Sei sulla pagina 1di 17

Um modelo de socialismo liberal na China

Uma conversa com Cui Zhiyuan

por Emilie Frenkiel*

Essa entrevista, com um politicólogo chinês, diplomado pela


Universidade de Chicago, oferece uma avaliação da política local
chinesa de experimentação por meio da experiência em Chongqing.
Cui Zhiyuan explica como a política social da cidade se alia à
economia de mercado, apoiada nos benefícios das empresas
públicas.

Em meados dos anos 1990 as consequências sociais da


intensificação da política de Reforma e Abertura, consecutiva à
repressão de junho de 1989, provocaram um vivo debate no seio da
inteligência chinesa. Este período marcou o fim do amplo consenso
dos anos 1980 sobre a necessária implantação do liberalismo e da
democracia na China.

As divisões vieram à luz do dia, principalmente marcadas pela


oposição entre os liberais hayekianos opostos à intervenção do
Estado e a Nova Esquerda, composta por social-democratas que
aceitam a economia de mercado, ao contrário da esquerda
tradicional. Nesse esse cenário político fragmentado, Cui Zhiyuan
se situa bem à esquerda. Geralmente esse pesquisador em
economia, política e filosofia política que atua no Departamento de
Política Pública e Administração da prestigiada Universidade
Tsinghua em Pequim é visto como um membro da Nova Esquerda.
Ele se identifica de forma mais livre como um socialista liberal na
tradição de John Stuart Mill e James Meade. Mill desenvolveu o
conceito de socialismo liberal no capítulo “O futuro provável das
classes trabalhadoras” em sua obra “Princípios de economia
política”, onde ele flexiona consideravelmente o direito à
propriedade privada no que se refira aos meios de produção e
defende a idéia de uma economia de mercado dominada por
empresas cooperativas, democráticas e descentralizadas. Quanto a
James Meade, economista keynesiano britânico laureado,
juntamente com Bertil Ohlin, com o Prêmio Nobel de economia em
l977, Cui Zhiyuan exprime sua admiração por suas veleidades de
buscar reconciliar os princípios da eficácia econômica e da justa
repartição das rendas [1].
Após haver terminado sua tese consagrada a Restrição
Orçamentária Frouxa [2][NT 1] desenvolvida, sob a orientação de
Jon Elster, Adam Przeworski e Lester Telser, na Universidade de
Chicago em 1995, Cui ensinou ciência política no MIT durante seis
anos. Ele conheceu Charles Sabel, um dos grandes especialistas
em produção pós-fordista, um dos autores da obra Second
Industrial Divide. Na escola de direito de Havard ele conheceu
Roberto [Mangabeira] Unger, que abandonou sua carreira
universitária entre 2007 e 2009 a fim de se tornar ministro de
Assuntos estratégicos do governo Lula.
As pesquisas de Cui Zhiyuan focam na questão da democracia
econômica. Ou, segundo ele, “a China é um terreno privilegiado
para a exploração mundial de inovações institucionais e teóricas”.
É uma das razões principais pela qual decidiu voltar para a China,
onde “se encontra as vantagens da flexibilidade e onde as coisas
não são determinadas de forma irrevogável” (entrevista em 1º de
fevereiro de 2009, com o autor).
Seus artigos receberam na China respostas por vezes violentas dos
liberais como Xu Youyu e Qin Hui, que pertencem à outra geração e
cujas experiências remontam aos priores momentos da Revolução
Cultural. Com efeito, Cui é um dos raros intelectuais que se arrisca
a evocar elementos positivos no passado maoísta. Efetivamente ele
declara que esse passado pode servir de base às inovações
institucionais.
Em artigo sobre a Consituição Angang [3], estatuto interno de uma
aciaria do nordeste da China, datado dos anos 1950, Cui apresenta
os seus princípios - liangcan (Dupla participação: Os dirigentes da
empresa devem participar do trabalho de produção e os
trabalhadores da gestão da empresa), yigai (Uma reforma: reforma
das regulações que não são razoáveis com relação ao local de
trabalho), sanjiehe (Três combinações: os trabalhadores e
engenheiros devem ser associar etc.) – provando que as idéias de
co-determinação e democracia econômica não têm nada de novo e
podem ser aprofundadas.

A ESTRATÉGIA CHINESA DE INOVAÇÃO E EXPERIÊNCIA EM


CHONGQING

Por ocasião do trigésimo aniversário da política de Reforma e


Abertura e do sexagésimo aniversário da República Popular da
China, tentou-se mostrar a receita do sucesso chinês em muitas
publicações.
Certos pesquisadores como Sebastian Heilmann e Wang
Shaoguang, se concentraram nas abordagens experimentais
pragmáticas, resumidas na célebre frase de Deng Xiaoping,
“atravessar o rio tateando”, que o governo chinês adotou. Heilmann
descreveu esse “modo distinto de governança” que ele nomeou de
“experimentação hierarquizada” (experimentation under hierarchy).
Wang Shaoguang afirmou que é precisamente a « capacidade de
adaptação » (shiying nengli) do sistema político chinês que permitiu
ao país superar um número incalculável de obstáculos institucionais
e políticos. Mostrou que os dirigentes chineses souberam responder
aos problemas tal como foram se colocando e que apreenderam
muito com as experiências controladas realizadas em pequena
escala com a finalidade de descobrir instrumentos capazes de
resolver certas dificuldades. Esta abordagem progressiva se
explica, em parte, pela formação técnica desta geração de
dirigentes, mas também por sua experiência, eventualmente cruel,
nos métodos revolucionários. “Preservada a unidade política o
sistema autoriza as tomadas de decisão descentralizadas onde for
possível e cria, assim, condições institucionais, para a pesquisa de
diversos métodos de resolução de problemas através de práticas e
experiências descentralizadas” [4]. Os governos locais são
estimulados a inovar, pois seu desempenho não é somente
avaliado em termos de crescimento econômico. Em função da
necessidade de assegurar sua legitimidade frente aos grupos
sociais de sua jurisdição para manter a estabilidade social, o inovar,
torna-se prioritário e não existindo essa lógica não há muitas
chances de ser promovido.
Nesse contexto de experimentações locais, múltiplas e
generalizadas, pesquisadores como Cui Zhiyuan encontraram
novos estímulos à suas proposições teóricas.
Num artigo intitulado “Como compreender a China de hoje: Uma
interpretação do conceito de pequena propriedade” Cui desenvolve
a idéia de que a China é um terreno propício às inovações
institucionais, em particular ao que concerne à economia de
mercado socialista (grifo nosso. Tradução): uma original mistura
de bens públicos e economia de mercado distinta da visão social-
democrata em sua lógica que o problema se situa no nível da
distribuição primária das rendas e não na sua redistribuição.
O pesquisador encontrou recentemente um terreno para aplicação
de suas teorias e se consagrou fundamentalmente no que ele
chama a experiência de Chongqing (Chongqing jingyan).
Como ele explicou, numa conversa em abril, 2010, em Chongqing:
“Chongqing é uma cidade muito importante na China. É uma das quatro
municipalidades postas diretamente sob a jurisdição do governo central,
além de Pequim, Shangai e Tankin (zhixiashi).
É a mais nova e a mais populosa entre elas. São 33 milhões de habitantes
quando Pequim não tem mais de 20 milhões.
Recebeu esse status em 1997, quando foi desmembrada da província de
Sichuan, para facilitar a gestão da construção da barragem das Três
Gargantas.
Chongqing, como Chengdu, foi escolhida pelo Conselho de Negócios de
Estado para se tornar uma zona experimental de desenvolvimento
integrado entre as zonas rural e urbana (chengxiang zonghepeitao gaige
shiyanqu).
A municipalidade de Chongqing é muito grande, muito populosa e 70% de
seus habitantes vive no campo. O perfil e a distribuição demográfica
propiciam a explicação para o caso de ter assumido importância nacional
ainda maior na crise financeira mundial, que reforçou a necessidade de
dinamizar o mercado interno.
Isso pode igualmente permitir a redução das tensões comerciais entre
EUA, Europa e China. Se o mercado interno puder ser desenvolvido, a
China dependerá menos de divisas estrangeiras, de exportações e isto
reduzirá o desequilíbrio da balança mundial (grifo nosso. Tradução). É
necessário aumentar a renda da população rural para estimular o
mercado interior.
De onde a centralidade da experiência que ocorre lá. A descrevi em
diversos artigos recentes.
Encontramo-nos atualmente no escritório da comissão de bens públicos do
governo municipal (guoziwei).
O governo central, mas também os locais, detém as empresas e as
propriedades públicas.
Há pouco tempo sou assistente do diretor da comissão. Terei o status de
vice-diretor durante um ano. Aceitei esse posto oficial sem vacilar por que
me parece mais estimulante do que ficar na universidade onde a maioria
está desligada da realidade.
Nos últimos dez anos, na maior parte das províncias, os governos locais
estimularam grandes privatizações.
Em Chongqing, mesmo que as grandes privatizações tenham ocorrido, os
bens públicos locais cresceram de seis a oito vezes. As empresas privadas
locais, em paralelo, cresceram no mesmo ritmo. A experiência lá mostra
então que a propriedade pública não é necessariamente incompatível com
o empreendimento privado e que uma não substitui o outro. Parece-me
que não são relações de substituição, mas complementares (grifo nosso.
Tradução).
Um dos principais mecanismos em jogo está nos benefícios produzidos por
esses bens públicos na economia de mercado. Colhidos os seus benefícios
pelo governo municipal, permitem reduzir a tributação das empresas
privadas e dos indivíduos. Assim não é preciso tributá-los pesadamente,
já que os bens públicos tiveram seus rendimentos multiplicados por oito
em oito anos” (grifo nosso. Tradução).

A política de desenvolvimento do Oeste da China

Nos anos 1990 certos pesquisadores chineses advertiram os


dirigentes políticos sobre as desigualdades, principalmente inter-
regionais, crescendo a um ritmo perigoso.
Em Political economy of uneven development: the case of China,
Wang Shaoguang e Hu Angang mostraram que a região oeste da
China era particularmente subdesenvolvida e recomendaram ao
governo reagir: “as inegualdades crescentes não são uma
fatalidade. A ação política se impõe”.
Os relatórios redigidos por esses dois pesquisadores constituem
uma tomada de posição que foi referenciada pela Nova Esquerda.
Em janeiro de 2000 o Conselho dos Negócios de Estado criou um
grupo dirigente (lingdao xiaozu) encarregado de desenvolver o
oeste da China com a finalidade de ajudar essa região a chegar ao
nível de desenvolvimento das regiões costeiras, grandes
beneficiárias das reformas econômicas.
Esta política cobre seis províncias (Gansu, Guizhou, Qinghai,
Shaanxi, Sichuan e Yunnan), cinco regiões autônomas (Guangxi,
Mongolie interior, Ningxia, Tibet e Xinjiang) e uma municipalidade
(Chongqing) e visa estimular o crescimento econômico endógeno, a
reduzir as desigualdades sócio-econômicas e a garantir a
estabilidade social e política das regiões não majoritariamente Han.

“A china lançou sua estratégia de desenvolvimento do oeste do país


(xibu da kaifa) em 2001. Chongqing é uma das cidades mais importantes
da região e tem o status administrativo de uma província.
O governo central concedeu privilégios políticos às 12 regiões alcançadas
por esse projeto: Foram autorizadas a não tributar as empresas que
conseguiram aumentar seus rendimentos em 15% enquanto a média
nacional subiu 33% em 2008 e agora 25%. Certas províncias
abandonaram voluntariamente esse privilégio depois de dois ou três anos
e suas rendas são tributadas à razão de 33% com a finalidade de financiar
as despesas sociais fundamentais, como pagamento dos salários dos
professores ou construção de estradas.
Apenas Chongqing tem uma tributação para as empresas locais de 15%. É
isso que permitiu a eles atraíssem colossais investimentos estrangeiros de
empresas como a HP e Foxcon, que prevêem a produção de 20 milhões de
computadores portáteis por ano lá.
A HP transferiu seu centro de gestão de Singapura para Chongqing. Essa
ação é pouco habitual o suficiente para ser assinalada:
Os investidores estrangeiros nunca haviam trazido para a China seus
centros de gestão. São normalmente localizados em Singapura, onde as
taxa de impostos locais são de 17,5% ou em Hong Kong.
Impostos menores são um motor do desenvolvimento local;
paradoxalmente, isso pode não ser viável se os bens e empresas que
pertencem ao governo municipal não gerarem benefícios e não forem
aplicados. É por isso que se pode falar de um novo modelo. De forma
alguma é um retorno ao período anterior às reformas; o setor público não
gera sua receita tributando o mercado. O caso de Chongqing dá, portanto,
corpo ao conceito de economia de mercado socialista e à coexistência de
diferentes formas de propriedade no mercado. Muito não vêem nisto mais
que um slogam mascarando uma economia concorrencial de mercado.
É um aspecto fascinante deste modelo”.

O estatuto particular e o sucesso econômico da cidade lhe


permitiram lançar diversos projetos pilotos.
Embora as medidas populistas, como a campanha em grande
escala contra a corrupção local, tenham recebido maior cobertura
da mídia local, nacional e internacional, outras medidas como a
troca de terras ou o alojamento social não chamaram a atenção
antes do governo municipal e Cui Zhiyuan se lançarem numa
grande campanha publicitária.

Um novo gênero de troca de títulos de propriedade

[ver NT 2]

Na China as terras cultiváveis são propriedade coletiva, divididas


em pequenas parcelas e repartidas entre os agricultores sob a
forma de locação válida por 30 anos. Os governos das aldeias,
capitaneados pelo secretário do partido local são os verdadeiros
detentores do poder de decisão. Eleições organizadas após 1980
permitiram aos cidadãos designar diretamente seus dirigentes
locais. Isso lhes dá melhor controle sobre seus recursos e permite
aumentar sua independência e auto-suficiência; notadamente
através de empresas cooperativas urbanas e a gestão das terras
habitadas, zonas cultiváveis e das florestas [5].
Em outubro de 2008 o Partido comunista desenvolveu uma nova
política de reforma das terras destinadas a aumentar o insuficiente
nível de rendas dos 750 milhões de habitantes do campo e a lhes
encorajar a alugar ou transferir seu direito de uso da terra em um
mercado de terras em organização. Esta política corresponde à
extensão de projetos-piloto conduzidos na província de Guangdong
e na municipalidade de Chongqing. As terras coletivas foram
diretamente trocadas sem aquisição prévia pelo governo local.
Antes dessa lei os governos locais adquiriam as terras por preços
absolutamente irrisórios e realizam lucros substanciais as
revendendo bem mais caro. O Partido prometeu, presentemente,
transferir os direitos de utilização das terras de 226 milhões, dos
500 milhões dos trabalhadores do campo, que encontram trabalho
em outro local, não estando mais, assim, ligados a produção
agrícola. Esse fenômeno está na origem da ineficácia e da
subutilização das terras cultiváveis
A política posta em prática acelera o processo de urbanização: A
população migrante para as cidades pode transferir mais facilmente
seus direitos na utilização da terra e financiar suas despesas nas
cidades onde estão instaladas com a renda estável obtida na
locação da terra [6].
A experiência piloto de Chongqing nos permite, por consequência,
entrever os resultados dessa nova política nacional. Cui Zhiyuan
explica:

“Um dos aspectos cruciais da experiência desenvolvida em Chongqing


corresponde a política de desenvolvimento integrado das zonas urbanas e
rurais, que trata de dividir mais equitativamente os benefícios da
urbanização com as populações rurais. A urbanização conduz
efetivamente ao aumento do valor da terra.
O ano que vem marcará o centenário da Revolução de 1911. O elemento
central de condução econômica da teoria dos três princípios do povo de
Sun Yat-sem foi explicitamente inspirado pelo pensamento de Henry
George, pensador americano do imposto único sobre a terra. Ele dizia que
o aumento dos preços das terras não tinha nada a haver com o esforço dos
proprietários, mas sim com as rotas das estradas de ferro construídas pelo
governo, as lojas e as atividades diversas organizadas pelos indivíduos
num local preciso. Segundo ele era a ação desses diferentes indivíduos que
levava o preço dos terrenos a subir como consequência da aglomeração. A
valorização da terra não devia, por consequência, dar lucro a um único
indivíduo privado, mas ao conjunto da sociedade. De acordo com sua
estimativa, se o governo representasse o conjunto da sociedade e tirasse
proveito da maior parte da alta dos preços das terras se livraria da
dependência de outras formas de taxação. Ele chamou esse processo de
movimento pela taxa única. Quando Sun Yat-Sen estudava medicina no
Havaí conheceu um amigo de Henry George. Ele desejava encontrá-lo em
pessoa, mas havia morrido de uma crise cardíaca durante uma campanha
pela prefeitura de Nova Yorque. Esses ideais de socialização da renda
proveniente da terra concebidos por Henry George e Sun Yat-Sem
inspiraram a elaboração, em Chongqing, de um original método de
captação do valor da terra.
Em dezembro de 2008, Chongqing criou a primeira Bolsa de troca de
terras da China. Shanghai e Shenzhen têm suas bolsas financeiras, mas lá
está a primeira cidade da China a criar uma bolsa de arrendamentos
rurais (dipiao) [2][NT3]

Duas políticas majoritárias nacionais entram em contradição: A China


quer uma rápida urbanização, mas ela não quer depender da importação
de alimentos. Os dirigentes então fixaram uma superfície mínima de terras
agriculturáveis que não pode ser alterada. O conjunto das terras
agriculturáveis da China não pode ser menor que 1,8 bilhões de mus (120
milhões de hectares).
O Conselho de Estado deu a Chongqing status de zona especial de
experimentação devido à cidade haver resolvido a contradição entre os
dois objetivos nacionais graças as suas experimentações pioneiras.
Num primeiro momento pouca publicidade foi dada aos projetos de ponta;
esperavam que rendessem seus resultados completos. A estratégia adotada
não consistia em reduzir as terras agriculturáveis existentes, mas
aumentá-las. Isso não é possível a não ser pela substituição das terras
destinadas à construção por terras agriculturáveis.
Nos povoados as terras são divididas em terras cultiváveis e terras para
construção. Sendo as últimas divididas em parcelas residenciais e
industriais.
Certas usinas e estradas desativadas começaram a ser reconvertidas pelos
agricultores em terras cultiváveis.
Os camponeses levaram desvantagem em seu espaço residencial,
normalmente amplo, vivendo em zonas mais densas, mas também mais
confortáveis pelas novas condições, principalmente o acesso à água. Isso
permite transformar seus antigos locais de moradia em terras cultiváveis.
A superfície total agriculturável cresceu e contratos originais de
arrendamento puderam ser negociados na bolsa sem reduzir as áreas
cultiváveis. Não importa quem – quais sejam os intermediários,
compradores privados ou públicos – todos podem participar dos leilões da
bolsa de trocas no centro financeiro da municipalidade. Após sua
instalação em dezembro de 2008, 10 leilões já ocorreram. No último, 28 de
abril, o preço de um lote de um “mu” foi fixado em RMB140 mil (16 mil
euros). Esse montante retorna para o povoado que converteu sua nova
área cultivável. É por esse caminho que os camponeses podem lucrar com
a mais-valia das terras frente à urbanização.
De outra forma, em Pequim, por exemplo, apenas os residentes das zonas
limófores às cidades lucram, caso sua terra seja confiscada, com essa alta
de preços graça à urbanização, mesmo reclamando das compensações
financeiras que lhes são ofertadas.
Ao contrário em Chongqing mesmo aqueles que vivem longe das cidades
podem se beneficiar do processo de urbanização e receber uma
retribuição pelas terras agriculturáveis reconvertidas. O dinheiro retorna
então ao povoado que pode utilizá-lo como lhe aprouver. Isso depende do
que o Comitê da Aldeia decidir. As decisões devem ser tomadas por dois
terços das vozes do povoado”.

As habitações sociais

No que se refere a habitação da população urbana, após a


abolição, em 1988, das normas de destinação das habitações
públicas, os apartamentos foram vendidos aos locatários por
preços subvencionados e um sistema de ofertas imobiliárias
foi estabelecido, comportando programas de aluguel de baixo
custo para as famílias de renda mais modesta e com acesso à
casas para rendas mais elevadas e médias. Outras medidas
foram tomadas para flexibilizar a regulação sobre os preços
dos imóveis e desenvolver um mercado para os imóveis
antigos e um mercado para as locações. As condições de
habitação urbana melhoraram sensivelmente, mas as
necessidades das populações menos favorecidas ainda
ficaram sem solução em muitas cidades.

A evolução da política governamental não somente olhou para o


desenvolvimento e o crescimento econômico, mas também
para a melhoria da qualidade de vida da população após
2007, dinamizando fortemente os programas de habitações
sociais. Cui Zhiyuan explica que Chongqing lançou seu
próprio programa imobiliário, pois uma das principais
preocupações dos chineses nesse momento se refere ao
aumento dos preços dos apartamentos comerciais.
“Antes da reforma todas as habitações pertenciam ao Estado e eram
alugadas por um preço bem baixo. Depois os bens públicos foram
privatizados por um processo justo. Por exemplo, meus parentes
alugaram um apartamento em Pequim durante cerca de 40 anos até
poderem apresentar uma proposta de compra em 1990 por um baixo
custo, tendo em vista que eles trabalharam sempre na mesma
unidade de trabalho (danwei) e alugaram o imóvel por longos anos.
A porcentagem de proprietários na China é, por consequência, mais
elevada que nos Estados Unidos. Pode-se falar de uma verdadeira
tradição nas cidades chinesas. As expectativas da população são
muito elevadas. Eu casei nos Estados Unidos onde éramos dois
estudantes bem simples e maioria dos meus colegas americanos
casou-se sem comprar um apartamento ou casa. Entretanto muito
jovens chineses pensam que primeiro devem comprar um
apartamento. A maior parte das pessoas reclama do preço de
apartamentos para comercialização na China. Somente 5% dos
imóveis são de baixo preço e destinados aos mais pobres. Não é
suficiente. Por isso lançamos um novo programa imobiliário.
Diferentemente dos apartamentos para comercialização os
apartamentos públicos para locação deverão constituir de 35% a
40% do parque imobiliário. Essa medida destina-se a oferecer
apartamentos a preços razoáveis para os jovens diplomados.
Aqueles que não são pobres, mas que não podem se endividar tão
pesadamente como quando se trata de comprar um apartamento.
Começamos a construir esses complexos em 24 quarteirões
diferentes da cidade. 40 milhões de metros quadrados estão sendo
construídos com essa finalidade pelas empresas criadas pela
comissão de bens públicos na qual trabalhamos hoje. Esses
apartamentos de aluguel controlado interessam menos aos
investidores que são reticentes em participar desses programas. É
por isso que as outras grandes cidades não podem embarcar nesse
tipo de projeto; faltam-lhes empresas públicas locais que se
encarreguem disso”.

Do campus ao governo local

Os universitários chineses estão divididos entre duas tradições


intelectuais: A idéia ocidental de universidade autônoma,
introduzida durante a dinastia Qing pelos funcionários
formados no exterior; e os valores confuncianos, voltados
para a formação em letras, destinados à formação de
funcionários, tal como expresso no princípio dos Colóquios de
Confúncio: “tornar-se funcionário quando for um grande
erudito” (xue er you ze shi) [7]. As duas tradições coexistem
na academia chinesa. Certos pesquisadores se consagram à
pesquisa pura, ao passo que um tipo de mercado de idéias se
desenvolve no seio do qual certos universitários se esforçam
de dar uma contribuição e encontrar soluções para os
numerosos obstáculos e dificuldades encontrado pelo país na
sua busca feérica por modernização e desenvolvimento. Os
dirigentes selecionam das idéias que lhes são mais
convenientes. A natureza tecnocrática e pragmática do
governo chinês – e seus dirigentes que procuram identificar,
analisar e resolver os problemas quando eles aparecem na
intenção de conservar o poder – encoraja essas práticas.
Existem diversos meios de comunicação entre os
pesquisadores e os dirigentes. Os canais confidenciais que
permitem chamar a atenção dos dirigentes por meio de
publicações internas (neibu) e os de relações interpessoais se
revelam hoje menos eficazes que as publicações destinadas
ao grande público [8]. É dado que os dirigentes chineses lêem
atentamente os debates e publicações que aparecem na
imprensa tradicional e na internet, eles tomam conhecimento
das sugestões que os economistas, sociólogos e juristas –
para citar apenas as disciplinas consideradas pertinentes aos
dirigentes – lhes fazem e eles os convidam regularmente a
partilhar suas idéias com eles, vindo a participar da
elaboração ou revisão de novas políticas. Estes encontros
ocorrem em nível central, mas também local, onde as práticas
experimentais permitem a vantagem da inovação e da
flexibilidade. No caso de Cui Zhiyuan o governo de Chongqing
iniciou suas reformas antes de ter contato com ele:

“Em novembro de 2008 eu participei da conferência anual da associação


chinesa dos economistas, organizada em Chongqing. Nessa ocasião
o secretário do Partido Bo Xilai e o primeiro ministro adjunto da
prefeitura, o prefeito atual, Huang Qifan, encontraram-se com cinco
economistas. Ao longo dessa longa discussão que decidi falar pela
primeira vez que resolvi falar pela primeira vez da experiência
deles. Retornei aqui oito vezes em 2009 para fazer pesquisas e
participar de reuniões organizadas pelo governo local. Também
escrevi certo numero de artigos sobre a questão. Consagrei-me aos
estudos da política da municipalidade e comecei pesquisas mais
aprofundadas para compreender a abordagem do governo local e
assim ajudá-los a melhor se expressar. Certos dirigentes locais
obtêm resultados muito bons, mas eles não avaliam necessariamente
todas as implicações do que empreendem, nem têm uma boa visão
de conjunto. Não estão sós, no caso. A ideologia que domina entre
os economistas chineses, particularmente em Pequim, é muito
marcada pelo pensamento neoliberal. A política do governo de
Chongqing é muito crítica a isso. Os economistas de Pequim
reclamam que o governo municipal estimula pouco a privatização
sem compreenderem que o setor privado se desenvolve mais rápido
do que o setor público. Os economistas ficam enublados pelo
crescimento do setor público. Trata-se na realidade de um modelo
de desenvolvimento simultâneo de empresas públicas e privadas. As
justificativas teóricas são necessárias enquanto o pensamento
dominante, mesmo no estrangeiro, considerar uma como substituta
da outra. Assim, eu já havia começado a me manifestar sobre sua
experiência local antes de vir trabalhar aqui. Este ano eu vou
continuar publicando artigos internos endereçados aos
funcionários, mas também artigos que aparecerão nas revistas.
Muitas coisas acontecem aqui atualmente. Numerosas dificuldades
perduram e o nível de andamento é lento. De qualquer forma a
cidade tem suas vantagens tais como a importância da cultura e as
suas tradições num lugar que já foi capital da China, durante a
ocupação na segunda grande guerra”.

O método chinês de experimentação local

A divisão administrativa da República Popular da China é


estruturada em províncias (sheng), prefeituras (diqu), distritos
(xian), cantões (xiang) ou cidades (zhen). As aldeias (cun)
correspondem a um quinto nível, informal. As performances dos
governadores locais pouco tempo atrás eram medidas em termos
de crescimento econômico, mas a sociedade chinesa vem se
tornando cada vez mais fraturada (duanlie), para usar a expressão
empregada pelo sociólogo Sun Liping quando ele soou o sinal de
alarme [9] e as prioridades evoluíram ligeiramente. As formidáveis
desigualdades contribuíram para o aumento da instabilidade. O
Ministério da Segurança Pública assinalou 87 mil sublevações
populares em 2005, um aumento de 6,6% em relação a 2004, e de
50% com relação a 2003. O ministério não publicizou essas últimas
estimativas. Esses protestos são, na maior parte dos casos,
provocados por manifestações contra a corrupção ou abuso de
poder por parte de governantes locais, expropriações injustas,
violência policiais ou judiciárias ou ainda graves casos de poluição.
Não há, portanto, como negligenciar o fato de que os protestos não
são contra o Estado de forma monolítica e que sua preocupação
maior, dos protestos, é apresentar queixas ao escalão superior. O
governo central é chamado a resolver ou arbitrar as disputas com
as autoridades locais [10]. Os quadros locais podem perder todas
as chances de serem promovidos se ocorrerem sublevações em
sua jurisdição. Esta é a razão de colocar em evidência as inovações
institucionais, destinadas a pacificar os conflitos sociais e assegurar
a legitimidade do dirigente. As inovações mais bem-sucedidas são
copiadas e implantadas localmente antes de serem generalizadas
na escala da província ou do país inteiro.

“Na União Européia um tipo de exame político pelos “métodos flexíveis de


coordenação” é referenciado no programa comunitário de Lisboa. Ali se
lê que cada país membro da União européia deve respeitar os principais
objetivos da União e ter uma avaliação anual feita por uma delegação
constituída por outros países membros. Embora os objetivos gerais da
União européia sejam fixados coletivamente cada membro se beneficia de
uma grande margem de manobra quanto aos métodos escolhidos para sua
avaliação. Essas inovações são, entretanto, objeto de um exame periódico.
Esse mecanismo formal poderia servir de exemplo para a China.
Deveríamos avaliar esse tipo de mecanismo e organizar uma conferência
política.

São numerosos os exemplos de instabilidade social nas diversas províncias


chinesas. Os eventos que se seguiram à privatização de uma usina de
siderurgia local em Jilin, por exemplo, receberam cobertura midiática
nacional. Suspeitas de corrupção pesaram sobre estas privatizações e o
novo gerente foi assassinado depois que tentou despedir os empregados. É
um caso legal de grande complexidade, pois é difícil provar que foi
assassinado por empregados da usina e os testemunhos convergem para
um homem, que teria sido enviado pelos concorrentes, envolvido.
Exemplos como esse mostram aos governos locais que muitas
privatizações feitas muito rapidamente podem não apenas gerar
instabilidade, mas também perda de rendas potenciais que poderiam ser
investidas pelos proprietários e empresas públicas. Essas privatizações
acabam conduzindo a taxações mais pesadas das empresas privadas com
grandes danos a empreendedores e proprietários privados de onde os
governos esperam receber sustento. Diversas províncias tais como
Shandong consequentemente enviaram grupos de estudo para a região de
Chongqing com o objetivo de compreender como a comissão de bens
públicos gerou as empresas privadas e de propriedade municipal. No nível
central os dirigentes começam a se interessar pelas experiências
realizadas. O secretário do partido, Bo Xilai, que foi enviado para lá no
fim de 2007 é membro do Birô Político e seu pai, Bo Yibo, pertence à
primeira geração de dirigentes comunistas. Seu status político é reforçado
pela proeminência da experiência na cidade”.

* Emilie Frenkiel, antiga aluna da Ecole Normale Supérieure de


Lettres et Sciences Humaines e agregada para a língua
inglêsa, é doutoranda em ciência política na EHESS na
questão referente as concepções sobre a política dos
intelectuais chineses no início do século XXI. Ensinou e
estudou na Gran-Bretanha e na China. É Secretária de
Redação de La Vie des Idées. Seus próximos artigos
aparecerão no número 50 de Critique Internationale e em
Le Mondial des Nations, obra coordenada por Joao
Medeiros.

Outras informações: http://www.laviedesidees.fr/_Frenkiel-


Emilie_.html

Notas
[1] Cui Zhiyuan, « Liberal Socialism and the Future of China: A Petty
Bourgeoisie Manifesto », Tianyu Cao (ed.), China’s Model for
Modern Development, Routlege, 2005.
[2] János Kornai, economista húngaro, foi o primeiro a observar o
fenômeno da restrição orçamentária leve na economia húngara nos
anos 1970, uma economia socialista que se abria ao mercado com
base em reformas experimentais. János Kornai, Eric Maskin and
Gérard Roland, « Understanding the Soft Budget Constraint”,
Journal of Economic Literature, American Economic Association,
Vol. 41, n°4, 2003.
[3] Cui Zhiyuan, “Anshan xianfa he hou Futezhuyi” (La Constitution
Angang et le post-Fordisme), Dushu (Lire) 1, 1996. Cui Zhiyuan
também se fez conhecer por ter sublinhado a importância de
Dazhai, uma comuna modelo dos tempos de Mao.
[4] Wang Shaoguang, “Adapting by learning: the evolution of China’s
rural health care financing”, Modern China vol. 35 n°4, July 2009;
Heilmann, Sebastian. « From Local Experiments to National Policy:
The Origins of China’s Distinctive Policy Process », The China
Journal, No. 59, Jan 2008 : 1-30.
[5] Gunter Schubert, “Democracy Under One-Party Rule”, China
Perpectives, 46, 2003 ; O’Brien, Kevin J. and Li, Lianjiang, Rightful
resistance in rural China, by New York and Cambridge : Cambridge
University Press, 2006.
[6] Sarah Y. Tong & Gang Chen, « China’s land policy », East Asian
Institute Background Brief No. 419, 11 Décembre 2008)
[7] Entretiens de Confucius, chap. 19.13
[8] On peut citer les numéros spéciaux dédiés à Chongqing dans
le 21st century business Herald et Outlook weekly.
[9] Sun Liping, Duanlie (Division), Beijing, Shehui kexui wenbian
chubanshe, 2003.
[10] Kevin O’Brien ed., Popular Protest in China, Cambridge,
Harvard University Press, 2008.

Notas de tradução

[NT 1] Para uma definição de Restrição Orçamentária Frouxa ver:


http://clipping.vrc.puc-rio.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?
infoid=22254&sid=67&tpl=printerview

[NT 2] – Na China a distinção entre morador urbano e rural é dada


pelo Estado e chega mesmo a constar do documento de
identidade. Nesse sentido a denominação dada aqui de
“camponês” ou “trabalhador rural” não implica
necessariamente num indivíduo que viva da produção
agrícola, apenas que vive num lote de terra fora dos limites
formais da cidade. Seja a terra produtiva ou não.

[NT 3] – O mecanismo desta bolsa é semelhante ao mecanismo da


Bolsa de Créditos Carbono. A conversão de terras de outro
uso para terras agriculturáveis dá direito à emissão de um
bônus em favor da aldeia ou cidade. Esse bônus pode ser
utilizado para arrendamento de outras terras por companhias
de desenvolvimento imobiliário. O resultado líquido da
operação é revertido para a comunidade e pode ser utilizado
conforme decisão local.

Para aprofundar...
• Os artigos de Cui Zhiyuan estão acessíveis on line em
seu blog: http://www.cui-zy.cn/pub.php

• Xu Youyu, « The Debates between Liberalism and the New


Left in China since the 1990s », Contemporary Chinese
Thought, Vol. 34, No. 3, 2003

• Marie-Claire Bergère, Sun Yat-sen, Fayard, 1994

• Emilie Frenkiel, « Political change and democracy in China :


an interview with professor Wang Shaoguang », La vie des
idées, 15 Juillet 2009. Ver em
http://www.booksandideas.net/Political-change-and-
democracy-in.html?lang=fr

• Emilie Frenkiel, « Wang Shaoguang : recherché et


engagement politique en Chine », Sinopolis, 16 septembre
2010. Ver em http://sinopolis.hypotheses.org/204

• Emilie Frenkiel, « Les universitaires chinois et la politique du


quotidien » in « À la recherche de la contestation politique
dans la Chine urbaine », Jean-Louis Rocca (dir.) Dossier
Kiosque du CERI « À la recherche de la contestation politique
dans la Chine urbaine », avril 2010

• Jean-Louis Rocca, « Chroniques chinoises du


mécontentement populaire», La vie des idées, 6 July 2010.
Ver em http://www.laviedesidees.fr/Chroniques-chinoises-
du.html

• Site sobre inovação institucional na China :

http://www.innovations.harvard.edu/awards.html?id=31011

• « For millions, owning a home is just a dream », Southern


Weekend, June 10 2010. Veja em

http://chinaelectionsblog.net/?p=6983

Observação.: Tradução livre do original em


http://www.laviedesidees.fr/Un-modele-de-socialisme-liberal-en.html
por Demetrio Carneiro

Potrebbero piacerti anche