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FRIEDRICH FROEBEL: O CONTEXTO EUROPEU DO SÉCULO XIX E OS

JARDINS DE INFÂNCIA

FRIEDRICH FROEBEL: THE EUROPEAN CONTEXT ON XIX CENTURY AND


THE KINDERGARDENS

Juliara Dias dos SANTOS1


Adão Aparecido MOLINA2

RESUMO

O educador alemão Friedrich Wilhelm August Froebel (1782-1852) criou o jardim de infância
em 1837. A fim de compreender sua teoria educacional voltada para a criança de 0 a 6 anos de
idade, fez-se necessário um estudo do contexto histórico do período no qual viveu, marcado
pela Revolução Francesa (1789) e pela revolução industrial na Inglaterra. A Alemanha - seu
país de origem - emergiu com características peculiares, industrializando-se tardiamente,
marcada pela descentralização política, com muitos reinos e principados. Por outro lado,
destacou-se no campo artístico e filosófico e com um forte sentimento nacionalista. Destarte,
desvendar a história do período foi fundamental para apreender as influências auferidas pelo
autor em referência. O estudo teve como âncora a pesquisa qualitativa com enfoque histórico-
estrutural e se utilizou de fontes bibliográficas. Com esse estudo foi possível assimilar o
pensamento místico e simbólico do pedagogo alemão, caracterizado pela religiosidade
protestante, pela defesa da sociedade equilibrada e harmoniosa, que se iniciaria com a educação
da criança desde o ventre materno.

Palavras-chave: Friedrich Froebel. Europa século XIX. Jardim de infância.

ABSTRACT

The German educator Friedrich Wilhelm August Froebel (1782-1852) created the kindergarten
in 1837. To understand his theory about kids between 0 and 6 years old was necessary a study
on the historical context of the time he lived, marked by the French Revolution (1789) and the
Industrial Revolution in England. Germany - his birth country - emerged with peculiar
characteristics, industrializing itself later, highlighting by the political decentralization with lots
of kingdoms and principalities. On the other hand, it highlighted in the artistic and philosophical
field and a strong nationalist feeling. With that said, knowing the history of this period was very
important to understand the author’s influences. The anchor of this study was the qualitative
research with a structural and historical focus and bibliographic sources. It was possible to
absorb the mystic and symbolic thought of the Germany pedagogue, characterized by the

1
Possui graduação em Letras pela Faculdade Estadual de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (2009);
Especialização em Fundamentos teórico metodológicos em Educação Especial e Educação Infantil pela Faculdade
Estadual de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (2012); Graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual
do Paraná - Campus Paranavaí (2013) e Mestrado em Ensino: Formação Docente Interdisciplinar, pela
Universidade Estadual do Paraná - Campus Paranavaí (2016). juliarasantos2011@hotmail.com
2
Doutor em Educação e Pós-doutor em História pela Unesp Campus Assis. Professor do Colegiado de Pedagogia
e do Mestrado em Ensino da Universidade Estadual do Paraná - Unespar - Campus de Paranavaí.
adaoamolina@gmail.com
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protestant religiosity, to defend the balanced and harmonic society that begins with the children
since the maternal belly.

Keywords: Friedrich Froebel. XIX century Europe. Kindergarten.

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Friedrich Wilhelm August Froebel (1782-1852) foi o pedagogo alemão responsável por
inaugurar uma teoria educacional voltada para a criança de 0 a 6 anos de idade, instituindo o
primeiro jardim de infância na Alemanha em 1837. A fim de compreender sua obra-prima A
educação do homem, de 1826 (FROEBEL, 2001), e sua teoria educacional, faz-se necessário,
primeiramente, realizar um estudo do contexto histórico no qual viveu, uma vez que as
transformações e as influências as quais vivenciou implicam diretamente no seu modo de pensar
a sociedade, o indivíduo e a educação.
Segundo Figueira (1995) é necessário conhecer o passado não como forma de satisfazer
curiosidades, mas sim, com o objetivo de compreender o presente e refletir sobre o futuro. Além
disso, a autora defende que não nos cabe julgar como certos ou errados os pensamentos
remanescentes, uma vez que cada pensador viveu em determinado período sendo influenciado
pelas relações sociais e pelo modo de produção material da vida humana ali existente.
Eis a relevância em se conhecer períodos históricos antecedentes, já que cada indivíduo
age de acordo com o contexto no qual vive. Assim, não é possível considerar nossa sociedade
como a correta, desconsiderando os pensamentos antepassados. Por outro lado, é possível
perceber que ainda há resquícios da pedagogia de Froebel nos dias atuais3.
Ademais, segundo Saviani (2002), o autor não é muito bem conhecido pelos
profissionais da educação na atualidade, por isso o objetivo é reverter esse quadro, para que os
educadores reflitam e aperfeiçoem a sua prática pedagógica. É essencial que, não apenas
pesquisadores e acadêmicos conheçam os autores clássicos, mas, também, os professores que
lidam diretamente com o educando em sala de aula, em especial os profissionais de educação
infantil; pois o educador é um intelectual que precisa se manter atualizado a fim de aperfeiçoar
sua prática pedagógica.

3
Veja-se mais a esse respeito na dissertação intitulada “A proposta educacional de Friedrich Froebel: dos jardins
de infância à atual educação infantil no Brasil” de autoria de Juliara Dias dos Santos, orientada pelo Prof. Dr.
Adão Aparecido Molina, defendida em maio de 2016, no Programa de Pós-Graduação em Ensino da
Universidade Estadual do Paraná, campus de Paranavaí.

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O passado está presente mesmo que de forma ressignificada. Conforme pensa Kulhman
Junior (2015), não se pode inventar a roda, ou seja, é preciso saber que as práticas que
utilizamos hoje já foram pensadas em determinado momento. Portanto, é fundamental que os
professores apreendam os conceitos do educador alemão Friedrich Froebel, para que tenham
clareza de que muitos dos ideais que estão presentes na educação da atualidade não são
novidades, mas que já foram pensados para a educação do século XIX.
Diante do exposto, justifica-se a relevância do presente estudo, a fim de investigar as
influências perpassadas pelo contexto histórico vivenciado pelo criador dos jardins de infância.
O estudo teve como âncora a pesquisa qualitativa com enfoque histórico-estrutural e se utilizou
de fontes bibliográficas e documentais.
Os resultados apontaram que a forte propagação do nacionalismo alemão, a
religiosidade da família que era protestante, o contato direto com a natureza, as transformações
na sociedade, advindas da Revolução Francesa e industrial, entre outros fatores, influenciaram
o educador alemão a criar uma teoria educacional voltada para as crianças de até 6 anos de
idade. Esse autor criou uma Pedagogia da infância, aproximando-se da psicologia ao inter-
relacionar os elementos intelectual, físico e espiritual, tornando-os interdependentes.
Destarte, é possível perceber a influência de Froebel ainda hoje no Brasil, haja vista que
as instituições de Educação Infantil exploram o jogo como recurso pedagógico e valorizam a
expressividade natural da criança, recursos idealizados por esse pensador para a formação das
crianças de 0 a 6 anos de idade.

2 O CONTEXTO EUROPEU DO SÉCULO XIX E A CRIAÇÃO DOS JARDINS DE


INFÂNCIA

Friedrich Froebel viveu em um período repleto de revoluções e transformações em


âmbito mundial. Conforme escreve Hobsbawm (2010), o momento em referência foi
demarcado pela “dupla revolução” ou “era das revoluções”, no qual ocorreram a Revolução
Francesa (1789) e a revolução industrial que eclodiu na Inglaterra em 1780. Assim, a França
viria a influenciar ideologicamente os demais países, enquanto que a Inglaterra influiria no
aspecto econômico.
Segundo o historiador em referência, as revoluções de 1789 a 1848 foram responsáveis
pela ascensão da classe liberal burguesa e do capitalismo, consequentemente, pela expansão do
comércio, pelo desenvolvimento das indústrias e pelo crescimento urbano. O movimento

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iluminista surgiu no período como contraponto aos ideais tradicionais da igreja, defendendo a
liberdade, a igualdade e a fraternidade, que se tornaram princípios da Revolução Francesa.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 4 foi um marco
da Revolução Francesa. Os burgueses se contrapunham à sociedade hierárquica, porém
defendiam o direito à propriedade privada. Marx e Engels (2011) explicam que a burguesia
surgiu como classe revolucionária, porém, preocupada com os levantes em massa, retrocedeu
ao conservadorismo, realizando compromissos com o rei e a aristocracia.
Não se pode deixar de citar a figura de Napoleão Bonaparte, líder que deu início ao
regime burguês. Considerado o mito “Deus-sol”, inaugurou o pensamento de que a sociedade
estaria aberta aos talentos, uma vez que ascendeu de pequeno cabo a imperador, por meio de
seus próprios méritos.
Já a revolução industrial teve seu ápice entre os anos de 1780 a 1800, findando-se em
1840 com a indústria pesada. Hobsbawm (2010) explicita que os produtos têxteis ganharam
campo uma vez que as máquinas eram simples e baratas:

As exigências que se derivaram do algodão – mais construções e todas as atividades


nas novas áreas industriais, máquinas, inovações químicas, eletrificação industrial,
uma frota mercante e uma série de outras atividades – foram o suficiente para que se
credite a elas uma grande proporção do crescimento econômico da Grã-Bretanha até
a década de 1830. (HOBSBAWM, 2010, p. 73-74).

Os meios de produção passaram por um prolongado processo de desenvolvimento,


acentuando também a diferença de classes. Se antes o artesão trabalhava com o produto de
forma doméstica, com o passar do tempo o processo tornou-se industrial, tornando o trabalhador
apenas um acessório da máquina. Assim, com o aumento da população, cresceu também a
demanda por produtos, o que fez a máquina substituir a manufatura.
Hobsbawm (2010) explica que o crescimento demográfico impulsionou as profundas
mudanças no período entre 1789 e 1848. A população rural iludida pelos melhores salários
citadinos abandonou o campo para trabalhar na cidade, causando um êxodo em massa, o que
fez surgir uma necessidade maior no fornecimento de alimentos. Além do acréscimo no número
de consumidores, houve o aumento do número de trabalhadores jovens. “O mundo nesse
período foi bem mais jovem do que qualquer outro anterior: cheio de crianças, com jovens
casais ou pessoas no auge da juventude” (HOBSBAWM, 2010, p. 273). A citação do autor em

4
A Declaração foi um documento valoroso, segundo Hobsbawm (2010), pois os homens passaram a adquirir os
mesmos direitos perante a lei, e as profissões abriram-se para os talentos. Leia-se mais a respeito em:
HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções 1789-1848. Tradução de Maria Tereza Lopes Teixeira e Marcos
Penchel. 25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2010.

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referência nos remete à valorização da infância no período, levando Froebel a preocupar-se com
a educação específica para essa fase da vida – a educação das crianças pequenas.
Não obstante, crescia também o descontentamento da classe proletária, uma vez que era
uma classe explorada, o que gerou uma revolução social. Mulheres e crianças também
trabalhavam a fim de garantir sua subsistência, recebendo um salário inferior ao dos homens.
A esse respeito, Marx e Engels (2011, p. 63) argumentam: “quanto menos o trabalho manual
requer habilidades e dispêndio de forças, isto é, quanto mais a indústria moderna se desenvolve,
tanto mais o trabalho dos homens é sufocado pelo das mulheres”.
O novo trabalhador, antes acostumado com o trabalho agrícola ou artesanal, precisava
adaptar-se ao trabalho em ritmo ininterrupto nas fábricas. Com isso, surgiu a necessidade de
capacitar essa mão de obra. Dessa forma, pensadores começaram a se preocupar com uma nova
pedagogia que atendesse às necessidades da sociedade emergente. Um exemplo foi Lancaster
(1778-1838), o qual se preocupou em sistematizar um ensino elementar de alfabetização
realizado por voluntários.
Manacorda (2010) escreve que nesse período surgiram os exames, bolsas de estudos, o
que caracterizou formas de competição individualista. Também surgiu o ensino mútuo, de
caráter particular, primeiramente na Inglaterra. Assim, um mestre instruía alguns monitores que
ensinavam outros discentes enquanto o mestre os supervisionava. Nesse modelo de ensino
notam-se algumas características militares e da indústria, uma vez que se mantinham a
disciplina e a mecanicidade na aprendizagem.
Percebe-se, assim, que o novo trabalhador precisava estar preparado para as constantes
e inovadas mudanças tecnológicas, daí a necessidade da instrução das massas. Dessa maneira,
a pedagogia moderna caracterizou-se pelas relações da instrução técnico-profissional,
enfatizando habituais práticas de observação e imitação.
Hobsbawm (2010) também ilustra as carreiras dispostas no período estudado: os
negócios, a educação, as artes e a guerra. As referidas carreiras levariam o indivíduo à ascensão
social e financeira. Porém, para adentrar em uma das funções, era necessário possuir recursos
iniciais, o que para a família trabalhadora era quase impossível. Por conseguinte, conseguir que
algum membro da família adentrasse em um cargo burocrático, no ensino ou no sacerdócio já
seria um grande feito.
Dessa forma, para o trabalhador pobre restava o emprego nas fábricas. Engels (1845),
em A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, descreve a situação desumana dos
operários das indústrias. É devido a essas subcondições que surgiu a Revolução de 1848, já que
o sentimento dos trabalhadores era de ódio pelos patrões. Segundo Hobsbawm (2010), o
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trabalhador pobre poderia tornar-se burguês, o que era extremamente difícil pois ele não detinha
um capital inicial para isso, poderia continuar a ser oprimido ou poderia se rebelar. Seguindo a
última opção é que surgem a consciência da classe proletária e o socialismo.
Conforme o historiador supracitado, o termo socialismo surgiu em 1820, sendo o
industrial e filantropo inglês Robert Owen (1771-1858) seu maior expoente. O ano de 1830 foi
o marco para o surgimento do movimento revolucionário proletário-socialista. A partir de 1840
o proletariado e o comunismo atingem um maior número de seguidores. Porém, a classe
burguesa, com o objetivo de manter-se no poder, utilizou-se da religião a fim de conter os
trabalhadores insatisfeitos.
Nesse contexto, tanto Froebel quanto seu mestre Pestalozzi5, envolvidos pelo sistema
capitalista que emergia e seguidores do protestantismo, defendiam que o homem deveria se
adaptar ao que lhe foi dado pelo espírito divino, e somente por meio do trabalho é que se
atingiria uma vida moralmente virtuosa.
Segundo Hobsbawm (2010) os trabalhadores e os patrões possuíam algo em comum, o
vício pelo álcool e pela prostituição. Diante dessa realidade, Froebel defendia fervorosamente
uma vida pura e santa, a valorização da moral e da vivência harmônica em sociedade. Dessa
maneira, preocupou-se com a formação de um novo homem para a sociedade capitalista que se
estabelecia, sendo necessária uma organização entre os membros. Por isso, era preciso deixar
claro quem lidera e quem é subordinado; pois, se cada indivíduo realizasse a sua função dentro
dessa sociedade, ela estaria em equilíbrio e, consequentemente, em harmonia.
Apesar de vários pensadores refletirem sobre a instrução pública no período, a grande
maioria da elite defendia que para o pobre trabalhador bastava inculcar a doutrina cristã, e no
âmbito educacional, saber o elementar era suficiente. Afinal, se o trabalhador pobre recebesse
maior instrução do que essa, era maior o risco de questionar o sistema imposto, de incitar
rebeliões e de propagar o comunismo.
Manacorda (2010) relata que, devido a esse forte doutrinamento, até mesmo os
intelectuais que propagavam uma transformação da sociedade eram levados a cair em
contradição:

E pensar que, até nobres inteligências, como Pestalozzi e outros, eram induzidos a
levar em conta, de certo modo, semelhantes argumentações, tamanha era a autoridade
e a firmeza com que eram propostas, e quão difícil era provar princípios contra a
realidade do momento! (MANACORDA, 2010, p. 333).

5
Johann Heinrich Pestalozzi foi um educador suíço e professor de Froebel. Ver mais a esse respeito em: ARCE,
Alessandra. A pedagogia na “era das revoluções”: uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel.
Campinas: Autores Associados, 2002a.

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A partir dessa leitura compreendemos o aspecto liberal do pensamento de Froebel, uma
vez que ele criou uma teoria educacional voltada para a classe burguesa. Um exemplo disso é
o papel da mulher na visão do autor, visto que ela não poderia trabalhar fora de casa, e sim,
dedicar-se ao lar e à educação do filho, em espera do pai, o provedor do lar. Embora sua teoria
tenha sido considerada mística, obscura e religiosa, o criador do jardim de infância se
preocupava com o indivíduo, com o desenvolvimento dos talentos individuais, para que cada
um pudesse desempenhar o seu papel social e viver em harmonia nessa sociedade emergente.
O país de origem de Froebel – a Alemanha – ficou caracterizado pela divisão em muitos
reinos, cidades, províncias e estados; e pela revolução tardia, permanecendo com atividades
agrícolas, características do feudalismo. No século XVIII, apenas o estado da Prússia destacou-
se como grande potência, já com características industriais. No final desse século, o
mercantilismo6 e o absolutismo7 entraram em crise, dando espaço para a ascensão da burguesia,
para o desenvolvimento da indústria manufatureira, e para o crescimento do capitalismo liberal.
No campo filosófico alemão, o destaque foi para o Idealismo de Hegel e a filosofia dos
neo-hegelianos. Nesse contexto, o pensamento alemão era carregado de misticismo e
simbolismo. Segundo Hobsbawm (2010), isso se dava implicitamente como uma reação
nacionalista contra a influência francesa. As discussões aconteciam no campo das ideias, isto
é, não partiam do material, não se fundamentavam na realidade. Por isso os filósofos idealistas
foram criticados por Marx e Engels.
Quando Marx nasceu, Froebel já completava 36 anos de idade. Assim sendo, quando
Marx começou a divulgar os seus conceitos, o pedagogo alemão já possuía suas convicções
formuladas, portanto, as ideias marxistas não viriam a influenciá-lo. Na literatura da época, o
país em questão destacou-se com Goethe (1749-1832) e Schiller (1759-1805); e na música com
Beethoven (1770-1827) e Sebastian Bach (1685-1750).
Apesar da chamada “colcha de retalhos” no campo político, nas esferas cultural e
filosófica o país prosperou consagrando-se como “terra de poetas e filósofos” (FULBROOK,
2012, p. 110). Assim, no século XVIII, com maior número de livros publicados em alemão, o
conhecimento e o questionamento da realidade se expandiram.
Na percepção de Fulbrook (2012), a Revolução Francesa influenciou a Alemanha no
âmbito político, por outro lado, o país ainda se mantinha economicamente agrícola e composto

6
O mercantilismo caracterizou-se pela intervenção do Estado na economia. Veja-se mais em: ARRUDA, José
Jobson de A. História moderna e contemporânea. 7. ed. São Paulo: Ática, 1977.
7
O absolutismo concentrava os poderes políticos nas mãos de um único soberano. Veja-se mais em: ARRUDA,
José Jobson de A. História moderna e contemporânea. 7. ed. São Paulo: Ática, 1977.
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por aldeias e florestas, além das igrejas e dos luxuosos castelos. Esse cenário seria modificado
devido à intervenção da revolução industrial.
Para Hobsbawm (2010), o ano de 1840 foi o marco para o início do desenvolvimento
industrial na Alemanha. Consequentemente, a Confederação Germânica percorria a conquista
da unificação nacional. A Prússia sobressaiu-se como Estado fortalecido economicamente,
além disso indicava crescimento populacional e também territorial. Em contrapartida, no
âmbito educacional, tanto a Prússia quanto a Áustria estimulavam programas de censura e
fiscalização da educação secundária e superior, mantendo-se conservadoras.
Apesar disso, Humboldt (1769-1859) foi responsável por relevantes reformas
educacionais na Prússia. Conforme escreve Manacorda (2010), a Prússia progrediu no âmbito
educacional, ultrapassando países como a Inglaterra e a França com relação ao percentual de
pessoas que concluíam a obrigatoriedade escolar do período.
Esse autor sustenta que, Jean Jacques Rousseau (1712-1778) representou importante
influência no pensamento entre os românticos, especialmente na Alemanha. Seus seguidores
defendiam a democracia, o nacionalismo e a prática da benevolência. Além disso, acreditavam
que os indivíduos seriam independentes com propriedades distribuídas igualmente. Outro ponto
relevante é que, o filósofo em referência inaugurou um novo modo e de pensar e entender a
criança que, segundo ele, era dotada de valor positivo e de inocência. Por consequência,
Rousseau considerava o desenvolvimento do espontaneísmo e da atividade própria da criança,
como importantes para sua educação.
Tanto Froebel quanto o educador suíço Pestalozzi (1746-1827) receberam essa
influência rousseauniana, uma vez que defendiam como importantes na educação da criança a
atividade e o espontaneísmo infantil. Assim como Rousseau, Froebel enfatizou o trabalho com
os jogos, os trabalhos manuais, a experiência e o espontaneísmo na primeira fase da vida.
Já Pestalozzi destacou a prática do filantropismo e do sentimentalismo, sendo como um
pai para os seus educandos. Dessa forma, era contra as punições no ensino. O educador referido
defendeu o ensino da leitura e da escrita desde a mais tenra idade, por julgar que essa seria a
forma correta de o indivíduo ter oportunidades para progredir na sociedade capitalista em
ascensão.
Manacorda (2010) expõe que o conceito primordial da pedagogia de Pestalozzi era a
intuição. O som, a forma e o número constituíam as unidades elementares da cognição. A
didática utilizada pela mãe ou pelo professor partiria da curiosidade e do interesse natural da
criança. O educador suíço também enfatizou a ginástica, a música, o desenho e a modelagem,
caracterizando os métodos denominados mais tarde de métodos ativos.
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Froebel passou dois anos com Pestalozzi em Iverdon, mas se ausentou da escola, pois
começou a divergir em algumas ideais com o seu mestre. Enquanto Pestalozzi se preocupou
com a classe pobre e defendia a iniciação à leitura e à escrita desde muito cedo, Froebel
defendeu o trabalho com a espiritualidade do indivíduo e primou pelo jogo e pelas atividades
naturais da infância.
Froebel nasceu no sudeste da Alemanha em 1782, sua mãe faleceu quando ele tinha
apenas 9 meses de idade, devido a algumas complicações do parto. Seu pai logo se casou
novamente, porém a madrasta teve seus próprios filhos, então Froebel foi deixado de lado. Ele
buscou refúgio na natureza. O pai o considerava com pouca capacidade cognitiva, assim não o
apoiava nos estudos teóricos. Mesmo assim, Froebel buscou os estudos em universidades, mas
devido às dificuldades financeiras não conseguiu concluir um curso.
Destarte, o pedagogo formulou sua teoria devido às várias influências que recebeu, tais
como: o contato próximo à natureza, a religiosidade protestante da família, o pensamento
filosófico alemão, a estada com o mestre Pestalozzi em Iverdon. Seu pensamento foi
considerado por alguns autores como místico ou semimístico, apesar disso, não se pode negar
a relevante contribuição do seu trabalho para a educação da criança pequena. A esse respeito,
Manacorda (2010, p. 300) justifica: “[...] a confusão místico-idealista das premissas teóricas,
das quais aparentemente foram deduzidas as opções pedagógicas e didáticas, não impediu que
Froebel contribuísse significativamente para o progresso da ciência da prática pedagógica”.
Em 1837, o pedagogo alemão instituiu o primeiro jardim de infância, ou Kindergarten,
que significa jardim de crianças. Dessa forma, o autor comparou a criança a uma planta, a qual
necessitava de cuidados para se desenvolver, sendo as professoras as jardineiras desse jardim.
O autor sistematizou a infância em três fases, que seriam interligadas, ou seja, não poderia haver
uma separação rígida entre uma fase e outra. A “primeira infância” seria do 0 aos 3 anos de
idade, momento fundamental para disponibilizar objetos para a criança manusear.
Na infância propriamente dita, fase chamada “o menino”, que seria dos 4 aos 6 anos, a
prioridade era para o jogo e a linguagem, além das atividades domésticas, as quais o pai deveria
despertar no filho desde pequeno. A última fase da infância denominava-se “o garoto”, que
seria dos 7 aos 11 anos. Nessa fase, a ênfase seria na linguagem e na escrita, pois este seria o
momento propício para a reflexão e consequentemente para a aquisição da consciência.
Sua obra-prima, A Educação do Homem, foi publicada em 1826, é a única obra do autor
traduzida para a língua portuguesa, em 2001. Os conceitos fundamentais presentes na obra são:
a interiorização e exteriorização: na primeira infância, há uma vaga interiorização do mundo
exterior; na segunda infância há a exteriorização do mundo interior e, por fim, na terceira
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infância, há a interiorização do exterior. É nesta última etapa que ocorre a educação formal,
quando o educando adquire conhecimento do mundo exterior. A unidade vital era a união entre
Deus, o homem e a natureza, por isso, o fim último da educação seria fazer com que o indivíduo
chegasse a essa unidade vital; e a lei esférica tinha fundamental importância, também nesse
processo, pois, para Froebel, a esfera era a forma perfeita, símbolo do equilíbrio, era a unidade,
a totalidade do universo, sendo Deus o seu centro.
A sua obra destaca: o papel da família, que seria a primeira instância educadora; a
valorização da criança desde o ventre materno; o trabalho, o pai deveria introduzir o filho ao
seu trabalho desde a mais tenra idade; o jogo; as excursões, que deveriam ocorrer pelo menos
uma vez na semana; a música; o desenho; as formas geométricas; a religião; a natureza; a
linguagem; a repetição em coro; a participação dos alunos. O professor realiza questionamentos,
o professor e os pais não dão as respostas prontas, mas fazem com que a criança chegue à
resposta.
Segundo Manacorda (2010), a baronesa Berra Von Marenholtz Bülow (1810-1893) foi
a grande divulgadora dos jardins de infância de Froebel em todo o mundo. Outra relevante
figura feminina foi Helena Raffalovich Comparetti (1842-1918), que estudou na escola
froebeliana em Gotha e doou seu patrimônio para uma fundação froebeliana em Veneza,
defendendo o caráter de gratuidade e laicidade da instituição.
No período vivido por Froebel ainda não existia uma psicologia da infância. Contudo,
suas ideias ganharam respaldo com a pedagogia moderna que se caracterizou pelo processo de
instrução técnico-profissional realizado nas escolas e, por outro lado, pelo surgimento da
psicologia infantil e dos métodos ativos. A primeira visava formar o indivíduo preparado para
o trabalho, habilitado às modernas tecnologias. A segunda sustentava a espontaneidade da
criança, a preocupação com o desenvolvimento da psique, utilizando-se do jogo, da livre
atividade, do afeto e da socialização.
Apesar de, no primeiro momento, parecerem perspectivas contraditórias, Manacorda
(2010, p. 367) explicita que ambas pretendiam formar o indivíduo ativo para o trabalho: “Nas
escolas ‘novas’, a espontaneidade, o jogo e o trabalho são elementos educativos sempre
presentes: é por isso que depois foram chamadas de ‘ativas’”.
Para Luzuriaga (1969) Froebel foi um precursor no estudo da psicologia, haja vista que
procurou explicar o desenvolvimento infantil: “a grande criação de Froebel foi o haver visto
antecipadamente o que os psicólogos descobririam depois: que os primeiros anos de vida são
os decisivos no desenvolvimento mental do homem” (LUZURIAGA, 1969, p. 201). Além
disso, o professor espanhol supracitado considerou a obra-prima de Froebel como um “clássico
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por excelência da primeira infância” (LUZURIAGA, 1969, p. 203), uma vez que reconheceu a
atividade e o jogo como fundamentais contribuintes para o desenvolvimento da infância.

O brincar, o jogo [...] é a manifestação espontânea do interno, imediatamente


provocada por uma necessidade do interior mesmo. É, ao mesmo tempo, modelo e
reprodução da vida total, da íntima e misteriosa vida da natureza no homem e em todas
as coisas. Por isso, engendra alegria, liberdade, satisfação e paz, harmonia com o
mundo. Do jogo, emanam as fontes de tudo que é bom. (FROEBEL, 2001, p. 47).

Analisando o pensamento de Froebel, verifica-se que suas concepções de homem, de


sociedade e educação estavam absorvidas pelo modo de produção capitalista em ascensão no
seu período. Percebe-se que, a instrução pública pensada para a época considerava
prioritariamente as necessidades do mundo do trabalho. Froebel poderia pensar diferente dessas
ideias predominantes em relação à educação do homem; no entanto, ele também vivia no
sistema capitalista. A preocupação dos dirigentes, em geral, era com a instrução técnica para o
mercado de trabalho.
Com relação à mulher, constata-se que a mãe trabalhadora não poderia ser o foco do
pedagogo alemão, já que seu modelo de mulher era a burguesa, que não poderia trabalhar fora
de casa; pois, seu papel era cuidar do lar e dos filhos, preparando-os para a chegada do pai, o
provedor do lar. A mulher possuía um papel primordial por ser a primeira educadora da criança,
desde o ventre. A família, em conjunto, seria a primeira e a maior instância responsável por
iniciar a criança em uma vida religiosa, pura e santa.
Nota-se que Froebel se preocupava muito com a espiritualidade do ser humano e com a
sua formação para a vida harmônica em sociedade. Para isso, os filhos já eram apresentados ao
trabalho do pai desde muito cedo, não importando em qual ofício o pai trabalhava, ele seria
capaz de ensinar seu filho, mesmo não sendo um intelectual. Por isso, ele se preocupou,
também, em defender que o pai ensinasse seu ofício para o filho desde a mais tenra idade, além
dos jogos que criou, que proporcionavam à criança o zelo, a perfeição estética e o trabalho em
grupo.
Sem embargo, Froebel compartilhou dos princípios filosóficos que estavam em
evidência no período histórico em que viveu, recebendo influência de autores contemporâneos
e remanescentes, combinando convicções liberais com misticismo e religiosidade para elaborar
a sua pedagogia.

3 A PEDAGOGIA DE FROEBEL E A EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL

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A despeito das críticas que sofreu, sua pedagogia se difundiu por alguns países,
sobretudo com os trabalhos da pedagoga, médica e pesquisadora italiana Maria Montessori
(1870-1952), que adaptou seus jogos e brinquedos criando o Método Montessori. Essa
pesquisadora foi também pioneira no campo pedagógico, dando mais ênfase à autoeducação do
aluno do que ao papel do professor como fonte de conhecimento. As bases da sua teoria estão
pautadas na individualidade, na atividade e na liberdade do aluno.
Arce (2010) assevera que Pestalozzi e Froebel foram influenciadores do pensamento
educacional para a infância no Brasil no período de 1827 a 1932, período em que se primava
por ideais liberais e uma disciplina modeladora. Assim, a autora sistematiza a infância no Brasil
em três momentos fundamentais: fim do Império e República Velha, entre 1827 a 1932; 1932
a 1985, período em que a Escola Nova ganhou espaço; e 1985 a 2008, com o auge do
construtivismo.
Apesar de levar em conta a referida sistematização dos períodos supracitados,
verificamos que, em especial nos dias atuais, por intermédio de documentos da Política
Nacional para a Educação Infantil no Brasil, algumas concepções de Froebel ainda se
encontram presentes na educação da infância brasileira.
Ao discutir sobre essa questão, Kishimoto (2014) realça a importância de Froebel ainda
hoje, haja vista que as instituições de educação infantil exploram o jogo como recurso
pedagógico, e a expressividade natural da criança. A estudiosa atesta que Froebel recebeu a
antonomásia de “psicólogo da infância”, pois inter-relacionou os elementos intelectual, físico e
espiritual, tornando-os interdependentes.
Nota-se que, para esses autores, o principal legado de Froebel é o jogo, em especial as
caixas de construção. A esse respeito, Kuhlmann Júnior (2015) corrobora comparando os dons
frobelianos às peças de encaixe, amplamente utilizadas pelas crianças na educação infantil hoje.
Em função disso, os jogos e as brincadeiras são temas recentes de pesquisas relacionadas à
educação infantil. Sendo Froebel um dos pioneiros a abordar o assunto com crianças pequenas,
torna-se fundamental essa volta ao passado, a fim de estudar os clássicos com objetivo de
compreender as questões educacionais atuais.
Conquanto, é importante trazer para a discussão educacional atual o educador alemão
considerado um clássico, é essencial para que sua teoria permaneça viva e que os educadores
de hoje se apropriem adequadamente de sua teoria, e não de forma superficial ou incorreta como
ocorre na maioria das vezes. Pois encontramos em vários documentos norteadores, tanto da
educação no geral como da educação infantil atual, a ênfase quanto a ludicidade, a brincadeira,
a observação do professor, o respeito às faixas etárias, o que nos remete à pedagogia
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froebeliana. Torna-se fundamental conhecer e usufruir de suas contribuições sobre como levar
em conta as fases da infância, ou seja, as faixas etárias, além dos brinquedos e jogos como
valiosos recursos pedagógicos; porém, sempre com o olhar crítico, uma vez que o autor foi
influenciado por seu contexto histórico, e acabou romantizando suas concepções de homem, de
mundo e de educação.
No Brasil, o primeiro jardim de infância foi fundado em 1875, pelo Dr. Joaquim José
de Menezes Vieira (1851-1897), que escreveu o Manual para os jardins de Infância, baseando-
se no método froebeliano. O termo educação infantil, por sua vez, surgiu apenas a partir da
Constituição de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, na qual se
tornou primeira etapa da educação básica. Apesar da alteração do nome – educação infantil
substituindo o jardim de infância – é possível perceber que, embora ressignificados, ainda
existem resquícios do pensamento froebeliano nas propostas educacionais para a infância
brasileira. Por conseguinte, aí está a relevância em se conhecer o educador e as suas ideias na
atualidade.
Em análise de Saito (2004) existem indícios dos princípios do autor nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) e no Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil
(RCNEI), mais fortemente apresentados nas categorias homem, família, perfil profissional e a
defesa do brincar, nos PCNs; e no volume 3 no RCNEI (BRASIL, 1998), no item Aprender
brincando.
Não nos cabe, nos limites deste texto, realizar uma análise crítica da presença do
discurso neoliberal implícita nos documentos da educação. Sabemos da existência dessas
influências nas atuais políticas educacionais brasileiras por meio da leitura de autores como:
Duarte (2008); Saviani (1992); Frigotto (1996); Arce (2010), dentre outros. No entanto, não é
este o objeto de discussão deste texto. Assim, buscamos, a partir de uma análise do Relatório
Delors, publicado em 1996 e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil de
2010, encontrar indícios do pensamento de Froebel presentes, ainda hoje, na educação da
infância. O objetivo é torná-lo conhecido, expondo sua proposta pedagógica, aproximando-a
dos jogos e das brincadeiras utilizados como trabalho docente na educação infantil da
atualidade.
Em 1996 foi publicada a primeira versão em língua portuguesa do Relatório Educação:
um tesouro a descobrir, organizado por Jacques Delors, que foi encomendado pela Organização
das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (Unesco) à Comissão internacional
sobre Educação. Esse relatório estabelece a nova base epistemológica para a educação do século

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XXI, pautada em quatro pilares, a saber: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a
conviver e aprender a ser (DELORS, 2001).
A partir desse documento a Unesco encaminhou novas orientações para a elaboração de
diretrizes educacionais, em especial para os países em desenvolvimento, determinando os
caminhos que devem ser seguidos para, por meio de propostas para a educação do novo milênio,
a superação dos problemas sociais. Na visão da Unesco sem essa nova base epistemológica a
educação do século XXI seria impossível.
A fim de comprovar a atualidade do pensamento de Froebel, realizamos a leitura de
algumas partes do Relatório Delors (2001) e uma pequena análise de documentos norteadores
da educação atual a saber: as Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação infantil de 2010
e as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica, de 2013, no item Revisão das
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil.
Tomamos como base para a análise algumas determinações estabelecidas no Relatório
Delors, na versão publicada em língua portuguesa (DELORS, 2001). Apesar de completar mais
de 20 anos de existência, os ideais dessa obra são, ainda hoje, propagados nas propostas
educacionais atuais para os países em desenvolvimento, como o Brasil.
Arce (2002c) explica que Froebel já defendia o lema “aprender a aprender”, ainda que
de forma incipiente, uma vez que atrelando lúdico ao prazer, a criança interagindo com seus
pares e adultos, além de pais e amigos que são convidados a estar em constante contato com a
escola, a criança constrói significados próprios do mundo.
Nessa obra, a educação é vista como reveladora do potencial criativo do indivíduo: “uma
nova concepção ampliada de educação deveria fazer com que todos pudessem descobrir,
reanimar e fortalecer o seu potencial criativo – revelar o tesouro escondido em cada um de
nós” (DELORS, 2001, p. 90, grifo nosso). Para que isso ocorra é que são propostos os quatro
pilares para a educação do século XXI.
No item Aprender a fazer, nota-se a importância da comunicação, do trabalho em equipe
e da resolução de problemas: “qualidades como a capacidade de comunicar, de trabalhar com
os outros, de gerir e de resolver conflitos, tornam-se cada vez mais importantes” (DELORS,
2001, p. 94).
No item Aprender a viver juntos, verifica-se a preocupação com a sociedade harmônica,
constituída por meio da resolução de conflitos. “Poderemos conceber uma educação capaz de
evitar os conflitos, ou de os resolver de maneira pacífica, desenvolvendo o conhecimento dos
outros, das suas culturas, da sua espiritualidade?” (DELORS, 2001, p. 97).

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Esse ideário está atrelado aos princípios de que uma educação que começa mais cedo,
ainda na primeira infância, tende a formar indivíduos autônomos para solucionar seus próprios
problemas e capazes de conviver com outros, independente das diferenças de raça, de credo, de
cultura, de gênero, dentre outras. Reforça-se a visão moral do indivíduo quanto à forma correta
de agir em sociedade, ideal perpassado pelo educador, que é exemplo para seu aluno: “passando
à descoberta do outro, necessariamente, pela descoberta de si mesmo, e por dar à criança e ao
adolescente uma visão ajustada do mundo, [...]. Os professores [...] funcionam como modelos”
(DELORS, 2001, p. 98).
No item Aprender a ser, percebe-se a preocupação em preparar o educando
espiritualmente, incutindo princípios éticos, de justiça, responsabilidade, criatividade, entre
outros: “A educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa – espírito e corpo,
inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade”
(DELORS, 2001, p. 99).
Predomina no texto a preocupação com o desenvolvimento da criatividade, da
comunicação, com a profissionalização, a cooperação, o trabalho em equipe, a resolução de
conflitos, a harmonia, a moralidade, a ética, a espiritualidade, além do professor como modelo.
Todos esses princípios podem ser relacionados aos princípios de Froebel, que também pensava
o educador como modelo, que deveria seguir os princípios do mestre maior, que era Jesus.
Froebel também se preocupou com a oralidade, a linguagem e a comunicação da criança desde
pequena, escrevendo até mesmo obras para ensinar às mães a se comunicarem brincando com
seus filhos pequenos.
Quanto às Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil, iniciamos a análise pelo
documento de 2010, logo em seguida, fazemos análise da revisão das atuais Diretrizes, do ano
de 2013. As categorias que serviram de base para a análise do pensamento do autor nos
documentos são: talentos, harmonia, jogos e brincadeiras, interação, espontaneidade,
afetividade, observação do professor. Essas categorias estão elencadas no decorrer do texto a
partir do pensamento filosófico e pedagógico do educador alemão.
Nas Diretrizes para a educação infantil de 2010, os eixos do currículo são as interações
e a brincadeira. Por meio desses eixos, é preciso garantir aos educandos experiências que
favoreçam o conhecimento de si e do mundo; além de introduzi-los em diferentes formas de
expressão, gestual, plástica, verbal, musical, e outras; envolvê-los em experiências de
narrativas; participação em atividades individuais e coletivas; motivação à curiosidade, à
exploração, ao questionamento, também em relação à natureza (BRASIL, 2010).

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Dentre vários itens trazidos pelas Diretrizes, destacamos acima os possíveis de se
relacionarem aos ideais de Froebel. Em primeiro lugar, a brincadeira e a interação são
destacadas como primordiais para a educação da criança pequena. Por meio da brincadeira, o
educando conhece a si próprio; brinca com diferentes materiais, sejam eles relacionados à
música, poesia, dança, dentre outros.
No documento de Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais de 2013, percebem-
se, também, que são reforçados vários princípios de Froebel, com relação à educação atrelada
a uma sociedade harmônica, o protagonismo do brincar na Educação Infantil, sem deixar de
lado outras formas de aprendizagem, como música, dança; a observação e afetividade do
professor; o contato com a natureza e a adequação às faixas etárias da criança (BRASIL,
2013b). Nota-se, nessas Diretrizes, que cabe à educação a responsabilidade de propiciar a
harmonia da sociedade, o que nos remete ao ideal de Froebel, o qual acreditava que o indivíduo
deveria ser educado para viver bem com seus iguais.
A brincadeira é prioridade na educação infantil, em detrimento do ensino sistemático do
alfabeto e dos números: “uma atividade muito importante para a criança pequena é a
brincadeira” (BRASIL, 2013b, p. 87, grifo nosso). Veja-se a esse respeito em outra passagem:

Cabe às instituições de Educação Infantil assegurar às crianças a manifestação de seus


interesses, desejos e curiosidades ao participar das práticas educativas, valorizar
suas produções, individuais e coletivas, e trabalhar pela conquista por elas da
autonomia para a escola de brincadeiras e de atividades [...]. (BRASIL, 2013b, p. 87,
grifo nosso).

A brincadeira e a ludicidade são os termos recorrentes para essa etapa da educação:


“nesse processo, é preciso valorizar o lúdico, as brincadeiras e as culturas infantis” (BRASIL,
2013b, p. 93, grifo nosso).
Outro aspecto importante a ser considerado nesse contexto é o papel que o educador
assume na função de observador: “[...] a professora e o professor observam as ações infantis,
individuais e coletivas, acolhe suas perguntas e suas respostas, busca compreender o significado
de sua conduta” (BRASIL, 2013b, p. 93, grifo nosso). Essa afirmação encontra respaldo na
pedagogia de Froebel que considerava importante o professor observar a criança no seu agir. A
prática de observar as crianças brincando era um papel preponderante para o professor, pois era
por meio dela que o educador concebia o desenvolvimento infantil. Foi observando as crianças
brincando, dançando e cantando que Froebel compreendeu e determinou os jogos e as
brincadeiras como elementos essenciais para o desenvolvimento da criança.
Vale lembrar que no dia 4 de abril de 2013, a Lei nº 12.796 modificou vários artigos da
Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, dentre eles o Art. 4º inciso I: “educação básica
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obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte
forma: a) pré-escola; b) ensino fundamental; c) ensino médio” (BRASIL, 2013a).
A partir dessa determinação, a pré-escola torna-se obrigatória, tendo como prazo o ano
de 2016 para a matrícula das crianças de 4 e 5 anos nas escolas de educação infantil. Destaca-
se, portanto, que a pré-escola, que já compunha com a creche a primeira etapa da educação
básica, passou a ser obrigatória para todas as crianças a partir dos 4 anos de idade, conforme a
lei supracitada, decretada pelo Congresso nacional e sancionada pela presidente Dilma
Rousseff, publicada no Diário Oficial da União em 05 de abril de 2013.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O conhecimento das questões discutidas neste texto torna-se fundamental para que se
possa relacionar o pensamento do educador em discussão, a fim de absorver as influências que
ele recebeu dos autores com os quais conviveu e das ideias em efervescência no período, que
também viriam a influenciá-lo, além da intervenção da guerra, da qual participou; do
protestantismo, herança que recebeu da sua família, especialmente do seu pai que era pastor.
Todavia, para a realização das análises de sua obra, apreende-se mais facilmente o pensamento
desse autor, ao se conhecer o contexto social no qual ele viveu.
Analisando os fatos, entende-se que Froebel, de família protestante, considerou a tríade
“Deus, homem e natureza” como a base de toda sua filosofia educacional. Por conseguinte,
verificamos a forte propagação da religiosidade no período em questão, a fim de controlar as
massas e, consequentemente, manter a divisão das classes sociais e o status quo existente. Além
disso, as revoluções obtiveram papel preponderante no modo de pensar um novo homem, apto
para o trabalho e para a vida em sociedade, surgindo, assim, a necessidade de uma nova proposta
pedagógica para cuidar e educar a infância.
Froebel foi o pedagogo que se preocupou com esse novo indivíduo, criando o jardim de
infância e uma nova proposta educacional para as crianças de 0 a 6 anos. A Alemanha, seu país
de origem, também influenciou em suas concepções, quanto ao nacionalismo, à filosofia mística
e idealista e ao contato com a natureza, dentre outros aspectos que contribuíram para a criação
dessa pedagogia.
Parafraseando Heiland (2010, p. 39) é possível afirmar que, apesar da pedagogia de
Froebel sofrer diversas alterações e influências ao longo do tempo, seus métodos de educação
elementar, fundamentados no jogo e utilizados nos jardins de infância, permanecem vivos na
nossa educação pré-escolar. Seus materiais de jogos continuam sendo utilizados, em particular
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as ‘caixas de construção’ que foram criadas como ‘dons’ para a educação de crianças de 3 a 6
anos.
As ideias de Froebel desencadearam movimentos como o escolanovismo e o
construtivismo, este último foi validado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1997). Assim, é clara a presença de muitos de seus princípios ainda hoje na Educação Infantil,
com relação ao brincar, aos jogos, à espontaneidade da criança, à observação e ao auxílio do
professor. Portanto, a prioridade é o brincar na infância ao invés de ensinar a ler e escrever na
mais tenra idade. Assim, podem-se perceber algumas de suas convicções contidas nos quatro
pilares da educação, presentes no Relatório Delors.
Por consequência, ainda hoje é imprescindível a leitura de seus textos, para se
compreender suas convicções a respeito do jogo, da atividade e da liberdade infantil, da criação
do jardim de infância, dos dons, das ocupações e dos cantos, dentre outras contribuições que
estão presentes na educação atual das nossas crianças.

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Recebido em: 23 de janeiro de 2019


Aceito em: 11 de novembro de 2019

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