugia para a luz do amanhecer.
CAPÍTULO 24
Quando Rafe abriu os olhos, era como se alguém tivesse o
esfaqueado com punhais aquecidos.
Fechou as pálpebras rapidamente e soltou um gemido. Droga.
Alguém amarrou um torno em volta de seu peito enquanto estava
inconsciente? Sua garganta tinha gosto de cinzas também.
Ele doía em todos os lugares. Seus membros, seu torso.
Porra, até o cabelo doía.
Mas estava vivo.
Sabia que estava, porque apesar de toda a dor no corpo, era o
coração dele que doía mais. E santo inferno, isso era dizer alguma coisa.
Ergueu as pálpebras novamente, lutando contra a agonia da luz
que atingia suas retinas. Uma grande sombra embaçada na frente dele
tomou forma lentamente.
— Tirou uma boa soneca? — Nathan pairou sobre ele, olhando para
ele do lado de uma cama de enfermaria onde Rafe estava deitado. — Como
está gostando dessa enxaqueca de corpo inteiro? A verdadeira diversão
não começa até você tentar se sentar.
— Merda. — Rafe tentou levantar a cabeça e a onda de náusea o
atingiu.
A boca de Nathan se torceu. — Sim, aí está.
Rafe gemeu quando caiu de volta no travesseiro. — Devony...
— Ela se foi. — Por mais divertido que seu capitão de equipe
parecesse estar sobre o desconforto físico de Rafe, seu tom agora era
quase gentil. — Ela deixou a mansão logo após drenar seu poder e o
derrubar no hall da entrada.
— Quanto tempo? — A pergunta foi arrancada dele, não só porque
seus pulmões pareciam contraídos pelos efeitos posteriores do soco
poderoso de Devony. — Quanto tempo desde que ela saiu?
— Duas horas.
Ah, Cristo. Duas horas sozinha na cidade, enquanto o esquadrão
da morte da Opus poderia estar procurando por ela? A ideia enviou uma
enxurrada de medo frio cortando suas veias. Sabia que Devony era forte
e inteligente. Malditamente dura. Era uma fêmea Raça, pelo amor de
Deus. Ele sabia que era capaz de se defender sozinha. Afinal, ela o
derrubou facilmente e ele era um guerreiro testado em combate e tinha o
dobro do seu tamanho.
Ela não precisava que ele cuidasse dela, mas odiava a ideia de que
ela estivesse sozinha. Ela também estava sofrendo e magoada – tudo por
causa dele.
Se suas ações descuidadas a levassem ao perigo, nunca seria capaz
de viver com isso.
Rafe levantou-se do colchão fino, empurrando a dor. — Preciso ir
atrás dela. Tenho que... encontrá-la.
— Ainda não está em condições de fazer isso — disse Nathan.
E maldição, ele estava certo. A cama girou debaixo dele apenas por
causa daquele pequeno movimento. O quarto cambaleou diante do rosto
dele como um espelho de parque de diversões.
— Essa sua fêmea dá um soco infernal. Infelizmente, falo por
experiência.
Rafe se inclinou para a agonia, empurrando-se para uma posição
sentada. Seus membros pareciam gelatinosos, longe de serem funcionais.
— Quanto tempo isso dura?
Nathan grunhiu. — Demorou cerca de três horas antes que eu
pudesse sentir meus pés novamente. Jordana se recuperou mais
rapidamente, então, aparentemente, quanto maior o alvo, mais forte
caímos. Ela não está chateada com você, mas parte de mim ainda quer
te matar por ter um papel em fazer a minha companheira passar por isso.
— Sinto muito — disse Rafe. — E sei que Devony também sente
muito. Ela não queria machucar nenhum de vocês.
— Ela fez isso para proteger você.
Rafe assentiu com a cabeça, um movimento que fez seu crânio
pulsar.
Teria feito o mesmo por ela, se fosse capaz. Ele ainda faria qualquer
coisa para protegê-la. E ainda assim, a enganou e partiu seu coração.
Ele a machucou mais do que qualquer outra pessoa poderia. Ele
sentiu isso nos momentos antes que ela o derrubasse com seu incrível
poder.
— Ela ama você — disse Nathan. — Vi no rosto dela naquela noite
no museu.
— Agora ela me odeia.
— Realmente acredita nisso?
Ele encolheu os ombros. Cuidadosamente sacudiu a cabeça
latejante. Mesmo que ela tivesse ido embora, podia senti-la através do
vínculo deles.
Ela não o odiava. Ele ainda podia sentir o amor dela, e isso lhe dava
um pequeno vislumbre de esperança de que poderia consertar isso.
Mas agora, sua mágoa era mais forte do que qualquer outra coisa
que ela sentisse.
Se ela não pudesse perdoá-lo, ele poderia perdê-la para sempre.
— Tenho que ir. — Ele balançou as pernas mortas sobre o lado da
cama de enfermaria. — Tenho que encontrá-la e trazê-la de volta.
Uma voz profunda e sardônica respondeu da porta aberta. — Então
precisará de asas.
Rafe olhou ao redor de Nathan e viu Aric Chase passear pelo
quarto. Ele parou ao lado da cama e exalou um suspiro. — Você parece
uma merda.
Rafe riu e foda-se, isso doeu. Apenas seu melhor amigo poderia
tirar um sorriso dele quando seu corpo era um nó fraco e seu coração
estava retalhado em seu peito. — Bom te ver também. O que sabe sobre
Devony? Onde ela está?
— A caminho de Londres, evidentemente. Gideon acabou de
mandar uma mensagem que ela apareceu num voo comercial para
Heathrow esta manhã. Ela deve pousar em cerca de cinco horas.
Londres. Ela estava indo para casa, mesmo que não quisesse voltar
para lá novamente depois de perder sua família.
— Preciso ir para lá também. Preciso fazer com que ela me escute.
— Rafe tentou se levantar, mas caiu de volta na cama. — Droga.
Aric deu-lhe um olhar avaliador. — Esta fêmea realmente fez um
número em você, hein?
Não falava sobre o fato de que ela o nocauteara hoje. E Rafe não
iria fingir com qualquer um dos seus amigos mais próximos que não
estava fora de si de tristeza pelo fato de perder a confiança de Devony
hoje.
Que poderia a ter perdido para sempre.
— Estamos ligados. Eu tomei o sangue dela. Porra, tomei muito
mais do que isso dela. — Ele encontrou os olhares sóbrios dos dois
machos Raça. — Então, ontem à noite, depois que nós chegamos aqui,
eu a deixei beber de mim também. Eu a amo e agora ela acha que a usei
como um trunfo para minha missão. Acha que a usei para obter as
informações. Merda. Ela acha que eu escolhi a Ordem em vez dela.
— Você não escolheu? — A lógica de Nathan, como de costume,
cortou tão limpa e friamente como uma faca.
Rafe queria se enfurecer com seu amigo, mas até mesmo sua raiva
falhou.
Porque o que o ex-assassino disse era verdade. Ele escolheu a
Ordem em vez dela.
Rafe se arrependeu disso agora. Se arrependeu desde o começo. E
se arrependeria pelo resto de sua vida eterna.
Porque Nathan estava certo. Devony estava certa.
Ele havia escolhido o dever sobre ela.
E não havia como voltar atrás agora.
CAPÍTULO 25
Devony pagou ao motorista de táxi em dinheiro enquanto descia na
calçada em frente ao Darkhaven de sua família em South Kensington.
Após deixar a mansão da Ordem em Boston, ela foi diretamente
para o aeroporto e para um pequeno armário onde guardava seu
passaporte e alguns milhares de dólares em diferentes moedas. Não
cresceu numa família de espiões e policiais sem pegar algumas dicas
profissionais ao longo do caminho.
Usar sua verdadeira identidade e viajar em público enquanto os
capangas da Opus poderiam estar em seu rastro era um risco, mas ela
não tinha muita escolha. Agora que estava longe de Boston, se permitiu
exalar um pouco da paranoia que havia se agarrado a ela até agora.
As encantadoras mansões de tijolos e estuque da Onslow Square,
com suas cercas pretas de ferro forjado e entradas clássicas de colunas
brancas, sempre foram uma visão acolhedora e reconfortante para ela.
Do outro lado da rua, enquanto os últimos raios do sol se punham sobre
a tranquila praça do jardim, os pássaros cantavam no parque repleto de
árvores que ela costumava brincar quando criança.
Agora, a paz era apenas uma fachada.
A familiaridade não lhe dava consolo, porque mesmo que tivesse
fugido para o único lugar que lhe restava, estava vindo para cá
destroçada, com o coração em farrapos. E com a sua família morta,
aquele quarteirão perfeito em Londres nunca mais voltaria a ser o seu
lar.
O Darkhaven estava vazio há meses, tudo exatamente como seus
pais deixaram. Suas vidas foram interrompidas, todos os quartos e
móveis congelados no tempo.
Agora que Devony estava lá, desejava não ter vindo. Se arrependeu
de sair de Boston assim que pisou no avião.
E estava doente consigo mesma pelo que fez a Rafe em seu
desespero para preservar seu orgulho – o pouco que restava a ela no que
dizia respeito a ele.
Foi o medo que a fez correr quando ela queria ficar.
Esse tipo de covardia nunca foi seu estilo.
Agora, Rafe estava a milhares de quilômetros de distância, em
agonia física pelas últimas horas. Ela sabia por que também sentia a dor
dele. Sua ligação com ele lhe transmitia a angústia dele da mesma forma
que a conectava ao seu prazer.
Ela mal conseguiu suportar a maior parte de seu voo para Londres.
Sentir a profundidade de seu amor por ela só tornava o pensamento
de sua dor mais insuportável.
Ela o machucou, não apenas fisicamente.
Deus, como eles se feriram.
Ela achava que a Opus Nostrum havia matado tudo o que
importava para ela, mas estava errada. Porque Rafe Malebranche matou
o seu coração.
Não importava que o conhecesse apenas por alguns dias. Ele
invadiu sua vida e agora ela nunca seria a mesma.
Ela o amava, apesar dele a ter magoado. Não conseguia parar só
porque seu coração estava partido. Agora, o amaria com todos os seus
pedaços quebrados.
Devony atravessou todos os cômodos do Darkhaven, sentindo-se
como um fantasma. Seu quarto era uma relíquia de sua infância. Ainda
mantinha os tons rosados femininos e os móveis delicados e requintados
que sua mãe a rodeara na esperança de que sua filha teimosa gravitasse
em direção a uma vida mais tranquila do que a dela.
Ela olhou para sua roupa preta suja e desgastada pela batalha e
botas de motoqueiro. Quão desapontada sua mãe devia estar com ela.
Devony nunca escolheria o caminho mais seguro e tranquilo. Ela
tentou, por eles. Os estudos de música, as aulas universitárias. Embora
gostasse dessas atividades, não a preenchiam. Ela ansiava por fazer a
diferença no mundo. Sentia a necessidade de um chamado maior.
Não se atreveu a alcançá-lo até depois de perder todos que amava.
Não imaginou que havia um jeito de realmente fazer a diferença até que
começou a trabalhar junto com Rafe em sua busca compartilhada para
destruir a Opus Nostrum.
Tudo mentira.
Compartilhavam esse objetivo comum, mas ele nunca esteve
trabalhando com ela. Estava fazendo ela de tola, usando as informações
dela para ajudar seus verdadeiros companheiros de equipe na Ordem.
Estava sozinha em sua busca agora, e nada da sua determinação
de vingar sua família havia desaparecido desde que deixou Boston. Deixe
a Ordem ter todas as anotações e pesquisas de seu pai, junto com o seu
trabalho de reconhecimento dos últimos meses. Ela podia recomeçar.
Agora que tinha um alvo da Opus em suas costas, ela teria que começar
tudo de novo.
Novo nome. Nova aparência. Novos alvos e plano de ataque.
Vida nova.
Uma que provavelmente não incluiria Rafe. Essa última parte era
a que mal podia suportar imaginar.
Depois de uma rápida ducha e troca de roupas, Devony desceu as
escadas para se acomodar e se reagrupar. A espaçosa casa estava fria e
escura, poeira acumulada no mobiliário e no piano de cauda que ficava
na espaçosa sala de estar. Na parte detrás da casa, o pequeno pátio do
jardim de sua mãe estava cheio de folhas secas de outono.
Quebrou algo nela ver o lugar tão abandonado e esquecido. E o seu
piano. Enquanto a música foi mais o sonho de seus pais para ela do que
o dela, sempre encontrou uma medida de consolo na sensação das teclas
frias sob as pontas dos dedos. Também a atraía agora.
Entrou na sala de estar e sentou-se no banco almofadado. Suas
mãos deixaram impressões na fina camada de poeira na brilhante tampa
preta do teclado enquanto o levantava.
Tocou algumas notas, seus dedos se movendo de memória através
de uma das composições clássicas que seus pais adoravam ouvi-la tocar.
Ela franziu a testa quando uma das teclas produziu um acorde
estranho e abafado. Bateu a nota novamente e ouviu algo se deslocar
dentro do instrumento.
— Que diabos?
Deveria haver algo bloqueando as cordas sob a capa do velho piano.
Ela se levantou e ergueu cuidadosamente a pesada tampa preta.
Um envelope estava escondido dentro. Conhecia o papel de
pergaminho. Era do suprimento pessoal de seu pai.
Devony pegou o envelope, fechou a tampa do piano e sentou no
banco.
Seus dedos tremeram quando cuidadosamente abriu o selo. Uma
única fotografia era tudo que o envelope continha.
Devony olhou para a foto, sua respiração escapando num suspiro.
— Oh meu Deus.
CAPÍTULO 26
Rafe bateu no batente da porta do escritório de seu comandante.
Chase ergueu os olhos dos papéis e fotografias espalhados em sua
mesa, uma expressão de leve surpresa em seu rosto. — Parece muito
melhor do que quando te vi há algumas horas.
— Sim, senhor. — Rafe ficou em posição de sentido, vestido com
seu uniforme de patrulha preto, seu rosto barbeado e cabelo cortado para
dar alguma aparência de controle.
Estava firme em seus pés agora, todos os traços da agonia do golpe
de despedida de Devony diminuíram. Todos, exceto a dor que se instalou
em seu coração. Não esperava que isso se dissipasse em breve. Assim
como, nunca.
Não enquanto ele e Devony estivessem separados.
— Entre — disse Chase. Ele tinha planos da equipe de patrulha
para esta noite e outros materiais da missão em sua mesa, junto com
alguns dos arquivos e fotos que Rafe tirou da casa de Devony.
— Acabei de receber uma ligação de Lucan — disse Chase. — As
informações que você e Devony nos forneceram nos deram vários
caminhos para investigar, tanto aqui em Boston quanto em Washington.
Gideon acha que levará dias para desvendar tudo, mas temos um bom
começo em várias novas pistas enquanto conversamos.
Rafe inclinou a cabeça. — Estou feliz que esteja sendo útil. Não
posso tomar qualquer crédito por isso, no entanto. Isso pertence
exclusivamente à Devony. E ao pai dela também.
Chase assentiu. — Temos com eles uma dívida, especialmente se
qualquer uma dessas novas pistas for confirmada. Gideon diz que as
anotações manuscritas de Roland Winters parecem indicar que ele
suspeitava que seus arquivos não estavam seguros na JUSTIS.
— Foi o que Devony pensou também. O pai dela manteve a
pesquisa no Darkhaven de Boston, não em casa, em Londres. Acho que
ele sabia que se algo acontecesse com ele, seu trabalho estaria mais
seguro com ela. Acho que queria que ela fosse a única a encontrar, porque
ele sabia que ela faria algo a respeito.
Rafe teve as últimas horas para considerar tudo o que aconteceu
durante seu tempo com Devony. Ela lhe disse que sua família a afastou
por segurança, tentou protegê-la, mas pareceu-lhe que seu pai entendia
do que ela era capaz. Ele conhecia o tipo de mulher forte, competente e
determinada que ela era.
Roland Winters deveria saber que se deixasse uma tocha acesa
atrás de si, por mais fraca que fosse, Devony seria a melhor pessoa, talvez
a única, que ele confiava que a pegaria e seguiria até o fim.
As sobrancelhas de Chase se levantaram. — Ela é uma mulher
especial. É preciso coragem para perseguir homens como Ricardo Cruz e
Judah LaSalle do jeito que ela fez. E pensar que pretendia seguir o rastro
deles até o círculo interno da Opus se a levasse até lá? Ela não fazia ideia
do que estava enfrentando.
— Ela não se importava com o que estava enfrentando — disse
Rafe, incapaz de manter o orgulho fora de sua voz quando falou sobre a
mulher que amava. — Devony queria justiça pelo que foi feito à sua
família. Não acredito que ela tenha mudado de ideia sobre isso agora. O
que aconteceu aqui, a maneira como eu a magoei, não vai atrasá-la por
um minuto.
— Ela é tenaz — observou Chase.
Rafe sorriu e balançou a cabeça. — Ela é... extraordinária. Ela é a
mulher mais incrível que conheço. E eu a deixei ir.
Chase grunhiu, uma torção irônica em sua boca. — Não parece que
ela lhe deu muita escolha, do jeito como ela o derrubou.
— Eu mereci isso. A magoei, e mereci toda a dor que ela me deixou.
Devony disse que eu deveria ter contado a ela sobre minha missão, que
eu estava trabalhando secretamente para a Ordem. Ela disse que eu
poderia ter confiado nela para manter isso em segredo. Mas para fazer
isso, eu teria que quebrar minha confiança com você. Com Lucan e meus
companheiros de equipe. Eu teria que escolher.
Sterling Chase se recostou em sua cadeira, uma solenidade em seu
rosto e em seu tom. — Isso é muito para alguém pedir a um de nós.
— Sim, senhor. — Rafe exalou um forte suspiro. — Mas não deveria
ser para mim.
Ele pegou a fivela no cinto de armas e a soltou. Então,
cuidadosamente a colocou sobre os planos de patrulha na mesa do seu
comandante.
— A Ordem tem sido minha vida desde que nasci. É minha família,
tão importante para mim quanto minha mãe e meu pai. Meus
companheiros de equipe, meus comandantes, todos na Ordem. Daria
minha vida por qualquer um de vocês, em qualquer dia da semana. Mas
estou apaixonado por Devony Winters. Ela é minha companheira de
sangue. — Ele xingou baixinho e sacudiu a cabeça. — Ela é tudo o que
importa para mim.
Era a verdade.
Ele voltou de Montreal com a vingança queimando um buraco em
seu estômago. Pensou que ir atrás da Opus Nostrum – destruí-los sozinho
– era a única coisa que queria mais do que qualquer outra coisa. Achava
que a vingança era a única razão pela qual vivia.
Agora, queria outra coisa ainda mais.
O perdão de Devony.
Queria o futuro dela, com ele ao seu lado.
E não deixaria outro segundo passar sem ir atrás dela.
— Sabe, não pode desfazer o que fez, filho. — Chase deu-lhe um
olhar simpático. — Algum dia, vou te contar todas as maneiras que fodi
com Tavia. Sei que meu amigo Dante tem muitas histórias parecidas em
relação à sua mãe, Tess.
— Mas Tavia perdoou você. Minha mãe perdoou meu pai — disse
Rafe, encontrando alguma esperança naquelas verdades. — Isso é tudo o
que quero de Devony também. Passarei o resto da minha vida tentando
consertar as coisas entre nós. Mas primeiro, eu preciso descobrir se ela
me aceitará.
E para fazer isso, precisava de um voo para Londres o mais rápido
possível.
O comandante se inclinou, com os dedos estendidos. — Tinha a
sensação de que você ia dizer isso. E é por isso que coloquei a viagem de
retorno de Mathias Rowan a Londres em espera esta tarde. Ele está
esperando por você na sala de guerra.
Rafe nem tentou conter o sorriso que se abateu sobre o rosto dele.
Pegou a mão do guerreiro mais velho e deu um aperto firme. — Obrigado,
senhor.
Chase deu-lhe um aceno de cabeça firme. Então deslizou o cinto
de armas para Rafe. — Você mantém isso. Não deixarei um dos meus
melhores guerreiros ir tão facilmente.
Rafe recolocou o cinto em torno de seus quadris e prendeu-o,
dando ao seu comandante um aceno de gratidão.
Então, ele saiu da sala num movimento rápido para pegar a sua
carona para Londres.
CAPÍTULO 27
Apoiando os cotovelos na mesa do escritório de seu pai, Devony
segurou os lados de sua cabeça com os dedos abertos e soltou um suspiro
cansado.
Suas têmporas latejavam. Seus olhos queimavam após várias
horas de busca obsessiva – embora infrutífera – por respostas sobre a
fotografia que havia encontrado.
Ou melhor, a fotografia que o pai dela deixou para ela encontrar.
Porque não podia haver dúvidas sobre isso. Não havia outra razão
para ele esconder algo assim dentro de um instrumento que ninguém
mais daria uma segunda olhada.
Ela pegou a fotografia e olhou para o que devia ser a centésima vez
desde que a tirou do envelope. Não importava quantas vezes olhasse, a
imagem continuava a confundi-la.
Era uma cópia impressa de uma fotografia banal, tirada em algum
tipo de reunião social. Dentro da multidão de pessoas estavam três
homens: seu irmão, Harrison; o magnata dos negócios Reginald Crowe; e
outro homem que foi pego quando começava a virar o rosto para longe da
câmera.
Devony reconheceu Crowe. Qualquer um o faria. Um dos homens
mais ricos do mundo, também era um dos mais perigosos, como se viu.
No início deste ano, ele liderou o esforço da Opus Nostrum para plantar
uma bomba ultravioleta numa cúpula de paz do Conselho das Nações
Globais. Ele teria se safado se não fosse pela Ordem.
E agora ela se lembrou que, entre as pesquisas de seu pai na casa
de Back Bay, havia registros de portos que datavam de dois anos atrás,
relativos às atividades de carregamentos para as Indústrias Crowe. Seu
pai estava investigando Crowe há mais de um ano antes do incidente na
cúpula da paz.
Por que Harrison estava lá conversando com Reginald Crowe como
velhos amigos na foto? Seria parte do seu trabalho secreto com a JUSTIS?
Devony não reconheceu o terceiro homem. Evidentemente, seu pai
também não. Ele desenhou um círculo em torno do perfil
semiobscurecido do homem e colocou um ponto de interrogação na
imagem.
Ela passou as últimas seis horas vasculhando a internet em busca
de informações ou outras imagens, e executando aplicativos de
reconhecimento facial para ver se conseguia descobrir alguma coisa
sobre o homem desconhecido. Até acessou o site seguro da JUSTIS
usando as credenciais de seu pai que ela havia memorizado – o login e a
senha que ela achava que ele deixara por descuido em seu cofre atrás do
retrato de sua mãe em Boston.
Agora, se perguntou se ele queria que ela tivesse essa informação
também. Talvez ele tenha deixado todas as suas anotações e pesquisas
para ela continuar na ausência dele. E do que adiantou?.
Ela perdeu tudo para o incêndio da Opus e para a Ordem. E esta
noite não encontrou absolutamente nada sobre o misterioso terceiro
homem.
Se seu pai achava que ela podia resolver a questão para ele depois
de sua morte, ele lhe dera muito crédito. Tudo o que a fotografia fez foi
levantar um monte de questões preocupantes em sua mente.
Assim como a data que ele rabiscou no envelope. Um dia antes do
atentado na sede da JUSTIS em Londres.
Ele sabia do perigo? Tinha alguma ideia do que estava prestes a
acontecer?
Ela descartou as duas hipóteses imediatamente. Seu pai nunca
deixaria sua amada esposa e filho chegarem perto daquele prédio se
temesse que pudesse estar comprometido. Ele teria soado um alarme
rápido e muito vocal dentro da organização no instante em que
suspeitasse que poderia haver problemas.
Então, não. Ele não sabia nada disso.
Mas estava preocupado o suficiente sobre seu filho e os dois
homens na fotografia para colocá-la em algum lugar que ela acabaria
descobrindo caso algo acontecesse com ele.
Deus, odiava pensar que ele podia temer por sua própria
segurança.
Ou que temia pela segurança do seu irmão e não fora capaz
protegê-lo no final.
O terceiro homem podia ter algo a ver com o ataque à JUSTIS?
Harrison foi o verdadeiro alvo de um atentado que matou tantos?
Sua mente nadou com mil cenários possíveis e teorias
emaranhadas, cada uma parecendo dar à luz a muitas outras.
Obviamente, passou muito tempo sentada atrás da mesa do
escritório do pai esta noite. Sua necessidade obsessiva de informações e
respostas estava começando a desgastar seu corpo e sua mente.
Ela se levantou da mesa e se espreguiçou, percebendo que não
comeu ou bebeu desde que chegou. Sendo daywalker, não precisava de
nutrição como os humanos. Também não precisava consumir sangue a
cada poucos dias do mesmo modo que Rafe e outros membros Raça.
Ela já havia bebido sangue de Anfitriões humanos, mas como faria
isso novamente após provar o sangue de Rafe, não fazia ideia. Não queria
pensar nessa possibilidade.
Não queria nem pensar em Rafe, mas ele estava vivendo em seus
pensamentos a noite toda, assim como vivia em seu sangue através do
vínculo deles.
Para sempre.
Ela nem precisava se concentrar para sentir a presença dele dentro
dela agora. Ele parecia quase perto o suficiente para tocar, o que era uma
crueldade particularmente severa quando ela sabia que havia fechado a
porta em seu relacionamento com ele – literal e figurativamente.
Mas, sonhando ou não, o zumbido reconfortante em suas veias a
acompanhava enquanto se dirigia para a cozinha para fazer um chá.
Sua raiva de Rafe havia diminuído horas atrás. Sua dor ainda
estava crua, seu coração ainda desgastado e dolorido, mas não podia
odiá-lo. Ela nunca o odiou, nem um pouco.
Ela o amava.
E mais do que tudo, queria vê-lo novamente.
Enquanto colocava a chaleira no fogo e procurava o chá e uma
caneca, percebeu que não foi apenas a raiva que havia desvanecido.
Durante os meses que se seguiram às mortes de sua família, ela foi
tomada pelo sofrimento e pela fúria. A vingança era a razão pela qual
vivia, não pelo certo ou justo. Aqueles nobres princípios que admirava
enquanto crescia, até mesmo aspirava, se transformaram em algo feio e
imprudente após o atentado à JUSTIS.
Ela perdeu os seus princípios quando se propôs vingar os seus
entes queridos. Eles foram enterrados por sua dor sobre os assassinatos
de sua família, transformados num ódio venenoso que a endureceu para
o mundo ao seu redor. Endureceu o seu coração.
Ainda queria que a Opus Nostrum pagasse pelo assassinato de sua
família e de todos os outros no escritório de Londres naquela noite
horrível, mas sua vingança pessoal se transformou em algo mais forte,
mais duro.
Um senso de propósito, não de ser uma justiceira.
Conhecer Rafe fez isso por ela. A parceria com ele numa causa
comum, abrindo-se com ele, como amigo e confidente, como um amante.
Ele a fez perceber que ela não queria ficar sozinha em sua busca.
Ela queria fazer parte de algo mais.
Com ele.
A chaleira gemeu no fogão. Devony despejou água quente sobre o
difusor e respirou a fragrância reconfortante de laranja e especiarias das
folhas de chá a granel.
Sentiu um formigamento estranho na nuca enquanto tomava o
primeiro gole cuidadoso.
Sua cabeça se ergueu e ouviu por um momento o silêncio absoluto
do Darkhaven vazio.
Não ouviu nada, mas estava certa de que não estava sozinha dentro
de casa agora.
Uma sacudida de esperança a atravessou. — Rafe?
Ninguém respondeu. Segurando a caneca fumegante, saiu da
cozinha e foi até o curto corredor que levava ao vestíbulo.
Se Rafe estivesse perto, ela não deveria sentir a presença dele
através do vínculo? Estava certa que sim, mas a esperança dele era
irracional quando entrou na área aberta na entrada da frente do
Darkhaven.
Não era Rafe.
No instante que seu olhar se iluminou sobre quem estava ali, ela
deixou o seu chá cair. Ela nem sentiu o líquido quente espirrando contra
seus pés descalços e tornozelos enquanto a caneca caía sobre o piso. Seu
coração estava muito cheio, sua mente muito atordoada, para sentir
qualquer coisa, exceto descrença e uma onda de esmagadora alegria.
— Harrison?
Seu irmão parecia mais magro do que se lembrava, seu belo rosto
um pouco fino contra a brilhante cor de cobre de seu cabelo curto.
Devony deu um passo ao redor do líquido derramado no chão, a excitação
quase a enviou correndo para abraçá-lo.
Quase.
Algo a deteve. Ela não sabia por que hesitou, mas a incerteza
acalmou seus passos. Seus instintos pareciam congelar seus membros,
apesar da esperança desesperada que borbulhava dentro dela.
— Harry. — Ela colocou os braços em volta de si em vez dele. —
Meu Deus. É realmente você?
Sua boca se curvou. — Sou eu, Dovey.
O apelido dele para ela desde quando eram crianças. Isso deveria
tê-la consolado, mas de alguma forma, emparelhado com o estranho
olhar no rosto dele, o carinho soava oco agora, a voz vazia e estranha.
— Mas... como está aqui? — Ela balançou a cabeça, dividida entre
a confusão e o espanto. — Onde você esteve todo esse tempo? Por que
não tentou entrar em contato comigo? Isso também significa que mamãe
e papai estão...
Ele balançou a cabeça. — Eles estão perdidos.
— Perdidos. — A palavra parecia tão fria, tão inconsequente caindo
da língua dele. Sabia que era simplesmente um fato, por mais doloroso
que fosse.
No entanto, sentiu a morte deles sobre ela novamente agora que
olhava para seu irmão, vivo e bem. De alguma forma, milagrosamente,
ileso.
— Estão mais do que perdidos, Harrison. Estão mortos. Todos
vocês estavam, pelo menos foi nisso que acreditei todo esse tempo. Você,
nossos pais, e uma centena de outras pessoas que também estavam
naquele prédio quando a bomba o destruiu. Mas aqui está você.
Ele inclinou a cabeça enquanto ela falava. — Pensei que você ficaria
feliz em me ver.
— Estou. Não tem ideia de quantas vezes desejei ver você, todos
vocês, novamente. Mas, eu estou... confusa. — Deus, só queria estar
confusa. Porque a explicação mais lógica para ele estar na frente dela
agora era uma que enviava um calafrio em suas veias. — Como é
possível? Não houve sobreviventes. A Opus não deixou nada além de
escombros para trás naquela noite. Então, por favor, me explique como
você foi a única pessoa a escapar daquela explosão?
— Estamos em guerra, Dovey. — Ele deu um passo na direção dela.
— As pessoas se machucam na guerra. Pessoas morrem.
Uma sensação nauseante tomou conta dela com o seu tom suave.
— Não falo de guerra. Falo de assassinato a sangue frio. A Opus Nostrum
matou nossos pais. Mataram seus colegas na JUSTIS. A partir de agora,
também querem me matar. — Ela exalou uma respiração trêmula
enquanto olhava para o rosto sem emoção que parecia com o do seu
irmão. Esse estranho. — Não acho que preciso te dizer isso, no entanto.
Preciso?
Quando ele não negou, algo se quebrou dentro dela. A parte dela
que amava seu irmão, o admirava como um herói por seu compromisso
em manter a lei. A parte dela que chorou por ele, e por seus pais, nos
últimos cinco meses.
— Quanto tempo, Harry? Quando foi que a Opus conseguiu colocar
as garras em você?
Ele encolheu os ombros, aproximando-se mais alguns passos. —
Isso importa?
— Importa para mim. Já estava do lado deles quando Reginald
Crowe tentou detonar a bomba na cúpula no início deste ano? — Ele não
respondeu, o que foi resposta suficiente. Devony zombou. — O que
aconteceu? Como fizeram lavagem cerebral em você?
— Lavagem cerebral? — Ele riu. — Vejo claramente pela primeira
vez por causa da Opus. Eles querem paz – paz verdadeira e duradoura.
Mas sabem que isso não acontecerá sem guerra. Uma grande guerra, que
pode redefinir o equilíbrio de poder e colocar mentes melhores no
comando. Mentes mais fortes.
— Você quer dizer, como Reginald Crowe? As coisas não
funcionaram tão bem para ele, pelo que me lembro.
Raiva brilhou nos olhos escuros de seu irmão. — Reginald Crowe
era um homem brilhante. Todos os membros do círculo interno da Opus
são as melhores mentes que este mundo já viu. Não percebi isso até que
Crowe me acolheu. Eu estava trabalhando numa operação secreta,
designado para ajudar a desmembrar uma rede corrupta de funcionários
do governo. Em vez disso, conheci Crowe e alguns de seus associados.
Eles me mostraram o que poderia ser, o que poderíamos criar juntos.
Devony zombou baixinho. — E então o agente secreto se tornou o
convertido.
Ele sorriu, e desta vez foi genuíno. — A cúpula foi apenas o começo.
A Ordem ficou no caminho. Eles mataram Reginald Crowe, mas ficamos
mais fortes desde então. A Ordem não ficará no nosso caminho por muito
tempo.
— Do que está falando?
— A Opus não pode ser parada. Nós não vamos ser detidos.
— Você está louco, Harrison. Está fora de si.
— E você sempre é tão fodidamente hipócrita — sibilou ele, as
pontas de suas presas brilhando na luz fraca do vestíbulo. — Você e
nossos pais. Especialmente eles, sempre pregando sobre propósito e
deveres mais elevados. Tentando falar sobre honra quando meus irmãos
da Opus e eu estamos fazendo o mais nobre trabalho sob o nariz de todos.
— É por isso que você os matou naquela noite na sede? — Sua voz
estava dura, seu coração pesado com a compreensão do que seu irmão
devia ter feito. — Todos os relatórios após o atentado especularam que
era um trabalho interno. Ninguém poderia ter colocado os explosivos e
executado a detonação de precisão sem conhecimento profundo do
edifício... e quem provavelmente estaria lá naquela noite. Foi você.
Ele soltou um suspiro atormentado. — Por que não pode ficar com
a sua música, Dovey? O que diabos estava pensando, indo atrás do
LaSalle? Ou fodendo com aquele guerreiro da Ordem? — Ele
praticamente cuspiu as palavras, seu rosto contorcendo-se com raiva mal
contida. — Você é uma vergonha para nós dois. Estou muito desapontado
com o que se tornou.
Ela arqueou uma sobrancelha, fúria acendendo em seu sangue. —
O mesmo para você, irmão.
— A Opus quer você morta agora — anunciou suavemente. — Não
quero isso. Sabia que você voltaria correndo para casa depois que
explodissem o Darkhaven de Boston. Eles me deram a chance de te
mostrar o caminho, Devony. Espero que seja inteligente o suficiente para
aceitar.
— Inteligente o suficiente para me tornar um dos peões da Opus,
como você? Isso não é ser inteligente, Harry. É ser fraco. Eu nunca serei
assim.
Ele riu como se ela fosse a louca. — Entende o que estou te
oferecendo? — Ele ergueu as mãos como se mostrasse preciosos
tesouros. — Com o nosso poder, você e eu trabalhando juntos,
poderíamos ser imbatíveis. Poderíamos administrar a Opus juntos um
dia.
Devony deu um passo para trás com os seus pés descalços quando
ele começou a se aproximar mais uma vez. — Você está fora de si,
Harrison. — Ele estava, claramente e perigosamente, insano. Não era
mais o irmão com quem ela cresceu, mas uma ferramenta da Opus
Nostrum. E o assassino de seus pais. — Nosso pai estava chegando perto
da verdade, não é? Acho que mais cedo ou mais tarde ele ia descobrir que
você era o inimigo.
Harrison sorriu, levantou seu ombro largo. — Provavelmente. Eu
não deixaria isso acontecer, você entende.
— Claro que não — disse ela —, acho que ele sabia disso também.
Acho que foi por isso que deixou meses de pesquisa para eu encontrar.
Acho que também foi por isso que ele escondeu uma fotografia sua, de
Crowe e de outro homem na esperança de que eu a encontrasse após não
estar mais aqui.
— Que fotografia? Que outro homem?
— É o que quero saber. Eu vou descobrir, Harry. Não descansarei
até que a Opus seja destruída.
Raiva queimava nos olhos de seu irmão. Seu lábio se curvou para
trás dos dentes e presas. — Você precisa me dar essa foto, Devony. E
toda a pesquisa do nosso pai. Precisa dar tudo para mim. Muito.
Fodidamente. Agora.
Ela balançou a cabeça, dando outro passo cauteloso para longe
dele. — Não tenho mais os arquivos de papai. Seus amigos brilhantes da
Opus explodiram tudo quando queimaram minha casa.
Ele sorriu. — Sua perda é meu ganho, então.
— Não exatamente. A Ordem tem cópias de tudo.
Um rugido irrompeu dele. — Sua idiota!
Ele pulou. Naquele mesmo instante, ela usou sua mente para
lançar o pedaço mais afiado de sua caneca quebrada na cabeça do irmão.
Colocou toda sua força nisso. O fragmento irregular conectou-se com o
osso sobre o olho direito e rasgou a pele. Ele cambaleou para trás, o
sangue escorrendo pelo seu rosto.
Seu rosnado foi sobrenatural. — Sua cadela. Agora você vai sofrer.
Ele a agarrou antes que pudesse escapar. As mãos dele penetraram
seus braços como garras, os olhos lançando raiva como uma fornalha.
Ela sentiu o poder dele prender-se ao dela, procurando a conexão
para que pudesse sugá-la. Mas o bloqueio não se manteve. — Mas o
que...? Você bebeu de alguém. Sua vadia! Você está fodidamente
vinculada com aquele merda da Ordem?
Devony se soltou e empurrou seu irmão com toda a sua força. Ele
bateu numa das mesas antigas da sua mãe. Ela explodiu embaixo dele,
se despedaçando enquanto ele caía no chão.
Ela precisava sair de lá. Necessitava escapar para que pudesse
contar ao Rafe e à Ordem que Harrison era corrupto. Mais do que isso,
ela precisava garantir que eles recebessem a fotografia que seu pai
deixara para ela.
Ela entrou no escritório e a pegou, colocando no bolso de trás do
jeans. Harrison estava lutando para ficar de pé quando ela passou por
ele no vestíbulo.
Mas agora não era só ele que ela precisava enfrentar.
Dois outros machos Raça entraram pela porta da frente. Os olhos
frios a seguraram enquanto bloqueavam sua saída da casa. Ao contrário
de seu irmão, este par estava armado com armas e facas.
Harrison limpou furiosamente o sangue que corria em seus olhos
e descia pelo rosto. — Eu te disse que eles me deram uma chance para
te mostrar o caminho. — Ele cuspiu um bocado de sangue no tapete que
era uma relíquia de família. — Você está além da minha ajuda agora,
Devony. Ou da minha misericórdia.
— Então, você deixará que seus amigos do esquadrão da morte me
matem?
— Sim, Devony. — Ele caminhou até ela, olhou-a diretamente nos
olhos. — Não vejo ninguém que irá detê-los. E você?
— Eu vou — respondeu Rafe.
CAPÍTULO 28
Mathias Rowan tinha um carro à espera de Rafe quando o jato
particular da Ordem aterrissou em Heathrow. Se Rafe soubesse que o
terror de Devony ia inundar suas veias como um rio frio a meio caminho
do aeroporto para Kensington, teria recrutado Rowan e toda a maldita
equipe de guerreiros em Londres para acompanhá-lo.
Desejou malditamente ter algum apoio agora, conforme entrava no
Darkhaven pela porta dos fundos e a encontrou presa lá dentro com um
ameaçador trio de criminosos Raça. A dupla vestindo ternos e bem
armada ao lado da porta da frente representava a ameaça mais imediata
para ela. Ambos pegaram as armas no instante em que Rafe apareceu no
arco da cozinha.
Rafe não hesitou por um momento. Ele lançou uma de suas
lâminas. Ela apunhalou o maior dos dois na garganta. Com a laringe
empalada, o vampiro caiu de joelhos num uivo abafado, agarrando-se à
lâmina projetando-se na frente de seu pescoço.
O parceiro do criminoso abriu fogo ao mesmo tempo, atingindo Rafe
no estômago.
Devony gritou. — Não!
Porra. Seu grito o machucou mais do que o ferimento de bala.
Rafe podia lidar com a lesão e a dor. Ele aguentou muito pior antes
e isso não o desacelerou. Mas graças ao vínculo de sangue dele, cada
golpe que tomasse ecoaria dentro dela. Ele mataria esses três idiotas esta
noite apenas por essa ofensa.
Devony lançou-se sobre o atirador, os olhos em chamas e as presas
em erupção atrás de seus lábios entreabertos. O cara enorme tentou tirá-
la de suas costas, mas ela não saiu. E, assim como seu parceiro de
esquadrão da morte da Opus, ele viera aqui para matar.
— Devony!
Rafe mal teve a chance de formar o pensamento, muito menos de
saltar em sua defesa, antes que o terceiro macho Raça o atacasse com o
assassinato queimando em seus olhos cor de uísque.
Olhos que tinham uma impressionante semelhança com os de
Devony.
Santo inferno. Não podia ser.
E ainda assim era.
Não sabia como podia ser possível, que o irmão dela estivesse vivo
e bem depois de todos esses meses, mas desde que ele havia declarado a
sua intenção de ferir Devony – Cristo, de matá-la a sangue frio – a sua
ressurreição milagrosa acabaria. Aqui e agora.
Com um berro enlouquecido, Harrison Winters acertou o estômago
ferido de Rafe, levando os dois ao chão. O irmão não-tão-morto de Devony
prendeu Rafe embaixo dele. A saliva se juntando nos cantos de sua boca
rosnando enquanto levava a mão até o peito de Rafe.
Foda-se, de maneira nenhuma.
Rafe se esquivou do toque do outro macho e o expulsou de cima
dele. Winters o atacou novamente, as mãos enroladas como garras. Ele
deu um golpe em Rafe, tentando se agarrar a ele.
Rafe foi mais rápido. E tinha outro punhal embainhado em seu
cinto de armas. Ele o soltou e o girou em suas mãos, em seguida, levou
o fio da lâmina entre os dedos médio e terceiro do atacante.
Winters rugiu. Sua mão esquerda jorrou sangue, quase dividida ao
meio. — Agora você morre, guerreiro.
Usando a mão direita, ele bateu com o punho o lado do crânio de
Rafe.
Sua visão rodopiou enquanto se equilibrava sobre um joelho. Do
outro lado do vestíbulo, Devony atacou a garganta do membro do
esquadrão da morte, drenando o poder dele. Mas enquanto aquele
assassino começava a cair de seu aperto, seu parceiro conseguiu se
levantar.
— Devony, atrás de você!
O bandido se lançou sobre ela, jogando-a contra a parede. Gesso e
tijolos se racharam com impacto terrível de todo o seu corpo contra a
parede.
Rafe também sentiu sua dor. Seu terror. Sua esperança
enfraquecendo de que eles sairiam vivos dessa situação.
Naquele mesmo momento, ele reuniu toda a velocidade a seu
comando e tirou uma de suas armas do coldre. Ele deu um tiro,
acertando o grande bastardo entre os olhos. Colocou uma bala no crânio
do segundo apenas para manter o filho da puta no chão para sempre.
Mas isso ainda deixava o problema do irmão de Devony.
Winters colocou a enorme mão no ombro de Rafe e apertou. Rafe
não conseguiu evitar a conexão com rapidez suficiente desta vez. Ele
sentiu o poder do outro macho começar a sugar o seu.
Não.
Ah, porra. Ele precisava aguentar.
Winters sorriu, seus olhos enlouquecidos e brilhantes como lava.
Ele pegou a arma de Rafe, usando a mão sangrenta e mutilada para tirar
a arma do alcance de Rafe.
Droga. Não.
Winters ergueu a arma, seus movimentos desajeitados após Rafe
quase partir a sua mão em duas.
Rafe observou a arma subir em direção ao seu rosto. Não podia
lutar contra isso agora. Mal conseguia manter a consciência enquanto o
cano de sua própria arma de patrulha era apontado à queima-roupa ao
lado de seu crânio.
Ele ouviu o tiro.
Explodiu como um canhão na frente dele.
Mas quando sua visão oscilou dentro e fora de foco, percebeu que
não foi sua cabeça que havia sido aberta pela bala disparada.
Harrison Winters estava caído no chão, sem vida.
E atrás dele, com uma das armas do bandido do esquadrão da
morte, estava Devony.
— Rafe. — Ela se engasgou, abaixando a arma enquanto se
arrastava para o lado dele no chão. Suas mãos estavam frias e trêmulas
enquanto as corria sobre ele, emoção em seus olhos. — Você veio atrás
de mim. Você me salvou.
Ele sacudida a cabeça de forma hesitante. Foi preciso toda a sua
força para levantar a mão e apoiá-la gentilmente contra a bochecha
machucada dela. — Não, Devony. Foi você quem me salvou.
CAPÍTULO 29
Em algum lugar sobre o Atlântico, Rafe acordou com Devony em
seus braços. Estavam a bordo do jato particular da Ordem, deitados nus
na cabine do quarto da espaçosa aeronave.
Mathias Rowan e sua equipe chegaram ao Darkhaven para
recuperá-los e conter a situação após a ligação de Rafe. A Ordem cuidaria
dos corpos e da limpeza da propriedade. Também abafariam as
impressionantes revelações sobre o irmão de Devony e seu envolvimento
com a Opus Nostrum.
Rafe ainda não podia acreditar como terrivelmente Harrison
Winters traiu seu dever, seus colegas da JUSTIS e sua família. Que
estivesse disposto a acrescentar a vida de Devony a essa contagem brutal
fez Rafe desejar ter matado o bastardo. Lentamente. De forma dolorosa.
O fato de ter chegado apenas alguns instantes antes que algo pior
tivesse acontecido com Devony fez seu coração se apertar.
Foi atrás dela para tentar salvar o que tinham juntos, mas no final
foi ela quem o salvou.
Não só com o poder de seu sangue depois que o ataque de seu
irmão quase o derrubou.
O amor dela era um presente que ele apreciaria e protegeria
enquanto respirasse.
Agora que Devony estava segura em seus braços novamente,
passaria o resto de seus dias, e todas as noites, se esforçando para
merecê-la.
Aninhada em seu abraço, ela se mexeu. Um zumbido silencioso
quando ela acordou vibrou contra o peito dele. — Estamos quase lá?
— Ainda temos algumas horas. — Ele deu um beijo na testa dela.
— Como se sente?
— Vou ficar bem — disse ela suavemente. — Com o tempo, vou
ficar bem.
Seus ferimentos desta noite foram curados com o sangue dele
também. Mas não falavam de feridas físicas agora. Falavam sobre o
horror do que o irmão dela fizera. Os horrores que ainda estavam por
acontecer, se a Opus Nostrum pudesse continuar com os seus planos de
guerra.
— Quero dizer que estou feliz por ter acabado — murmurou ela. —
Mas não acabou, não é? Não acabará até que todos os membros dessa
organização distorcida sejam erradicados e desmascarados.
Rafe assentiu. — Com alguma sorte, a foto que você tem nos
ajudará a fazer isso.
Eles já haviam transferido uma cópia para a Ordem enquanto
estavam em Londres. O pai de Devony fez o certo para garantir que a
imagem terminasse nas mãos de sua inteligente e corajosa filha. Rafe só
queria que Roland Winters soubesse o quão fundamental ela já se provou
na busca para frustrar este novo mal.
— Se homens assim puderam chegar ao Harry, poderiam chegar a
qualquer um, Rafe. São piores do que monstros. Não acho que percebi
isso até que ouvi meu irmão esta noite.
Ele acariciou os braços nus de Devony, traçando o floreio de um de
seus belos glifos. — Sinto muito por não ter chegado lá antes. Me mata
pensar em como cheguei perto de te perder. — Ele ergueu o queixo dela
com as pontas dos dedos. — Não falo de apenas algumas horas atrás,
com seu irmão e aqueles capangas. Falo de antes... Por causa do jeito
como eu te magoei.
Seu olhar caloroso de Bourbon alcançou dentro dele como uma
carícia. — Você não pode me perder, Rafe. Eu te amo.
— Graças a Deus. — Embora o vínculo deles dissesse isso a ele,
não percebeu até agora o quanto precisava ouvi-la dizer as palavras. Ele
precisava sentir seu perdão e saber que teria uma vida inteira para se
mostrar digno disso.
Abaixando a boca para a dela, ele gastou seu tempo a beijando,
saboreando a pressão suave de seus lábios contra os dele. Seu sangue se
acendeu, embora sua intenção fosse apenas confortar. O pulso de Devony
respondeu com um próprio calor pulsante.
— Sinto muito por tudo o que eu fiz — murmurou ele, acariciando
seu rosto adorável. — Você estava certa. Deveria ter confiado em você.
Eu te amo. Deveria ter escolhido você, não minha missão.
Ela franziu a testa, sacudindo a cabeça lentamente. — Foi injusto
da minha parte dizer isso, Rafe. Não era justo que eu pedisse...
— Eu escolho você. — Ele deslizou a mão em torno de sua nuca e
a puxou mais perto, sua boca roçando a dela. — Foi o que eu disse ao
meu comandante esta noite, antes de vir te procurar. Eu escolho você,
Devony.
— O que está dizendo? Que saiu da Ordem?
— Tentei. Chase não me deixou. Mas eu vou, se é isso que é preciso
para ter você. — Ele a beijou novamente, mais profundamente desta vez,
seu coração pertencente exclusivamente a essa mulher. — Eu te amo,
Devony. Você é minha parceira, a única para mim agora. E farei qualquer
coisa para provar isso para você. Incluindo deixar a Ordem.
— Não. — Ela se afastou dele. — Não é isso o que eu quero. Essa é
a última coisa que quero para você. A Ordem é sua vida, sua família.
— Você é.
Seus dedos acariciaram a mandíbula dele com um cuidado terno.
— Quero que você tenha ambos, Rafe. Quero algo mais do que isso, na
verdade. — Seu olhar procurou o dele, firme com a força e a determinação
que ele amava nela. — Quero compartilhar essa vida com você. Tudo isso.
Quero fazer parte disso de qualquer maneira que eu puder.
— O que está dizendo? — Sua testa franziu. — Você quer fazer
parte da Ordem?
Ao assentir, ele soltou um suspiro e rolou de costas.
Devony se aproximou dele, com a cabeça apoiada na mão enquanto
olhava para o rosto desnorteado dele. Um brilho desafiador iluminou o
seu olhar. — Antes de tentar argumentar, gostaria de lembrar que você
acabou de dizer que faria qualquer coisa por mim.
— Eu disse isso, sim.
— Mas o quê? — Ela franziu a testa. — Você não quer fazer uma
recomendação sobre mim?
Ele se virou para ela, gentilmente colocando o rosto dela na palma
da sua mão. — O que te faz pensar que eu ainda não o fiz?
— Você fez? — Ela piscou, claramente surpresa. — Quando?
— Antes de sairmos do centro de comando de Londres, falei com
Lucan Thorne e o comandante Chase. Disse a eles que estávamos
voltando, mas éramos um pacote agora. Se você quiser, é claro. Esses
foram meus termos. E eles concordaram.
— Você fez isso por mim?
— Fiz isso por nós. — Ele sorriu, acariciando sua boca bonita
enquanto o sorriso se abria em seus lábios. — Fiz isso porque nada me
faria mais orgulhoso, ou mais feliz, que ter você ao meu lado, Devony.
Como minha parceira, minha amante. Minha companheira.
— Rafe. — Com um soluço baixo, ela agarrou seu rosto e o beijou,
sem uma fusão suave de suas bocas, mas uma reivindicação ardente.
Ele amava isso nela, como podia ser vulnerável e carinhosa, e ainda
a mulher mais excitante e gostosa que já conheceu. Ela era teimosa e
destemida. Inocente, mas sábia.
Mas o mais importante de tudo, ela era dele.
Com um grunhido possessivo, ele rolou seu belo corpo para baixo
dele na cama.
Ela já estava molhada e pronta para ele quando entrou nela, sua
bainha apertada segurando seu eixo quando afundou até o punho dentro
de seu calor. Devony gritou, as unhas curtas arranhando seus ombros
enquanto se moviam juntos, num ritmo que ambos conheciam bem
agora, a necessidade compartilhada um pelo outro, ambos urgentes e
ternos.
No início desta noite, eles beberam das veias um do outro para se
curarem. Agora, era o desejo que acendia a sede mútua. Foi a
necessidade que levou a boca de Rafe para o pescoço de Devony enquanto
se balançava contra ela. Foi prazer que o fez gritar em tormento erótico
no instante que as presas dela se afundaram no músculo de seu ombro.
Deus o ajudasse, nunca se acostumaria com a intensidade do
vínculo deles.
Ele mordeu a garganta delicada, gemendo quando o doce sabor do
sangue dela rugiu sobre a sua língua. O clímax dela cresceu numa onda
que se quebrou contra ele quando sua própria liberação atingiu seu pico
também.
E foi o amor – brilhante, caloroso e eterno – que passava por suas
veias e por todas as partículas de seu ser enquanto envolvia Devony nos
braços e se preparava para levá-la sobre aquela borda íngreme com ele
novamente.
Tinham horas antes de pousarem em Boston.
Ele aproveitaria ao máximo cada segundo.
CAPÍTULO 30
— Relaxe. Vai se sair bem.
A segurança de Rafe enquanto Devony permanecia na frente do
espelho em seus aposentos no centro de comando de Boston ajudou a
acalmá-la, mas ela estava nervosa. Não podia evitar.
Chegaram de Londres ontem, e esta noite todos estavam se
reunindo para conhecê-la e recebê-la no grupo como uma de suas
integrantes.
Ela alisou as palmas das mãos na frente de sua nova calça preta e
blusa com decote em V, a roupa foi um presente de Carys e Tavia. Assim
que souberam que Rafe a trazia com ele, as duas mulheres abasteceram
metade do grande armário com roupas novas, botas e todos os outros
itens de que ela pudesse precisar para estar confortável quando
chegasse.
Ela nunca teve uma irmã, mas Carys parecia animada para
assumir o papel. Até mesmo Jordana foi graciosa e a perdoou, tanto
assim que realmente abraçou Devony ao conhecê-la, apesar da maneira
terrível como foram apresentadas no museu.
Mas em apenas alguns minutos, Devony encontraria seus colegas
de equipe e alguns dos anciãos da Ordem na sala de operações do centro
de comando.
Rafe apareceu atrás dela e deu um beijo na curva do pescoço e do
ombro. Os olhos de água-marinha encontraram seu olhar no reflexo do
espelho. — Você está linda. E já tem uma sala cheia de apoio lá embaixo.
Gideon fala sobre seu trabalho de campo para quem quiser ouvir.
Ela sorriu. — Só quero deixar você orgulhoso.
— Você já faz isso, então risque essa preocupação da sua lista.
Ela se virou para encará-lo, incapaz de resistir a abraçá-lo. — Tem
alguma ideia do quanto eu te amo?
Ele sorriu, puxando-a contra a dureza de seu corpo. — Acho que
tenho alguma ideia, mas por que não me dá uma dica agora mesmo?
Ele não precisou pedir duas vezes. Ela pegou sua boca num beijo
apaixonado, suas veias se iluminando com o prazer da boca dele na dela.
Quando se afastou, ele gemeu, os olhos brilhando com âmbar.
— Acho que estou começando a entender agora — disse ele, seus
lábios se curvando. — Estou recebendo várias ideias interessantes, na
verdade.
Ela beijou seu queixo quadrado. — É mesmo?
— Hum. As melhores envolvem muito menos roupas do que
qualquer um de nós está usando no momento.
— Parece intrigante até agora.
Na porta aberta atrás deles, alguém pigarreou. A voz profunda
pertencia a um grande macho Raça, com cabelos loiros dourados e olhos
da mesma tonalidade verde-folha de Tavia. Um sorriso com covinhas
invadiu seu rosto bonito. — Mau momento?
Rafe grunhiu. — A única classe que você tem.
— Você deve ser Devony.
Ela assentiu. — E você deve ser Aric.
— Ah. Minha reputação me precede — disse ele, cruzando os
aposentos de Rafe para cumprimentá-la. Ela esperava um aperto de mão,
mas conseguiu um breve abraço. — É ótimo conhecer você, Devony.
— Você também, Aric. Rafe me contou muitas coisas boas sobre
você.
Rafe riu. — Todas mentiras, obviamente.
Aric olhou para Devony. — Realmente gosta deste idiota, hein?
— Eu o amo.
— Acho que alguém tem que fazer isso. — Ele balançou a cabeça e
pegou a mão de Rafe. Assim que a segurou, puxou-o para um abraço
apertado também. — Ouvi o que aconteceu em Londres. Tem que parar
de quase se matar, ou precisarei encontrar um novo melhor amigo.
Os nervos de Devony se acalmaram enquanto observava os dois
homens conversarem. Após um momento, a atenção de Aric voltou para
ela.
— Todo mundo já está reunido na sala de guerra, mas queria
encontrar vocês antes de irem para lá. Especialmente você, Devony.
Ela assentiu. — Tudo bem.
— Não sei se Rafe te disse, mas tenho recrutado para uma unidade
especial nos últimos meses.
— A equipe daywalker — disse ela. — Sim, eu ouvi.
— Bom. Porque gostaria que você fizesse parte dela. Se estiver
interessada, é claro.
Ela mal conseguia segurar sua excitação. Exceto... — Eu adoraria,
Aric. Mas não quero fazer parte de uma equipe que não inclua o Rafe.
— Sim, tinha a sensação de que diria isso. — Ele deu uma olhada
para Rafe. — Também tenho um lugar para você, se quiser. A equipe será
baseada aqui em Boston, mas nossas atribuições podem nos levar a
qualquer lugar onde nossas habilidades especializadas sejam
necessárias.
— Parece interessante — disse Rafe, passando o braço ao redor de
Devony.
Aric assentiu. — Podemos falar mais sobre isso depois das
apresentações no andar de baixo. Lucan acabou de chegar com Gabrielle,
Gideon e Savannah. Seus pais estão aqui também.
Devony olhou para Rafe. — Vou conhecer seus pais esta noite?
— Claro. Estão morrendo de vontade de conhecê-la desde que eu
contei sobre você.
Oh, Deus. Agora, seus nervos voltaram com uma vingança.
— Espere um minuto — disse Aric, um olhar estranho surgindo em
seu rosto. — Quer dizer que Tess ainda não viu Devony?
Rafe sacudiu a cabeça e o seu amigo arqueou uma sobrancelha.
— Por quê? — perguntou Devony, preocupação a envolveu, embora
o sangue de Rafe estivesse completamente calmo. — O que está
acontecendo?
— Algum tempo atrás, minha mãe viu uma visão nos olhos de uma
vidente. Nos olhos de Mira.
— Ela é membro da Ordem em Montreal — disse Devony,
lembrando-se de Rafe mencionar alguns dos nomes dos outros guerreiros
desde que chegaram em Boston. — O que sua mãe viu?
— Não sei. Uma visão minha com minha companheira,
aparentemente. E nossos filhos.
Devony ficou boquiaberta. — Você nunca me disse isso.
Ele deu a ela um olhar despreocupado. — Não disse?
— Não. — Deus a ajudasse, queria estrangulá-lo. — Rafe, e se eu
não sou ela? E se você deveria estar com outra pessoa? E se nós...
Rafe a silenciou com um beijo lento e brincalhão. Quando recuou,
o amor que brilhava em seu olhar era inegável. — Não há mais ninguém
para mim, com visão ou não. O que minha mãe viu não faz diferença para
mim. Você é minha companheira, Devony. Você é meu coração. — Ele
pressionou um beijo amoroso em sua têmpora. — Agora, está pronta para
ir cumprimentá-los?
Ela soltou o ar e olhou para seu confiante e afetuoso olhar. — Ok.
Acho que estou tão pronta quanto é possível.
— Essa é minha garota — disse ele, entrelaçando seus dedos.
Com Aric acompanhando-os, ela entrou na sala de guerra
segurando a mão de Rafe. O aperto dele era sua tábua de salvação, sua
âncora firme enquanto encontrava os olhares esperançosos e amistosos
dos companheiros de equipe, amigos e família de Rafe.
Eles eram dela agora também.
Ela sentiu isso quando as apresentações foram feitas e foi recebida
no rebanho por todos, de Lucan Thorne e sua bela companheira de cabelo
ruivo, Gabrielle, a cada membro do centro de comando de Boston. Aric
trouxe sua linda companheira, Kaya, para conhecê-la, então fez sinal
para dois homens machos Raça e uma mulher bonita se apresentarem.
— Devony e Rafe, conheçam o resto da equipe: Grayson, Jade e
Lachlan.
Eles conversaram por alguns instantes, mas Devony não conseguia
tirar os olhos da loira deslumbrante que a observava do outro lado da
sala, e do guerreiro de cabelos escuros com ela, cuja confiante arrogância
masculina era tão parecida com o macho Raça que invadiu a vida de
Devony e a virou de cabeça para baixo.
Não havia dúvida de quem era aquele casal.
Rafe deve ter sentido a sua curiosidade. — Vamos dizer olá?
— Sim — disse ela, querendo de verdade isso. — Eu adoraria
conhecê-los.
Pedindo desculpas ao resto da sala, eles foram cumprimentar os
pais dele. Rafe não soltou a mão dela, nem mesmo quando estavam na
frente do casal.
— Mãe, pai. Gostaria que conhecessem Devony. Minha
companheira.
— Oi — disse ela, sentindo-se um tanto desajeitada no silêncio
prolongado e ilegível.
— Eu sou Dante — disse o pai dele, sua voz profunda rolando sobre
seus sentidos como veludo e uísque.
Ele estendeu a mão grande, mas Devony sentiu uma onda de afeto
pelas pessoas que lhe deram o homem que ela amava. Ela abraçou Dante,
depois se virou para olhar para a mãe de Rafe, Tess.
— Olá — disse ela, então esperou com um pavor sem fôlego pela
resposta dela.
Um sorriso terno curvou a boca gentil de Tess.
— Olá, Devony. Estou esperando há muito tempo para recebê-la
em nossa família. — Tess a puxou para um abraço apertado e a segurou.
— É tão maravilhoso finalmente conhecê-la.

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