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Marshall
Como há mais de 12 anos o Brasil vendo sendo governado por um partido cuja
ideologia é de esquerda, o que vemos é que são fortes as políticas públicas em
prol do combate à desigualdade socioeconômica, porém, a igualdade absoluta
nos parece algo inatingível, seja pela qualidade e abrangência dos serviços
sociais prestados no Brasil, seja por conflitos de interesse. Mas como o próprio
autor diz, não buscamos uma igualdade absoluta. Eis que há limites para o
movimento em favor da igualdade, já que parece haver um abismo entre as
classes mais e menos favorecidas, que só seria possível desaparecer se
houvesse uma mudança significativa no sistema capitalista, algo que não é do
interesse das elites.
Cidadania e classe social, para Marshall, por divergirem-se fortemente quanto aos
fins, tomaram a forma de conflito entre princípios opostos. A observância de que,
no século XX, cidadania e sistema de classe capitalista encontram-se em guerra
foi o que trouxe ao autor a preocupação em investigar os impactos de uma sobre
outra, e eventualmente entrever algum tipo de compatibilidade. Ainda assim, os
termos continuam a carecer de definições mais concretas.
Marshall ocupa-se em realizar uma diferenciação entre dois tipos de classe social
que são importantes para o seu estudo. Ele ressalta que o primeiro deles é a
classe que “se assenta numa hierarquia de ‘status’ e expressa a diferença entre
uma classe e outra em termos de direitos legais e costumes estabelecidos que
possuem o caráter coercivo essencial da lei” (p. 76), sendo uma instituição,
emergida naturalmente, em seu próprio direito. Trata-se, de certa forma, do
sistema de classes do feudalismo medieval, e o autor aponta incisivamente a
incompatibilidade deste sistema com as aspirações de cidadania, quando afirma:
“Uma justiça nacional e uma lei igual para todos devem (...) enfraquecer e,
eventualmente, destruir a justiça de classe, e a liberdade pessoal, como um direito
natural universal, deve eliminar a servidão” (p. 77).
Tem-se, portanto, que até o início do século XX, momento em que os direitos
sociais começam a se efetivar, o desenvolvimento da cidadania tenha exercido
pouca influência direta sobre a desigualdade social (p. 87). A ampliação dos
direitos sociais constituiu-se num papel decisivo na relação com o sistema de
desigualdade, ainda que seu objetivo aparente não tenha sido atacar a
desigualdade de renda, mas sim promover a igualdade de “status”.
Por fim, julgam-se importantes dois aspectos da análise proposta por Marshall. Em
primeiro lugar, a essencialidade de sua definição de cidadania, em geral, e de sua
tipologia dos direitos, em particular. Ainda que o empreendimento do autor não
chegue a se constituir numa teoria específica, apesar de certas e dispersas
generalizações quanto ao surgimento da cidadania na Europa, suas formulações
fornecem ferramentas importantes para a compreensão de fenômenos sociais ao
longo da história. Um segundo aspecto a se acentuar é a relação crucial
estabelecida por Marshall entre busca por igualdade, por meio da universalização
da cidadania, e manutenção de um sistema de desigualdades, produzido pelo
próprio desenvolvimento de uma economia de mercado. Ele demonstra que a
convivência entre ambos é desejável e necessária dentro da lógica capitalista
vigente. Nesse sentido, vale destacar a atualidade de certas questões por ele
levantadas, embora a análise tenha sido realizada há seis décadas.