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Armando Emerenciano*
Resumo
Esse trabalho busca discutir a comunicação em sala de aula a partir de quatro dos axiomas expostos
por Watzlawiick, Beavin e Jackson. O ensino é apresentado como um processo de formação e transformação
da conduta através da comunicação ocorrida em sala de aula. Nos axiomas apresentados no livro Pragmática
da Comunicação Humana o professor ocupa o papel de articulador da comunicação. Colocando o professor
como articulador da comunicação mencionamos momentos marcantes dos axiomas aplicados à sala de aula.
Abstract
This work intends to discuss the communication in the classroom based on four axioms proposed by Watzlawick, Beavin and
Jackson. Teaching is presented as a process of formation and transformation of behavior through class communication. In the work
“Pragmatics of Human Communication”, teachers play the role of communication catalysts. Based on these axioms, we set the teacher
as someone who facilitates and articulates communication. We mention remarkable moments of this experience, all of them applied to
classrooms.
1 Introdução
Em sua utilização cotidiana, podemos observar diversas alusões ao termo ensino enquanto uma palavra
que designa transmissão de conhecimento entre pessoas através da comunicação. De forma mais genérica,
Ferreira define o ensino como: “o esforço orientado para a formação ou a modificação da conduta humana”
(1986:532). Nesse sentido a aprendizagem ocorre quando o ensinando incorpora novos conhecimentos ao
repertório já existente, tornando-se mais capaz.
A aquisição de novos conhecimentos e habilidades geram um processo de mudanças nas pessoas que é
facilitado quando eles contam com a influênciade uma terceira pessoa fora da relação imediata. (Cf. Schein,
1988). Essa terceira pessoa pode ser um amigo, namorado, consultor, terapeuta ou um professor, ou seja, uma
pessoa com a qual se estabelece uma relação de ajuda, se tem confiança e respeito.
A comunicação é o meio que permite ações mútuas entre pessoas para a aprendizagem. Existe comunicação
quando uma pessoa influi sobre o comportamento de outra, mesmo sem falar. O essencial é que só se pode
fazer alusão à “comunicação”, no sentido exato da palavra, quando o receptor tem oportunidade de poder reagir
à mensagem do emissor.
Para discutir a comunicação em sala de aula, objetivo principal deste trabalho, analisaremos quatro dos
axiomas expostos por Watzlawick, Beavin e Jackson no livro Pragmática da Comunicação Humana. O primeiro
axioma pragmático é o seguinte:
“A impossibilidade de não comunicar” (1967:44)
Noutras palavras, é impossível não comunicar. A simples presença de uma pessoa modifica o
comportamento do outro. E tudo isto, sem a mínima troca de palavras. Ou seja, a presença do outro basta para
*
Psicólogo e professor da Universidade de Fortaleza. E-mail: armandoemerenciano@unifor.br
uma pessoa modifique seu comportamento e ela não pode fugir desta comunicação. Neste sentido comportamento
é igual a comunicação. A palavra dita é uma parte da comunicação, uma parte essencial, mas não a única.
Trazendo isto para a prática do professor, significa afirmar que, ao entrar na sala de aula, ele exerce uma
influência sobre todos os presentes, simplesmente devido à sua presença. Consideremos agora o segundo axioma:
Toda comunicação contém um aspecto de conteúdo e um aspecto de relação tais que o segundo classifica o primeiro e é,
portanto, uma metacomicação”. (WATZLAWICK, BEAVIN E JACKSON, 1967:50).
Analisaremos agora o texto do terceiro axioma, procurando explicar os termos técnicos em linguagem
coloquial.
• Sintaxe - forma na qual as palavras estão reunidas numa frase;
• Semântica - ciência que estuda o significado das palavras;
• Digital - que funciona segundo o princípio do contar (matematicamente correto);
• Analógico - neste sentido com significação figurada: em imagens (icônico)
Se tentarmos traduzir o axioma acima formulado da linguagem científica para a linguagem cotidiana,
teremos o seguinte texto: a comunicação humana se desenvolve tanto na forma matematicamente correta como
em imagens. A comunicação matematicamente correta (objetiva) contém uma ordem de palavras variada e
estruturada segundo uma lógica rigorosa: sem problemas, porém, os significados das palavras (símbolos e
números) utilizados para este tipo de comunicação não bastam para descrever relações emocionais. Por outro
lado, a comunicação analógica, aquela que funciona preponderantemente com imagens (ícones), utiliza uma
linguagem mais significativa e carregada de emoções, sendo, contudo, pouco adequada para expressar
corretamente fatos estritamente objetivos. Em outras palavras, o terceiro axioma afirma: Os dois aspectos de
cada comunicação, o aspecto do conteúdo e o da relação, correspondem a um linguajar muito especial: um
linguajar digitalmente correto e o outro, um linguajar “icônico” e carregado de emoção.
Evidentemente que cada comunicação contém estes dois aspectos. Observamos, sobretudo na arte, uma
mistura equilibrada, onde o artista expressa idéias e emoções, através de diversos meios de expressão. Então o
que significa o terceiro axioma de Watzlawiick, Beavin e Jackson para a prática da sala de aula? Significa que
o professor deveria poder se expressar de maneira digitalmente correta, quando se tratam de textos e relações
científicos. Para discutir assuntos da sala de aula, tais procedimentos são essenciais. Mas como discutir relações
entre pessoas só com textos?
Na vida cotidiana, e às vezes na sala de aula, encontramo-nos forçados a cobrir zonas periféricas da
comunicação que não podem ser dominadas por via puramente digital, nem puramente análoga. Por esta razão,
temos “dificuldades de expressão”. Penso que podemos fazer uso do conceito de letramento, ampliado, como
proposto por Cavalcante (1999).
“O conceito mais amplo de letramento não desconsidera a importância das palavras, mas aceita as outras formas de composição
de mundo, incluindo arte, dramatização, expressão corporal, canto, música e a escrita”.
Na prática, isso significa que, tratando-se de um texto denso, que apenas a leitura não permite a sua
compreensão imediata, o professor deve buscar a ajuda de outros meios, como os filmes, música, técnicas de
trabalho com grupos etc., que estando integrados ao con(texto) da disciplina, podem ser utilizados como meios
de ensino. Essas experiências costumam provocar excelentes reflexões nos alunos que, geralmente, as relacionam
à sua história de vida, permitindo-os discutir a realidade de forma mais ampla, uma vez que vinculam a
aprendizagem a sua própria vivência, ou seja, relacionando a aprendizagem também ao sócio-emocional.Vamos
ao último axioma de Watzlawick, Beavin e Jackson: “Todas as permutas comunicacionais ou são simétricas
ou complementares, segundo se baseiem na igualdade ou na diferença”.(1967:64)
Assim, os processos de comunicação interpessoal ou são simétricos, ou complementares, segundo se
baseiem as relações entre os interlocutores: se na igualdade ou na diferença. Neste axioma trata-se principalmente
do poder que possuem os interlocutores. Ao se enfrentarem, dois homens, cujo status é aproximadamente
igual, teremos uma comunicação “simétrica”. Porém, se o status dos interlocutores é desigual, fala-se de uma
comunicação “complementar”, ou seja, que se complementa. Cabe a indagação: A relação entre o professor e
os alunos deveria ser simétrica ou complementar?
O que se espera do professor é que no início das aulas, a comunicação só pode ser complementar. Isto é,
os participantes chegam a aula para aprender algo. É o professor que sabe mais que os outros e lhes pode
transmitir esta sabedoria. Porém, acreditamos que o professor deve buscar transformar pouco a pouco a
comunicação de complementar em simétrica. Isso porque, um bom curso precisa de uma conversa alternada
entre interlocutores, favorecendo, assim, um clima de intercâmbio. Principalmente no ensino superior, onde os
alunos já trazem conhecimento, habilidades e experiência de vida e trabalho importantes.
Referências
CAVALCANTE JUNIOR, F. S. Letramentos múltiplos: da palavra às múltiplas formas de representações de
mundos. 1999. Palestra proferida no 12o Congresso de Leitura do Brasil. Campinas, 1999.
SCHEIN, Edgar H. Consultoria de procedimento. São Paulo: EPU, 1972.
WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Jackson. Pragmática da comunicação humana. Cultrix: São Paulo, 1967.